Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ESCOLA: INTERDISCIPLINARIDADE, SUSTENTABILIDADE E CIDADANIA ADJANE DE ARAÚJO MACHADO 1 Resumo: O artigo propõe discutir a temática da educação ambiental no contexto escolar, a partir da perspectiva crítica e reflexiva, a fim de mostrar como a educação ambiental pode ser trabalhada de forma interdisciplinar para a sustentabilidade e o exercício da cidadania. Como estudo empírico, o artigo enfoca o relato da experiência de práticas pedagógicas de EA desenvolvidas na Escola Estadual de Ensino Médio Integral Presidente Médici, localizada em João Pessoa/PB. Revela-se que a educação ambiental representa uma estratégia significativa para mudança de valores sociais e ambientais mais efetivos. Palavras-chave: Educação ambiental; interdisciplinaridade; cidadania. INTRODUÇÃO Os relatos a respeito de práticas, experiências e projetos de educação ambiental - EA na escola, atualmente envolvem diferentes propostas metodológicas que permitem compreender a EA para além dos conceitos, discursos e teorias, a exemplo dos projetos de Menezes e Martins (2012) e Grohe e Corrêa (2012). Tais pesquisas oferecem resultados que possibilitam entender como a educação ambiental, sobretudo, se trabalhada na perspectiva crítica e reflexiva, apresenta-se como uma estratégia para a formação de cidadãos conscientes e responsáveis com o meio ambiente a partir dos seus diversos elementos – sociais, ecológicos, culturais, econômicos e políticos. Apesar disso, a EA ainda não está presente efetivamente nos espaços escolares, muitas vezes, devido o predomínio do modelo pedagógico tradicional, o baixo estímulo dos professores na adoção de princípios e práticas interdisciplinares, e a ocorrência de projetos pontuais e descontínuos, que alcançam soluções técnicas e não políticas (GROHE e CORRÊA, 2012; REBOUÇAS, 2012). Contudo, o cenário de crise ambiental que marca o mundo contemporâneo, cada vez mais, chama atenção para a transformação do padrão civilizatório baseado na valorização de princípios políticos e econômicos, que colocam em segundo plano a manutenção da vida no planeta. Essa questão desperta para a necessidade de um modelo de desenvolvimento sustentável capaz de garantir o equilíbrio dos ecossistemas e a manutenção dos recursos necessários à sobrevivência humana. E a educação ambiental, *Turismóloga, Mestra em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Professora da Escola Estadual de Ensino Médio Integral Presidente Médici. E-mail: adjanearaujo@gmail.com nesse contexto, vem se constituindo num processo didático e pedagógico que permite refletir esse período de crise e promover conhecimentos, valores e atitudes para o alcance de um meio ambiente mais sustentável (PELICIONI e PHILIPPI JR., 2005). Para tanto, torna-se importante despertar a concepção crítica dos problemas ambientais, a fim de politizar para o entendimento dessa crise ecológica entrelaçada com a atual crise e revolução social, econômica, política, cultural e tecnologia (CARVALHO, 2011). Assim como explicam Acselrad (1992) e Rebouças (2012), pensar na questão do lixo questionando os padrões de consumo da sociedade, discutir a relação da destruição da camada de ozônio com os direitos humanos, entender os impactos do efeito estufa numa sociedade de desigualdades sociais, e entender que cada agressão ambiental representa um desrespeito ao meio ambiente e a coletividade. A proposta desse artigo dialoga nessa perspectiva e enfoca as experiências de educação ambiental desenvolvidas na Escola Estadual de Ensino Médio Integral Presidente Médici, localizada em João Pessoa/Paraíba. A escola, além do ensino médio, oferece os cursos de formação profissional em Hotelaria, Eventos, Serviço de Restaurante e Bar e Informática, e em função das aulas, dos projetos e dos trabalhos das diversas disciplinas, acaba se tornando um segundo lar para os alunos, que são estimulados a diversas práticas pedagógicas na obtenção e disseminação de conhecimentos. Por essa característica, a presença da educação ambiental na escola precisa ser continuadamente estimulada nas diversas ciências, estudos e pensamentos. Sendo esse o motivo maior deste artigo, que aborda práticas de EA interdisciplinadas com conteúdos teóricos específicos de três cursos técnicos oferecidos na escola. MEIO AMBIENTE E SOCIEDADE: o viés da educação ambiental A questão ambiental tem se tornado um tema frequente nos meios midiáticos, acadêmicos e políticos, como uma problemática existente entre a sociedade moderna – capitalista e industrial – e suas relações com a natureza, sobretudo, diante de fatores como urbanização, aumento populacional, limites dos recursos naturais, poluição dos rios, desmatamento, mudanças climáticas, entre outros. A tradicional visão naturalista que tende a interpretar o meio ambiente apenas do ponto de vista ecológico, segundo Carvalho (2011), durante anos disseminou vertentes conservadoras de proteção ambiental de modo radical e restrito. Entretanto, o entendimento moderno que o homem faz parte do meio ambiente – por relação direta de dependência – e que os problemas ambientais não se restringem aos fatores ecológicos, pois são produtos também dos fatores sociais, históricos, políticos, culturais e econômicos, deslocou a perspectiva ambiental dessa visão científica conservadora e focou discussão na necessidade de harmonizar as interações sociais e as dinâmicas da natureza (ACSELRAD, 1992; CARVALHO, 2011). Tal entendimento despertou a necessidade global em construir uma nova ética planetária, que promova mudanças de comportamento e consciência ecológica crítica para fortalecer visões sobre meio ambiente, sociedade e desenvolvimento (CARVALHO, 2011; REBOUÇAS, 2012). Essa ética, pautada na ideia de desenvolvimento sustentável, de acordo com Guimarães (2001), deve ser guiada tanto na sustentabilidade do acesso e uso dos recursos naturais, quanto na redução da pobreza e das desigualdades sociais; tanto na preservação dos diversos ecossistemas, quanto no respeito à dignidade humana, promovendo justiça e equidade, conservando práticas e símbolos de identidade – gênero, religiosidade, dimensões estéticas e espirituais – e promovendo a democracia para garantir o acesso e a participação de todos nas decisões de ordem política. Nesse complexo cenário, de crise ambiental contemporânea e necessidade de consciência planetária, a educação ambiental se torna um lócus para promover o intercâmbio de informações e mediar experiências que busquem harmonizar as relações entre sociedade e natureza (REBOUÇAS, 2012). Segundo Lipai et. al. (2007) a definição da EA, no artigo da Lei n o 9.795/99 2 , é dada como um processo por meio do qual os indivíduos constroem valores sociais, conhecimentos e atitudes voltadas para preservação e conservação do meio ambiente, essencial à sadia qualidade de vida de todos os seres vivos e a sustentabilidade. Para tanto, conforme Pelicioni e Philippi Jr. (2005), a proposta educativa deve propor uma reflexão crítica de ação transformadora do atual sistema da sociedade moderna, para viabilizar um desenvolvimento a partir de valores éticos, de justiça social e solidariedade ambiental. Conforme Carvalho (2011), a EA dialogando no campo político, econômico, social, cultural e educacional – de tradições, teorias e saberes –, promove mudança de práticas e consciência ambiental como algo que integra a formação de cidadãos, pois contribui na formação de sujeitos ecológicos críticos que interpretam o mundo a partir do entendimento de si e de suas relações com os outros. Esse processo,segundo a autora, acontece como parte da ação humana em transformar a natureza em cultura e no sentido de compreender o papel do indivíduo no meio ambiente. Para tanto se faz necessário refletir e questionar a ordem social vigente, baseada no sistema econômico 2 A Lei dispõe sobre a Educação Ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências (Ver: PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Lei no 9.795 de 27 de Abril de 1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9795.htm> Acesso em: 16 de Jun. de 2014). capitalista e de consumo, que promove desigualdades sociais, degradação dos recursos naturais e a racionalidade que desvincula o homem da natureza (CARVALHO, 2006). A compreensão sobre cidadania, ligada à noção de justiça e igualdade, no sentido de direitos e deveres humanos perante a sociedade, conforme Acselrad (1992), no âmbito da atual crise ambiental, vem incluindo como direito dos cidadãos o acesso justo aos bens coletivos – tais como água e ar – essenciais para as condições adequadas de existência, a igualdade na distribuição dos custos ambientais do desenvolvimento, e a solidariedade no respeito e na conservação da biodiversidade dos ecossistemas. Segundo o autor, sendo o meio ambiente um bem coletivo, uma ação de degradação dos recursos realizada por um, afeta o usufruto e a saúde dos outros, bem como, as práticas de preservação da natureza iniciada por um indivíduo contribui para a qualidade de vida da coletividade (ACSELRAD, 1992). Nesse contexto, e na busca da mediação desses valores, a escola se torna, então, um espaço privilegiado para possibilitar parte das transformações necessárias à construção de uma sociedade igualitária que respeite a diversidade nos diversos sistemas ecológicos e sociais (REBOUÇAS, 2012). Por esse motivo, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB inclui a Lei n o 9.795/99, determinando que a EA seja um processo educativo presente, de forma articulada e contínua, em todas as áreas de conhecimento, componentes curriculares, e atividades escolares e acadêmicas (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2012). Assim como, propõe que EA não seja uma disciplina específica, já que o principal objetivo é a formação humana para plena prática social de valores, cuidado, respeito, ética e justiça ambiental, isto é, a preparação do indivíduo para o exercício da cidadania (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2012; LIPAI et. al., 2007). EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ESCOLA: entre os discursos e as práticas A reunião da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento em 1987, apresentando o conceito e as ideias de desenvolvimento sustentável, e a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro em 1992, questionando os padrões modernos de produção e consumo da sociedade, representam marcos importantes na discussão da necessidade de estimular ações de educação ambiental, para efetivar as vias de transição de um modelo de desenvolvimento mais sustentável (REBOUÇAS, 2012). No contexto escolar, entretanto, a concepção conservadora de tratar a questão ambiental apenas do ponto de vista ecológico, também possui relações com as identidades da educação ambiental, pois a tendência das ações de EA atuando na transmissão de conhecimentos para preocupação apenas com o verde, as florestas e os animais, representaram as principais práticas nas escolas (REBOUÇAS, 2012). Tais experiências além de proporcionarem uma visão fragmentada da realidade, possibilitavam a incorporação da EA na educação baseada no sistema capitalista e hegemônico da sociedade, insustentável, sem promover valores que estimulassem a transformação do modelo de desenvolvimento (REBOUÇAS, 2012). Desse contexto, surgiu a necessidade de trabalhar a educação ambiental crítica, na qual discentes e docentes refletem a questão ambiental contextualizada a partir da realidade social, econômica, política e cultural, e incorporando as consequências do modelo de desenvolvimento na natureza e na sociedade (CARVALHO, 2006). Esse processo reflexivo, no entanto, de acordo com Jacobi (2005) envolve alguns desafios, uma vez que a vertente crítica da EA perpassa instrumentos que promovam a politização da problemática ambiental, inserida no macrossistema social e subordinada ao contexto de desenvolvimento existente. Nesse sentido, segundo o autor, sua ação prática deve lidar com conexões de diferentes dimensões humanas e possibilitar entrelaçamento com múltiplos saberes, o que indica, portanto, pensar a educação interdisciplinar para a cidadania ambiental. “O principal eixo de atuação deve buscar, acima de tudo, a solidariedade, a igualdade e o respeito à diferença por meio de formas democráticas de atuação baseadas em práticas interativas e dialógicas” (JACOBI, 2005, p. 243). A escola, por estar inserida nesse contexto, e por ser a cidadania uma das principais funções políticas da educação (TORALES, 2013), assume papel importante para promover consciência, sensibilidades e atitudes socioambientais responsáveis. Segundo Torales (2013) isso não quer dizer que a escola deve se tornar a única instância responsável pela educação, mas por ser uma das instituições, que durante um período contínuo e extenso na vida das pessoas, desenvolve uma prática educativa planejada e sistematizada, deve assumir o compromisso de potencializar a dimensão ambiental na formação dos alunos. A atuação dos professores na busca por pontes de conexão para o debate do assunto, também assume significativa relevância na formação e sensibilização de diversas gerações de estudantes (TORALES, 2013). Contudo, a adoção de metodologias e práticas pedagógicas interdisciplinares e multidisciplinares para mediação dos saberes ambientais na escola, além de complexa, ainda é pouco utilizada. Apesar disso, muitas experiências atualmente são compartilhadas no sentido de contribuir na construção desse processo de ensino. Menezes e Martins (2012), por exemplo, expõe os resultados de um projeto de educação ambiental desenvolvido numa escola de ensino fundamental, no qual a perspectiva reflexiva foi estimulada através do enfoque do meio ambiente a partir das relações de interdependência da natureza que envolve todos os seres vivos do planeta. O trabalho pedagógico envolveu questões do cotidiano das crianças, práticas no entorno da escola e observação da realidade ambiental, rompendo a tradicional dicotomia entre escola e comunidade (MENEZES e MARTINS, 2012). Grohe e Corrêa (2012) também apresentam resultados de um projeto do de EA desenvolvido numa escola pública de ensino fundamental, através método reflexão-ação-reflexão, para romper com práticas alicerçadas no paradigma simplificado e reducionista, e, assim, possibilitar ressignificação do espaço escolar e potencializar o sentimento de pertencimento, por meio de práticas de cuidado, proteção e responsabilidade com o meio ambiente. Assim como esses projetos é possível encontra vários outros artigos com a descrição de experiências de EA na escola que, além de referências teóricas, permitem a socialização de métodos que podem viabilizar práticas de educação para o meio ambiente no contexto escolar. No entanto, ainda pode-se identificar em muitas instituições a formação de estudantes no modelo educativo tradicional e disciplinar, compartilhando conhecimentos pontuais e fragmentados da realidade socioambiental (REBOUÇAS, 2012; TORALES, 2013). Tal questão foi percebida na Escola Estadual de Ensino Médio Integral Presidente Médici, pois, a partir da inserção de conteúdos e/ou comentários informaisque aludiam ao tema meio ambiente, percebeu-se que grande parte dos alunos discutia a questão ambiental a partir do cenário de crise atual, enfocando, exclusivamente, a falta de preservação das florestas e extinção dos animais. Da mesma forma, foi possível observar que alguns alunos – principalmente das turmas do 1o ano – desconheciam o significado do termo sustentabilidade ou nunca ouviram falar sobre o mesmo, de forma que, sentiam um pouco de dificuldades em pronunciar a palavra. Esse contexto comprovou a possibilidade desses alunos terem concluído o ensino fundamental, sem a obtenção de conhecimentos que, de um lado despertasse para uma visão mais abrangente da realidade ambiental, de outro disseminasse conceitos de termos já habitual em discursos políticos, midiáticos e acadêmicos. Diante dessas questões, surgiu a importância de educar ambientalmente os alunos para os fatores – sociais, econômicos, políticos, culturais e ecológicos – envolvidos na perspectiva ambiental, através de um processo de educação que privilegie a disseminação teórica de conceitos e a reflexão crítica da realidade para a prática de ações que introduzam princípios de cidadania: direitos e deveres compartilhados no acesso à natureza e na preservação do meio ambiente (ACSREALD, 1992). INTERDISCIPLINARIDADE NAS PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ESCOLA No intuito de promover um diálogo interdisciplinar, que possibilite mostrar que EA pode ser trabalhada a partir de diferentes campos de conhecimento, as atividades desenvolvidas na Escola Presidente Médici tiveram o objetivo de definir estratégias que levassem a uma melhoria das condições da escola, a partir do entendimento do impacto da ação humana no meio ambiente e a influência do meio ambiente na saúde humana. A proposta focou a reflexão de que toda ação que prejudique a natureza, representa um desrespeito aos direitos ambientais dos indivíduos e à coletividade (ACSREALD, 1992). As ações foram desenvolvidas com a participação de seis turmas da escola e envolveu aproximadamente 107 alunos. A tabela abaixo demonstra sinteticamente as atividades realizadas. Tabela: Descrição das atividades interdisciplinares de EA na escola. Turma Disciplina Referencial Teórico Atividades Desenvolvidas 1 o A e B de Eventos Segurança e Higiene no Trabalho - SHT Riscos e fatores de riscos ambientais: físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e de acidentes. Educação Sanitária: diagnóstico ambiental da escola. Campanha educativa de combate a dengue; Realização do Mutirão de limpeza contra a dengue. 2 o de Eventos Decoração em eventos - DE Decoração e reciclagem na organização de eventos. Consumo Consciente: reciclagem 1 o e C de Hotelaria Meios de Hospedagem - MH Turismo, meio ambiente e sustentabilidade: novas práticas para os meios de hospedagem. Educação ecológica: preservação da biodiversidade. 3 o de Serviço de Restaurante e Nutrição e Dietética - ND Alimentação, saúde e meio ambiente: Educação Alimentar: alimentos naturais versus Bar. segurança alimentar e sustentabilidade. alimentos industrializados Fonte: MACHADO, 2013. As práticas pedagógicas foram realizadas a partir de aulas expositivas, nas quais os referidos referenciais teóricos foram estudados por meio de leituras de textos para debates em sala de aula, atividades extraclasses e produção de materiais didáticos, tais como cartazes, panfletos, etc. Os materiais utilizados nas atividades não demandaram muitos recursos financeiros, pois foram desenvolvidas com o uso de cartolinas, lápis de cor, tesoura, fita adesiva, cola branca, garrafas pets, papéis variados, entre outros. Para complementar o caráter interdisciplinar, algumas atividades envolveram a parceria de outros professores – das disciplinas de Biologia, Artes e Educação Física – e de um inspetor escolar. EDUCAÇÃO SANITÁRIA: riscos ambientais A partir de um levantamento sistematizado do ambiente interno e externo da escola, o objetivo da educação sanitária foi trabalhar a percepção dos alunos para a identificação e análise de situações de riscos ambientais – químicos, físicos, biológicos, ergonômicos e de acidentes – e dos agentes existentes no meio ambiente que podem interferir na saúde humana. Por riscos ambientais entende-se a possibilidade de ocorrer agravos à saúde pelas condições dos diversos elementos existente na natureza, tais como flora, fauna, solo, água, ar e ação humana – de acordo com sua variabilidade em termos de presença ou ausência (DAGNINO e CARPI JÚNIOR, 2007). Essa influência ambiental na saúde pode ser positiva na medida em que promovem condições que propiciem o bem-estar, mas pode também ser negativa, se contribuir para o aparecimento e permanência de doenças, agravos e/ou lesões traumáticas em grupos populacionais particulares (GEO, 2002). Dagnino e Carpi Júnior (2007) definem risco como a probabilidade de um evento – esperado ou não – se tornar realidade, isto é, um acontecimento, que pode apresentar um “perigo possível” mesmo que relacionado a uma característica natural do meio ambiente. Nesse contexto, as ações desenvolvidas buscaram diagnosticar situações de risco existentes na escola, visando conjuntamente à adoção de medidas para reduzir ou eliminar tais riscos. Primeiramente foram realizadas, sob a orientação da professora, vistorias técnicas na área interna e externa da escola, fazendo uso de caderno de anotação e registro fotográfico, a fim de identificar os principais riscos ambientais que afetam a comunidade escolar. Em seguida os alunos do curso de Eventos produziram um Check list com as informações das vistorias técnicas seguindo a classificação dos tipos de riscos, o grau de gravidade e a priorização dos riscos ambientais existentes. A partir do processo de priorização dos riscos, foi elaborado um diagnóstico ambiental, com o destaque das imagens fotográficas produzidas pelos alunos. O diagnóstico ambiental seguiu a tabela de gravidade representada pelos símbolos, pelas cores correspondentes aos riscos ambientais e traziam o destaque das principais doenças e/ou perigos relacionados. Figura1: Alunos fixando o diagnóstico ambiental no mural da escola. Fonte: Machado, 2013. Dentre os riscos identificados o acúmulo de lixo na área interna da escola e, consequentemente, a diversidade de recipientes com água parada favorecendo a proliferação do vetor da dengue, foi apontado como principal risco biológico existente, que anunciava a solução de medidas imediatas. Daí, os alunos desenvolveram uma campanha educativa, conscientizando a comunidade escolar – alunos, professores e funcionários – para o fato de que a dengue é um risco ambiental biológico, no qual todos têm sua parcela de responsabilidade. A partir de então, mobilizaram para ações de controle, com a realização de um mutirão de limpeza de combate a dengue. O mutirão envolveu a parceria com a professora de biologia e o professor de educação física, além da participação dos demais alunos, professores e funcionários da escola. O evento foi considerado uma iniciativa bastante proveitosa, pois além de solucionar o principal problema existente, dispensou ações da Secretaria de Saúde do Estado e do Centro de Zoonoses – borrifações manuais e nebulização com veículo fumacê – que em anos anteriores precisaram intervir com a eliminação de químicos inseticidas no meio ambiente. Figura 2: Imagens do dia do Mutirão escolar de combate a dengue. Fonte: Machado, 2013.CONSUMO CONSCIENTE: reciclagem Tendo em vista a grande quantidade de resíduos coletados a partir do mutirão escolar, as ações de reciclagem representaram uma importante iniciativa para mostrar aos alunos que a maioria dos objetos podem ser reutilizados, e que apenas o descarte produz o acúmulo de lixo. Nesse sentido, na festa do São João, por exemplo, os alunos do curso de eventos adotaram a tradicional confecção de bandeirinhas e balões a partir de revistas e jornais usados, dispensando a compra de bandeiras de TNT e outros acessórios ornamentativos feitos de plástico. Para o evento “II Festival Gastronômico: sabores da língua”, os alunos confeccionaram cestos de lixo de garrafas pets para a separação do descarte de resíduos orgânicos e inorgânicos. A produção dos cestos foi realizada a partir da coleta de garrafas pets descartadas na escola, e envolveu campanha para arrecadação com outros estudantes, principalmente, aqueles que assistem aula em horário integral, se reúnem para almoçar na escola e acabam dividindo a compra de uma garrafa de refrigerante. Na festa do Halloween os alunos reaproveitaram e reciclaram as sobras do material – cartolinas, isopor e TNT – de outras atividades, referentes a outras disciplinas, desenvolvidas na escola. Vale ressaltar que, trabalhos de decoração, além de financeiramente dispendioso, envolve um grande desperdício de material e, muitas vezes, os alunos dividiam parte dos custos com a decoração dos eventos na escola, nesse contexto, as atividades foram economicamente viável para os alunos e ecologicamente correta para o meio ambiente, o que representou um grande estímulo para novas práticas de reciclagem. Figura 3: Alunos em sala de aula confeccionando os cestos reciclados. Fonte: Machado, 2013. EDUCAÇÃO ECOLÓGICA: plantando uma árvore A etapa da educação ecológica consistiu numa atividade extraclasse em comemoração ao Dia Mundial da Árvore, 21 de Setembro, na qual os alunos do curso de hotelaria plantaram vários tipos de mudas de árvores nas áreas internas da escola. Os alunos foram incentivados à atividade com consciência ecológica, pois aprenderam que o plantio de árvores é essencial para o equilíbrio ambiental, por fornecer alimento, oxigênio, sombra, madeira, água, vida. A temática também foi inserida no contexto do ambiente sócio escolar, pois as mudas foram plantas em áreas estratégicas, tais como o estacionamento para proporcionar mais espaços com áreas de sombra, e próximas às salas de aula no sentido de proporcionar a arborização, tendo em vista que a pouca ventilação, muitas vezes, expõe alunos e professores ao risco físico de temperaturas elevadas, sobretudo no período de verão. Além disso, a atividade levou em consideração que escola possui uma área total de 22 mil metros quadrados, com apenas 3.400 metros de área construída, o que implica a disponibilidade de espaços propícios à expansão de matagal, a atração de animais e ao acúmulo de lixo. Nesse contexto, a ação focou a possibilidade de revitalização de algumas áreas, que podem no futuro oferecer condições adequadas para construir espaços que efetive novas sociabilidades – lazer, jogos, recreação, atividades extraclasses, etc. Os alunos ainda tiveram a experiência de celebrar a natureza, a biodiversidade e a vida, diferente de outras datas comemorativas – como Natal, Dia das Crianças, etc. – que, na maioria das vezes, estão associadas apenas ao consumo de novos produtos e serviços. Vale destacar que, o pai de uma aluna, com bastante solicitude, se envolveu com a atividade e consegui 12 mudas de espécies de árvores diferentes para serem plantadas na escola. Figura 4: Na companhia do inspetor escolar, alunos dão mais vida à área interna da escola. Fonte: Machado, 2013. EDUCAÇÃO ALIMENTAR: alimentos naturais versus alimentos industrializados A educação alimentar amarrou as demais atividades desenvolvidas na escola, pois, a proposta ressaltou a importância dos alimentos naturais saudáveis na saúde humana e na preservação do meio ambiente. A ideia surgiu porque, apesar da escola oferecer merenda regular aos estudantes, grande parte deles optam por fazer o lanche no intervalo a partir de refrigerantes, salgados variados, pipocas, achocolatados, biscoitos recheados, etc. que são comprados na padaria, no mercadinho ou nos vendedores que costumam comercializar esses alimentos na frente da escola. Essa prática é comum também entre os professores e é responsável pelo descarte de uma grande quantidade de embalagens plásticas – muitas vezes nas áreas sociais da escola. Nesse sentido, os alunos desenvolveram uma campanha de educação alimentar, a partir da apresentação dos alimentos naturais X alimentos industrializados. Na mesa dos alimentos naturais, os alunos organizaram bandejas de frutas como melão, banana, laranja, melancia e abacaxi, e na mesa dos alimentos preparados os alunos apresentaram amostra de salgadinho industrializado, batatas fritas, cachorro quente e hambúrguer, que envolveram no cozimento o óleo para fritura, o catchup e a maionese para o molho, carne de hambúrguer e salsichas, além do refrigerante para acompanhar a refeição. A partir da exposição dos alimentos, os alunos explicaram as propriedades nutricionais existente nas frutas – tais como fibras, vitaminas, sais minerais, açúcares, etc.– essenciais para saúde e bem estar, e ressaltaram que o hábito desse tipo de alimentação é importante, pois as sobras das frutas são biodegradáveis e não poluem o meio ambiente. No que diz respeito aos alimentos preparados à base de produtos industrializados, os alunos destacaram o impacto dessa alimentação na saúde humana, tendo em vista que podem causar uma série de riscos pela presença de químicos, como corantes, conservantes, aromatizantes, entre outros. Além disso, chamaram atenção para o descarte de embalagens de plástico e sobra de óleo, que do ponto de vista ecológico são extremamente poluentes. Essa explicação acabou por questionar os atuais padrões de consumo alimentar da sociedade – industrial e capitalista – que priorizam a comercialização de produtos em detrimento à saúde humana e a preservação ambiental. Figura 5: Alunos na cozinha pedagógica no preparo dos alimentos. Fonte: Machado, 2013. Vale ressaltar que apenas as frutas foram compartilhadas para o consumo com os estudantes, professores e funcionários da escola, e que os outros alimentos foram apenas demonstrativos a fim de fazer a comparação entre os dois tipos de alimentação. Cabe destacar também que o padrasto de um aluno conseguiu a doação de parte das frutas na CEASA/EMPASA para serem distribuídas na campanha de educação alimentar. A atividade extraclasse organizada pelos alunos foi bem aceitável, principalmente, por parte dos professores, que se propuseram a levar mais frutas para escola no intuito de socializar esse tipo de refeição, além disso, estimulou a implantação de um pomar, o que acabou por conciliar com a proposta de educação ecológica. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como principais resultados, destaca-se que após as ações de educação sanitária – no segundo semestre do ano letivo de 2013 – a escola passou por uma importante reforma empreendida pelo Governo do Estado, que, significativamente, mudou o cenário de insalubridade observado nas vistorias técnicas realizadas pelos alunos. A pintura na área interna e externa da escola, a capina do matagal, a chegada de carteiras novas, a substituição dos quadros, a sinalização do acesso para portadores de necessidades visuais e os cestos de coleta seletiva dos resíduos, acabaram representando mudançasadvindas a partir da mobilização dos alunos em prol das melhorias ambientais na escola. Tal fato mostrou como o cuidado com meio ambiente pode se transformar numa reinvindicação sociopolítica – e nesse caso para muitos alunos foi atendida. Além disso, no primeiro semestre de 2014 a escola foi contemplada com uma Horta Orgânica Escola e um Pomar na área do plantio das mudas trazidas pelos alunos, por intermédio da parceria e financiamento do Verdegreen Hotel, o que estimulou a continuidade das práticas de educação ecológica e alimentar na escola. Nesse sentido, conclui-se a consolidação de uma estratégia interdisciplinar promissora para a troca de diversos conhecimentos a respeito do meio ambiente, a prática de ações que potencializaram mudanças no ambiente escolar e um projeto que indica o início da formação de uma consciência política transformadora. A proposta não acaba por aqui, mais ações estão sendo desenvolvidas a fim de dar continuidade e possibilitar novas mudanças, contudo, a participação de outros professores, disciplinas e projetos nessa perspectiva é de suma relevância, sobretudo, em uma escola que a cada ano acolhe um número significativo de novos estudantes. REFERÊNCIAS ACSELRAD, Henri. Cidadania e meio ambiente. In: ACSELRAD, Henri. Meio ambiente e democracia. Rio de Janeiro, 1992. p. 18-31 CARVALHO, Isabel Cristina M. Educação ambiental: a formação de sujeitos ecológicos. Cortez, 2011. DAGNINO, Ricardo de Sampaio; CARPI JÚNIOR, Salvador. Riscos ambientais: conceitos e aplicações. Revista Climatologia e Estudo da Paisagem. Rio Claro, 2007. Disponível em: < http://pt.scribd.com/doc/9519182/Risco-Ambiental-Conceitos-e-aplicacoes> Acesso em: 12 de Jun. de 2012. GEO, Brasil. O estado da saúde e do meio ambiente no Brasil. 2002. Disponível em: <http://www.uff.br/cienciaambiental/biblioteca/geobrasil/saude.pdf> Acesso em: 05 de Jul. de 2012. GROHE, Sandra Lilian Silveira; CORRÊA, Luciara Bilhalva. Ressignificando o espaço escolar: uma proposta de educação ambiental. Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental. Universidade Federal do Rio Grande. 2012. p. 403-418. Disponível em: <http://www.seer.furg.br/remea/article/view/3167> Acesso em: 01 de maio de 2014. JACOBI, Pedro Roberto. Educação ambiental: o desafio da construção de um pensamento crítico, complexo e reflexivo. Educação e Pesquisa. São Paulo, 2005. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/ep/v31n2/a07v31n2.pdf> Acesso em: 07 de Mai. de 2014. LIPAI, E. M.; LAYRARGES, P.P; PEDRO, V. V. Educação ambiental na escola: ta na lei. In: MELLO, S. S. TRAJEBER, R. Vamos Cuidar do Brasil: conceito e práticas de educação ambiental na escola. Ministério de Educação. UNESCO, 2007. MENEZES, Fábio Assis; MARTINS, Leandro Dias. A importância da educação ambiental no contexto escolar. Disponível em: < http://fetagro.org.br/wp- content/uploads/2012/07/A-importancia-da-Educa%C3%A7%C3%A3o-Ambiental-no- Contexto-Escolar.pdf> Acesso em: 01 de Mai. de 2014. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Proposta de Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental. Resolução N o 2 de Junho de 2012. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/publicacao13.pdf> Acesso em: 16 de Jul. de 2014. PELICIONI, Maria Cecília Focesi; PHILIPPI JUNIOR, Arlindo. Bases Políticas, Conceituais, Filosóficas e Ideológicas da Educação Ambiental. In: PELICIONI, Maria Cecília Focesi; PHILIPPI JUNIOR, Arlindo. Educação Ambiental e Sustentabilidade. São Paulo: Manole, 2005. p. 3-12. REBOUÇAS, João Paulo. A educação ambiental entre reprodução e emancipação: experiências em escolas públicas de Mossoró/RN. Dissertação (Mestrado). Programa Regional de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, 2012. SCOTTO, Gabriela; CARVALHO, Isabel Cristina de Moura. Desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Vozes, 2007. TORALES, Marília Andrade. A inserção da educação ambiental nos currículos escolares e o papel dos professores: da ação escolar a ação educativo-comunitária como compromisso político-ideológico. Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental. Universidade Federal do Rio Grande. 2013. Disponível em: < http://www.seer.furg.br/remea/article/view/3437/2064> Acesso em: 03 de Mai. de 2014.
Compartilhar