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1 Nota: Este material foi desenvolvido pelo prof. Roland Veras Saldanha Jr, e representa uma primeira versão de material a ser transformado em livro didático. Reservam-se os direitos autorais sobre o mesmo, mas comentários e sugestões são bem vindas no e-mail rsaldanha@actiomercatoria.com.br. Cap 2 A Firma: Natureza, Objetivos e Custos Introdução Os complexos desafios enfrentados pela Organização Industrial não demoraram a expor diversas fragilidades e limites da teoria da firma tradicional (neoclássica), conforme esboçada nos estudos microeconômicos de cunho geral e abstrato desenvolvidos até a década de 1940. Efetivamente, a abordagem neoclássica enfatiza a importância dos preços na alocação dos recursos e dá pouca ou nenhuma atenção aos aspectos administrativos e aos problemas econômicos existentes no interior da firma. É por esta razão que a firma neoclássica é frequentemente associada a uma “caixa preta”, na qual entram recursos e saem bens ou serviços em resposta a sinais de mercado, sem que se realize um tratamento mais rigoroso para a explicação dos processos internos mediante os quais a transformação produtiva ocorre. É certo que uma análise cuidadosa das firmas não pode menosprezar a importância das tecnologias, custos produtivos e reações da produção às mudanças nos preços relativos destes insumos e produtos. Dificilmente quem já tomou contato com a teoria neoclássica da firma conseguiu identificar naqueles modelos aplicabilidade imediata a grandes empresas como a Wal-Mart Stores, a British Petroleum (BP) ou a Toyota Motor. Na verdade, o problema não é de 2 tamanho, pois o quadro minimalista desenhado pela análise neoclássica mostra- se insuficiente mesmo à análise de firmas médias e pequenas, como a empresa de aviação regional ou o consultório de um dentista. De fato, associar qualquer uma destas firmas aos modelos abstratos dos manuais de Microeconomia exige um imenso esforço de idealização, normalmente excessivo quando se pretende aplicações destes conhecimentos a casos concretos e específicos. Como colocado no Capítulo 1, o desenvolvimento da OI é marcado pela tentativa de aproximação à realidade das firmas e indústrias com finalidades práticas bem definidas, numa estratégia que vêm esbarrando em problemas como o da caixa preta neoclássica e, a partir deles, detectando novas e interessantes questões. Frequentemente, estes esforços culminam na identificação de linhas de pesquisa e soluções alternativas, num processo que enriquece o ferramental técnico da Economia. Sem pretender separar o que é indivisível, já que os tradicionais argumentos neoclássicos sobre as firmas e indústrias integram a moderna OI, por motivos didáticos opta-se por iniciar a apresentação pelos conceitos microeconômicos básicos para então, progressivamente, incorporar os aperfeiçoamentos ou inovações teóricas mais recentes. Desta forma, divide-se este capítulo em dois blocos, o primeiro em que se discutem os conceitos de tecnologia e custos da firma, e o segundo no qual os desenvolvimentos mais modernos e associados à percepção destas firmas como organizações em que ocorrem inúmeros problemas de conflitos de interesse, agrupamento e coordenação de recursos são apresentados. Mesmo na parte voltada aos conceitos microeconômicos, adequações e ajustes na apresentação serão realizados. É assim que surgirá a distinção entre custos evitáveis e inevitáveis, incomum em manuais de Microeconomia, bem como a extensão dos indicadores de custos para o caso das firmas multiproduto. A segunda parte iniciará com a apresentação das célebres considerações feitas por Ronald Coase (1937) a respeito da natureza das firmas, aproveitando para detalhar e estender o raciocínio mais geral hoje conhecido como teoria dos custos de transação. Em prosseguimento, serão analisados os problemas associados aos 3 incentivos internos às firmas sob perspectiva informacional e, em conclusão, à teoria dos direitos de propriedade. 2.1 A Firma Neoclássica: Tecnologia e Custos A definição abrangente de firma como uma organização voltada à produção de bens ou serviços para a satisfação das necessidades ou vontades dos demandantes nos mercados. já foi proposta no Capítulo I, estabelecendo um conveniente ponto de partida para a caracterização da firma neoclássica. Buscando com um alto grau de generalidade e fortemente influenciada pela importância dos preços de mercado na solução dos problemas de alocação de recursos, a abordagem neoclássica estuda a firma sob uma perspectiva externa, observado os insumos que nela entram e os produtos que dela saem, como se a firma fosse uma caixa preta. Com estas lentes, as explicações para as atividades da firma precisam se restringir àquilo que se observa fora da mesma, vale dizer, às relações entre inputs e outputs e aos seus preços de mercado. Não causa estranheza, desta forma, o fato de se encontrar nesta teoria da firma argumentos estruturados quase que exclusivamente sobre as tecnologias e custos de produção, havendo autores como Hart (1996:15) que afirmam que a teoria neoclássica percebe a firma “principalmente em termos tecnológicos”. 2.1.1 Tecnologias de Produção Na Figura 2.1 encontra-se uma ilustração genérica de uma firma neoclássica, na qual n inputs, ( )1 2, , , nx x x… , são transformados em m outputs ( )1 2, , , mq q q… . A transformação produtiva decorre do uso de fatores de produção como máquinas de costura, teares e mão de obra sobre matérias primas ou produtos semi- 4 elaborados, como fios de algodão, botões, tecidos e corantes, de forma a transformá-las em produtos qualitativamente distintos. Com a produção, as matérias primas assumem nova forma, passando a ser produtos diferentes, (outputs) destinados ao consumidor final, ao uso como matérias primas ou como fatores de produção em outros processos produtivos. O processo esboçado na Figura 2.1 tanto pode representar uma firma de vestuário ou de tecidos, conforme insinuam os exemplos de inputs e outputs apresentados no parágrafo anterior, como serve para ilustrar o que ocorre com uma firma prestadora de serviços ou uma empresa agrícola. Uma maneira mais precisa e usual de expressar relações produtivas como estas se dá através do uso de funções de produção. Seja ( )1 2, , , mq q q=q … um vetor que representa o conjunto de quantidades de outputs ou produtos obtidos com o uso das quantidades de insumos elencadas no vetor ( )1 2, , , nx x x=x … . A função de produção será a regra, ( )f ⋅ , que indica algebricamente a relação entre q e x , vale dizer: x1 Firma q1 x2 x3 ... xn q2 ... qm Figura 2.1: A Firma Neoclássica 5 (2.1) ( )f=q x Como é evidente, funções de produção são formas algébricas que representam tecnologias produtivas. Pode-se definir uma tecnologia de produção, desta forma, como uma regra que relaciona o uso de inputs à produção de outputs. Variáveis mensuradas como quantidades por unidade de tempo são denominadas variáveis de fluxo. O uso de insumos e a produção exigem um período de tempo positivo para se concretizar na prática, razão pela qual se fala em fluxos de insumos e produtivos. Ainda que o processo de desenvolvimento e aperfeiçoamento tecnológico seja objeto de estudos econômicos, não é tarefa da Economia a criação ou melhoramento das técnicas de produção. Desta forma, na maior parte das situações as informações tecnológicas são consideradas dados exógenos nos modelos de teoria da firma. Aos engenheiros, designers, administradores e inventores cabe o desenvolvimentodas tecnologias observadas e usadas na produção. Não obstante, em diversas situações os economistas usarão funções de produção que se mostram analiticamente convenientes à construção de seus argumentos didáticos ou teóricos. Apesar de artificiais, estas tecnologias costumam permitir a adequação às situações concretamente observadas através da manipulação de seus parâmetros, conforme se observará frequentemente nos modelos discutidos neste manual. Considerando inicialmente uma firma simples, que usa apenas dois insumos, x1 e x2 na produção, digamos capital físico e mão de obra, pode-se ilustrar com mais facilidade alguns conceitos recorrentes na discussão da teoria da firma. Supõe-se que esta firma seja “uniproduto”, quer dizer, que produza um único tipo de bem ou serviço, (q) com estes inputs que utiliza. Usando (2.1), têm-se: (2.2) ( )1 2,q f x x= Conforme expõe a função de produção acima, a quantidade do bem ou serviço produzida por intervalo de tempo depende das quantidades de insumos utilizadas 6 neste mesmo período. Para facilitar a visualização, imagine-se que a quantidade de x1 empregada por intervalo de tempo seja constante e igual a 01x , talvez porque haja alguma limitação posta pelo número de máquinas e equipamentos atualmente disponíveis para uso da empresa. Desta forma, para 01 1x x= , uma representação gráfica de (2.2) pode ser resumida às combinações das diferentes quantidades produzidas à medida que se varia as quantidades de 2x usadas por intervalo de tempo, conforme ilustra a Figura 2.1. Figura 2.1 – Função de Produção Este gráfico da função de produção foi construído com intuito didático, apresentando um formato que facilita a apresentação de alguns conceitos sem que, entretanto, se deva esperar que as firmas no mundo real se deparem com funções de produção assim tão bem comportadas. Como se sabe, as tecnologias variam conforme a indústria considerada e mesmo dentro de uma indústria costumam ser diferentes entre as firmas, quer por envolverem a produção de bens e serviços distintos, quer em razão das diferenças nos recursos à disposição de cada empresa. Para melhor lidar com esta variedade, algumas medidas são úteis para tentar resumir as características destas tecnologias e facilitar sua análise. Função de Produção 0 50 100 150 200 250 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 x 2 q ( )10 2,q f x x= 7 Sendo as tecnologias relações entre uso de insumos e produção, uma primeira medida interessante é a do produto médio (= produtividade média) do insumo. Para firmas que produzem um único produto, a produtividade média é de quantificação bastante simples, bastando dividir a quantidade do bem ou serviço produzida pela quantidade do insumo utilizada. A fórmula da produtividade média do insumo i é i i qPMe x = , sendo evidente que esta produtividade média irá variar à medida que se utilizam diferentes quantidades deste insumo i, a menos que ele seja empregado em proporções fixas por unidade produzida – caso em que a função de produção seria linear no uso deste insumo1. Outra medida fundamental à caracterização das tecnologias é o produto (ou produtividade) marginal de i. O que este índice mede é a variação na quantidade produzida trazida por uma alteração na quantidade do insumo i. Intuitivamente é possível apresentar esta medida de produtividade pelo quociente i q x ∆ ∆ . Mantendo constantes as quantidades utilizadas de todos os demais insumos, se o aumento de uma unidade no uso do insumo i, 1ix∆ = , fizer com que a produção passe de 20 para 60 unidades, 40q∆ = , o valor deste quociente será 40 40 1i q x ∆ = =∆ . Para uma compreensão mais precisa do conceito, entretanto, algum rigor adicional é necessário, pois no cálculo da produtividade marginal se está imaginando o impacto de variações bastante pequenas (marginais) no uso do insumo i sobre a quantidade produzida. Desta forma, o que se procura matematicamente é o valor da razão i q x ∆ ∆ quando ix∆ tende a zero, ou seja, o 0limii x i i q qPMg x x∆ → ∆ ∂= =∆ ∂ . 1 Coeficientes de utilização de insumos fixos são comuns quando se trata de matérias primas, já que as mesmas quantidades destes insumos costumam ser usadas por unidade do produto final, independentemente da escala de produção. Quer se produzam camisas de forma artesanal ou em confecções modernas e automatizadas, sempre se usará a mesma quantidade de botões a cada modelo produzido. O desenho de uma função de produção como feito na Figura 2.1, neste caso, seria o de uma reta partindo da origem, já que para produzir 1 camisa se usariam 6 botões, 2 camisas seriam feitas com 12 botões, e assim por diante. Para este mesmo exemplo, o PMe dos botões seria constante e igual a 1/6 (1 camisa a cada 6 botões). 8 Os raciocínios marginalistas são centrais na análise econômica, apresentando diversas vantagens analíticas e sendo de compreensão simples. A idéia básica por detrás deles é a da comparação sistemática de uma posição ou situação econômica com outras alternativas (próximas) possíveis. Assim, quando se está produzindo 20 unidades de um bem com o uso de 1 unidade do insumo i, o que se quer saber através da iPMg é o que aconteceria com a quantidade produzida em decorrência de uma pequena variação, para mais ou para menos, na utilização de i. Caso se decida alterar a quantidade produzida, repete-se o raciocínio marginalista, prosseguindo repetidamente até que se chegue a uma situação em que a mudança deixe de ser desejável. Da comparação entre os valores dos PMe e PMg de um insumo encontra-se uma relação importante e sutil, que reaparecerá na análise dos custos e das receitas das firmas. Na Figura 2.2 reproduz-se o gráfico da função de produção exibido na figura anterior, a ele superpondo as curvas de produto médio e marginal de x2. Para facilitar a visualização, os valores do 2PMe e da 2PMg foram colocado no eixo vertical direito, podendo-se notar facilmente que 2PMe é crescente até a utilização de 4 unidades de x2, passando então a diminuir quando sucessivas unidades de x2 são empregadas na produção. Observa-se, ainda, que até 2 4x = a produtividade marginal exibe valores maiores do que a produtividade média, padrão que se inverte quando 2 4x > . 9 Figura 2.2 – Função de Produção, Produtos Médio e Marginal de x2 Não há uma mera coincidência nos dados plotados na Figura 2.2. Sempre que 2 2PMg PMe> , a 2PMe estará aumentando, o contrário ocorrendo se 2 2PMg PMe< . Esta é uma relação bastante geral, afinal para se aumentar uma média, é necessário que os valores adicionados sejam superiores a ela, ocorrendo uma redução de média quando se incorporam à mesma valores que lhe sejam inferiores. Considere as notas de avaliação durante um curso de OI, se a nota média encontra-se em elevação (redução), isto decorre do fato da obtenção de notas “marginais” maiores (menores) do que a nota média. Evidentemente, os valores encontrados para 2PMe e 2PMg estão condicionados à suposição de que as quantidades usadas dos demais insumos permaneçam constantes. No exemplo utilizado, se houvesse uma ampliação da planta, fazendo com que 01 1x x> , outros desenhos apareceriam nas Figuras 2.1 e 2.2, a dependerem das tecnologias efetivamente empregadas. Via de regra, a presença de fatores de produção fixos é um limitador das possibilidades de produção. Se fosse possível alterar simultaneamente as quantidades de todos os insumos utilizados, os problemas econômicos adquiririam Função de Produção, Produto Médio e Marginal de x 2 0 50 100 150 200250 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 x 2 q -20 -10 0 10 20 30 40 50 60 70 ( )10 2,q f x x= 2x PMe 2x PMg 10 novas feições. Na prática, ambos os contextos merecem atenção, já que é necessário decidir quanto produzir diante das restrições existentes num determinado instante do tempo, com as máquinas e equipamentos hoje disponíveis, mas também é de se considerar a possibilidade de alteração dos fatores de produção com maior liberdade, por exemplo, avaliando a oportunidade de investir em novos equipamentos ou desativar parte dos existentes. Para lidar com estes diferentes horizontes de planejamento, é praxe em Economia distinguir entre o “curto-prazo” e o “longo-prazo”. Estas expressões também são usadas no linguajar comum e na prática dos negócios financeiros e comerciais, não sendo rara a convenção de entender por curto-prazo o período inferior a um ano, tendo-se por “longo” qualquer período superior a 12 meses. No seu uso técnico-econômico, entretanto, a interpretação desta terminologia é completamente diferente, estando o curto-prazo associado a situações em que existe pelo menos um fator de produção fixo, e o longo-prazo aos problemas em que todos os fatores de produção podem ser variados. Neste sentido, o número de dias, meses ou anos que separará o curto do longo prazo econômico dependerá do tipo de atividade produtiva considerado, podendo ser bastante exíguo quando se fala da expansão do número de barracas em uma feira livre, ou muito extenso, como seria o caso da duplicação da capacidade de geração de energia elétrica em uma bacia hidroelétrica. Na realidade a dicotomia entre curto e longo prazos é marcada por um simplismo que merece atenção. O que interessa saber é que na medida em que se amplia o intervalo de tempo disponível para viabilizar a readequação dos fatores de produção alteram-se as possibilidades a serem consideradas, o que sugere a existência de um continuum de horizontes de planejamento em que as limitações são paulatinamente eliminadas. Para concluir estes comentários sobre as tecnologias produtivas, é interessante apresentar uma classificação muito empregada nas análises de OI e que tem implicações relevantes na análise dos custos de produção. Trata-se da distinção das tecnologias em função da mudança na produção trazida por uma variação proporcional no uso de todos os fatores de produção. Usando a função 11 de produção simplificada, exposta na equação (2.2), imagine que a utilização de 10 unidades do insumo 1 e 3 unidades do insumo 2 impliquem a produção de 120 unidades do bem ou serviço por mês. Considere, agora, uma variação de igual proporção em todos os insumos, digamos, de 10%. Em conseqüência, três fatos poderiam ser observados com relação a mudança na quantidade produzida, e que motivam a classificação aqui discutida: (i) se a mudança percentual em q for igual a 10% - passando-se a produzir 132 unidades com 11 unidades do insumo 1 e 3,3 unidades do insumo 2 -, diz-se que a tecnologia exibe retornos constantes de escala, se q aumentar em menos do que 10%, os retornos de escala serão decrescentes e, finalmente, se q aumentar em mais do que 10%, tal tecnologia será de retornos crescentes de escala. Vale a pena formalizar esta classificação tecnológica, especialmente para eliminar interpretações tecnicamente equivocadas que se faz dela em diversas aplicações práticas. A tipologia apresentada é aplicável a tecnologias e pressupõe que as alterações percentuais no uso dos insumos seja a mesma para todos os inputs. Seja 1λ > um fator que mede a proporção em que os insumos serão alterados, e considere um vetor de insumos ( )1 2, , , nx x x… 2. Então, a tecnologia que usa estes insumos para produzir um bem ou serviço será sujeita a: (i) retornos constantes de escala, se ( ) ( )1 2 1 2, , , , , ,n nf x x x f x x xλ λ λ λ=… … , (ii) retornos crescentes de escala, se ( ) ( )1 2 1 2, , , , , ,n nf x x x f x x xλ λ λ λ<… … , e, (iii) retornos decrescentes de escala, se ( ) ( )1 2 1 2, , , , , ,n nf x x x f x x xλ λ λ λ>… … . 2.1.2 Custos de Produção Combinando as informações sobre as tecnologias produtivas às dos preços dos insumos usados pelas firmas, estrutura-se a análise neoclássica dos custos 2 É possível que uma mesma tecnologia exiba retornos de escala de um tipo, por exemplo constantes, em determinada faixa de utilização de insumos, mas que seja classificada de forma diversa, com retornos crescentes ou decrescentes, quando a escala de produção varia. Isto não inutiliza a classificação sugerida, mas exige a cautela de especificar a faixa de produção em que cada modalidade é aplicável. 12 de produção. Apesar de se permanecer do lado de forma firma, ainda uma caixa preta, conhecimentos preciosos são obtidos com este passo adicional. De fato, os custos de produção ajudam a explicar a dimensão da firma, a caracterizar algumas estruturas de mercado em função das barreiras à entrada/saída e a justificar determinadas políticas regulatórias específicas. A área hachurada na Figura 2 destaca os elementos sobre os quais se estrutura a teoria neoclássica dos custos. Figura 2 Preliminarmente é preciso lembrar que a Economia usa uma noção bastante peculiar de custos, diferente daquelas normalmente empregadas por contadores ou para satisfazer exigências fiscais. Os custos econômicos são calculados como custos de oportunidade na utilização dos recursos, vale dizer, como o valor que os recursos teriam caso estivessem alocados à melhor utilização possível fora da firma. Esta noção de custos remete a um rigoroso critério para a avaliação do desempenho dos negócios da firma, já que a decompõe num conjunto de recursos econômicos e exige que cada um destes recursos seja valorado conforme o retorno máximo que obteria caso não estivesse à disposição da produção pela firma. É compreensível, neste sentido, interpretar o lucro econômico zero como uma situação em que os recursos são alocados de forma eficiente, vale dizer, na qual não haveria ganhos produtivos com o deslocamento destes recursos para x1 Firma x2 x3 ... xn Px1 Px2 Px3 ... Pxn q1 q2 ... qm 13 outras atividades em que eles teriam sua remuneração máxima. Como se verá no próximo capítulo, um lucro econômico zero é o que se espera observar no longo prazo para firmas em concorrência perfeita, o “lucro normal”. Se o uso da noção de custo econômico traz grandes vantagens analíticas e uma percepção criteriosa do desempenho das firmas, a tentativa de aplicar uma contabilidade baseada em custos econômicos expõe diversas dificuldades práticas. Com efeito, como os custos de utilização de todo e cada recurso devem ser aferidos com base na melhor remuneração que ele receberia fora da firma, o que interessa não são os lançamentos das saídas de caixa atuais ou diferidas conforme a boa técnica da contabilidade tradicional, mas uma avaliação dos custos dos recursos conforme as rendas que eles poderiam gerar caso estivessem nas melhores utilizações fora da firma. Imagine, para fixar o conceito, a existência de duas firmas que seriam idênticas, exceto pelo fato de que apenas uma delas precisar pagar aluguel pelo uso das instalações físicas que ocupa. As despesas com aluguéis destas instalações aparecem como custos de produção no demonstrativo de resultados publicado por apenas uma delas, o que tende a fazer com que a firma que não precisa pagar aluguéis pareça ter um lucro maior. Para a análise econômica, entretanto, os lucros da firma proprietária aparecem superestimados secalculados desta forma, afinal, ela está deixando de receber aluguéis por decidir usar as instalações para produzir, existindo aí um verdadeiro custo econômico que precisaria ser considerado. Levando este raciocínio ao extremo, qual deveria ser o custo de um equipamento produzido sob encomenda e adquirido por $ 15 milhões, mas que após instalado tem valor de revenda igual a $1 milhão, dadas a dificuldades de adaptação para seu uso fora das instalações para as quais foi especificamente desenvolvido? Imaginando que com este $ 1 milhão se conseguiria no máximo $10 mil de retorno por mês, este seria o custo econômico mensal de manter a máquina operando3. Na situação considerada, é de se notar que assim que a desistência da aquisição do equipamento passou a ser impossível, o ativo perdeu 3 Desconsiderando, é claro, os gastos com manutenção do equipamento, que costumam variar de acordo com a intensidade de seu uso. 14 $14 milhões em valor, pelo que seus custos econômicos devem levar em consideração apenas o custo de oportunidade de manter $1 milhão no equipamento em vez de auferir as rendas que este montante, na melhor das hipóteses, geraria caso a máquina fosse vendida. A aquisição desta máquina gera um investimento de $14 milhões de natureza irreversível, o que se denomina também por custo irreversível ou irrecuperável (sunk cost). O custo de oportunidade de um investimento irreversível é igual a zero, já que uma vez realizado não pode ser recuperado. Estes custos irreversíveis acontecem com muita freqüência, por exemplo quando se realizam dispêndios promocionais com o lançamento de um determinado produto. Como não é factível, na maioria das vezes, recuperar estas despesas com propaganda, alocando-as a outras finalidades, uma campanha promocional frustrada representará uma perda de capital, mas não deverá ser contabilizada como custo econômico depois de realizada. Os sunk costs serão importantes fontes de barreiras à entrada e saída dos mercados, pois se em determinada indústria estes custos forem importantes, aqueles que resolverem nela ingressar devem considerar, antes de fazê-lo, as repercussões de suas decisões. Depois de se realizar investimentos irreversíveis, como bem lembra a sabedoria popular, “não adianta chorar sobre o leite derramado”. Numa classificação bastante utilizada, os custos totais de produção podem ser distinguidos entre variáveis e fixos, conforme dependam ou não da quantidade produzida. Os custos fixos serão iguais quer se produzam mais ou menos unidades do produto, enquanto o valor dos custos variáveis será dependente da quantidade produzida, como posto na equação (2.3) (2.3) ( )CT CF CV q= + Os custos fixos independem da quantidade produzida, como costuma ocorrer com o aluguel de uma planta fabril ou de um escritório em que se prestam serviços e com certos impostos sobre o patrimônio, por exemplo. Para algumas aplicações, entretanto, convém saber se estes custos podem ser reduzidos caso 15 haja necessidade. Considere a situação em que uma firma contrata serviços externos de segurança pelo prazo de dois anos, com pagamentos mensais pré- estabelecidos. Se esta empresa decidir implementar um sistema de monitoramento próprio após assinatura do contrato com a firma de vigilância, eventualmente seja possível repactuar os valores acertados, reduzindo o montante destas despesas fixas. Quando os custos puderem ser reduzidos, mesmo sendo independentes das quantidades produzidas, eles merecerão a denominação de custos evitáveis. Todos os custos variáveis são evitáveis. Custos fixos que não podem der revistos são custos inevitáveis, caso se possa rever e diminuir os custos fixos, estes também serão custos evitáveis. Assim como ocorre com as tecnologias, existem medidas que facilitam a análise dos custos e suas funções algébricas, reaparecendo aqui a distinção entre valores médios e marginais. Os custos fixos médios (CFMe) são obtidos pela divisão dos custos fixos pelas quantidades produzidas, CFCFMe q = , da mesma forma se fazendo para obter os custos variáveis médios (CVMe), ( )CV qCVMe q = . Somando-se CFMe e CVMe, encontram-se os custos totais médios (CTMe), conforme se observa na equação a seguir: (2.4) ( ) ( )CV q CT qCFCTMe q q q = + = Dimensionar a variação nos custos totais trazida por uma alteração na quantidade produzida é conveniente em diversas aplicações na OI. Considerando variações infinitesimais em q, obtém-se a medida dos custos marginais (CMg), formalmente: (2.5) ( ) ( ) ( )dCT q dCV q dCV qdCFCMg dq dq dq dq = = + = 16 Na Figura 3 ilustram-se curvas “bem comportadas” em que se pode observar uma ilustração didática dos conceitos de custos recém apresentados. Em primeiro, note-se que os CFMe mostram um comportamento assintótico ao eixo horizontal à medida que aumenta a escala de produção. Relativamente à curva de CMg, vale a pena atentar para o fato dela cruzar as curvas de CVMe e CTMe nos pontos em que estes são mínimos, reiterando o raciocínio da relação entre valores médios e marginais usado anteriormente. De fato, sempre que os Custos Médios, totais ou variáveis, estão caindo, seus valores são maiores do que os dos CMg, o oposto acontecendo quando estes valores médios crescem. 2.1.3 Economias de Escala O comportamento dos custos médios à medida que a escala de produção aumenta é central para a análise de diversos problemas na OI, sendo tópico obrigatório na compreensão dos monopólios naturais e teoria da regulação, no dimensionamento das barreiras à entrada nos mercados e na avaliação de operações de fusão e aquisição, para citar apenas algumas das aplicações mais importantes deste indicador. As economias de escala ocorrem quando os custos médios de produção diminuem com o aumento da escala de produção. Se o comportamento oposto é Figura 3 17 observado, com elevações nos custos médios em decorrência de uma elevação na quantidade produzida, fala-se em deseconomias de escala. Quando não há nem economias e nem deseconomias de escala, os custos médios são constantes em relação à escala de produção. O tema das economias de escala normalmente aparece na discussão microeconômica no contexto de longo-prazo, no qual se pode ampliar a capacidade produtiva sem limites na disponibilidade dos fatores produtivos. Na Economia Industrial a associação exclusiva ao horizonte de planejamento em que todos os fatores de produção podem ser variados costuma ser relaxada, permitindo-se falar em economias de escala mesmo quando há custos fixos e inevitáveis. Esta maior flexibilidade conceitual ocorre na OI já que são recorrentes situações práticas em que uma ou poucas empresas conseguem aproveitar reduções nos seus custos médios de produção e atender toda a demanda de determinado mercado com a capacidade produtiva já instalada, fazendo ser improvável ou desnecessário imaginar ampliações ainda maiores na escala de produção. Como a produção é um fluxo, sendo medida por período de tempo, a noção de economias de escala também pode ser aplicada a variações na freqüência de produção, vale dizer, quantificando a variação nos custos médios quando o número de turnos produtivos ou a velocidade de produção se altera. Uma medida simples para a quantificação das deseconomias ou economias de escala em uma atividade produtiva para firmas uniproduto, s, pode ser obtida a partir da comparação entre custos médios e custos marginais: (2.6) 1 Economias de Escala 1 Custos Médios Constantes 1 Deseconomiasde Escala CMes CMg > ⇔= = ⇔< ⇔ Como se percebe por (2.6), a existência de economias de escala exige que os custos marginais sejam menores que os custos médios (s > 1). Custos médios decrescentes com a escala de produção, a seu turno, podem estar associados a 18 aspectos internos ou externos à firma. As economias de escala internas encontram sua origem em alguma vantagem tecnológica que permita a produção a um custo unitário menor à medida que a escala de produção aumente. Já as economias de escala externas são devidas a alguma redução nos preços dos inputs gerada pela elevação da escala produtiva, sendo também conhecidas, em função disto, por economias pecuniárias. No uso prático do conceito de economias de escala é conveniente tomar uma percepção bastante abrangente dos custos, incluindo os custos de administração, promocionais, de estocagem e transporte (distribuição) dos produtos. Isto porque boa parte destas despesas não varia proporcionalmente com as quantidades produzidas, vale dizer, em diversas situações aumentos na escala de produção costumam trazer reduções nos custos médios quando estes componentes são levados em conta. As principais fontes das economias de escala internas decorre de reduções de custos associadas (i) ao melhor aproveitamento de recursos indivisíveis, (ii) aos custos de setup, aos (iii) ganhos com a divisão e especialização do trabalho. As indivisibilidades são freqüentes na produção e, entendidas de forma ampla, incluem as duas outras origens mais comuns de economias de escala. Considere uma empresa de refino de petróleo, em que o uso de tubos para o escoamento de fluídos e de tanques de armazenamento representam uma parcela significativa dos custos de produção. Uma regra de bolso para estimar os custos de construção de refinarias e conhecida como “regra dos dois-terços” é dada por: (2.7) ( )23Custo de Construção = capacidade de escoamentok ∗ Nota-se em (2.7) que à medida que a capacidade de escoamento aumenta, os custos de construção da planta se elevam menos do que proporcionalmente, com k representando uma constante que depende da tecnologia utilizada. A regra dos dois-terços decorre de fatos geométricos básicos, pois enquanto a relação entre a superfície e o raio de recipientes cilíndricos é quadrática, seus volume e raio se relacionam cubicamente. Infelizmente, entretanto, não costuma ser possível dividir 19 o uso de um recipiente ou tubo cilíndrico, pelo que o aproveitamento destas importantes reduções de custos exige que a escala de produção (ou escoamento) aumente. Analogamente, há situações em que o início da produção exige um período de preparo (setup) para o treinamento da mão de obra ou para o ajuste das máquinas e equipamentos. Produzir em escalas maiores significará uma diluição destes custos de ajustamento, especialmente quando estes não puderem ser proporcionalmente “divididos” quando a quantidade produzida se reduz. Desde Adam Smith (ver Box. 1.1) as vantagens com a divisão do trabalho são percebidas como importantes fontes de redução nos custos de produção. Para que as vantagens da divisão das tarefas sejam aproveitadas ao máximo sem que recursos permaneçam ociosos, maiores escalas produtivas tendem a ser necessárias. Com efeito, adquirir uma máquina ou contratar operários exclusivamente para desentortar arames na fabricação de alfinetes pode ser ineficiente ou excessivamente caro quando a escala de produção for baixa. As economias (deseconomias) de escala externas, a seu turno, dependem de fatores externos à firma, normalmente estando associadas a reduções (aumentos) nos preços dos insumos ou fatores de produção à medida que a produção na indústria (não na firma!) aumenta. Exemplos típicos destas economias pecuniárias são as reduções nos custos de contratação de força de trabalho em decorrência da aglutinação de mão de obra especializada em determinados pólos industriais. Outra forma usual deste tipo de economias decorre da existência de economias de escala internas na produção dos insumos adquiridos pelas firmas. Evidentemente, a possibilidade de aproveitar estas economias depende da expansão da indústria como um todo, ficando condicionada ao efetivo repasse dos menores custos percebidos pelas fornecedoras de insumos aos elos subseqüentes da cadeia produtiva. Por fim, convém lembrar as economias externas associadas aos transbordamentos tecnológicos (technological spillovers) que consistem no acesso mais barato aos aperfeiçoamentos tecnológicos pelo aproveitamento dos esforços em pesquisa e desenvolvimento realizados por outras firmas. Neste último tópico se inclui a engenharia reversa, pela qual invenções eventualmente trazidas por 20 vultosos investimentos de concorrentes tornam-se facilmente assimiladas e, nos limites permitidos pela proteção à propriedade intelectual vigente, empregados a custos mais baixos pelas demais firmas. Conforme se alertou anteriormente, no cálculo das economias e deseconomias de escala é importante considerar os custos de forma abrangente. Mesmo que uma firma perceba significativas economias de escala na planta de produção, há situações em que os custos de transporte e distribuição dos produtos fazem ser mais conveniente (barato) produzir em plantas menores e próximas aos consumidores. Em outras situações, os custos de transporte das matérias primas até o local de fabricação serão determinantes para o dimensionamento da escala de produção e localização espacial da firma. Quando os custos de transporte das matérias primas aumentam, as firmas tendem a se aproximar mais dos locais em que elas são produzidas, mesmo que isto implique um distanciamento maior em relação aos consumidores finais. 2.1.3 Economias de Escopo O conceito de economias de escala chamou a atenção para a mudança nos custos médios derivadas de alterações na escala de produção. Apontando para outra possibilidade, as economias e deseconomias de escopo se referem às relações entre os custos produtivos e a diversificação no mix de produção. De forma simples, as economias de escopo são reduções nos custos de produção trazidas pelo aumento na variedade de produtos ofertados. Firmas que ofertam dois ou mais produtos são denominadas “multiproduto”, e este tipo de economias costumam decorrer da existência de sinergias na produção, administração, distribuição ou marketing que se traduzem em reduções de custos. Não é necessário que os diferentes produtos sejam fabricados numa mesma planta fabril para que haja economias de escopo. De fato, observa-se com freqüência firmas que produzem cigarros e snacks ou confeitos em plantas fabris 21 diferentes, embora consigam reduções significativas nos custos conjuntos de distribuição e venda, já que há uma coincidência importante nos pontos de varejo atendidos e na logística de venda e transporte utilizada. Lojas de locação de vídeo como a Blockbuster, por exemplo, além do aluguel de fitas e discos de vídeo, oferecem aparelhos de DVD, sorvetes e pipocas a seus clientes, sem que para isto precise contratar mais funcionários ou arcar com despesas mais altas com o espaço de venda. Companhias de transporte aéreo de passageiros costumam ter serviços de entregas expressas de pacotes e encomendas, universidades tendem a oferecer serviços de consultoria para aproveitar o agrupamento de talentos de seu corpo docente, bancos comerciais modernos oferecem serviços bastante diversificados, desde a simples administração de contas correntes até a estruturação de sofisticadas operações de captação de recursos. Todos estes são exemplos cotidianos queilustram as sinergias associadas ao compartilhamento de recursos e implicam economias de escopo. Uma fórmula para se dimensionar as economias de escopo como uma porcentagem do custo da produção conjunta é apresentada na equação (2.8). (2.8) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) 1 2 1 2 1 2 ,0, ,0 ( 0, ,0, ,0 ( 0,0,0, , ( , , , , , , m m m C q C q C q C q q q SC C q q q + + + − = … … " … …… A lógica nesta equação é de simples entendimento. No numerador encontra-se a soma dos custos de produção separada dos m produtos considerados, subtraída dos custos da produção conjunta. Se o valor do numerador for positivo, produzir os m produtos conjuntamente é mais barato do que produzi-los separadamente, ou seja, quando SC > 0, há economias de escopo. Quando a soma dos custos das produções separadas é menor do que o custo da produção conjunta, SC < 0 e há deseconomias de escopo. A divisão da diferença entre os custos da produção separada e conjunta dividida pelo custo da produção conjunta serve para dimensionar o grau das economias ou deseconomias de escopo. Resumindo: 22 0 Economias de Escopo 0 Indiferente produzir junto ou separado 0 Deseconomias de Escopo SC > ⇔= ⇔< ⇔ 2.1.4 Medidas de Custos em Firmas Multiproduto A existência de economias de escopo parece ser fenômeno abrangente nas mais diversas atividades produtivas, sendo raras as situações em que as firmas ofertam apenas um produto ou serviço. Este fato, entretanto, torna necessária a extensão das medidas de custos até agora apresentadas para o caso mais simples em que se consideravam firmas uniproduto. Um exemplo simples tende a ser suficiente para a reapresentação dos conceitos de Custo Médio, Custo Marginal e medida de Economias de Escala de forma a compatibilizá-los ao caso mais geral. Suponha que os custos de produção conjunta e separada de três produtos - isqueiros, canetas e barbeadores – sejam dados pelas funções abaixo: ( )1 2 3 1 2 3, , 500 2 3 5CT q q q q q q= + + + ( )1 1,0,0 500 2CT q q= + ( )2 20, ,0 500 3CT q q= + ( )3 30,0, 500 5CT q q= + Com estas informações, um passo preliminar seria verificar a existência de economias de escopo, de forma a certificar o interesse na produção conjunta. Substituindo os dados fornecidos em (2.8) e rearranjando os termos, obtém-se: ( )1 2 3 1 2 3 1 2 3 1 2 3 500 2 500 3 500 5 500 2 3 5 500 2 3 5 1000 0 500 2 3 5 q q q q q q SC q q q SC q q q + + + + + − + + + = + + + = >+ + + 23 Como as quantidades produzidas dos três produtos, ( )1 2 3, ,q q q não pode ser negativa, SC será positivo, de forma que se atesta a existência de economias de escopo na produção destes três bens. Qual seria, entretanto, o custo médio de produção nesta firma? Para o caso das firmas uniproduto, os custos médios de produção eram encontrados pela divisão dos custos totais pela quantidade produzida, mas agora se dispõem de três quantidades de produtos distintos a serem consideradas. Uma alternativa simplista seria a de somar as quantidades de isqueiros (digamos 200 mil isqueiros / mês), à de canetas (500 mil canetas / mês) e de barbeadores (180 mil barbeadores / mês), dividindo os custos totais por esta “soma” (880 o quê? por mês). Nota-se imediatamente que esta estratégia conduz a um problema sério, o da impossibilidade de somar unidades de “coisas” diferentes. Não existe uma maneira única ou correta para solucionar esta dificuldade, mas um caminho frequentemente empregado é o do cálculo do Custo Médio de Raio (CMeR), que passa a ser apresentado. Inicialmente cria-se um índice para a alocação dos custos, iλ , com as seguintes características: (2.9) 1 , 1, , e, 1 i i m i i q i m q λ λ = = = =∑ … Este índice representará a participação dos custos em relação aos custos totais que se considera adequada para cada um dos itens produzidos, inexistindo o problema da soma de unidades diferentes pois “q” será uma commodity composta pelos diferentes bens produzidos. No exemplo apresentado, a quantidade de bens 3m = , propõem-se 1 2 30, 4; 0,1; e, =0,5 λ λ λ= = . A justificativa para a escolha destas ponderações dependerá, na prática, de uma criteriosa avaliação do caso concretamente analisado, pretendendo-se obter o máximo de 24 fidelidade no compartilhamento dos recursos comuns na produção dos diferentes bens. A partir dos índices de alocação de custos, lembrando que i iq qλ= , pode-se reescrever a função custos total da seguinte forma: (2.10) ( ) ( )1 2, , , nCT q CT q q qλ λ λ= … O que permite chegar à fórmula do Custo Médio de Raio: (2.11) ( ) ( )1 2 1 , , , , 1, , 1 n i i n i i CT q q q CTMeR q q q i n q λ λ λ λ λ = = = = =∑ … … Usando os índices do exemplo em (2.11), obtém-se: ( ) ( ) ( ) ( )500 2 0, 4 3 0,1 5 0,5 500 3,6 500 3,6q q q qCTMeR q q q q + + + += = = + Para o cálculo dos Custos Marginais, a existência de produção múltipla não traz maiores dificuldades. De fato, lembrando que ( )dCT qCMg dq = para a firma uniproduto, a adequação consistirá apenas da percepção de que agora os custos totais podem variar com a mudança na quantidade fabricada de qualquer um dos m produtos, passando a existir, desta forma, m Custos Marginais a serem considerados: (2.12) ( )1 2, , , , 1, ,ni i CT q q q CMg i m q ∂= =∂ … … 25 Novamente, pode-se usar o exemplo aqui considerado como ilustração: ( )1 2 3 1 1 500 2 3 5 2 q q q CMg q ∂ + + += =∂ ( )1 2 3 2 2 500 2 3 5 3 q q q CMg q ∂ + + += =∂ ( )1 2 3 3 3 500 2 3 5 5 q q q CMg q ∂ + + += =∂ Por fim, falta ajustar a medida de economias de escala para a situação em que a firma produz mais de um produto. Aqui há duas situações a considerar, pois tanto se pode avaliar a existência de economias de escala específicas ao aumento na produção de apenas um dos produtos, como o impacto sobre os custos médios de uma ampliação na escala de produção de todo o mix produtivo. Uma medida adicional e útil ao cálculo das economias de escala específicas ao produto é a de Custo Incremental de produzir i, CIi: (2.13) ( ) ( )1 2 1 2, , , , , , , ,0, ,i i m mCI C q q q q C q q q= −… … … … Conforme mostra (2.13), o custo incremental mede o acréscimo nos custos conjuntos de produção quando se aumenta a quantidade produzida do produto i. A divisão do CIi pela quantidade de i produzida gera o seu Custo Incremental Médio (CIMei) : (2.14) ( ) ( )1 2 1 2, , , , , , , ,0, ,i m mi i C q q q q C q q q CIMe q −= … … … … As economias de escala específicas ao produto i , is , são medidas pela razão entre seus Custo Incremental Médio e Custo Marginal, havendo redução nos custos incrementais médios de produção deste produto quando sua escala de produção aumenta se 1is > : 26 (2.15) 1 Economias de Escala Específicas 1 Custos Incrementais Médios Constantes 1 Deseconomias de Escala Específicas i i i CIMes CMg > ⇔= = ⇔ < ⇔ Com os dados do exemplo para isqueiros, i =1, em (2.15), observa-se que não há economias ou deseconomias de escala específicas para este produto. ( )1 2 3 2 3 1 1 1 1 1 1 500 2 3 5 500 3 5 3 3 3 1 3 q q q q q CIMe q CMg CIMes CMg + + + − + += = = = = = Para a avaliação da existência de economias de escala não específicas, pode- se usar regra expressana equação (2.16). Nota-se que quando m = 1, esta equação é a mesma encontrada em (2.6), que definia a medida de economias de escala para a firma uniproduto. (2.16) ( )1 2 1 1 2 2 , , , m m m CT q q q s q CMg q CMg q CMg = + + + … " Usando (2.16) encontra-se valores para s que podem ser maiores, iguais ou menores do que a unidade, a serem interpretados da mesma maneira que se fez para (2.6): 1 Economias de Escala 1 Custos Médios Constantes 1 Deseconomias de Escala s > ⇔= ⇔< ⇔ Com os dados do exemplo, pode-se observar que além de economias de escopo (SC > 0), esta firma aproveita-se de economias de escala (s > 1). 27 1 2 3 1 2 3 1 2 3 500 2 3 5 5001 1 2 3 5 2 3 5 q q qs q q q q q q + + += = + >+ + + + Interessante atentar para o fato de haver economias de escala para aumentos na produção de todos os produtos, ainda que para cada um deles as economias de escala específicas não existam (acima se encontrou 1 1s = , verifique se esta última afirmação está correta achando 2s e 3s ). Da mesma forma, não há qualquer relação pré-determinada entre a existência (ou não) de economias de escala e escopo. Estas são medidas independentes e com interpretações econômicas distintas, ainda que, por vezes, possa-se entender que as economias de escopo decorrem do melhor aproveitamento de alguma indivisibilidade na produção, por compartilhamento. 2.2 A Natureza e os Objetivos da Firma Num pequeno trabalho publicado em 1937, The Nature of the Firm, Ronald Coase propôs uma abordagem inovadora ao estudo das firmas e adiantou questões que até hoje definem a pauta das análises sobre o tema. A grande contribuição de Coase se encontra numa radical mudança de perspectiva, deslocando a firma, anteriormente tratada como uma mera tecnologia de transformação de insumos em produtos, ao centro da análise da alocação eficiente de recursos. De figurante a firma assume papel de protagonista neste enredo, em upgrade que não pode ser menosprezado, pois, antes de Coase, os mercados reinavam ali de forma absoluta. Coase deixou claro que as explicações típicas encontradas na teoria neoclássica não bastavam sequer para justificar logicamente a existência das firmas. Na verdade, no arcabouço dos mercados neoclássicos ideais supunha-se que a realização de todas as trocas mutuamente benéficas ocorresse automaticamente e sem custos significativos nos mercados. Ora, se o mundo fosse assim, qual seria a explicação para a existência de transações ocorrendo no interior das firmas ou “fora” dos mercados? 28 Os motivos coasianos para a existência e os limites da firma são achados precisamente nos custos de utilização dos mercados, os hoje denominados “custos de transação”. Sem custos de transação o tamanho das firmas, e sua existência, restam indeterminados. Em sua roupagem moderna, a teoria dos custos de transação aparece indissociável do nome de Oliver Wiliamson, que durante as décadas de 1970 e 1980 aprofundou as idéias originais de Coase, fundindo-as com as de autores de linhagens diversas como Herbert Simon, Chester Barnard, Alfred Chandler, Hayek, Keneth Arrow e Frank Knight. Para Williamson, as firmas e os mercados são “estruturas de governança”, que define como “o arcabouço de contratos explícitos ou implícitos no qual as transações são realizadas (mercados, firmas e formas mistas – por exemplo, franchinsing – incluídos).” (1981: 1544). Os contratos a que se refere este autor consistem das relações travadas entre diferentes entidades econômicas, envolvendo os custos das negociações preliminares, da redação contratual, da execução, do monitoramento e da solução de disputas futuras que eventualmente venham a ocorrer entre os envolvidos. Como se percebe, tais relações contratuais podem ocorrer sob a governança do sistema de preços, nas firmas ou em organizações híbridas, a depender dos custos e benefícios associados a cada uma destas estruturas de governança. Na teoria dos custos de transação duas hipóteses comportamentais básicas são fundamentais: a racionalidade limitada e o comportamento oportunista. A expressão racionalidade limitada foi cunhada por Herbert Simon (1957) e procura representar a dificuldade dos agentes econômicos em processar informações e resolver problemas complexos. Não há intenção pejorativa ao se falar em limitações da racionalidade humana, mas apenas a constatação de que os indivíduos não são oniscientes ou capazes de entender e prever com exatidão tudo o que acontecerá no mundo. Analisando o outro lado da moeda, se há incerteza, algo desconhecido ou que não se entende como funciona, existe a racionalidade limitada. O comportamento oportunista, a seu turno, já era conhecido de há muito na teorização econômica, podendo ser entendido como uma corruptela da ação auto-interessada (self-interested) em que um agente tenta 29 se locupletar às custas de outro. O oportunismo aqui se aproxima à idéia de fraude, logro, de se levar vantagem em determinada situação. Quando há a possibilidade de comportamento oportunista em relações entre agentes econômicos limitados racionalmente, as transações entre eles tornam-se mais difíceis ou arriscadas, pois não se pode confiar na lisura no comportamento dos contratantes. A partir deste ponto, a expressão “custos de transação” se referirá exclusivamente aos custos para a utilização dos mercados, respeitando uma convenção praticamente consensual na literatura. É certo que as transações internas às firmas ou outras estruturas de governança também são onerosas, mas quando se quiser falar destes custos haverá qualificação expressa. Os principais custos de transação, desta forma, serão decorrentes da poderosa química existente entre a limitação de racionalidade e o comportamento oportunista. Três direções em que esta alquimia gera resultados interessantes têm sido foco de maior atenção: (i) a freqüência com que as transações são realizadas, (ii) o tipo e o grau de incerteza envolvida na relação e, (iii) a especificidade de ativos. O problema com a freqüência de ocorrência das trocas de mercado tanto está associado aos custos redundantes, como ao grau de dependência que esta pode trazer às partes envolvidas. Se para cada compra e venda existe um custo fixo com telefonemas, extração de notas e expedição dos produtos, por exemplo, o aumento na freqüência destas trocas tende a representar dispêndios proporcionalmente maiores e desnecessários. Por outro lado, um relacionamento freqüente e intenso entre duas firmas tende a gerar uma dependência mútua arriscada, especialmente quando uma destas partes puder agir de forma oportunista, tentando extrair rendas adicionais quando o parceiro se tornar eventualmente vulnerável. É bastante comum, neste sentido, encontrar produtores de bens de varejo que optam por reduzir tal dependência assumindo diretamente a distribuição de seus produtos para evitar ações oportunistas de distribuidores terceirizados. Numa alternativa menos agressiva, a elaboração de contratos de distribuição terceirizada bastante rígidos e a manutenção de uma estrutura de 30 distribuição direta paralela são remédios interessantes para o disciplinamento dos distribuidores externos. Williamson propõe uma classificação útil para os tipos de incerteza que geram custos de transação. Percebida da forma mais ampla possível, pode-se falar na incerteza primária ou ambiental quando se trata da existência de contingências, fatores não antecipados pelas partes envolvidas, mas que interferem no seu relacionamento de mercado. Fala-se aqui, por exemplo, do impacto de uma secainesperada e que impede o produtor de soja de honrar os compromissos assumidos com uma empresa de refino de óleo comestível. É denominada incerteza secundária aquela associada aos problemas de comunicação entre as partes contratantes. Esta modalidade de incerteza inclui as dificuldades associadas ao processo de emissão, armazenamento, recuperação e transmissão de informações, dando conta de toda a sorte de ruídos e incompreensões concebíveis no processo comunicativo. Afinal, a seca inesperada é um motivo de força maior que desobriga o sojicultor da entrega dos grãos na data acertada ou ele deveria ter previsto a possibilidade da seca quando assinou o contrato? O que é força maior? Evidente que esta questão pode ser resolvida na justiça ou por um árbitro, mas não costuma ser óbvia ou previsível a interpretação que estes novos envolvidos farão a respeito desta situação concreta, permanecendo ou até aumentando a incerteza secundária. Finalmente, nunca se terá certeza a respeito dos atributos morais da outra parte contratante. Um agente aparentemente confiável e com boa reputação pode se revelar subitamente um ladino oportunista, aproveitando uma brecha contratual ou alguma situação não regulada contratualmente para tirar proveito da outra parte, gerando uma incerteza que Williamson tipifica por terciária. A última direção explorada pela teoria dos custos de transação diz respeito à existência de ativos específicos ao relacionamento, fato que costuma ampliar muito a dependência bilateral entre as partes contratantes, aumentado os custos das transações de mercado. Um ativo específico ao relacionamento é aquele que perde boa parte de seu valor fora dele, quer dizer, um ativo cujo valor depende intrinsecamente da relação de mercado. A especificidade de ativos aparece sob 31 variadas formas, destacando-se na literatura cinco situações típicas: (i) especificidade de localização, em que firmas se localizam bastante próximas umas das outras com a finalidade de reduzir custos com estoques e transporte, (ii) especificidade de ativos físicos, na qual máquinas ou equipamentos úteis apenas (ou majoritariamente) no relacionamento estão envolvidos, (iii) especificidade de capital humano, relacionada aos esforços de aprendizado específicos, que “amarram” o empregado à firma ou vice-versa, (iv) ativos dedicados, que são investimentos realizados exclusivamente para atender as necessidades de determinado cliente, e, (v) existência de capital de marca, que pode ter seu valor substancialmente reduzido por ações oportunistas por parte de um associado ou franqueado que não participou dos investimentos na marca. Apesar dos importantes insights trazidos pela teoria dos custos de transação na análise das firmas, a generalidade com a qual seus argumentos são apresentados dificulta a realização de testes empíricos que permitiriam um posicionamento mais objetivo a seu respeito. Pode-se dizer que esta abordagem é flexível e abrangente demais, o que pode ser uma fragilidade quando se pretende encontrar proposições científicas bem definidas e sujeitas ao crivo dos estudos econométricos. Sem questionar a importância deste pano de fundo convincente fornecido pela abordagem dos custos de transação, mas procurando detalhá-lo e aprofundar o conhecimento sobre as firmas, aparecem as contribuições dos modelos de Agência e dos Direitos de Propriedade. A Economia da Informação é campo de estudo relativamente novo, mas desde a década de 1970 encontrou na análise da firma um campo de aplicação fértil. Aqui se destaca o modelo Agente-Principal, uma estrutura lógica geral para o tratamento de problemas econômicos envolvendo assimetria informacional, situações em que os conjuntos de informações à disposição dos agentes econômicos são diferentes, embora importantes à tomada de decisões em seu relacionamento. O problema clássico se define na contraposição dos interesses de um agente denominado “principal”, proprietário de determinados recursos econômicos, que depende das escolhas de um “agente”, cuja função é administrar ou operar os recursos do principal. Enfocando a dimensão informacional desta 32 delegação de poderes, as dificuldades aparecem no desenvolvimento de um esquema de incentivos que faça com que o agente escolha de acordo com os interesses do principal, tarefa nem sempre simples quando o agente dispõe de informações que não são acessíveis ou podem ser verificadas pelo principal. Três tipos básicos de problemas de agência têm uso imediato na teoria da firma, aqui sendo apresentados apenas com o intuito de ilustração, pois apesar de recente, a literatura a respeito é bastante volumosa e rica em detalhes. Fala-se em problemas de moral hazard (dano ou risco moral) quando a criação de um relacionamento contratual dá margem, ex post, a ações oportunistas em função do diferencial de informações entre agente e principal. Num interessante estudo, Bertand e Mullainathan (2003) avaliam o impacto de leis que dificultam a tomada de controle de uma firma por outra (takeover) sobre o comportamento dos diretores destas empresas. Eles constatam, com a análise de mais de 7500 grandes empresas norte-americanas, que a redução dos riscos de demissão por takeover parece afetar as escolhas feitas pelos altos executivos, com aumento dos salários do staff mais graduado, redução dos investimentos em novas plantas fabris e diminuição dos lucros e rentabilidade. Tal comportamento sugere que os altos executivos (agentes) escolhem de forma mais agressiva e alinhada com os interesses dos acionistas (principais) quando temem que indicadores de desempenho modestos aumentem as chances da empresa que dirigem ser adquirida por outra corporação. Entende-se que a ameaça de perda do controle via takeover seja um mecanismo para reduzir os problemas de moral hazard. Os modelos de classificação são outra modalidade de aplicação da abordagem da Agência. Aqui a assimetria informacional aparece como um problema que pode ser mitigado através do envio (signaling) ou captação de sinais específicos (screening). Weiss (1995) e Garner (1985) vão usar o argumento de sinalização para associar salários a níveis educacionais dos empregados, servindo o histórico acadêmico tanto como sinal de competência quanto como critério de seleção por empregadores. À medida que o tamanho da empresa aumenta, também se ampliam os problemas de assimetria informacional, sendo interessante notar que na amostra analisada por Garner encontra-se tanto uma menor dispersão dos 33 salários por nível de formação dos empregados, como o pagamento de salários relativamente mais altos em firmas maiores do que nas empresas médias e pequenas. O terceiro tipo de modelo de Agência é o de seleção adversa, em que a assimetria de informação serve como justificativa para a realização de escolhas ineficientes ou socialmente indesejáveis. Landers et al. (1996) fazem uma avaliação interessante dos esquemas de remuneração em grandes escritórios de advocacia, em que é freqüente o uso do número de horas de trabalho dos associados como critério de promoção a sócio da firma. Como aqueles que trabalham mais horas têm uma chance maior a serem promovidos a sócios, há uma tendência para que, no decorrer do tempo, todos – associados e sócios - estejam trabalhando horas demais e com menor eficiência. Colateralmente, bons advogados que percebem a situação de trabalho excessivo evitarão trabalhar em escritórios com tal esquema de incentivos, que perde em qualidade ao selecionar os sócios pelo critério quantitativo. A Teoria dos Direitos de Propriedade seguirá um enfoque compatível com as linhas gerais para aanálise da firma proposta por Coase, sendo também consistente com as aplicações de Economia da Informação recém apresentadas. A novidade deste enfoque da propriedade decorre da peculiar definição de firma que utiliza. A firma, para a Teoria dos Direitos de Propriedade, será um conjunto de ativos que ela utiliza, sendo proprietário da firma aquele(s) que possuam direitos residuais de controle sobre estes ativos. A noção de direitos de propriedade empregada não difere muito da tradicionalmente usada pelos juristas, querendo significar o conjunto de prerrogativas de usar, fruir e dispor, com exclusividade e nos limites legais, de determinado recurso econômico. Nas transações de mercado, os agentes realizam contratos pelos quais dispõem, total ou parcialmente, de seus direitos de propriedade. Os problemas interessantes e que são enfatizados pelos principais autores desta corrente, como Sanford Grossman e Oliver Hart, aparecem quando há custos de transação que impedem a realização de contratos completos, que especificariam de forma compreensiva os direitos transacionados com previsão 34 para toda e qualquer contingência possível. Nos contratos incompletos apenas direitos específicos são transacionados, restando com o proprietário todas as prerrogativas de que não abriu mão contratualmente, os denominados direitos residuais de controle. São estes direitos residuais de controle que determinam a propriedade da firma, quando eles são vendidos, a transferência de propriedade é total. A importância da propriedade ou dos direitos residuais de controle decorre da manutenção do controle em situações não previstas contratualmente. Através da comparação dos problemas econômicos envolvidos quando os direitos residuais de controle permanecem com as partes contratantes ou são adquiridos pela(s) outra(s), os modelos deste enfoque conseguem gerar explicações precisas e passíveis de verificação empírica, em aperfeiçoamento teórico de extrema relevância para a nova teoria da firma. Palavras-chave Firma neoclássica Tecnologia de Produção Firma Uniproduto Firma Multiproduto Produto Médio Produto Marginal Retornos de Escala Custo de Oportunidade Custos Irreversíveis Custos Evitáveis e Inevitáveis Horizonte de Planejamento 35 Economias de Escala Internas e Externas Economias de Escopo Custos na Firma Multiproduto Novas Teorias da Firma Custos de Transação Racionalidade Limitada Comportamento Oportunista Modelo Agente Principal Teoria dos Direitos de Propriedade Modelo U Modelo M Exercícios Sugeridos 1) Em que sentido a firma pode ser entendida como uma caixa preta? Por que uma percepção assim tão rudimentar não é simplesmente desconsiderada? 2) Defina tecnologia de produção. Escolha uma firma de sua preferência, descrevendo a tecnologia produtiva por ela empregada. 3) Um economista agrícola descreve a função de produção de um determinada cultura através de uma função Cobb-Douglas, cuja fórmula genérica é dada por 1 2q Ax x α β= . Defina os conceitos de produto médio e produto marginal para esta monocultura. Usando a função apresentada, encontre os produtos médios e marginais de cada um dos inputs empregados. 36 4) Diferencie curto e longo prazo para a produção em Economia. Intervalos de tempo inferiores a um mês sempre serão curto-prazo? Justifique. 5) Como se classificam as tecnologias de produção em função de seus retornos de escala? Mostre as fórmulas. 6) Qual a justificativa para se usar a noção de custos econômicos em vez dos custos contábeis, já que estes últimos são facilmente disponíveis? 7) No curtíssimo prazo, praticamente todos os custos são fixos, isto significa que os custos marginais são nulos? (Carlton & Perloff, Cap. 2 Ex. 5) 8) Qual a diferença entre custos variáveis e custos evitáveis? Todos os custos fixos são inevitáveis? 9) Uma firma percebe que seus custos médios estão aumentando enquanto paradoxalmente os custos marginais estão caindo. Está havendo um erro no cálculo destes custos? 10) Os custos médios de uma firma mostram comportamento de queda ã medida que aumenta a escala de produção. O que poderia estar causando isto? 11) Como se decide, com fundamento nos custos, se é conveniente ampliar o mix de produção? Que fatores costumam estimular a diversificação da oferta de uma firma? 12) Por que a medida de economias de escopo não pode superar à unidade se os custos marginais forem sempre positivos? (Carlton & Perloff, Cap. 2 Ex. 8) 13) Uma firma considera a produção conjunta de dois produtos, conhecendo as seguintes funções custo: ( )1 2 1 2, . 800 8 2CT q q q q= + + ( )1 1,0 500 8CT q q= + ( )2 20, 700 2CT q q= + Esta firma deve produzir os bens conjuntamente ou a produção separada é mais interessante? Encontre os custos médios de produção, qualquer que seja 37 a sua resposta para a questão anterior. Há economias de escala na produção conjunta dos dois bens? E economias de escala específicas? 14) Quais as principais fontes dos custos de transação? Em que esta abordagem diverge da teoria da firma tradicional? 15) O que é uma estrutura de governança? O mercado pode ser considerado uma destas estruturas? Justifique. 16) De que formas a incerteza, a freqüência no relacionamento e a presença de ativos específicos pode afetar os custos de transação? 17) O que é o modelo de Agente-Principal e que fenômenos da teoria da firma ele ajuda a entender? 18) Explique qual a diferença entre a teoria dos direitos de propriedade e dos custos de transação na explicação da natureza e limites das firmas. Leituras Sugeridas Coase, R. H. (1988). The Firm, the Market and the Law. USA: Chicago Press. – livro que inclui os clássicos artigos “The Nature of the Firm” e “The Problem of Social Cost”. Hart, O. (1996). Firms, Contracts and Financial Structure. New York: Claredon Press - Oxford. – Para uma apresentação recente e acessível às abordagens disponíveis à análise da firma, com ênfase na teoria dos direitos de propriedade. Holmstrom, Bengt R., and Jean Tirole. "The Theory of the Firm." In Schmalansee, Richard, and Robert Willig. Handbook of Industrial Organization, Vol I. Amsterdam: North-Holland, 2001. P. 63-133. – Para uma survey mais detalhada sobre as novas abordagens à teoria da firma. Williamson, Oliver E. "The Modern Corporation: Origins, Evolution, Attributes." Journal of Economic Literature XIX (Dec. 1981): 1537-1568. – para uma discussão detalhada da abordagem dos custos de transação 38
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