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2010 Aleitamento Materno manual febrasgo2 miolo.indd 1 27/8/2010 14:59:02 manual febrasgo2 miolo.indd 2 27/8/2010 14:59:02 Aleitamento Materno Manual de Orientação Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia Comissões Nacionais Especializadas Ginecologia e Obstetrícia Aleitamento Materno Presidente: Corintio Mariani Neto (SP) Vice-Presidente: Antonio Fernandes Lages (MG) Secretária: Márcia Maria Auxiliadora de Aquino (SP) Membros Alexandre Vieira Santos Moraes (GO) Ariani Impieri Souza (PE) Heitor Hentschel (RS) Juracy dos Santos Freire (GO) Luciane Maria Oliveira Brito (MA) Margarida Silva Nascimento (BA) Newton Tomio Miyashita (SP) Noélia Pedrosa Brito (SP) Sérgio Makabe (SP) Vander Guimarães Silva (RJ) Wellington Ferreira Brum (AC) manual febrasgo2 miolo.indd 3 27/8/2010 14:59:04 manual febrasgo2 miolo.indd 4 27/8/2010 14:59:04 Manual de Aleitamento Materno Colaboradores Alexandre Vieira Santos Moraes Ana Cristina F. de Vilhena Abrão Ana Júlia Colameo Ana Márcia Correa Gomes Ariani Impieri de Souza Corintio Mariani Neto Cristina Aparecida Falbo Guazzelli Evanguelia Kotzias Atherino dos Santos Fátima Maria Bessa Lafayette Geisy Maria de Souza Lima Gláucia Virgínia de Queiroz Lins Guerra Joana Saioko Watanabe Kuzuhara Joel Alves Lamounier José Eduardo Nestarez Keiko Teruya Kelly Pereira Coca Laís Graci dos Santos Bueno Márcia Maria Auxiliadora de Aquino Margarida Silva Nascimento Maria Isabel A. L. Nestarez Maria José Guardia Mattar Newton Tomio Miyashita Nilson Roberto de Melo Noélia Pedrosa Brito Roberto Gomes Chaves Rui de Paiva Sérgio Makabe Sonia Isoyama Venancio Teresa Cristina Semer Tereza Setsuko Toma Vander Guimarães Vilneide Braga Serve manual febrasgo2 miolo.indd 5 27/8/2010 14:59:04 manual febrasgo2 miolo.indd 6 27/8/2010 14:59:04 7 ÍNDICE A GLÂNDULA MAMÁRIA ............................................................................................................... 11 Introdução .................................................................................................................................................11 Embriologia mamária .................................................................................................................................11 Desenvolvimento puberal ...........................................................................................................................12 Anatomia da mama ....................................................................................................................................13 Fisiologia da mama ....................................................................................................................................13 Ciclo menstrual ........................................................................................................................................15 Puerperalidade ............................................................................................................................................15 BENEFÍCIOS DO ALEITAMENTO MATERNO .............................................................................. 17 Para a mulher .............................................................................................................................................17 Para a criança .............................................................................................................................................17 Para a família, a instituição e a sociedade ....................................................................................................18 O pApEL DO OBSTETRA NO INCENTIvO AO ALEITAMENTO MATERNO ........................... 19 No pré-natal ...............................................................................................................................................19 No trabalho de parto ..................................................................................................................................20 No parto ...................................................................................................................................................20 Na cesariana ...............................................................................................................................................20 No puerpério ..............................................................................................................................................21 ALEITAMENTO MATERNO EXCLUSIvO ...................................................................................... 23 Definição de aleitamento materno exclusivo ...............................................................................................23 Duração ideal do aleitamento materno exclusivo ........................................................................................23 Impacto do aleitamento materno exclusivo sobre a saúde materno-infantil .................................................24 Situação do aleitamento materno exclusivo no Brasil e seus determinantes .................................................25 Estratégias para a proteção, promoção e apoio ao aleitamento materno exclusivo ........................................26 TÉCNICAS EM ALEITAMENTO ...................................................................................................... 29 Posicionamento ..........................................................................................................................................29 Pega ............................................................................................................................................................30 Sucção efetiva .............................................................................................................................................30 Posição da mãe para amamentar .................................................................................................................31 Término da mamada ..................................................................................................................................31 Amamentação de gêmeos ...........................................................................................................................32 pRINCIpAIS INTERCORRÊNCIAS MATERNAS LOCAIS .............................................................. 35 Introdução .................................................................................................................................................35 Classificação das principais intercorrências locais ........................................................................................35 Considerações finais ...................................................................................................................................42 INTERCORRÊNCIAS MATERNAS GERAIS .................................................................................... 43 Infecções que merecem cuidado especial .....................................................................................................44 manual febrasgo2 miolo.indd 7 27/8/2010 14:59:04 8 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno pRINCIpAIS INTERCORRÊNCIAS NEONATAIS ............................................................................ 47 Introdução .................................................................................................................................................47 Bebês normais ............................................................................................................................................48 Bebê que “não sabe mamar” .......................................................................................................................48Bebê que não consegue manter a pega ........................................................................................................48 Bebê chorão ...............................................................................................................................................49 Gêmeos ......................................................................................................................................................50 Bebê dorminhoco ......................................................................................................................................50 Bebês com outras necessidades....................................................................................................................51 QUEIXAS COMUNS DAS NUTRIZES ............................................................................................. 55 Queixas durante o período de internação e após a alta hospitalar ................................................................56 pRÁTICAS COMUNS QUE pREJUDICAM A AMAMENTAÇÃO ................................................... 69 Amamentação: importância e barreiras .......................................................................................................69 Práticas que prejudicam a amamentação .....................................................................................................70 Considerações finais ...................................................................................................................................75 USO DE MEDICAMENTOS DURANTE A LACTAÇÃO .................................................................. 77 Conceitos ...................................................................................................................................................77 Classificação dos fármacos para uso durante a amamentação ......................................................................77 Implantes mamários de silicone ..................................................................................................................84 Fármacos que alteram o volume do leite materno .......................................................................................84 Princípios básicos para uso de fármacos durante a amamentação ................................................................85 ANTICONCEpÇÃO DURANTE O ALEITAMENTO ....................................................................... 87 Retorno da fertilidade .................................................................................................................................87 Quando iniciar o método anticoncepcional? ...............................................................................................88 Métodos contraceptivos ..............................................................................................................................88 AMAMENTAÇÃO E SEXUALIDADE ................................................................................................ 91 Amamentação e sexualidade infantil ...........................................................................................................91 Amamentação e sexualidade da mulher puérpera ........................................................................................92 Considerações finais ...................................................................................................................................93 INIBIÇÃO DA LACTAÇÃO: INDICAÇÕES E ESQUEMAS ............................................................. 95 Introdução .................................................................................................................................................95 Indicações para inibição da lactação ............................................................................................................95 Métodos para inibição ................................................................................................................................96 Terapia medicamentosa de apoio ................................................................................................................99 O ALOJAMENTO CONJUNTO ...................................................................................................... 101 MÉTODO MÃE CANGURU ........................................................................................................... 107 Introdução ...............................................................................................................................................107 Histórico ..................................................................................................................................................108 BANCO DE LEITE HUMANO ........................................................................................................ 113 Processamento ..........................................................................................................................................116 Administração (Ministério da Saúde, 2008) ..............................................................................................119 INICIATIvA HOSpITAL AMIGO DA CRIANÇA ........................................................................... 121 Evidências científicas que sustentam os Dez Passos ...................................................................................122 manual febrasgo2 miolo.indd 8 27/8/2010 14:59:04 9 LEGISLAÇÃO E NBCAL. pROTEÇÃO LEGAL À MATERNIDADE E À AMAMENTAÇÃO NO BRASIL ................................................................................................ 129 Introduzindo a Temática: Amamentação, Maternidade e Trabalho ............................................................129 Direitos Relacionados à Maternidade e à Amamentação no Brasil ...........................................................130 Normas Constitucionais e Legais ..............................................................................................................131 EvIDÊNCIAS CIENTÍFICAS SOBRE O SUCESSO DO ALEITAMENTO MATERNO ................. 137 LEITURAS SUpLEMENTARES ...................................................................................................... 139 manual febrasgo2 miolo.indd 9 27/8/2010 14:59:04 manual febrasgo2 miolo.indd 10 27/8/2010 14:59:04 11 A GLÂNDULA MAMÁRIA José Eduardo Nestarez Maria Isabel A. L. Nestarez INTRODUÇÃO As glândulas mamárias constituem uma característica que distingue os mamíferos. Evoluíram como órgãos produtores de leite para nutrir a prole, que nasce em estado imaturo e dependente. A amamentação, além de alimentar e imunizar o filho, produz involução uterina puerperal. A mama é um conjunto de tecido glandular, gordura e tecido conjuntivo fibroso, situada acima dos músculos peitorais da parede torácica, aos quais está aderida por tra- ves de tecido fibroso, os ligamentos de Cooper. Uma camada de tecido adiposo envolve toda a glândula, penetrando na mesma. Este tecido é que confere à glândula mamária sua consistência típica. O tecido glandular é composto dos lóbulos (extremidade final dos lobos, produtores de leite) e dos ductos (conduzem o leite). Cada ducto, na proximidade do mamilo, dilata-se em forma de saco (seio lactífero), onde a secreção láctea se acumula antes da amamentação. EMBRIOLOGIA MAMÁRIA O tecido mamário humano começa seu desenvolvimento a partir da sexta semana de vida intrauterina. A glândula mamária origina-se de um espessamento em fita da epiderme, a chamada linha mamária. Na fase embrionária, essa linha se estende desde a base dos membros superiores (axilas) até a raiz dos membros inferiores, incluindo os CapÍtulo 1 manual febrasgo2 miolo.indd 11 27/8/2010 14:59:04 12 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno grandes lábios davulva. Até este momento, não existem diferenças entre os sexos femini- no e masculino. Entre as várias espécies de mamíferos, o número de glândulas pareadas varia muito, tendo relação com o tamanho da prole. No ser humano, a partir da nona semana, a linha mamária regride, deixando apenas dois botões na metade superior da parede torácica. Com o desenvolvimento, no sexo feminino, ela penetra no mesênquima subjacente, formando 15 a 20 esboços epiteliais que se ramificam e se canalizam, para formar os alvéolos e ductos, que mantêm contato com a linha mamária original na epiderme. Com a proliferação do tecido conjuntivo, forma-se o mamilo. Em cerca de 1% dos casos podem permanecer mamas (polimastia), ou mamilos extras (politelia). Geralmente essas glândulas anômalas estão na linha mamária. Os recém-nascidos (RN) de ambos os sexos apresentam glândulas mamárias pe- quenas, podendo apresentar alguma descarga papilar neonatal consequente à ação dos hormônios maternos. DESENvOLvIMENTO pUBERAL No sexo feminino, as mamas permanecem quiescentes até os 11 ou 12 anos, quando começa a atividade ovariana. O início se dá com o aparecimento dos pelos pubianos (pubarca). Depois ocorre a telarca, pela ação do estrogênio e posteriormente da proges- terona. Pode ser um período doloroso para as adolescentes. O crescimento continua até a menarca, que sugere a preparação das mamas para a lactação. Geralmente, a primeira menstruação ocorre de um a dois anos após o início do desenvolvimento mamário. Figura 1: Estágios de Tanner desenvolvimento mamário Fonte adaptada de Marshall WA e Tanner JM (1969) manual febrasgo2 miolo.indd 12 27/8/2010 14:59:05 13 A Glândula Mamária ANATOMIA DA MAMA Por volta dos 20 anos, a mama atinge seu maior desenvolvimento e, a partir dos 40 anos, começam as alterações atróficas. Os limites anatômicos da mama adulta atingem superiormente a segunda ou terceira costela, inferiormente a sexta ou sétima costela; na parte lateral, a linha axilar anterior e medialmente à borda lateral do esterno. A cauda axilar (Spence) invade a axila. A mama madura é composta de 15 a 20 lobos, subdivididos em diversos lóbulos, que possuem de 10 a 100 alvéolos. Essa estrutura predomina na região superolateral da glândula. A epiderme do mamilo e da aréola é muito pigmentada e enrugada. A superfície profunda da epiderme é invadida por papilas dérmicas longas que determinam a cor rósea devido aos capilares. Existem feixes musculares circulares e longitudinais, propiciando a ereção do mami- lo. A aréola contém glândulas sebáceas, sudoríparas e acessórias (Montgomery). O mamilo e a aréola possuem rica inervação sensitiva que propicia o desencadear de eventos neurais e neuro-humorais com a sucção do recém-nascido, estimulando a produção de leite. FISIOLOGIA DA MAMA No embrião, o que propicia a diferenciação sexual masculina é a presença do cromos- somo Y, que precocemente estimula a produção de testosterona pelas gônadas fetais. Em relação à glândula mamária, a atuação restritiva do Y não é intensa, pois em- briões de ambos os sexos apresentam botões mamários de características semelhantes. Vários hormônios atuam no desenvolvimento e na função da glândula mamá- ria: esteroides sexuais, prolactina, ocitocina, cortisol, hormônio tireoidiano e hor- mônio de crescimento. A ação de cada um deles pode ser resumida: Estrogênio: tem efeitos mitóticos no epitélio mamário e dá início ao desenvolvi- mento canalicular. Aumenta o número de receptores de estrogênio e progesterona nas células epiteliais. progesterona: diferenciação das células epiteliais, promovendo o desenvolvimento lobu- lar. Diminui a ação estrogênica no parênquima mamário, limitando a proliferação tubular. Antes da puberdade puberdade inicial puberdade tardia Apenas o mamilo se sobressai no tórax. Aréola proeminente. Glândula cresce. Glândula e gordura crescem. Aréola plana. manual febrasgo2 miolo.indd 13 27/8/2010 14:59:05 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 14 prolactina: estimula o desenvolvimento do tecido adiposo. Junto com o hormônio de crescimento e cortisol estimula o crescimento e desenvolvimento do epitélio mamário. Potencializa a ação do estrogênio e da progesterona. É o principal estímulo hormonal para a lactogênese, diferenciando as células produtoras de leite e a síntese de seus componentes. Hormônio de crescimento, cortisol e hormônio tireoidiano: a ação dessas subs- tâncias não está perfeitamente esclarecida na espécie humana. A secreção dos esteroides ovarianos é controlada pela hipófise e por neuro-hormô- nios hipotalâmicos. Essas substâncias possuem efeito em cascata; a hipófise anterior (células basófilas), por meio do hormônio foliculoestimulante (FSH) e do hormônio luteinizante (LH), atua nos ovários estimulando a produção de estrogênio e progesterona. Quem controla a liberação de FSH e LH é o hipotálamo, com o hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH). Todas essas substâncias são controladas por mecanismos de retroalimentação (feed- back). Há o feedback positivo e o negativo. O feedback positivo ocorre quando o aumento de secreção de uma substância esti- mula a produção de outra; já o negativo ocorre quando o aumento de concentração de um hormônio inibe a secreção de outro. Ao longo da vida da mulher, a secreção dessas substâncias varia de forma bas- tante significativa. Na vida intrauterina, os níveis de estrogênio e progesterona fetais são baixos, pois a produção gonadal é mínima, refletindo as concentrações maternas. O desenvolvimento de estruturas rudimentares mamárias no feto é evidente e cau- sado por estrogênio, progesterona e prolactina placentários maternos. Isso ocorre nos embriões de ambos os sexos. Após o nascimento, os níveis caem drasticamente. Nessa época, a mama consiste em duc- tos que convergem para o mamilo, mostrando atividade secretora nos alvéolos incipientes. Nas primeiras semanas de vida pode ocorrer secreção mamária (“leite de bruxa”) tanto em recém-nascidos femininos quanto masculinos. A composição é semelhante à do colostro e o mecanismo de seu aparecimento é o mesmo do início da lactação. O estrogênio e a progesterona permanecem baixos durante toda a infância, por ser o hipotálamo da jovem bastante sensível (feedback negativo) aos esteroides ovarianos, cuja secreção nessa época é pequena. A glândula permanece inativa, sem secreções. O crescimento que ocorre durante esse período é semelhante ao crescimento corporal. Três fatos ocorrem no início da puberdade: aumento da estimulação central sobre o hipotálamo; diminuição do feedback negativo ao estrogênio com substituição deste por um feedback positivo. Esses eventos levam ao aumento da liberação de GnRH, fazendo a hipófise produzir mais FSH e LH com consequente aumento das concentrações estrogênica e progestagê- nica. Por essa época, começa o ciclo menstrual. manual febrasgo2 miolo.indd 14 27/8/2010 14:59:05 15 A Glândula Mamária Com o aumento da secreção estrogênica, o botão mamário se evidencia, o que é, geralmente a primeira manifestação morfológica da puberdade. Talvez o fator de cresci- mento I semelhante à insulina (IGF-I ou somatomedina C) tenha participação. O estrogênio (E2) isoladamente, nessa fase, parece não ser suficiente para o cresci- mento mamário; é necessária a ação concomitante do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) e do hormônio tireoestimulante (TSH). Como vimos, o E2 promove proliferação do epitélio ductal e células mioepiteliais, além das células estromais circunjacentes; já a progesterona (P), em conjunto com o E2, inicia a formação acinar secretória. Ambos também estimulam o crescimento do tecido conjuntivo, que, substituindo o adiposo, dá sustentação à mama. Geralmente, após dois anos da menarca, a mama atinge as proporções adultas. O tamanhofinal depende de aspectos genéticos, nutricionais e outros determinantes. CICLO MENSTRUAL O ciclo menstrual, conforme as variações hormonais, pode ser dividido em três fases: proliferativa, ovulatória e secretora. Na primeira fase predomina a produção de E2 pelo ovário. Na mama, ocorrem prin- cipalmente fenômenos proliferativos ductais. Durante a ovulação, a secreção de E2 é máxima, podendo ocorrer ingurgitamento da glândula. Já na fase secretória, o E2 atua junto com a P, liberada pela rotura folicular. Com isso, a mama mostra vacuolização epitelial e o estroma torna-se frouxo e infiltrado por líquido e células linfoides e plasmáticas. No final dessa fase, no período pré-menstrual, a mama apresenta os maiores volumes, nodulosidade e sensibilidade. Assim que ocorre a menstruação, com a queda dos níveis hormonais, esses fenôme- nos regridem, para surgirem novamente no próximo ciclo. pUERpERALIDADE Durante a gestação, pelos altos níveis de esteroides, as alterações são exuberantes. Ocorre uma fase secretória exagerada. Os ductos proliferam já a partir da terceira semana. O crescimento da árvore lóbulo- alveolar, no primeiro trimestre, substitui os tecidos gorduroso e conjuntivo. Durante o segundo trimestre, essas alterações se acentuam, agora já com a presença da prolactina (PRL). Os fenômenos secretórios surgem, amadurecendo por completo a glândula mamária. manual febrasgo2 miolo.indd 15 27/8/2010 14:59:05 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 16 Já no terceiro trimestre, com o aumento de PRL, a vascularização se acentua, para fornecer o substrato da lactogênese. Para o completo amadurecimento é importante a presença de cortisol, insulina, hormônio do crescimento e fator de crescimento epidér- mico. A somatomamotrofina placentária tem ação semelhante à da PRL hipofisária, mas com efeito mais discreto; ela compete com a PRL. Próximo do parto, tem início a secreção de colostro. A lactogênese não ocorre, inibi- da pela ação do E2 e da P nos alvéolos. Após o parto, com a dequitação, os níveis de estrogênio e progesterona caem abrupta- mente, possibilitando que a PRL atue em sua plenitude. Ela induz a diferenciação de células pré-secretórias em secretórias; estimula a síntese de RNA para a produção de proteínas lácteas específicas, caseína e alfalactoalbumina, além de possibilitar a indução das enzimas galactosil transferase e lactose sintetase. A PRL também induz à formação de receptores para PRL. Ela é básica para a apojadura; cerca de 40 dias depois, seus níveis voltam ao normal; entretanto, após cada mamada, seus níveis sobem em picos, mantendo a produção de leite. Com o passar do tempo, os picos induzidos pela sucção tendem a diminuir. Essa queda nos níveis dos picos de PRL parece estar relacionada ao intervalo das mamadas; quanto maior o intervalo, maior o tempo para a PRL se restabelecer; o limite é de aproximadamente 12 horas. A manutenção da lactação exige remoção regular do leite e estímulo para sua libera- ção devido ao reflexo neural. Sem o estímulo da sucção mamária pelo neonato, os baixos níveis de PRL não são suficientes para manter a galactopoese. A produção e a ejeção do leite são controladas por arcos reflexos neurais, iniciando-se em terminações nervosas livres no complexo areolomamilar. O estímulo dessas termina- ções libera ocitocina da hipófise posterior e PRL da anterior. A ocitocina contrai os com- ponentes das células mioepiteliais perialveolares, ocorrendo a expulsão láctea. Estímulos auditivos, visuais e olfatórios também podem contribuir para a liberação de ocitocina. Por outro lado, a dor ou o constrangimento podem exercer efeito inibidor. Quanto mais frequente for a sucção pelo neonato, mais duradouro será o efeito da PRL, inclusive com implicações na volta à normalidade dos ciclos menstruais e conse- quente anovulação. Sabe-se hoje que a amamentação por livre demanda mantém os níveis de PRL mais constantes. Como níveis acima da média de PRL inibem a secreção de GnRH pelo hipotálamo, ocorre período maior de amenorreia e anovulação puerperal com este tipo de amamentação. Quando cessa a amamentação, a glândula retorna ao estado inativo. Não mais ocorre o estímulo para liberação de ocitocina e PRL. Os níveis de gonadotrofinas voltam ao normal e, com elas, os ciclos ovulatórios. O leite não removido exerce pressão intrama- mária, ocorrendo a rotura alveolar, com atrofia da estrutura lobular. O material retido é fagocitado. manual febrasgo2 miolo.indd 16 27/8/2010 14:59:05 17 BENEFÍCIOS DO ALEITAMENTO MATERNO Corintio Mariani Neto Márcia Maria Auxiliadora de Aquino Sérgio Makabe pARA A MULHER • Menor sangramento pós-parto e, consequentemente, menor incidência de anemias. • Efeito contraceptivo por seis meses (aleitamento materno exclusivo mais ame- norreia) e, portanto, maior intervalo interpartal. • Recuperação mais rápida do peso pré-gestacional. • Menor prevalência de câncer de mama, ovário e endométrio. • Menos fraturas ósseas por osteoporose. pARA A CRIANÇA Crianças amamentadas ao peito apresentam menores índices de: • Alergias em geral • Asma brônquica • Aterosclerose e doenças cardiovasculares • Colite ulcerativa • Dermatite atópica • Desnutrição • Diabetes mellitus • Diarreias CapÍtulo 2 manual febrasgo2 miolo.indd 17 27/8/2010 14:59:05 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 18 • Doença celíaca • Doença de Crohn • Doenças crônicas • Doenças respiratórias • Enterocolite necrosante • Gastrite • Leucemias e linfomas • Mortalidade infantil • Necessidade de hospitalização por doenças respiratórias • Neuroblastomas • Obesidade • Osteoporose • Otites • Parasitoses intestinais • Rinite alérgica • Síndrome da morte súbita infantil • Tumores de crescimento • Úlcera gástrica Crianças amamentadas ao peito apresentam melhores índices de: • Acuidade visual • Desenvolvimento cognitivo • Desenvolvimento neuromotor • Desenvolvimento social • Quociente intelectual pARA A FAMÍLIA, A INSTITUIÇÃO E A SOCIEDADE • Economia com a alimentação do recém-nascido. • Economia em consultas médicas, medicamentos, exames laboratoriais e hospita- lização da criança. • Redução dos gastos institucionais com aquisição de fórmulas, frascos, bicos arti- ficiais e medicamentos (ocitocina). • Otimização da equipe de profissionais de saúde com a promoção do alojamento conjunto e eliminação do berçário de recém-nascidos normais. • Redução da poluição ambiental: menos lixo inorgânico resultante do consumo de bicos artificiais e mamadeiras e menos poluentes do ar decorrentes do trans- porte de sucedâneos do leite materno. manual febrasgo2 miolo.indd 18 27/8/2010 14:59:05 19 O PAPEL DO OBSTETRA NO INCENTIVO AO ALEITAMENTO MATERNO Corintio Mariani Neto Noélia Pedrosa Brito Newton Tomio Mayashita Ao contrário do que ocorre com os demais mamíferos, a mulher não amamenta como um ato instintivo. Por essa razão, ela deve aprender a realizar o aleitamento, com- petindo ao obstetra, que é o primeiro profissional de saúde a lidar com a gestante, par- ticipar ativamente desse ensinamento. O obstetra tem várias oportunidades de atuação desde o início do pré-natal até o fi- nal do puerpério, de modo que suas condutas podem se constituir em poderosas armas a favor do aleitamento materno. Como chefe de equipe, que naturalmente é, deveria tam- bém se posicionar contra as rotinas institucionais adversas ao sucesso da amamentação. NO pRÉ-NATAL • Examinar as mamas, explicar sua função e a importância do aleitamento materno. • Mostrar a saída do colostro e explicar sua finalidade. • Informar as gestantes sobre as eventuais dificuldades no aleitamento materno e as maneiras de superá-las, como nos casos de variações anatômicas dos mamilos e mamoplastias. • Alertarpara os procedimentos ou atitudes contrárias à amamentação. • Conscientizar os familiares sobre a necessidade de apoiar a mulher que amamenta. CapÍtulo 3 manual febrasgo2 miolo.indd 19 27/8/2010 14:59:05 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 20 NO TRABALHO DE pARTO • Manter o ambiente tranquilo para a parturiente (incentivar a presença de acompanhante). • Utilizar todos os recursos disponíveis para alívio da dor, evitando substâncias entorpecentes que possam prejudicar a emoção do primeiro contato mãe-filho. NO pARTO • Promover a integração da equipe para que todos ajudem mãe e filho a iniciar a amamentação o mais precocemente possível. Do ponto de vista obstétrico, esse início precoce do aleitamento traz as seguintes vantagens para a mãe: maior pro- dução e liberação de ocitocina; maior vínculo com seu filho e maior chance de aleitar por tempo prolongado. • Evitar o uso de anestesia geral ou de entorpecentes que prejudiquem a emoção do primeiro encontro mãe-filho. • Colocar o recém-nascido com boa vitalidade sobre o ventre da mãe, mantendo-o assim pelo maior tempo possível. Estimular os contatos físico e visual entre a mãe e o RN. • Estimular a mamada ainda na sala de parto. A sucção mamária promove libera- ção de ocitocina endógena que acelera a dequitação e o miotamponamento. • Quando indicada, proceder à episiotomia, de tal modo que a mãe possa sentar e caminhar sem dor. • Estimular a presença do pai na sala de parto. • Lembrar a equipe que os procedimentos rotineiros com o RN sadio, como identifica- ção, medição, pesagem e profilaxia da oftalmia gonocócica, podem ser postergados. NA CESARIANA • Optar por anestesia peridural e, como segunda escolha, raquianestesia, ficando a anestesia geral restrita a situações excepcionais. • Orientar para que o recém-nascido com boa vitalidade permaneça junto à mãe pelo maior tempo possível. Estimular os contatos físico e visual entre ambos e, se possível, a primeira mamada. • Prescrever soro de hidratação pelo menor tempo possível e, se necessário, scalp salinizado para eventuais medicações intravenosas. • Aliviar a dor com analgésicos não entorpecentes para que a mãe seja capaz de cuidar do recém-nascido. manual febrasgo2 miolo.indd 20 27/8/2010 14:59:05 21 O Papel do Obstetra no Incentivo ao Aleitamento Materno • Usar ocitocina preferencialmente aos ergóticos, quando necessário, para aumen- tar a contratilidade uterina. NO pUERpÉRIO • Estimular as mães a permanecer ao lado de seus filhos 24 horas por dia, em alo- jamento conjunto, desde o pós-parto imediato, inclusive durante a recuperação pós-anestésica. • Orientar as mães para os cuidados com as mamas e os mamilos. • Observar e corrigir posicionamento e/ou pega inadequados. • Tratar as intercorrências locais sem interromper a lactação. • Estimular as mães a amamentar seus bebês sob livre demanda, sem horário esta- belecido. Caso seus bebês não possam sugar, ensinar a ordenha e como armaze- nar o leite, mantendo a lactação. • Orientar e apoiar as mães trabalhadoras, no que se refere às leis que prote- gem a amamentação. • Apoiar e divulgar a Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para Lac- tentes – NBCAL, desestimulando o uso de mamadeiras e chupetas em serviços hospitalares e impedindo a livre propaganda de “substitutos” do leite materno, bem como sua distribuição gratuita ou a baixo custo em maternidades. • Acompanhar ou referir o binômio mãe-filho para acompanhamento, desde a primeira semana, para evitar desmame precoce. • Aproveitar consultas médicas por quaisquer motivos para avaliar a prática da amamentação. • Prescrever método anticoncepcional que não interfira na lactação. manual febrasgo2 miolo.indd 21 27/8/2010 14:59:05 manual febrasgo2 miolo.indd 22 27/8/2010 14:59:05 23 ALEITAMENTO MATERNO EXCLUSIVO Sonia Isoyama Venancio Os objetivos deste capítulo são: apresentar a definição de Aleitamento Materno Ex- clusivo (AME) e a recomendação atual sobre a sua duração ideal; discutir brevemente seu impacto sobre a saúde materno-infantil; descrever sua situação no Brasil e alguns determinantes, bem como as principais estratégias para a sua promoção. DEFINIÇÃO DE ALEITAMENTO MATERNO EXCLUSIvO Segundo a definição da Organização Mundial de Saúde (OMS), um lactente é ama- mentado de forma exclusiva quando recebe somente leite materno (de sua mãe ou orde- nhado) e não recebe quaisquer outros líquidos ou alimentos sólidos, à exceção de gotas de vitaminas, minerais ou outros medicamentos (OMS, 2008). DURAÇÃO IDEAL DO ALEITAMENTO MATERNO EXCLUSIvO A duração ideal da amamentação exclusiva tem sido objeto de debate entre especia- listas ao longo de vários anos. Desde 1979, a recomendação da OMS quanto à duração do aleitamento materno exclusivo era de “quatro a seis meses”. Após uma ampla revisão sistemática sobre o tema (OMS, 2001), foi aprovada pela 54ª Assembleia Mundial de Saúde a recomendação da amamentação exclusiva por seis meses. A resolução conclama aos Estados Membros “o fortalecimento de atividades e o desenvolvimento de novos caminhos para a proteção, promoção e apoio à amamentação exclusiva por seis meses CapÍtulo 4 manual febrasgo2 miolo.indd 23 27/8/2010 14:59:05 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 24 como uma recomendação global da saúde pública, levando em consideração os achados da consulta de experts da OMS sobre a duração ótima da amamentação, e o provimento de alimentação complementar segura e adequada, com a continuidade da amamentação por dois anos ou mais, enfatizando os canais de disseminação social desses conceitos a fim de levar as comunidades a aderir a essas práticas” (OMS, 2001). IMpACTO DO ALEITAMENTO MATERNO EXCLUSIvO SOBRE A SAúDE MATERNO-INFANTIL Na década de 1980 começaram a ser publicados os primeiros estudos que mostra- vam as vantagens da amamentação exclusiva e desde então ficou evidente que a intro- dução de água, chá ou outros líquidos ou alimentos pode aumentar consideravelmente o risco de doenças, ter impacto negativo sobre o crescimento dos lactentes, reduzir a duração total da amamentação, podendo também reduzir a duração da amenorreia pós- parto (Giugliani, 2001). Podemos citar alguns estudos que forneceram as novas bases para as recomendações atuais. Em uma revisão de 35 estudos realizados em diferentes países, Feachem e Koblinsky (1984) mostraram que, quando crianças não amamentadas são comparadas àquelas que recebem leite materno de forma exclusiva, a média de riscos relativos de morbidade por diarreia varia de 3,5 a 4,9 nos primeiros seis meses de vida, havendo evidências de aumento da severidade da diarreia entre as crianças que recebem alimentação artificial. Popkin et al. (1990) mostraram que a frequência de diarreia pode dobrar quando água e chás são oferecidos em adição ao leite materno para crianças com menos de seis meses de idade, comparadas a crianças em amamentação exclusiva. Um estudo de caso-controle realizado no Brasil mostrou que, no primeiro ano de vida, crianças que não eram amamentadas tinham uma probabilidade muito maior de morrer por diarreia (14 vezes maior) ou doença respiratória (3,6 vezes), quando comparadas com crianças exclusivamente amamentadas. O risco das crianças não amamentadas de morrer por diarreia era 22 vezes maior durante os dois primeiros meses de vida (Victora et al., 1987). Resultados de estudo realizado no Brasil mostraram que a probabilidade de hospita- lização em decorrência de pneumonia foi 17 vezes maior em crianças não amamentadas durante o primeiro ano de vida e 61 vezes maior nos três primeiros meses, quando com- paradas a crianças exclusivamente amamentadas (César et al., 1999). Em Gâmbia, onde a mortalidade neonatal é de 39 por 1.000 nascidos vivos,57% dos óbitos neonatais são de causa infecciosa e 30% relacionados à prematuridade, sendo os alimentos pré-lácteos um importante fator de risco para esses óbitos (odds ratio, OR = 3,4) (Leach et al., 1999). Na Europa, um estudo multicêntrico prospectivo mostrou que a mortalidade devida à enterocolite necrotizante foi 10,6 vezes maior entre prematuros que rece- manual febrasgo2 miolo.indd 24 27/8/2010 14:59:05 25 Aleitamento Materno Exclusivo biam somente leite artificial e 3,5 vezes maior entre os que estavam em aleitamento misto, quando comparados a recém-nascidos alimentados exclusivamente com leite materno (Lucas e Cole, 1990). Existem evidências de que não há necessidade de oferecer suplemento hídrico para crianças amamentadas exclusivamente. Sachdev et al. (1991) mostraram que crianças exclusivamente amamentadas são capazes de manter a homeostase hídrica mesmo du- rante os meses de verão em um país tropical, sob condições que aumentam as perdas de água, como altas temperaturas e clima seco. Somando-se às vantagens já apresentadas, a amamentação exclusiva reduz custos para as famílias e para o sistema de saúde. Hospitais economizam mamadeiras, bicos e fórmulas infantis; além disso usam menos medicamentos para favorecer a contratilidade uterina no pós-parto e para tratar infecções neonatais. Sanghvi (1996), após revisar os custos e benefí- cios da amamentação exclusiva em três hospitais, no Brasil, Honduras e México, concluiu que a promoção dessa prática é altamente custo-efetiva para a prevenção de episódios de diarreia e para o ganho de “anos de vida ajustados por incapacidade”. Por todos os benefícios apresentados, a promoção do aleitamento materno exclusivo é considerada uma das mais vantajosas intervenções em saúde (Sanghvi, 1996). SITUAÇÃO DO ALEITAMENTO MATERNO EXCLUSIvO NO BRASIL E SEUS DETERMINANTES As pesquisas nacionais realizadas nas três últimas décadas revelam que a situação do AME no Brasil vem melhorando gradativamente. No tocante à duração mediana da amamentação, Venancio e Monteiro (1998) verificaram aumento entre 1974 e 1989, passando de 2,5 para 5,5 meses. Dados das Pesquisas Nacionais sobre Demografia e Saú- de (PNDS) confirmaram essa tendência, identificando aumento na mediana do AME de 7 meses em 1996 (Bemfam, 1997), para 14 meses em 2006 (Brasil, 2009). A primeira pesquisa nacional a investigar a situação do aleitamento materno exclu- sivo no País foi realizada em 1986, na qual se evidenciou que apenas 3,6% das crianças entre zero e quatro meses eram amamentadas de forma exclusiva (Monteiro, 1997). Dados da PNDS de 2006 mostraram avanços, com prevalência do AME de 38,6% em crianças com menos de seis meses (Brasil, 2009). Duas pesquisas conduzidas pelo Ministério da Saúde em todas as capitais brasileiras e Distrito Federal (DF), em 1999 e 2008, também denotam avanços. Constatou-se aumento da prevalência de AME em crianças com menos de quatro meses no conjunto das capitais brasileiras e DF, de 35,5% para 51,2% (Brasil, 2009). Vários fatores podem influenciar a prática da amamentação exclusiva. Com base em estudo realizado em 111 municípios do Estado de São Paulo, verificou-se que mulheres com baixa escolaridade, adolescentes e primíparas são as que têm menor probabilidade manual febrasgo2 miolo.indd 25 27/8/2010 14:59:05 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 26 de amamentar seus bebês exclusivamente até o sexto mês de vida. Além disso, algumas características das crianças, como o baixo peso ao nascer e o sexo masculino, podem ser apontadas como fatores que dificultam a amamentação exclusiva. O mesmo estudo mos- trou que a implementação de quatro ou mais ações de incentivo à amamentação, na rede pública municipal, pode aumentar em até duas vezes a probabilidade de amamentação exclusiva em crianças até o sexto mês de vida, o que reforça a importância da implemen- tação de políticas municipais de aleitamento materno (Venancio, Monteiro, 2006). ESTRATÉGIAS pARA A pROTEÇÃO, pROMOÇÃO E ApOIO AO ALEITAMENTO MATERNO EXCLUSIvO Giugliani (2001) aponta alguns dos principais obstáculos à prática da amamentação exclusiva, que incluem: • O desconhecimento, por parte da população em geral, profissionais de saúde e gestores, do real significado da amamentação exclusiva e sua importância. • Práticas inadequadas nos serviços de saúde, cabendo destacar o papel das mater- nidades, que muitas vezes dificultam o estabelecimento da amamentação exclu- siva não promovendo o contato pele a pele entre mãe e bebê após o nascimento, separando mães e bebês por longos períodos, oferecendo suplementos lácteos e impondo horários rígidos para as mamadas, além do uso de bicos artificiais. • Práticas culturais e crenças, a exemplo do uso de chás, em nosso meio. • A falta de confiança das mães em prover adequada nutrição aos lactentes prati- cando o aleitamento materno exclusivo. • O trabalho materno. • A promoção comercial das fórmulas infantis e outras situações, como a da trans- missão do vírus da imunodeficiência humana (HIV). Embora poucos estudos tenham testado estratégias para aumentar a frequência do aleitamento materno exclusivo, seus resultados permitem fazer algumas inferências, en- tre as quais: • A prática da amamentação exclusiva pode ser ampliada com diferentes estratégias e a orientação/aconselhamento individual parece resultar no efeito mais consistente. • O aconselhamento de amigas e colegas parece ser a estratégia mais efetiva. • O forte envolvimento da comunidade, incluindo os homens, parece ser muito efetivo. • Visitas domiciliares produzem mais efeitos que clínicas de lactação. • As estratégias mais eficientes são aquelas que se iniciam nas primeiras semanas após o parto, o período mais crítico para o abandono da amamentação exclusiva. • Programas baseados somente em hospitais aumentam a prevalência de amamen- tação exclusiva, mas os efeitos podem não ser duradouros (Giugliani, 2001). manual febrasgo2 miolo.indd 26 27/8/2010 14:59:05 27 Aleitamento Materno Exclusivo Tendo em vista os obstáculos mencionados, estratégias como educação em larga escala, adequação das práticas assistenciais, disseminação de mensagens sobre amamen- tação exclusiva, que levem em consideração as práticas culturais, apoio e orientação às mulheres lactantes, garantia dos direitos reprodutivos e a implementação da Norma Bra- sileira de Comercialização de Alimentos para Lactentes são estratégias fundamentais. manual febrasgo2 miolo.indd 27 27/8/2010 14:59:05 manual febrasgo2 miolo.indd 28 27/8/2010 14:59:05 29 TÉCNICAS EM ALEITAMENTO Ariani Impieri de Souza Gláucia Virgínia de Queiroz Lins Guerra Vilneide Braga Serva Os apoios familiar, comunitário e profissional são a base do sucesso da amamentação. Ouvir a mulher sobre seus anseios, dúvidas e experiências anteriores faz parte do proces- so de aprendizado da amamentação, apoiando-a e aumentando sua autoconfiança. Assim, tanto a mulher como o obstetra e todos os profissionais de saúde (que servirão de facilitadores para o início e manutenção da amamentação) devem estar aptos a manejar as técnicas de amamentação, que têm como base o posicionamento, pega e sucção efetiva. pOSICIONAMENTO A mãe pode estar sentada, deitada ou em pé. O bebê pode permanecer sentado, deitado ou até em posição invertida (entre o braço e o lado do corpo da mãe). O funda- mental é que ambos estejam confortáveis e relaxados. Existem quatro sinais indicativos da posição correta da criança: • O corpo e a cabeça devem estar alinhados, de modo que a criança não necessite virar a cabeça para pegar a mama. • O corpo do bebê deve estar encostado ao da mãe (abdome da criança em frente ao abdome da mãe). • Seu queixo deve estar tocando o peito da mãe. • A criança deve ser apoiada pelo braçoda mãe, que envolve a cabeça, o pescoço e a parte superior do seu tronco. Em casos de crianças muito pequenas, a mãe deve apoiar também suas nádegas com a mão. CapÍtulo 5 manual febrasgo2 miolo.indd 29 27/8/2010 14:59:05 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 30 pEGA Para que haja sucção efetiva, a criança deve abocanhar não só o mamilo, mas prin- cipalmente toda ou a maior parte da aréola. Esta pega correta proporciona a formação de um grande e longo bico que toca o palato, iniciando assim o processo de sucção. Os ductos lactíferos terminais, situados embaixo da aréola, são assim pressionados pela lín- gua contra o palato, iniciando-se a saída do leite, ajudada pelo reflexo de ejeção mediado pela ocitocina. Caso a pega seja só no mamilo, pode haver erosão e/ou fissura mamilar por fricção continuada. A criança pode ficar inquieta, largar o peito, chorar ou se recusar a mamar, pois sem a pressão dos ductos lactíferos contra o palato não há saída adequada de leite, levando a mulher a acreditar que tem “pouco leite”, sentir dor, podendo então ser desen- cadeado o processo de desmame precoce. A mãe pode ser auxiliada a aproveitar o processo de procurar e apreender o mamilo, que é estimulado colocando-se este na bochecha do bebê, deixando-o explorar o peito com a língua. Para tanto, a criança deverá permanecer calma e alerta, facilitando a pega da aréola. Deve-se ainda orientar a mãe a observar sinais de ejeção de leite, como o vazamento da mama contralateral e a presença das contrações uterinas (cólicas uterinas no pós- parto imediato ou dores de “tortos”). SUCÇÃO EFETIvA Para que a sucção seja efetiva, devem-se observar cinco pontos: 1. A boca do bebê deve estar bem aberta para abocanhar toda ou quase toda a aréola. 2. O lábio inferior deve estar voltado para fora e cobrir quase toda a porção infe- rior da aréola, enquanto a parte superior da aréola pode ser visualizada. 3. A língua deve permanecer acoplada em torno do peito. 4. As bochechas devem ter aparência arredondada. 5. A criança deve parecer tranquila com sucção lenta, profunda e ritmada e com períodos de atividade e pausa. Antes de iniciar a pega, a mulher deverá ser orientada a palpar a aréola. Se esta estiver túrgida, ela deve ordenhar um pouco de leite para facilitar a pega. Se a mulher tiver ma- mas muito volumosas, pode pressionar a mama contra a parede torácica, segurando-a e erguendo-a com a mão oposta (mama direita/mão esquerda), colocando os quatro dedos juntos por baixo da mama e o polegar acima da aréola – pega da mama em “C”. Não há necessidade de afastar a mama do nariz do bebê, ele mesmo o fará se preci- sar, pendendo a cabeça levemente para trás. Por essa razão, a mulher deve ser orientada, quando necessário, a segurar a mama longe da aréola. manual febrasgo2 miolo.indd 30 27/8/2010 14:59:05 31 Técnicas em Aleitamento Deve-se promover o início da amamentação já na sala de parto, mantendo-se a livre demanda (a criança deve mamar sempre que desejar, sem horários estabelecidos, seja durante o dia ou durante a noite). Em cada mamada, ambas as mamas poderão ser oferecidas, dependendo da necessidade da criança. Deixe que a criança sugue o peito o tempo que desejar, solte-o espontaneamente para só então oferecer a outra mama. Na mamada seguinte, deve-se começar pela mama que o bebê mamou por último. Há, entretanto, alguns bebês que não aceitam o segundo peito. Daí a im- portância de ensinar à mulher, desde o pré-natal, no pós-parto e nas consultas de seguimento, as técnicas de ordenha, para evitar o ingurgitamento. pOSIÇÃO DA MÃE pARA AMAMENTAR Há várias possibilidades de posições para amamentar. A mulher deve escolher a mais confortável e que a deixe mais relaxada naquele momento. Deitada • Ela pode deitar-se de lado, apoiando a cabeça e as costas em travesseiros. O bebê deverá permanecer também deitado de lado, proporcionando o contato abdome/ abdome. Os ombros do bebê devem ser apoiados com os braços da mãe para man- ter a posição adequada. • A mulher pode ainda deitar-se em decúbito dorsal (posição útil para as primeiras horas pós-cesariana ou para aquela mulher com excedente lácteo muito grande). A criança deve ficar deitada em decúbito ventral, em cima da mãe. Sentada • A mulher deve permanecer com as costas apoiadas na cadeira ou cabeceira da cama. Ela pode ainda cruzar as pernas ou ainda usar travesseiros sobre as coxas. Colocar os pés em um pequeno banco para dar mais apoio, pode ser útil. • A criança pode ficar deitada, em posição invertida ou sentada (posição muito utili- zada em situações especiais como crianças prematuras, fissuradas ou sindrômicas). TÉRMINO DA MAMADA • O ideal é que o bebê solte o peito espontaneamente. Se isso não ocorrer, a mulher pode colocar a ponta do dedo mínimo na boca do bebê pela comissura manual febrasgo2 miolo.indd 31 27/8/2010 14:59:05 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 32 labial deste para romper o vácuo e a criança soltar o peito sem machucar o ma- milo. Ao término da mamada, o mamilo fica levemente alongado e redondo, e não deve estar achatado, nem com estrias vermelhas. AMAMENTAÇÃO DE GÊMEOS • O benefício da amamentação é bem estabelecido para o lactente. A amamen- tação de gêmeos é benéfica, permitindo um crescimento adequado para ambos os lactentes. A prática de amamentar gêmeos tem aumentado nos últimos anos, acompanhando o aumento na prevalência de aleitamento materno. A produção de leite materno na maioria das mulheres é adequada à demanda, isto é, quanto mais os lactentes sugam, maior a produção de leite. A maioria das mulheres tem leite suficiente para amamentar filhos gêmeos. • As razões referidas pelas mulheres para a introdução de suplementos quando estão amamentando gêmeos são: produção inadequada, ingurgitamento das ma- mas, mamilos retraídos, doença materna. No entanto, os profissionais de saúde devem estar preparados para orientar e solucionar as dificuldades surgidas du- rante a amamentação. O apoio familiar nas dificuldades é fundamental. A par- ticipação familiar na amamentação é muito importante, e isso é mais verdadeiro na amamentação de gêmeos, pois a dinâmica da amamentação nos primeiros dias é trabalhosa e exige a participação de todos. Nos dias iniciais do aleitamen- to, deve-se orientar a amamentar cada lactente separadamente até se garantir uma boa pega dos dois recém-nascidos. À medida que a mulher se sente segura em relação à pega e haja satisfação dos bebês, ela deve iniciar as mamadas simul- taneamente, de modo que ela possa ter tempo para o seu próprio descanso. A mãe pode ficar sentada com um bebê na forma tradicional e o outro na posição invertida com o corpo desse bebê embaixo da axila, segurando sua cabeça com a mão e o corpo apoiado em uma almofada. Nas mamadas seguintes, deve-se fazer um rodízio de posições entre os bebês. • Outra posição que pode ser adotada é a mãe sentada confortavelmente, os dois bebês sentados nas pernas da mãe e esta sustenta as cabeças de ambos. Com o progredir da amamentação, outras posições surgem espontaneamente e, com o crescimento dos bebês, eles mesmos escolhem as posições e mamas preferidas. É importante verificar se os bebês estão crescendo adequadamente. Ponto importante: informe as nutrizes que a amamentação não é para ser um sofri- mento e que é comum acontecer algumas dificuldades no início da lactação; porém, com o apoio familiar e a orientação de um profissional capacitado, elas serão superadas e a amamentação será bem-sucedida. manual febrasgo2 miolo.indd 32 27/8/2010 14:59:05 33 Técnicas em Aleitamento Um instrumento importante para os profissionais de saúde ajudarem a mulher a posicionar corretamente seu filho ao peito é o Formulário de Observação de Mamadas (adaptado de Helen Armstrong). Formulário de Observaçãode Mamadas (segundo Helen Armstrong, com adaptações). Os itens entre parênteses referem-se apenas aos recém-nascidos. Sinais de que a amamentação vai bem Sinais de possível dificuldade Posição corporal Mãe relaxada e confortável Mãe com ombros tensos e inclinada sobre o bebê Corpo do bebê próximo ao da mãe Corpo do bebê distante do da mãe Corpo e cabeça do bebê alinhados O bebê vira o pescoço Queixo do bebê tocando o peito O queixo do bebê não toca o peito Nádegas do bebê apoiadas Somente os ombros/cabeça apoiados Respostas O bebê procura o peito quando sente fome (o bebê busca o peito) Nenhuma resposta ao peito (nenhuma busca observada) O bebê explora o peito com a língua O bebê não está interessado no peito Bebê calmo e alerta ao peito Bebê irrequieto ou agitado O bebê mantém a pega da aréola O bebê não mantém a pega da aréola Sinais de ejeção de leite, como vazamento e cólicas uterinas Nenhum sinal de ejeção de leite Estabelecimento de laços afetivos A mãe segura o bebê no colo com firmeza A mãe segura o bebê nervosamente ou fracamente Atenção face a face da mãe Nenhum contato ocular entre a mãe e o bebê Muito toque da mãe no bebê Mãe e bebê quase não se tocam Anatomia Mamas macias e cheias Mamas ingurgitadas e duras Mamilos protrácteis, projetando-se para fora Mamilos planos ou invertidos Tecido mamário com aparência saudável Tecido mamário com fissuras ou vermelhidão Mamas com aparência arredondada Mamas esticadas Continua manual febrasgo2 miolo.indd 33 27/8/2010 14:59:06 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 34 Sucção Boca bem aberta Boca quase fechada, fazendo um bico para a frente Lábio inferior projeta-se para fora Lábio inferior virado para dentro Língua acoplada em torno do peito Não se vê a língua do bebê Bochechas de aparência arredondada Bochechas tensas ou encovadas Sucção lenta e profunda em períodos de atividade e pausa Sucções rápidas, com estalidos É possível ver ou ouvir a deglutição Podem-se ouvir estalos dos lábios, mas não a deglutição Tempo gasto com sucção O bebê solta o peito naturalmente, após mamar por determinado tempo A mãe tira o bebê do peito continuação Todos esses procedimentos devem ser orientados desde o pré-natal por uma equipe multiprofissional, sendo o obstetra membro fundamental para o sucesso e manutenção da amamentação. manual febrasgo2 miolo.indd 34 27/8/2010 14:59:06 35 PRINCIPAIS INTERCORRÊNCIAS MATERNAS LOCAIS Margarida Silva Nascimento INTRODUÇÃO As intercorrências mamárias locais são as principais causas de desmame precoce, por causa da dor e, quando não tratadas a tempo, levam a quadros severos de mastites, abscessos mamá- rios e até mesmo septicemia. Pelo caráter emergencial dessas complicações, elas costumam ser atendidas nos serviços de Pronto-Socorro ou nos Bancos de Leite Humano (BLH). O obstetra nem sempre toma conhecimento desses problemas, mesmo que seja o primeiro profissional a ser procurado pela mãe aflita diante da situação; para esses casos, ele deve estar capacitado a abandonar a antiga atitude passiva de que “amamentação é coisa para enfermeiros e pediatras”. Dessa forma, ele deve adotar uma postura de participação ativa junto aos demais profissionais da equipe de saúde que cuidam do binômio mãe-filho. CLASSIFICAÇÃO DAS pRINCIpAIS INTERCORRÊNCIAS LOCAIS A presença dessas manifestações atesta a falta de apoio e orientação às mães por parte dos profissionais e dos serviços de saúde, que necessitam rever suas práticas e condutas. Para facilitar o seu manejo, elas estão agrupadas em: • Intercorrências precoces – Mamilares: mamilos doloridos, bolhas mamilares, fissuras, monilíase mamilar. – Mamárias: mamas doloridas, ingurgitamento mamário. • Intercorrências tardias – Ducto lactífero bloqueado; mastite aguda; abscesso mamário; mastite crônica/ fístulas lácteas. CapÍtulo 6 manual febrasgo2 miolo.indd 35 27/8/2010 14:59:06 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 36 Intercorrências mamárias precoces O aleitamento materno não deve ser um processo doloroso. Assim, deverá a lactante ser orientada desde o início da amamentação para evitar o desmame precoce. O trata- mento para todas as intercorrências, à exceção da monilíase, segue as mesmas orienta- ções e será abordado ao final deste tópico. Intercorrências mamilares Mamilos doloridos Após a descida do leite, durante a sucção, os mamilos tornam-se sensíveis, planos e distendidos, dificultando a pega do bebê. Diagnóstico História clínica: dor de intensidade variável quando o bebê suga. Exame físico: à inspeção, os mamilos têm aspecto normal, mas podem perder sua proeminência com diminuição da proctratilidade. Bolhas mamilares São traumas mamilares quase imperceptíveis que se instalam quando o bebê suga a ponta do mamilo numa pega incorreta. Formam-se pequenas bolhas com descolamento da pele que, por se desfazerem rapidamente, dificultam o diagnóstico. Quando não tratadas, evoluem para a mais dolorosa – a da ponta do mamilo. Diagnóstico História clínica: intensa dor na porção terminal do mamilo quando o bebê suga. Exame físico: à inspeção, observa-se o descolamento da pele e, após a mamada, o mamilo fica enrugado. Fissuras mamilares São traumas com ruptura do tecido, uni ou bilaterais, com forma e localização varia- das, sendo a principal causa de desmame precoce. Diagnóstico História clínica: dor mamilar intensa, por vezes lancinante, que faz a mãe chorar quando o bebê suga. Exame físico: à inspeção, observa-se lesão mamilar de diversos tipos, descritos a seguir: Fissura de base mamilar: a lesão circunda parcial ou totalmente a base do mamilo. Fissura do bico mamilar: lesão em linha reta única ou em forma radiada com lesões múltiplas. Fissura de ponta de mamilo: a lesão se apresenta na porção terminal do mamilo. Fissura mista: lesões na base e na ponta do mamilo. manual febrasgo2 miolo.indd 36 27/8/2010 14:59:06 37 Principais Intercorrências Maternas Locais Monilíase mamilar Infecção fúngica dos mamilos que ocorre por contaminação da mãe portadora de candi- díase (Candida albicans) ou do bebê que adquiriu no canal do parto monilíase oral (“sapinho”). Diagnóstico História clínica: dor penetrante com sensação de ardor ou prurido nos mamilos. Exame físico da mãe: Mamas: à inspeção, os mamilos podem se apresentar avermelhados, irritados, com placas e pontos esbranquiçados ou mesmo com aspecto normal, quando o único sinal é a persistência da dor, mesmo com a pega adequada. Genitália: infecção fúngica na vagina, vulva ou região inguinal. Exame físico do bebê: Boca: apresenta língua, palato ou gengivas com pontos ou placas brancas. Genitália: hiperemia em genitália, nádegas ou região inguinal. Tratamento É importante tratar, ao mesmo tempo, a mãe e o bebê para evitar o ciclo vicioso da monilíase entre eles. Tratamento materno Mamilos • Creme fungicida (nistatina ou miconazol): espalhar uma fina camada do creme nos mamilos durante o intervalo das mamadas, de 3 a 4 vezes ao dia, até o desaparecimento das lesões. • Violeta de genciana em solução a 0,5 ou 1%: aplicar nos mamilos, uma vez ao dia, durante 3 a 5 dias. Apesar de eficaz, não se recomenda o uso da violeta pela fixação pro- longada do pigmento à pele, induzindo a mãe a lavar várias vezes o mamilo, na tentativa de retirar a coloração violácea, o que agravaria a lesão. Vagina • Creme fungicida (nistatina, miconazol etc.): aplicação vaginal durante 7 noites e nas áreas vulvoinguinais, 2 a 3 vezes ao dia, até o desaparecimento das lesões. Cuidados gerais Deixar os mamilos em contato com o ar e expô-los ao sol para ajudar a cicatrização. Evitar o uso de protetores mamilares, porque diminuem a ventilação e podem ser fonte de germes, quando não bem esterilizados(ferver por 20 minutos, diariamente). Higiene cuidadosa das mãos ao sair do sanitário e for cuidar do bebê. manual febrasgo2 miolo.indd 37 27/8/2010 14:59:06 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 38 Tratamento do bebê Oral • Solução de nistatina a 100.000 UI/mL: umedecer um algodão com a solução e passar suavemente em toda a cavidade oral, no intervalo das mamadas, ou instilar 1mL na boca do bebê, 4 vezes ao dia, até o desaparecimento das lesões. • Genitália: creme fungicida (nistatina, miconazol etc.): passar fina camada, 3 vezes ao dia, na genitália, nádegas e/ou região inguinal. Cuidados gerais Manter seca e limpa a área em contato com a fralda. Intercorrências mamárias Mamas doloridas No curso do processo fisiológico da descida do leite, as mamas podem ficar doloridas devido ao rápido afluxo lácteo, aumento de volume, congestão vascular e edema linfáti- co dos tecidos mamários. Esse fenômeno é bilateral. Diagnóstico História clínica: dor, com mamas quentes e pesadas. Exame físico: mamas tensas com aumento da rede vascular superficial (rede de Haller). O leite flui sem dificuldade à expressão manual. Ingurgitamento mamário Quando o leite não é retirado em quantidade suficiente, isso leva à estase do fluxo lácteo, ocasionando o ingurgitamento mamário. Diagnóstico História clínica: dor mamária bilateral e aumento da temperatura local e corpo- ral por menos de 24 horas, conhecida como “febre do leite”. Exame físico: mamas brilhantes e compactas pela distensão. O leite flui com dificuldade à expressão manual. Tratamento geral das intercorrências locais precoces • Manter o aleitamento exclusivo sob livre demanda: iniciar a amamentação na primeira hora após o nascimento, estimulando a permanência em alojamento conjunto. • Ajudar a mãe a estabelecer boa pega e posição adequada do bebê: faz a dor ma- mária desaparecer e a sucção torna-se confortável para a mãe. • Intervenção e tratamento precoces: oferecer ajuda imediata à mãe logo às pri- meiras queixas de dor mamária evita complicações. manual febrasgo2 miolo.indd 38 27/8/2010 14:59:06 39 Principais Intercorrências Maternas Locais • Ordenhar e massagear as mamas (vide capítulo sobre técnicas de amamentação): capacitar as mães para que elas próprias realizem esses procedimentos, nos inter- valos das mamadas, para evitar estase láctea. • Sugerir à mãe expor os mamilos ao ar e ao sol por 10 a 15 minutos ao dia: essa prática pode facilitar a cicatrização de fissuras e monilíase mamilares, apesar de seus benefícios serem questionáveis. • Usar compressas frias ou quentes: aplicar compressa fria no intervalo das mamadas pode diminuir a dor e o edema; a compressa quente, antes de amamentar, estimula o reflexo da ocitocina, favorecendo o afluxo do leite. Atualmente essa prática não é recomendada, principalmente se a mãe a realiza em domicílio, pois, movida pelo desespero da dor, tende a exagerar na temperatura (muito quente ou muito gela- da), podendo ocasionar queimaduras. • Evitar lavar os mamilos várias vezes ao dia: a lavagem excessiva com sabões res- seca a pele mamilar. Orientar a mãe a espalhar o próprio leite ordenhado para hidratar e lubrificar a aréola. • Evitar o uso de protetores mamilares: além de confundir a pega, diminuem a ventilação. • Aconselhar a mãe a não usar cremes, loções e pomadas “ditas cicatrizantes”: podem irritar a pele e diminuir a ventilação; as fissuras são agravadas quando a mãe tenta retirar esses produtos. Não há evidências de que sejam úteis. • Orientar como retirar o bebê do peito antes do término da mamada: puxar bruscamente o bebê do peito pode traumatizar o mamilo quando a mãe necessita interromper a ma- mada ou o bebê dorme ao seio. Demonstre como proceder: interpor o dedo mínimo por entre os maxilares, no canto da boca da criança, para desfazer a pressão. • Iniciar a mamada pelo peito sadio ou menos dolorido: esse recurso pode ajudar se a dor inibir o reflexo da ocitocina; oferecer a mama sadia e, após a ejeção do leite, passar para a mama afetada. • Amamentar o bebê em diferentes posições: segurar o bebê variando a posição pode ser útil principalmente em caso de fissuras: amamentar deitada e passar o corpo do bebê por baixo do braço. Mudar as posições numa mesma mamada ajuda a esvaziar todos os lóbulos. Intercorrências tardias das mamas Ducto lactífero bloqueado O acúmulo e o espessamento do leite em um segmento mamário bloqueiam o ducto lactífero com estase láctea. Geralmente é unilateral e não há comprometi- mento sistêmico da mãe. Diagnóstico História clínica: dor localizada com sensação de caroço em um ponto da mama. Exame físico: à inspeção, nota-se uma área avermelhada e endurecida. manual febrasgo2 miolo.indd 39 27/8/2010 14:59:06 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 40 Tratamento • Orientar a mãe a massagear suavemente a área afetada: essa técnica fluidifica o leite por transferência de energia cinética e estimula o reflexo da ocitocina. • Ajudar a mãe a estabelecer uma boa pega: – Segurar o bebê em diversas posições durante a mamada. – Verificar e corrigir compressão de roupas ou dos dedos da mãe nesse ponto (de- dos em tesoura). Mastite aguda A mastite puerperal é a infecção aguda da mama, que acomete 2 a 6% das mães lactantes, principalmente as primigestas. Geralmente é unilateral. Quando não tratada, evolui para abs- cesso ou até mesmo septicemia. Diversos micro-organismos podem causar mastite: Staphylo- coccus epidermidis, Enterobacter, Klebsiella sp, E. coli, sendo o Staphylococcus aureus o principal agente etiológico, presente em mais de 60% dos casos. Existem fatores predisponentes para o aparecimento dessas lesões: • Fatores gerais: cansaço por excesso de tarefas, estresse psicológico, tempo de sono reduzido levam à diminuição do estado imunológico. • Fatores locais: ingurgitamento mamário, fissuras e ducto bloqueado. As fissuras são a principal causa de mastite por apresentarem solução de continuidade; servem como porta de entrada para germes. Quanto à sua localização, as mastites podem ser: Classificação das mastites (critérios de Vinha) Mastite lobar: acomete uma região ou lóbulo. É o tipo mais frequente. Mastite ampolar: acomete parte ou toda a aréola. Mastite glandular: toda glândula mamária é afetada. Diagnóstico História clínica: intensa dor e vermelhidão da mama. Além de: febre, calafrios, mal-estar, prostração. Exame físico: temperatura corporal acima de 38ºC. Mama hiperêmica, endure- cida e quente. Tratamento • Uso de analgésicos (paracetamol, acetominofeno) e anti-inflamatórios (Piroxicam). • Uso de antibióticos: como a principal bactéria é S. aureus, usar antibióticos penicili- nase resistente ou cefalosporinas que cobrem S. aureus produtor de betalactamase: – Cefalexina: 1g, a cada 8h, por 7 dias. – Flucloxacilina: 500mg, a cada 8h, por 7 a 10 dias. – Sulbactam: 500mg, a cada 8h, por 5 dias. manual febrasgo2 miolo.indd 40 27/8/2010 14:59:06 41 Principais Intercorrências Maternas Locais Cuidados gerais O melhor tratamento para as mastites é a retirada do leite, preferencialmente por ordenha manual, associado à antibioticoterapia. Além disso, é importante manter a lac- tação, começando pela mama sadia, segurar o bebê em diferentes posições e a mãe deve ter licença do trabalho para repousar. Abscesso mamário É um processo infeccioso agudo que se instala no curso da mastite não tratada. Pode ser único ou múltiplo na mesma mama. Quando não há intervenção preco- ce, pode evoluir com necrose do tecido mamário, necessitando cirurgia plástica reparadora. Diagnóstico História clínica: intensa dor na mama com área quente, endurecida e aver- melhada, além de agravamento do estado geral materno, apresentando febre,calafrio, prostração. Exame físico: abscesso único ou múltiplo com ponto de flutuação. Tratamento • Cirúrgico: internar a mãe para drenar o conteúdo sob anestesia. • Uso de antibióticos, analgésicos e anti-inflamatórios: utilizar a mesma cate- goria de medicamentos para o tratamento das mastites, mas por tempo mais prolongado. • Cultura com antibiograma: para identificação dos germes. • Suspender provisoriamente a amamentação do seio afetado: até a retirada do dreno, mantendo a ordenha dessa mama várias vezes ao dia. Mastite crônica/fístulas lácteas A mastite crônica é uma intercorrência tardia, que se instala meses após um quadro de mastite aguda ou abscesso mamário, e se caracteriza pela presença de tecido conjun- tivo e fenômenos exsudativos no parênquima mamário. Depois de surtos recidivantes, drena espontaneamente em diversos pontos da mama formando fístulas lácteas. Diagnóstico História clínica: aparecimento de tumoração meses após a amamentação com drenagem espontânea de conteúdo amarelado. Exame físico: presença de abscessos ou fístulas múltiplas drenando exsudato seroso ou substância láctea, podendo apresentar tecido necrosado em algumas áreas. manual febrasgo2 miolo.indd 41 27/8/2010 14:59:06 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 42 Tratamento • Cirúrgico: a técnica mais eficaz é a ressecção completa do sistema ductal pato- lógico. Geralmente é um procedimento realizado por mastologista ou cirurgião, necessitando por vezes cirurgia plástica reparadora. • Exame anatomopatológico: para afastar neoplasias e identificar infecções específicas. • Clínico: uso de antibióticos pré e pós-operatório. CONSIDERAÇÕES FINAIS O obstetra deve participar ativamente do manejo para o aleitamento materno, acom- panhando as mães lactantes, especialmente aquelas que apresentam dificuldades. Ele deve incentivar, apoiar e principalmente capacitar as mães para que se tornem aptas a vencer qualquer dificuldade durante o processo de amamentação. Lembrar que a tríade (1) amamentar sob livre demanda; (2) estabelecer boa pega; (3) ordenhar/massagear as mamas para a retirada do leite são os fatores mais importantes para o sucesso do aleitamento materno. manual febrasgo2 miolo.indd 42 27/8/2010 14:59:06 43 INTERCORRÊNCIAS MATERNAS GERAIS Corintio Mariani Neto Alexandre Vieira Santos Moraes A maioria dos processos infecciosos, que acometem a puérpera, não impede o alei- tamento materno (AM), assim como em muitos casos é comum ter ocorrido exposição prévia do recém-nascido, ainda na fase intrauterina. Por outro lado, o leite materno contém vários elementos protetores, como anticorpos, substâncias anti-inflamatórias e imunomoduladores. Desse modo, o neonato em aleitamento materno exclusivo está protegido contra a maior parte das infecções e, quando elas ocorrem, os sintomas costumam ser menos acentua- dos que o habitual. Entre os processos infecciosos que permitem a amamentação, destacamos: • Gripe: os únicos cuidados devem ser com a higiene das mãos e o uso de máscara, cobrindo o nariz e a boca da nutriz, para evitar a propagação de fomites. • Toxoplasmose aguda, malária e infecção das vias urinárias: requerem tratamento materno específico concomitante à amamentação. • Sífilis (em qualquer fase): a terapêutica penicilínica de ambos (mãe e RN) é feita simultaneamente ao aleitamento materno. • Gonorreia: as mamadas só devem ser iniciadas 24 horas após o início do trata- mento materno específico. Logo após o parto, o recém-nascido receberá o nitra- to de prata ocular rotineiro e penicilina sistêmica. • Citomegalia: não impede a amamentação, pois o leite materno contém tanto os vírus quanto os anticorpos. CapÍtulo 7 manual febrasgo2 miolo.indd 43 27/8/2010 14:59:06 FEBRASGO – Manual de Aleitamento Materno 44 INFECÇÕES QUE MERECEM CUIDADO ESpECIAL varicela: apenas quando for adquirida no período compreendido entre os últimos cinco dias da gestação e os dois primeiros dias do pós-parto, a criança deverá ser separada da mãe. Nessa fase existe o perigo da exposição do recém-nascido (RN) ao contato ínti- mo prolongado e repetido, o que vale tanto para a amamentação no peito quanto para o uso de mamadeira. A criança deverá receber imunoglobulina específica contra varicela e o leite materno ordenhado, desde que não existam lesões contaminantes nas mamas. Uma semana após o aparecimento da doença surgem as crostas e a criança pode então mamar no peito. Quando a doença iniciar fora do período anteriormente descrito, isto é, mais de cinco dias antes ou mais de dois dias depois do parto, não é necessário separar mãe e filho. Herpes simples: se não houver vesículas nas mamas, proceder à amamentação nor- mal. Se as vesículas estiverem presentes, o leite deverá ser ordenhado e oferecido em copinho ou xícara, até secarem as lesões. A higiene das mãos não deve ser descuidada. A mãe deverá usar luvas, se surgirem vesículas nos dedos, e máscara, se as lesões se mani- festarem nos lábios ou no nariz. Hepatite A: AM e administração de imunoglobulina ao RN. Hepatite B: AM, imunoglobulina e primeira dose de vacina para o RN (se for an- tígeno HbsAg negativo). Hepatite C: AM sem restrições, exceto em casos de coinfecção pelo vírus da imuno- deficiência humana (HIV) e/ou insuficiência hepática grave. Tuberculose pulmonar ativa: é fundamental o diagnóstico exato, por meio do qua- dro clínico, radiografia de tórax, pesquisa de bacilo de Koch (BK) no escarro e reação de Mantoux para distinguir entre infecção e doença ativa. O perigo está na exposição do RN ao contato íntimo prolongado e repetido, o que vale tanto para amamentação no peito quanto para a mamadeira. Deve-se oferecer o leite materno ordenhado, pois é isento de bacilos. O contato direto é permitido após, no mínimo, duas semanas de tra- tamento, com melhora do quadro clínico e resultado negativo do BK no escarro. Essas são as recomendações da Academia Americana de Pediatria. O Centro de Lactação de Santos, SP, recomenda, ainda, lavar as mãos, usar máscara e administrar hidrazida ao RN na dose de 10mg/kg/dia durante três meses. Hanseníase não contagiante: amamentar normalmente. Hanseníase contagiante: é a forma não tratada ou em tratamento com sulfona, há menos de três meses, ou com rifampicina, há menos de três semanas. Nesses casos, as mãos devem ser rigorosamente lavadas e os panos desinfetados antes de amamentar, o uso de máscara é obrigatório e o tratamento deve prosseguir concomitantemente. Infecção pelo HIv: de acordo com o Ministério da Saúde, constitui contraindica- ção absoluta ao aleitamento materno, assim como ao aleitamento cruzado, sendo obri- gatório o aleitamento artificial. O diagnóstico e o tratamento devem ser realizados o manual febrasgo2 miolo.indd 44 27/8/2010 14:59:06 45 Intercorrências Maternas Gerais mais precocemente possível e a lactação deve ser suprimida imediatamente após o parto. Para os recém-nascidos prematuros deve ser oferecido leite humano pasteurizado em Banco de Leite Humano. É necessário, porém, relatar algumas evidências científicas: • Apesar de o AM ser contraindicado nos países industrializados, ele é permitido em situações de pobreza em que os seus benefícios superam os riscos da trans- missão vertical. • A terapia antirretroviral reduz a transmissão vertical da doença. • Com o aleitamento misto (peito e mamadeira), o risco de transmissão vertical é maior do que com o aleitamento materno exclusivo. • A pasteurização do leite materno (a 62,5ºC) realizada por Bancos de Leite Hu- mano destrói o HIV. Em suma, a questão não está fechada. Novas pesquisas poderão (ou não) modificar certas verdades até o momento consideradas absolutas. manual febrasgo2 miolo.indd 45 27/8/2010 14:59:06 manual febrasgo2
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