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PLANEAMENTO REGIONAL E URBANO PLANEAMENTO ESTRATÉGICO - APONTAMENTOS DO CAPÍTULO II - LICENCIATURA EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICO-PRIVADA FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA ANO LETIVO 2013/2014 DOCENTE: SARA MORENO PIRES Planeamento Regional e Urbano -1- Sara Moreno Pires 1. Origens do Planeamento Estratégico empresarial A palavra e o conceito de “estratégia” têm origem da palavra grega stratego, combinação de stratos (exército) com ego (líder). Tendo a sua origem no campo militar, pode-se definir como “a arte de conduzir um exército até à presença do inimigo e dirigir as operações de forma a atingir o objetivo desejado” (Guell, 1997:18).1 O Planeamento Estratégico (PE) aplicado ao setor privado surgiu nos Estados Unidos no início do século XX, mais propriamente nos anos de 1920, como uma preocupação académica. Foi através de cursos sobre políticas empresariais oferecidos pela Harvard Business School, da Universidade de Harvard2 que os princípios estratégicos começaram a ser estudados tendo por objetivo melhorar a gestão das grandes empresas. Harvard, Ansoff e Steiner criaram e estruturaram os modelos de PE que até hoje servem de base para a formulação de estratégias nas organizações. Esses modelos pretendiam uma forma de planeamento mais dinâmico, adequando-se à complexidade crescente da envolvente externa. O planeamento tradicional, de longo prazo, com seu foco nas projeções feitas a partir das condições presentes, apresentava-se demasiado estático perante as mudanças evolutivas do mercado (Silva, 2001). A formulação de um processo de gestão empresarial estratégica foi posta em prática por F. Taylor, H. Fayol, Sloan e M. Weber por imperativos de competição, num processo ligado à tentativa de aumentar a produtividade da indústria, concretizando-se nas linha de montagem de Ford, na gestão por departamentos de Sloan e na administração científica de Taylor. “Ser competitivo estava associado à ideia da procura constante de inovação e à escolha e aplicação de estratégias adequadas, o que implicava determinar e formular prioridades articuladas no tempo e garantir uma permanente autoavaliação face à conjuntura externa.” DGOTDU (1996: 28). Em 1956, 8% das grandes empresas nos Estados Unidos já empregavam PE, subindo esta percentagem para 85% em 1966. Esta utilização aplicava-se somente nos setores mais externos das empresas, como o de vendas e formulação de negócios, não se repercutindo sobre as funções administrativas e a estrutura das empresas (Rosa, 2003). Foi com a General Eletric (GE) que o PE assumiu uma condição formal dentro das organizações, primeiro com a criação das Unidades Estratégicas de Negócios, estruturas descentralizadas com autonomia na definição de estratégias, operação em mercados externos e controlo de lucros e 1 Rosa (2003: 1). Planeamento Regional e Urbano -2- Sara Moreno Pires custos, em 1970, e cinco anos depois, com a incorporação do PE em toda a sua estrutura empresarial.3 A maioria das grandes organizações empresariais seguiu o exemplo da GE, e o PE difundiu-se por todo o mundo empresarial. O Planeamento Estratégico empresarial atingiu o seu auge no final dos anos de 1970. A partir de então iniciou-se um momento de críticas face aos diversos e contínuos erros/prejuízos de muitas empresas, coincidindo com a recessão dos primeiros anos da década de 1980. 2. A Importância do Planeamento Estratégico no Setor Público A produção teórica em torno da aplicação do planeamento estratégico às organizações do setor público é relativamente escassa, sendo mesmo difícil de falar num corpo teórico próprio. Uma das primeiras referências teóricas data de 1988, quando J. Bryson publica o primeiro manual de aplicação da técnica, exclusivamente formulado para o setor público e organizações sem fins lucrativos. (Rosa, 2003) Para além disso, a maioria das referências bibliográficas existentes privilegiam a análise na ótica do processo, no terreno dos procedimentos, valorizando menos aspetos de conteúdo.4 “A apropriação pelas organizações públicas dos referenciais e práticas do planeamento estratégico do setor privado é recente: início da década de 80 nos EUA, e segunda metade adiantada desta década, em grandes capitais europeias. Esta apropriação, que um autor como J. G. Padioleau inscreve num ‘movimento de racionalização da ação pública urbana’, corresponde ao reconhecimento de que as administrações públicas locais poderiam retirar vantagens da utilização de modelos gestionários das grandes empresas, para conduzir as suas cidades, bem como para escolher e acompanhar os programas (políticas de desenvolvimento, projetos e ações de renovação urbana...) que compõem essa ação pública” (Neves, 1996: 47). Num contexto económico e financeiro cada vez mais turbulento, onde são constantes a escassez de recursos (com a redução das transferências financeiras do Estado Central para as administrações locais), o aumento das atribuições de competências às administrações locais e o aumento da 2 Bryson (1988: 30). 3 Wilson, I. (1990), “The state of strategic planning”, in Technological Forescating and Social Change. n. 37, p. 103-110. 4 Neves (1996: 45). Planeamento Regional e Urbano -3- Sara Moreno Pires concorrência global entre cidades, os sistemas de planeamento tradicional não conseguem responder a esses desafios, pois: - “regulamentam muito mais do que estimulam; - concentram em organismos legalmente e democraticamente definidos o papel de motor e o poder da decisão mais do que repartem a responsabilidade na iniciativa e no consenso; - privilegiam a modificação da estrutura construída em detrimento da atividade social, económica e cultural da comunidade como forma de transformar a cidade; - arbitram conflitos de interesse no processo de participação mas dificilmente se constituem como plataformas para acordos de ações a empreender conjuntamente; - impõem-se na modelação do futuro mas são pouco ágeis na readaptação que as mudanças sempre exigem”. (DGOTDU, 1996: 28). A primeira experiência de trabalho de especialistas em planeamento estratégico na esfera do planeamento das cidades teve lugar, em 1981 – e sob iniciativa da comunidade de negócios –, em São Francisco, grande cidade a braços com uma profunda crise económica, traduzida na perda de população, na quebra do produto interno e na perda de posição no ranking das cidades americanas. Nas experiências seguintes figuram, entre outras5, Nova Iorque (à beira do colapso fiscal), e pelas capitais europeias, Amesterdão (à procura de recuperar o prestígio geoeconómico das atividades ligadas à exploração portuária), Birmingham (a braços com a crise social e económica derivada do envelhecimento da estrutura produtiva); Barcelona (com o objetivo de garantir um reposicionamento no contexto da integração na continuidade do sistema urbano europeu) (Neves, 1996). Ou seja, as experiências conhecidas de recurso direto às “ferramentas” do planeamento estratégico por parte das administrações das grandes cidades refletem situações relativamente diferenciadas, mas com uma matriz comum: a necessidade da revitalização do tecido social e económico das cidades (que evoluem segundo ciclosde atividades e de formas de ocupação humana do espaço que se sustentam, crescem e definham em função das suas próprias forças, mas também em função de envolventes externas que condicionam, de modo positivo ou negativo, o perfil do ciclo). 5 Numa pesquisa nacional publicada em 1990, o PE estava presente em 63% das cidades norte-americanas de pequeno e médio porte, entre 25 mil e um milhão de habitantes, e numa outra, publicada em 1995, resultou que 60% das agências governamentais norte-americanas já utilizavam o Planeamento Estratégico e 10% pretendiam utilizá-lo (Rosa, 2003). Planeamento Regional e Urbano -4- Sara Moreno Pires “Para estas administrações, a formulação de estratégias de gestão ajustadas à sustentação e conquista de posições competitivas constituía um salto qualitativo nas suas vocações tradicionais” (Neves, 1996: 48). CC AIXA AIXA 1:1: CC ONCEONCE TUALIZAÇÃO DE TUALIZAÇÃO DE PP LANEAMENTO LANEAMENTO EE STRATÉGICOSTRATÉGICO ** Conceito de PETER DRUCKER, um dos decanos dos pensadores da área e grande influenciador do setor privado: “Planeamento estratégico é o processo contínuo de, sistematicamente e com o maior conhecimento possível do futuro contido, tomar decisões atuais que envolvem riscos; organizar sistematicamente as atividades necessárias à execução dessas decisões e, através de uma retroalimentação organizada e sistemática, medir o resultado dessas decisões em confronto com as expectativas alimentadas”. O QUE O PLANEAMENTO ESTRATÉGICO NÃO É (no pensamento de Peter Drucker) • o PE não é uma caixa de magia, nem um amontoado de técnicas. Drucker defende uma abordagem cognitiva, analítica e criativa para o PE em contraposição à utilização de inúmeras técnicas quantitativas, computacionais e de simulação. Ele diz que nenhuma dessas técnicas responde à pergunta “Qual é o nosso negócio?” ou “Qual deve ser o nosso negócio?”. • o PE não é uma previsão. Drucker não gosta da associação da previsão do futuro ao planeamento. Para ele o futuro é imprevisível e qualquer tentativa neste sentido é perda de tempo e esta incapacidade é cognitiva. A partir daí, ele cunha uma frase antológica: o planeamento estratégico é necessário exatamente porque não temos capacidade de prever. • o PE não opera com decisões futuras. Ele opera com o que há de futuro nas decisões atuais. A pergunta que Drucker coloca não é sobre o que a organização deverá fazer no futuro, mas o que ela deverá fazer no presente para ter um futuro. • o PE não é uma tentativa de eliminar riscos. Nem de diminuí-los. Trata-se de saber reconhecê- los, compreendê-los e escolher, racionalmente, aqueles para os quais a organização está melhor preparada. O planeamento estratégico deve possuir esta capacidade. Planeamento Regional e Urbano -5- Sara Moreno Pires Conceito de JOHN BRYSON, pioneiro na adaptação do planeamento estratégico para o setor público: “Defino planeamento estratégico como um esforço disciplinado para produzir ações e decisões fundamentais que moldam e orientam o que uma organização é, o que ela faz e por que faz”. O QUE O PLANEAMENTO ESTRATÉGICO NÃO É (no pensamento de John Bryson) • o PE não é uma panaceia. Bryson reforça com isso o valor da metodologia, dizendo que o PE é um conjunto de conceitos, procedimentos e ferramentas desenhados para ajudar líderes, administradores e planeadores a pensarem e agirem estrategicamente. E que, fundamentalmente, o PE não é um substituto para este pensar e agir, mas simplesmente uma forma de ajudar as pessoas a atingi-los. • o PE não é um substituto para a liderança. Para Bryson nada substitui uma liderança organizacional quando ela quer promover a melhoria da performance desta organização. O PE apenas ajuda na construção de acordos entre os principais decisores. • o PE não é sinónimo de criação de estratégias organizacionais. Para Bryson, assim como para Mintzberg, as estratégias são resultado da combinação das intenções com as emergências da implementação. *Fonte: Rosa (2003); Silva (2001) e Bryson (1995). Planeamento Regional e Urbano -6- Sara Moreno Pires 3. Os Modelos de Planeamento Estratégico Destacam-se duas grandes correntes na metodologia de “construção do exercício de reflexão estratégica”: a corrente clássica e a corrente interacionista. Elas diferenciam-se fundamentalmente pelo grau de detalhe que atribuem ao processo de obtenção de escolhas estratégicas por parte dos atores e pela importância dada à função implementação, que reflete quadros institucionais públicos estruturalmente distintos dos que enquadram relações de mercado (Neves, 1996). 3.1- O Modelo Clássico do Planeamento Estratégico (Escola de Harvard) O modelo clássico de planeamento estratégico no terreno do setor público foi desenvolvido pela Universidade de Harvard com apoio da empresa Arthur Andersen, e aplicado originariamente por esta na cidade de S. Francisco (1981). A difusão deste modelo a várias outras cidades americanas ocorreu na base da iniciativa do US Department of Housing and Urban Development com o objetivo de explorar a aplicação às coletividades locais do exercício de ‘reflexão estratégica’, praticado pelas empresas (Neves, 1996). A definição de planeamento estratégico proposta pela empresa Arthur Andersen foi: “processo para gerir a mudança e para descobrir as visões do futuro mais promissoras das cidades e comunidades locais. Este processo consiste em analisar os pontos fortes, fracos, as ameaças e as oportunidades das cidades e das comunidades locais.” (Neves, 1996: 46) O “Modelo Harvard”, como ficou conhecido, desenvolveu um ciclo estratégico de planeamento e formulou a sistemática do diagnóstico estratégico, um dos elementos mais importantes desse ciclo. Este diagnóstico, ou análise SWOT (Strengths and Weaknesses, Opportunities and Threats), como ficou mais conhecido, incorpora a análise da organização frente às dinâmicas ambientais, interna e externa, e constitui o principal recurso no desenvolvimento do pensamento estratégico. Ele compreende uma análise do ambiente interno à organização – através dos pontos fortes e fracos que uma cidade apresenta em cada uma das componentes de oferta do sistema funcional urbano (formação, estrutura social, base económica, sistemas de transporte, sistemas de telecomunicações, qualidade de vida, participação do cidadão, etc.), elementos estes participantes de uma dinâmica sob o controlo da organização –, e uma análise do ambiente externo à organização – através das ameaças e oportunidades à prossecução da missão, e pertencentes a uma dinâmica cuja capacidade de controlo da organização é mínima ou não existente (fatores geo- Planeamento Regional e Urbano -7- Sara Moreno Pires políticos, económicos, administrativos, sociais, tecnológicos, etc.) e que afetam a componente da procura do sistema funcional urbano (Rosa, 2003). O processo de planeamento estratégico proposto por Harvard inicia-se, então, com esse diagnóstico, que pretende efetuar o levantamento das questões chave num contexto de mudança. O ciclo estratégico pode ser sintetizado na figura seguinte, proposta por Mintzberg, transmitindo uma ideia de ação, de interatividade e de contínua avaliação e controlo, mesmo após a implementação. FIGURA 1 - Modelo Clássico do Planeamento Estratégico Fonte:Rosa, 2003 - Adaptado de Mintzberg, H. (1994), The rise and fall of strategic planning. Free Press, Nova Iorque, p.37. Análise EXTERNA Análise INTERNA Oportunidades e Ameaças Pontos Fortes e Pontos Fracos Competências Diversas Fatores-Chave de Sucesso Criação da Estratégia Avaliação e escolha da estratégia IMPEMENTAÇÃO DA ESTRATÉGIA Responsabilidade Social Valores de Gestão Planeamento Regional e Urbano -8- Sara Moreno Pires A figura indica um eixo vertical-central representado pelo processo de formulação das estratégias, compreendendo as etapas de criação, avaliação e escolha e implementação. Este eixo é alimentado por quatro fluxos de informação e conhecimento. Os dois fluxos superiores representam o diagnóstico estratégico, com a análise externa à esquerda e a análise interna à direita e os dois fluxos laterais-centrais representam os objetivos e missão da organização. Os objetivos e a missão da organização são os elementos valorativos e contextualizadores no processo de definição das estratégias, que no modelo clássico estão inseridos no processo de formulação das estratégias (Rosa, 2003). O plano estratégico deve também concretizar, operacionalizar, as opções estratégicas identificando os recursos, financeiros e humanos, necessários à concretização dos objetivos. O plano tem assim uma dimensão operativa ligada a um ciclo financeiro controlado (Rosa, 2003). Os principais aspetos críticos deste modelo correspondem de alguma forma à sua imagem de marca excessivamente presa à matriz fundadora: de consultoria à gestão empresarial. Eles foram essencialmente: - no plano de ação (que concretiza detalhadamente as opções estratégicas selecionadas) quando são programados os recursos humanos e financeiros necessários à implementação do plano, estes surgem estreitamente ligados ao ciclo orçamental da instituição; esta solução, se, por um lado, tem a vantagem de ligar a gestão corrente a opções mais de longo-prazo, por outro envolve o risco de eventuais dilações temporais da concretização dessas opções, por razões de aperto orçamental de curto prazo; - o processo proposto por este modelo clássico obriga ao encontro de consensos entre um grande número de agentes; mas no entanto existe uma insuficiência da análise quanto aos mecanismos de produção de consensos na elaboração do plano estratégico, sobretudo no que atenta às especificidades próprias das organizações públicas (conflitos de tutela, culturas de intervenção, estrutura de motivações e objetivos de participação); - ausência de referências às modalidades de escolha das estratégias por parte dos intervenientes, nomeadamente na perspetiva de maximizar o binómio potencialidades/oportunidades e de minimizar o par debilidades/ameaças. (Neves, 1996: 50,51) Planeamento Regional e Urbano -9- Sara Moreno Pires 3.2 - O Modelo Interacionista (Escola de Minnesota) O modelo interacionista surge inicialmente numa ótica de correção dos aspetos menos conseguidos do modelo anterior. Passa, desde logo, pelo reconhecimento da especificidade do papel das administrações e coletividades públicas – desde os elementos internos às atribuições e competências das instituições públicas, ao seu estatuto jurídico-legal, à envolvente política (ciclos eleitorais, natureza do mandato, etc.), a constrangimentos de dotações e execução orçamental, ao sistema de interesses em presença (que projeta sobre as instituições e a cidade expectativas e valores, cuja consideração para a construção de consensos é vital, tanto na ótica da mobilização dos atores-chave, como na ótica dos contributos para a descrição da organização no futuro), entre outros. O modelo desenvolvido pela escola de Minnesota (da qual se destaca o autor John Bryson), assumindo os pressupostos metodológicos do modelo clássico da Universidade de Harvard, reconhece uma conceção mais aberta da ação pública baseada na gestão estratégica dos atores, reforçando a importância do papel e do desempenho de todos esses atores no processo de planeamento (co-responsabilizando-os mesmo, no âmbito dos recursos disponíveis para a formalização do processo de planeamento). Para o modelo interacionista, o planeamento estratégico procura consensos que não estão estabelecidos à priori, pois só os objetivos mais gerais são passíveis de consensos. É nesse sentido que este modelo se esforça por encontrar problemas e soluções comuns no decorrer do seu processo, por ativar solidariedades de interesses e sentimentos (valores, ideologias, etc.) entre os parceiros da ação pública e por gerar situações de troca e de aprendizagem. Recorre, para tal, a diversas metodologias ou modalidades de “pedagogia” de planeamento estratégico (Guerra, 2000). Metodologia proposta por JONH BRYSON para o Setor Público6 O fluxo com as etapas da metodologia proposta por John Bryson para o setor público foi publicado por primeira vez em 1987 na forma de artigo, sendo desenvolvido em livro um ano depois. Em 1995, Bryson reedita o livro de 1988 com diversas modificações, inclusive na própria metodologia, passando de oito para dez etapas. É sobre esta última edição que nos iremos debruçar com algum pormenor. O fluxo da metodologia, The Strategy Change Cycle, chamado por Bryson, reúne, ao mesmo tempo, os processos de planeamento e de administração estratégicas. 6 Neste ponto vamos seguir de perto Rosa (2003); Silva (2001) e Bryson (1995). Planeamento Regional e Urbano -10- Sara Moreno Pires A sequência das etapas é a seguinte: 1. Acordo inicial sobre o processo de planeamento. 2. Identificar o mandato da organização. 3. Esclarecer os valores e a missão da organização. 4. Avaliar os ambientes externo e interno da organização para identificar os riscos, oportunidades, pontos fortes e fracos. 5. Identificar as questões estratégicas da organização. 6. Formular as estratégias para gerir estas questões. 7. Rever e adotar o plano estratégico. 8. Estabelecer uma visão organizacional efetiva. 9. Desenvolver um processo efetivo de implementação. 10. Reavaliar as estratégias e o processo de planeamento. 1- Acordo Inicial Esta primeira etapa trata do acordo inicial com as lideranças organizacionais, com o objetivo de viabilizar o processo. Tanto a participação dos patrocinadores, líderes e principais decisores da organização (em princípio, não se faz planeamento estratégico no setor público sem o desejo e a autorização dos responsáveis políticos diretos pela organização), como a clara compreensão do esforço do planeamento, seus objetivos, resultados e compromissos e suas etapas, são dois elementos fundamentais desta etapa. Por vezes é recomendável que o acordo inicial inclua um termo de compromisso devidamente firmado pelas autoridades. Daí a importância do segundo elemento, a clarificação do processo e das suas etapas. O acordo inicial não possui um tempo determinado e pode resultar de uma ou várias reuniões. A definição do grupo de coordenação, ou do líder do processo, que não é necessariamente o patrocinador político, é fundamental para o início dos trabalhos, já que este grupo possui a responsabilidade de reunir e sistematizar as informações e documentos da organização, através dos quais se executam os passos seguintes de esclarecimento do mandato e construção da missão. Grande parte do sucesso ou fracasso do processo de planeamento estratégico reside na qualidade do acordo inicial que deve, fundamentalmente: -encontrar os atores-chaves; - trabalhar e pensar estrategicamente o processo; Planeamento Regional e Urbano -11- Sara Moreno Pires - focalizar o que é verdadeiramente importante para a organização; - considerar os recursos necessários. 2 – Identificar o Mandato da Organização Frequentemente, não se tem claro aquilo que se pode, ou não, fazer dentro do espaço de atuação das organizações, especialmente no setor público, devido à rotatividade das lideranças eleitas (que muitas vezes assumem pela primeira vez a responsabilidade de conduzir uma determinada política pública), bem como dos técnicos indicados para cargos-chaves, quando não até mesmo pelos funcionários de carreira. O objetivo desta etapa é identificar e tornar claro o conjunto de leis, normas, políticas, estatutos e regimentos que, formalmente, através da cultura organizacional, determinam e delimitam as funções exercidas pela organização. 3 – Esclarecer os Valores e a Missão da Organização O esclarecimento da missão não é mais do que a tentativa de dar resposta a perguntas como: quem é a organização? O que deve fazer e porquê? Como se deve comportar? A quem se dirigir?, etc. Ela é determinada, no modelo Bryson, após e em função da análise dos Grupos de Influência (Stakeholders7). Para Bryson ‘a chave do sucesso para organizações públicas e sem fins lucrativos (e para comunidades) é a satisfação dos Grupos de Influência-chaves’ (Bryson, 1995, p.27). 4. Avaliar os Ambientes Externo e Interno (Diagnóstico Estratégico) A avaliação dos ambientes externo e interno à organização é seu diagnóstico estratégico e é realizado através do modelo SWOT (já referido anteriormente pelo modelo clássico), ou seja, através da identificação das principais oportunidades e ameaças à consecução da missão vindas do ambiente externo, bem como, através da identificação dos pontos fortes e fracos das dinâmicas internas da organização. 5 – Identificar as Questões Estratégicas As Questões Estratégicas são questões formuladas a partir do olhar dirigido aos resultados das etapas anteriores e representam o ‘coração’ do processo de planeamento estratégico, em torno das quais são formuladas e implementadas as estratégias. A sua formulação deve ser analisada 7 Stakeholder é qualquer pessoa ou grupo de pessoas que possa influenciar ou ser influenciado pela organização – consumidores, empregados, proprietários, dirigentes, governos, ONGs, instituições financeiras, etc., etc. (Rosa, 2003) Planeamento Regional e Urbano -12- Sara Moreno Pires cuidadosamente, para evitar a identificação de falsas questões. Uma falsa questão estratégica resulta num plano não estratégico. As questões podem ser diretas ou indiretas, individuais ou coletivas, e devem ser estabelecidas por ordem de prioridade. Para além disso, devem ser, igualmente, portadoras de uma coerência global, num horizonte de longo prazo e motivadoras de um consenso institucional alargado. Bryson chama atenção ainda para os três tipos de questão que costumam aparecer: as que requerem apenas monitorização; as que podem ser resolvidas dentro do próprio ciclo organizacional do planeamento estratégico e as que requerem um tratamento urgente e imediato. 6. Formular as Estratégias A distinção entre formulação e adoção de estratégias é destacada por Bryson. Na formulação, as forças da criatividade estão envoltas num clima de cooperação de ideias. Na adoção, elas estão sujeitas ao clima de negociação estratégica, na procura de um consenso não necessariamente ditado pela cooperação. Bryson (1995, p.138) aponta um método para a formulação de estratégias “The Five Step Process” 8 que consiste na resposta a cinco perguntas dirigidas às Questões Estratégicas (Rosa, 2003). “The Five Step Process” 1. Quais são as alternativas, as mais genéricas possíveis, com as quais poderíamos encaminhar uma Questão Estratégica? 2. Quais são as barreiras existentes para a realização destas alternativas? 3. Que propostas específicas podemos apontar para encaminhar as alternativas ou superar suas barreiras? 4. Que ações podem ser tomadas no curto prazo para implementar estas propostas? 5. Quais os passos específicos que podem ser tomados para a implementação das propostas e quem são os seus responsáveis? Ao formular as estratégias, a organização deve voltar-se para a sociedade (o ambiente externo) e construir canais de atendimento e satisfação das necessidades e interesses dos grupos de influência que atuam sobre as políticas públicas a cargo da organização, assim como, procurar cumprir uma missão e um mandato, sem o qual resulta apenas a burocracia por si só. 8 Spencer, L.(1989), Winning Through Participation, Dubuque, Kendall/Hunt, Iowa. Planeamento Regional e Urbano -13- Sara Moreno Pires 7. Rever e adotar o Plano Estratégico Uma vez concluída a formulação das estratégias, tem-se pronto o Plano Estratégico da organização. Começa, então, a etapa de ‘negociação estratégica’, que significa a procura de entendimento com os diversos grupos de influência de cada uma das estratégias sobre a sua implementação. Isto vale tanto para o ambiente interno, quanto para o ambiente externo. O plano estratégico é o instrumento de negociação. As estratégias efetivamente implementadas serão resultado desta negociação entre o pretendido e o possível. 8. A visão de sucesso Enquanto a missão caracteriza os objetivos principais da organização, a visão de sucesso é uma visão de futuro, que mostra uma imagem da organização (ou da comunidade) quando da realização destes objetivos. É construída a partir da identificação de elementos descritores do ambiente organizacional ou comunitário sobre o qual é projetada (indicadores das metas e objetivos específicos). A Visão de Sucesso cria um ‘estado de tensão’ positivo entre o mundo como ele é e o que gostaríamos que fosse. Este estado de tensão, segundo Bryson (1995, p.158), pode servir também como uma fonte inspiradora que estimule e motive as pessoas a ver realizada com sucesso a missão da organização. 9 – A implementação do plano Um Plano Estratégico é um plano para a ação. Mas não basta a formulação das estratégias desta ação. É necessário implementá-las através de programas e projetos específicos. Bryson (1995, p.175 - 180) apresenta alguns pontos gerais que devem nortear esta implementação, dos quais se destacam os seguintes: - será sempre resultado de uma negociação entre os grupos de influências, a começar pela definição dos orçamentos de cada um dos programas; - deve conformar e aglutinar pessoas e recursos na elaboração de programas e projetos para cada estratégia; - deve aproveitar e articular as novas iniciativas surgidas no processo de implementação, evitando o surgimento de competições desnecessárias e; - deve dar atenção aos conflitos de interesses dentro da organização, de modo que estes se ajustem aos interesses da implementação. Planeamento Regional e Urbano -14- Sara Moreno Pires 10. Reavaliar as estratégias e o processo de planeamento O objetivo desta última etapa é rever o que foi implementado para decidir os novos rumos do processo, mantendo as estratégias implantadas com sucesso e revendo as más. Este é o começo de um novo ciclo, abordando as questões residuais não resolvidas no primeiro ciclo, bem como as novas questões surgidas durante a implementação. Brysonapresenta um roteiro de orientação para as três situações de reavaliação das estratégias: a de manutenção, a de mudança e a de conclusão. Em todas elas, a reavaliação de estratégias aparece como resultado de um processo de mediação dos diversos ‘grupos de influências’ associados a cada estratégia. Na reavaliação de manutenção, a participação dos interessados leva a um fortalecimento da missão ou da visão de sucesso que alimenta a estratégia a ser mantida. Na reavaliação de mudança, trata-se de atender a aspirações desses grupos que não foram contempladas ou a revisão da missão, por inclusão de novas expressões, exigindo, então, novas reorientações nas estratégias implementadas. Na reavaliação de conclusão, Bryson sugere-a como um caso extremo da anterior, onde já não se trata mais de corrigir a direção dos esforços, mas sim de a eliminar, visto aquela direção não se continuar a justificar face à nova missão ou ao insucesso da implementação. Planeamento Regional e Urbano -15- Sara Moreno Pires 3.3 – Os resultados da “Reflexão Estratégica”9 Segundo Mintzberg, no seu livro ‘The Rise and Fall of Strategic Planning’ (1994), os resultados de um processo de planeamento estratégico ocorrem em três níveis diferentes: a um nível individual (Pensar Estratégico); a um nível coletivo (Plano Estratégico); e, finalmente, a um nível institucional (Agir Estratégico). O PENSAR ESTRATÉGICO O primeiro grande resultado de um processo de PE é o ‘pensar estratégico’. Ele acontece ao nível individual, de cada participante, e significa, fundamentalmente, a capacidade cognitiva adquirida de superar a dicotomia entre a análise e a síntese. O ‘pensar estratégico’, adquirido durante o processo (coletivo e cooperativo) de elaboração do Plano, habilita a pessoa a ‘ver’ oportunidades que antes não ‘via’ e a perseguir uma realização (a missão e a visão) que antes não poderia imaginar. O PLANO ESTRATÉGICO O Plano Estratégico é o segundo grande resultado de um processo de planeamento estratégico. Ele resume, na forma de um pequeno, objetivo e denso documento, todos os resultados obtidos nas diversas etapas do processo. Ele é a ponte entre a etapa concluída, de alta densidade de cognição, e o processo de implementação, de alta densidade operacional. Numa interpretação analítica de um Plano, Mintzberg (1994: 351-357) aponta apenas dois papéis principais: o de servir de instrumento de comunicação (interna e externa) e o de servir como mecanismo de controlo. Em ambos se procura a coordenação das ações. Para alguns, o papel principal de um Plano Estratégico é o de ser uma agenda de compromissos para a organização política a que ele se destina, aglutinadora das pessoas e grupos de influência que participaram ou que possam ser envolvidos por estratégias formuladas. O AGIR ESTRATÉGICO MINTZBERG diz que o ‘agir estratégico’ é aquela atividade que consegue usar, da melhor forma possível, os dois resultados anteriores do processo de planeamento estratégico: o pensar e o Plano. O plano por si só, nada faz. É a combinação do ‘plano’ com o ‘pensar’ que resulta no ‘agir’. 9 Rosa (2003), Silva (2001) e Mintzberg (1994). Planeamento Regional e Urbano -16- Sara Moreno Pires O agir estratégico é, essencialmente, uma atividade pedagógica, mediadora entre todas as necessidades e oportunidades que encontramos quando agimos de forma orientada, guiados por uma Missão e/ou Visão de Sucesso. MINTZBERG (1994) caracteriza este agir através de três papéis que ele identifica no ‘planeador’: o de ‘achador’ de estratégias; o de analista; e, o de catalisador. No primeiro, o agir é sinónimo de atenção, procurando, tanto no passado como no presente da organização, explicações para as estratégias formuladas e implementadas, identificando aquelas que emergiram no processo. A justificativa é a de que ‘planos existem muito mais em função de um contexto do que de antecipações’. No papel de analista, o agir é sinónimo de controlo, procurando o tratamento e ordenamento das informações relevantes ao processo, a sua análise e suas implicações para poder detalhar as estratégias dentro da cultura da organização. No papel de catalisador, o agir é sinónimo de liderança, onde devem ser revelados os esforços de fazer os outros pensarem estrategicamente; de animar e valorizar a participação de cada um e de ser capaz de catalisar as vontades e oportunidades na definição da melhor estratégia. O sucesso deste agir está na capacidade de superar a dicotomia entre as atividades de análise e as de síntese, com uma grande carga de imaginação, criatividade e liderança. Planeamento Regional e Urbano -17- Sara Moreno Pires 4. O Planeamento Estratégico como instrumento de gestão pública local 4.1 – Elementos fundamentais da “Reflexão Estratégica” Pretende-se neste ponto salientar determinadas características inovadoras do planeamento estratégico, deixando de fora a preocupação pelo processo ou pelos procedimentos – característica dos modelos de planeamento estratégico estudados no ponto anterior. Independentemente da forma como esse processo se poderá revelar na prática, há determinadas características que o devem envolver para que se possa considerar um processo estratégico. Essas características são: Matriz política na origem do processo De um modo geral, os processos de planeamento estratégico são de iniciativa do poder político, sob protagonismo direto dos seus responsáveis máximos. A legitimidade política coloca-os numa posição privilegiada para desempenharem uma função de liderança, essencial para o sucesso do planeamento estratégico. Mas esta motivação deve resultar da necessidade de “alargar o mandato político” (normalmente de quatro anos) a um “mandato económico”, tornando-o consentâneo com um período mínimo necessário às adaptações do tecido urbano aos programas estratégicos. (Neves, 1996) Pressupostos de participação coletiva A origem política do processo de planeamento contribui para enfatizar a componente dos serviços públicos municipais na composição das equipas que desencadeiam e sustentam os procedimentos de elaboração dos planos estratégicos. No entanto, a natureza do planeamento estratégico sugere haver vantagens com o envolvimento de outros atores e agentes em todo o seu processo: desde logo, responsáveis dos departamentos setoriais da administração central, regional e outros operadores públicos com competências e atribuições que tutelam as diversas áreas de intervenção estratégica; entidades de intermediação de interesses do setor privado, que possibilitem o conhecimento de intenções de investimento e possibilidades de contratualização entre setor público e privado; universidades, com fortes contributos no domínio técnico-científico e com grandes capacidades em termos de recursos humanos, físicos, de investigação e de prestação de serviços à comunidade; Planeamento Regional e Urbano -18- Sara Moreno Pires da sociedade civil em geral, com especial atenção para organizações de índole social e cultural e associações de desenvolvimento com intervenção em áreas setoriais e horizontais (Neves, 1996). Atração de novos atores A necessidade de qualificar tecnicamente a elaboração dos planos estratégicos e simultaneamente a necessidade de os legitimar socialmente dá especial relevo à inclusão de outro tipo de atores, nomeadamente a imprensa e profissionais da comunicação (que dão maior visãopública ao processo) ou líderes de opinião (que mobilizam atores-chave e promovem o debate público mais abrangente) (Neves, 1996). Caráter Integrado Outro dos aspetos que distingue o planeamento estratégico é o facto de fazer prevalecer uma perspetiva global, em qualquer das fases do processo. Evidentemente que o contributo setorial e especializado não deixa de ser importante, mas deve emanar de necessidades de análise ou intervenção generalista. Na relação entre o trabalho integrado e a abordagem setorial poderá residir uma das chaves de sucesso do processo (DGOTDU, 1996). Mecanismos de cooperação Neste campo reside a importância das várias formas de cooperação entre entidades do setor público, setor privado e sociedade civil. Torna-se necessário gerar estruturas de concertação entre os diversos atores, que acompanhem todo o processo (não apenas de curto e médio prazo), isto é, estruturas de partenariado com a sociedade civil, quer no campo da expertise universitária ou de gabinetes de consultoria privados, quer no campo da participação de câmaras e comércio e indústria, sindicatos, artistas, intelectuais, etc. Os mecanismos de cooperação devem estar presentes tanto na fase de elaboração de planos estratégicos (grupos de trabalho, emissão de pareceres, colóquios, redes de cooperação e intercâmbio, etc.), como na fase da sua implementação (consórcios, concessões de exploração, sociedades de economia mista, etc.). (Neves, 1996) Avaliação de Resultados O normal desenvolvimento do ciclo contínuo que caracteriza o planeamento estratégico implica, para além da indispensável motivação dos agentes envolvidos, o estabelecimento de um sistema de acompanhamento e avaliação que produza informação regular e estabeleça grelhas de critérios, Planeamento Regional e Urbano -19- Sara Moreno Pires ou um conjunto de indicadores, que permitam uma produção de elementos de apoio à revisão dos programas e ações estratégias em campo (Neves, 1996). 4.2. O espaço de intervenção dos governos locais para o desenvolvimento urbano A atuação para um desenvolvimento urbano sustentável implica uma abordagem integrada de objetivos económicos, sociais e ambientais, de forma transdisciplinar, com uma perspetiva de longo prazo em termos de políticas públicas. O papel dos governos locais é preponderante neste domínio, enquanto agente de desenvolvimento local, com atribuições e competências regulamentadas10. Este facto faz com que a dimensão política e institucional seja determinante na condução destas estratégias. Devem ser igualmente responsáveis, todos os cidadãos e todos os atores do desenvolvimento que desempenhem papéis importantes no jogo de mudança em direção a um futuro sustentável (Rosa, 2003). Encarar o desenvolvimento sustentável nesta perspetiva conciliadora de objetivos, por vezes conflituosos entre si, torna-se uma tarefa difícil. A tradicional dominância da perspetiva económica, situação que leva à subvalorização das outras componentes, é disso um exemplo. O que significa que à complexidade da abordagem integradora é acrescentada outra problemática, associada à cultura organizacional. As respostas a estes desafios devem, pois, passar por uma mudança na estrutura e na cultura da organização municipal. Nos últimos anos, têm emergido conceções inovadoras de estruturação social e organizacional traduzidas no Novo Institucionalismo.38 Dennis Church (1991) referia que "o papel e conceito dos governos locais está agora na beira da revolução (...). Penso esta mudança como um passar de "sente-se, esteja quieto, vamos cuidar de si" para uma escola de governos locais que defenda "levante-se, envolva-se, trabalhe connosco" (citado em Rosa, 2003). A mudança na estrutura e cultura organizacional e societária passará pela sua flexibilização, por uma abertura institucional a toda a comunidade e passará por uma mudança de valores, expectativas e práticas, tornando possível a integração e a coordenação de diferentes políticas. É neste campo, que o desenvolvimento de um pensar e agir estratégico se tornam ‘armas’ para alcançar um desenvolvimento mais sustentável. 10 Regime legal de transferências de atribuições e competências (Lei nº 159/99 de 14 de Setembro) e o quadro de competências e regime jurídico de funcionamento dos órgãos dos municípios e freguesias ( Lei nº 169/99 de 18 de Setembro). 38 O Novo Institucionalismo emergiu das fundações filosóficas da "acção comunicativa" e do "estruturalismo" (Habermas, 1984; Giddens, 1984). Muitos autores (e.g., Innes, Healey, Forester) têm explorado as novas formas de estruturação social e restruturação de oportunidades das pessoas e das organizações, enquanto vivem as suas vidas nas suas comunidades (Healey et al., 1996 em Vasconcelos, 2001: 4) (Rosa, 2003). Planeamento Regional e Urbano -20- Sara Moreno Pires 4.3. Organização e estrutura do processo de planeamento estratégico A diversidade da organização do poder local nas cidades médias não aconselha modelos únicos na estrutura que sustenta o planeamento estratégico, antes sim, modelos flexíveis, ajustáveis a cada realidade local (Rosa, 2003). Algumas questões importantes foram levantadas no Guia para elaboração de planos estratégicos de cidades médias, editado pela DGOTDU (Direção Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano)11 para permitir formular alguns caminhos possíveis, em direção a uma estrutura de planeamento inovadora, adequada a diferentes contextos. Essas questões foram, nomeadamente: As respostas a estas questões permitem tipificar algumas opções organizativas para a realização de Planos Estratégicos12: - Quanto à independência das ESTRUTURAS ORGANIZADAS do poder: A solução interna ou municipal Plano da Câmara para a Cidade (Situação na qual o processo é conduzido pela Câmara Municipal, no seu todo ou em parte. Poderá justificar-se, caso seja absolutamente impossível levar a cabo uma solução alternativa mais alargada e participada. Os riscos de insucesso serão neste caso mais elevados.) 11 O Guia original foi editado pela Comissão das Comunidades Europeias, Direcção Regional das Políticas Regionais, Programa RECITE, 1996. 12 Vamos seguir de perto aqui a abordagem descrita no Guia para elaboração de planos estratégicos de cidades médias, editado pela DGOTDU, 1996. A iniciativa do plano estratégico deve pertencer ao município OU à cidade? As Câmaras Municipais possuem capacidade e representatividade que lhes permita assumir um Plano de e para a cidade? O desenvolvimento da sociedade civil local será suficiente para tomar a seu cargo a responsabilidade de pensar e interferir eficazmente no futuro da sua cidade? Planeamento Regional e Urbano -21- Sara Moreno Pires A solução externa ou da cidade Plano da cidade para a cidade (Situação que é concetualmente mais adaptada ao processo de planeamento estratégico uma vez que, teoricamente, proporcionará um ambiente mais propício à participação, ao partenariado e à inovação). - Quanto à AUTONOMIA ORGANIZATIVA: Recorrendo às estruturas estabelecidas (técnicas e políticas) Criando estruturas específicas Conjugando estas diferentes opções podemos obter quatro situações-tipo, seguidamente apresentadas na Figura 2. Esta tipificação permite proceder ao seu enquadramento, pois elas não esgotam a diversidade de soluções possíveis, colocando-se as restantesem níveis intermédios. Figura 2 – Organização e estrutura do processo de planeamento estratégico Fonte: Rosa, 2003 – Adaptado de DGOTDU, 1996. Autonomia organizativa Independência das estruturas face ao poder institucionalizado SOLUÇÃO MUNICIPAL AUTÓNOMA A2 Constituição, no interior do ‘edifício’, de uma nova estrutura de pessoal, com o único objetivo de concepção e gestão do plano estratégico SOLUÇÃO EXTERNA (da cidade) com participação da Câmara Municipal B2 Solução externa com participação do município SOLUÇÃO MUNICIPAL INTERIORIZADA A1 Plano concebido no quadro das competências e atribuições normais da Câmara Municipal SOLUÇÃO EXTERNA (da cidade) com presença importante da Câmara Municipal – B1 Solução externa com a presença importante da Câmara Municipal Planeamento Regional e Urbano -22- Sara Moreno Pires A1 - SOLUÇÃO MUNICIPAL INTERIORIZADA Situação na qual todo o processo é conduzido pela Câmara Municipal e na qual o plano é concebido no quadro das suas competências e atribuições normais, com recurso aos Serviços Técnicos da Câmara e aos circuitos institucionais normais de decisão política. VANTAGENS: • Implicação direta e co-responsabilização dos diferentes serviços municipais em todas as fases do plano; • Boas expectativas de articulação entre os outros planos municipais e o plano estratégico; • Possibilidades de boa articulação ente as decisões políticas e as técnicas; • Inscrição imediata no plano de atividades municipal. DESVANTAGENS: • Riscos de maior burocratização de todo o processo; • Riscos de dificuldades de articulação funcional e de linguagem; conflitos internos entre os diferentes setores e serviços da C.M.; • Dificuldades acrescidas de fazer chegar o plano à cidade. A2 - SOLUÇÃO MUNICIPAL AUTÓNOMA Situação na qual todo o processo é conduzido igualmente pela Câmara Municipal, mas onde se constitui, no interior do Município, uma nova estrutura com o único objetivo de conceção e gestão do plano estratégico. VANTAGENS: • Possibilidade de criação de um grupo coeso na multidisciplinaridade e com maior capacidade prospetiva; • Desburocratização, maior eficácia e maior celeridade no processo de planeamento; • Maior envolvimento e responsabilização dos eleitos municipais; • Criação de um observatório da cidade. DESVANTAGENS: • Riscos de “elitização” do processo; • Riscos de distanciação entre o grupo de planeamento estratégico e os serviços municipais com eventuais rupturas; • Maior dificuldade de acesso ao circuito administrativo de decisão e execução. B1 – SOLUÇÃO EXTERNA COM PRESENÇA IMPORTANTE DA C.M. Num contexto de fraco dinamismo da sociedade civil a solução poderá passar pela constituição de uma nova estrutura para conceber e gerir o plano estratégico, envolvendo não somente a Câmara, mas também os diversos atores e entidades intervenientes no desenvolvimento da cidade. É à Planeamento Regional e Urbano -23- Sara Moreno Pires Câmara Municipal que cabe a iniciativa e é ela que vai exercer um papel chave no desenvolvimento do processo. Neste caso justifica-se que evidenciemos a importância da dimensão institucional. Esta opção poderá ser concretizada através da constituição de um Gabinete de Cidade, exclusivamente composto por representantes institucionais (universidades, organizações económicas, organizações sociais e culturais, departamentos da administração regional e central, etc.), e ainda de um Conselho Consultivo, composto por indivíduos representativos, dinamizadores e formadores de opinião pública e, que possam representar o leque de opiniões existente na cidade no que diz respeito aos diversos domínios e áreas do plano consideradas estratégicas. VANTAGENS: • Base alargada de participação; • Estreita ligação e articulação com a C.M.; • Maiores possibilidades de suporte nos meios locais disponíveis ou disponibilizáveis no município; • Maiores probabilidades do plano se constituir como fator de dinamização da sociedade civil local. DESVANTAGENS: • Dependência da C.M. no processo de planeamento estratégico; • Riscos de dificuldades na articulação institucional com ausência de consensos; B2 - SOLUÇÃO EXTERNA COM PARTICIPAÇÃO DA CÂMARA MUNICIPAL Participação da C.M. numa organização com autonomia totalmente exterior à C.M., criada especialmente para desenvolver e implementar o plano estratégico. Face aos conceitos implícitos na conceção de planeamento estratégico, este será o cenário mais desejável, mas apenas possível em casos de forte mobilização e dinâmica dos diversos intervenientes institucionais e individuais na cidade. VANTAGENS: • Maior capacidade de mobilização de ideias e vontades; • Maiores probabilidades de obtenção de elevados graus de participação e partenariado; • Maior possibilidade de aproveitamento de sinergias. DESVANTAGENS: • Maiores dificuldades na operacionalização de todo o processo; • Riscos de quebra de ligação com os instrumentos, meios e recursos pré- existentes; 4.4. Estruturas aplicáveis ao processo Planeamento Regional e Urbano -24- Sara Moreno Pires Algumas das propostas de inovação institucional vão no sentido da criação de um novo conjunto de serviços municipais, como por exemplo, um Departamento Municipal de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável, um Núcleo de Investigação ou Equipas Técnicas de Apoio, uma Infra-estrutura de Informação Integrada Municipal ou um ‘Gabinete da Cidade’. Estas propostas apoiam-se na promoção de interatividade entre todos os serviços municipais e entre todas as fases do processo de construção de políticas, nomeadamente a identificação dos problemas, definição de políticas, sua implementação, monitorização e avaliação, e sequente reformulação. Departamento Municipal de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável Este órgão poderá promover a integração e coordenação, na tomada de decisões, das diferentes políticas relacionadas com o desenvolvimento sustentável, entre os diversos serviços (departamentos, divisões, órgãos de staff). Poderá, igualmente, coordenar a sua intervenção com os organismos da administração central, resolver as tensões e conflitos que decorrem do próprio processo integrado de tomada de decisões e informar (para a tomada de decisões e das decisões tomadas) (Rosa, 2003). A integração e coordenação de políticas é uma tarefa complexa, não só devido à tensão que se cria entre os diversos objetivos de cada uma, mas também porque se procura apostar em novos caminhos que influenciem os comportamentos económicos e sociais, apostar em novos caminhos que alterem os padrões habituais de consumo, produção e organização. Integração, gestão de conflitos, quantidade e qualidade de informação são questões problemáticas sem resposta padronizada, relacionadas com a tomada de decisões políticas para um desenvolvimento sustentável, de natureza dinâmica e evolutiva (idem). Torna-se necessário a criação de um outro serviço, o Núcleo de Investigação, que apoie este Departamento Municipal. Núcleo de Investigação ou Equipas Técnicas de Apoio Os governos municipais necessitam sempre de mais informação relativamente à mudança de comportamentos, às necessidades e às expectativas dos seus cidadãos, à forma como decorrem práticas que protegem o uso dos recursos materiais e energéticos, etc. (Rosa, 2003). Este núcleo torna-se assim fundamental na busca por mais e melhor informação, no sentido de dar a conhecer a qualquermomento os impactes das políticas e dos planos em implementação (idem.) Planeamento Regional e Urbano -25- Sara Moreno Pires É uma estrutura com competências no trabalho de investigação e de estudos e ações específicas que possuam um carácter técnico e político – estudos setoriais, realização do marketing do plano, etc. (DGOTDU, 1996). E, enquanto estrutura permanente, torna-se num elo essencial na fase da avaliação e monitorização do plano estratégico. Infra-estrutura de Informação Integrada Municipal Esta estrutura não é mais do que um esforço de sistematização de toda a informação que é produzida. No fundo trata-se de melhorar a qualidade do acesso à informação, para poder responder com oportunidade, precisão, fiabilidade e de forma estruturada às políticas municipais e aos cidadãos (por ex., criando-se locais de acesso e de apoio à utilização da internet, difundindo informação, promovendo a educação, etc.). Pode, e deve, incluir a opinião pública como forma de promover soluções interativas e o sentimento de cidadania (Rosa, 2003). Poderá adotar novos métodos de trabalho de forma a apoiar a gestão interna dos serviços e fomentar relações de parceria, colaboração e cooperação entre os diversos níveis de administração. É igualmente fundamental para apoiar a cultura e o marketing territorial promovendo a oferta de bens e serviços culturais na rede de domínio público, criando-se um novo serviço cultural de proximidade (idem). ‘Gabinete da Cidade’ Espaço com funções importantes (ver Caixa 2) que servirá de apoio ao processo de planeamento estratégico. Na sua composição deve incluir representantes do município e dos principais agentes intervenientes no processo (DGOTDU, 1996). Planeamento Regional e Urbano -26- Sara Moreno Pires CC AIXA AIXA 2:2: ‘G‘G ABINETE DE ABINETE DE CC IDADEIDADE ’’ –– FF UNÇÕES UNÇÕES PP RINCIPAISRINCIPAIS Funções Descrição Informação e vigia Recolha, sistematização e difusão de informação sobre a cidade e suas dinâmicas, nomeadamente através da edição de um boletim; por outro lado, a função de vigia tem sobretudo a ver com a recolha do conjunto de informação que, sendo exterior à cidade, determina o desenvolvimento da própria cidade (por exemplo investimentos infraestruturais e empresariais, evolução de outras cidade do sistema regional, oportunidades de cooperação, etc.), e que o Gabinete terá de considerar na orientação das suas atividades. Concertação e negociação interna O Gabinete constitui, por excelência, o espaço de concertação, de negociação entre as principais forças vivas da cidade, o lugar onde se forjam os entendimentos necessários ao seu desenvolvimento; esta função é ela mesmo a razão fundamentadora da própria existência do Gabinete. Implementação coordenada A implementação do plano estratégico deve obedecer a critérios de coordenação que favoreçam a coerência das ações lançadas e a sua melhor rentabilização; competirá ao Gabinete assegurar, em permanência, a coordenação das atividades do Plano e as intervenções dos diferentes atores. Pensamento estratégico O ciclo do planeamento não se fecha com a formalização do plano, ele continuará numa dinâmica interativa entre a ação e as necessidades de reformulação do plano; o Gabinete de Cidade deverá assim ser um espaço importante de pensamento estratégico para permitir a alimentação do processo de planeamento encetado com a elaboração do plano. Observação O cumprimento da função anterior e o próprio sucesso do plano dependem, em grande medida, da eficácia do sistema de acompanhamento que venha a ser criado e que é fundamental para alimentar a função de observação; nestes termos, o Gabinete de Cidade deverá munir-se de um dispositivo de acompanhamento que lhe permita conhecer, com oportunidade e rigor, a forma como o plano estratégico está a ser implementado e, consequentemente, a forma de garantir a sua regulação. Representação e negociação com o exterior O Gabinete de Cidade terá também uma função de representação da cidade de um ponto de vista global, ou seja, integrando as diferentes facetas da sua vida económica, sócio-cultural e institucional; nesta medida ele assume uma legitimidade de representação e de defesa dos interesses da cidade, nomeadamente em matéria de negociação com agentes exteriores, particularmente com a Administração Central. Fonte: Rosa, 2003 – Extraído do Plano Estratégico de Viana do Castelo Planeamento Regional e Urbano -27- Sara Moreno Pires 4.5. Alguns instrumentos de apoio ao plano estratégico O processo dinâmico e evolutivo, no espaço e no tempo, do planeamento estratégico urbano, torna indispensável a articulação entre todos os tipos de planos, ao nível do planeamento local e regional (como os Planos de Atividade, Planos Financeiros, Planos Diretores Municipais, Planos Regionais de Ordenamento do Território, Planos Urbanísticos, Planos Estratégicos de Cidade, Concelhios e Regionais, Planos Municipais do Ambiente, etc.) e entre todos os instrumentos. Porém, no quadro da atuação municipal, a gestão casuística torna-se demasiado frequente: são, por vezes, delineadas metas sem se ter planeado de forma integrada e sem se ter atendido à disponibilidade de meios (recursos humanos, técnicos e financeiros). Condicionadas pelas receitas que se prevê obter durante o ano financeiro, as atividades municipais previstas em plano de atividades, têm tendência para resultar de um planeamento a curto prazo, situação muitas vezes reforçada pela aplicação da legislação em vigor e pela pressão dos munícipes: “Nesta situação de «aperto», em que os autarcas atuam tal qual bombeiros voluntários se tratassem, o amadorismo da gestão municipal conduz: - à absorção dos autarcas pelas tarefas de rotina em detrimento do seu papel de estrategas e diplomatas; - à subutilização dos recursos humanos disponíveis e à subvalorização da importância da informação enquanto suporte da decisão, que em vez de tecnicamente fundamentada é tomada por intuição. Afinal, «não há tempo para pensar, todo o tempo é pouco para executar” (Raul Lopes, citado em Rosa, 2003: 46). No sentido de abandonar esta forma de gestão contraditória com o espírito estratégico podem ser utilizados vários instrumentos. Alguns deles - na área do diagnóstico, financeira, de gestão e de monitorização – são exemplificados seguidamente: A) Instrumentos de diagnóstico “Enquanto suporte de concretização do diagnóstico e apoio à formulação do plano, podemos destacar o método dos cenários, que, desenhando as hipóteses fundamentais sobre a evolução das componentes (variáveis) do sistema e da estratégia dos atores envolvidos no processo de transformação da cidade e da sua integração numa lógica de rede, pressupõe a identificação da sua estrutura interna, assim como a identificação das dimensões de incerteza que o afetam (DGOTDU, 1996: 77) Planeamento Regional e Urbano -28- Sara Moreno Pires B) Instrumentos financeiros Atualmente a gestão municipal têm ao seu dispor um conjunto de instrumentos, adequados à contabilidade orçamental ainda em vigor: o Plano de Atividades, definindo os objetivos prioritários e as ações municipais a prosseguir; o Orçamento, prevendo os recursos financeiros globais para financiamento das despesas de funcionamento e investimento; o Orçamento de Tesouraria, avaliando da liquidez do município; a Conta de Gerência, como documento de prestação de contas; e, o Relatório da Atividades,para avaliação do desempenho da atividade municipal (Rosa, 2003). Com a aplicação do novo modelo contabilístico POCAL para as autarquias desde 2001, o município poderá proceder à aplicação de modelos de gestão financeira através de técnicas de gestão (contabilidade de gestão e analítica), instrumentos de análise financeira e controlo (controlo de gestão, plano de tesouraria, sistemas de planificação e orçamentação, inventário e balanço) e instrumentos de avaliação da ação autárquica. Estes deveriam, em grande medida, passar pela análise da qualidade e pertinência da política local fiscal, ambiental, social e económica (idem). Por outro lado, há cada vez mais a necessidade de os governos locais gerarem as suas próprias receitas, implementando ações de investimento que estimulem a expansão da atividade económica, social e a qualidade de vida ambiental, sem estar dependentes das políticas e prioridades estabelecidas pela administração central. As autarquias devem assim recorrer à sua capacidade de gerar receitas próprias através de um conjunto diversificado de taxas, tarifas (distribuição de água, drenagem águas residuais, recolha, depósito e tratamento de resíduos sólidos, transportes coletivos de pessoas e mercadorias e distribuição de energia elétrica de baixa tenção) preços ou impostos locais (contribuição autárquica, imposto municipal sobre os veículos, derrama, etc.) (Rosa, 2003). C) Instrumentos de Gestão - Contratualização e negociação Instrumentos que a administração deve utilizar na gestão de conflitos e obtenção de consensos em todas as áreas de intervenção municipal, a curto e a longo prazo, entre interesses privados e públicos, atendendo aos direitos da administração e dos cidadãos (Rosa, 2003). - Informação e participação Um intercâmbio permanente de diálogo, informação, conhecimento, formação, experiências entre autarquias, agentes locais, instituições científicas, financeiras e tecnológicas, Planeamento Regional e Urbano -29- Sara Moreno Pires universidades e o cidadão em geral é também um instrumento indispensável de gestão num processo de desenvolvimento sustentável. Há, por isso, que criar todo um conjunto de serviços de apoio, promoção, assistência e incremento para informação dos agentes locais (Rosa, 2003). As redes de cooperação e intercâmbio desempenham também, aqui, um papel preponderante, baseado na ideia de que a conectividade é mais importante do que a proximidade (DGOTDU, 1996; CES, 1997). - Marketing Territorial Procura, através de ações individuais e coletivas, atrair novas atividades, favorecer o desenvolvimento empresarial local e transmitir, na sua globalidade, uma imagem favorável da cidade. As dimensões do marketing territorial situam-se ao nível do mercado de implantação de empresas, da decisão de localização das firmas, da oferta proporcionada pelas cidades, das vantagens das redes de cidades no contexto da internacionalização dos mercados, e das relações cidades-empresas à escala local (Texier e Valla citados em DGOTDU, 1996). D) Instrumentos de Monitorização - Avaliação de impactes Componente que deve ser essencial às tomadas de decisão no tocante à avaliação social custos- benefícios, avaliação dos impactes na qualidade do ambiente ou na utilização dos recursos naturais, resultado da ação do Homem e ou da intervenção da administração local (Rosa, 2003). O programa de avaliação deve definir tanto os parâmetros de eficiência (temporal, física e financeira) e de eficácia (impactos intermédios e finais), como as questões pragmáticas e as relativas à informação necessária (DGOTDU, 1996). - Auditorias As auditorias ajudam ao desempenho de uma melhor integração das políticas que visem consolidar a sustentabilidade social, a eficiência do tecido económico local, a competitividade, a qualidade e protecção ambiental (Rosa, 2003). - Observatórios Os observatórios (assegurando a utilização de métodos específicos de sondagem de opinião) têm por objetivo sondar a dinâmica da cidade (face aos objetivos e ações do plano estratégico), quer interna, quer externamente, ao longo de todo o processo de implementação do plano. Planeamento Regional e Urbano -30- Sara Moreno Pires 4.6. Considerações finais “A execução de um plano, por anormal que pareça, não é um ato adquirido na tradição da políticas públicas. Muitos planos estratégicos foram confundidos com estudos de prospetiva e marketing, ligados às modas vigentes nos modelos de gestão. Só o envolvimento de todos os atores oferece garantias de cumprimento de um plano que se define obrigatoriamente como proactivo” (Manuel de Forn, citado em Neves, 1996: 90). Contudo, não devemos mistificar o planeamento estratégico. Em termos técnicos, ele é um instrumento simples. Em contrapartida pode recorrer-se a modelos matemáticos, a complexos cálculos económicos, muito mais elaborados do que o planeamento estratégico. Mas o que suporta todo o processo de ‘reflexão’ sobre a cidade, e uma forte mobilização em torno da implementação, é a escolha da metodologia. A metodologia participativa e interativa entre os agentes permite dar corpo a novas atitudes e a um novo relacionamento público/privado. A mudança política e cultural municipal torna-se num eixo fundamental do agir estratégico, da mudança da cultura da quantidade para a cultura da qualidade (Ferreira, 1996). A construção do projeto resulta de uma emergente vontade coletiva de mudança, mas esta acaba por esbarrar muitas vezes com a falta de integração das componentes institucional, económica, social, ambiental. Os modelos de gestão geralmente adotados acabam por não ser verdadeiros sistemas integrados de gestão. Fazendo uma breve nota à experiência Portuguesa no campo do planeamento estratégico podemos apontar como fatores negativos: situações de falta de integração horizontal e vertical na atuação dos vários departamentos da administração pública central e local, o incumprimento da legislação, uma visão setorizada das realidades e necessidades, a confusão crescimento/desenvolvimento económico, o individualismo e o desrespeito pelos bens e serviços públicos, a não disponibilidade e não acesso à informação, a desresponsabilização, etc. (Rosa, 2003). No entanto, alguns fatores positivos são igualmente de referir: indícios de uma maior participação dos cidadãos e de todos os agentes da comunidade, a tendência para a descentralização, o fomento de parcerias e co-decisão e a crescente preocupação da trilogia eficiência económica, equidade social e territorial e escala ambiental (Rosa, 2003). Planeamento Regional e Urbano -31- Sara Moreno Pires Bibliografia Citada: - Bryson, John M. (1988), Strategic Planning for public and nonprofit organizations, Jossey-Bass: San Francisco; - Bryson, John M. (1995), Strategic Planning for public and nonprofit organizations. Jossey-Bass: San Francisco, Edição Actualizada; - CES, (1997), Colóquio “A Política das Cidades”, CES (Conselho Económico e Social), Lisboa; - DGOTDU (1996), Guia para a elaboração de planos estratégicos de cidades médias, coordenação de Jorge Silva, Oficina de Arquitectura: Lisboa; - Ferreira, A. F. (1996), “Planos Estratégicos das Cidades”, em CCRC, As Cidades Médias e o Ordenamento do Território, CCRC: Coimbra. - Guerra, Isabel (2000), “O planeamento estratégico das cidades”, em revista Cidades, Comunidades e Territórios, ISCTE, Dez 2000; - Neves, António Oliveira das (1996), Planeamento Estratégico e o ciclo de vida das grandes cidades – os exemplos de Lisboa e Barcelona,Celta Editora: Oeiras; - Quinta, Fernanda (2002), A Cultura da Avaliação no Planeamento Estratégico, APPLA, (Internet); - Rosa, Teresa (2003), Apontamentos de Planeamento e Gestão Estratégica, ESTGS: Santarém; - Silva, Daniel J. (2001), Uma abordagem cognitiva ao planeamento estratégico de desenvolvimento sustentável, Tese de Doutoramento (Internet);
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