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Dois Conceitos de Liberdade Isaiah Berlin

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DOIS CONCEITOS DE LIBERDADE, Isaiah Berlin 
 Tradução: Aline Mesquita - UFABC 
 
Se os homens nunca discordassem sobre os propósitos da vida, se nossos ancestrais 
tivessem permanecido sem distúrbios no Jardim do Éden, os estudos aos quais o Chichele Chair 
of Social and Political Theory se dedica dificilmente poderiam ter sido concebidos. Já que esses 
estudos brotam e prosperam da discórdia. Alguém pode questionar que mesmo em uma 
sociedade de anarquistas cheia de virtude, onde nenhum conflito sobre propósitos finais tem 
lugar, problemas políticos, por exemplo, problemas constitucionais ou legislativos, podem 
ainda surgir. Mas esta objeção se apóia em um erro. Onde as finalidades são assentadas, as 
únicas questões restantes são aquelas sobre os meios, e essas não são políticas, mas técnicas, 
isto é, capazes de serem resolvidas por especialistas ou máquinas, como as discussões entre 
engenheiros e médicos. É por isso que aqueles que colocam sua fé em algo maior, fenômenos 
que transformam o mundo, como o triunfo final ou razão da revolução proletária, devem 
acreditar que todos os problemas políticos e morais podem, desse modo, ser transformados 
em problemas tecnológicos. Esse é o significado da frase famosa de Engels (parafraseando 
Santo Simon) sobre ‘substituir o governo das pessoas pela administração das coisas’, e as 
profecias marxistas sobre o definhamento do Estado e o começo da verdadeira história da 
humanidade. Tal perspectiva é chamada utópica por aqueles que especulam que essa perfeita 
harmonia social é um jogo de fantasia ociosa. Não obstante, um visitante de Marte para 
qualquer Universidade Britânica – ou Americana – hoje pode ser perdoado se ele sustentar a 
impressão de que seus membros vivem em algo muito parecido com esse estado muito 
inocente e idílico, por toda a atenção séria que é dada aos problemas fundamentais da política 
pelos filósofos profissionais. 
Ainda assim isso é ao mesmo tempo surpreendente e perigoso. Surpreendente por 
que, talvez, nunca tenha havido um tempo na história em que numero tão grande de seres 
humanos, em ambos, Oriente e Ocidente, tivessem suas noções, e suas vidas, tão 
profundamente alterados, e em alguns casos violentamente perturbadas, por se segurarem 
fanaticamente à doutrinas sociais e políticas. Perigoso, por que, quando idéias são 
negligenciadas por aqueles que devem atendê-las – isto é, aqueles que foram treinados para 
pensar criticamente sobre idéias – elas algumas vezes adquirem uma dinâmica desenfreada e 
um poder irresistível sobre multidões de homens que podem se tornar violentos demais para 
serem afetados pela critica racional. Há mais de um século atrás, o poeta alemão Heine alertou 
os franceses para não subestimarem o poder das idéias: conceitos filosóficos nutridos na 
quietude do escritório de um professor podiam destruir uma civilização. Ele falou sobre A 
Critica da Razão Pura de Kant como a espada com que o deísmo alemão tinha sido decapitado, 
e descreveu as palavras de Rousseau como a arma manchada de sangue a qual, nas mãos de 
Robespierre, se destruiu o antigo regime; e profetizou que o destino romântico de Fitche e 
Schelling um dia se tornaria, com efeitos terríveis, pelos seguidores alemães fanáticos, contra a 
cultura liberal do Ocidente. Os fatos não desmentiram essas predições inteiramente; mas, se 
professores podem verdadeiramente empunhar esse poder fatal, não devem ser apenas os 
outros professores, ou pelo menos, outros pensadores (e não o governo ou comitês do 
congresso) que podem desarmá-los? 
Nossos filósofos parecem estranhamente ignorantes desses fatos devastadores de 
suas atividades. Pode ser que intoxicados por suas realizações magníficas nos reinos mais 
abstratos, os melhores entre eles olham com desdém sobre o campo onde descobertas 
racionais são menos prováveis de serem feitas, e o talento por análises pormenores são menos 
prováveis de serem recompensado. Ainda, apesar de todos os esforços para separá-los, 
conduzidos por um pedantismo escolar cego, a política tem permanecido indissoluvelmente 
entrelaçada a qualquer outra forma de investigação filosófica. Negligenciar o campo do 
pensamento políticos, porque sua matéria instável, com suas margens desfocadas, não é 
capturada por conceitos fixos, modelos abstratos e instrumentos adequados para a lógica ou 
análise lingüística – a exigir uma unidade de métodos na filosofia, e rejeitar qualquer que seja 
o método que não possa ser manuseado com sucesso – é meramente permitir-se ficar a mercê 
das crenças políticas primitivas e não criticadas. Apenas um materialismo histórico muito 
vulgar nega o poder das idéias, e diz que as idéias são apenas interesses materiais disfarçados. 
Pode ser que, sem a pressão das forças sociais, idéias políticas são natimortos: o que é certo é 
que essas forças, a menos que revestidas em idéias, se mantém cegas e sem direção. 
A Teoria Política é um ramo da filosofia moral que começa com a descoberta ou 
aplicação de noções morais na esfera das relações políticas. Não quero dizer, como creio que 
alguns Filósofos Idealistas podem ter acreditado, que todos os movimentos históricos ou 
conflitos entre humanos são reduzíveis a movimentos ou conflitos de idéias ou forças 
espirituais, ou até mesmo que eles são efeitos (ou aspectos) destes. Mas eu quero dizer que 
para entender tais movimentos ou conflitos é, acima de tudo, entender as idéias ou atitudes 
das vidas envolvidas neles, o que sozinho faz esses movimentos parte da história humana, e 
não meramente eventos naturais. Palavras políticas, noções e atos não são inteligíveis, salvo 
no contexto dos problemas que dividem os homens que os usam. Conseqüentemente nossa 
própria atitude e atividades são prováveis a permanecer obscuras para nós, a menos que nós 
entendamos os problemas dominantes de nosso próprio mundo. O mais importante disso é a 
guerra declarada que tem sido lutada entre dois sistemas de idéias que dão diferentes e 
conflitantes respostas para o que tem sido por muito tempo a questão central da política – a 
questão da obediência e coerção. ‘Por que eu (ou qualquer pessoa) deveria obedecer outros?’ 
Por que eu não deveria viver como desejo?’ ‘Devo obedecer?’ ‘Se desobedecer, serei coagido?’ 
‘Por quem e em qual grau, e no nome de que, e pro bem de que?’ 
Mediante as respostas para essas questões dos limites admissíveis de coerção pontos 
de vistas opostos são mantidos no mundo de hoje, cada um alegando a fidelidade de um 
grande numero de homens. Parece a mim, portanto, que qualquer aspecto dessa questão é 
digno de exame. 
 
 
 
1 
Coagir um homem é privá-lo da liberdade – liberdade de que? Quase todo moralista na 
história humana elogia a liberdade. Como a felicidade e a bondade, como a natureza e a 
realidade, liberdade é um termo cujo significado é tão poroso que há poucas interpretações a 
que é capaz de resistir. Não proponho discutir nem a história dessa palavra prótea nem seus 
mais de duzentos sentidos registrados por historiadores de idéias. Proponho examinar não 
mais que dois desses sentidos – mas eles são sentidos centrais, com uma grande quantidade 
de historia humana por trás, e, se me ousar a dizer, ainda por vir. O primeiro desses sentidos 
políticos de freedom ou liberty (usarei ambas para dizer o mesmo), que (seguindo muitos 
precedentes) vou chamar sentido “negativo” está envolvido na resposta à pergunta ‘Qual é a 
área em que o sujeito – uma pessoa ou um grupo de pessoas – é ou deve ser deixado para 
fazer ou ser o que ele é capaz de fazer ou ser sem interferência de outras pessoas?’ O 
segundo, que devo chamar de sentido ‘positivo’ envolve a resposta da pergunta ‘Qual ou 
quem é a referência de controle e interferência que podedeterminar alguém a fazer ou ser 
isso ao invés daquilo?’ As duas questões são claramente diferentes, apesar de as respostas 
para elas talvez coincidirem. 
 
 
I 
A noção da liberdade negativa. 
Normalmente me é dito para ser livre no grau em que nenhum homem ou corpo de 
homem interfira em minhas atividades. Liberdade Política nesse sentido é simplesmente a área 
em que cada homem pode agir desobstruído por outros. Se sou impedido por outros de fazer 
algo que eu poderia, caso contrário, fazer, sou naquele grau sem liberdade; e se essa área é 
contraída por outro homem além de um certo mínimo, posso ser descrito como sendo 
coagido, ou, talvez, escravizado. Coerção não é, de qualquer forma, um termo que cobre toda 
forma de inabilidade. Se digo que não sou capaz de pular mais que dez pés no ar, ou que não 
posso ler, pois sou cego, ou não consigo entender páginas negras de Hegel, seria excêntrico 
dizer que sou naquele grau coagido ou escravizado. Coação implica na interferência deliberada 
de outros seres humanos em uma área em que eu agiria de outra forma. Você tem falta de 
liberdade política ou liberdade apenas se for impedido de atingir um objetivo por um ser 
humano. Mera incapacidade de se atingir um objetivo não é falta de liberdade política. Isso é 
trazido pelo uso de tais expressões modernas como “liberdade econômica” e sua 
contrapartida “escravidão econômica”. É discutido, muito plausivelmente, que se um homem é 
muito pobre para obter algo em que não haja banimento legal – pão, uma viagem ao redor do 
mundo, recurso à corte legal – ele é tão livre para ter tais coisas quanto seria se elas fossem 
proibidas a ele pela lei. Se minha pobreza fosse um tipo de doença que me impedisse de 
compra um pão, ou pagar uma viagem ao redor do mundo, ou ter meu caso ouvido, como 
claudicação me impede de correr, essa inabilidade não seria naturalmente descrita como falta 
de liberdade, muito menos falta de liberdade política. É apenas devido a minha crença que 
minha inabilidade de ter tal coisa é devida ao fato de que outro ser humano tomou 
previdências por meio de que eu sou, enquanto outros não são, impedido de ter dinheiro 
suficiente para pagar por isso, acredito que sou vitima de escravidão ou coerção. Em outras 
palavras, o uso do termo depende numa teoria particular social e econômica sobre as causas 
de minha pobreza ou fraqueza. Se minha falta de bens materiais reflete minha falta de 
capacidade mental ou física então começo a falar sobre ser privado de liberdade (e não 
simplesmente sobre pobreza) apenas se eu aceitar a teoria. Se, em adição, eu acreditar que 
estou sendo mantido em desejo por um acordo específico que considero injusto ou desleal, 
falo de escravidão econômica ou opressão. A natureza das coisas não nos enlouquece, apenas 
má vontade o faz, disse Rousseau. O critério de opressão é parte do que eu acredito ser o jogo 
jogado por outros seres humanos, direta ou indiretamente, com ou sem intenção de fazê-lo, 
onde meus desejos são frustrados. Por ser livre, nesse sentido, quero dizer não sofrer 
interferência dos outros. Quão maior a área de não interferência, maior minha liberdade. 
Isso é o que queriam dizer os filósofos políticos clássicos ingleses quando usaram essa 
palavra. Eles discordavam sobre quão grande deveria ser essa área. Supunham que a área não 
podia, como as coisas eram, ser ilimitada, por que se fosse, entrar-se-ia num estado no qual 
homens poderiam, sem limites, interferir com outros homens; e esse tipo de liberdade 
‘natural’ levaria ao caos social no qual as mínimas necessidades dos homens não seriam 
satisfeitas; ou então a liberdade dos fracos seria suprimida pelos fortes. Por que perceberam 
que os propósitos e atividades humanas não se harmonizam automaticamente uns com os 
outros e por isso (independente de suas doutrinas oficiais) eles colocaram grande valor em 
outros objetivos, tais como justiça, felicidade ou cultura, ou segurança, ou graus variados de 
igualdade, eles estavam preparados para reduzir a liberdade ante aos interesses de outros 
valores que eles acreditavam serem desejáveis. Pois sem isso, era impossível de se criar o tipo 
de associação que eles acreditavam desejável. Conseqüentemente, se assume que por esses 
pensadores a área de ação livre dos homens deve ser limitada pela lei. Mas, igualmente se 
assume, especialmente por tais libertários como Locke e Mill na Inglaterra, e Constant e 
Tocquevilee na França, que deve existir certa área mínima de liberdade pessoal que não deve, 
de forma alguma, ser violada, pois se ultrapassada, o individuo se encontrará em uma área 
deveras estreita mesmo que para o mínimo desenvolvimento de suas faculdades naturais; o 
que por si só torna impossível perseguir, e até mesmo conceber, os vários fins aos quais os 
homens mantêm bons ou certos ou sagrados. Segue-se que uma fronteira deve ser 
estabelecida entre a área da vida privada e a da autoridade pública. Onde deve ser 
estabelecida é um problema de argumento, na verdade de barganha. Homens são 
amplamente interdependentes, e nenhuma atividade dos homens é completamente privada 
quanto a nunca obstruir as vidas dos outros de alguma forma. ‘A liberdade dos peixes grandes 
é a morte dos peixinhos’; a liberdade de alguns deve depender da repressão de outros. A 
liberdade para um professor de Oxford, outros são conhecidos por adicionar, é uma coisa 
muito diferente da liberdade para um camponês egípcio. 
A força dessa proposição deriva de algo que é, ambos, verdadeiro e importante, mas a 
frase se mantém um artifício político. É verdade que para oferecer direitos políticos, ou 
proteção contra a intervenção do Estado, para homens meio-vestidos, iletrados, desnutridos 
ou doentes é uma zombaria de sua condição; eles precisam de ajuda médica ou educação 
antes que possam entender, ou fazer uso de um aumento em suas liberdades. O que é 
liberdade para aqueles que não podem utilizá-la? Sem condições adequadas para o uso de 
liberdade, qual o valor dela? Coisas principais vêm na frente: há situações nas quais – para usar 
um ditado atribuído satiricamente aos niilistas por Dostoiévski – botas são superiores a 
Puchkin; liberdade individual não é a necessidade primária de todos. Pois liberdade não é a 
mera falta de frustrações de qualquer tipo; isso inflaria o significado até que significasse muito 
ou muito pouco. Os camponeses egípcios precisam de roupas ou remédios antes, e mais que, 
liberdade pessoal, mas o mínimo de liberdade que ele necessita hoje, e o nível mais alto que 
pode vir a precisar amanhã, não é uma espécie de liberdade peculiar para ele, mas idêntica à 
dos professores, artistas e milionários. 
O que preocupa a consciência dos Liberais do Ocidente é, acredito, a crença, não de 
que a liberdade que o homem procura difere de acordo com suas condições econômicas e 
sociais, mas que a minoria que possui isso, ganhou-a através da exploração, ou pelo menos, 
evitando o olhar da vasta maioria que não a tem. Acreditam, com boas razões, que se a 
liberdade individual é o final ultimo para os seres humanos, nenhum deveria ser privado dela 
pelos outros; muito menos que alguns deveriam experimentar dela a custos dos outros. 
Igualdade de liberdade; não tratar os outros como não gostaria que me tratassem; 
reembolsando meu débito para aqueles que sozinhos tornaram possível minha liberdade ou 
prosperidade ou esclarecimento; justiça, em seu sentido mais simples e universal – essas são 
as fundações da moralidade liberal. Liberdade não é o único objetivo dos homens. Posso, 
como o crítico Russo Belinsky, dizer que se os outros são privados dela – se meus irmãos 
devem continuar na pobreza, miséria e presos – então eu não quero a liberdade para mim 
mesmo, a rejeitocom ambas as mãos e prefiro infinitamente dividir de seus destinos. Mas 
nada se ganha pela confusão de termos. Para evitar a desigualdade gritante ou miséria 
generalizada, estou pronto a sacrificar alguma, ou toda, minha liberdade. Posso fazê-lo por 
vontade própria e livremente; mas é uma justiça da qual estou desistindo pelo bem da justiça 
ou igualdade ou amor por meus companheiros homens. Deveria ser atingido pela culpa, e com 
razão, se não estivesse em algumas circunstancias pronto para fazer tal sacrifício. Mas um 
sacrifício não é um aumento no que está sendo sacrificado, nomeado liberdade, apesar da 
grande necessidade moral ou compensação por isso. 
Tudo é o que é: liberdade é liberdade, não igualdade ou equidade ou justiça ou 
cultura, ou felicidade humana ou uma consciência tranqüila. Se minha liberdade ou minha 
classe ou nação dependem da miséria de um número de seres humanos, o sistema que a 
promove é injusto e imoral. Mas, se me privo ou perco minha liberdade com objetivo de 
diminuir a vergonha de tamanha desigualdade, e desse modo não aumento materialmente a 
liberdade individual dos outros, uma perda absoluta de liberdade ocorre. Pode ser 
compensada por um ganho na justiça ou na felicidade ou na paz, mas a perda da liberdade – 
‘social’ ou ‘econômica’- é aumentada. Ainda assim, se mantém verdade que a liberdade de 
alguns deve algumas vezes ser cortada para garantir a liberdade dos outros. Sobre que 
principio isso deveria ser feito? Se a liberdade é um valor intocável, sagrado, não pode existir 
tal principio. Uma ou outra regra ou princípio conflitante deve, de qualquer forma, na prática, 
gritar mais alto: não por razões que podem ser claramente especificadas, muito menos 
generalizadas em regras ou máximas universais. Ainda assim, um compromisso prático deve 
ser encontrado. 
Filósofos com uma visão otimista da natureza humana e a crença na possibilidade de 
harmonia dos interesses humanos, como Locke ou Adam Smith, ou algumas vezes, Mill, 
acreditavam que a harmonia social e progresso eram compatíveis com a reserva de grandes 
áreas de vida privada superiores que nem o Estado ou nenhuma outra autoridade deveria ser 
permitido ultrapassar. Hobbes, e aqueles que acreditavam nele, especialmente pensadores 
conservadores ou reacionários, discutiam que se fosse para os homens serem impedidos de 
destruírem uns aos outros e fazerem da vida social uma selva ou selvageria, proteções maiores 
deveriam ser instituídas para mantê-los em seus lugares; ele desejava correspondentemente 
aumentar a área de controle centralizado e diminuir a do individuo. Mas ambos os lados 
acreditavam que alguma porção da existência humana deveria se manter independente da 
atmosfera do controle social. A invasão dessa preservação, mesmo que pequena, seria 
despotismo. O mais eloqüente de todos os defensores da liberdade e privacidade, Benjamin 
Constant, que não esqueceu a ditadura Jacobina, declarou que no mínimo as liberdade de 
religião, opinião, expressão, propriedade deveriam ser garantidas contra invasões arbitrarias. 
Jefferson, Burke, Paine, Mill compilaram diferentes catálogos de liberdade individual, mas a 
discussão de manter a autoridade sob controle é sempre substancialmente a mesma. Nós 
devemos preservar uma área mínima de liberdade pessoal se não queremos ‘degradar ou 
negar nossa natureza’. Não podemos permanecer absolutamente livres, e devemos desistir de 
alguma de nossa liberdade para preservar o resto. Mas rendimento total é autodestrutivo. 
Qual então deve ser o mínimo? Aquele que o homem não deve desistir sem ofender a essência 
de sua natureza humana. Qual é essa essência? Quais os padrões que contempla? Esse tem 
sido, e talvez sempre seja, um problema de debate infinito. Mas qualquer que seja o principio 
em que a área de não interferência deve ser desenhada, se é aquele sobre lei natural ou 
direito natural, ou utilidade ou pronunciamentos de imperativos categóricos, ou a santidade 
do contrato social ou qualquer outro conceito com o qual homens procuraram clarificar ou 
justificar suas convicções, liberdade nesse sentido significa de, falta de interferência além, 
deslocamento, mas sempre reconhecível limite. ‘A única liberdade que merece esse nome, é 
aquela que busca nosso próprio bem de nosso próprio jeito’, disse o campeão mais celebrado. 
Se é assim, a compulsão pode alguma vez ser justificada? Mill não tinha duvidas que sim. Já 
que justiça demanda que todos os indivíduos tenham direito ao mínimo de liberdade, todos os 
outros indivíduos têm necessidade de ser impedidos, se não por força, privando qualquer um 
dela. Na verdade, a função da lei era a prevenção de que eu fizesse tais colisões: o Estado era 
reduzido ao que Lassale desdenhosamente descreveu como as funções do guarda noturno ou 
policial de tráfico. 
O que faz a proteção da liberdade individual tão sagrada à Mill? Em seu artigo famoso 
ele declara que, a menos que o individuo seja deixado para viver como deseja em ‘ a parte *de 
sua conduta] que diz respeito meramente a ele mesmo, civilizações não podem avançar; a 
verdade não vai, por falta de mercado livre de idéias, vir à tona; não haverá espaço para 
espontaneidade, originalidade, gênios, para energia mental, para coragem moral. A sociedade 
será esmagada pelo peso da ‘mediocridade coletiva’. O que for rico e diversificado será 
esmagado pelo peso do costume, pela constante tendência dos homens à conformidade, que 
gera apenas capacidades ‘murchas’, homens ‘apertados e ofuscados’, ‘comprimidos’ e 
‘inflexíveis’ ‘A auto-afirmação pagã’ é tão digna quanto a ‘autonegação cristã’. ‘Todos os erros 
que [um homem] é susceptível de cometer contra conselho e advertência, são compensados 
pelo mal de permitir outros, para obrigar os outros ao que consideram seu bem. A defesa da 
liberdade consiste no objetivo ‘negativo’ de afastar interferências. Ameaçar um homem com 
perseguição a menos que ele se submeta a uma vida na qual ele não exerce escolha alguma 
em seus objetivos; Bloquear em sua frente todas as portas exceto uma, não importa qual 
nobre a perspectiva em que se abre, ou quão benevolente são os motivos daqueles que 
organizam isso, é pecar contra a verdade que ele é um homem, um ser com uma vida própria 
para viver. Isto é a liberdade como foi concebida pelos liberais no mundo moderno dos dias de 
Erasmus (alguns diriam Occam) até os nossos. Cada pedido de liberdades civis e direitos 
individuais, todo protesto contra a exploração e humilhação, contra a invasão da autoridade 
pública, ou a hipnose em massa do costume ou propaganda organizada, surgem dessa 
concepção individualista e muito disputada do homem. 
Três fatos sobre esta posição podem ser notados. Em primeiro lugar, Mill confunde 
duas noções distintas. Uma que toda coerção é, na medida em que frustra os desejos 
humanos, más como tal, embora possa ter de ser aplicada para evitar outros males maiores; 
enquanto a não interferência, que é o oposto de coerção, é boa como tal, embora não seja o 
único bem. Esta é uma concepção ‘negativa’ da liberdade em sua forma clássica. A outra é que 
os homens devem procurar descobrir a verdade, ou para desenvolver certo tipo de 
personagem que Mill aprovou – critico, original, imaginativo, independente, não-conformado 
ao ponto de excentricidade, e assim por diante – e que a verdade pode ser encontrada, e que 
tal personagem pode ser criado, apenas em condições de liberdade. Ambas essas visões são 
visões liberais. Mas elas não são idênticas, e a conexão entre elas é, na melhor das hipóteses, 
empírica. Ninguém diria que verdade ou liberdade de expressão poderiam florescer onde o 
dogma esmagasse todos os pensamentos. Mas, a prova da história tende a mostrar (como, 
aliás, foi defendidopor James Stephen em seu ataque formidável à Mill em seu Liberdade, 
Igualdade, Fraternidade) que integridade, amor pela verdade e pelo individualismo crescem 
pelo menos tão freqüentemente em comunidades severamente disciplinadas, entre, por 
exemplo, os Calvinistas puritanos da Escócia ou Nova Inglaterra, ou sob a disciplina militar, 
como nas sociedades mais tolerantes e indiferentes, e se é assim, o argumento de Mill para a 
liberdade como uma condição necessária para o crescimento da genialidade humana cai por 
chão. Se seus objetivos se mostrassem incompatíveis, Mill seria forçado por um dilema cruel, 
independentemente das novas dificuldades criadas pela inconsciência de suas doutrinas com 
utilitarismo estrito, mesmo em sua versão humana delas. 
Em segundo lugar, a doutrina é relativamente moderna. Não parece haver qualquer 
discussão sobre liberdade individual como ideal político consciente (ao contrário de sua 
existência atual) no mundo antigo. Condorcet já havia observado que a noção de direitos 
individuais estava ausente das concepções jurídicas dos romanos e gregos. O que parece 
assegurar a igualdade aos judeus, chineses e todas as civilizações antigas que, desde então 
vieram à luz. O domínio deste ideal tem sido a exceção e não a regra, mesmo na história 
recente do Ocidente. Nem a liberdade, nesse sentido, regularmente incitou um grito de guerra 
para as grandes massas de seres humanos. O desejo de não ser usurpado, para ser deixado por 
si só, tem sido a marca das civilizações em parte de ambos, indivíduos e comunidades. O 
sentido de privacidade em si, da área das relações pessoais como sagrada como seu próprio 
direito deriva do conceito de liberdade que, por todas suas raízes religiosas, dificilmente mais 
velha em seu estado desenvolvido, que o Renascimento ou a Reforma. No entanto, seu 
declínio marca a morte da civilização, de toda uma perspectiva moral. 
A terceira característica dessa noção de liberdade é sua maior importância. É que a 
liberdade nesse sentido não é incompatível com alguns tipos de autocracia, ou de qualquer 
forma com a falta de um auto-governo. Liberdade, nesse sentido é a preocupação principal 
com a área de controle, não com sua fonte. Assim como a democracia pode, de fato, privar o 
cidadão de um grande número de liberdades que ele poderia ter em alguma outra forma de 
sociedade, por isso é perfeitamente concebível que um déspota de mente liberal permita que 
seus súditos tenham grande liberdade pessoal. O déspota que deixa a seus súditos uma grande 
área de liberdade pessoal pode ser injusto, ou incentivar as mais selvagens desigualdades, 
talvez se importe pouco pela ordem, ou virtude, ou conhecimento; mas se ele não coíbe suas 
liberdades, ou pelo menos, se os restringe menos que outros regimes, ele cumpre as 
especificações de Mill. 
Liberdade, neste sentido, não é, em todo caso, logicamente, conectada com 
democracia ou autogoverno. Autogovernos podem, em conjunto, proporcionar uma melhor 
garantia de liberdades civis que outros regimes, e têm sido defendidos desse modo por 
libertários. Mas não há, necessariamente, conexão entre liberdade individual e a regra 
democrática. A resposta à pergunta: ‘Quem me governa?’ é logicamente diferente da questão: 
‘Quão longe o governo interfere comigo?’ É nessa diferença que o grande contraste entre os 
dois conceitos de liberdade negativa e positiva, no final, consiste. Já que o sentido de liberdade 
‘positiva’ vem à luz se tentarmos responder a pergunta, não ‘À que sou livre para fazer ou ser?’ 
mas ‘Por quem sou governado?’ ou ‘Quem pode dizer o que posso ser ou fazer?’ A conexão 
entre democracia e liberdade individual é muito mais tênue que pareceu aos defensores de 
ambos. O desejo de ser governado por mim mesmo, ou de qualquer forma, de participar no 
processo pelo qual minha vida é controlada, pode ser um desejo tão profundo quanto aquele 
pela área de ação, e talvez, historicamente mais velho. Mas não é um desejo pela mesma 
coisa. Tão diferente que são, na verdade, que podem ter levado ao grande choque de 
ideologias que domina nosso mundo. Pois, a concepção ‘positiva’ de liberdade, não é liberdade 
de, mas liberdade para – para liderar uma forma prescrita de vida – o que os adeptos da 
‘negativa’ representam como sendo, às vezes, nada melhor que um disfarce capcioso de 
tirania brutal. 
 
 
II 
A noção de liberdade positiva 
O sentido positivo da palavra liberdade deriva do desejo da parte do individuo de ser 
seu próprio mestre. Desejo que minha vida e minhas decisões dependam de mim, não de 
forças externas de forma nenhuma. Desejo ser meu próprio instrumento, não dos atos ou 
vontades dos outros homens. Desejo ser sujeito, não objeto; ser movido por razões, por 
propósitos conscientes, que são meus, não por causas que me afetem de fora. Desejo ser 
alguém, não ninguém; um fazedor – decidindo, não sendo decidido para – auto dirigido e não 
influenciado por natureza externa ou por outros homens como seu eu fosse uma coisa, ou um 
animal, ou um escravo incapaz de atuar num papel de humano, isto é, de conceber metas e 
políticas próprias minhas e realizá-las. Isto é pelo menos parte do que eu quero dizer quando 
falo que sou racional, e que essa é a razão que me distingue como ser humano do resto do 
mundo. Desejo, acima de tudo, ter consciência de mim mesmo como um pensador, disposto, 
ativo, tendo responsabilidades por minhas escolhas e capaz de explicá-las por referências às 
minhas próprias idéias e propósitos. Sinto-me livre no grau que acredito ser verdade, e 
escravizado no grau que sou feito para perceber que não é. 
A liberdade que consiste em ser mestre de si mesmo, e a liberdade que consiste em 
não ser impedido de escolher o eu faço aos outros homens, pode, em face disso, parecer um 
conceito sem grande noção ‘negativa’ de liberdade, historicamente desenvolvidas em direções 
divergentes, não sempre logicamente em passos respeitáveis, até que, no final, elas vêm em 
direção uma da outra e entram em conflito. 
Um modo de deixar isso claro é em termos de quantidade independente de 
movimento que inicialmente, talvez uma metáfora bastante inofensiva, de autodomínio 
adquirido. ‘Sou meu próprio mestre’; ‘Não sou escravo dos homens’; Mas posso eu (como os 
Platonistas ou Hegelianos tendem a dizer) não ser escravo da natureza? Ou das minhas 
próprias paixões desenfreadas? Não são essas muitas espécies de ‘escravo’ – alguns políticos 
ou legais, outros morais ou espirituais? Os homens não tiveram a experiência de se libertar da 
escravidão espiritual, ou escravidão à natureza, e eles não se tornaram conscientes disso no 
curso, por um lado, de um eu que domina, e por outro, de algo neles que é trazido para o 
restante? Esse eu dominante é, então, por alguns, identificado com razão, como minha 
‘natureza superior’ com o eu que calcula e que visa o que irá satisfazer em longo prazo, com 
meu eu ‘real’, ou ‘ideal’, ou ‘autônomo’, ou com meu eu ‘em seu melhor’; o que é depois 
contrastado com impulsos irracionais, desejos incontroláveis, minha natura ‘mais baixa’, a 
procura de prazeres imediatos, meu eu ‘empírico’ e ‘heterônomo’, varrido por cada rajada de 
desejo e paixão, necessitando ser rigidamente disciplinado se é para se elevar para a altura 
completa de sua natureza ‘real’. Presentemente os dois eus podem ser representados como 
divididos por um grande hiato; o eu real pode ser concebido como algo mais selvagem que o 
individuo (como o termo é entendido normalmente), como um ‘todo’ social do qual o 
individuo é um elemento ou aspecto: uma tribo, um Igreja, um Estado, a grande sociedade dos 
vivos e dos mortos e os ainda não nascidos. Esta entidade é então identificada como sendo o 
‘verdadeiro’ eu que,por impor sua coletividade, ou ‘orgânico’, vontade própria sobre os 
‘membros’ recalcitrantes, atinge sua própria e, portanto, a liberdade ‘superior’ deles. Os 
perigos de usar metáforas orgânicas para justificar a coerção de alguns homens por outros a 
fim de elevá-los ao nível ‘mais alto’ de liberdade foram muitas vezes apontados. Mas, o que dá 
tal plausibilidade como há nesse tipo de linguagem é que nós reconhecemos que é possível, e 
às vezes justificável, coagir homens em nome de algum objetivo (deixe-nos dizer, justiça ou 
saúde pública) que eles iriam, se fossem mais esclarecidos, exercerem eles mesmos, mas não o 
fazem, pois são cegos, ignorantes ou corruptos. Isso torna mais fácil para mim conceber-me a 
coagir outros para seu próprio bem, por eles, não por mim, já que não resistiriam a mim se 
fossem racionais e sábios como eu e entendessem seus próprios interesses como eu entendo. 
Mas posso continuar e argumentar um pouco mais que isso. Posso declarar que eles estão na 
verdade apontando para o que em seu estado ignorante eles resistem conscientemente, por 
que existe dentro deles uma entidade oculta – seus desejos racionais latentes, ou o 
‘verdadeiro’ propósito deles – e que essa entidade, embora seja desmentida por tudo que eles 
sentem e fazem abertamente, é o eu ‘real’ deles, sobre o qual o eu empírico pobre no espaço 
e tempo pode saber muito pouco ou nada a respeito; e esse espírito interior é o único que 
merece ter seus desejos levados em conta. Uma vez que eu tome este ponto de vista, estou 
em posição de ignorar os desejos verdadeiros dos homens e das sociedades. Para intimidar, 
oprimir, torturar em nome, e em beneficio, do eu ‘real’ deles. Com a certeza de qual é o 
verdadeiro objetivo dos homens (felicidade, dever, sabedoria, uma sociedade justa e auto-
realização) devem ser idênticos à sua liberdade – a livre escolha de seu eu ‘verdadeiro’, 
embora seu eu muitas vezes submerso e inarticulado. 
Esse paradoxo tem sido freqüentemente exposto. É uma coisa dizer que eu sei o que é 
bom para X enquanto ele próprio não sabe; e até mesmo ignorar seus desejos para seu próprio 
bem; e outra bem diferente é dizer que ele eo ipso escolheu isso, não conscientemente, não 
como ele faz todo dia em sua vida, mas em seu papel como um eu racional do qual seu eu 
empírico não tem conhecimento – o eu ‘real’ que distingue bem, e não pode escolhê-lo 
quando é revelado. Essa representação monstruosa, que consiste em equacionar o que X 
escolheria se fosse algo que ele não é, ou pelo menos não ainda, com o que X realmente 
procura e escolhe, é o coração de todas as teorias políticas de auto-realização. É uma coisa 
dizer que eu posso ser coagido para meu próprio bem, que sou muito cego para enxergar: isso 
pode, na ocasião ser para meu benefício; na verdade, pode alargar o âmbito de minha 
liberdade. Outra é dizer que se é para meu bem, então não estou sendo coagido, pois eu havia 
desejado isso, independente seu eu sabia ou não. E eu sou livre (ou ‘verdadeiramente’ livre) 
mesmo enquanto meu pobre corpo terreno e minha mente tola rejeitam isso, e lutam como 
grande desespero contra aqueles que buscam, mesmo que benevolentes, me imporem isso. 
Essa transformação mágica, ou por passe de mágica (pela qual William James tão 
justamente zombou dos Hegelianos), pode sem dúvidas ser perpetradas com a mesma 
facilidade com o conceito ‘negativo’ de liberdade, na qual o eu com que não se deveria 
interferir não é mais um individuo com desejos e necessidades reais como são normalmente 
concebidos, mas o homem ‘real’ dentro identificado com a procura de algum propósito ideal 
não sonhado por seu eu empírico. E, como no caso o eu ‘positivamente’ livre, essa entidade 
pode ser inflada em alguma entidade super-pessoal – um Estado, uma classe, uma nação, ou 
mesmo a própria marcha histórica. Mas a concepção ‘positiva de liberdade como mestre de si 
mesmo, que sugere um homem dividido contra si mesmo, tem em fato, e por questão 
histórica, de doutrina e prática, que faz mais fácil essa divisão da personalidade em duas: o 
transcendente, controle dominante e o feixe empírico de desejos e paixões à serem 
disciplinado. É esse fato histórico que tem sido influente. Demonstra (se demonstrações de 
fatos tão óbvios são necessárias) aquelas concepções de liberdade diretamente derivadas de 
visões do que constitui o eu, uma pessoa, um homem. Manipulação suficiente da definição de 
homem, e liberdade pode ser feita para significar o que quer que o manipulador deseje. A 
história recente tornou bem claro que a questão não é meramente acadêmica. 
As conseqüências da distinção entre dois eus se tornarão ainda mais claras se alguém 
considerar as duas principais formas de desejos auto-dirigidas – dirigidas pela ‘verdadeiro’ eu 
de alguém – que foram historicamente tomadas: a primeira, de autonegação, a fim de alcançar 
independência, a segunda, de auto-realização, ou auto-identificação total com um princípio 
específico ou ideal a fim de atingir o mesmíssimo fim. 
 
III 
O retiro para a cidadela interior 
Sou possuidor de razão e vontade. Eu concebo fins e desejo atingi-los; mas, eu sou 
impedido de atingi-los, não me sinto mais mestre da situação. Posso ser impedido pelas leis da 
natureza, ou por acidentes, atividades dos homens, ou efeito, muitas vezes involuntário, das 
instituições humanas. Essas forças talvez sejam demais para mim. O que devo fazer para evitar 
de ser esmagado por elas? Devo me libertar dos desejos que sei que não posso realizar. Desejo 
ser o mestre do meu reino, mas minhas fronteiras são longas e inseguras, por isso eu os 
contrato a fim de eliminar a área vulnerável. Começo desejando felicidade, poder, 
conhecimento, ou a realização de alguns objetivos específicos. Mas eu não posso comandá-los. 
Escolho evitar a derrota e desperdício e, portanto, decido não lutar por nada que não posso 
obter. Determino-me a não desejar o que é inatingível. O tirano me ameaça com a destruição 
de minha propriedade, com pena de prisão, com o exílio ou a morte de pessoas que eu amo. 
Mas se não me sinto mais ligado a propriedade, não me importo mais se estou na prisão, se 
matei dentro de mim meus afetos naturais, então ele não pode me dobrar às suas vontades, 
pois tudo que me sobrou não é subjugado a medos empíricos ou desejos. É como se eu tivesse 
executado um recuo estratégico em uma cidadela interior – minha razão, minha alma, meu eu 
‘numênico’ – que faz o que pode, nem forças externas cegas, ou a maldade humana, podem 
tocar. Retirei-me para dentro de mim mesmo; lá, e apenas lá, estou seguro. É como se eu 
dissesse: ‘Tenho uma ferida em minha perna. Há apenas dois métodos de me libertar da dor. 
Um é curar a ferida. Mas se a cura é muito difícil e incerta, há outro método. Posso me livrar 
da ferida cortando minha perna. Se me treinar a não querer nada para que a posse da minha 
perna seja indispensável, não sentirei a falta dela.’ Esta é a auto-emancipação dos ascetas e 
quietistas , sábios estóicos e budistas, homens de várias religiões ou de nenhuma, que fugiram 
do mundo e escaparam do jugo da sociedade ou opinião pública, por algum processo de auto-
transformação deliberada que lhes permite não se importar mais para qualquer valor da 
sociedade, para permanecer isolados e independentes na borda dela, não mais vulneráveis às 
suas armas. Todos os isolamentos político, toda autarquia econômica, toda forma de 
autonomia, tem algum elemento dessa atitude. Elimino os obstáculos em meu caminho 
abandonando meu caminho; eu recuo em minha própria seita, minha própria economia 
planejada, meu próprio território deliberadamente isolado, onde nenhuma voz do lado de fora 
precisa ser ouvida, e nenhuma força externa pode ter efeito. Essa éuma forma de busca por 
segurança; mas também tem sido chamada de busca por liberdade pessoal, nacional ou 
independência. 
A partir dessa doutrina, e sua aplicação aos indivíduos, não há uma grande distância 
das concepções daqueles que, como Kant, identificaram a liberdade não de fato como a 
eliminação dos desejos, mas como a resistência a eles, e controle sobre eles. Identifico-me 
com o controlador e escapo da escravidão do controlado. Sou livre por que, e na media que, 
sou autônomo. Obedeço às leis, mas eu as impus, ou as encontrei, em meu próprio eu sem 
coação. Liberdade é obediência, mas nas palavras de Rousseau, ‘obediência a uma lei que 
prescrevemos a nós mesmos’, e nenhum homem pode escravizar a si mesmo. Heteronomia é a 
dependência a fatores externos, a responsabilidade de ser um joguete do mundo externo que 
não posso controlar inteiramente, e que, portanto, me controla e ‘escraviza’. Sou livre apenas 
no grau em que minha pessoa não é ‘algemada’ por nada, que obedece forças sobre as quais 
eu não tenho controle algum; não posso controlar as leis da natureza; minha atividade livre 
deve, portanto, em hipótese ser levantada acima o mundo empírico da causalidade. Esse não é 
o lugar para discutir a validade dessa doutrina antiga e famosa, eu só gostaria de salientar que 
as noções de liberdade como resistência (ou fuga) aos desejos irrealizáveis, e como 
independência da esfera a causalidade, desempenham um papel central na política não menos 
do que na ética. 
Pois se a essência dos homens é que eles são seres autônomos – autores de valores, 
de fins em si mesmos, a autoridade máxima que consiste precisamente no fato que tem 
vontade livre – então nada é pior que tratá-los como se não fossem seres autônomos, mas 
objetos naturais, joguetes de influencias casuais, criaturas à mercê de estímulos externos, 
cujas opções podem ser manipuladas por sues governantes, seja por ameaças de força ou 
ofertas de recompensas. Tratar os homens dessa maneira é tratá-los como se não fossem 
auto-determinados. ‘Ninguém pode obrigar-me a ser feliz a sua própria maneira’, disse Kant. O 
paternalismo é ‘o maior despotismo imaginável’. É assim, pois tratar os homens como se não 
fossem livres, mas material humano para mim, o reformador benevolente, moldá-lo de acordo 
com meu próprio, não deles, propósitos adotados livremente. Isto é, é claro, precisamente a 
política que os primeiros utilitaristas recomendaram. Helvetius (e Bentham) acreditavam não 
em resistir, mas em usar, a tendência dos homens de serem escravos de suas paixões; eles 
desejavam balançar recompensas e punições em frente aos homens – a forma mais 
indesejável possível de heteronomia – se, isso quer dizer que os ‘escravos’ pudessem ser mais 
felizes. Mas, para manipular os homens, para impulsioná-los em direção às metas que você – o 
reformador social – vê, mas que eles não vêem, é negar a essência humana, ou enganá-los, 
isto é, para usá-los como meios para meus, não deles próprios, fins concebidos 
independentemente, mesmo se for para o próprio benefício deles, é, com efeito, tratá-los 
como sub-humanos, se comportar como se os fins deles são menos finais e sagrados que os 
meus. Em nome de que posso até mesmo me ver no direito de forçar os homens a fazer o que 
eles não desejam ou concederam? Somente em nome de algum valor maior que eles mesmos. 
Mas se, como Kant propôs, todos os valores são feitos de tal forma pelos atos livres dos 
homens, e chamados de valores apenas se são assim, não há valor maior que o individual. 
Portanto, fazer isso é coagir os homens em nome de algo menor e menos final que eles 
mesmos – submetê-los ao meu desejo, ou para o desejo de outrem de felicidade ou 
conveniência ou segurança ou oportunidade. Estou visando algo desejado (por qualquer 
motivo, não importando quão nobre) por mim ou meu grupo, para os quais estou usando 
outros homens como meios. Mas essa é uma contradição do que sei que os homens são, ou 
seja, fins neles mesmos. Todas as formas de adulteração dos seres humanos, chegando a eles, 
moldando-os contra sua vontade ao seu próprio padrão, todo pensamento de controle e 
condicionamento, são, portanto, uma negação daquilo nos homens que os fazem homens e de 
seus valores fundamentais. 
O individuo livre de Kant é um ser transcendente, além do domínio da causalidade 
natural. Mas em sua forma empírica – em que a noção de homem é aquela da vida comum – 
essa doutrina era o coração do humanismo liberal, tanto moral e politicamente, foi 
profundamente influenciado por Kant e Rousseau no século XVIII. É uma versão a priori da 
forma de um Individualismo Protestante secularizado, em que o lugar de Deus é tomado pela 
concepção de vida racional e o lugar da alma do individuo que tenciona no sentido da união 
com ele é substituída pela concepção do individuo, dotado de razão, esforçando-se para ser 
governado pela razão e apenas razão, e depender de nada que possa desviar ou iludi-lo 
envolvendo sua natureza irracional. Autonomia, não heteronomia: agir e não que ajam através 
de você. 
 A noção de escravidão das paixões é – para aqueles que pensam nesses termos – mais 
que uma metáfora. Poi, me livrar do medo, amor ou desejo de conformar é me livrar do 
despotismo de algo que não posso controlar. Sófocles, quem Platão relata dizendo que apenas 
a velhice libertou da paixão do amor – o jugo de um mestre cruel – é relatado como uma 
experiência tão real como a da libertação de um tirano humano ou de um proprietário de 
escravos. A experiência psicológica de observar-me cedendo a algum impulso ‘inferior’, agindo 
por um motivo que não gosto, ou fazer algo que no momento que faço detesto, e refletir mais 
tarde que eu não era eu mesmo, ou não estava em controle de mim mesmo, quando fiz aquilo, 
pertence a essa forma de pensar e falar. Identifico a mim mesmo com meus momentos críticos 
e racionais. As conseqüências de meus atos podem não importar, pois não estão em meu 
controle; apenas meus motivos estão. Esse é o credo do pensador solitário que desafiou o 
mundo e se emancipou das cadeias de homens e coisas. Nessa forma a doutrina pode parecer 
primariamente um credo ético, e dificilmente político; no entanto, suas implicações políticas 
são claras, e entra na tradição do individualismo liberal, pelo menos tão profundamente 
quando o sentido ‘negativo’ de liberdade. 
Talvez valha a pena observar que em sua forma individualista o conceito do sábio 
racional que escapou para a fortaleza interior de seu eu verdadeiro parece surgir quando o 
mundo externo se provou excepcionalmente árido, cruel ou injusto. ‘Ele é verdadeiramente 
livre’, disse Rousseau, ‘quem deseja o que pode executar, e faz o que deseja. ’ Em um mundo 
em que o homem buscando felicidade, justiça ou liberdade (em qualquer sentido) pode fazer 
pouco, por que acha muitas avenidas de ação bloqueadas para ele, a tentação de retirar-se 
para si mesmo pode tornar-se irresistível. Pode ter sido assim na Grécia, onde o ideal Estóico 
não pode ser totalmente desconectado com a queda das democracias independentes ante à 
centralizada autocracia Macedônia. Foi assim em Roma, por razões análogas, após o fim da 
República. Surgiu na Alemanha no século XVII, durante o período da mais profunda 
degradação dos Estados Germânicos que se seguiu à Guerra dos Trinta Anos, quando o caráter 
da vida pública, particularmente nos pequenos principados, forçou aqueles que valorizavam a 
dignidade da vida humana, não pela primeira ou ultima vez, a uma espécie e emigração 
interna. A doutrina que sustenta que o que não posso ter, devo ensinar-me a não querer, que 
um desejo eliminado, ou resistido com sucesso, é tão bom quanto um desejo satisfeito, é 
sublime, mas me parece, inconfundivelmente,uma forma de doutrina de uvas verdes: sobre o 
que não posso ter certeza, não posso querer verdadeiramente. 
Isto deixa claro por que minha definição de liberdade como a habilidade de fazer o que 
deseja – o que é, com efeito, a definição adotada por Mill – não vai ser possível. Se descubro 
que posso fazer pouco ou nada do que desejo, preciso apenas contrair ou extinguir meus 
desejos, então serei livre. Se o tirano (ou ‘persuasão oculta’) consegue a condição de seus 
súditos (ou clientes) em perder seus desejos originais e abraçando (‘internalizando’) a forma 
de vida que ele inventou para eles, ele irá, em sua definição, ter tido sucesso em libertá-los. 
Ele irá, sem dúvidas, tê-los feito sentirem-se livres – como Epicteto se sente mais livre que seu 
mestre (e se diz que o homem proverbial sentiu-se feliz na tortura). Mas o que ele criou é a 
verdadeira antítese de liberdade política. 
A autonegação ascética pode ser fonte de integridade, serenidade ou força espiritual, 
mas é muito difícil de ver como pode ser chamada de uma ampliação da liberdade. Se me 
salvo de um adversário recuando para dentro e trancando cada entrada e saída, posso estar 
mais livre do que se tivesse sido capturado por ele, mas sou mais do que se tivesse derrotado-
o ou o capturado? Se vou longe demais, me contraio dentro de espaços muito pequenos, vou 
sufocar e morrer. A culminação lógica de destruir tudo através de que posso me machucar é 
suicídio. Enquanto eu existir no mundo natural, nunca poderei estar inteiramente seguro. 
Liberação total nesse sentido (como Schopenhauer corretamente percebeu) é conferida 
apenas pela morte. 
Encontro-me em um mundo no qual encontro obstáculos para minha vontade. Aqueles 
que estão apegados ao conceito de liberdade ‘negativa’ talvez possam ser perdoados caso 
acreditem que a autonegação não é o único método de superar os obstáculos, que também é 
possível fazê-lo removendo-os: no caso de objetos não-humanos, por ações físicas; no caso de 
resistência humana, por força ou persuasão. Como quando eu induzo alguém a abrir espaço 
para mim em seu carro, ou conquistar um país que ameaça os interesses do meu. Tais atos 
talvez sejam injustos, podem envolver violência, crueldade, a escravidão dos outros, mas 
dificilmente pode ser negado que, desse modo, o agente é capaz no sentido mais literal de 
aumentar sua própria liberdade. É uma ironia da história que essa verdade seja repudiada por 
aqueles que a praticam com mais força, homens que, mesmo quando conquistam poder e 
liberdade de ação, rejeitam o conceito ‘negativo’ de liberdade em favor de sua contrapartida 
‘positiva’. Seu ponto de vista domina mais da metade de nosso mundo; deixe-nos ver sobre 
que fundação metafísica descansa. 
 
 
IV 
Auto-realização 
O único método verdadeiro de alcançar a liberdade, nos é dito, é pelo uso da razão 
critica, a compreensão do que é necessário e o que é contingente. Se sou um estudante, todas 
menos as mais simples verdades matemáticas intrometem-se como obstáculos ao livre 
funcionamento de minha mente, como teoremas cuja necessidade não entendo; são ditos 
serem verdades por alguma autoridade externa, e se apresentam a mim como corpos 
estranhos que esperam de mim que mecanicamente absorva em meu sistema. Mas quando eu 
entendo as funções dos símbolos, axiomas, as formas e regras de transformação – a lógica pela 
qual as conclusões são obtidas – e compreendo que essas coisas não podem ser obtidas de 
outra maneira, pois elas parecem seguir a partir de leis que governam o processo de minha 
própria razão, então as verdades matemáticas não intrometem-se como entidades externas 
forçadas sobre mim que devo receber independente de querer ou não, mas como algo que eu 
desejo livremente no curso do funcionamento natural de minha própria atividade racional. 
Para o matemático, a prova desses teoremas é parte de seu livre exercício de sua capacidade 
natural de raciocínio. Para o músico, depois de assimilar o padrão da contagem do compositor, 
e fazer dos fins do compositor seus próprios, a reprodução da musica não é obediência às leis 
externas, uma compulsão e barreira para a liberdade, mas um exercício livre, desimpedido. O 
músico não é ligado à contagem como um boi ao arado, ou um trabalhado fabril à maquina. 
Ele absorveu a contagem ao seu próprio sistema, teve, ao entendê-la, identificado-a consigo 
mesmo, mudou de impedimento à uma atividade livre em um elemento dessa atividade em si. 
O que se aplica à musica ou matemática deve, nos é dito, em principio se aplicar à todos os 
obstáculos que se apresentam como nódulos de coisas externas bloqueando nosso auto-
desenvolvimento. Esse é o programa de racionalismo iluminista de Spinoza para as ultimas 
(algumas vezes inconscientes) disciplinas de Hegel. Sapere aude. O que você sabe, aquilo que 
você compreende a necessidade – a necessidade racional – você não pode enquanto 
permanecendo racional, querer fazer o contrário. Pois, querer que algo seja diferente do que 
deve ser é, dadas as premissas, a necessidade de governar o mundo – ser pro tanto ou 
ignorante ou irracional. Paixões, preconceitos, medos, neuroses, nascem da ignorância, e 
tomam a forma de mitos e ilusões. Ser governado por mitos, se eles brotam da imaginação 
vivida dos charlatões inescrupulosos que nos enganam a fim de nos explorar, ou por causas 
psicológicas ou sociológicas, é uma forma de heteronomia, de ser dominado por fatores 
externa, em uma direção, não necessariamente desejada pelo agente. Os cientistas 
deterministas do século XVIII supuseram que o estudo das ciências da natureza, e a criação das 
ciências da sociedade no mesmo modelo, fariam a operação de tais causas transparentemente 
claras, e assim, permitiriam indivíduos a reconhecer sua própria parte no funcionamento do 
mundo racional, frustrando apenas quando mal interpretada. O conhecimento liberta, como 
Epicuro ensinou há muito tempo, eliminando automaticamente os medos e desejos. 
Herder, Hegel e Marx substituíram seus próprios modelos vitalistas da vida social pelos 
mais velhos, mecânicos, mas acreditaram não menos que seus adversários, que entender o 
mundo é ser livre. Eles meramente diferenciaram-se deles sublinhando o papel desempenhado 
pela mudança e crescimento no que faziam seres humanos serem humanos. A vida em 
sociedade não podia ser entendida por uma analogia retirada da matemática ou da física. 
Deve-se também entender a história, que são as leis peculiares do crescimento contínuo, quer 
seja por conflitos dialéticos ou de outra forma, que governam os indivíduos e grupos na sua 
interação uns com os outros e com a natureza. Não entender isto é, de acordo com esses 
pensadores, cair num tipo particular de erro, isto é, a crença que a natureza humana é 
estática, que suas propriedades essenciais são as mesmas o tempo todo, que é regida por leis 
naturais invariáveis, sejam elas concebidas em termos teológicos ou materialistas, o que 
implica no corolário falacioso que um legislador sábio pode, em principio, criar uma sociedade 
perfeitamente harmoniosa em qualquer tempo com a educação e legislação apropriadas, por 
que os homens racionais, em todas as épocas e países, devem sempre exigir as mesmas 
satisfações das mesmas necessidades inalteráveis. Hegel acreditava que seus contemporâneos 
(e de fato todos os seus antecessores) interpretaram erroneamente a natureza das instituições 
por que eles não entendiam as leis – as leis racionalmente inteligíveis, já que brotavam da 
operação da razão – que criam e alteram as instituições e transformam o caráter humano e a 
ação humana. Marx e seus discípulos sustentaram que o caminho dos seres humanos era 
obstruído não apenas por forças naturais, ou imperfeições deseu próprio caráter, mas, ainda 
mais, pelo funcionamento de suas instituições sociais, que eles tinham originalmente criado 
(nem sempre conscientemente) para certos propósitos, mas cujo funcionamento eles 
sistematicamente vieram a compreender mal, e que logo em seguida tornou-se obstáculo para 
o progresso de seus criadores. Marx ofereceu hipóteses sociais e econômicas para a 
consideração de tais mal entendidos, em particular da ilusão de que esses arranjos feitos pelo 
homem fossem forças independentes, como leis inevitáveis da natureza. Como exemplos de 
tais forças pseudo-objetivas, ele apontou para as leis de oferta e demanda, ou a instituição da 
propriedade, ou da eterna divisão da sociedade entre ricos e pobres, ou proprietários e 
trabalhadores, como muitas categorias inalteráveis. Não até que nós tivéssemos atingido um 
estagio que os feitiços dessas ilusões pudessem ser quebrados, isto é, até que homens o 
suficiente atingissem o estagio que sozinho lhes permitisse entender que essas leis e 
instituições eram elas mesmas o trabalho das mentes humanas e mãos, historicamente 
necessárias em seus dias, e depois confundidas com poderes objetivos, inexoráveis, poderia o 
velho mundo ser destruído, e substituído por uma maquina social libertadora e mais 
adequada. 
Somos escravizados por déspotas, instituições, crenças ou neuroses, que podem ser 
removidas apenas através de analise e entendimento. Estamos presos por espíritos malignos 
que nós mesmo temos – embora não conscientemente – criado, e que podem ser exorcizados 
apenas por mim ao me tornar consciente e agir apropriadamente: de fato, para Marx 
entendimento é a ação apropriada, Sou livre se, e apenas se, planejo minha vida acordo com 
meu próprio desejo; planos implicam regras; uma regra não me oprime ou escraviza se eu a 
impor a mim mesmo conscientemente, ou a aceito livremente, tendo entendido-a, sendo ela 
criada por mim ou por outros, desde que seja racional, isto é, em conformidade com a 
necessidade das coisas. Entender por que as coisas devem ser como elas devem ser é desejar 
que sejam assim. Conhecimento liberta não ao nos oferecer mais possibilidades abertas entre 
as quais podemos fazer nossa escolha, mas por preservar-nos da frustração de tentar o 
impossível. Desejar que leis necessárias sejam outra coisa ao invés do que são é ser a presa de 
desejos irracionais – um desejo de que o que deve ser deveria também ser não-X. Para ir mais 
longe, e acreditar que essas leis são outra coisa do que o que necessariamente são é ser louco. 
Esse é o coração metafísico do racionalismo. A noção de liberdade contida nela não é a 
concepção ‘negativa’ de um campo (idealmente) sem obstáculos, um vácuo no qual nada me 
obstrui, mas a noção de auto-orientação ou autocontrole. Posso fazer o que quero comigo 
mesmo. Sou um ser racional; o que quer que possa demonstrar a mim mesmo como sendo 
necessário, incapaz de ser diferente em uma sociedade racional – isto é, em uma sociedade 
dirigida por mentes racionais, na direção de metas as quais um ser racional faria – eu não 
posso, sendo racional, desejar varrer do meu caminho. Eu assimilo isso em minha substancia 
como faço com as leis da lógica, da matemática, da qual eu nunca poderei ser frustrada, uma 
vez que não posso querer que seja diferente do que é. 
Esta é a doutrina positiva de libertação pela razão. Formas socializadas dela, 
largamente díspares e opostas uma a outra como são, estão no coração das crenças 
nacionalistas, comunistas, autoritaristas, e totalitaristas de nossos dias. Ela pode, no curso de 
sua evolução, desviar-se longe de suas amarras racionalistas. No entanto, é desta liberdade 
que em democracias e em ditaduras se discute sobre, e por ela se luta, em muitas partes do 
mundo hoje. Sem tentar traçar a evolução histórica dessa idéia, gostaria de comentar algumas 
de suas vicissitudes. 
 
 
V 
O templo de Sarastro 
Aqueles que acreditam em liberdade como auto-direção racional estão sujeitos, cedo 
ou tarde, a considerar como ela pode ser aplicada não apenas para a vida interior do homem, 
mas para suas relações com os outros membros de sua sociedade. Mesmo os mais 
individualistas entre eles – e Rousseau, Kant e Fichte certamente começaram como 
individualistas – vieram em algum ponto a perguntar a si mesmo se a vida racional não apenas 
para o individuo, mas também para a sociedade, era possível, e se sim, como se alcançava. 
Desejo ser livre como minha vontade racional (meu eu ‘verdadeiro’) comanda, mas os outros 
também devem ser. Como posso evitar colisões com suas vontades? Onde é a fronteira que 
fica entre meus (racionalmente determinados) direitos e o direito idêntico dos outros? Pois se 
sou racional, não posso negar que o que é certo para mim deve, pelas mesmas razões, ser 
certo para os outros que são racionais como eu. Um Estado Racional (ou livre) seria um Estado 
governado por tais leis as quais todos os homens aceitariam livremente; isto quer dizer, tais 
leis as quais eles próprios teriam promulgado se tivessem sido perguntados, como seres 
racionais, eles exigiriam; daí as fronteiras seriam as quais todos os homens racionais 
considerassem certo serem as fronteiras para os seres racionais. 
Mas quem, de fato, deveria determinar quais são as fronteiras? Pensadores desse tipo 
discute, que se os problemas morais e políticos fossem genuínos – como certamente eram – 
eles devem, em principio, serem solucionáveis; isto quer dizer, deve haver um e apenas uma 
solução para qualquer problema. Todas as verdades poderiam, em principio, ser descobertas 
por um pensador racional, e demonstrada tão claramente que todos os outros homens não 
poderiam evitar aceitá-la; na verdade, esse já era o caso, em grande medida, nas novas 
ciências naturais. Nesta hipótese, o problema da liberdade política seria solucionável 
estabelecendo uma ordem justa que daria a cada homem toda a liberdade para a qual um ser 
racional tinha direito. Minha reivindicação por liberdade irrestrita pode a primeira vista não 
ser reconciliável com minha igualmente inqualificável reivindicação; mas essa solução racional 
de um problema não pode colidir com a solução igualmente verdadeira de outrem, pois duas 
verdades não podem ser logicamente incompatíveis; portanto, uma ordem justa deve ser, em 
principio, detectável – uma ordem na qual as regras fazem possível soluções corretas para 
todos os problemas possíveis que podiam surgir na mesma. Esse estado, ideal, harmonioso das 
coisas das coisas às vezes é imaginado como o Jardim do Éden antes da Queda do Homem, um 
Éden de onde fomos expulsos, mas pelo qual ainda estamos cheios de saudade; ou como a 
idade do ouro ainda antes de nós, na qual homens, tendo se tornado racional, não será mais 
‘direcionado aos outros’, ou ‘alienar’ ou frustrar um ao outro. Nas sociedades existentes, 
justiça e igualdade são ideais que ainda pedem alguma quantidade de coação, pois a elevação 
prematura dos controles sociais podem ter levado à opressão dos mais fracos e mais estúpidos 
por mais fortes, mais capazes ou mais inescrupulosos. Mas é apenas a irracionalidade da parte 
dos homens (de acordo com essa doutrina) que os leva a desejar oprimir, explorar, ou 
humilhar uns aos outros. Homens racionais respeitarão o principio da razão, e não ter 
qualquer desejo de lutar ou dominar uns aos outros. O desejo de dominar é ele mesmo um 
sintoma da irracionalidade, e pode ser explicado e curado pelos métodos racionais. Spinoza 
oferece um tipo de explicação e remédio, Hegel outro, Marx um terceiro. Algumas das teorias 
podem, talvez, em algum grau, suplementar a outra, outras não são combináveis. Mas todas 
elas assumem que em uma sociedade de seres perfeitamente racionais o desejode dominação 
estará ausente ou ineficaz. A existência de, ou vontade de, oprimir será o primeiro sintoma de 
que a solução aos problemas da vida social não foi ainda alcançada. 
Isto pode ser colocado de outra forma. Liberdade é autodomínio, a eliminação dos 
obstáculos à minha vontade, quaisquer que sejam esses obstáculos – a resistência da natureza, 
minhas paixões desgovernadas, instituições irracionais, desejo ou comportamento oposto dos 
outros. A natureza eu posso, ao menos em principio, sempre moldar através de meios 
técnicos, e moldar minha forma. Mas como eu devo tratar seres humanos recalcitrantes? 
Devo, se puder, impor minha vontade neles também, ‘moldá-los’ ao meu padrão, dar papeis 
para eles em minha peça. Mas isso não irá significar que apenas eu sou livre enquanto eles são 
escravos? Será assim se meu plano não tiver nada a ver com os desejos ou valores deles, 
apenas com os meus próprios. Mas se meu plano é inteiramente racional, irá permitir o 
‘verdadeiro’ desenvolvimento de suas verdadeiras naturezas, a realização de suas capacidades 
de decisões racionais, por ‘fazer o melhor de si’ – como parte da realização de meu próprio eu 
‘verdadeiro’. Todas as soluções verdadeiras para todos os problemas genuínos devem ser 
compatíveis:m mais que isso, devem caber em um único conjunto; pois isso que significa 
chamá-los todos racional e ao universo harmonioso. Cada homem tem seu caráter especifico, 
habilidades, aspirações, fins. Se eu entender quais são esses fins e naturezas, e como eles se 
relacionam uns com os outros, posso, ao menos em principio, se tiver o conhecimento e a 
força, satisfazer a eles todos, desde que a natureza e as questões sejam racionais. A 
racionalidade é conhecer as coisas e pessoas pelo que são: não devo usar pedras para fazer 
violinos; ou fazer violinistas natos tocarem flauta. Se o universo é governado pela razão, então 
não haverá necessidade para coerção; uma vida planejada corretamente para todos irá 
coincidir com a plena liberdade – a liberdade de auto-orientação racional – para todos. Será 
assim se, e apenas se, o plano for o verdadeiro plano – o padrão único que sozinho atende as 
reivindicações da razão. Suas regras serão regras prescritas pela razão: elas só parecerão 
cansativas para aqueles cuja razão está adormecida, que não compreendem as verdadeiras 
‘necessidades’ de seus próprios eus ‘reais’. Assim que cada parte reconhecer e desempenhar 
seus papeis dados a eles pela razão – a faculdade que entende sua verdadeira natureza e 
discerne seus verdadeiros fins – não poderá haver conflito. Cada homem será um ator liberto, 
auto-dirigido no drama cósmico. Assim, Spinoza noz diz que crianças, apesar de serem 
coagidas, não são escravas pois obedecem ordens dadas em seus próprios interesses, e que o 
sujeito de uma comunidade verdadeira não é escravo, pois o interesse comum inclui o dele 
próprio. Similarmente, Locke diz ‘Onde não há lei não há liberdade’, por que a lei racional é a 
direção para os ‘interesses adequados’ ou ‘bem geral’ de um homem; e acrescenta que desde 
que a lei desse tipo é o que ‘nos cobre de pântanos e precipícios’ ele ‘mal merece o nome de 
confinamento’, e fala dos desejos de escapar disso como sendo formas irracionais de ‘licença’ 
como ‘brutais’ e assim por diante. Montesquieu, esquecendo seus momentos liberais, fala de 
liberdade política como sendo não permissão de fazer o que se quer, ou mesmo o que a lei 
permite, mas apenas o ‘poder de fazer o que nós temos vontade’ o que Kant praticamente 
repete. Burke proclama o ‘direito’ do individuo de ser contido em seu próprio interesse, 
porque o ‘consentimento presumido de cada criatura racional é em uníssono com a ordem 
predisposta das coisas’. 
A suposição comum desses pensadores (e de muitos outros escolásticos antes deles e 
Jacobinos e Comunistas depois deles) é que os fins racionais de suas naturezas ‘verdadeiras’ 
devem coincidir, ou se fazer que coincidam, apesar de quão violentamente nossos pobres, 
ignorantes, cheios de desejo, apaixonados, eu empírico possa chorar contra esse processo. 
Liberdade não é liberdade de fazer o que é irracional, ou estúpido, ou errado. Forçar o eu 
empírico no padrão correto não é tirania, mas liberação. Rousseau diz me que se abandonar 
livremente todas as partes de minha vida para a sociedade, eu crio uma entidade que, por que 
foi construída da igualdade de sacrifício de todos os seus membros, não pode desejar 
machucar nenhum deles; em tal sociedade, somos informados, não pode ser interesse de 
ninguém prejudicar aos outros. ‘Ao dar a mim mesmo para todos, não me dou para ninguém’, 
e recebo de volta a mesma quantidade que perco, como nova força suficiente para preservar 
meus novos ganhos. Kant nos diz que quando ‘o individuo abandona inteiramente sua 
liberdade selvagem, sem leis, para encontrá-la novamente, intacta, num estado de 
dependência de acordo com a lei’, essa por si só é a verdadeira liberdade, ‘pois essa 
dependência é meu próprio trabalho agindo como legislador. Liberdade, longe de ser 
incompatível com a autoridade, se tona praticamente idêntica a ela. Este é o pensamento e a 
linguagem de todas as declarações dos direitos do homem no século XVIII, e de todos aqueles 
que desejam uma sociedade como um projeto construído de acordo com as leis racionais do 
legislador sábio, ou da natureza, ou da historia, ou do Ser Supremo. Bentham, quase sozinho, 
obstinadamente passou a repetir que o negócio das leis não era libertar, mas conter: toda lei é 
uma infração da liberdade – mesmo se tal infração conduz a um aumento do montante de 
liberdade. Se os pressupostos subjacentes tivessem sido corretos – se o método de resolver 
problemas sociais assemelhava-se a forma em que se encontram as soluções para os 
problemas das ciências naturais, e se a razão fosse o que os racionalistas diziam que era – tudo 
isso talvez se seguisse. No caso ideal, liberdade coincide com leis: autonomia com autoridade. 
Uma lei que me impede de fazer o que eu não poderia, como ser são, possivelmente desejar 
fazer não é uma restrição de minha liberdade. Numa sociedade ideal, compostas de seres 
totalmente responsáveis, regras, por que eu dificilmente seria consciente delas, gradualmente 
desapareceriam. Apenas um movimento social foi ousado o suficiente para deixar este 
pressuposto bastante explícito e aceitar suas conseqüências – aquele dos Anarquistas. Mas 
todas as formas de liberalismo fundadas na metafísica racionalista versões desse credo mais 
ou menos diluídas. 
No devido tempo, os pensadores que inclinaram suas energias para a solução do 
problema nessas linhas vieram a ser confrontados com a questão de como, na prática, os 
homens seriam feitos racionais nessa forma. Certamente eles deveriam ser educados. Pois os 
ignorantes são irracionais, heterônomos, e precisam ser coagidos, apenas para tornar tolerável 
a vida para os racionais para que possam viver na mesma sociedade e não serem obrigados a 
se retirar para um deserto ou para alguma altura Olímpica. Mas do ignorante não se pode 
esperar que entenda ou coopere com o propósito de seus educadores. A educação, diz Fichte, 
deve inevitavelmente trabalhar de tal forma que ‘que mais tarde você entenderá as razões do 
que estou fazendo agora’. Não se pode esperar das crianças que entendam porque são 
obrigadas a ir a escola ou do ignorante – que é, no momento a maioria da humanidade – por 
que eles são obrigados a entender as leis que os tornarão racionais. ‘Compulsão é também um 
tipo de educação’. Você aprende a grande virtude da obediência às pessoas superiores. Se 
você não consegue entender seus próprios interesses como um ser racional, não pode esperar 
que te consultem, ou cumpram seus desejos, no cursode te fazer racional. Eu devo, no final, te 
forçar a se proteger contra a varíola, mesmo que você não o deseje. Até mesmo Mill está 
preparado para dizer que posso forçadamente impedir um homem de atravessar uma ponte se 
não há tempo de alertá-lo que ela está prestes a cair, pois eu sei, ou sou justificado a assumir, 
que ele não deseja cair na água. Fichte sabe que um Alemão ignorante de seu tempo desejava 
ser ou fazer melhor que possivelmente poderia saber por si mesmo. O sábio te conhece 
melhor que você se conhece, pois você é a vitima de suas paixões, um escravo vivendo uma 
vida heterônoma, obtusa, incapaz de entender seu verdadeiro objetivo. Você quer ser um ser 
humano. É o dever do Estado satisfazer seu desejo. ‘A compulsão é justificada pela educação 
por discernimento futuro’. A razão dentro de mim, se é para triunfar, deve eliminar meus 
instintos inferiores, minhas paixões e meus desejos, que me tornam escravo. Similarmente (a 
transição fatal de conceitos individuais para sociais é quase imperceptível) os elementos mais 
elevados da sociedade – o melhor educado, o mais racional, aqueles que ‘possuem a maior 
percepção de seu tempo e das pessoas’ – pode exercer compulsão para racionalizar o setor 
irracional da sociedade. Pois – assim Hegel, Bradley, Bosanquet freqüentemente nos 
asseguraram – ao obedecer o homem racional, nós obedecemos a nós mesmos: Não de fato 
como estamos, afundados em nossa ignorância e paixões, criaturas fracas afligidas por 
doenças que necessitam um curandeiro, barreiras que precisam de um guardião, mas como 
poderíamos ser se fossemos racionais; como poderíamos ser mesmo agora, se pelo menos 
ouvíssemos o elemento racional que é, ex hyoithesi, dentro de cada ser humano que merece 
esse nome. Os filósofos de ‘Razão Objetiva’, do Estado duro, rigidamente centralizado de 
Fichte, ao liberalismo suave e humano de T.H. Green, certamente se supunham ser 
satisfatórios, e não resitentes, as exigências racionais que, não importa quão incipiente, seriam 
encontradas no peito de cada ser senciente. 
Mas devo rejeitar tão otimismo democrático, e me afastar do determinismo ideológico 
dos Hegelianos para alguma filosofia mais voluntária, conceber a idéia de impor a minha 
sociedade – para sua própria melhoria – um plano de minha autoria, que elaborei em meu 
conhecimento racional; e que, a menos que eu aja por conta própria, talvez contra os desejos 
permanentes da maioria de meus companheiros cidadãos, pode nunca vir a se concretizar. Ou, 
abandonando o conceito razão completamente, posso conceber eu mesmo como um artista 
inspirado, que molda homens sem seus padrões na luz de sua visão única, como pintores 
combinam cores e compositores os sons; a humanidade é o material cru sobre o qual eu 
imponho minha vontade criativa; mesmo que homens sofram e morram no processo, eles são 
elevados a uma altura a qual nunca teriam subido sem minha coerciva – mas criativa – violação 
de suas vidas. Esse é o argumento usado por cada ditador, inquisidor ou valentão que procura 
alguma justificativa moral, mesmo estética, para sua conduta. Devo fazer para os homens (ou 
com eles) o que eles não podem fazer por si mesmo, e eu não posso pedir sua permissão ou 
consentimento porque eles não estão em condição de saber o que é melhor para eles; na 
verdade, o que ele permitiria ou aceitaria pode significar uma vida de mediocridade 
desprezível, ou talvez até mesmo sua ruína e suicídio. Permitam-me citar o verdadeiro 
progenitor da doutrina heróica, Fichte, uma vez mais: ‘Ninguém tem direitos contra a razão’. 
‘O homem tem medo de subordinar sua subjetividade às leis da razão. Ele prefere a tradição 
ou arbitrariedade.’ No entanto, ele deve ser subordinado. Fichte apresenta as alegações do 
que ele chama razão; Napoleão, ou Carlyle, ou autoritários românticos talvez adorem outros 
valores, e vejam em seu estabelecimento pela força o único caminho para a ‘verdadeira’ 
liberdade. 
A mesma atitude foi claramente expressa por Auguste Comte, que quando perguntado 
por que, se não permitimos liberdade de pensamento na química ou biológica, nós deveríamos 
permitir isso na moral ou na política. Por que, de fato? Se não faz sentido falar de verdades 
políticas – afirmações de fins sociais que todos os homens, porque são homens, devem, uma 
vez descobertas, concordar por assim ser; e se, como Comte acreditava, o método cientifico irá 
no devido tempo revelá-las, então qual caso há para liberdade de opinião ou ação – ao menos 
como fim em si mesmo, e não meramente como uma simulação do clima intelectual – tanto 
para indivíduos quanto para grupos? Por que deveria se tolerar qualquer conduta que não foi 
autorizada por especialistas adequados? Comte colocou sem rodeios o que tinha estado 
implícito na teoria racionalista da política em seu começo na Grécia Antiga. Se pode, em 
principio, haver apenas uma forma correta de vida; o sábio a segue espontaneamente, por isso 
é chamado sábio; O ignorante deve ser arrastado para ela por todos as formas sociais em 
poder do sábio; por que deveria esse erro demonstrado sofrer e sobreviver e procriar? O 
imaturo e ignorante devem ser forçados a dizer a si mesmo: ‘Apenas a verdade liberta, e a 
única forma na qual posso aprender a verdade é fazendo cegamente hoje, o que você, que 
sabe, me ordena, ou me coage, a fazer, na certeza de que só assim vou chegar em sua visão 
clara, e ser livre como você’. Temos vagado, na verdade, de nosso começo liberal. Essa 
discussão, empregada por Fichte em sua ultima fase, e depois deles por outros defensores da 
autoridade, dos escolásticos vitorianos e administradores coloniais ao ultimo nacionalista ou 
ditador Comunista, é precisamente o que a moral dos Estóicos e Kantianos protesta contra 
mais amargamente em nome da razão do individuo livre seguindo sua própria luz interior. 
Dessa forma o argumento racionalista, com sua suposição de uma única solução verdadeira, é 
conduzido por etapas, que, se não logicamente valido, é historicamente e psicologicamente 
inteligível a partir de uma doutrina ética de responsabilidade individual e auto-
aperfeiçoamento individual para um Estado autoritário obediente às diretrizes de uma eline de 
guardiões platônicos. 
O que pode ter levado para uma reversão tão estranha – a transformação do 
individualismo severo de Kant em algo próximo a uma doutrina totalitária da parte dos 
pensadores, alguns dos quais que alegavam serem seus discípulos? Essa questão não é 
meramente de interesse histórico, pois não foram poucos os liberais contemporâneos que 
passaram pela mesma evolução peculiar. É verdade que Kant verdadeiramente insistiu, 
segundo Rousseau, que a capacidade de auto-orientação pertence à todos os homens; que 
não poderia haver especialistas em questões morais, já que a moralidade não é uma questão 
de conhecimento especializado (como os filósofos utilitaristas sustentam), mas do uso correto 
das faculdades humanas; e conseqüentemente que o que faz dos homens livres não é agir de 
maneiras auto melhoráveis, que eles podiam ser coagidos a fazer, o que ninguém poderia fazer 
por – ou em nome de – outra pessoa. Mas até mesmo Kant, quando veio a lidar com questões 
políticas admitiu que nenhuma lei, desde que fosse de tal forma que eu deveria, se 
perguntado, aprovar como um ser racional, poderia possivelmente me privar de nenhuma 
parte de minha liberdade racional. Com isso, a porta foi aberta amplamente para os 
especialistas das regras. Não posso consultar todos os homens sobre todas as leis o tempo 
todo. O governo não pode ser um plebiscito continuo. Além disso, alguns homens não são tão 
bem sintonizados com a voz de sua própria razão quanto outros: alguns parecem 
singularmente cegos. Se sou um legislador

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