Buscar

O DIREITO NA GRÉCIA

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 8 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 8 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

O DIREITO NA GRÉCIA 
A GRÉCIA, BERÇO DO CONHECIMENTO 
Na Grécia, aproximadamente entre os séculos VII e VI a.C., surgiu uma nova forma de compreensão da realidade, qual seja a Filosofia, cujas raízes repousam sobre uma série de fatores. Para alguns autores, os helenos (habitantes de Hellas ou Hélade, como era conhecida a Grécia Antiga) muito aprenderam sobre o mundo e a vida com outros povos, especialmente com aqueles que viviam no oriente e com os quais mantiveram intenso intercâmbio comercial em seu período de maior prosperidade econômica (quando estabeleceram um império marítimo, a partir do grande porto do Pireu). Exportando e importando produtos e ideias, os gregos teriam atingido o apogeu da vida urbana, intelectual e artística, podendo assim dedicar-se ao exercício do pensar e na busca do conhecimento (Aristóteles afirmava que os escravos e as riquezas granjeadas liberavam os gregos das fadigas do trabalho, proporcionando-lhes um ócio indispensável para a vida contemplativa). Doutra parte, é sabido que os gregos herdaram sua cultura de inúmeras civilizações que os precederam no território de Hellas, como os jônios, aqueus e dórios, que a partir da ilha de Creta já praticavam, desde o segundo milênio a.C., comércio marítimo com os povos asiáticos. 
Outrossim, fatores literários, religiosos e sociopolíticos também teriam contribuído para esse raiar filosófico. Enquanto, por exemplo, os poemas épicos de Homero, como a Ilíada e a Odisséia, difundiram a preocupação com causas e razões, logo incorporada ao modo de agir, pensar e viver dos helenos, uma religião destituída de dogmas (verdades incontestáveis impostas aos crentes) possibilitava-lhes, em suas práticas privadas, desenvolver concepções éticas e políticas. Enfim, tudo parecia convergir para que, a partir de um determinado momento, viessem os gregos a adquirir uma espécie de curiosidade sofisticada, verdadeiro amor pelo saber (filosofia), empenhando-se em adquiri-lo. 
O fato é que, como afirmado pelo filósofo Martin Heidegger, “a filosofia fala grego”. “A tradição atribui ao filósofo Pitágoras de Samos (que viveu no século V a.C.) a criação da palavra. Conforme essa tradição, Pitágoras teria criado o termo para modestamente ressaltar que a sabedoria plena e perfeita seria atributo apenas dos deuses; os homens, no entanto, poderiam venerá-la e amá-la na qualidade de filósofos. O termo grego Filosofia (philosophia) é a expressão do amor ao conhecimento e da busca incansável do homem pelo sentido e fundamento de todas as coisas.” 
Nessa mesma linha, reconhece Marilena Chauí que os helenos operaram uma enorme mutação qualitativa sobre a herança recebida de outras civilizações, pois se os egípicios produziram conhecimentos geométricos, deve-se aos gregos a produção da ciência matemática; se babilônios e caldeus produziram conhecimentos sobre o céu e meteoros, aos gregos cabe a criação da astronomia; se várias civilizações obtiveram significativos resultados no que tange às formas de governo, coube aos gregos “inventarem a política”, por meio de práticas públicas para a tomada de decisões, instituições próprias (tribunais, eleições), a lei como expressão da vontade popular, separação do poder civil-militar e a autoridade religiosa etc. Portanto, será pela Grécia Antiga que iniciaremos os nossos estudos, seguindo os principais passos deixados na caminhada histórica da busca da sabedoria, mirando seus autores e concepções (“Introdução à história da filosofia”, vo. 1, da Editora Companhia das Letras). 
Nossa atenção, portanto, agora se dirigirá aos filósofos, ou seja, àqueles que deram vida e viveram a filosofia, porque especialmente dotados do “puro desejo de conhecer e contemplar a verdade”, pois, como sentenciou Aristóteles, “exercer a sabedoria e conhecer são desejáveis pelos homens em si mesmos; com efeito, não é possível viver como homens sem essas coisas”. E sobre esses admiráveis pensadores, lecionam Eduardo C. B. Bittar e Guilherme Assis de Almeida: “A posição do filósofo, portanto, se assemelha à do monge e à da sentinela. Sua distância das coisas se deve ao fato de que, antes de tudo, ante a possibilidade de simplesmente viver naturalizando tudo, detém o compasso das coisas e apresenta como movimento de resistência contra a tendência inata ao convencimento natural de que „as coisas são como são‟, a força do pensamento. Para isso, observa. A arguta observação segue a função de apreensão e compreensão. Dessa forma, ao usar do pensamento como força de compreensão, acaba por agir sobre o mundo, e isto porque, ao utilizar o ferramental da razão, se posta como sentinela e defensor da garantia de que a razão será conservada na vida social como um distintivo fundamental da condição humana”(Curso de Filosofia do Direito). 
OS SETE GRANDES SÁBIOS DA ANTIGA GRÉCIA E SUAS LIÇÕES: 
Tales de Mileto 
• Ter certeza absoluta é precursor da ruína. 
• Evita enriquecer por vias desonestas. 
• Educai as crianças e não será preciso punir os homens. 
Pítaco de Mitilene 
• Não faças o que não gostares que te façam. 
Bias de Priene 
• Aprende a saber ouvir. 
• Reflete nos teus atos. 
Sólon de Atenas 
• Nada em excesso. 
• Procura ser honesto, porque a honestidade é melhor do que uma palavra honrada. 
Cleóbulo de Lindos 
• A sabedoria é preferível à ignorância. 
• Cuidado com a língua. 
Periandro de Corinto 
• Tudo deve ser estudado com cuidado. 
Quílon de Lacedemonia 
• Conhece-te a ti mesmo. 
• Põe a razão antes da língua. 
O VALOR DA FILOSOFIA: “O valor da filosofia, na realidade, deve ser buscado, em grande medida, na sua própria incerteza. O homem que não tem umas tintas de filosofia caminha pela vida afora preso a preconceitos derivados do senso comum, das crenças habituais de sua época e do seu país, e das convicções que cresceram no seu espírito sem a cooperação ou o consentimento de uma razão deliberada. Para tal homem o mundo tende a tornar-se finito, definido, óbvio; para ele os objetos habituais não levantam problemas e as possibilidades infamiliares são desdenhosamente rejeitadas. Quando começamos a filosofar, pelo contrário, imediatamente nos damos conta (...) de que até as coisas mais ordinárias conduzem a problemas para os quais somente respostas muito incompletas podem ser dadas. A filosofia, apesar de incapaz de nos dizer com certeza qual é a verdadeira resposta para as dúvidas que ela própria levanta, é capaz de sugerir numerosas possibilidades que ampliam nossos pensamentos, livrando-os da tirania do hábito. Desta maneira, embora diminua nosso sentimento de certeza com relação ao que as coisas são, aumenta em muito nosso conhecimento a respeito do que as coisas podem ser; ela remove o dogmatismo um tanto arrogante daqueles que nunca chegaram a empreender viagens nas regiões da dúvida libertadora; e vivifica nosso sentimento de admiração, ao mostrar as coisas familiares num determinado aspecto não familiar”. (RUSSELL, Bertrant. Os Problemas da Filosofia, Capítulo XV) 
A FILOSOFIA DO DIREITO: Finalmente, e agora mirando especificamente o nosso curso, esclarecemos com André Gualtieri de Oliveira: “Ora, se filosofar consiste nessa preocupação com as causas primeiras, o filosofar sobre o direito seguirá os mesmos objetivos. Nesse sentido, a filosofia do direito implica, então, indagar-se a respeito daqueles elementos que constituem o que há de fundamental para a compreensão do fenômeno jurídico. As perguntas que daí surgem e que nos permitem identificar duas questões fundamentais que a filosofia do direito busca exclarecer: a) o que é o direito; b) o que é a justiça. ( Filosofia do Direito, Saraiva, p. 16/17). 
AS CONTRIBUIÇÕES GREGAS AO DIREITO 
A GRÉCIA E A LEI DA PÓLIS: Politéiai – Constituições políticas (direito da cidade, direito político do cidadão). 
 Constituição de LICURGO – Político e educador, viveu em Esparta, no séc. VIII a.C.. Suas leis eram transmitidas oralmente e se destinavam a vivificar um Estado militar, avesso ao luxo, à ganância, às liberdades, mas devotado ao rigor,ao amor à pátria e às suas instituições, à homenagem aos mais velhos e veneração das coisas sagradas e das tradições de seu povo. Nela, o comércio não era prestigiado, assim como outras atividades (artes e filosofia, por exemplo) que não serviriam ao seus fins militaristas. 
 Código de DRÁCON – Elaborado em Atenas, em 621 a.C. as leis por escrito, para por fim à luta entre as famílias mais poderosas da cidade. Drácon era eupátrida (integrante da classe dirigente, uma espécie de nobreza), instruído no direito religioso, tendo se limitado a registrar por escrito os antigos costumes, sem qualquer inovação. Suas leis ganharam a fama de cruéis, mormente porque as gerações futuras contaram com normas bem mais flexíveis e humanizadas. De fato, o roubo, e.g., era punido com a morte, pois ofendia aos deuses que tornaram a propriedade sagrada. 
 Código de SÓLON – aboliu as leis draconianas (Atenas, 594 a.C.).Empreendeu uma verdadeira revolução social. As leis passaram a ser as mesmas para todos, eis que todos passaram a ser considerados iguais (abolição de privilégios de classe). Esse Código abrandou as penas, humanizando-as, chegando a perdoar as dívidas dos miseráveis. Introduziu o regime democrático. Foi tão duradouro que, quatro séculos depois, os meninos ainda eram obrigados a decorá-lo 
 Constituição de CLÍSTINES – Atenas, 509 a.C.. Seu objetivo era criar um Estado baseado na igualdade política e na participação de todos os cidadãos no governo. Mas foi a assembléia dos cidadãos (excluídos mulheres, estrangeiros e escravos), a Eclésia, organizada definitivamente no governo de Sólon, que se tomou o órgão central da democracia ateniense. Nela, eram discutidos praticamente todos os assuntos de Estado, civis e militares. Com a Constituição elaborada por Clístenes, todo cidadão, independentemente da renda, podia ocupar qualquer cargo público, o que acabou por derrubar o Estado oligárquico. Instituiu o sistema onde cada cidadão tinha como segundo nome não mais o apelido de família, mas sim de seu demos (povo), contribuindo, no plano da igualdade, para o fim das hierarquias sociais. Ainda assim, Clístenes instituiu o OSTRACISMO, por meio do qual todo cidadão suspeito de atentar contra a segurança do Estado era desterrado, por decisão da Eclésia, durante dez anos. 
OS SOFISTAS: Contemporâneos a Sócrates, merecem agora os SOFISTAS ( “sábio” ou “especialista do saber”) a nossa atenção. Referimo-nos a um grupo de pensadores e professores – que nunca formaram uma escola ou apresentaram uma unidade de ideias - que mudou o eixo das reflexões sobre o mundo físico e mítico para o plano 
humano, focalizando assuntos como ética, política, religião, arte e educação (“o homem é a medida de todas as coisas”, dizia Protágoras). Do ponto de vista histórico, os sofistas surgiram no momento em que, diante do desenvolvimento tecnológico e científico, a política grega, notadamente em Atenas - que no século V a.C. vivia a sua denominada “idade de ouro” (século de Péricles), consistente numa era de progresso sem precedentes em todas as áreas do domínio humano -, deixava de ser tão centralizada e aristocrática para ganhar ares mais democráticos. Com isso, os helenos iam frequentemente à “agorá” (praça) para debater e decidir os problemas e rumos da polis. Nesse ambiente de ampla liberdade de expressão, a detença do conhecimento e das técnicas de falar se afigurava o caminho certeiro para o sucesso. Dizia Protágoras, o maior dos sofistas, que a retórica (a arte da eloquência, a arte de bem argumentar; arte da palavra) era a todos fundamental para “o cuidado adequado de seus negócios pessoais, para poder administrar melhor a sua casa e família, e também nos negócios do Estado, para se tornar poder real na cidade, quer como orador, quer como homem de ação”. Com vistas a esses desejados efeitos, os gregos recorriam aos sofistas para aprender a arte do discurso e da persuasão. Assim, os mestres conseguiam o sustento por meio de suas lições e os aprendizes tornavam-se capazes de lidar com os novos desafios da vida pública. 
Eduardo C. B. Bittar e Guilherme Assis de Almeida também nos elucidam sobre a presença desses pensadores no mundo do Direito: “A praça pública (agorá), povoada por homens dotados de técnica (techné) de utilização das palavras, funcionava como oficina de intelectualidade em sua expressão oralizada. Além da praça pública, a muitos interessava o domínio da linguagem (pense-se que os discursos forenses eram encomendados a homens que se incumbiam de escrevê-los para serem lidos perante os juízes – este é o trabalho dos logógraphoi) para estar diante da tribuna, perante os magistrados. As palavras tornaram-se o elemento primordial para a definição do justo e do injusto. A técnica (techné) argumentativa faculta ao orador, por mais difícil que seja a sua causa jurídica, suplantar as barreiras dos preconceitos sobre justo e injusto e demonstrar aquilo que aos olhos vulgares não é imediatamente visível. As experiências jurídicas, nesse contexto, aproximam-se do casuísmo relativista que só pode definir justiça e injustiça diante da análise de uma situação concreta, de sua ocorrência efetiva, de sua apreciação imediata. Isso favorece o desenvolvimento do discurso judiciário, pois, conquanto que bem articulado, pela força da expressão oral, e bem defendido perante os magistrados, o efeito a ser produzido pode favorecer aquele que deseja por ele ver-se beneficiado” (op. Cit., p. 94). Esclarecem ainda esses autores que os sofistas opunham a lei humana às leis da natureza, pois a atividade legislativa somente poderia ser realizada por homens, aos quais, nesse passo, exclusivamente cabia determinar o que era justo e o que era injusto. Contudo, diante desse antagonismo, apontavam a lei humana como artificial, exatamente por desdizer a lei natural, onde vigia a prevalência do mais forte. 
Passaram os sofistas para a história, porém, com uma visão bastante negativa, justamente devido aos relatos de Platão e Aristóteles, que ecoando as palavras de Sócrates recriminavam algumas posturas que os caracterizaram, especialmente a promoção de um comércio educacional, onde deixavam de lado a busca pelo conhecimento e pela verdade para simplesmente ensinar seus clientes a discursar, ou seja, a usar todo tipo de lógica falaciosa, articulada por belas palavras e gestos impressionantes, a fim de convencer seus interlocutores sobre qualquer coisa (algo que, na realidade, perfaria até mesmo a arte de enganar). Não ensinavam doutrinas, mas sim técnicas para convencer e sobrepujar os demais em debates e duelos verbais. Tratavam-se, portanto, de falsos sábios, na exata medida em que nada sabiam, intencionando “somente contraditar a tudo e a todos, criar disputas, fomentar debates inócuos e vazios de sentido” (ibidem, p. 91). Outra severa censura que os alcançava residia na já mencionada “relativização da justiça”. De fato, concebiam que o Direito deveria expressar “aquilo que favorece o mais forte”, ou nas palavras de Trasímaco: “A justiça é na realidade um bem de outrem; é uma vantagem para quem manda e um dano para quem obedece” (ibidem, p., 96). 
ARISTÓTELES E A JUSTIÇA 
Nasceu em Estagira ou Estagiros (atual Stavros) em 384 ou 385 a.C. e morreu em Cálcis, na Ilha de Eubéia, em 322 a.C.. Em Atenas tornou-se discípulo de Platão, frequentando a Academia. Mais tarde, afastando-se do mestre, fundou a sua própria escola, denominada Liceu (dado à sua proximidade com o templo dedicado a Apolo Lício). 
Como Platão, de quem foi discípulo, propunha uma moral para a felicidade (eudaimonía), cuja busca, entretanto, considerando o fato de que os homens/mulheres são seres complexos, passava necessariamente pela necessidade de conquista de vários bens, como amizade, saúde, e até mesmo de alguma riqueza. Sem um certo conjunto de bens, não há a felicidade humana. Porém, institui uma certa escala ou hierarquia de bens, onde o pensamento desponta como o elemento divino do homem e o bem mais precioso. Em sua “Ética a Eudemo”, Aristótelesfixa o culto e a contemplação do divino como a finalidade da vida humana, como a nossa norma mais segura de conduta. Em “Ética a Nicômaco”, aborda as coisas mais relativas e também necessárias. Assim, por exemplo, reconhece que o prazer, negado por Platão, não é um bem absoluto, mas também não é um mal em si mesmo, pois acompanha as diferentes atividades humanas, mesmo as intelectuais e espirituais. Todavia, insiste que os verdadeiros prazeres do homem são as ações conforme a virtude, cuja prática é o único caminho para a conquista da real felicidade (alcançável apenas mediante a contemplação da verdade e na adesão a ela). Aristóteles estimula, pois, os homens à deliberação e ao esforço em busca dos bons hábitos, apresentando a virtude como uma espécie de segunda natureza humana, adquirida pela razão livre e por esse esforço consciente. 
Bittar nos esclarece que dentre as várias virtudes humanas (coragem, temperança, liberalidade, benevolência, magnificência, respeito próprio, gentileza, agudeza de espírito, amizade, modéstia, justa apreciação e justa indignação), Aristóteles destaca a justiça, daí ponde em evidência a necessidade do homem buscar conhecer o que é justo e o que é injusto, o que é ser corajoso, o que é ser arrogante, o que é ser bom e o que é ser mau etc.. Contudo, não basta ao 
homem apenas deter esse conhecimento (como entrevia Sócrates), mas sim esforçar-se para colocá-lo em prática e assim viver eticamente (virtuosamente). O estudo da justiça tem por tarefa, ainda nesse plano, “traçar as normas suficientes e adequadas para orientar as atividades da pólis, e dos sujeitos que a compõe, para a realização palpável dos sujeitos que a compõe, para a realização palpável do Bem Comum” (op. cit., p. 126). 
Importa esclarecer que para o filósofo, assim como já nos apresentou o Prof. Goffredo Telles Júnior em sua “Saudação”, a polis é o habitat do ser humano, o qual, portanto, somente pode viver agindo e interagindo em seu interior: “§ 9. Fica evidente, portanto, que a cidade participa das coisas da natureza, que o homem é um animal político, por natureza, que deve viver em sociedade, e que aquele que, por instinto e não por, inibição de qualquer circunstância, deixa de participar de uma cidade, é um ser vil ou superior ao homem. Esse indivíduo é merecedor, segundo Homero, da cruel censura de um sem-família, sem leis, sem lar. Pois ele tem sede de combates e, como as aves rapinantes, não é capaz de se submeter a nenhuma obediência. § 10. De modo muito claro entende-se a razão de ser o homem um animal sociável em grau mais alto do que as abelhas e os outros animais todos que vivem reunidos. A natureza, afirmamos, nenhuma coisa realiza em vão. Somente o homem, entre todos os animais, possui o dom da palavra; a voz indica dor e o prazer, e por essa razão é que ela foi outorgada aos outros animais. Eles chegam a sentir sensações de dor e de prazer, e fazerem-se entender entre si. A palavra, contudo, tem a finalidade de fazer entender o que é útil ou prejudicial, e, consequentemente, o que é justo e o injusto. O que, especificamente, diferencia o homem é que ele sabe distinguir o bem do mal, o justo do que não o é, e assim todos os sentimentos dessa ordem cuja comunicação forma exatamente a família do Estado. § 11. Na ordem natural, o Estado antepõe-se à família e a cada indivíduo, visto que o todo deve, obrigatoriamente, ser posto antes da parte. Levantai o todo: dele nao restara nem pé nem mão senão no nome, como se poderá afirmar, por exemplo, que a mão separada do corpo não será mão senão pelo nome. Todas as coisas são definidas pelas suas funções; e desde o instante em que elas venham a perder os seus característicos, não mais se poderá afirmar que são as mesmas; somente ficam entendidas sob a mesma denominação. De maneira evidente, o Estado está na ordem da natureza e antecede ao indivíduo; pois, se cada indivíduo por si a si mesmo não é suficiente, o mesmo modo acontecerá com as partes em relação ao todo. Ora, o que não consegue viver em sociedade, ou que não necessita de nada porque se basta a si mesmo, não participa do Estado; é um bruto ou uma divindade. A natureza faz assim com que todos os homens se associem. Ao que primeiro estabeleceu essa fórmula se deve o bem maior; pois se o homem, chegado à sua perfeição, é o mais excelente dos animais, também é o pior quando vive isolado, sem leis e sem preconceitos. Tremenda calamidade constitui-se a injustiça com armas na mão. As armas que a natureza fornece ao homem são a prudência e a virtude. Não possuindo a virtude, torna-se o mais ímpio e o mais feroz de todos os entes vivos; não sabe, para sua vergonha, mais do que amar e comer. A justiça constitui a base da sociedade. Dá-se o nome de julgamento à aplicação do que é justo.” (Política. Trad. Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2001, p. 14/15). 
Cabe à lei da pólis prescrever comportamentos capazes de promover o bem de todos os seus integrantes. Assim sendo, é função do político, exercitando a prudência (capacidade de encontrar os meios adequados a se chegar ao fim desejado), elaborar uma legislação que leve necessariamente à justiça, ou seja, que conduza todos os cidadãos, na sua obediência, à vivência e convivência virtuosa, realizadora, como posto acima, do Bem Comum. “Aquele que contraria as leis contraria a todos que são por ela protegidos e beneficiados; aqueloe que as acata, serve a todos que por elas são protegidos ou beneficiados” (Bittar, ibidem, p. 131). 
Não fosse só isso, Aristóteles assegurava que a felicidade somente seria alcançada pelo exercício das virtudes – que concebia em dois grupos: duanoéticas (intelectuais) e éticas (morais) -, devendo, também por essa razão, esmerar-se para o cumprimento das leis da cidade. A ética, como antes mencionado, exige do cidadão a persistência das condutas virtuosas, criando-se um saudável hábito (ethos, em grego). “Aqui o importante é a reiteração da prática virtuosa; nesse sentido, ser justo é praticar reiteradamente atos voluntários de justiça. Está-se, destarte, a recorrer, novamente, ao capital valor da educação (paideia) como bem maior de todo Estado” (Bittar, ibidem, p.128). 
Emenda Sacadura Rocha: “Sócrates dizia que a violência era produto da ignorância. Obviamente que, sem instrução, a opção ética por práticas em prol da vida coletiva – política – pode estar algo prejudicada. No entanto, existem pessoas, sempre existiram e existirão, com pouca ou nenhuma instrução que são exemplo de decência e retidão e acolhem dentro de si um amor desvelado aos homens. Da mesma forma, infelizmente, mais do que o desejado entre os homens de hoje, o conhecimento é usado para o „mal‟, para propósitos egoístas e personalíssimos em detrimento mesmo da coletividade. Estes últimos, claro, com relação ao pensamento de Aristóteles, são os piores malfeitores. Ainda assim, a educação é vista aqui como fundante da possibilidade de que os homens, quando adultos, possam querer fazer a opção pelo bem geral e politicamente ser ativistas do bem-estar coletivo. Por esse motivo, Aristóteles funda o Liceu, ensino público, e conclama todos os governantes a abrirem escolas públicas em suas cidades-estados. Acreditava que uma formação que fosse além da simples instrução, portanto, uma formação voltada para a cultura da política com ética, criaria o hábito de viver para criar o bem-estar entre todos os homens, e levaria a possibilidades maiores de opções individuais pela ética e decência. É neste sentido que se pode falar de Educação Sentimental, uma educação/formação voltada para a relação política com os outros objetivando o bem-estar de todos e a paz social.” (op. cit., p. 56/57). E mais: “Cidadão para Aristóteles não é aquele que só fala mal dos governantes ou cobra direitos; ele tem consciência do papel de construir a cidadania ou, dito de outra forma, de cumprir seus deveres.” (ibidem, p. 58). 
TEORIA DA JUSTIÇA. Aristóteles desenvolveu o tema justiça especialmente encontra-se no livro V da obra “Ética à Nicômaco”. Para o filósofo, como jávisto, a justiça pressupõe uma vida virtuosa, caminho para a felicidade. Concebida intelectualmente, deve ser exercitada no cotidiano, como fruto de muito determinação e esforço, tornando-se um hábito (ethos). Outrossim, não pode ser vivida senão na pólis, mediante o cumprimento de suas leis, numa relação de alteridade. Contudo, apresenta diversos tipos de justiça, como adiante identificado: Divide a justiça em dois grupos: 
 JUSTIÇA GERAL (ou total ou coletiva), correspondente à observância da lei, objetivando a realização do bem comum. Como justiça legal, abrangia o respeito não somente ao ordenamento jurídico positivo (escrito e imposto na forma de leis), mas principalmente as leis não escritas, universais e não derrogáveis do Direito Natural. Para 
Aristóteles, as leis civis são uma garantia contra a injustiça, mas elas não tem poder para fazer os indivíduos justos e bons. "Da justiça política, uma parte é natural, a outra é legal. A natural tem em qualquer lugar a mesma eficácia, e não depende das nossas opiniões; a legal é, em sua origem, indiferente que se faça assim ou de outro modo; mas, uma vez estabelecida, deixa de ser indiferente” (Cap. 7, Livro V, Ética a Nicômaco). 
 JUSTIÇA PARTICULAR, que se reporta às relações concretas entre os indivíduos, vividas e arbitradas pelas leis da cidade. Essa é o objeto próprio do Direito, da ciência jurídica. tem por objetivo realizar a igualdade entre o sujeito que age e o sujeito que sofre a ação. Esta se divide em: 
 Justiça distributiva: consiste na distribuição ou repartição de bens e honraria segundo os méritos e necessidades de cada um. Cabe ao governo da cidade promover a “proporcionalidade”, fazendo com que cada cidadão concorra na exata proporção de suas posses e forças para o bem-estar geral. Daí a instituição de deveres e direitos diferentes, na medida das possibilidades de cada um. 
 Justiça corretiva (ou sinalagmática ou equiparadora): visa a correção das relações entre os indivíduos. Nesta forma de justiça, surge a necessidade da intervenção de uma terceira pessoa, responsável pela aplicação da lei, a quem caberá decidir sobre os litígios. À sua vez subdivide-se em: 
 Justiça comutativa: que preside os contratos em geral: compra e venda, locação, empréstimo, etc. Esse tipo de justiça é essencialmente preventiva, uma vez que a justiça prévia iguala as prestações recíprocas antes mesmo de uma eventual transação. 
 Justiça reparativa (ou judicial): visa reprimir a injustiça cometida, a reparar ou indenizar o dano, estabelecendo, se for o caso, a punição. Abrange, assim, as controvérsias civis (relações voluntárias) e os casos criminais (relações involuntárias). 
Aristóteles argumentava que num mundo onde a maioria dos indivíduos se encontra submetida às paixões, é preciso conceber uma polis dotada de leis justas. Para isso, é necessário estudar a ciência da legislação, que perfaz parte da Política. Assim, assegurava, que é melhor ser governado por leis do que por excelentes governantes, porque as leis não estão sujeitas as paixões, enquanto que os homens, por mais excelentes que sejam, não estão livres delas e dos desacertos que provocam. Por fim, visando atenuar o excessivo rigor da justiça, o filósofo propôs, quando da aplicação da lei a uma causa concreta, que o julgador se utilizasse da equidade (epieikéia), como ferramenta indispensável a “adaptar a lei a cada caso particular e temperar-lhe o rigor com a adequação” (Flamarion, op. cit., p. 74). A equidade passou a traduzir, desde então, um julgamento reto, honesto, imparcial e justo. 
JUSTIÇA POLÍTICA: Comentando a classificação elaborada por Aristóteles, Chauí pondera: “Que é justiça? A igualdade entre os iguais e a desigualdade entre os desiguais. A justiça política consiste em duas ações principais: igualar os desiguais, ou seja, criar os iguais; e determinar que o tratamento desigual dos desiguais é justo. Essas duas ações são realizadas por duas formas de justiça: a justiça principal ou fundante, que é a justiça distributiva; e a justiça secundária, que é a justiça comutativa.” (op. cit., p. 470). Depois conclui: “A Cidade justa, portanto, é aquela que preenche quatro condições: 1) quem governa o faz para todos e com vistas ao bem de todos; 2) todos os cidadãos (um só, alguns, a massa) possuem o mesmo poder; 3) a justiça distributiva é praticada baseada nos bens da economia e dos valores morais e intelectuais da cidade; 4) a justiça comutativa é exercida como remédio legal e legítimo para corrigir injustiças.” (ibidem, p. 471).

Continue navegando