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Teoria da História Aula 02 Os direitos desta obra foram cedidos à Universidade Nove de Julho Este material é parte integrante da disciplina, oferecida pela UNINOVE. O acesso às atividades, conteúdos multimídia e interativo, encontros virtuais, fóruns de discussão e a comunicação com o professor devem ser feitos diretamente no ambiente virtual de aprendizagem UNINOVE. Uso consciente do papel. Cause boa impressão, imprima menos. Aula 02: O que é a História? Tempo, espaço e sociedade Objetivo: Prosseguir no estudo dos conceitos básicos e introdutórios sobre a ciência histórica, destacando sua importância para a correta compreensão do passado social. Firmando conceitos Vimos que o passado, que é o objeto de estudo da História, tem grande importância para o presente, não podendo ser esquecido ou desprezado a fim de que entendamos o nosso próprio mundo contemporâneo. Concluímos também que o passado tem sido utilizado por monarcas, aristocratas e classes dominantes para explicar e justificar uma pretensa superioridade em relação aos demais, resultando daí versões manipuladoras do passado, criadas e sustentadas por esses dominadores. Cabe, então, à ciência histórica, por meio do trabalho de seus especialistas, denunciar e desmentir essas falsas versões do passado, bem como trazer à tona os conflitos de projetos sociais de cada tempo e contexto. Espera-se, portanto, que o conhecimento do passado auxilie no entendimento do presente e na promoção de projetos de sociedade justos e igualitários. Entendidas as motivações pelas quais os homens olham para o passado, apontaremos agora para outro aspecto também muito importante da ciência histórica, que destaca a peculiaridade e a complexidade dessa ciência: trata-se da relação entre o tempo, o espaço e a sociedade. A história humana acontece no tempo O tempo é uma das dimensões de existência do universo e, por extensão, da própria sociedade. Em linguagem científica, o tempo é uma grandeza, ou seja, uma forma de se medir e descrever essa existência. Entender o tempo, porém, não tem sido fácil até mesmo para os cientistas. O físico britânico Isaac Newton, que viveu no século XVII, afirmou que o tempo era uma grandeza absoluta que deveria ser contada de forma absolutamente igual em todos os relógios do mundo. O cientista alemão Albert Einstein (1979– 1955) debruçou-se sobre a questão da relatividade nas relações entre tempo e espaço, chegando a conclusões que mudaram os rumos da ciência moderna. Assim, por complexas fórmulas matemáticas, conseguiu mostrar que o tempo passa de forma diferenciada, levando-se em conta a velocidade do observador. Aplicadas às ciências humanas, as ideias dele reforçam a constatação de que as sociedades humanas percebem e vivem o tempo no contexto dessa imensa relatividade. A história humana acontece no tempo, desenrola-se nele. As sociedades humanas existem, criam suas tradições, projetam suas aspirações e constroem suas visões de mundo no tempo. Chamamos a isso de tempo histórico, ou seja, o lapso cronológico que se marca e se faz conhecido pelas construções sociais peculiares estabelecidas pelas sociedades de determinada época. Além de existir nele e de construí-lo socialmente, as sociedades humanas contam e organizam o tempo de maneira particular. Por exemplo: para o homem moderno, influenciado pela cultura do Ocidente3, o tempo passa em uma sucessão contínua e irreversível de horas, minutos e segundos que são contados pelo relógio. Outras sociedades humanas, porém, perceberam e contaram o tempo de formas diferentes ao longo da história, o que evidencia as peculiaridades de sua própria cultura. Povos indígenas americanos contavam o tempo por meio da aparição da lua e de suas fases, por exemplo. As diferentes formas socioculturais de apropriação do tempo deram origem aos calendários — o maia, o chinês, o judaico, o árabe, dentre outros. O calendário adotado mais comumente nos dias de hoje é o cristão, que foi instituído pelo Papa Gregório XIII, em 1582, e se tornou uma referência universal pela expansão colonial europeia a partir do século XVI. Esse calendário (conhecido como ―calendário gregoriano‖ em homenagem a seu instituidor), por força de tais imperialismos1 do Ocidente, determinou até mesmo as tradicionais divisões que se adotam na ciência histórica: Pré-história, História antiga, História medieval, História moderna, História contemporânea. Tais divisões foram concebidas tendo a história do Ocidente como base, mas é sempre bom lembrar que não há nada no calendário ocidental que o torne superior às outras formas de se contar o tempo. As formas de contagem do tempo e os seus respectivos calendários não são neutros em sua concepção, revelando a existência do controle social do passado. A passagem do tempo, assim entendida, não se apresenta caótica ou confusa na memória social2 estabelecida, mas é descrita de maneira segura, lógica e coerente, de acordo com o projeto daqueles que a elaboraram. O historiador, ao defrontar-se com tais formas de contagem do tempo, deve levar em conta a existência desses projetos e entender como o tempo se faz suporte para a explicação do passado. A história acontece no espaço social A história dos povos e sociedades se dá no espaço físico do planeta, ou seja, as sociedades humanas e suas respectivas construções socioculturais situam-se geograficamente. Tais porções do planeta Terra foram rotuladas (ou seja, ganharam seus nomes) de acordo com a apropriação política, social, econômica que as sociedades concretizaram nesses espaços geográficos ao longo do tempo. Suméria, Egito, Grécia, Macedônia, Roma, Gália, França, Portugal e Brasil são nomes históricos, sociais, da mesma forma que América do Sul, Europa, África, se pensarmos o planeta a partir de seus continentes e regiões. Tais rótulos geográficos que permitem a localização espacial, físicos ou políticos, são ―dados‖ socialmente, ou seja, estão ligados à história da apropriação desses espaços pelos seus habitantes, mas também aos diferentes interesses que outras sociedades, muitas vezes de lugares distantes, tiveram e tem por eles. Assim, o nome ―Brasil‖ tem relação com a exploração das terras que foram por conquistadas pelo colonialismo europeu português do século XVI, terras usurpadas dos indígenas. Aliás, para esses mesmos índios, a chegada dos conquistadores portugueses não transformou as terras nas quais viviam e que eram a sua casa em ―Brasil‖. Coberto de florestas e habitado já naquele contexto por dezenas de nações indígenas e, portanto, por alguns milhões de seres humanos, tal território não era apropriado socialmente por esses povos nos mesmos termos de seus invasores. Dentro desse mesmo período e contexto, o nome ―América‖, dado pelos europeus às novas terras conquistadas a partir das viagens de Cristóvão Colombo, homenageou um desses pioneiros da conquista, o navegador Américo Vespúcio. Como exemplo mais recente de luta pela apropriação histórica dos espaços geográficos, temos as ilhas do Atlântico Sul em disputa por argentinos e britânicos, chamadas de ―Malvinas‖ pelos primeiros e de ―Falklands‖ pelos segundos; ambos os disputantes buscam explicar os seus direitos sobre elas com base em compreensões ou versões da história. Com a exploração do espaço sideral, desde o lançamento da nave Sputnik, pelos soviéticos, no ano de 1957, da ida dos norte-americanos à Lua, em 1979, e o envio de naves não tripuladasque exploram pontos do Sistema Solar e, até mesmo, vão além de tais fronteiras, o espaço social tende a se expandir. O palco da História, em futuro próximo, poderá incluir as já planejadas colônias terrestres em planetas como Marte, obrigando os historiadores do futuro a considerarem a apropriação desses novos ambientes e os interesses que a determinam. Os diferentes contextos geográficos, assim, mais do que simplesmente prover os diversos cenários físicos e naturais para a realização do processo histórico, pressupõem uma apropriação econômica, política e social desses espaços. A História e as ciências que estudam a sociedade As sociedades que se construíram no tempo e no espaço apresentam suas peculiaridades econômicas, políticas, sociais, culturais. Ciências sociais como a Sociologia, a Antropologia, a Geografia, dentre outras, tornam-se, então, importantíssimas para a compreensão mais correta dos quadros históricos, contribuindo assim para o resgate do passado. A ciência histórica deve estar em constante diálogo com elas ciências sociais e as ciências humanas em geral, pois esses conhecimentos ajudam decisivamente no entendimento das sociedades humanas de diferentes épocas e contextos. Segundo o grande historiador britânico Eric Hobsbawm4 (2003), ―A história da sociedade é, entre outras coisas, a história de unidades específicas de pessoas que vivem juntas, unidades que são definíveis em termos sociológicos‖ (p. 118). Dessa forma, ele está afirmando a importância de se conhecer essas ―unidades específicas de pessoas‖, que se desenvolveram nos diferentes tempos históricos, a fim de que se compreendam os quadros mais amplos. Isso seria impossível sem o auxílio das ciências que devassam as particularidades dessas mesmas sociedades. Conclusão Há uma ideia generalizada de que a história é uma sucessão de datas importantes e de nomes de pessoas que fizeram coisas de destaque nos lugares onde habitavam. Cabe ao historiador, ao professor de História, corrigir esse entendimento equivocado. A história humana é temporal, espacial, mas é, acima de tudo, social. Os recortes que efetuarmos dos diferentes períodos históricos sempre passarão pelos ―quem‖, ―quando‖ e ―onde‖. Porém, as questões ligadas ao ―por que‖ nos encaminharão para as mais importantes pistas que levam à compreensão do passado. Tais questões estão sempre referidas às sociedades humanas particulares, localizadas no espaço social e no tempo histórico, às ―unidades específicas de pessoas‖ lembradas por Hobsbawm e que constituem o objeto de estudo de nossa apaixonante ciência. Saiba Mais Imperialismos1: políticas de conquista e de dominação utilizadas por povos mais fortes econômica, política e militarmente, para impor suas ideias e objetivos a povos mais fracos. Memória social2: aquilo que as sociedades lembram ou sabem de seu passado sem que tenham sido ensinadas formalmente, ou seja, conteúdos históricos informais e tradições que as pessoas aprendem fora da escola. Ocidente3: expressão utilizada para referir-se à porção do planeta que tem suas raízes culturais na Europa e na América do Norte, diferenciando-os do Oriente. Eric Hobsbawm4: historiador britânico nascido em Alexandria, Egito, em 1917, e falecido em 2012. Um dos nomes mais respeitados da historiografia universal, autor de uma série de obras notáveis que são utilizadas largamente no mundo acadêmico. REFERÊNCIAS BORGES, V. O que é História. São Paulo: Brasiliense, 1981. HOBSBAWM, E. Sobre a História. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. HOBSBAWM, E; RANGER, T. (Org.). A invenção das tradições. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
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