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Universidade Federal de Goiás Curso de Psicologia Profª Priscilla Lima Psicologia e Processos Clínicos Thais Martins Calleo Henderson Goiânia Julho, 2014 Estudo de Caso: Caso John/Joan Em 1965, na cidade de Winnipeg, Canadá, Janet e John Reimer, um jovem casal deu a luz a um par de gêmeos, Brian e Bruce. Com a idade de 6 meses, após seus pais se preocuparem com a maneira como ambos urinavam, os meninos foram diagnosticados com fimose. Aos 8 meses foram encaminhados para uma cirurgia de circuncisão. Um urologista realizou a operação utilizando um equipamento elétrico de cauterização que apresentou problemas diversas vezes. Na última tentativa, o procedimento não saiu como o planejado e o pênis de Bruce ficou totalmente queimado. Nos anos 60 uma cirurgia plástica reconstrução de pênis não era uma opção, então não havia nada a ser feito e o pênis de Bruce nunca seria funcional. Com relação ao irmão, os médicos optaram por não operar Brian, cuja fimose logo desapareceu, sem qualquer intervenção cirúrgica. Alguns meses depois, os Reimer viram na televisão uma entrevista com o Dr. John Money, já famoso por suas teorias e o tratamento psicológico de operações de mudança de sexo em transexuais. Nesta entrevista Money expunha sua teoria na qual os bebês teriam sua identidade definida como masculina ou feminina (identidade de gênero) em função da maneira pela qual são criados. Acreditando que tal ideia poderia ser apropriada para o problema do filho, o casal procurou Money, que imediatamente se dispôs a atendêlos e indicou uma mudança cirúrgica de sexo. Ele e outros médicos que trabalhavam com crianças nascidas com genitália anormal acreditavam que um pênis não podia ser substituído, mas que uma vagina funcional poderia ser construída cirurgicamente, e que seria mais provável que Bruce tivesse uma mais bem sucedida maturação funcional sexual como uma menina do que como um menino. Money teria também a oportunidade de comprovar sua teoria com um caso inédito, um bebê completamente e funcionalmente masculino sendo socialmente transformado em uma menina. Até então estes procedimentos só haviam sido feitos com crianças hermafroditas, na qual se optava por um dos sexos. E de bônus havia ainda um irmão gêmeo com o qual se poderia comparar o desenvolvimento do gênero em cada um. Bruce teve sua cirurgia de mudança de sexo aos 17 meses de idade e desde então passou a ser tratado como Brenda. Money considerou o caso um sucesso, Brenda explicitava os comportamentos e desenvolvimentos de uma garota normal. Porém, aos 14 anos, após anos de não identificação com o gênero femino, Brenda decidiu trocar de sexo, assumindo a nova identidade como David. A mudança para o sexo com qual se identificava trouxe um grande alívio para David, mas ele ainda se ressentia pela impossibilidade de ter filhos e por ter um pênis não completamente funcional. David acreditava que nunca poderia casar, um de seus sonhos, e tentou suicídio duas vezes durante a juventude. Dr. Milton Diamond foi atrás do famoso caso dos gêmeos de Money, porque este havia parado de publicar followups sobre o caso. Encontrou David, aos 29 anos, explicou o quanto o seu caso era marcante na teoria do gênero e que era utilizado para perpetuar práticas por todo o mundo. David então aceitou fazer o followup com Diamond e revelar como realmente havia sido o seu caso. Em 2000, David decidiu aparecer em público contando seu caso. John Colapinto escreveu o livro ''As Nature Made Him: The Boy Who Was Raised as a Girl”, baseado no caso. David apareceu em programas de auditório e um documentário da BBC, também sobre o caso. Em 5 de Maio de 2004, após enfrentar uma série de problemas como a morte do irmão por overdose, desemprego e fim de seu casamento de 14 anos, David se suicidou com um tiro na cabeça. Sua morte movimentou ainda mais as discussões sobre gênero e sexualidade. Seu caso entrou para história. O caso de David foi descrito na literatura como o caso dos gêmeos, por Money, mas ficou mais conhecido como o caso John e Joan, pseudônimos atribuídos por Diamond. Caso por William Money Psicólogo da Jonhs Hopkins University de Baltimore, sexologista, pesquisador e publicador assíduo, especializado em pesquisas sobre identidade sexual, mudança de sexo e biologia do gênero, Money foi grande responsável pela criação e popularização da teoria de identidade de gênero. Seu livro “Homem e mulher, menino e menina” (1962) tornouse um livrotexto amplamente utilizado nas universidades. Money também popularizou a ideia de papel social de gênero e criou a teoria do “lovemap”. Para Money, não era a biologia, ou genes, que determinava se a pessoa seria homem ou mulher, mas sim sua criação social. Algumas diferenças são sexualmente adjuntivas, como o fato do homem urinar em pé e a mulher urinar sentada e o tamanho menor das mulheres quando crianças, que fazem com que os homens assumam o papel de dominância. A maioria das diferenças porém são sexualmente arbitrárias, impostas pela sociedade, como a cor das roupas (azul para meninos e rosa para meninas) e carreiras a serem seguidas por cada sexo. Para Money, o órgão sexual determinaria o tipo de criação que a criança receberia e, portanto, tal criação determinaria seu gênero. Dr. Money descreveu o caso John/Joan em um dos capítulos do livro “Homem e mulher, menino e menina” (1962), segue um resumo de sua descrição. No livro Money descreve os pais como: jovens, advindos de um ambiente rural, apenas com educação básica e desesperados com a condição do filho com o seu pênis mutilado. Money não narra como entraram em contato e nem como foi feita a decisão da cirurgia. John teve sua mudança de sexo aos 17 meses e a cirurgia de vaginoplastia foi deixada para quando o seu corpo se desenvolvesse mais. Money aconselhou os pais baseado nos casos de hermafroditismo que ele anteriormente havia acompanhado. Foram informados do programa médico que deveriam seguir, manipulação de hormônios, associados a uma educação sexual. Foram guiados em como fornecer informaçõespara sua então filha, familiares e para o irmão de acordo com as necessidades futuras. A criança, por exemplo, só receberia a informação de que não poderia ter filhos quando casasse e quisesse constituir uma família. O acompanhamento pós processo cirúrgico passou por um amplo contato com os pais a distância, por cartas, aparentemente, e visitas anuais. A criança inicialmente rejeitou usar vestidos, aceitando após algum tempo. Money narra a mudança de roupas, e a preferência da criança por vestidos, o gosto por arrumar seu grande cabelo, a criança não gostar de se sujar como sinais claros do sucesso do caso. A mãe teve problemas para fazer com que a criança urinasse sentada, o que Money atribuiu ao formato que a genitália da criança ficou após a cirurgia. Conseguise que a criança sentasse para urinar ao 5 anos de idade, ocasionalmente ainda copiando o irmão. Quando as crianças perguntaram para quê serviam os seios, a mãe retratou as diferenças dos papeis de mães e pais na criação dos bebês, dizendo que os seios servem paras mães darem leite aos bebês e os pais tem músculos para protegêlos. Quando a menina se deparou com os absorventes da mãe, ela lhe explicou sobre a menstruação e sua parte no papel feminino. Dr. Money diz que a mãe executou muito bem a tarefa de especificar o papel reprodutivo masculino e feminino para as crianças, em especial em um episódio no qual os gêmeos tomavam banho juntos e o irmão ficou com o pênis ereto e apontando “Olha o que eu tenho, olha o que eu tenho!”, a irmã ficou brava e bateu em seu pênis. Ao ver a menina chateada a mãe lhe disse para esperar quando ela crescer, porque mulheres podem ter bebês e homens não. O irmão, por sua vez, ficou chateado, então a mãe lhe explicou o papel dos homens na formação dos bebês com suas “sementes”. A menina ajudava a mãe nas tarefas da casa e queria bonecas de presente no natal. A mãe narra que enquanto o irmão queria ser bombeiro ou policial, ela desejava ser médica ou professora, mas não possuía nenhum desejo em se casar. Dr. Money aponta, no final de sua narração do caso, que a garota possuía bastantes traços masculinos como excesso de energia física, teimosia, grande nível de atividade, dominância em qualquer grupo que pertencia e dominância sobre o irmão gêmeo. Sua mãe tentou modificar esses comportamentos sem resultado. O pai pouco narrou sobre seus comportamentos para com as crianças e não acreditava que havia algum tipo de favoritismo para nenhuma delas. Porém Money afirma que ele reforça diferentes comportamentos para ambos. No artigo “Ablatio Penis: Normal Male Infant SexReassigned as a Girl” (1975), Money reconta o caso, que acompanhava há 9 anos e acrescenta algumas novas informações. Justifica a mudança de sexo para o feminino no seguinte trecho: “A razão de tal programa é simples: é possível com a cirurgia e terapia hormonal, habilitar um bebê com um pênis defeituoso mais efetivamente a ser uma garota que um garoto. Vaginoplastia permite uma vida sexual normal enquanto a faloplastia não. A vaginoplastia exige somente duas cirurgias, ao contrário da faloplastia que exige uma dúzia ou mais. Resposta orgásmica não é perdida. Maternidade pode ser adquirida por adoção. O indivíduo não se sente como uma aberração” Em uma das consultas com os gêmeos, ela contava sobre uma visita no zoológico, Money perguntou qual animal ela gostaria de ser. Ela respondeu que gostaria de ser um macaco, porque ele pode subir nas árvores e balançar no seus braços. O doutor então perguntou se ela gostaria de ser um macaco menino ou menina. Ela respondeu que gostaria de ser um macaco menina, quando questionada por que justificou porque já era uma. Caso por Milton Diamond Dr. Milton Diamond foi responsável pelo follow up do caso John/Joan. Diamond era um intenso crítico das teorias de Money e os dois nutriram uma richa por muitos anos. Ele contrapôs o sucesso do caso e realizou entrevistas com John, sua mãe e sua mulher, de 1994 à 1995, para relatar um outra visão do caso e a nova mudança de sexo de John para o masculino. Diamond defende a Teoria do desenvolvimento do gênero, que incorpora fatores biológicos como organizadores de predisposições em temperamentos e atitudes, com a ativação destes fatores, que ocorre a partir da interação da pessoa com a sociedade. Tendências herdadas mais interações sociais determinaram o gênero que a pessoa assumirá. A pessoa nasce com um background baseado na herança evolutiva, genética familiar, desenvolvimento uterino e saúde. Esses fatores organizados influenciarão os comportamentos subsequentes do indivíduo. As pessoas não são psicossexualmente neutras ao nascer, mas programadas a se comportarem de uma certa maneira. Todos os indivíduos se comparam com outras pessoas decidindo quem eles são parecidos e com quem são diferentes. Estas experiências e identificações levarão a pessoa se identificar com o gênero masculino ou feminino. Diamond narra o caso no artigo “Sex Reassignment at Birth: A Long Term Review and Clinical Implications” (1997). Segue um resumo de sua descrição: Diamond faz um resumo do caso e seguido de vários pequenos trechos do desenvolvimento de John apresentado pelos entrevistados. A mãe narra que ao tentar vestir Joan com vestidos, ela os negava veementemente, chegando a rasgálos. Porém Joan também era bastante feminina quando queria, a mãe se encabulava com o quanto era bonita e virtuosa como menina. Sua mãe também relata que Joan copiava muito mais seu pai do que seu irmão gêmeo o copiava, em um dia Joan viu o pai se barbeando e a mãe se maquiando, Joan logo começou a aplicar a espuma de barbear e mesmo com mãe a corrigindo dizendo que ela deveria se maquiar, Joan replicou que queria se barbear e não se maquiar. Como descrito por Dr. Money, Joan regularmente tentava urinar em pé, mesmo depois dos 5 anos, quando aprendeu a urinar sentada, ainda tentava urinar em pé ocasionalmente. Joan chegou a ser pega urinando em pé tantas vezes no banheiro feminino que as garotas a ameaçaram e a expulsaram do banheiro. Contrapondoo que foi descrito por Money, Diamond afirma que durante o desenvolvimento, Joan preferiu atividades e jogos de meninos, tendo pouco interesse em bonecas ou atividades de garotas, ignorando os brinquedos que lhe eram dados. Joan não fugia de esportes duros ou brigas. A realização de Joan de que não era uma garota aconteceu entre os 9 e 11 anos. John relata: “Sempre houveram pequenas coisas desde o começo. Eu comecei a ver como eu me sentia e era diferente do que eu deveria ser. Eu achei que fosse uma aberração ou algo assim… Eu olhei para mim mesmo e disse Eu não gosto deste tipo de roupa, eu não gosto deste tipo de brinquedo que sempre me dão, eu gosto de andar com garotos e subir em árvores e garotas não gostam de nenhuma dessas coisas. Eu olhei no espelho e vi que meus ombros eram tão largos, não há nada de feminino sobre mim… foi assim que eu descobri, mas eu não queria admitir, eu não queria causar um grande problema” Joan já possuia pensamentos suicidas trazidos por por esta dissonância cognitiva. Ela não tinha amigos, tanto garotos quanto garotas estavam sempre implicando com ela. Joan chegou a agredir uma garota que implicava com ela e foi expulso de sua escola. Sua mãe diz que Joan era uma garota bonita, mas quando começava a se mover ou falar sua incongruência e estranheza apareciam. Na escola, Joan recebeu os apelidos de “homem das cavernas” e “gorila”. John conta que quando tentava expressar seus pensamentos para os médicos eles “mudavam de assunto sempre quando eu tentava dizer como eu me sentia. Ele não queria escutar o que eu tinha para dizer, mas queria me dizer como eu deveria me sentir”. Quando Joan relatava seus sentimentos de não se sentir como uma garota, os seus terapeutas, antes da mudança de sexo, argumentavam que era um sentimento normal, que todas as garotas passavam por isso no seu desenvolvimento. John diz que não podia argumentar com um monte de médicos em seus jalecos, suas mentes já estavam feitas, eles não queriam ouvílo. John diz que os médicos estavam mais preocupados com a aparência de sua vagina que ele mesmo. Sua genitália era inspecionada em cada visita ao John Hopkins. John lembra de pensar “Me deixe do jeito que estou e eu ficarei bem… É bizarro. Minha genitália não estão me incomodando, eu não sei porque vocês estão tão incomodados com ela.”. John conta que Joan não tinha ninguém com quem comparar sua genitália, a não ser seu irmão. Nudez não era aceitável em sua comunidade. Em uma das visitas a John Hopkins os gêmeos tiveram que ficar nus para a inspeção do grupo de médicos e inspecionar os genitais um do outro. Esta inspecção deixou fortes emoções nos irmãos. O irmão de John recorda desta experiência com lágrimas. A partir dos 7 anos, Joan se rebelou com as consultas feitas em no hospital de John Hopkins. Ela se sentia descofortável e envergonhada com a frequente exposição de seus genitais e as constantes tentativas, a partir dos 8 anos, de convencêla a se comportar mais como uma garota e aceitar a vaginoplastia. Para convecêla a ir os pais misturam as visitas com viagens em família. Aos 12 anos Joan iniciou seu tratamento hormonal, aos quais ela se rebelou porque a faziam se sentir estranha. Ela regularmente conseguia driblar sua dose diária. Joan desenvolveu seios, mas se recusava a usava sutiã. Em Baltimore, os médicos levaram transsexuais feminos para convencer Joan das vantagens de ser mulher e ter uma reconstrução vaginal. Joan ficou extremamente perturbada por esses encontros e em um deles, aos 13 anos, ela fugiu do hospital e se escondeu na cobertura de um prédio próximo. Aos 14 anos, Joan se recusou a retornar para o hospital e passou a ser tratada por um grupo de médicos locais. Os pais de Joan continuara a reforçar sua identidade feminina, como orientaram os médicos. Psicoterapia, primeiramente por terapeutas mulheres, tinha o objetivo de reforçar sua identidade feminina e redirecionar sua ideação masculina. Isto foi se tornando cada vez mais difícil a medida que Joan negava ver a si mesmo como um garota e se irritava em ser tratada como uma. John se lembra “Eles faziam eu me sentir uma aberração”. Aos 14 anos, ainda sem saber de sua condição original, Joan se recusou a viver como garota e fantasiava ser “um homem grande, com muitos músculos, um carro e com vários amigos”, Joan queria ser mecânica e só vestia jeans e camisetas. Seus teste de Rorschach e Teste de Apercepção temática da época mostraram uma personalidade mais masculina que feminina. Joan disse para o seu endocrinologista que suspeitava que era um garoto desde criança. O endocrinologista, que acompanhava o caso há um tempo, percebia a clara preferência de Joan pelo comportamento masculino, abriu a possibilidade para Joan de fazer uma mudança de sexo. Poucos meses depois Joan aceitou e decidiu passar a viver como um homem. Após a decisão de Joan seu pai lhe contou toda a verdade do seu caso. Foi um momento muito emocional para todos, John relata “Pela primeira vez as coisas fizeram sentido e eu entendi quem e o que eu era.”. John logo inciou o tratamento hormonal, realizou uma masectomia aos 14 anos e sua primeira faloplastia aos 15. Após as cirurgias John se ajustou bem, era bem aceito e popular com garotos e garotas. John porém tinha relutância com a iniciativas sexuais. Quando contou para uma amiga que estava inseguro com seu pênis ela contou para toda a escola, o que machucou bastande John, mas logo ele superou e foi reaceito em seus grupos. A cirurgia não foi completamente um sucesso. John, na época em que foi entrevistado por Diamond, urinava por uma fístula na base de seu pênis, grande parte do seu pênis não possuia sensação e aviam áreas com intensas cicatrizes. A castração que John sofreu retirou totalmente sua capacidade reprodutiva, algo que John ressentia muito na época da entrevista. Sua capacidade de ejacular retornou com o tratamento andrógeno. John teve sua primeira experiência sexual aos 18 anos. Aos 25 anos John casou com uma mulher mais velha e adotou seus filhos. Sexo era ocasional no relacionamento,fato com o qual sua mulher manifestou insatisfação. Porém Dr. Diamond não percebeu também uma possível depressão em John e termina o relato do caso dizendo “John é um homem maduro e voltado para o futuro com senso de humor perspicaz e equilíbrio. Enquanto ainda ressentido pela sua experiência, ele filosoficamente aceita o que aconteceu e tenta superar isso com o apoio de sua mulher, pais e família.” Para Diamond é possível que as interpretação dos primeiros anos de John tenham sido erradas, pela dificuldade de pesquisador de ver os resultados saindo de sua hipótese. As manifestações comportamentais masculinas de Joan iriam sempre ser interpretadas como uma fase, ou comportamentos desviantes normais para uma garota. Os comportamentos masculinos de Joan eram repetidamente rejeitados pelos médicos também pela crença a diminuição da dúvida do paciente levaria a um maior sucesso da mudança de sexo Para Diamond, todo o caso foi construído na crença de que toda a imagem pessoal depende da criação que a criança receberá baseada no órgão sexual funcional: era melhor que John tivesse uma vagina funcional que um pênis não funcional. Apesar da funcionalidade do órgão ser um fator importante para pessoa, Diamond não acredita que é o ponto central para o estabelecimento do gênero. Diamond aponta que o caso de John/Joan é incomum na literatura (não hermafrodita), mas cita outros artigos de followup de casos de pacientes com micropênis, que tiveram a mudança de sexo para o feminino, e que hoje não possuem nenhuma dúvida de seu sexo ser o masculino. E vários estudos nos quais homens com o pênis anormal sofreram uma mudança de sexo para o feminino e hoje vivem como homens. Diamond ressalta que há casos na literatura de homens que aceitaram a vida como mulheres, quando trocado de sexos quando bebês. Mas os casos relatados não contém detalhes da vida sexual ou pessoal do indivíduo e não há um longo follow up, acompanhando apenas os primeiros anos de vida. Diamond afirma que os followups de mudança de sexo tem que ir além dos 5 ou 10 anos e acompanhar a pessoa principalmente na puberdade, quando a pessoa realmente reafirmará o seu gênero. Discussão O caso de John/Joan é emblemático em dois pontos principais: na ideologia de gênero, criada por Dr. Money, que é ainda hoje defendida por alguns grupos, e no enviesamento científico que um pesquisador pode ter quando se apaixona demais por sua teoria e começa a distorcer os fatos ao seu favor. É preciso ressaltar o cuidado que o pesquisador deve ter com sua teoria e pesquisa, para que não se apaixone tanto por ela ao ponto de que esta não vire um dogma para si próprio e ao invés de criar teorias que tentem explicar a realidade ele dobre a realidade para encaixar em sua teoria. Money considerou o caso um exemplo de sucesso, e provavelmente realmente o enxergou como um completo sucesso, deixando de ver ou arranjando justificativas para qualquer comportamento de Joan que saía do esperado. A sua teoria e o caso se espalharam rapidamente, não só nos meios acadêmicos, como também na mídia. Time magazine escreveu “Este caso dramático… dá bastante suporte… que os padrões convencionais de comportamentos masculinos e femininos podem ser alterados. Também impõe dúvidas na teoria de que a maioria das diferenças sexuais, psicológicas e anatômicas, são imutáveis, deterrminadas por genes e concepção. O modelo Hopkins se espalhou pelo mundo nos hospitais. Com a crença de que a criança se adaptaria a qualquer gênero a escolha passou a se guiar pelo orgão que seria mais funcional para pessoa. Os endocrinologistas manipulavam hormônios para o melhor desenvolvimento sexual do paciente na puberdade. Neste guia pelo orgão mais funcional muitos meninos sofreram mudanças de sexo apenas ter um pênis que os médicos consideraram muito pequeno, com a crença de que eles teriam um vida mais satisfatória como meninas. Após a revisão do caso por Diamond, o caso de John/Joan levou ao início de mais estudos de followup de pacientes que tiveram uma mudança de sexo ainda quando bebês/crianças. A Intersex Society of North America (ISNA) realizou levantamentos com pacientes adultos e percebeu que um grande número dos que tiveram troca de sexo quando bebês estavam insatisfeitos com o sexo ou já haviam realizado uma mudança de sexo. Por mais que Money afirmasse que o desenvovimento do gênero é social, o foco no tratamento se concentrava na funcionalidade e mudança do orgão sexual, pouco se trabalha o lado social dos papeis. Money insistia em mostrar as diferenças dos orgão sexuais para os gêmeos, acreditando que Joan entenderia que porque tinha tal orgão era uma menina e então teria que agir de uma certa forma. Apartir de vários estudos as concepções sobre gênero e manejo destes pacientes começaram a mudar, hoje defendese que a própria pessoa deve decidir qual gênero irá ter, quando tiver capacidade para tal. A INSA afirma “Não há evidência que crianças que crescem com genitálias hermafroditas estão piores psicologicamente que aquelas que possuem o sexo alterado. Na verdade há evidências de que crianças que crescem com genitálias hermafroditas crescem bem, psicologicamente… as cirurgias acontecem antes da idade de consentimento sem justificativa”. Como o próprio John narra “Doutor… disse, vai ser difícil, as pessoas irão pegar no seu pé, você será bastante solitário, você não irá achar ninguém a não ser que tenha uma cirurgia vaginal e viva como uma mulher. E eu pensei comigo mesmo… me desapontou o fato de que estas pessoas serão muito baixas se esta é a única coisa que eles pensam que há para mim…. Se isso é tudo o que elas pensam de mim, que meu valor é baseado pelo o que eu tenho no meio das minhas pernas I tenho que ser um completo perdedor”. No caso de John/Joan toda família foi afetada drasticamente pelas decisões e ações tomadas. Obviamente o processo pelo qual estava submetido não afetou e desgastou apenas o psicológico de John, mas de seus pais e irmão, tornandoos uma família traumatizada e vítima de depressão. Foraas orientações sobre como deveriam proceder para criar seus filhos não houve, aparentemente, acompanhamento psicológico aos pais e ao irmão de John. John tornouse um adulto atormentado pelas lembranças de sua infância repleta de confusão sexual, imagem corporal incoerente e experiências traumáticas, não recebeu nenhum amparo, nem acolhimento, culminando por fim em seu suicídio. Infelizmente ainda hoje muitos médicos seguem o modelo Hopkins e a teoria de John Money, atualizada, ainda é defendida por grupos feministas. Alguns movimentos insistem em negar as influências prénatais na escolha do gênero. Esperase que as pesquisas se ampliem neste campo, e que talvez seja criado a Sexologia como ciência, como era defendido por Diamond. E teremos o fim da clássica dicotomia biológico x social, partindo para a concepção mais ampla do indivíduo como um ser com bases biológicas que se alteram com o social. Referências Colapinto, J. (1997). The True Story of John/Joan. The Rolling Stone, December 11, 1997. Pages 5497 Colapinto, J. (2004). What were the real reasons behind David Reimer's suicide? retrieved from http://www.slate.com/articles/health_and_science/medical_examiner/2004/06/gender_gap.2.html Diamond, M. (1997); Sigmundson, K. Sex Reassignment at Birth: A Long Term Review and Clinical Implications, Archives of Pediatrics and Adolescent Medicine, No. 151 Diamond, M. (2000). The field of Sex Research: Responsability to ourselves and to society, Archives of sexual behavior, Vol 9, Nº 4. Diamond, M. (2006). Biasedinteraction theory of Psychosexual development: “How does one know is one is male or female?”, Sex Roles, Vol 55, 589600. Intersex Society of North America. What's wrong with the way intersex has traditionally been treated? retrieved from http://www.isna.org/faq/concealment Money, J. & Ehrhardt, A. A. (1972) Man & woman, boy & girl: the differentiation and dimorphism of gender identity from conception to maturity. Baltimore, MD: Johns Hopkins University Press. Money, J. (1975) Ablatio Penis: Normal Male Infant SexReassigned as a Girl. Archives of Sexual Behavior, VoL 4, No. 1.
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