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Aula 1 
A Literatura Comparada nasceu na França. Atualmente, Literatura Comparada e Literatura Mundial, embora não sejam sinônimas, são usadas para designar os estudos de autores do mundo todo, independentemente da língua em que escreveram. A perspectiva comparatista é que vai definir a diferença entre elas. Para os franceses, a Literatura Comparada envolvia investigações limitadas. A definição de Remak é bem ampla e se aproxima daquilo que se pratica até hoje. A literatura comparada é o estudo da literatura além das fronteiras de um país específico e o estudo das relações entre, por um lado, a literatura, e, por outro, diferentes áreas do conhecimento e da crença, tais como as artes (...), a filosofia, a história, as ciências, a religião etc. Em suma, é a comparação de uma literatura com outra ou outras e a comparação da literatura com outras esferas da expressão humana. No que se refere aos países africanos de língua portuguesa, o termo lusofonia tende a não ser apreciado por atrelá-los de modo simbólico a Portugal, como salienta Laura Padilha, que vê a lusofonia como extensão do lusismo, maneira de afirmação de Portugal. Buscaremos estudar alguns grandes momentos da literatura mundial, dando destaque aos cânones, ou seja, aqueles escritores que exerceram um poder irradiador muito forte, tendo sido lidos e retrabalhados pelos escritores subsequentes. 
Aula 2 A importância de Cervantes
D. Quixote trata tanto da viagem quanto da viagem através da leitura. Fidalgo da região de La Mancha, na Espanha, D. Quixote leu livros de cavalaria demais, o que o deixou louco, ou seja, fora da realidade. Ele quer realizar feitos heroicos numa época em que já não havia cavaleiros. Essa alienação o faz sonhar, ou ainda, viver dentro de um sonho, o que vai render a criação do adjetivo quixotesco para designar a pessoa sonhadora, que luta por seus ideais. Para criar esse personagem com tantas facetas, Cervantes usou a paródia, ou seja, ele imitou, de maneira cômica, os romances de cavalaria. A narração da viagem de Quixote e Sancho é entremeada com outras histórias contadas ou lidas por personagens encontrados ao longo do tempo. 
Ambiguidade
O escritor mexicano Octavio Paz considera o romance Dom Quixote o primeiro romance moderno, porque ele tem como principal característica a ambiguidade do personagem, que decorre do humor. O humor que nasce com Cervantes não existia antes, trata-se de uma invenção que mudou o caráter da literatura. D. Quixote é, ao mesmo tempo, louco e sublime, o romance flutua entre realidade e fantasia, loucura e senso comum. D. Quixote e Sancho Pança: dois homens opostos, unidos pela viagem: se o primeiro sonha em desempenhar seu papel de cavaleiro andante, Sancho Pança é sensato e vê a vida tal como ela é. 
Intertextualidades
Esse modelo de um nobre e seu lacaio que viajam a cavalo, param nas estalagens para comer e dormir, encontram pessoas e passam por peripécias, vai se repetir na literatura nos séculos subsequentes. Um bom exemplo disso é o romance Jacques, o fatalista, e seu amo, de Denis Diderot e A vida e as opinioes do cavalheiro Tristram Shandy, de Laurence Sterne. 
O narrador e a metalinguagem
O narrador tem participação explícita tanto no Quixote quanto nos outros romances que se inserem nessa tradição, diferente, portanto, daquele narrador impessoal, neutro, que surgiria no romance realista do século XIX, um narrador onisciente que evita aparecer. O narrador em Cervantes (século XVII), em Sterne e Diderot (século XVIII) e em Machado de Assis (século XIX) fala diretamente com o leitor, comentando a história que conta e, ao mesmo tempo, interpelando o leitor, fazendo-o entrar na narrativa. Como você pode ver nesta citação, Quixote, o narrador, interpela o leitor de maneira um pouco provocativa chamando-o de “desocupado” e depois “caríssimo”; é bastante satírico ao apresentar seu livro, tão diferente de tantos outros mais nobres que o precederam. Essa atitude, que dá um tom oral, como se o narrador estivesse falando para seus ouvintes, foi usada antes dele por um outro grande nome da literatura que não poderemos desenvolver aqui: François Rabelais (1484-1553), autor de Gargantua e Pantagruel. Ele também começa seus romances dirigindo-se a seus leitores como se fossem ouvintes. Sterne criou o narrador mais falante, cada palavra pronunciada por alguém é motivo para uma digressão; diferente do narrador de Sterne, o de Diderot não é personagem; ele também interrompe muitas vezes o fio da narrativa para se dirigir ao leitor. Machado de Assis é, sem dúvida, leitor e apreciador de Sterne e de Diderot, por essa razão ele foi considerado anacrônico, já que nos fins do século XIX já não se fazia narrador desse tipo. No prólogo do Bras Cubas, o narrador já faz troça de si e de seu romance dizendo que se Stendhal só esperava cem leitores, ele não terá nem mesmo dez, talvez cinco. E termina o breve prólogo intitulado “Ao leitor” com a seguinte frase: “A obra em si mesma é tudo: se te agradar, fino leitor, pago-me da tarefa; se te não agradar, pago-te com um piparote, e adeus” (ASSIS, 1971, p. 513). O narrador aqui também é irônico porque ele espera que o leitor goste do livro, mas, se não gostar, recebe um peteleco.
É interessante perceber como o romance se modificou ao longo de sua história: nos séculos XVII e XVIII muitos romances (como os de Cervantes, de Sterne e de Diderot) não são lineares e contêm muitas digressões ou histórias interpoladas. Já o romance do século XIX tende a ser linear, ou seja, a história é contada do início ao fim, com algum suspense de maneira a provocar o interesse do leitor. O narrador desaparece a fim de privilegiar a intriga e os personagens. Já o romance do século XX (Virginia Woolf, Faulkner) rompe a linearidade e tem uma construção temporal mais complexa. 
O romance Triste fim de Policarpo Quaresma (publicado em livro, em 1915), de Lima Barreto, tem influxo da obra de Cervantes não na forma narrativa, como acabamos de ver em Sterne, Diderot e Machado, mas na construção do personagem central. À maneira do Quixote, Policarpo é um sonhador, um homem que não aceita a realidade tal como ela é. Influenciado pela literatura romântica, tem uma biblioteca centrada em assuntos sobre o Brasil. Patriota ao extremo, acaba se comportando de maneira estranha e antissocial. Não aprecia nada que é estrangeiro porque acha que devemos valorizar os produtos nacionais. Começa a estudar
a língua tupi-guarani porque acredita que ela é a língua nacional. O auge de sua alucinação acontece quando manda um requerimento à Câmara, pedindo que esta decrete que o tupi-guarani se torne a língua oficial do país. 
No projeto de Borges estão implícitas algumas noções relevantes da história literária:
O Quixote “no século XVII” era agradável e foi lido com prazer pelo público, enquanto agora ele é um clássico, um romance canônico cuja notoriedade acaba por engessá-lo; escrevê-lo de novo seria uma maneira de resgatar o frescor que ele tinha na época de sua publicação.
2. Ele hoje é lido juntamente com a história de sua recepção, com uma grande quantidade de estudos críticos, filológicos etc.
3. Ao discutir a transposição do romance para o século XX, Borges introduz a questão da tradução literária, pois os grandes clássicos permanecem em suas línguas originais (Cervantes, Shakespeare) nos países que falam aquela língua, enquanto nos outros países, eles são
traduzidos e retraduzidos, a cada geração, porque as traduções podem envelhecer, mas os originais, não.
4. Ao ler os dois textos ao mesmo tempo, Borges introduz a noção de palimpsesto, o que é muito interessante porque realmente em cada texto há camadas de outros textos que foram lidos e reapropriados pelo escritor. Palimpsesto, aqui, remete à intertextualidade, dado característico de toda a literatura.
Estabeleça, brevemente, alguns pontos convergentes nas obras Dom Quixote, Memorias postumas de Bras Cubas e Triste fim de Policarpo Quaresma, identificando o que há de “quixotesco” nos romances brasileiros.
Machadode Assis se insere nessa tradição do filão paródico de Cervantes, notadamente no romance Memorias postumas de Bras Cubas, que explora com humor a posição de um narrador morto ao contar sua vida de maneira bastante cínica. Também Sterne, precursor do fluxo de consciência como técnica narrativa, acaba influenciando de maneira decisiva a obra de Machado de Assis. Dessa forma, podemos dizer que Sterne, Diderot e Machado sofrem influxo da obra de Cervantes na forma narrativa. Já Lima Barreto cria seu personagem principal à maneira do Quixote. Em Triste fim de Policarpo Quaresma (publicado em livro, em 1915), Policarpo é um sonhador, um homem que não aceita a realidade tal como ela é. Influenciado pela literatura romântica, tem uma biblioteca centrada em assuntos sobre o Brasil. Patriota ao extremo, acaba se comportando de maneira estranha e antissocial. Não aprecia nada que é estrangeiro porque acha que devemos valorizar os produtos nacionais. Começa a estudar a língua tupi-guarani porque acredita que ela é a língua nacional. O auge de sua alucinação acontece quando manda um requerimento à Câmara pedindo que esta decrete que o tupi-guarani se torne a língua oficial do país.
Aula 3 – A atualidade de Shakespeare
Os dois grandes cânones da literatura ocidental moderna, William Shakespeare e Miguel de Cervantes, foram contemporâneos, mas nunca se conheceram. Ambos ajudaram a moldar e a consolidar o inglês (no caso de Shakespeare) e o espanhol (no caso de Cervantes) como línguas literárias. Shakespeare seria, para o crítico norte-americano Harold Bloom, o principal cânone universal. Antes dele os personagens eram imutáveis, ou ainda, eles agiam em função de seu relacionamento com os deuses, com o destino que os alcançava. Já na obra de Shakespeare, os personagens “se desenvolvem, e o fazem porque têm a capacidade de se autorrecriarem. Bloom salienta a importância das vozes na obra shakespeariana, pois cada personagem, principal ou secundário, tem sua voz, tem sua individualidade ressaltada pela reflexão que faz sobre sua vida. Essa autoconsciência dos personagens, que desvenda vícios, paixões, desejo de poder, compreensão da vulnerabilidade humana, da loucura, da morte e do sentido da vida levou o autor a considerar que Shakespeare inventou o humano, seguindo uma linha traçada pelo crítico inglês do século XVIII, Samuel Johnson. É justamente por esta razão que a obra de Shakespeare atravessou os séculos sem envelhecer: porque seus personagens têm uma interioridade complexa, cheia de contradições e, sobretudo, porque Shakespeare não teme revelar sentimentos de toda ordem, que vão do sublime ao torpe. Os assassinatos se sucedem nas peças de Shakespeare e, muitas vezes, a crueldade aparece de maneira explícita. A atualidade de sua obra revela-se no número de representações de suas peças no teatro de todo o mundo, além das inúmeras adaptações para o cinema, para a ópera, para a televisão, para a pintura e para os quadrinhos. Ou seja, a obra de Shakespeare não só inspirou autores ao longo dos séculos como continua vívida até hoje, encantando o público. 
Algumas peças
Hamlet
Hamlet é, talvez, a obra mais importante de William Shakespeare, pois contém quase todas as questões que aparecem no conjunto de sua obra, sendo histórica, psicológica, filosófica e sentimental. Como peça histórica, ela oferece o mesmo esquema das outras peças históricas, ou seja, começa e acaba com a morte de um rei e a entronização do novo rei; como peça psicológica, tem o drama familiar formado pelo triângulo edipiano: mãe-filho-pai, com a morte de um pai e a substituição por outra figura de pai (padrasto, assassino do pai); como peça filosófica, temos toda a reflexão de Hamlet acerca da vida e da morte e, enfim, como peça sentimental, ela apresenta o amor entre Hamlet e Ofélia. A partir desse encontro com a morte e com o morto, Hamlet passa a ter um comportamento bizarro, como se estivesse louco. Como o Quixote, é um personagem ambíguo. As perguntas que o leitor/espectador da peça se faz são: Hamlet está louco ou finge a loucura para melhor realizar sua vingança? Se está fora de si, quais são as causas? E por que hesita tanto? É nesse contexto que ele pronuncia a frase que é muito repetida até hoje: “Há algo de podre no Estado da Dinamarca”. Hamlet é um personagem filosófico, que, antes da morte do pai, estudava na universidade, para onde deseja voltar no início da peça. Aliás, ele aparece com um livro na mão. Rei e rainha o impedem de partir: por quê? Para monitorarem seus movimentos? Por que a mãe quer tê-lo perto dela? A ambiguidade permeia toda a história de Hamlet. É importante destacar que, em Hamlet, há uma cena de teatro dentro do teatro, ou metateatro: Hamlet chama alguns atores para representarem diante do rei e da rainha o crime que eles haviam cometido, ou seja, a forma como mataram o rei por envenenamento e em seguida se casaram. Ao assistir a esse teatro no próprio palácio, o rei fica desesperado e manda parar o espetáculo. Nesse momento ele se trai e, ao mesmo tempo, se dá conta de que Hamlet sabe a verdade. Essa técnica de colocar em miniatura a história de toda a obra foi chamada, pela crítica francesa do século XX, de construção em abismo (mise-en-abyme). Dessa forma, o metateatro trata de problemas de representação dentro do próprio texto de representação; é a peça dentro da peça, através de um discurso crítico sobre as fronteiras do que é real e do que é representação do real. Esse procedimento é recorrente nos dramaturgos do século XX, tendo como seus maiores representantes os textos de Samuel Beckett, Luigi Pirandello, Bertold Brecht e Jean Anouilh. Hamlet é um clássico do metadrama, o que também demonstra a sua atualidade, sendo possível estabelecer diálogos producentes entre a obra dramática de Shakespeare do século XVI e os dramaturgos do século XX, relacionando a profunda reflexão acerca da complexidade da arte dramática e da mimesis (imitação). Ademais, também utilizamos os termos metalinguagem ou metaficção quando o texto literário discute o seu próprio fazer artístico, a sua ficcionalidade e processo de criação, as técnicas de narração e os usos da linguagem. 
	O enigma de Hamlet é o enigma de todo ser humano, que balança de um lado para outro, que deseja uma coisa e seu contrário ao mesmo tempo; em outras palavras, o ser humano é contraditório, às vezes paradoxal, e a literatura é capaz de captar essas variações de comportamento, que a personagem tão bem representa. 
	Comente sobre o drama presente em Hamlet, justificando por que essa obra permanece atual e inesquecível ao longo dos séculos. 
Hamlet é uma personagem clássica de Shakespeare. Mesmo quem não leu Hamlet ou não assistiu ao filme, em uma de suas adaptações, provavelmente já ouviu falar da personagem, da célebre expressão “ser ou não ser: eis a questão”. Isso também define um clássico. Para Calvino,
“os clássicos são livros que, quanto mais pensamos conhecer por ouvir dizer, quando são lidos de fato mais se revelam novos, inesperados, inéditos” (CALVINO, 1993, p. 12). Hamlet tem um conflito existencial que permanece atual até hoje, pois adquiriu dimensão universal ao tratar do ser humano e de suas indagações metafísicas. A peça apresenta perguntas para as quais não temos respostas; não as tínhamos no século XVI e continuamos sem as ter no século XXI. Por isso, as personagens de Shakespeare continuam atraentes, interessantes, instigantes. Elas mexem com o leitor, causam raiva e revolta, fazem com que, nelas, identifiquemos nosso íntimo irrevelável e nossos conflitos internos. O enigma de Hamlet é o enigma de todo ser humano, que balança de um lado para outro, que deseja uma coisa e seu contrário ao mesmo tempo; em outras palavras, o ser humano é contraditório, às vezes paradoxal. 
Otelo
A peça se passa em Veneza. Otelo é um mouro de origem nobre que presta serviços militares ao doge veneziano, que está em guerra com Chipre. Esse é o pano de fundo histórico para a intriga principal em torno do ciúme. Otelo é cortejado por todos nacidade porque é competente em seu trabalho e valorizado pelo Doge, apesar do racismo que aparece desde as primeiras cenas. Ser mouro é, na linguagem de Iago, o auxiliar de Otelo, sinônimo de ser animal. Tradicionalmente a personagem é representada como um negro, embora os mouros não sejam negros. Em um momento da peça se diz que Otelo é de origem berbere, Argélia. Otelo conquista o amor de Desdêmona com sua conversa cativante porque ele é um homem bom, culto, com larga experiência de vida, que sabe contar histórias. Entretanto, ele se deixa enredar pelas intrigas de Iago, em quem confia plenamente. O que move Iago é a inveja porque, sendo alferes, gostaria de ter sido promovido a tenente; em vez dele, Cássio o foi. Iago é mau, odeia todos, inclusive sua mulher, que ele acaba matando. Já Otelo é de natureza boa e crédula, mas fica obcecado com a suspeita de traição que lhe é inoculada por Iago. Otelo tornou-se o símbolo do homem que tem ciúme de uma mulher inocente e inspirou, por exemplo, Machado de Assis ao escrever Dom Casmurro. O próprio Shakespeare explorou o ciúme sob o modo da comédia em As alegres comadres de Windsor, que gira em torno de Falstaff. 
Romeu e Julieta
A peça Romeu e Julieta se passa em Verona (Itália). Os dois jovens que a nomeiam vêm de famílias rivais, Montéquio e Capuleto. Eles se encontram e se apaixonam, inicialmente sem saber sua origem, e, em seguida, continuam se amando, porque já não podem resistir à paixão. Sendo o amor impossível, já que as duas famílias não autorizam o casamento, eles decidem se casar às escondidas (como Desdêmona e Otelo fizeram). É Frei Lourenço quem celebra o matrimônio; a ama de Julieta, que vai levar os recados, ajuda os dois jovens a promoverem sua união. Como em geral acontece no teatro, os empregados domésticos têm um papel de ajudantes dos protagonistas. Eles também têm características cômicas. A rixa que já existia entre as duas famílias se acirra quando Teobaldo Capuleto provoca Mercúcio Montéquio e o mata; em seguida, é Romeu quem mata Teobaldo. Para Julieta uma tensão se instaura porque ela ama Romeu, com quem acaba de se casar, e odeia o assassino de seu primo Teobaldo. Mais uma vez, vemos como Shakespeare explora a ambiguidade de sentimentos que causa conflitos no espírito de seus personagens. Esse modelo de intriga de amor impossível atravessa a literatura ocidental desde o chamado ciclo bretão, na Idade Média, que Shakespeare devia conhecer. Duas histórias são muito famosas: a de Tristão e Isolda e a de Lancelot, apaixonado por Guinevere, esposa do rei Artur. Nos dois casos, Tristão e Lancelot são pessoas muito próximas do rei, são seus guerreiros e colaboradores, mas a paixão é mais forte do que a fidelidade. Esse esquema narrativo de Romeu e Julieta é muito usado na literatura romântica do século XIX e, por essa razão, tal peça de Shakespeare fez muito sucesso nesse período. O obstáculo que impede a união dos amantes pode variar. 
A Tempestade
Esta é a última peça de Shakespeare. Nela, encontramos Próspero e sua filha Miranda, que estão morando em uma ilha há 12 anos. Na ilha ele encontrou dois seres: Ariel e Caliban. O primeiro foi libertado de uma prisão em que o colocara Sycorax, mãe de Caliban e, por isso, deve gratidão a Próspero. Já Caliban é revoltado e se considera um escravo de Próspero porque faz todo o trabalho braçal para ele. O escritor uruguaio José Enrique Rodó publicou em 1900 o ensaio Ariel, no qual identificou a América Latina à figura etérea de Ariel porque as ideias têm asas. Próspero aparece como uma figura de professor. Já nos anos 1960, Aimé Césaire, escritor da ilha da Martinica (Caribe francês), criador do movimento da negritude ao lado de Léopold Sédar Senghor (Senegal) e Léon Damas (Guiana Francesa), escreveu uma peça chamada Uma tempestade. Nessa peça Caliban é um negro, associado aos Panteras Negras dos Estados Unidos, que se revolta contra a opressão de Próspero, ao passo que Ariel é um mulato assimilado.Nesses dois exemplos, podemos ver a imensa variedade de leituras possíveis da peça de Shakespeare: de um lado, Rodó, homem branco e culto, identifica-se com a latinidade de sua formação europeia e, portanto, com Ariel, figura superior; de outro, Césaire, homem negro e culto, identifica-se com a África e com todos os negros que foram escravizados na América, que, para ele, podem ser representados na figura revoltada de Caliban.
Aula 4 – O classicismo francês
Clássico pode ser, por exemplo, tudo que resiste ao tempo, sendo assim, dizer que Machado de Assis ou Shakespeare são clássicos significa dizer que eles permaneceram vivos através de suas obras literárias. Clássicos são obras definitivas.
Em resumo, em francês o termo classicismo designa tanto a literatura produzida no período greco-latino quanto a literatura francesa dos séculos XVII e XVIII, chamados séculos clássicos. Já em alemão e em inglês, só há um classicismo: o da Antiguidade. Como afirma Alain
Génetiot, o classicismo francês é parte da chamada “exceção francesa”. 
	Além da linguagem depurada e clara, o classicismo se caracteriza por sua pretensão ao universal, ou seja, ele concebe a natureza humana como algo mais ou menos imutável, que deveria retratar o homem em sua essência. É por essa razão que os escritores não hesitavam em se inspirar nos autores antigos, que tinham vivido em sociedades muito diferentes das suas. De qualquer modo, até o século XVIII não se valorizava a originalidade: esse será um valor romântico, que só surgirá no século XIX, e que veremos no seu devido tempo. 
Consolidação da língua e da literatura 
Como dissemos nas aulas anteriores, as literaturas modernas começam a partir do século XVI, ainda que antes disso (na Idade Média) já tivessem existido textos publicados nas novas línguas, sobretudo poesia, teatro (religioso e profano) e pequenos relatos em prosa, em grande parte
textos cômicos, de origem popular e oral. Assim, as literaturas modernas só se consolidam realmente no século XVII, quando as línguas já encontraram sua forma definitiva (ainda
que as línguas sejam organismos vivos que estão sempre se modificando). É por essa razão que dedicamos três aulas a este século: porque os autores que surgiram nos diferentes países da Europa criaram verdadeiros paradigmas literários que estão vivos até hoje. 
Assim, voltando à França, o classicismo estava de acordo com o ideal do rei, Luís XIV, da corte e da nobreza: refinamento. Tudo tinha de ser muito ordenado, regrado, elegante. O pior insulto que se podia fazer a uma pessoa da aristocracia francesa era a vulgaridade, própria de outras classes sociais, jamais da nobreza. 
O classicismo francês 
O teatro clássico francês tem dois gêneros: tragédia e comédia, sendo que a primeira era considerada mais nobre, já que seus personagens representavam reis, rainhas, duques, enfim, personalidades de alta estirpe. A primeira exigência que se faz a uma peça classicista é a verossimilhança, ou seja, o espectador que assiste à peça no teatro tem de acreditar
que aquela história poderia acontecer naquelas condições. Para se criar a verossimilhança, Aristóteles tinha definido em sua Poética a exigência de que houvesse duas unidades: de tempo e de ação. A unidade de lugar, como veremos mais adiante, foi adicionada posteriormente pelos franceses. 
Explique qual é a principal diferença entre a Fedra de Racine e as obras de Eurípides e de Sêneca, no que diz respeito às personagens femininas.
	Tanto a obra do grego Eurípides, quanto a do latino Sêneca apresentam um discurso de ódio e desprezo em relação às personagens femininas da peça. Esse discurso é pronunciado não só por homens, mas também pelas próprias mulheres. Eurípedes é famoso por sua misoginia.
A grande diferença de Racine é justamente superar essa visão misógina. A misoginia presente nos textos grego e latino desaparece em Racine, autor que criou grandes personagens femininos. Fedra sofre porque é consciente de seu crime; numa sociedade cristã, ela sofre duplamente porque sabe quecomete um pecado.
Molière: a crítica cômica de uma sociedade 
Molière é o grande autor de comédias e, como Shakespeare, era um homem de teatro: tinha sua trupe, era ator e diretor, além de ser o autor das peças que levava. A comédia, ao contrário da tragédia, tem como personagens pessoas comuns, e visa mostrar os costumes, criar tipos, através de uma intriga simples. O esquema narrativo geralmente funciona da seguinte maneira: o pai é contrário ao casamento de sua filha (ou de seu filho) com o escolhido por ela/ele porque ele tem uma mania, que o leva a querer escolher um cônjuge que sirva aos seus desígnios, ou seja, contribua para sua ideia fixa. As comédias de Molière têm, frequentemente, um tom satírico, porque ele visava criticar os costumes da sociedade. Em Tartufo, por exemplo, ele satiriza a hipocrisia na figura do falso devoto, que quer se apoderar da riqueza do homem que se deixa impressionar por sua aparente devoção, acolhe-o em sua casa e pretende lhe dar a filha em casamento. 
	Sátira é uma técnica literária de caráter denunciador e moralizador, utilizada para ridicularizar determinado tema – indivíduos, organizações, estado. O objetivo da sátira é atacar os males da sociedade, o que deu origem à expressão latina: castigat ridendo moris, que se pode traduzir livremente como “castigar os costumes pelo riso”. No Brasil, o poeta barroco Gregório de Matos Guerra é famoso por suas sátiras e, por causa delas, levou o apelido de “boca do inferno”.
Diferente da tragédia, a linguagem da comédia é mais livre, às vezes um pouco vulgar, principalmente nos papéis dos domésticos, que fazem as cenas mais farsescas. Algumas peças de Molière são farsas, ou seja, têm muitas cenas físicas do tipo jogar coisas sobre os outros, cair, dar piruetas, o que se costuma chamar no Brasil de comédia pastelão. 
O teatro clássico tem dois gêneros, a comédia e a tragédia. Especifique cada um deles e dê um exemplo.
	A tragédia era considerada mais nobre, já que seus personagens representavam reis, rainhas, duques, enfim, personalidades de alta estirpe. O autor que melhor representa o ideal clássico da tragédia é Racine porque seus versos alexandrinos são perfeitos, as intrigas são enxutas, os personagens bem delineados. A comédia, ao contrário da tragédia, tem como personagens pessoas comuns e visa mostrar os costumes, criar tipos, através de uma intriga simples. O esquema narrativo geralmente funciona da seguinte maneira: o pai é contrário ao casamento de sua filha (ou de seu filho) com o escolhido por ela/ele porque ele tem uma mania que o leva a querer escolher um cônjuge que sirva aos seus desígnios, ou seja, contribua para sua ideia fixa. Diferentemente da tragédia, a linguagem da comédia é mais livre, às vezes um pouco vulgar, principalmente nos papéis dos domésticos, que fazem as cenas mais farsescas. Molière era ator e diretor, além de ser o autor das peças que levava.

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