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Art. 155 Furto

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Direito penal: parte especial
Prof. MsC. Eduardo Ferraz
FURTO
Legislação
Art. 155. Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1º A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.
§ 2º Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.
§ 3º Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.
Furto qualificado
§ 4º A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:
I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;
II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;
III - com emprego de chave falsa;
IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.
§ 5º A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior.
Bem jurídico
Posições:
Somente o direito de propriedade.
Somente a posse.
A posse e a propriedade
A posse, a propriedade e a detenção (legítima). É a mais aceita. A posse (relação de fato estabelecida entre o indivíduo e a coisa, pelo fim de sua utilização econômica) é tutelada imediatamente; a propriedade (o direito de usar, gozar e dispor da coisa (jus utendi, fruendi et abutendi)), mediatamente.
Sujeito ativo
É um delito comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa.
Pode o proprietário ser autor do delito de furto? Para parte da doutrina, sim, vez que esta seria a violação da posse, e esta é o bem jurídico imediatamente tutelado, caracterizando-se como coisa alheia móvel vez que seu possuidor deixa de dispor/gozar imediatamente da coisa. Em sentido contrário, afirma-se que não, vez que já existe o delito de furto de coisa comum (art. 156), e não há como incluí-lo, nesse tipo, como autor de crime contra si próprio; argumenta-se ainda o absurdo de considerar um coisa como própria e alheia ao mesmo tempo, e; existe a previsão da subtração de coisas embargadas ou seqüestradas cometidas pelo proprietário. Para Cezar Bitencourt, o fato é atípico.
O possuidor não pode ser sujeito ativo, já que se encontra na posse da coisa, podendo responder, unicamente, por apropriação indébita.
Sujeito passivo
O proprietário, o possuidor e o detentor (de boa-fé).
A pessoa jurídica pode ser sujeito passivo do crime de furto.
Tipo objetivo
Subtrair coisa alheia móvel, para si ou para outrem.
Subtrair significa tirar, retirar, surrupiar, tirar às escondidas. Subtrair não é, porém, a simples retirada da coisa do lugar em que se encontrava, e sim subtraí-la para sujeitá-la ao seu poder de disposição. Esse poder de disposição deve ser com animus definitivo.
Pode ser de forma clandestina ou manifesta, e pressupõe o não consentimento da vítima. Caso este esteja presente, deve ser preexistente ou concomitante ao ato da apreensão da res, e exige que a anuência tenha sido feita por quem tenha o poder disposição sobre a coisa, e que este possua capacidade de entender e querer.
Como delito de forma livre, a subtração pode ser feita mediante a apreensão direta da coisa, com o emprego de instrumentos, com a utilização de um animal adestrado, ou até mesmo com a utilização de interposta pessoa (autoria mediata), sendo indiferente sua prática na presença ou ausência da vítima.
Elementos normativos: coisa
Coisa, para fins penais, é tudo que possa ser objeto da ação física de subtrair, isto é, coisa corpórea, passível de ser deslocada, transportada de um lugar para o outro. Não afasta a idoneidade da coisa sua eventual intangibilidade, desde que possa ser apreendida (o ar, a luz, a água dos mares e dos rios e o calor do sol não podem ser consumidos em sua totalidade, mas podem ser aproveitados como força ou energia). O mesmo vale para os direitos de crédito, que embora não susceptíveis de furto, furtados podem ser os títulos que lhes representam.
A coisa deve ter um valor econômico? Alguns consideram que o delito patrimonial deve constituir uma lesão à um interesse jurídico de cunho econômico. Outros, embora reconheçam a importância do caráter econômico, consideram que um bem moral constituído por uma coisa deve ser considerado coisa no sentido jurídico, por que a coisa pode não ter valor para o autor da ação, mas pode ser significativa para a vítima, sendo-lhe útil ao atender suas necessidades, como a de afeição, por ex.
Elementos normativos: alheia
Alheia é um termo utilizado para indicar que a coisa, objeto de furto, pertence outrem, que não o sujeito ativo. Faz-se necessário demonstrar que a res furtiva pertence a alguém, sendo irrelevante seu possuidor ou proprietário.
Não podem ser objeto de furto:
as coisas sem dono (res nullius),
as coisas abandonadas, quando seu dono renunciou a propriedade (res derelictae) (que não se confundem com as coisas perdidas (ver art. 169, II), vez que o seu proprietário não renunciou a sua propriedade, apenas ignora o local em que elas se encontram), e;
as coisas comuns (res communis omnium), que podem, todavia, ser captadas e transformadas em energia, aptas a serem objeto de furto. O desvio desta, porém, configura o crime de usurpação (art. 161, CP).
Elementos normativos: móvel
Móvel. Não vale para o Direito Penal a equiparação feita pelo Direito Civil ao definir determinados bens como imóveis por ficção (arts. 81 e 1473, VI, CC).
Para o Direito Penal, para que uma coisa seja móvel, é suficiente a possibilidade de remoção, deslocamento, apreensão, transporte, de um lugar para o outro. Os imóveis, se mobilizados, podem ser furtados.
Os direitos reais, considerados móveis pelo art. 83, II, CC, não podem ser objeto de furto, vez que não possuem materialidade que os torne susceptíveis de apreensão.
Tipo subjetivo
É o dolo (vontade e consciência) de subtrair coisas alheia móvel, e;
o elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de apoderar-se da coisas subtraída, para si ou para outrem. Necessário o animus rem sibi habendi.
Caso o agente acredite ser a coisa sua, haverá erro de tipo (art. 20, caput, CP), excluindo a tipicidade por falta de modalidade culposa, salvo se se tratar de simulacro de erro.
Furto de uso: crime ou fato atípico?
A ausência do animus apropriativo desnatura o furto, havendo inversão do ônus da prova, devendo o agente demonstrar que a finalidade da subtração era outra. Este é o caso, por ex., do furto de uso, um indiferente penal. O furto de uso, aliás, tem como requisitos:
intenção, desde o início, de uso momentâneo da coisa subtraída;
coisa não consumível; 
restituição imediata e integral à vítima.
Nelson Hungria vê no furto de uso de um automóvel um autêntico furto em relação a gasolina e ao óleo. A doutrina moderna, entretanto, exige para a caracterização do furto pelo simples uso um desfalque juridicamente apreciável no patrimônio da vítima, desfalque esse que não se dá com o mero gasto dos pneus ou do combustível.
É irrelevante a intenção de lucrar, vez que a conduta poderá ter sido realizada por mero capricho ou vingança e ainda assim continuará sendo furto.
Causa de justificação no furto: o furto famélico
A jurisprudência tem reconhecido a inexistência de crime em virtude do estado de necessidade (art. 24, CP), presentes os seguintes requisitos:
que o fato seja praticado para mitigar a fome; 
que seja o único e derradeiro recurso do agente (inevitabilidade do comportamento lesivo);
que haja a subtração de coisa capaz de diretamente contornar a emergência, e;
a insuficiência dos recursos adquiridos pelo agente com o trabalho ou a impossibilidade de trabalhar.
Consumação
Tem-se quatro correntes:
Contrectatio: a consumação se dá pelo simples contato entre o agente e a coisa alheia, dispensado o seu deslocamento.
Amotio (ou apprehensio, também conhecida como teoria da inversão da posse): dá-se a subtração quando a coisa subtraída passar para o poder do agente (quando há
inversão da posse, isto é, quando esta for mansa e pacífica), mesmo que num curto espaço de tempo, independentemente de deslocamento.
Ablatio: a consumação se dá quando o agente, depois de apoderar-se da coisa, consegue deslocá-la de um lugar para o outro.
Ilatio: para ocorrer consumação a coisa deve ser levada ao local desejado pelo ladrão para ser mantida a salvo.
Consumação (cont.)
O STF e o STJ adotam a segunda posição. Consumado está o delito no momento em que perde o proprietário, no todo ou em parte, a possibilidade do contato material com a coisa ou de exercício de custodia dominical, seja por que o agente logrou bem sucedida fuga, seja por que destruiu a coisa apoderada.
Nelson Hungria destacava circunstâncias em que o furto era considerado perfeito, mesmo que a res furtiva permanecesse no âmbito pessoal ou profissional da vítima. É o caso, por ex., da criada que sub-repticiamente empolga uma jóia da patroa e a esconde no seio ou mesmo nalgum escaninho da casa, para, oportunamente, sem despertar suspeitas, transportá-la a lugar seguro.
Tentativa
É perfeitamente possível, por se tratar de crime material.
Nelson Hungria formula a seguinte hipótese: “o indivíduo, visando ‘surrupiar’ dinheiro do bolso da calça de transeunte, se depara com a algibeira vazia.” O caso é de tentativa punível ou de crime impossível?
Para Hungria seria caso de tentativa, vez que foi por mero caso fortuito que deixou de ter êxito o crime. É a opinião dominante.
Bitencourt distingue duas posições: 1ª) Se a vítima tem dinheiro acondicionado em outro bolso, o seu bem jurídico (patrimônio) corre sério risco; 2ª) Se a vítima não tem dinheiro algum no momento, não há qualquer risco a seu patrimônio, em face da inexistência do bem. Na primeira posição, a impropriedade do objeto é relativa, há tentativa. Na segunda, é absoluta, tratando-se de crime impossível.
Outra hipótese é a de furto em supermercados. A vigilância física e eletrônica existente nos mesmos não torna, por si só, o crime impossível, devendo ser analisada, no caso concreto, a absoluta ou relativa ineficácia do meio.
Majorante: repouso noturno (§ 1º)
De acordo com o § 1º, a pena é aumentada de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno. Referido aumento não se aplica as formas qualificadas do furto, mas deve ser levado em consideração na aplicação da pena (art. 59, CP).
Por furto noturno deve entender-se não o período da noite, mas deve compreender o momento, segundo os costumes locais, que as pessoas estejam repousando.
Existem vários posicionamentos acerca da necessidade de ser o locar do crime habitado ou não. Vejamos:
O lugar precisa ser habitado, com pessoa repousando.
O lugar não precisa ser habitado.
Os moradores não devem estar acordados.
Não se exige a presença de moradores.
Magalhães Noronha e Régis Prado entendem não ser necessário que a casa seja habitada. Cezar Bitencourt, ao lado da doutrina e jurisprudência dominantes, afirma que não incidirá a majorante se for em local desabitado ou na ausência dos moradores.
Furto privilegiado (§ 2º)
A partir do diminuto desvalor do resultado, o injusto é menor, conseqüentemente também a pena é menor. Tem como requisitos:
Pequeno valor da coisa;
Primariedade do agente.
O que é pequeno valor? Atualmente, o salário mínimo é a base para delimitá-lo, e o valor da res deve ser apreciado no momento da consumação, e não depois. Deve-se analisar, não com precisão matemática, a situação financeira da vítima e comparar com o salário mínimo vigente ao tempo do fato.
A redução da pena é um direito público subjetivo do réu.
Para a maioria da doutrina, o privilégio não se coaduna com o furto qualificado, embora atualmente haja entendimento favorável em nossos tribunais.
Furto e princípio da insignificância (ou princípio da bagatela)
O STF e o STJ tem aceito a aplicação do princípio da insignificância (ou princípio da bagatela) no crime de furto, quando presentes:
A mínima ofensividade da conduta do paciente;
Ausência de periculosidade social da ação;
Reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento;
Inexpressividade da lesão jurídica provocada.
O problema reside na extrema subjetividade desses critérios, que acabam levando em consideração a personalidade do autor, quando deveriam se limitar a dados objetivos da conduta.
Cláusula de equiparação (§ 3º)
O § 3º equipara à coisa móvel a energia elétrica e outras (genética, mecânica, térmica e a radioatividade), desde que tenham valor econômico.
Toda energia economicamente utilizável e susceptível de incidir no poder de disposição de uma pessoa pode ser incluída entre as coisas móveis.
Em relação à subtração de energia elétrica, registre-se que nem sempre caracteriza furto. Diz-se furto quando o agente subtrai a energia antes do medidor. Se, entretanto, se utilizar de algum instrumento para viciar o medidor, fazendo com que este registre menos energia, é estelionato.
Cláusula de equiparação (§ 3º) (cont.)
É possível o furto de sinal de TV a cabo? Para Bitencourt, o sinal de TV a cabo não pode ser equiparado à coisa móvel, pois constituiria uma interpretação extensiva. A energia se consome, se esgota, ao passo que o sinal de televisão não se gasta, mesmo que metade do país acesse o sinal ao mesmo tempo. Quem utilizada clandestinamente de sinal de televisão, não o retira e tampouco se apossa, não havendo qualquer diminuição no patrimônio alheio. Para Nucci, é possível.
Sobre o tema, o STJ manifesta-se em sentido favorável. Em sentido contrário, o STF, informativo nº 623, considerando a conduta de ligação clandestina de sinal de TV a cabo como penalmente atípica.
E em relação aos pulsos telefônicos? Para uns, não há furto, pois não tem capacidade energética. Para outros, configura furto, pois há a subtração de algo que não lhe pertence, os pulsos telefônicos, e há dano patrimonial.
Furto qualificado (§ 4º, I)
Com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa. A violência deve ser contra obstáculo que dificulta a subtração e não contra a própria coisa. Não qualifica o crime a violência contra o obstáculo que é inerente à própria coisa. Exige-se o exame de corpo de delito.
Furto qualificado (§ 4º, II)
Com abuso de confiança. Predomina o entendimento de que não basta a simples relação de emprego, sendo necessária a relação subjetiva de confiança. Essa relação não se comunica aos partícipes, por ser particular.
Ou mediante fraude. É o emprego de ardil ou artifício para a subtração da coisa. O furto praticado mediante fraude difere do estelionato: naquele a fraude é empregada para iludir a atenção ou vigilância do ofendido, que não percebe que a coisa lhe é subtraída; neste, a fraude antecede o apossamento da coisa e é causa de sua voluntária entrega ao agente pela vítima (a fraude motiva o consentimento).
Escalada. Considera-se escalada a entrada no local por via anormal, predominando a opinião de que tal entrada requer o emprego de meio instrumental (escada) ou esforço incomum.
Ou destreza. Pressupõe ação dissimulada e especial habilidade do agente. Não configura o arrebatamento violente ou inopinado.
Furto qualificado (§ 4º, III)
Com emprego de chave falsa. Chave falsa é o instrumento falso, com ou sem forma de chave, com a finalidade de fazer funcionar o mecanismo de uma fechadura ou dispositivo análogo. Em que pese a existência de julgados em contrário, é pacífico na doutrina que a chave verdadeira não pode ser considerada “chave falsa”.
Furto qualificado (§ 4º, IV)
Mediante concurso de duas ou mais pessoas. A pluralidade de agente (duas ou mais pessoas) também é causa de aumento de pena, sendo necessário que todos participem da execução do delito, direta ou indiretamente, sendo prescindível que todos estejam no local do crime ou sejam imputáveis. Aplica-se a regra do art. 29, CP.
Furto qualificado (§ 5º)
Figura criada pela Lei nº 9.426/96, possui dois requisitos:
Que o objeto furtado seja veículo automotor. Veículo automotor compreende os automóveis, caminhões, ônibus, motocicletas,
lanchas, aeronaves etc., ficando excluídos os movidos a tração humana ou animal. As peças avulsas de um veículo não configuram a presente qualificadora; poderá configurar, todavia, quando se tratar de todo um veículo desmontado.
Que o veículo venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. Caso o agente, com a posse pacífica do veículo, tenha sido descoberto antes de atravessar a divida do Estado em que o veículo foi furtado, ou antes de atravessar a fronteira do Brasil (v.g.: Estado do Paraná e Paraguai), não pode incidir a presente qualificadora. Assim, Delmanto, Bitencourt, Nucci. Contra, Damásio. Registre-se que há, na presente qualificadora, uma omissão legislativa quanto ao transporte de veículo automotor de um Estado para o Distrito Federal.
Ação penal
Com as ressalvas do art. 182, CP, a ação penal é pública incondicionada.

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