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Capital Social, Teoria e Prática

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO 
GRANDE DO SUL 
DCS – DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS 
PROGRAMA DE PESQUISA EM CIÊNCIAS SOCIAIS 
LINHA DE PESQUISA: SOCIEDADE, CULTURA E PODER 
 
 
 
 
 
 
CAPITAL SOCIAL: TEORIA 
E PRÁTICA 
 
ORGANIZADORES: 
MARCELLO BAQUERO E DEJALMA CREMONESE 
 
 
 
 
 
 
 
Ijuí, maio de 2006.
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
APRESENTAÇÃO ....................................................................................................................................................... 3 
A RETÓRICA DO CAPITAL SOCIAL: UMA ANÁLISE DA OBRA DE ROBERT PUTNAM 
Leonardo Monteiro Monasterio .................................................................................................................................. 11 
GLOBALIZAÇÃO E DEMOCRACIA INERCIAL: O QUE O CAPITAL SOCIAL PODE FAZER NA 
CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE PARTICIPATIVA? 
Marcello Baquero ....................................................................................................................................................... 28 
INSOLIDARISMO E CORDIALIDADE: UMA ANÁLISE DAS MAZELAS POLÍTICAS DO BRASIL 
Dejalma Cremonese .................................................................................................................................................... 48 
SOCIEDADE CIVIL OU CAPITAL SOCIAL? UM BALANÇO TEÓRICO 
Julian Borba e Lillian Lenite da Silva ........................................................................................................................ 71 
A DIMENSÃO INTANGÍVEL DO DESENVOLVIMENTO: ALGUMAS REFLEXÕES PRELIMINARES 
Valdir Roque Dallabrida ............................................................................................................................................ 88 
O CAPITAL SOCIAL COMO CONDIÇÃO DE INICIATIVAS PRODUTIVAS 
Silvio Salej H............................................................................................................................................................. 110 
CAPITAL SOCIAL, CULTURA E SOCIALIZAÇÃO POLÍTICA: A JUVENTUDE BRASILEIRA 
Rosana Katia Nazzari ............................................................................................................................................... 123 
EDUCAÇÃO DE JOVENS E CONSTRUÇÃO DE CAPITAL SOCIAL: QUE SABERES SÃO NECESSÁRIOS? 
Rute Baquero e Lúcio Jorge Hammes....................................................................................................................... 141 
O EMPODERAMENTO E A CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL SOCIAL ENTRE A JUVENTUDE 
Angelita Fialho Silveira ............................................................................................................................................ 159 
POLÍTICAS PÚBLICAS, DIREITOS HUMANOS E CAPITAL SOCIAL 
Jussara Reis Prá ....................................................................................................................................................... 176 
CAPITAL SOCIAL E ESTRATÉGIAS DE REPRODUÇÃO DAS FAMÍLIAS RURAIS 
David Basso .............................................................................................................................................................. 193 
 
 
 
 
APRESENTAÇÃO 
 
Apresentação 
 
 O inicio do XXI inicia com o triunfo da democracia de mercado sobre a democracia que 
situava o Estado como indutor do desenvolvimento econômico. Na América Latina um dos 
principais ganhos desse processo foi a institucionalização da rejeição a quaisquer formas de 
autoritarismo, por parte dos cidadãos, embora, paradoxalmente, não tenha se solidificado uma 
postura de apoio normativo as instituições democráticas. Se, por um lado, houve mobilizações e 
demandas pelo reconhecimento de novos direitos e, em alguns casos, as conquistas foram 
significativas (movimento das mulheres), numa avaliação geral, a situação de precariedade das 
classes tradicionalmente excluídas pouco se alterou. Constata-se, presentemente, a manutenção 
de estruturas políticas e econômicas que privilegiam as classes mais abastadas em detrimento de 
políticas de proteção social dos interesses da maioria da população. 
Tal situação tem se agravado com as reformas econômicas neoliberais que não têm 
proporcionado a constituição de uma cidadania social, pois a base material (moradia, educação e 
saúde) continua precária e gerando novas formas de pobreza e exclusão social. A existência de 
mais e novos direitos políticos não tem sido suficientes para gerar uma base de apoio à 
democracia. Pelo contrário, segundo dados de pesquisa de opinião realizadas na última década 
(Latinobarômetro), observa-se um padrão atitudinal e de comportamento na América Latina de 
desvalorização da democracia poliárquica e uma crescente desconfiança nas instituições políticas 
e nos seus representantes. 
O processo de democratização formal está baseado no respeito dos direitos dos cidadãos 
em externar suas demandas e reivindicações e se a economia de mercado promove o crescimento 
econômico, então como explicar que, no caso dos países da América Latina, o desemprego 
cresça linearmente, a pobreza se manifeste em outras modalidades e a exclusão social aumente? 
 4 
Como explicar que, a América Latina, a despeito da institucionalização de procedimentos de 
fiscalização das autoridades publicas, continue a ser a Região mais desigual do mundo na 
dimensão de políticas públicas sociais? Como avaliar o fato de que o mercado tem agido muito 
mais em beneficio dos privilegiados e poderosos? 
As respostas a estas indagações são complexas. Porém, do ponto de vista das Ciências 
Sociais, o modus operandi dos estados neoliberais tem se mostrado frágil na luta contra as 
desigualdades e injustiças que o mercado tem gerado. Os representantes eleitos pelo voto 
popular, igualmente não têm se mostrado dispostos a enfrentar as forças do mercado. Não, por 
acaso, os últimos governos eleitos em países como o Peru, Equador, Bolívia, Argentina e Brasil, 
que defendiam uma agenda alternativa orientada para o social, antes das eleições, após 
assumirem o poder sucumbiram à força do mercado e de uma democracia meramente formal 
que, se necessária, mostrou-se insuficiente na preservação da qualidade de vida das pessoas e na 
proteção social da população. 
Nessas circunstâncias não se pode afirmar que a democracia na América Latina, 
principalmente na sua dimensão social, tenha se consolidado e muito menos que esteja a 
caminho de se enraizar de forma duradoura. Pelo contrário, teme-se que as condições que se 
estão estabelecendo e que promovem a fragmentação e a desigualdade coloquem um ponto de 
interrogação sobre o futuro da democracia nesta Região. 
Pensar que somente mais leis e mais instituições e a proliferação de procedimentos sejam 
suficientes para fomentar a igualdade social é negar a evidência empírica e histórica as quais 
mostram que reduzir o problema da construção democrática à tradicional dicotomia 
democracia/não democracia baseado unicamente em procedimentos pode ser fatal para a 
solidificação de um sistema minimamente responsivo as demandas da população. 
Neste sentido, torna-se imperativo refletir sobre outras dimensões que auxiliem não só na 
compreensão dos dilemas contemporâneos da democracia latino-americana, mas, sobretudo, 
pensar essa situação em termos propositivos. 
É na poblematização dessas questões que este livro se materializa, enfocando a discussão 
em torno do conceito de capital social e sua aplicabilidade enquanto instrumento com 
possibilidades (ou não) de abrir novos caminhos na resolução dos dilemas da ação coletiva. 
Assim, o livro procura avaliar a incorporação ao método democrático, princípios de grupo 
baseados na associação com vistas a revitalizar a vida política. Não é o objetivo nem o propósito 
defender um posicionamento dogmático sobrea superioridade ou não de determinada 
perspectiva teórica (instituições vs valores cívicos). Tal dicotomia nos parece ser deletéria, estéril 
e imobilizante para pensar em formas de resolução dos problemas sociais contemporâneos. Em 
nossa opinião, urge refletir sobre formas de incidência na realidade buscando, desse modo, 
 5 
contribuir organicamente para a melhoria da democracia. Cabe ressaltar que pensar em formas 
alternativas de ingerência política e construção de identidades coletivas, não implica em 
considerar a democracia representativa e suas instituições dispensáveis ou desnecessárias. Tal 
postura seria ingênua e ultrapassada. Pensamos, entretanto, que é essencial complementar os 
mecanismos formais de representação e mediação política com outros instrumentos que, ao 
longo do tempo, têm se mostrado eficazes no fomento da ação coletiva, baseados no principio da 
construção de capital social. 
O conceito de capital social está fundado na importância da cultura política e da 
sociedade civil no processo de construção democrática. O surgimento deste conceito pode ser 
atribuído, entre outros fatores, às deficiências explicativas já mencionadas do paradigma 
instuticionalista e às dificuldades do enraizamento de uma base normativa de apoio à 
democracia. Uma das conseqüências dessas dificuldades tem sido o crescente distanciamento e 
desengajamento dos cidadãos da política, bem como a crescente desconfiança, por eles 
demonstrada nas instituições tradicionais da democracia formal (partidos e congresso). 
Nesse contexto, o conceito de capital social tem sido considerado como um elo para 
entender com mais profundidade a estagnação da democracia na América Latina, mas, 
principalmente na utilidade prática ao proporcionar mecanismos de incidência na realidade 
estudada. Tal perspectiva não está imune às críticas que o conceito de CS social tem recebido 
desde seu aparecimento e que vão de argumentos ideológicas ao questionamento de sua 
operacionalização. No entanto, a sua persistência como categoria analítica em várias áreas 
(economia, ciência política, sociologia e psicologia) atestam para a importância que tal termo 
tem adquirido, não só no meio acadêmico, mas também como instrumento de vários governos no 
mundo que buscam melhorar a qualidade de suas democracias, pois consideram que o 
crescimento econômico, se não está acompanhado por valores que enfatizem a importância da 
participação dos cidadãos, a solidariedade e a confiança reciproca para resolver problemas 
coletivos, está fadado ao fracasso. Não que tais atitudes gerem uma ruptura institucional num 
sentido causal, mas, podem contribuir para a manutenção de uma cultura política descrente e 
desconfiada colocando a democracia num patamar de permanente instabilidade. 
As controvérsias e polêmicas em relação ao conceito de CS estão retratadas nos vários 
trabalhos que fazem parte deste livro. No entanto, seus autores convergem para a idéia de que, 
apesar das limitações teóricas e metodológicas do conceito de capital social, os resultados 
práticos já podem ser avaliados do ponto de vista de sua contribuição para a revitalização de 
valores subjetivos da democracia e do fomento do sentimento de pertencimento e participação na 
vida política. A título de exemplo, podem ser citadas as experiências de Villa El Salvador no 
Peru; as feiras de consumo popular na Venezuela; a promoção de identidades coletivas em povos 
 6 
indígenas no Equador e na Bolívia, bem como as centenas de experiências de cooperação 
reciproca que surgem e são documentadas a cada dia. 
Existem, também, exemplos, e não são poucos de situações onde o CS não funcionou; 
pelo contrário, manteve práticas antigas intactas (clientelismo, personalismo, patrimonialismo) 
promovendo CS num sentido negativo. No entanto, enfocar essas experiências para 
descaracterizar a utilidade de CS na promoção da ação coletiva é, em nossa opinião aderir a 
princípios que paralisam a capacidade criativa para incidir na realidade. De fato, parece que 
estamos recém começando a entender de que forma CS pode ser efetivo na construção 
democrática. Dessa forma, não consideramos o conceito de CS como a última ou a única 
verdade. Posicionamos-nos da mesma forma que Yunus (2001) o faz ao defender a importância 
de resolução de problemas pontuais sem abrir mão da natureza programática que a atividade 
intelectual exige. 
Com esses objetivos em mente, o livro está estruturado em duas partes: a primeira aborda 
o conceito de CS a partir de uma discussão conceitual e, a segunda parte analisa situações onde o 
CS tem sido aplicado. 
Leonardo Monastério inicia a primeira parte do livro com o artigo A retórica do capital 
social: uma análise da obra de Robert Putnam. Monastério acredita que Robert Putnam não foi 
o criador da expressão “capital social”, nem seu principal teórico. Contudo, seu nome está hoje 
ligado de forma definitiva a tal conceito. Monastério procura investigar como isso ocorreu. Para 
investigar o assunto, Monastério analisa as estratégias argumentativas utilizadas por Putnam em 
suas obras Making Democracy Work: civic traditions in modern Italy (1993) e Bowing Alone: 
the collapse and revival of American community (2000). O autor entende que, na primeira obra 
de Putnam, seu público-alvo é o acadêmico iniciado em Ciências Sociais e que ele usou recursos 
mais próximos da pesquisa científica tradicional. Anos depois, ao tempo da publicação de 
Bowling Alone, com seu sucesso consolidado, ele se volta para um público mais amplo do que o 
acadêmico: os norte-americanos cultos. Ao longo dos dois livros, Putnam divide-se entre 
militante e cientista: procura, ao mesmo tempo, divulgar uma idéia e preservar sua imagem de 
pesquisador sério. Para tanto, repetidas vezes afirma buscar o maior número possível de 
evidências, com vistas à comprovação de sua transparência metodológica e sua honestidade 
acadêmica. Ao mesmo tempo, utilizas estratégias persuasivas que atingem os leitores não-
acadêmicos. Monastério não pretende negar a validade de suas teses. Trata-se apenas de 
colaborar para uma melhor compreensão da obra de Putnam através das técnicas de análise 
retórica. 
 7 
Marcello Baquero, no artigo: Globalização e democracia inercial: o que o capital 
social pode fazer na construção de uma sociedade participativa?, examina por que o processo de 
globalização tem sido muito mais danoso nos países em desenvolvimento, no Brasil 
especificamente, tendo como decorrência desse processo a incidência negativa na constituição de 
capital social (capacidade associativa), enquanto que, nos países desenvolvidos, o conceito de 
capital social tem sido incorporado como estratégia governamental de promoção de políticas 
públicas socialmente orientadas. 
Dejalma Cremonese, no artigo Insolidarismo e cordialidade: uma análise das mazelas 
políticas do Brasil discorre sobre algumas categorias explicativas dos “males de origens” da 
sociedade brasileira, bem como sobre a possibilidade da construção do capital social no país. O 
autor analisa o processo da emancipação política do Brasil (Independência) e da Proclamação da 
República e seu caráter sui generis. Cremonese entende ser nas décadas de 1930 e 40 do século 
passado que aparecem, mais nitidamente, as práticas do populismo, personalismo (messianismo), 
clientelismo, patrimonialismo e coronelismo na política brasileira. Essas categorias foram 
discutidas com profundidade pelos cientistas sociais da época e servem, ainda hoje, para a 
compreensão de tais “vícios”. Frente às mazelas políticas do Brasil, consideradas empecilhos 
para o processo de modernização do país, o autor questiona se há espaço para a criação do 
capital social em nossa realidade. 
Com o artigo Sociedade civil ou capital social? Um balanço teórico, Julian Borba, e 
Lillian Lenite da Silva, entendem que o estudo das formas deassociativismo civil recebeu, no 
Brasil, nas duas últimas décadas, duas formas de tratamento teórico. Uma delas trata-se da teoria 
da sociedade civil, inspirada nos trabalhos de Habermas e Cohen e Arato. Mais recentemente, 
vem ganhando destaque na literatura a abordagem do capital social, especialmente aquela 
inspirada no trabalho de Robert Putnam. Partindo da constatação de que essa “transição teórica” 
tem sido feita de forma muito rápida e sem um balanço adequado dos limites e ganhos em termos 
analíticos, os autores pretendem comparar as duas abordagens. O artigo sustenta a hipótese de 
que a abordagem mais empírica da teoria do capital social pode reter as preocupações normativas 
da teoria da sociedade civil com maior possibilidade de operacionalização para fins 
investigativas. Além disso, poderá contribuir para a compreensão das relações entre as formas de 
associativismo civil e o Estado em contextos onde vigoram arranjos participativos. 
Valdir Roque Dallabrida, no artigo A dimensão intangível do desenvolvimento: algumas 
reflexões preliminares, entende que o desenvolvimento, além da dimensão tangível (material), 
cuja expressão maior centra-se nos aspectos econômicos, possui também uma dimensão 
intangível (imaterial), referente à capacidade coletiva para realizar ações de interesse societário. 
 8 
Para Dallabrida, o debate sobre o capital social, como diferencial para a dinamização de 
processos qualificados de desenvolvimento territorial, precisa ser enriquecido com a reflexão 
sobre o sentido de outros conceitos, tais como os de capital sinergético, densidade institucional e 
empoderamento. Na ciência geográfica, a vertente da Geografia Cultural pode contribuir 
teoricamente para o aprofundamento da dimensão intangível do desenvolvimento. 
A segunda parte do livro relativa a aplicabilidades do capital social é aberta por Silvio 
Salej, no artigo O capital social como condição de iniciativas produtivas, o autor apresenta os 
resultados exploratórios de uma pesquisa que se enquadra no campo da Sociologia Econômica. 
No nível analítico, visa a identificar o ponto de convergência entre uma teorização pré-sistêmica, 
como a do capital social, e um modelo de análise sistêmico de ampla utilização no estudo dos 
commons. Segundo Salej somos guiados por um insight de mão dupla: por uma parte, 
acreditamos que as descobertas da ciência política e da economia neo-institucional, em matéria 
de sistemas de participação e ação coletiva, constituem uma contribuição inovadora para o 
estudo da co-gestão de recursos de uso comum; por outra, pensamos que a modelização 
sistêmica permite identificar melhor as variáveis que compõem o conceito de capital social aqui 
adotado. O autor questiona se essa complementaridade será útil para a análise da situação-
problema apresenta condições de possibilidade de uma iniciativa produtiva, de tipo 
agroindustrial, que pretende se constituir em experiência-piloto para a substituição de lavouras 
de coca na Colômbia. 
No artigo Capital social, cultura e socialização política: a juventude brasileira, Rosana 
Katia Nazzari, investiga a socialização política e o capital social dos jovens brasileiros no início 
do século XXI, no contexto do debate sobre a consolidação democrática no país. Com base em 
investigações de cunho nacional e internacional, estabeleceram-se referenciais teóricos 
relacionados à socialização, cultura política e capital social, necessários para a compreensão da 
formação da juventude e o exercício democrático. São enfocados aspectos importantes da 
sociedade e do Estado na tentativa de contextualizar os dados obtidos na pesquisa empírica. A 
juventude é retratada como uma construção histórico-social, cujo perfil é traçado por meio dos 
impactos conjunturais desencadeados pelo processo de globalização e, também, por impactos 
estruturais relacionados a uma cultura política híbrida de autoritarismo e democracia. 
Rute Baquero e Lúcio Jorge Hammes no artigo Educação de jovens e construção de 
capital social: que saberes são necessários? buscam identificar saberes construídos em 
experiências educativas não-formais em três organizações – O Movimento dos Trabalhadores 
Rurais Sem Terra, a Rede em Busca da Paz e a Pastoral da Juventude Estudantil -, que enfatizam 
o grupo como espaço de convivência e ação dos jovens, problematizando-os na sua relação com 
 9 
a construção de capital social. O artigo parte da hipótese de que a vivência nos grupos se 
constitui em espaço privilegiado da formação individual e coletiva dos jovens com efeitos na 
constituição de capital social. 
A pesquisadora Angelita Fialho Silveira, no artigo O empoderamento e a constituição 
de capital social entre a juventude, propõe-se a avaliar o engajamento político da juventude 
enquanto categoria analítica, tendo como referência o contexto latino-americano. A autora 
examina os conceitos de capital social e empoderamento com o intuito de buscar elementos 
teóricos para enfocar aspectos da realidade sócio-política da população juvenil. Por fim, com 
base em pesquisa quantitativa realizada no ano de 2004 em dezenove escolas da cidade de Porto 
Alegre, são examinados dados sobre comportamento e atitudes dos jovens em relação a 
atividades coletivas, visando identificar a capacidade de participação política da juventude. 
No artigo Políticas públicas, direitos humanos e capital social, Jussara Reis Prá, enfoca 
as políticas públicas pela ótica dos direitos. Considera que é um trabalho complexo e ao mesmo 
tempo necessário e indispensável quando se considera o confronto atual entre discursos 
difundidos por diversos tipos de fundamentalismo e os voltados à defesa intransigente dos 
direitos humanos. Diante disso, refletir sobre a questão dos direitos é uma forma de repensar 
problemas que afetam a ordem social e política, dificultando a tarefa de construir uma cultura 
pública democrática em sociedades periféricas. O presente trabalho compartilha da idéia que é 
necessário intervir na formulação do discurso jurídico-normativo e em seus desdobramentos. 
Assim, examina-se o caso brasileiro com o intuito de estabelecer algumas conexões entre 
políticas públicas e direitos humanos; identificar restrições impostas ao processo de extensão 
desses direitos e pensar em formas de viabilizar estratégias de ação coletiva. A questão dos 
"direitos humanos" é associada ao marco teórico do Capital Social de uma perspectiva que 
contempla a possibilidade de promover o desenvolvimento e a manutenção desse capital no 
Brasil. O exame de dados empíricos revela que a melhoria de alguns indicadores sociais não tem 
sido capaz de promover a igualdade e inclusão da maioria da população do país. O conceito de 
capital social revela um potencial inestimável para desencadear práticas de participação e 
interpelações democráticas capazes de reverter o quadro de incertezas e de exclusão social que 
caracteriza o cenário brasileiro do novo século. Os resultados do estudo sugerem a necessidade 
articular e fomentar esse capital depende e que isso depende de nossa capacidade de construir e 
efetivar uma cultura pública de direitos humanos na sociedade brasileira. 
Por fim, Davi Basso, no artigo Capital social e estratégias de reprodução das famílias 
rurais, trata de novos procedimentos teórico-metodológicos para a análise de processos de 
desenvolvimento rural locais, considerando que tanto as atividades e rendas agrícolas, quanto 
 10 
não-agrícolas podem ser relevantes para a composição das estratégias de reprodução das famílias 
rurais. Basso apresenta os principais elementos da abordagem para tratar das estratégias de 
reprodução familiar em função do acesso a um conjunto de ativos de capital e de atores que 
operam nas esferas do mercado, do Estado e da sociedade civil, exemplificando, na medida do 
possível, com referências do estudo de uma situação de desenvolvimento rural.O autor ainda 
analisa o significado do capital social como agente capaz de potencializar processos particulares 
de desenvolvimento. 
Gostaríamos de agradecer as instituições e pessoas que foram fundamentais na 
concretização deste livro. Ao Núcleo de pesquisas Sobre América Latina NUPESAL/UFRGS, e 
ao Núcleo Interdisciplinar de Estudos Sobre a Mulher NIEM/UFRGS. Aos bolsistas de iniciação 
científica Bianca de Freitas Linhares e Douglas Santos Alves da UFRGS. A Professora Maria 
Salete de Souza Amorim da UNIOESTE, a Angelita Fialho Silveira, Rodrigo Gelpi e Lea 
Epping. Agradecimento especial a Editora da UNIJUÍ, na pessoa de Gilmar Antônio Bedin 
(Reitor e editor-chefe da Editora), a Joel Corso (editor adjunto) e, ao Departamento de Ciências 
Sociais da Unijuí, pelo apoio para que essa obra fosse publicada. 
 
 
 
 
A RETÓRICA DO CAPITAL SOCIAL: UMA ANÁLISE DA OBRA DE ROBERT 
PUTNAM 
 
Leonardo Monteiro Monasterio1 
Professor do Curso de Economia da Universidade Federal de Pelotas - UFPEL 
E-mail: leonardo.monasterio@gmail.com 
 
 
Introdução 
 
O conceito de capital social já conquistou o seu lugar no glossário das Ciências Sociais. 
Mesmo não tendo sido o criador da expressão, é consensual que foi o sociólogo James Coleman 
(1988) o responsável por trazê-la a lume nos debates acadêmicos. Contudo, foram os trabalhos 
do cientista político Robert Putnam os que tiveram maior impacto. Seu Making Democracy 
Work: civic traditions in modern Italy (1993; a partir de agora MDW) cruzou as fronteiras das 
Ciências Sociais, alcançando um público mais amplo do que aqueles atraídos apenas pelo restrito 
subtítulo da obra. 
Hoje, o nome de Putnam está tão associado ao capital social quanto, por exemplo, o de 
Ronald Coase (1937) aos custos de transação. Ao contrário deste, porém, Putnam não foi o 
pioneiro, nem o responsável por avanços teóricos de vulto acerca do tema. Qual a origem, então, 
de seu sucesso? 
Existem múltiplas causas que conduzem ao triunfo de um conceito e à celebração de um 
autor. Foge do escopo do trabalho identificá-las na totalidade no caso de Putnam; busca-se 
apenas examinar o papel da retórica ao longo de seus escritos. Ou seja, será feita uma análise 
retórica que destaque as estratégias persuasivas empregadas pelo autor. Trata-se de um estudo 
 
1
 Agradeço a revisão atenta e os comentários de Martin Dietrich Brauch. 
 12 
inserido naquilo que Harris (1997) chamou de “retórica da disseminação”: buscam-se no texto as 
concessões que o autor fez para que sua mensagem obtivesse o apoio devido. 2 
A próxima seção mostra, através de dados quantitativos, a medida do estrondoso impacto 
que MDW causou no meio acadêmico. Além desse livro, analisou-se outra obra de Putnam: 
Bowling Alone: the collapse and revival of American community (2000) (doravante BA). Com 
isso, será possível perceber as mudanças estratégicas de Putnam ao longo de sua trajetória de 
apóstolo do capital social. Devido à extensão das obras, optou-se por estudar apenas o prefácio e 
os capítulos 1, 4 e 6 de MDW e os capítulos 1, 10 e 16 de BA. As seções 2 e 3 estão voltadas 
para o estudo dessas obras. Há, ainda, uma seção conclusiva. 
 
A Ascensão e Ascensão do Capital Social 
 
Em 1993, aos 52 anos, Putnam já tinha uma carreira consolidada como cientista político 
na Universidade de Harvard. Ele obtinha uma elevada freqüência anual de citações pelos seus 
trabalhos anteriores: 49 referências em 1992 e 17 no ano seguinte. A publicação de MDW fez 
com que esses números ficassem ofuscados. Conforme mostra a Tabela 1, o impacto da obra foi 
rápido. Entre os anos de 1993 e 1999, as citações cresceram à taxa média anual de 76,5%. 
Segundo o próprio autor, o começo de ano de 1995 é o marco da sua passagem de obscure 
academic para uma figura pública. Ele passou a ser presença constante em talk-shows, Camp 
David e foi retratado pela revista People (BA, p. 506). 
Os dados mais recentes sugerem que o número de citações a MDW continua crescendo. 
Para fins de comparação, basta mostrar que, em 2002, o número de referências a MDW superou 
as de “O Capital” (130 citações - todas as citações de Karl Marx em 2002 somaram 335 
referências únicas). 
 
2
 Não há mais necessidade de se fazer uma justificativa do projeto retórico nas ciências econômicas. Desde o texto 
seminal de McCloskey (1983), tem havido profícuos debates e estudos de caso que consolidaram esse tipo de 
pesquisa. Vale acrescentar que a postura da retórica da disseminação é mais conservadora do que considerar que 
"ciência = retórica" (ver Harris, 1997, p. xxx) 
 13 
TABELA 1 - CITAÇÕES ÚNICAS AO TERMO SOCIAL CAPITAL E AOS PRINCIPAIS 
LIVROS DE ROBERT PUTNAM – 1993-2003. 
 
 “Social Capital” Making Democracy Work Bowling Alone 
1993 15 10 
1994 14 33 
1995 28 68 
1996 38 129 
1997 61 162 
1998 112 215 
1999 129 227 
2000 176 281 11 
2001 210 299 81 
2002 257 283 100 
2003 291 215 118 
 
Fonte: Autor com base em Science Citation Index Expanded, Social Sciences Citation Index (SSCI) e 
Arts & Humanities Citation Index (A&HCI). Versão eletrônica, consultada em 6 de Novembro de 2004. 
 
A Tabela 1 realça o impacto de MDW, mesmo quando comparado com trabalhos afins. A 
ocorrência da expressão “social capital” nos títulos e resumos de artigos científicos deu-se com 
freqüência crescente. A mesma tendência foi observada no tocante à citação do trabalho de 
James Coleman Human Capital and Social Capital. Contudo, a despeito desses avanços, um ano 
após o seu lançamento, o número de citações de MDW já ultrapassava a própria ocorrência da 
expressão “social capital”. Isso indica que MDW atingiu um público acadêmico mais amplo do 
que os interessados apenas na questão do capital social. 
BA, por sua vez, mostrou seu impacto acadêmico muito mais rapidamente do que MDW. 
Conforme mostra a tabela, o livro salta de uma dezena de citações no ano do lançamento para 
uma centena dois anos depois. Apesar de ser cedo demais para garantir, dados recentes sugerem 
que BA alcançou um patamar de citações mais baixo do que MDW. Este padrão poderia sugerir 
que o impacto de BA foi mais limitado. Contudo, levando-se em conta o impacto total de BA, e 
 14 
não apenas no meio acadêmico, muda-se de figura. Uma busca no Google por “Bowling Alone” 
gera cerca de 32.000 resultados, enquanto “Making Democracy Work”, 16.500 itens. 3 
 
Making Democracy Work (1993) 
 
No prefácio de MDW, Putnam deixa claro quais são seu tema e seus objetivos: This book 
explores some fundamental questions of civic life by studying the regions of Italy. It is written 
with two different audiences in mind - those who share my fascination with subtleties of Italian 
life, and those who do not, but who care about democratic theory and practice (MDW, p. xiii).4 
Ou seja, a experiência italiana é apenas um instrumento, uma ilustração de um debate 
muito mais profundo acerca das condições que fazem “a democracia funcionar”.5 Ao explicitar o 
seu leitor presumido, ele está indicando que seu argumento almeja um público bem maior do que 
os interessados apenas pela Itália. É quase uma conclamação aos leitores interessados pela 
ciência política e pela democracia para que sigam em frente. 
Seu pathos, isto é, seu esforço para atrair a atenção do leitor, é reforçado pelo convite a 
uma viagem exploratória (A Voyage of Inquiry) através da Itália moderna. Ao longo de suas 
páginas, cruzam-se os 870 quilômetros que separam o norte do sul do país. To the thoughtful 
observer, however, this swift passage is less impressive for the distance spanned than for the 
historical contrast between the point of departure and the destination (MDW, p. 4).63
 A busca foi feita em 5 de Novembro de 2004 e, para evitar falsos resultados, o termo “Putnam” foi incluído. Para 
fins de comparação, pesquisa semelhante por “Keynes” e “General Theory” resultou em 30.500 itens. 
4
 Este livro explora algumas questões fundamentais da vida cívica através do estudo das regiões da Itália. Destina-se 
a dois públicos-alvos – aqueles que compartilham minha fascinação com os pormenores da vida italiana, e aqueles 
que não são fascinados com a Itália, mas que se interessam por teoria e prática democráticas (tradução livre). 
5
 Putnam (1993, p. 3) reafirma esse ponto em diversos momentos ao longo do capítulo introdutório de MDW: “This 
book aims to contribute to our understanding of the performance of democratic institutions...Our intent is 
theoretical, our method is empirical, drawing lessons from a unique experiment in institutional reform conducted in 
regions of Italy over the two last decades”. (Este livro visa a contribuir para nosso entendimento a respeito da 
performance das instituições democráticas... Nossa intenção é teórica, nosso método é empírico, tirando lições de 
um experimento singular de reforma institucional conduzido em regiões da Itália ao longo das duas últimas 
décadas.) 
“The central question posed in our voyage of inquiry is this: What are the conditions for creating strong, responsive, 
effective representative institutions” (MDW, p. 6, grifo no original). (A questão central que é colocada em nossa 
viagem exploratória é esta: Quais são as condições para a criação de instituições representativas fortes, eficientes e 
efetivas.) 
6
 Para o observador atento, porém, esta breve viagem impressiona menos pela distância atravessada que pelo 
contraste histórico entre os pontos de partida e destino. 
 15 
Em um relato impressionista, em que o tempo não importa (ora estamos na década de 
1970, ora no tempo presente), Putnam reforça os contrastes entre as regiões italianas. Para 
qualificar o governo regional da Puglia, ao sul, ele reserva os termos “indolente”, “lúgubre” 
(dingy), “fantasmagórico” (ghostly). Já em relação à sede do governo da Emilia-Romagna, os 
adjetivos são: “moderno” (modern), “diligente” (brisk), “cortês” (courteous). 
Neste ponto, já se sabe quais são os interesses dos leitores presumidos de MDW. E qual a 
formação intelectual que Putnam espera da audiência? Têm-se algumas pistas. Ele supõe um 
leitor culto e, mais importante, já iniciado nas Ciências Sociais. Uma audiência para a qual há 
sentido na analogia entre a observação de um conjunto de dados estatísticos e a apreciação de um 
quadro do pintor pontilhista Seurat (MDW, p. 12). Um público capaz de identificar uma paródia 
de Marx (MDW, p. 8) e que reconheça a autoridade de Karl Deutsch (MDW, p. 12) e Kenneth 
Arrow (MDW, p. 170), sem a necessidade de apresentações. Apenas aqueles autores cujas 
credenciais intelectuais não vão além da sua área de pesquisa é que são adjetivados. Tem-se, 
assim, a thoughful observer (atenta observadora) Elinor Ostrom e o specialist (especialista) 
Arturo Israel. Muitas vezes o diálogo é buscado com os adeptos da Teoria Política e Econômica 
moderna: jogos em forma extensiva (MDW, p. 7), dilemas de ação coletiva, tragédia dos bens 
comuns (MDW, p. 10) são citados sem maiores explicações. 
A escolha de expressões tipicamente modernistas7 mostra a preocupação de Putnam em 
buscar o diálogo com cientistas sociais que seguem esse tipo de abordagem: Our study of the 
Italian regional experiment is intended to contribute empirical to both these themes. Taking 
institutions as an independent variable, we explore empirically how institutional change affects 
the identities, power, and strategies of political actors. Later, taking institutions as a dependent 
variable, we explore how institutional performance is conditioned by history (MDW, p. 8).8 
Putnam reforça o caráter empírico do estudo e seu jargão de “variáveis dependentes e 
independentes” é bastante aconchegante para aqueles que cursaram Introdução à Econometria. 
Com isso, ele se credencia como um cientista sério, de acordo com os critérios modernistas. 
Por outro lado, Putnam também mostra que navega bem entre os clássicos da Ciência 
Política. Aristóteles, Platão, Hume, Mill, Tocqueville transitam ao longo do primeiro capítulo, 
demonstrando o ethos do autor como versado na Teoria Política mais tradicional. Assim, 
 
7
 Modernistas no sentido adotado por McCloskey (1983). 
8
 Nosso estudo da experiência regional italiana pretende contribuir empiricamente para ambos os temas. Tomando as 
instituições como uma variável independente, exploramos empiricamente como as mudanças institucionais afetam 
as identidades, o poder e as estratégias dos atores políticos. Em seguida, tomando as instituições como uma variável 
dependente, exploramos como a performance institucional é condicionada pela história. 
 16 
qualquer que seja o tipo de Ciência Política a que o leitor seja afeito, ele encontrará em Putnam 
um interlocutor à altura. 
Metodologicamente, Putnam afirma que seu estudo busca recolher o maior número 
possível de evidências. Para justificar essa postura, ele se apóia em Karl Deutsch e reforça: “The 
prudent social scientist, like a wise investor, must rely on diversification to magnify the 
strengths, and to offset the weakness, of any single instrument.”9 (p. 12, grifos meus). Dessa 
maneira, ele reitera sua posição como cientista social (e não apenas cientista político) cauteloso e 
defende uma metodologia que tem evidente apelo persuasivo: “se tantos dados apontam na 
mesma direção, ele devem estar certos!”. 
Explaining Institutional Performance é apontado por Putnam como o ponto central do 
estudo (MDW, p. 15). Isso é um fato, porque nessa seção ele estabelece o elo causal entre 
comunidade cívica e desempenho institucional. Vejamos como o argumento é construído. 
Putnam inicia o capítulo afirmando que há muito tempo os sociólogos políticos sustentam que o 
desempenho institucional depende da modernidade econômica e que essa correlação é observada 
empiricamente. O caso italiano não fica de fora e, de fato, as regiões mais desenvolvidas são 
aquelas de melhor performance institucional. Mas o autor argumenta que essa ligação é ilusória 
ao mostrar graficamente que a variação da qualidade institucional dentro das regiões norte e sul é 
independente do grau de desenvolvimento econômico. 
Essa técnica argumentativa foi classificada por Perelman (1969) como procedimento de 
dissociação, mais especialmente de “ruptura de ligação”.10 Ela consiste em asseverar que a 
conexão existente entre dois elementos não deveria ter sido feita e, portanto, deve ser rompida. 
Putnam, tendo excluído da ligação a modernidade econômica, pode estabelecer sua própria 
conexão entre desempenho institucional e comunidade cívica. 
Em seguida, Putnam passa a construir uma ligação com base no argumento pelo caso 
particular. Esse argumento consiste em, a partir de um fato (i. e. premissas limitadas que são 
aceitas por todos), fundamentar uma proposição mais geral, uma regra (Salviano Jr., 1993). Seu 
fato é a relação causal entre comunidade cívica e desempenho institucional na Itália moderna. 
Sua regra é que isto pode ser extrapolado como uma norma para o funcionamento das 
democracias. 
 
9
 O cientista social prudente, como um sábio investidor, deve apoiar-se na diversificação para aumentar as forças, e 
para compensar as fraquezas, de qualquer instrumento singular. 
10
 Para uma apresentação sistematizada da tipologia das técnicas argumentativas de Perelman, ver Salviano Jr. 
(1993, cap. I). Para uma aplicação dessa classificação à obra de Oliver Williamson, ver Fernandez e Pessali (2000). 
 17 
Ele elabora o conceito de comunidade cívica ao longodo capítulo IV mediante 
procedimentos retóricos que vale a pena destacar. Sem uma definição sintética, segue a seguinte 
estratégia: examinar vários quesitos que uma comunidade cívica deve cumprir (participação 
cívica; igualdade política; solidariedade, confiança, tolerância; e práticas associativas) para então 
averiguar a aderência entre esse tipo ideal e as regiões do norte da Itália. 
Através de análise fatorial, Putnam cria um único indicador de civismo que tenta capturar 
os diversos aspectos da comunidade cívica. Apresenta um gráfico que destaca a forte correlação 
entre os indicadores de comunidade cívica e o de desempenho institucional. A relação aparece 
com “stark clarity”. E mais: “the predictive power of the civic community is greater than the 
power of economic development” (p. 98).11 Poder de predição? Rigorosamente, a afirmação só é 
apropriada se ele testasse suas previsões em um outro conjunto de dados ou omitisse 
observações. É razoável entender essa frase como mais uma forma de satisfazer as expectativas 
dos pesquisadores “sérios”. 
O próximo passo de Putnam consiste em relacionar as comunidades cívicas com outras 
variáveis obtidas em pesquisas de opinião como: intransigência das lideranças, clientelismo, 
apoio à igualdade política, entre outras. Com isso, ele faz um retrato da comunidade cívica, no 
qual muitas vezes não se sabe se ele está se referindo a um ideal ou ao observado na Itália. Por 
exemplo, após dar conta que na região mais cívica apenas 20% dos líderes políticos concordam 
que “transigir é perigoso”, ele escreve: “Politicians in civic regions do not deny the reality of 
conflicting interests, but they are unafraid of creative compromise”.12 Essa é uma afirmativa 
relativa a uma sociedade imaginada, ou à Itália concreta? 
No trecho abaixo, Putnam faz um retrato utópico, idílico, da comunidade cívica e o 
contrapõe à distopia da sociedade pouco cívica: Citizens in civic community, it is said, deal 
fairly with one another and expect fair dealing in return. They expect their government to follow 
high standards, and they willingly obey the rules they have imposed on themselves... In a less 
civic society, by contrast, life is riskier, citizens are warier, and the laws, made by higher ups, are 
made to be broken (MDW, p. 111).13 
 
 
11
 O poder preditivo da comunidade cívica é maior que o poder do desenvolvimento econômico. 
12
 Políticos em regiões cívicas não negam a realidade dos interesses conflitantes, mas não têm medo de 
compromissos criativos. 
13
 Diz-se que os cidadãos na comunidade cívica lidam com justiça uns com os outros e esperam tratamento justo em 
retribuição. Eles esperam que seu governo siga altos padrões, e voluntariamente obedecem às regras que impõem a 
eles próprios... Em uma sociedade menos cívica, por outro lado, a vida tem mais riscos, os cidadãos são mais 
cuidadosos e as leis elaboradas pelos governantes são feitas para ser violadas. 
 18 
Percebendo que essa caricatura não é uma das práticas vista com bons olhos pela 
Academia, faz uma ressalva: This account of the civic community sounds noble, perhaps, but 
also unrealistic and even mawkish, echoing some long-forgotten high school civics text. 
Remarkably, however, evidence from the Italian regions seems consistent with this vision 
(MDW, p. 111).14 
Ou seja, são os dados que lhe permitem fazer essa contraposição qualitativa entre as 
sociedades com graus distintos de civismo. No fim do capítulo, ele abre mão da modéstia e 
dúvida acadêmica para reafirmar peremptoriamente a importância do civismo: The evidence 
reviewed in this chapter is unambiguous: Civic context matters for the way institutions work. By 
far the most important factor in explaining good government is the degree to which social and 
political life in a region approximates the ideal of civic community (MDW, p. 120).15 
O título do capítulo VI, Social Capital and Institutional Success, é o primeiro lugar no 
qual Putnam utiliza o conceito que está hoje ligado ao seu nome de forma indelével. Ele espera 
até a última seção do livro, quando os leitores possivelmente já foram persuadidos, para 
introduzir o conceito que o tornou famoso. E, mesmo nesse capítulo final, ele só trata do 
conceito a partir da segunda parte. A primeira está dedicada à demonstração de que o dilema da 
ação coletiva é uma questão teórica recorrente. Desde o charco de Hume até o dilema do 
prisioneiro, há diversas situações nas quais indivíduos racionais deixam de aproveitar os ganhos 
potenciais da cooperação. Em seguida, ele argumenta que a solução proposta pelo novo 
institucionalismo aos problemas de ação coletiva – qual seja, instituições formais que garantam a 
colaboração – é insuficiente, pois não explica o surgimento destas. 
O capital social entra em cena com um papel claro: resolver os problemas de ação 
coletiva. Sua definição é uma das mais citadas na bibliografia sobre o tema: Social capital here 
refers to features of social organization, such as trusts, norms, and networks, that can improve 
the efficiency of society by facilitating coordinated actions (MDW, p. 167).16 
Segue-se uma citação de Coleman (1990) que também enfatiza o caráter produtivo do 
capital social. Em momentos posteriores da obra de Putnam, outros benefícios surgem, mas 
 
14
 Essa descrição da comunidade cívica parece nobre, talvez, mas também irreal e mesmo piegas, ecoando alguns 
textos cívicos esquecidos do colegial. Notavelmente, entretanto, evidências das regiões italianas parecem ser 
consistentes com esta visão. 
15
 É curioso notar que apenas nesse momento ele explicita que a comunidade cívica é um ideal. Tradução: Não há 
ambigüidade na evidência revisada neste capítulo: o contexto cívico importa para o modo como funcionam as 
instituições. O mais importante fator para explicar o bom governo é o grau em que a vida social e política em uma 
região aproxima-se do ideal da comunidade cívica. 
16
 A expressão “capital social” aqui se refere às características da organização social, tais como confiança, norma e 
redes, que podem melhorar a eficiência da sociedade, facilitando ações coordenadas. 
 19 
nesse instante a ênfase está na obtenção da cooperação espontânea para a produção de bens 
coletivos. Putnam apresenta um exemplo de colaboração voluntária para mostrar a relevância e a 
universalidade do capital social: as associações rotativas informais de crédito. Elas estão 
presentes em diversas partes do planeta e o autor as explicita: Rotating saving credit associations 
have been reported from Nigeria to Scotland, from Peru to Vietnam, from Japan to Egypt, from 
West Indian immigrants in the eastern United States to Chicanos in the West, from illiterate 
Chinese villagers to bank managers and economic forecasters in Mexico city (MDW, p. 167).17 
A clássica figura retórica que ele usa chama-se copia. Ela se baseia na repetição, na 
referência a uma vasta quantidade de casos como forma de tornar o argumento mais persuasivo. 
Além disso, ao dizer de “X até Y” ele faz crer que existem registros de crédito rotativo em todos 
os pontos intermediários; como se os indivíduos constituíssem associações cooperativas de 
crédito em todos os países que ficam entre o Japão e o Egito. 
 
Bowling Alone (2000) 
 
Tal como em MDW, Bowling Alone tem início com uma impressionista visão panorâmica 
do problema. Se na obra de 1993 a viagem exploratória ocorreu através do espaço italiano, agora 
ela ocorre ao longo do tempo (BA, p. 15-18). Ele pinta um mosaico da decadência da 
participação associativa nos EUA de hoje e o contrasta com um passado não tão distante, a 
década de 60, quando o engajamento em questões comunitárias alcançou níveis inéditos. 
Naquela época: “Never in our history had the future of civiclife looked better18”. Em seguida, 
ele apresenta o tema do livro: “What happened next to civic and social life in American 
communities is the subject of the book”.19 
O conceito de capital social é apresentado logo na página 18, através da analogia com os 
outros tipos de capital: Just as a screwdriver (physical capital) or a college education (human 
 
17
 A existência de associações rotativas de crédito tem sido constatada da Nigéria à Escócia, do Peru ao Vietnã, do 
Japão ao Egito, de imigrantes indianos ocidentais na costa leste dos EUA até Chicanos na costa oeste, de aldeãos 
chineses iletrados a gerentes de banco e elaboradores de previsões econômicas na Cidade do México. 
18
 Nunca em nossa história o futuro da vida cívica tinha parecido tão bom. 
19
 O que em seguida aconteceu com a vida cívica e social nas comunidades estadunidenses é o assunto do livro. 
 20 
capital) can increase productivity (both individual and collective), so too social contacts affect 
the productivity of individuals and groups (BA, p. 19).20 
A escolha dos exemplos indica qual o leitor-alvo de Putnam. Em vez de um torno ou uma 
complexa máquina, ele opta por um bem de capital próximo do cotidiano. E, em vez de ilustrar o 
capital humano com a educação básica, ele escolhe a educação universitária, cujos ganhos 
pecuniários são conhecidos de seus leitores: norte-americanos bem-educados. 
O histórico do conceito que se segue, além do valor em si, tem forte apelo argumentativo. 
Ele mostra que a expressão social capital foi cunhada independentemente ao menos seis vezes 
ao longo do século XX. Quando pensadores isolados formulam conceitos e teorias análogas, 
alguma pertinência deve haver. Vide os casos de Newton e Leibnitz; Wallace e Darwin; e 
Keynes e Kalecki. Ele apresenta os autores acompanhados de sua área de pesquisa e sua 
nacionalidade (exceto no caso dos norte-americanos). Tem-se: os Canadian sociologists, a 
urbanist Jane Jacobs; o economist Glenn Loury; o French social theorist Pierre Bourdieu; o 
German economist Ekkehart Schlicht e o sociologist James Coleman (BA. p. 19). Assim, ele faz 
crer que o conceito de capital social é um consenso não só entre os ramos das Ciências Sociais, 
como também internacional. 
Ainda no primeiro capítulo, Putnam aponta que nem sempre o capital social traz efeitos 
positivos para a sociedade como um todo. Ele cita o exemplo extremo da rede de amigos que 
auxiliou Timothy McVeigh no atentado terrorista em Oklahoma. Em uma nota de fim de texto 
(BA, p. 446) ele admite ter, em MDW, ignorado “the possibility that social capital might have 
antisocial effects, but I recognized this possibility explicitly in ‘The Prosperous Community’, 
published in the same year”21. É inevitável supor que a omissão do dark side do capital social 
tenha sido estratégica, já que no mesmo ano ele já tinha ciência dessa faceta. Mais adiante, a 
analogia com os capitais físicos e humanos é usada para minimizar o caráter perverso do capital 
social. Ele lembra que McVeigh também usou máquinas e seus conhecimentos para cumprir seus 
objetivos de destruição. Essa ilustração anula as diferenças e mostra que todos os “capitais” 
podem trazer prejuízos para a sociedade. 
Na discussão sobre os tipos de capital social, ele usa com generosidade as metáforas. O 
bridging social capital envolve pessoas de diversos grupos sociais, enquanto o bonding mantém 
os grupos internamente coesos. A seguir ele cunha uma metáfora cotidiana de conceitos que já 
 
20
 Assim como uma chave de fenda (capital físico) ou uma educação de nível superior (capital humano) podem 
aumentar a produtividade (individual e coletiva), também os contatos sociais afetam a produtividade de indivíduos e 
grupos. 
21
 […] a possibilidade de que o capital social tenha efeitos anti-sociais, mas reconheci essa possibilidade 
explicitamente na obra “A Comunidade Próspera”, publicada no mesmo ano. 
 21 
são metáforicos (bridging, bonding social capital): Bonding social capital constitutes a kind of 
sociological superglue, whereas bridging social capital provides a sociological WD-40. (BA, p. 
23).22 
É interessante notar o esforço que ele faz para diferenciar seu argumento das 
declensionist narratives, isto é, “the postmodernist jargon for tales of decline and fall”23 (BA, p. 
24). Ele argumenta que não há uma direção unívoca de variação no capital social norte-
americano. No século XX houve ondas de renovação e contra-fluxos de colapso (BA, p. 25). 
Mas o verdadeiro antídoto contra “gauzy self-deception”24 que poderia levar a “simple 
nostalgia”25 é a transparência dos métodos. O que ele quer dizer com isso? Dados quantitativos: 
“One way of curbing nostalgia is to count things”26. Com base em que informações? Nada 
menos que “... the best available evidence”27 (BA, p. 26). 
Em MDW, Putnam recorria ao argumento de Deutsch para asseverar a regra 
metodológica de usar várias fontes de dados. Agora ele usa uma ilustração que exige menos 
conhecimentos do leitor: “prudent journalists follow a 'two source' rule: Never report anything 
unless at least two independent sources confirm it”28. Na seqüência, ele nos garante a sua 
honestidade intelectual: In this book I follow that same maxim. Nearly every major 
generalization here rests on more than one body of independent evidence, and where I have 
discovered divergent results from credible sources, I note that disparity as well.29 
Mesmo longo, vale reproduzir o trecho abaixo: I have a case to make, but like any officer 
of the court, I have a professional obligation to present all relevant evidence I have found, 
exculpatory as well as incriminating. To avoid cluttering the text with masses of redundant 
 
22
 O capital social “ligação” constitui um tipo de supercola sociológica, enquanto o capital social “ponte” provê um 
WD-40 sociológico. (WD-40 é um produto químico, desenvolvido em 1953 para a indústria aeroespacial com a 
finalidade de prevenir corrosão e ferrugem). 
23
 O jargão pós-modernista para movimentos de declínio 
24
 Difuso auto-engano 
25
 Simples nostalgia 
26
 Um meio de evitar a nostalgia é contar as coisas. 
27
 a melhor evidência disponível 
28
 Jornalistas prudentes seguem a “regra das duas fontes”: nunca noticiam algo que não seja confirmado por pelo 
menos duas fontes independentes. 
29
 Neste livro eu sigo a mesma máxima. Praticamente toda generalização aqui feita repousa sobre mais de um corpo 
de evidências independentes, e onde descubro resultados divergentes de fontes dotadas de credibilidades observo 
também essa disparidade. 
 22 
evidence, I have typically put confirmatory evidence from multiple studies in the notes, so 
skeptical 'show me' readers should examine those notes as well as the text (BA, p. 26).30 
A primeira frase demonstra o quanto ele está consciente da sua missão persuasiva. 
Alardeia que sua honestidade acadêmica o faz apresentar todas as evidências, quer a favor, quer 
contra a sua tese. A frase seguinte também é significativa: aqueles que recorrerem às notas do 
fim de texto, ao invés de leitores atentos, são uns céticos, uns incrédulos que não botam fé na 
imparcialidade do professor Putnam.31 
Se os argumentos pela seriedade científica do estudo não forem suficientes, ele busca 
cativar o coração do leitor. Conta uma história verídica em que um parceiro de boliche doou o 
fígado para outro apesar de se encontrarem apenas para jogar. O relato fica ainda melhor quando 
informa que o doador é branco (33 anos) e o recebedor, afro-americano (64 anos) (BA, p. 28). 
Lágrimas vertidas, lê-se a conclamação do livro: In small ways like this- and in larger ways too- 
we Americans need to reconnect with one another. This isthe simple argument of this book.32 
A seção seguinte, Trends in Civic engagement and Social Capital, retrata a erosão do 
capital social nos EUA a partir do fim da década de 60. O capítulo introdutório da seção III – 
intitulado Why?, no qual Putnam apresenta as razões desse fenômeno – contém a metáfora que 
será bastante explorada: It is, if I am right, a puzzle of some importance to the future of 
American democracy. It is a classic brainteaser, with a corpus delicti, a crime scene, strewn with 
clues, and many potential suspects. As in all good detective stories, however, some plausible 
miscreants turn out to have impeccable alibis, and some important clues hint at portentous 
developments that occurred long before the curtain rose. Moreover, as in Agatha Christie's 
Murder on the Orient Express, this crime turns out to have more than one perpetrator, so that we 
shall need to sort out ringleaders from accomplices (BA, p. 184).33 
 
30
 Tenho que fazer um caso, mas, como qualquer oficial em um tribunal, tenho a obrigação profissional de 
apresentar todas as provas relevantes que tiver encontrado, absolutórias ou incriminadoras. Para evitar o 
abarrotamento do texto com massas de evidências redundantes, eu normalmente coloquei evidências confirmatórias 
(comprobatórias) de diversos estudos nas notas, para que os céticos leitores “mostre-me” possam examinar essas 
notas assim como o texto. 
31
 Os incrédulos que buscarem todas as notas finais do livro terão que fazê-lo 991 vezes (sic). 
32
 Em pequenas atitudes como essa – e também de maneiras mais amplas – nós, estadunidenses, precisamos 
estabelecer vínculos uns com os outros. Este é o argumento simples deste livro. 
33
 Trata-se, se estou certo, de um quebra-cabeça importante para o futuro da democracia estadunidense. É um 
clássico exercício mental, com um corpus delicti, uma cena de crime, pistas e muitos suspeitos. Como em todas as 
boas histórias de suspense policial, porém, alguns plausíveis delinqüentes têm, no fim das contas, álibis impecáveis, 
e algumas pistas importantes apontam para desenvolvimentos, ocorridos muito antes do abrir das cortinas, que 
demonstravam a futura ocorrência de acontecimentos desagradáveis. Além do mais, como no Assassinato no 
Expresso Oriente, de Agatha Christie, o crime pode acabar tendo mais de um executor; então, precisamos fazer a 
distinção entre autores e cúmplices. 
 23 
A pesquisa científica se transforma em um livro de mistério34. A escolha de Agatha 
Christie é perfeita. Putnam segue uma tradição inglesa de romance policial no qual há um 
enigma intelectual a ser resolvido em um ambiente a princípio ordeiro e as evidências estão todas 
disponíveis ao observador atento. Não há aqui detetives como os norte-americanos Sam Spade 
ou Marlowe, imersos na desordem geral, tendo que buscar por conta própria as provas do 
crime.35 Finally, I need to make clear at the outset that I have not entirely solved the mystery, so 
I invite your help in sifting clues (BA, p. 184).36 
A afirmação de que não resolveu completamente o Enigma da Erosão do Capital Social, 
em vez de ser uma confissão de incapacidade, torna-se um irresistível convite. Como não aceitar 
participar da resolução de um crime em que todos os elementos estão postos? Quem resiste a um 
quebra-cabeça? 
A partir daí, ele segue usando a primeira pessoa do plural (uma vez que aceitamos o 
convite) e o jargão policial. Ele reafirma o mistério, argumentando que nenhum dos usual 
suspects se destaca no alinhamento inicial. Ao listar os mais de dez possíveis culpados (que vão 
desde a televisão até a ampliação do Welfare State), ele escreve: Most respectable mystery 
writers would hesitate to tally up this many plausible suspects, no matter how energetic their 
detective, I am not in a position to address all these theories - certainly not in any definitive 
form- but we must begin to winnow the list.37 
O próximo passo persuasivo de Putnam é mostrar a falta que o capital social faz, ou 
melhor dizendo, os benefícios potenciais que adviriam de sua ressurreição. Mas ele não faz um 
mero panegírico. A seção So What? Mostra, com generosos recursos às evidências empíricas, 
como cada aspecto da vida norte-americana seria melhorado pela ampliação do estoque de 
capital social. No capítulo introdutório da seção, Putnam antecipa os resultados e apresenta os 
microfundamentos. Are we right? Does social capital have salutary effects on individual, 
 
34
 Já em MDW, ele faz o paralelo entre a pesquisa científica e a investigação criminal (p. xiv). Contudo, ele não a 
inclui no corpo do texto, deixando-a limitada ao prefácio, e se abstém de utilizar novamente tal metáfora. 
35
 Ver Fonseca (1994) para um debate sobre as diferenças entre as tradições inglesas e norte-americanas de romance 
policial. 
36
 Finalmente, preciso esclarecer que não resolve completamente o mistério, e por isso convido você a ajudar-me no 
descobrimento das pistas. 
37
 O capítulo XVI resume as pistas e se intitula What Killed Civic Engagement? Summing up. Na sua 
“guesstimation”, Putnam distribui da seguinte forma a culpa: 10% pressões de tempo e dinheiro oriundas das 
famílias com pais e mães com carreiras profissionais; 10% mudanças na estrutura urbana (movimento pendular dos 
trabalhadores e mobilidade populacional), 25% entretenimentos eletrônicos (televisão em especial) e, mais 
importante, a mudança de gerações com 50%. O resíduo de Putnam é maior do que meros 5% porque ele admite que 
existe uma sobreposição dos efeitos da televisão e da mudança de gerações. Tradução: A maioria dos escritores 
respeitáveis de histórias de mistério hesitaria em listar todos dentre os muitos plausíveis suspeitos, não importa quão 
enérgico seu detetive. Assim tampouco eu estou em posição de discutir todas essas teorias – certamente não em 
qualquer forma definitiva –, mas devemos começar a refinar a lista. 
 24 
communities, or even entire nations? Yes, an impressive and growing body of research suggests 
that civic connections help wise. Living without social capital is not easy, whether one is a 
villager in southern Italy or a poor person in the American inner city or a well heeled 
entrepreneur in a high tech-industrial district (BA, p. 287).38 
Para apresentar ao leitor os mecanismos pelos quais o capital social traz tais benefícios, 
ele segue o mesmo roteiro de MDW. Mas, desta vez, além de asseverar o papel do capital social 
na resolução dos problemas de ação coletiva, ele acrescenta efeitos benéficos sobre a 
solidariedade social e sobre a saúde física e mental dos indivíduos39. 
Um exemplo, fictício segundo ele, ajuda a persuadir. Ele conta que um casal Bob e 
Rosemary Smith, pais de Jonathan40, de seis anos, querem melhorar a qualidade da escola 
pública de seu filho. Se eles estiverem em uma comunidade cívica, será mais fácil estabelecer 
uma associação de pais e mestres cujo objetivo fundador é apenas educacional. Outros benefícios 
surgem: valores cívicos são reforçados e os vínculos entre os pais se desenvolvem. Caso Bob 
perca o emprego ou Rosemary queira formar um grupo de pressão para obter maiores recursos 
para as crianças da cidade, eles já terão quinze outros pais ou mães para pedir ajuda (BA, p. 289-
90). 
Para um cientista político sério, não pareceria correto basear sua argumentação nesses 
relatos pessoais (ou para-pessoais). Putnam se apressa em ressaltar que ele tem boas evidências 
empíricas no bolso do paletó: Community connectedness is not just about warm fuzzy tales of 
civic triumph. In measurable and well-documented ways, social capital makes an enormous 
difference in our live (BA, p. 290).41 
A mensagem é clara: “Leitores modernistas, fiquem tranqüilos. Apesar das vulgarizações 
e caricaturas, eu conduzi umapesquisa honesta, isto é, objetiva e empírica”. Mesmo o leitor não-
iniciado se sente confortado, uma vez que nesse momento ele está falando mais como um 
cientista do que como um político. 
 
38
 Estamos certos? O capital social tem mesmo efeitos salutares sobre os indivíduos, comunidades ou mesmo nações 
inteiras? Sim, um significativo e crescente corpo de pesquisas sugere que as conexões cívicas auxiliam. Viver sem 
capital social não é fácil, seja no caso de um aldeão do sul da Itália ou de uma pessoa pobre em uma cidade de 
interior nos EUA ou de um empresário de alto nível em um distrito industrial de alta tecnologia. 
39
 “Social capital appears to be a complement, if not a substitute, for Prozac, sleeping pills, antiacids, vitamin C, 
and other drugs we buy at the corner pharmacy” (BA, p. 289). O capital social parece ser um complemento, senão 
um substituto, para Prozac, calmantes, antiácidos, vitamina C e outros medicamentos que compramos na farmácia 
da esquina. 
40
 Os nomes são os mesmos da família de Putnam. 
41
 A integração de uma comunidade não se trata apenas de historinhas felizes de triunfo cívico. De formas 
mensuráveis e bem-documentadas, o capital social faz uma enorme diferença em nossas vidas. 
 25 
No apêndice intitulado The Story Behind this Book, Putnam relata que, em 1995, ele 
objetivava terminar um volume sobre capital social mais breve do que MDW e voltado para um 
público mais amplo do que o acadêmico (BA, p. 506). Em seguida, ele diz que os leitores de BA 
perceberão que ele fracassou em mais de um objetivo. Sem embargo, é trivial que ele não tenha 
cumprido as metas no tocante ao prazo e às dimensões do trabalho. O curioso é que, através do 
estratagema “mais de um”, ele deixa em aberto a questão do sucesso em alcançar um público 
alvo. Uma vez que isso foi escrito na primeira edição do livro e que ele não poderia avaliar o 
impacto efetivo de seu livro, algumas interpretações não-exclusivas são possíveis: 
a) Essa afirmativa é um prêmio para o leitor não-acadêmico que enfrentou as mais de cinco 
centenas de páginas. Agora ele pode sentir-se quase um membro da Academia. 
b) O leitor acadêmico, avesso às popularizações do saber, pode considerar que o fracasso 
refere-se apenas às duas primeiras partes da afirmativa. 
c) Se o livro fosse um fracasso de vendas, ele poderia dizer que já tinha antecipado sua 
incapacidade de alcançar um público mais amplo. 
Há outro trecho revelador. Escrevendo sobre quando era um obscure academic, isto é, 
pré-1995: Although I had published scores of books and articles in the previous three decades 
(many of them, I immodestly believed, of greater scholarly elegance than “Bowling Alone”), 
none had attracted the slightest public attention (BA p. 506).42 
Ele lembra a todos que é um intelectual de respeito e bastante produtivo e que BA é uma 
popularização, não tão elegante quando o conjunto da obra. O que chama atenção no trecho 
citado é o fato de ele utilizar o pretérito do verbo “to believe”. Por que não usou o presente? Uma 
resposta atraente é que assim ele enfraquece o teor de sua afirmação, como se pudesse, hoje, já 
ter mudando de opinião. 
 
Conclusão 
 
Conforme lembra Salviano Jr. (1993), os estudos retóricos têm o defeito de não serem 
passíveis de teste. Ao analisar um texto de sucesso, sempre se pode, ex post, encontrar as razões 
retóricas do seu sucesso. O critério para avaliar a qualidade das análises retóricas tem que ser, 
 
42
 Embora eu tenha publicado diversos livros e artigos nas três últimas décadas (muitos dos quais, eu sem modéstia 
acreditava, com maior elegância acadêmica que Bowing Alone), nenhum deles atraiu a mínima atenção do público. 
 26 
igualmente, seu poder de persuasão. O presente trabalho apresentou argumentos que apóiam a 
idéia de que boa parte do sucesso de MDW e BA pode ser atribuído às suas qualidades retóricas. 
Putnam, em 1993, buscava o público acadêmico e o conceito de capital social ainda não 
havia obtido a legitimidade hodierna. Sua ênfase na questão empírica, combinada com as 
referências aos clássicos da Ciência Política e às teorias mais recentes fez com que ele obtivesse 
livre-trânsito nos meios acadêmicos. A abstenção, até o último momento, do uso do termo 
“capital social” mostrou-se um estratagema eficaz. Convencido de que a comunidade cívica 
efetivamente traz benefícios econômicos, o leitor fica mais propenso a aceitar um novo conceito. 
Em Bowling Alone, a situação muda. “Capital social” tornou-se um termo corrente nas 
Ciências Sociais (e Putnam é um dos responsáveis pelo feito). Agora ele pode introduzir a 
expressão no primeiro capítulo e até admitir que nem todos os vínculos sociais trazem 
benefícios, sem temores de que isso vá enfraquecer seu argumento. 
A grande mudança entre MDW e BA é a busca de uma audiência mais ampla, uma 
tentativa de cross-over do público acadêmico para os norte-americanos cultos. Ao conquistar as 
platéias dos cientistas sociais mundo afora, Putnam obteve as credenciais para escrever para o 
público não-especializado. Essa passagem seria bem mais árdua se a fizesse no outro sentido: um 
autor que primeiro tem o reconhecimento público terá problemas graves em obter a aceitação de 
seus pares na Academia. 
Em ambos os livros (mais intensamente em BA), Putnam se divide entre seguir sendo um 
scholar respeitado ou um divulgador de uma idéia, um militante. Ele busca preservar sua 
imagem de pesquisador, talvez porque saiba que, se for visto como um militante, seus 
argumentos em favor da promoção do capital social perderão força não só entre os acadêmicos, 
mas também entre o público em geral. 
Os trabalhos do projeto da retórica da ciência sempre ressaltam que, ao desvendar o 
instrumental de convencimento usado, não se pretende desqualificar os argumentos dos autores, 
nem tratá-los como ilusionistas. Da mesma forma, mostrar as estratégias retóricas de Putnam não 
implica, necessariamente, em negar a pertinência de suas teses. Aqueles que celebram a chegada 
do conceito do capital social têm mais motivos ainda para celebrar o esforço persuasivo de 
Putnam. 
 
Referências 
 
 27 
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COLEMAN, J. Foundations of social theory. Cambridge, Mass: Harvard University, 1990. 
COLEMAN, J. S. Social capital in the creation of human capital. American Journal of Sociology, 
v. 94, p.S95-S120, 1988. 
FERNANDEZ, Ramón García, PESSALI, Huáscar Fialho. Oliver Williamson and the rhetorical 
construction of the “Transaction Costs Economics” Trabalho apresentado no V Encontro 
Nacional de Economia Política. Fortaleza. 2000. 
FONSECA, Rubem. Romance Negro. In: Contos Reunidos. Rio de Janeiro: Companhia das 
Letras, 1994. 
HARRIS, Randy Allen ed. Landmark Essays on the Rhetoric of Science: Case Studies. Mahwah 
(NJ): Hermagoras Press, 1997. 
McCLOSKEY, Deirdre N. "The Rhetoric of Economics". Journal of Economic Literature, 21 
(2): 481-517. 1983. 
_________. The Rhetoric of Economics. Madison: Univ. of Wisconsin Press, 1985. 
PERELMAN, C. The New Rhetoric: A Treatise on Argumentation. Notre Dame: UND, 1969. 
PUTNAM, Robert. Bowling Alone: the collapse and revival of American community. New York: 
Simon & Schuster, 2000. 
_________. Making democracy work: civic traditions in modern Italy. Princeton: Princeton 
University, 1993. 
SALVIANO J.r. Cleófas. O discurso cepalino: ensaio de análise retórica. Dissertação de 
mestrado. IPE-USP: 1993. 
 
 
 
 
GLOBALIZAÇÃO E DEMOCRACIA INERCIAL: O QUE O CAPITAL SOCIAL PODE 
FAZER NA CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE PARTICIPATIVA? 
 
Marcello Baquero 
Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UniversidadeFederal 
do Rio Grande do Sul. 
E-mail: baquero@orion.ufrgs.br 
 
Introdução 
 
Apesar da sabedoria convencional sinalizar para a vitória incontestável da democracia 
formal no mundo contemporâneo, principalmente a partir das indicações apresentadas por 
Samuel Huntington (2000) sobre a terceira onda de democracia, argumentamos, neste artigo, que 
a democracia de mercado, que se institucionaliza na América Latina, está longe de ser 
considerada consolidada. Em particular, se pensada em termos de uma base material adequada 
para garantir uma qualidade de vida mínima para os seus cidadãos. 
O aparente consenso sobre as virtudes do mercado na construção de uma cidadania mais 
ampla e participativa deixou de existir. Estudos produzidos, nos últimos anos, convergem para a 
idéia de que é necessário rever os mecanismos de mercado e reinventar a sociedade, não só no 
sentido nacional, mas transnacional (Baquero, 2001; Silva, 2004; Camp, 2001). 
Um dos aspectos que tem merecido críticas diz respeito ao processo de globalização, o 
qual alterou significativamente a matriz de relações sociais intra e entre países. Duas dimensões 
precisam ser consideradas nessa discussão: a primeira, diz respeito ao impacto da globalização 
nas estruturas internas de cada país, tornando-as mais ou menos vulneráveis às leis de mercado e, 
conseqüentemente, alterando a forma como os governos se posicionam diante das políticas 
internacionais dos Estados e, a segunda, refere-se ao declínio do capital social, num momento em 
que, paradoxalmente, se exige a valorização da sociedade e do cidadão. 
 29 
Um país que vive esse dilema é o Brasil, o qual, por um lado, apresenta índices 
moderados de crescimento econômico e aumento da produtividade industrial, ao mesmo tempo 
em que, no campo social, as condições se agravam, as diferenças sociais se aprofundam, o 
conflito social cresce e as pessoas se afastam da política. 
Para analisar esta questão e, ao mesmo tempo, pensar alternativas propositivas para o 
fortalecimento da sociedade e valorização do cidadão no processo de construção democrática, 
este trabalho se propõe a examinar por que o processo de globalização tem sido muito mais 
danoso para países em desenvolvimento, pontualmente o Brasil, tendo como decorrência desse 
processo à incidência negativa na constituição de capital social (capacidade associativa), já 
historicamente precário na sociedade brasileira, enquanto que, nos países desenvolvidos, o 
conceito de capital social tem sido incorporado como estratégia governamental de promoção de 
políticas públicas socialmente orientadas (Jeff, 2003). 
 
Globalização e soberania interna 
 
O conceito de globalização tem sido aplicado indiscriminadamente a diversos campos e 
fenômenos. Inicialmente, foi utilizado preponderantemente na área econômica. A despeito de sua 
propalada dimensão positiva, no caso da América Latina e, pontualmente o Brasil, os países têm 
sido submetidos a flutuações na economia internacional, comprometendo sua capacidade de 
investir no social, e, inclusive, sua competitividade internacional. Nesse sentido, o crescimento 
experimentado por essas nações, embora superior ao alcançado na década de 80, não tem 
conseguido erradicar os problemas sociais endêmicos e comprometedores da construção 
democrática. 
 Quando a democracia coexiste com uma situação de pobreza, é pouco provável o 
empoderamento dos cidadãos para participar ativamente da vida política. Nesse sentido, gera-se 
um círculo vicioso no qual convivem, sem se aproximar, procedimentos poliárquicos com a 
exclusão social. 
Tomando como um a priori positivo, os debates sobre a globalização negligenciavam, 
na análise, outras dimensões também impactadas por esse processo, entre as quais: a perda da 
soberania nacional, o impacto negativo no crescimento da pobreza e o aumento da exclusão 
social. Foi somente após a materialização dos efeitos deletérios do processo de globalização que 
se passou a examinar suas implicações no campo político, cultural, social e ideológico. 
 30 
Na dimensão política, as mudanças na cultura, decorrentes desse processo, incidem não 
só na política internacional, mas no âmbito interno de uma nação em termos da estruturação dos 
valores e mecanismos da vida política. 
Evidências de pesquisas sobre como a globalização tem incidido na modificação dos 
mecanismos convencionais da política nos países em desenvolvimento podem ser sumariadas nas 
seguintes tendências: (1) reafirmação da integração cultural via tradição com seus conteúdos 
messiânicos (Islamismo); (2) fortalecimento do étnico-territorial religioso; (3) desejo 
indiscriminado, das nações dependentes, de alcançar o estilo de vida das sociedades industriais 
ocidentais a qualquer custo; (4) fragmentação das sociedades em desenvolvimento; (5) aumento 
do individualismo nas relações sociais; (6) perda do senso de pertencimento e (7) erosão das 
bases de convivência coletiva. 
Essas tendências têm redundado em crise de identidades coletivas, crise de natureza 
política e crise no campo da sobrevivência econômica dos setores mais vulneráveis da sociedade. 
Fruto desse cenário enfrenta-se, atualmente, a deterioração do contrato social e o surgimento de 
instituições para-estatais, que geram instabilidade política-social permanentes. Para tentar 
compreender o impacto da globalização em países com níveis diferenciados de desenvolvimento 
econômico e político, como o Brasil, é necessário fazer uma retrospectiva na história, 
especificamente na origem e evolução do chamado Estado Moderno. 
Uma das características do pensamento latino-americano é sua dependência das 
estruturas conceituais que, geradas em contextos específicos, não encontram condições análogas 
em outros cenários. Este é o caso da conceptualização a respeito da origem e evolução do Estado 
na América Latina, onde se verifica que a Ciência Política tem recorrentemente utilizado a 
experiência do Estado europeu como matriz explicativa do seu desenvolvimento. 
Embora existam esforços acadêmicos no sentido de resgatar as especificidades do 
continente latino-americano, continua a prevalecer a idéia que esta região é uma extrapolação 
histórica da Europa. Decorrente dessa visão plasmou-se, nos círculos da Ciência Política, o 
pressuposto de aceitar como válida a compreensão textual das interpelações européias a respeito 
da realidade social latino-americana. 
Nesse sentido, parte significativa dos estudos sobre o Estado se orientava no sentido de 
interpretar textualmente as idéias externas, baseadas no pressuposto de que o texto é objeto único 
e auto-suficiente de explicação da nossa história. Tal prática, na minha opinião, tem produzido 
uma mitificação de livros e autores que se consideram e são considerados supra-históricos. A 
conseqüência não poderia ser outra senão o desenvolvimento de um conhecimento reativo, que 
negligencia as características estruturais e históricas de cenários diferentes. Este é o caso do 
 31 
conceito de globalização, que é visto, apesar de suas deficiências, como algo inevitável e 
positivo na geração de políticas de distribuição. Tal argumento é uma apologia da hegemonia do 
discurso econômico das nações desenvolvidas. A impossibilidade de aplicar concretamente os 
mecanismos gerados por teorias desenvolvidas em outros contextos, se constitui em instrumento 
que dificulta o entendimento e a mudança da nossa realidade social, gerando a já conhecida crise 
dos paradigmas, revelando nossa falta de ousadia para questionar o conhecimento estabelecido. 
 No caso da América Latina, a “dependência” de paradigmas externos tem produzido 
uma estagnação no conhecimento, bem como uma paralisia da criatividade intelectual no sentido 
de propor alternativas para pensar nossa história a partir de construtos autóctones. 
Isso não significa negligenciar ou não analisar

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