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GESTÃO PÚBLICA NO BRASIL CONTEMPORÂNEO LEVY DRAGO

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2 
 
GESTÃO PÚBLICA NO BRASIL 
CONTEMPORÂNEO 
 
Evelyn Levy 
Pedro Aníbal Drago [organizadores] 
 
 
 
 
 
 
 
 
  
 
9 
 
 
 
Governo do Estado de São Paulo 
 
Governador do Estado 
Alberto Goldman 
 
Secretário de Gestão Pública 
Marcos Antonio Monteiros 
 
 
FUNDAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO ADMINISTRATIVO – FUNDAP 
 
Diretora Executiva 
Geraldo Biasoto Junior 
 
Equipe de Edição 
 
Edição de texto 
Maria Eloisa Pires Tavares, Newton Sodré, Vera Carvalho Zangari Tavares 
 
Editoração eletrônica 
Júlia Yaeko Kurose 
 
Capa e projeto gráfico 
Cristina Penz 
 
 
 
c 2005 By Fundap 
 
2ª Impressão 2010 
 
Dados Internacionais de Catalogação da Publicação (CIP) 
(Centro de Documentação da Fundap, SP, Brasil) 
 
Gestão pública no Brasil contemporâneo / Evelyn Levy, Pedro Anibal Drago 
 
 (organizadores) – São Paulo : Casa Civil, 2005. 
 
 448p. 
 
 ISBN 85-7285-097-X 
 
 1. Administração Pública – Brasil. I. Levy, Evelyn (org.) II. Drago, Pedro Anibal (org). 
 
III. Fundação do Desenvolvimento Administrativo – Fundap. IV. São Paulo ( Estado) 
 
Casa Civil 
 
 CDD -350.00091 
_____________________________________________________________________ 
 
 
 
 
 
 
4 
EDIÇÕES FUNDAP 
Rua Cristiano Viana, 428 
05411-902, São Paulo, SP 
Telefone (11) 3066 5584 
Fax (11) 3081 9082 
livraria@fundap.sp.gov.br 
SUMÁRIO 
INTRODUÇÃO, 11 
Evelyn Levy e Pedro Aníbal Drago 
REFORMA DA GESTÃO E AVANÇO SOCIAL EM UMA ECONOMIA SEMI-
ESTAGNADA, 15 
Luiz Carlos Bresser Pereira 
TENDÊNCIAS DA GESTÃO PÚBLICA NOS PAÍSES DA OCDE, 
33 
Flávio da Cunha Rezende 
ADMINISTRAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO: A 
RELEVÂNCIA EM BUSCA DA DISCIPLINA, 44 
Humberto Falcão Martins 
ESTRATÉGIA E GESTÃO DE MUDANÇAS NAS POLÍTICAS DE 
GESTÃO PÚBLICA, 61 
Francisco Gaetani 
ABRINDO A CAIXA PRETA DO ESTADO: A ECONOMIA 
POLÍTICA DA INFORMAÇÃO, 74 
Marcos Fernandes Gonçalves da Silva 
INTERVENÇÃO ESTATAL, AGÊNCIAS REGULADORAS E 
CONTROLE DO PODER ECONÔMICO, 84 
Arthur Barrionuevo Filho 
POSSIBILIDADES E DIFICULDADES DAS ORGANIZAÇÕES 
SOCIAIS, 92 
Carlos Américo Pacheco 
A NOVA SOCIEDADE CIVIL E SEU PAPEL ESTRATÉGICO 
PARA O DESENVOLVIMENTO, 101 
Augusto de Franco 
  
 
9 
ORGANIZAÇÕES SOCIAIS: A EXPERIÊNCIA DA SECRETARIA 
DE ESTADO DA SAÚDE DE SÃO PAULO, 168 
Márcio Cidade Gomes 
RESPONSABILIDADE FISCAL: A AGENDA INCOMPLETA, 189 
José Roberto R. Afonso 
PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO COMO INSTRUMENTOS DE 
GESTÃO, 202 
Ariosto Antunes Culau 
GESTÃO PÚBLICA ORIENTADA PARA RESULTADOS NO 
BRASIL, 215 
Ariel Garces e José Paulo Silveira 
UM GOVERNO MATRICIAL: ESTRUTURAS EM REDE PARA 
GERAR RESULTADOS DE DESENVOLVIMENTO, 239 
Caio Marini e Humberto Falcão Martins 
FRAGMENTAÇÃO E INTERSETORIALIDADE: EM BUSCA DE 
UMA AGENDA DA INTEGRAÇÃO, 282 
Humberto Falcão Martins 
GOVERNO ELETRÔNICO E NOVOS PROCESSOS DE 
TRABALHO, 309 
Roberto Meizi Agune e José Antônio Carlos 
ORGANIZAÇÕES PÚBLICAS DE QUALIDADE, 323 
Paulo Daniel Barreto Lima 
POLÍTICAS INTEGRADAS DE RECURSOS HUMANOS PARA O 
SETOR PÚBLICO, 337 
Nelson Marconi 
MOTIVAÇÃO, CLIMA ORGANIZACIONAL E QUALIDADE DE 
VIDA, 356 
Ana Maria Brescancini 
CAPACITAÇÃO PARA A GESTÃO POR COMPETÊNCIAS, 368 
Maria Cecília Araújo da Silva 
AVALIAÇÃO DE RESULTADOS: A EXPERIÊNCIA DO 
GOVERNO FEDERAL, 385 
Pedro Antonio Bertone Ataíde 
 
 
 
6 
GESTÃO DO CONHECIMENTO COMO SISTEMA DE GESTÃO 
PARA O SETOR PÚBLICO, 415 
Espartaco Madureira Coelho 
CONHECIMENTO, COMUNIDADES E INOVAÇÃO, 440 
Paulo Sérgio Vilches Fresneda 
A INSTITUIÇÃO DO CÓDIGO DE CONDUTA DA ALTA ADMINISTRAÇÃO 
FEDERAL, 447 
João Geraldo Piquet Carneiro 
SOBRE OS AUTORES, 454 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
  
 
9 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
Evelyn Levy e Pedro Anibal Drago 
Com a presente coletânea gostaríamos de apresentar, para o público-
leitor, um panorama do ―estado da arte‖ da gestão pública no Brasil, especial-
mente a experiência da última década do Governo federal e do Governo do 
Estado de São Paulo. Essa escolha é parcial e obviamente traz omissões im-
portantes, como o trabalho desenvolvido nos outros poderes, em outros esta-
dos e nos municípios, que igualmente merece registro e análise. Esperamos, 
ainda assim, estar contribuindo para os estudos da área, bem como o aperfei-
çoamento de nossas instituições. 
Os temas aqui tratados foram inicialmente propostos a um conjunto de 
especialistas, que os apresentaram, no âmbito do ―Programa Avançado em 
Gestão Pública Contemporânea‖ – promovido pela Casa Civil em parceria 
com a Fundap, de março a dezembro de 2004 –, aos integrantes da alta admi-
nistração do Governo de São Paulo. 
Embora os autores tenham diferentes trajetórias, os capítulos se alicer-
çam sobre o conhecimento, a reflexão e a experiência dos próprios protagonis-
tas de muitos dos processos de mudanças dos quais está se falando. Assim, o 
leitor encontrará – em muitos dos textos – a localização teórica do assunto, sua 
reconstrução histórica, bem como análises comparativas entre o Brasil e outros 
países, mas também depoimentos de quem liderou, ou ainda lidera, esses pro-
cessos. Em muitos casos, o leitor terá oportunidade de acompanhar os dilemas 
vividos por aqueles que tomaram decisões importantes no curso desses proces-
sos, ou cuja ação foi de alguma forma modificada pelo contexto. Isso significa 
que, em vários momentos, a leitura explicita a tensão entre teoria e realidade, 
tal como tem sido vivida no âmbito da administração pública brasileira. Cre-
mos que isso favorecerá tanto aqueles cujo objetivo é a produção do conheci-
mento, como aqueles que vivem, igualmente como sujeitos, o papel de empre-
ender processos de transformação da gestão pública. 
 
 
 
8 
O caminho que percorremos foi do geral para o particular. O texto de 
abertura é de autoria do ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, cuja impor-
tância para a construção do novo modelo de funcionamento da administra-
ção pública brasileira (e latino-americana) dispensa referência. Mas importa 
assinalar que Bresser, ao lado dos textos de Rezende e Martins, que se se-
guem, está preocupado em mostrar os vínculos entre a gestão pública, a de-
mocracia e o desenvolvimento. Bresser retoma o modelo de reforma admi-
nistrativa por ele proposto, recuperando seus fundamentos teóricos, mas 
também faz uma avaliação retrospectiva dos avanços e dos obstáculos que 
encontrou. Ao final, depois de mostrar como o Estado brasileiro tem pro-
gressivamente vencido sua crise, dirige sua atenção para os aspectos macro-
econômicos que, a seu ver, o Brasil ainda não foi capaz de enfrentar. Re-
zende e Martins contribuem com análises comparativas sobre a natureza dosmodelos que estão sendo implementados. Voltam, portanto, a colocar os 
ajustes e dissonâncias entre as mudanças na gestão pública e o contexto his-
tórico mais amplo. Silva contribui com um texto que explica as bases teóri-
cas do modelo que vem sendo adotado, especialmente pela Nova Gestão 
Pública, tanto para controlar organizações e burocratas, como para ampliar a 
transparência, evitando a corrupção. 
O texto de Gaetani nos faz refletir sobre as diferentes reformas admi-
nistrativas havidas no Brasil, suas características e processos de implemen-
tação. Problematiza a gestão como política pública, os atores que confor-
mam essa arena e as estratégias adotadas para sua transformação. 
Barrionuevo Filho, Franco, Pacheco e Gomes tratam dos novos modelos 
organizacionais – agências reguladoras, Oscips e organizações sociais – expli-
citando o papel das novas regras institucionais para cumprir atribuições que 
fortalecem o papel do Estado (Estado-rede), aperfeiçoando o funcionamento 
do mercado e a produção de serviços públicos. Em cada um de seus textos o/a 
leitor/a encontrará os acertos e desacertos dessas experiências iniciais. 
Afonso, Culau, Garces e Silveira apresentam textos sobre as mudanças 
na gestão fiscal e financeira (LRF), orçamentária e seus vínculos com o pla-
nejamento por programas. Mostram as conquistas feitas nesse âmbito e os 
desafios que ainda se colocam para a implementação das políticas públicas, 
que efetivamente esteja focada na resolução de problemas. O texto de Mari-
ni e Martins complementa esses três textos apontando caminhos para uma 
gestão adequada aos programas, dentro de um governo ―matricial‖. ―Frag-
mentação e intersetorialidade, uma agenda de integração‖, também de Mar-
tins, discute com mais detalhe a questão da coordenação governamental, 
  
 
9 
sempre muito difícil em vista de estarmos diante de organizações comple-
xas, determinadas por forças díspares e múltiplas. 
Barreto Lima, Agune e Carlos dão sua contribuição referindo-se à 
transformação dos processos de trabalho nas organizações públicas, o pri-
meiro a partir de programas de qualidade, os últimos através da introdução 
do governo eletrônico. 
Marconi, Brescancini e Araújo da Silva desenvolvem as questões mais 
relevantes referentes à gestão de pessoas no setor público, um problema cen-
tral na agenda de mudanças e especialmente complexo no Brasil pela heran-
ça patrimonialista ainda recente. 
O texto de Bertone Atayde dialoga com os de Garces e Silveira, Barre-
to Lima e Marconi, ao introduzir a questão da avaliação. Ao lado de trazer a 
experiência recente em diversos países, Bertone narra a experiência brasilei-
ra de avaliação de programas e sua integração com a avaliação do desempe-
nho de pessoas e organizações. 
Madureira e Fresneda trazem aportes bastante equilibrados sobre as 
possíveis contribuições da gestão do conhecimento, no atual estágio de nos-
sas administrações. 
O texto de Piquet Carneiro finaliza o livro, expondo a experiência com 
o ―Código de Conduta da Alta Administração‖, abrindo a discussão sobre a 
ética no serviço público. 
Ao término do percurso, imaginamos que o leitor terá visitado os prin-
cipais tópicos que hoje preocupam administradores e estudiosos; terá prova-
velmente observado que ainda há um longo caminho a percorrer para que 
nossas instituições atendam a contento às demandas de nossa sociedade; 
mas também terá conhecido mais de perto os progressos que já foram feitos 
e as dificuldades que se interpuseram no meio do caminho. De toda maneira, 
acreditamos que os avanços somente serão maiores e mais velozes à medida 
que a experiência for colocada em debate público e as análises se aprofunda-
rem. Era essa nossa intenção. 
 
 
São Paulo, maio de 2005 
 
 
 
 
 
 
 
10 
 
 
 
 
REFORMA DA GESTÃO E AVANÇO 
SOCIAL EM UMA ECONOMIA SEMI-
ESTAGNADA
1
 
Luiz Carlos Bresser-Pereira 
Vinte e cinco anos depois de desencadeada a grande crise da dívida ex-
terna, vinte anos depois da redemocratização do Estado brasileiro, e dez 
anos depois de iniciada a Reforma da Gestão Pública de 1995/98, enquanto 
se observa no país um grande desenvolvimento político – do qual a reforma 
da gestão faz parte – e um substancial avanço social – que se expressa na 
melhoria substancial dos indicadores sociais –, a economia praticamente não 
cresce em termos de renda por habitante. O avanço político teve como eixos 
a transição e consolidação da democracia e um dinâmico processo de refor-
mas institucionais. O desenvolvimento social apoiou-se no aumento da carga 
tributária, na forte elevação do gasto social per capita e em políticas sociais 
mais adequadas às necessidades dos cidadãos. Enquanto a Reforma da Ges-
tão Pública de 1995/98 era um fruto por excelência do avanço político, ela 
vem contribuindo para o avanço social. Já a semi-estagnação econômica foi 
fruto, primeiro, da crise da dívida externa, da crise fiscal do Estado e da alta 
inflação, mas – desde que a estabilidade de preços foi alcançada em 1994 – só 
políticas macroeconômicas equivocadas, baseadas em uma ortodoxia conven-
cional, podem explicar a sua continuidade. 
 
1
 Agradeço os comentários de Ângela Santana, Carmen Varela, Evelyn Levy e Helena 
Pinheiro, e o apoio do Núcleo de Pesquisas e Publicações da Fundação Getúlio Var-
gas, São Paulo. 
Neste paper, vou procurar demonstrar e aprofundar essas questões, concen-
trando minha atenção na reforma da gestão e no caráter desequilibrado do 
desenvolvimento brasileiro, que é grande no plano político e social, mas quase 
 
 
nulo no econômico. Enquanto, desde 1980, o crescimento irrisório da renda per 
capita, de não mais do que 8,4%, indica que não está havendo desenvolvimento 
econômico, os avanços nos planos democrático e institucional são consideráveis 
(inclusive a Reforma da Gestão Pública de 1995/98) e, no plano social, a melho-
ria dos indicadores sociais tem sido significativa. E, no final, vou argumentar 
contra o discurso dominante que faz a superação da semi-estagnação depender 
da introdução de reformas institucionais ou microeconômicas. Embora sejam 
importantes, estas reformas só vão produzir efeitos a médio e longo prazo. Mais 
urgente para a retomada do desenvolvimento é a mudança da política macroeco-
nômica – esta sim uma mudança com efeitos imediatos que poderá arrancar a 
economia do país da semi-estagnação. 
Não discutirei, neste trabalho, a política macroeconômica. Limitar-me-
ei a examinar, na primeira seção, o desenvolvimento político e, em especial, 
a Reforma da Gestão Pública de 1995/98, da qual participei diretamente; na 
segunda seção, a relacionar o avanço da democracia ao aumento do gasto 
social e à substancial melhoria dos indicadores sociais; e, na terceira seção, a 
fazer uma breve análise dos limites das reformas institucionais e da necessi-
dade urgente de mudar a política macroeconômica. 
DESENVOLVIMENTO POLÍTICO E REFORMA DA GESTÃO 
PÚBLICA 
Os países ou estados nacionais desenvolvidos, apesar de todas as dificul-
dades que enfrentam, tendem a ser mais democráticos e mais republicanos à 
medida que aumenta a participação social na política. A organização do Estado 
tende a ser mais descentralizada e sua administração mais gerencial. No plano 
social, a onda neoliberal que começou no final dos anos 1970 representou uma 
ameaça aos direitos sociais alcançados duramentepelos trabalhadores daqueles 
países, mas a grande maioria desses direitos foi conservada. Não está claro, 
porém, como será o mundo em termos econômicos. A globalização exige que 
os estados nacionais sejam cada vez mais competitivos – o que os obriga a 
combinar de forma pragmática a alocação de recursos pelo mercado e a inter-
venção estratégica do Estado, em um quadro de estabilidade macroeconômica 
–, mas é difícil estabelecer parâmetros para essa combinação. 
O Brasil apresenta evolução paralela àquela que vem ocorrendo nos pa-
íses ricos, mas, como país em desenvolvimento, mostra peculiaridades im-
portantes. No plano político, a democracia não tem cessado de avançar em 
termos institucionais e de práticas políticas desde que, em 1985, consumou-
se a transição democrática. A nova Constituição, em 1988, representou um 
 
 
grande avanço e alguns retrocessos – os quais não se cristalizaram, mas estão 
sendo corrigidos à medida que a Constituição é emendada. As práticas políti-
cas, por sua vez, continuam muito aquém do desejável, mas o clientelismo é 
cada vez mais criticado, a corrupção é cada vez mais investigada, e a clássica 
impunidade dos políticos e, mais amplamente, das classes dirigentes no Bra-
sil vai pouco a pouco sendo combatida. O grande avanço em relação ao fi-
nanciamento das campanhas políticas foi dado pela criação do horário gratui-
to na rádio e televisão, mas só se completará quando for aprovado o financi-
amento público de campanha. Nesse momento estaremos, no plano político-
democrático, próximos aos mais avançados países europeus, e mais avança-
dos do que os Estados Unidos. 
A democracia brasileira vai assim deixando de ser uma democracia de 
elites para se transformar em uma democracia de opinião pública, na qual já 
podem ser percebidas características da democracia participativa ou republi-
cana. Adoto uma tipologia histórica das democracias modernas que tem co-
mo base as democracias avançadas, iniciando com a democracia de elites (na 
primeira metade do século XX), passando para a democracia de opinião pú-
blica (a partir do fim da Segunda Guerra Mundial) e começando a ser parti-
cipativa ou republicana no final do século (Bresser-Pereira, 2004). O Brasil 
acompanha essas tendências, mas, como é próprio dos países em desenvol-
vimento, sobrepõe ou atropela as etapas. Estamos ainda transitando da de-
mocracia de elites para a democracia de opinião pública, mas já há caracte-
rísticas da democracia republicana, como os processos participativos oriun-
dos de organizações da sociedade civil, sejam elas organizações públicas 
não-estatais de controle e advocacia social, sejam organizações corporativas, 
tais como as associações representativas de interesses e sindicatos. 
No plano da gestão pública, o progresso nos últimos vinte anos foi tam-
bém extraordinário. A Constituição de 1988 representou um retrocesso nesse 
campo, uma vez que criou privilégios, inaceitáveis, para a burocracia públi-
ca; mas, mesmo nesse momento, houve um avanço administrativo quando foi 
estabelecido o princípio da descentralização dos serviços sociais, para os es-
tados e municípios. 
A grande mudança administrativa e organizacional do Estado brasileiro 
começou, entretanto, com a Reforma da Gestão Pública de 1995/98. Através 
dela, o Brasil acompanha, com uma pequena defasagem, a segunda grande 
reforma do Estado moderno. A primeira foi a reforma burocrática, que ocor-
reu nos países europeus desenvolvidos no final do século XIX, nos Estados 
Unidos no início do século XX, e no Brasil a partir de 1936/38. É a reforma 
que substitui a burocracia patrimonialista por uma burocracia e por um estilo 
 
 
de administração weberianos. A partir dos anos 80, porém, começa na Ingla-
terra, e depois se espalha para a maioria dos países desenvolvidos, a reforma 
da gestão pública, que o Brasil adotará já nos anos 1990. 
A Reforma da Gestão Pública de 1995/98 estabeleceu dois princípios 
para a organização do Estado brasileiro e um novo princípio para a sua 
administração. O primeiro princípio organizacional é a terceirização, ou 
‗publicização‘, das atividades exclusivas de Estado: terceirizar para empre-
sas privadas os serviços auxiliares do Estado (como obras públicas, limpe-
za, serviços de alimentação, digitação etc.) e publicizar os serviços sociais, 
contratando organizações públicas não-estatais para realizá-los mediante 
contratos de gestão. O segundo princípio organizacional é de, no caso das 
atividades exclusivas de Estado, tornar mais descentralizadas as agências 
executivas e reguladoras, garantindo maior autonomia para seus gestores e 
exigindo deles maior responsabilização pública (accountability). O novo 
princípio de gestão é a substituição parcial dos controles burocráticos clás-
sicos (supervisão, regulamentação detalhada e auditoria) pelos controles ou 
sistemas de responsabilização gerenciais: o controle por resultados, a com-
petição administrada por excelência e o controle social por organizações 
da sociedade civil e pela mídia. 
O objetivo fundamental da Reforma da Gestão Pública de 1995/98 foi 
tornar mais eficiente o Estado. Para isto, partia do pressuposto de que o Es-
tado brasileiro já é democrático. A descentralização, com a transferência de 
decisões seja para organizações públicas não-estatais seja para as agências 
executivas, só é viável no contexto de uma sociedade civil com capacidade 
para exercer controle social. As reformas burocráticas eram necessariamente 
centralizadoras, porque ocorreram no século XIX em estados liberais, mas 
ainda autoritários; já as reformas da gestão pública podem envolver descen-
tralização e publicização, porque estão ocorrendo em países em que o regime 
político é democrático. 
A Reforma da Gestão Pública de 1995/98 parte de uma visão crítica da 
administração pública burocrática e propõe substituí-la pela administração 
pública gerencial, mas não confunde administração burocrática com os buro-
cratas públicos que a executam. Estes recebem vários nomes sinônimos – 
burocrata, alto servidor público, gestor público, administrador público, ad-
ministrador profissional, tecnoburocrata público, técnico do Estado –, mas 
são essenciais para a reforma da gestão pública. Eles fazem parte de uma 
categoria social ampla, de uma classe social que deriva seu prestígio e seus 
rendimentos não do capital (como o fazem os capitalistas) nem do trabalho 
manual (como é o caso dos operários), mas do seu conhecimento técnico e 
 
 
organizacional
2
. Enquanto nas organizações públicas os gestores públicos 
dividem seu poder com os políticos e com os cidadãos, nas organizações pri-
vadas dividem-no com os capitalistas. Não existe a possibilidade de reformar 
o aparelho do Estado, e substituir gradualmente a administração pública bu-
rocrática pela gestão pública, sem contar com a participação ativa dos buro-
cratas públicos. São eles e os políticos (ou seja, os ‗agentes públicos‘) que, 
no núcleo estratégico do Estado, organizam e dirigem toda a organização 
estatal. São eles que, fazendo parte das carreiras exclusivas de Estado, detêm 
em alguma medida o poder de Estado. 
Estes são pressupostos da Reforma da Gestão Pública de 1995/98, cuja 
implementação, longa e contraditória, não se encerrou naquele período. Essa 
reforma continua sendo implementada – e com sucesso, ainda que lentamen-
te –, porque correspondia e continua a corresponder a uma necessidade do 
Estado e da sociedade brasileiros. Essa reforma logrou deixar uma marca 
definitiva na gestão do Estado brasileiro porque, ao colocar o gestor público 
no centro da reforma e ao demandar para ele mais autonomia e mais respon-
sabilização, logrou conquistarseus corações e mentes
3
. Os administradores 
públicos mais competentes compreenderam que a reforma os valorizava e 
prestigiava. Logo, equivocam-se Clovis Bueno de Azevedo e Maria Rita 
Loureiro quando afirmam que a Reforma da Gestão Pública de 1995/98 su-
bestimou a importância do recrutamento por concurso e a valorização das 
carreiras no serviço público (Azevedo e Loureiro, 2003). Pelo contrário, ela 
enfatiza a contínua profissionalização dos gestores públicos, e das carreiras 
exclusivas de Estado, e a exigência de concurso público para seu recrutamen-
to. A importância dada à necessidade de fortalecer as atividades exclusivas 
do Estado e, particularmente, o núcleo estratégico do Estado pode ser tradu-
zida, dentre outras medidas implementadas nesse período, pela promoção 
anual de concursos públicos para todas as carreiras de Estado do Governo 
federal – iniciativa inédita na história da administração pública brasileira. 
Os autores mencionados parecem supor que a existência, no Estado, de 
uma boa burocracia – ou seja, de administradores profissionais competentes 
e dotados de espírito público – significa que a administração é burocrática. 
Assim, a partir da leitura do Plano Diretor, perguntam: ―Se há uma boa bu-
 
2
 Refiro-me à tecnoburocracia ou classe média profissional, que existe tanto nas organi-
zações privadas quanto públicas. 
3
 Em ―Reflexões sobre a Reforma Gerencial de 1995‖ analisei as estratégias que adotei para 
aprovar a reforma, e apresentei as pesquisas então realizadas que mostram o alto nível de 
aprovação alcançado pela reforma entre os altos servidores públicos brasileiros. 
 
 
rocracia, o modelo a seguir, dito gerencial, seria ainda burocrático, cujos 
princípios estão flexibilizados, logo fortalecidos?‖. Não, respondo. Ou o mo-
delo é o da administração pública burocrática, ou é o da administração ge-
rencial (que hoje prefiro chamar de modelo da gestão pública). Nos docu-
mentos e nos trabalhos sobre a Reforma da Gestão Pública de 1995/98, dis-
tingui com clareza a administração pública burocrática tanto da administra-
ção patrimonialista que a antecede, quanto da administração pública gerenci-
al ou do modelo da gestão pública que a sucede. Existem diferenças concei-
tuais entre as três formas de organizar e gerir o Estado, mas estas diferenças 
não derivam da qualidade dos burocratas, e sim do modelo de organização e 
administração do Estado. 
Nos três modelos, o Estado é gerido por políticos e burocratas, e, mes-
mo no caso do modelo patrimonialista, não há razão para supor que os buro-
cratas ou administradores sejam incompetentes. O modelo de organização e 
administração no qual operam é diferente, e, em conseqüência, as qualidades 
requeridas dos burocratas serão diferentes. A gestão pública exige adminis-
tradores ou burocratas ainda mais competentes e mais prestigiados do que os 
que existiam na administração burocrática, porque eles são mais autônomos, 
dirigem agências ou departamentos mais descentralizados, e devem tomar 
decisões continuamente – algo que no modelo burocrático não era apenas 
dificultado pelo seu caráter centralizado: era proibido, porque visto como 
marcado pelo vício da ‗discricionariedade‘. Entendia-se o princípio do Esta-
do de direito, ou do império da lei, de forma estrita, não cabendo ao adminis-
trador público outra função senão aplicar a lei. 
Não é, portanto, pelo fato de o Estado brasileiro contar com uma boa 
burocracia que o modelo de administração é burocrático. A organização do 
Estado precisa de um grupo de gestores altamente capacitado, que deve ser 
tão responsabilizável, no plano democrático, quanto autônomo, no gerencial. 
Conforme afirmei insistentemente enquanto fui responsável pela área, o Go-
verno federal já conta, em linhas gerais, com uma burocracia bem seleciona-
da por concursos públicos, bem treinada e, portanto, competente. Sem ela, 
não poderia ter pensado na reforma. Foi a competência da burocracia pública 
brasileira que permitiu ao Brasil ser o primeiro país em desenvolvimento do 
mundo a começar sua reforma da gestão pública. A partir de 1995, um núme-
ro grande de administradores públicos vem sendo admitido anualmente para 
todas as carreiras de Estado. A alta e competente burocracia de Brasília está, 
assim, desde então, sendo renovada gradualmente, de acordo com a filosofia 
de concursos e de recursos humanos da Reforma da Gestão Pública de 
1995/98. Este grande grupo de administradores, que não têm paralelo em 
 
 
nenhum outro país latino-americano, é essencial para que o Estado possa de-
sempenhar as funções estratégicas que dele se espera no mundo global. 
Esta reforma vai, gradualmente, substituindo o modelo burocrático pelo 
da gestão pública. Jamais, porém, pretendeu ser uma revolução. É curioso, 
portanto, ver que Azevedo e Loureiro surpreenderam-se agradavelmente 
quando leram, no livro La Responsabilización en la Nueva Gestión Pública, 
editado pelo Conselho Científico do Clad (que presido)
4
, que a adoção das 
três formas próprias de responsabilização gerencial (administração por resul-
tados, por concorrência administrada e por controle social) não prescinde o 
uso das formas clássicas de controle burocrático (supervisão, regulamentação 
detalhada e auditoria), apenas diminui a ênfase que se deve nelas colocar. 
Em meus trabalhos anteriores, em que discuto o ‗leque de controles‘ (Bres-
ser-Pereira, 1997, 1998, 2004), deixei sempre claro que as novas formas ge-
renciais de responsabilizar ou tornar ‗accountable’ os servidores públicos 
não dispensam as formas clássicas, burocráticas: apenas reduzem sua impor-
tância. A auditoria, por exemplo, continua essencial, mas deixa de controlar 
detalhadamente procedimentos, já que o importante é alcançar os resultados 
contratados. Através do processo gradual de implementação da reforma, os 
mecanismos gerenciais de responsabilização vão ganhando força, mas não é 
razoável esperar que os mecanismos burocráticos clássicos desapareçam 
completamente mesmo no longo prazo. 
Os obstáculos de implementação que a Reforma da Gestão Pública de 
1995/98 hoje enfrenta em nível federal não derivam da falta de valorização 
do burocrata público por parte dessa reforma, nem da resistência originada 
em servidores e em especialistas em direito administrativo, que ainda se man-
têm ou se manteriam fiéis ao velho modelo burocrático, mas da dificuldade 
que os economistas no Ministério do Planejamento e no Ministério da Fa-
zenda, preocupados com a redução da despesa pública, têm em aceitar uma 
reforma que, ao descentralizar, reduz aparentemente seu poder de controle 
sobre essa despesa e da falta de uma secretaria da presidência com nível mi-
nisterial para tratar das questões relativas à gestão. 
A grande maioria dos altos servidores públicos compreendeu que a Re-
forma da Gestão Pública de 1995/98 valorizou o seu trabalho, e por isso a 
apoiou. Apenas os servidores de nível mais baixo, que não pertencem a car-
reiras exclusivas de Estado, mostraram-se sempre contrários. Não é surpre-
endente, dado o fato de que a organização do novo Estado que surge da re-
 
4
 CLAD, Conselho Científico. (2000) As formas de responsabilização gerenciais discuti-
das nesse livro basearam-se em Bresser-Pereira (1998). 
 
 
forma da gestão pública prescinde desse tipo de servidor, necessitando ape-
nas de servidores altamente qualificados e capacitados, que exerçam funções 
com poder de Estado. As funções auxiliares (como serviços de limpeza, de 
alimentação, de digitação) serão terceirizadas. 
A Reforma da Gestão Pública de 1995/98 continua, porém, a enfrentar 
dificuldades com os economistas do governo. Estes apóiam em princípioa 
reforma, mas quando se trata de dar mais autonomia às agências executivas e 
às organizações sociais, resistem com medo de perder o controle das finanças 
públicas. Além disso, no caso da transformação de autarquias em organiza-
ções sociais, sentem-se tentados a reduzir, em seguida, suas dotações orça-
mentárias, não percebendo que o que se pretende com essa mudança não é 
reduzir imediatamente os custos, mas melhorar a quantidade e a qualidade 
dos serviços, com a adoção do novo modelo de organização, tornando-o pú-
blico não-estatal. 
Por outro lado, estou hoje convencido de que cometi um erro quando, 
em 1998, propus e apoiei a extinção do Mare (Ministério da Administração 
Federal e Reforma do Estado), que, entre 1995 e 1998, presidiu a reforma
5
. 
Como alternativa, ofereci a reversão do Mare à condição de secretaria da 
Presidência com nível ministerial (como era antes a Secretaria da Adminis-
tração Federal, SAF), mas esta alternativa só teria sentido se o presidente, 
que está sempre assoberbado de problemas, tivesse um interesse especial pe-
lo tema da gestão, vendo nele, como acontece hoje nos países ricos, uma 
questão política importante. Propus a extinção do Mare e a integração da 
função-gestão no Ministério do Planejamento, porque verifiquei que faltava 
ao Mare o poder executivo que sobrava no outro ministério, uma vez que 
controla o orçamento da República. No Mare, o poder era apenas persuasó-
rio. Embora esse seja o mais importante dos poderes em uma democracia, 
parecia-me insuficiente. Não previ, entretanto, que os ministros do Planeja-
mento concentrassem toda a sua atenção no orçamento e nos demais proble-
mas econômicos, deixando o problema da gestão em segundo plano. O resul-
tado da extinção do Mare foi que a função-gestão – que, entre 1995 e 98, foi 
exercida em nível de primeiro escalão – tem sido, desde então, exercida em 
nível de terceiro escalão, porque os ministros do Planejamento têm, invaria-
velmente, colocado seu secretário Executivo entre si próprios e o secretário 
da Gestão. Por outro lado, o secretário da Gestão deixou de ter poder sobre a 
 
5
 Expliquei as razões que me levaram a fazer esta proposta em Bresser-Pereira (1999). 
 
 
folha de pagamento, sobre a utilização da tecnologia da informação na gestão 
eletrônica e sobre a própria política de recursos humanos. 
O terceiro problema tem caráter político. Em 2003, assumiu o poder um 
partido político de quadros burocráticos médios – o Partido dos Trabalhado-
res –, que, durante os quatro anos em que a reforma foi definida e, basica-
mente, institucionalizada, se opôs sistematicamente a ela. Opunham-se por-
que eram de oposição e porque supunham, equivocadamente, que a reforma 
fosse contrária aos interesses de toda a burocracia pública, inclusive a de ní-
vel médio. No governo, seus dirigentes percebem que é essencial aumentar a 
eficiência e a efetividade do Estado. Só assim terão argumentos contra a di-
reita neoliberal que quer sistematicamente reduzir o Estado em nome da 
maior eficiência do setor privado. Só assim poderão dispor de recursos para 
aplicar em atividades sociais e de promoção do desenvolvimento. E só assim 
poderão melhorar a qualidade dos serviços sociais, existentes. Mas temem a 
reação dos níveis inferiores e médios do funcionalismo que constituem o PT 
e as críticas de que estão adotando políticas ‗neoliberais‘. Resulta daí um 
discurso contraditório e pouco convincente em relação à reforma. De um la-
do, falam contra a terceirização e a publicização; de outro, adotam de forma 
entusiástica a PPP (parceria público-privada) – uma estratégia de terceirização 
combinada com uma de financiamento de obras e serviços públicos. 
Não obstante essas dificuldades, a Reforma da Gestão Pública de 
1995/98 continua a ser implantada em todos os níveis do Estado brasileiro – 
federal, estadual e municipal –, uma vez que as idéias que defendeu foram 
vitoriosas e se tornaram dominantes na sociedade brasileira. A reforma ca-
minha, assim, de baixo para cima, a partir da iniciativa dos próprios gestores 
públicos e das demandas da cidadania. Caminha, também, porque ela se tor-
nou imprescindível para que o Estado possa ser razoavelmente eficiente e 
efetivo em um mundo globalizado, no qual a competição entre as empresas 
apoiadas por seus respectivos estados nacionais transformou-se na lei eco-
nômica global fundamental. Caminha, finalmente, porque a Reforma da Ges-
tão Pública de 1995/98 é um capítulo importante de um amplo processo de 
desenvolvimento político que vem ocorrendo no Brasil desde a transição pa-
ra a democracia. 
AVANÇO SOCIAL E AUMENTO DO GASTO PÚBLICO 
No campo social os avanços foram também extraordinários. Conforme 
verificamos pela Tabela 1, a expectativa de vida, que era de 62,5 anos em 
1980, aumentou em 8 anos, passando para 70,5 anos em 2000. Considerando 
 
 
esse mesmo período, a taxa de mortalidade infantil, que era de 69,1 por mil, 
baixou para 30,1 por mil, e a taxa de analfabetismo caiu de 31,9% para 
16,7%
6
. O Brasil, entretanto, continua apresentando uma das mais altas taxas 
de concentração de renda do mundo. As injustiças e os privilégios estão por 
toda parte, mas não há dúvida de que houve avanço no plano social. Muitos 
brasileiros se indignam com a situação de injustiça que caracteriza a socieda-
de brasileira. E não querem reconhecer os avanços nessa área, porque pen-
sam que tal reconhecimento enfraquece a luta contra a injustiça. Creio que 
estão enganados. Uma vez demonstrado que a melhoria dos indicadores so-
ciais é conseqüência do aumento do gasto público na área social, esses gastos 
tornam-se justificados politicamente. Se não houver esse reconhecimento dos 
avanços e a explicação dos mesmos através do aumento dos gastos sociais, 
ficarão fortalecidos os conservadores que querem reduzir o gasto social e a 
carga tributária. 
Tabela 1 
Brasil, 1980-2000  Dados Sociais 
 1980 2000 
Esperança de Vida ao Nascer (em anos) 62,5 70,5 
Taxa de mortalidade infantil/mil (em ‰) 69,1 30,1 
Taxa de Analfabetismo – Pessoas com 5 anos ou mais 
(em %) 
31,9 16,7 
Fonte: IBGE/PNAD 2002; www.ipeadata.gov.br ; www.inep.gov.br. 
O fato novo que possibilitou o avanço social foi o aumento do gasto 
público per capita a um nível muito maior do que o aumento da renda per 
capita. Verificamos pela Tabela 2 que, enquanto a renda por habitante per-
manecia quase estagnada, crescendo apenas 8,5% no período, o gasto social 
público per capita, incluindo União, estados e municípios, crescia 43,4%. 
Este dado é impressionante. O substancial aumento do gasto social per ca-
pita está certamente relacionado à transição para a democracia e à pressão 
dos eleitores por serviços sociais mais amplos e com melhor qualidade. Esse 
extraordinário aumento do gasto social, por sua vez, foi financiado pela ele-
vação da carga tributária, que subiu, no mesmo período, de 22% para 33% do 
 
6
 Fontes: IBGE/PNAD 2002; www.ipeadata.gov.br; www.inep.gov.br. A taxa de analfa-
betismo refere-se a pessoas com 5 anos ou mais. 
 
 
Tabela 2 
Brasil, 1980-2000  PIB e Gasto Social per Capita 
 1980 2000 Variação % 
PIB per capita – em R$ (preços de 2002) 6.951 7.544 8,5 
Gasto Social Público per capita em R$ 
(valores constantes para dez./2001) 
1.143,59 1.639,34 43,4 
Fonte: IBGE/PNAD 2002, www.ipeadata.gov.br; www.inep.gov.br. 
PIB
7
. O gasto social, portanto, foi efetivo em promover a melhoria das con-
dições de vida da população brasileira. 
Os efeitos dessa política social progressiva não aparecem nas estatísticas 
de concentração de renda, porque uma parte deles não envolve transferências 
monetáriase, por isso, não é considerada nos levantamentos do IBGE. A acele-
ração do progresso técnico, que aumentou a procura por trabalho qualificado e 
diminuiu a por trabalho não especializado, é o fator que, nos últimos trinta 
anos, vem provocando universalmente o aumento da concentração de renda. 
Esse processo certamente também está ocorrendo no Brasil, e, por isso, a taxa 
de concentração de renda não cede, apesar dos êxitos da política social. 
Foi a transição para a democracia que permitiu esse grande aumento 
dos gastos sociais, como também possibilitou que fosse melhorada a quali-
dade das políticas públicas sociais. A partir de 1983 (quando os primeiros 
governadores estaduais tomaram posse por eleições diretas) e de 1985 
(quando o primeiro presidente civil foi eleito), os eleitores passaram a ter 
condições de pressionar os políticos por melhores e mais amplos serviços 
sociais e por garantias de renda mínima, o que vem se expressando em um 
grande número de políticas de transferência de renda
8
. Estava claro, entretan-
 
7
 Fontes: IBGE/PNAD 2002; www.ipeadata.gov.br; www.inep.gov.br. 
8
 Segundo Gilberto Dimenstein (2004) relatórios oficiais afirmam que, apenas no plano 
federal, são distribuídos 48 milhões de benefícios na forma de transferências. A aposen-
tadoria rural atende a quase 6,8 milhões de pessoas; 824 mil idosos e portadores de de-
ficiência ganham um salário mínimo mensal; 700 mil crianças ganham uma renda para 
não trabalharem; 3,6 milhões de brasileiros recebem a bolsa-família, o que atinge pelo 
menos 11 milhões de pessoas. Adicionalmente existem os programas Bolsa-Escola, 
Vale-Gás, Cartão-Alimentação e Bolsa-Alimentação, que ainda não estão incorporados 
ao Bolsa-Família. Os estados de Goiás, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Minas Ge-
rais, Mato Grosso do Sul, Acre, Amazonas, Roraima, Amapá e Pará, além do Distrito 
Federal, contam com programas de transferência de renda. No caso de São Paulo, exis-
tem, além de recursos estaduais, programas de transferências de renda em cidades im-
 
 
 
to, para os estudiosos da questão social do Brasil, que não era possível me-
lhorar sensivelmente a distribuição de renda no país por meio de aumentos 
de salários, já que estes dependem do mercado, no qual prevalece uma clás-
sica oferta ilimitada de mão-de-obra não-qualificada. A solução demandada 
politicamente pela sociedade era, portanto, a única efetiva e recomendável do 
ponto de vista técnico: consistia em aumentar o gasto social. E isso foi reali-
zado com financiamento pela via do aumento da carga tributária
9
. 
A política social foi o maior êxito do novo regime democrático brasilei-
ro. O gasto social aumentou como conseqüência da pressão dos eleitores por 
mais e melhores serviços sociais de educação e saúde, e pela adoção de di-
versos mecanismos de renda mínima. Ao mesmo tempo, melhorava a quali-
dade das políticas sociais, uma vez que estas eram mais fruto de se ouvir a 
sociedade e do debate público do que da decisão ‗iluminada‘ dos técnicos. 
Houve, portanto, melhores decisões – decisões mais efetivas, mais adequadas 
a resolver o problema específico a que se destinavam – e maior disponibili-
dade de recursos (sempre escassos) para financiá-las. 
Seria interessante saber se a melhoria dos indicadores sociais ocorreu 
devido, também, ao aumento da eficiência dos serviços sociais do Estado. A 
motivação fundamental da Reforma da Gestão Pública de 1995/98 foi exa-
tamente essa: permitir que o Estado brasileiro lograsse maior quantidade e 
melhor qualidade dos seus serviços públicos, a um custo menor. Na primeira 
reunião da Câmara da Reforma do Estado, em 1995, solicitei aprovação para 
a política de privilegiar, do ponto de vista administrativo, os ministérios da 
área social. Distingui os ministérios da área econômica (―que já tinham mui-
tos economistas e administradores, e dispunham de recursos abundantes‖) e 
os ministérios da área de infra-estrutura (―que contavam com engenheiros 
qualificados para a administração e recursos razoáveis‖), dos ministérios da 
área social (aos quais ―faltavam sejam recursos administrativos sejam orça-
mentários‖). E afirmei que a prioridade do Mare seria ―fornecer gestores pú-
blicos de alto nível e dar assessoria administrativa para os ministérios da área 
social‖. Essa política foi rigorosamente seguida nos quatro anos em que ocu-
pei a direção do Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado. 
 
portantes como São Paulo, Santo André, Campinas e Ribeirão Preto. Técnicos do Ban-
co Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) comentam que tanta 
gente atendida compõe, nesse caótico desenho, um dos maiores programas do mundo 
de transferência de renda via governo. 
9
 Infelizmente o aumento da carga tributária também destinou-se ao financiamento do 
serviço da dívida pública, onerado por taxas de juros absurdas decididas pelo Banco 
Central. 
 
 
Consegui assessorar de forma efetiva principalmente o Ministério da Saúde 
(Bresser-Pereira, 1998: Cap. 14). Estou seguro de que – dez anos depois do 
início da reforma em todo o Brasil –, embora o avanço dos indicadores soci-
ais se deva principalmente ao aumento do gasto com a melhoria da qualidade 
das políticas públicas (mais orientadas para as necessidades dos cidadãos), 
resultados efetivos foram alcançados em termos de aumento da eficiência dos 
serviços sociais. 
Há, entretanto, um longo caminho a percorrer no campo do aumento da 
quantidade e da qualidade dos serviços sociais, já que os índices de pobreza 
e de concentração de renda, no Brasil, continuam dramáticos. E o problema 
está em saber como financiar esse processo. A solução via reforma da gestão 
pública é fundamental, mas demanda tempo. Por outro lado, o financiamento 
via aumento da carga tributária está-se tornando cada vez mais problemático. 
A carga tributária não tem parado de crescer desde a transição democrática, 
tendo subido de 22%, na época da transição, para 36% do PIB hoje, e não há 
mais condições, nem econômicas nem políticas, de ampliar os serviços soci-
ais com esse tipo de financiamento. 
UMA ECONOMIA SEMI-ESTAGNADA 
Existe uma forma óbvia de continuar a aumentar o gasto social sem 
aumentar a carga tributária. Para isto seria necessário que o país gastasse 
menos com juros e retomasse o desenvolvimento econômico. Dessa forma, 
recursos não envolvendo aumento da carga tributária viriam de duas fontes: 
da diminuição do brutal volume de juros pagos aos rentistas pelo Estado bra-
sileiro, e do crescimento da própria economia, que faria aumentar o volume 
dos recursos tributários arrecadados. 
Nossa economia, porém, encontra-se semi-estagnada desde 1980, como 
mostra o crescimento mínimo da renda por habitante. Esta estagnação deveu-
se, inicialmente, à grande crise da dívida externa, que atinge o Brasil e os 
demais países latino-americanos a partir de 1979, e, mais amplamente, à crise 
do Estado e às altas taxas de inflação, que decorreram em grande parte do 
excessivo endividamento externo ocorrido nos anos 1970. 
Entretanto, para fazer face à crise, grandes ajustes foram realizados, re-
formas foram implementadas e, em 1994, através de um choque heterodoxo 
bem concebido – o Plano Real –, o país logrou estabilizar seus preços, e 
imaginou-se que estava pronto para retornar ao desenvolvimento. Não foi 
isso, porém, que ocorreu. Aceitando conselhos de Washington e Nova York, 
que se consubstanciaram no que tenho chamado de Segundo Consenso de 
 
 
Washington, a instabilidade macroeconômica foi mantida não porque voltas-
se a alta inflação, mas porque uma perversa equação macroeconômica, carac-
terizada por uma alta taxa de jurosbásica (determinada pelo Banco Central) 
e uma taxa de câmbio alta (valorizada), impedia que o país alcançasse a esta-
bilidade intertemporal de suas contas públicas e de suas contas externas 
(Bresser-Pereira, 2003a). Esta ‗ortodoxia convencional‘
10
 – que os países 
asiáticos sabiamente não adotam, mas que os brasileiros e, em geral, os lati-
no-americanos não sabem recusar – afirma que para que a economia brasilei-
ra volte a crescer é preciso continuar a dar absoluta prioridade ao combate à 
inflação, através do ajuste fiscal e da elevação da taxa de juros básica, e da 
adoção de reformas institucionais orientadas para o mercado. 
Embora considere necessárias as reformas institucionais ou microeco-
nômicas, desde que realizadas com equilíbrio e voltadas para a realidade na-
cional, não acredito que elas sejam o que de mais urgente e efetivo se possa 
fazer para a retomada do desenvolvimento econômico. Reformas institucio-
nais são sempre necessárias. Os parlamentos existem para realizá-las. Elas 
levam tempo para serem aprovadas, e mais tempo ainda para serem imple-
mentadas. Seus efeitos são, por definição, de médio e longo prazo. 
A retomada do desenvolvimento hoje no Brasil é algo que depende de 
medidas de curto prazo. Depende, essencialmente, de que se alcance efeti-
vamente a estabilidade macroeconômica. Em 1994, o Brasil alcançou a esta-
bilidade de preços, mas com prejuízo da estabilidade intertemporal das con-
tas externas e das contas públicas. Das contas externas, devido a uma taxa de 
câmbio valorizada, muito baixa; das contas públicas, devido a uma taxa bási-
ca de juros altíssima, incidindo sobre uma dívida pública elevada. Portanto, 
para que se retome o desenvolvimento econômico, será necessário, além de 
continuar a controlar a despesa pública, mudar a equação macroeconômica 
perversa de alta taxa de juros e baixa taxa de câmbio que tem caracterizado a 
economia brasileira nos últimos anos (Bresser-Pereira e Nakano, 2002). 
Ao contrário do que supõe a sabedoria convencional, a estabilidade 
macroeconômica do Brasil é incompatível com a ortodoxia convencional, 
que expressa os interesses dos rentistas e do sistema financeiro nacional e 
internacional. É principalmente incompatível com uma taxa básica de juros 
 
10
 A ortodoxia convencional é um conjunto de crenças econômicas, geralmente com fun-
damentação neoclássica, que traduz o pensamento econômico dominante em Washing-
ton e Nova York em relação aos países em desenvolvimento. Nos anos 80 assumiu a 
forma do Primeiro Consenso de Washington, e, a partir dos anos 90, a do Segundo 
Consenso de Washington. No Brasil essa ortodoxia convencional se expressa através 
das opiniões dos empresários e economistas do sistema financeiro, cujos interesses 
atendem, e das políticas adotadas pelo Banco Central do Brasil. 
 
 
(Selic) do Banco Central que nada tem a ver com as classificações de risco 
do Brasil. Alcançada a verdadeira estabilidade macroeconômica, o Brasil 
poderia retomar o desenvolvimento e não apenas aumentar o gasto social, 
mas reduzir o emprego e aumentar os salários reais. 
Enquanto, porém, uma democracia pujante tem logrado êxitos impor-
tantes na área social, principalmente em níveis municipal e estadual, a eco-
nomia brasileira tem-se mantido semi-estagnada. O crescimento de 8,5% da 
renda per capita em vinte anos é irrisório. Entre 1950 e 1980, a renda per 
capita dos brasileiros crescia essa porcentagem em dois, ao invés de em vinte 
anos. Nos anos 2000, o crescimento da renda per capita continua lastimável. 
Em 2003, caiu 1,5%
11
. Não cabe aqui discutir os grandes equívocos de políti-
ca econômica que têm sido cometidos nessa área
12
. Cabe, entretanto, assina-
lar que a causa principal destes erros e da crise econômica crônica em que 
vivemos desde 1980 foi, no início, uma conseqüência do endividamento ex-
terno excessivo e da crise fiscal do Estado, mas, desde a primeira metade dos 
anos 1990, esses problemas foram em grande parte superados com o Plano 
Real, de 1994. No entanto, a economia brasileira não voltou a crescer. Por 
quê? Basicamente por uma razão política. A revolução capitalista e democrá-
tica do Brasil foi completada, mas a revolução nacional – a transferência, 
para dentro do país, das principais decisões – não foi. Pelo contrário, sofreu 
uma interrupção e um retrocesso nos anos 1990. A ortodoxia convencional 
vinda de Washington e Nova York voltou a dirigir a economia brasileira. 
Nossas elites econômicas e políticas, que desde 1930 vinham desenvol-
vendo a capacidade de pensar e resolver os problemas nacionais, deixaram, 
de repente, de fazê-lo, respondendo à crise negativamente. Em nome da esta-
bilidade de preços, a política macroeconômica passou a sacrificar ou a esta-
bilidade da balança de pagamentos (através de taxa de câmbio valorizada) ou 
a estabilidade das contas públicas (através de política de juros básica absurda-
mente alta). Que uma política dessa natureza interesse aos rentistas brasileiros 
– que vivem de juros e consideram ‗mínima‘ a remuneração de 9% reais para 
seus empréstimos de curto prazo –, não surpreende. Que interesse ao sistema 
financeiro – que, além de lucrar com os juros dos seus empréstimos ao Esta-
 
11
 O PIB brasileiro decresceu 0,2% em 2003. O último ano em que o crescimento do PIB 
havia sido negativo foi 1992. Não é coincidência que, nesses dois anos, o Brasil seguia 
à risca acordo assinado com o FMI no final, respectivamente, de 1991 e 2002. Em am-
bos os casos, um acordo incompetente que partia de um diagnóstico macroeconômico 
errado e impunha políticas danosas ao país. 
12
 Minha reflexão sobre o assunto encontra-se, principalmente, em Desenvolvimento e 
Crise no Brasil (Bresser-Pereira, 2003b). 
 
 
do, depende das comissões que aufere sobre o volume total dos negócios –, é 
perfeitamente compreensível. Que os dois interessados justifiquem a política de 
juros altos, em nome do combate à inflação, é previsível. Também não há nada 
de surpreendente no fato de esse tipo de política ser recomendado pelo Fundo 
Monetário Internacional: afinal, é a ortodoxia convencional que essa institui-
ção adota, uma vez que representa, de um lado, a visão que o governo dos 
Estados Unidos tem dos problemas macroeconômicos mundiais e, de outro, 
os interesses do sistema financeiro internacional. 
É triste, porém, verificar como o restante de nossas elites econômicas e 
políticas não têm forças para se opor a esta política antinacional. Existe aí 
um problema político grave, que só será resolvido pelo próprio avanço da 
democracia brasileira e do debate público que lhe é inerente. A alienação das 
elites, que – ao copiarem os padrões de consumo do centro rico – aceitam, de 
forma acrítica, as idéias que vêm de lá, só poderá ser superada por meio des-
se debate e da indignação crescente da sociedade contra esse tipo de política 
macroeconômica. Ou, colocando-se a questão em outros termos, só retoma-
remos o desenvolvimento quando retomarmos também a nossa revolução 
nacional. 
A menor prioridade que estou atribuindo às reformas institucionais, in-
clusive à Reforma da Gestão Pública de 1995/98, não significa, obviamente, 
que elas não possam e não devam ser tocadas enquanto não se muda a políti-
ca macroeconômica, não se alcança a estabilidade macroeconômica e não se 
retoma o desenvolvimento. Estas reformas devem e estão continuando. O 
parlamento brasileiro tem logrado avanços importantes nessa direção, com o 
apoio da sociedade e a resistência de grupos minoritários, geralmente situa-
dos nos níveis inferiores do Estado brasileiro. Observe-se, porém, que esses 
avanços contam também com o apoio internacional – o quefacilita o proces-
so de reforma, mas o põe sob suspeita. Embora Washington e, particularmen-
te, o Banco Mundial resistam a admitir esse fato, instituições não se expor-
tam por um sem número de razões, a partir do fato simples de que políticas 
econômicas e normas legais são geralmente equivocadas quando impostas de 
fora. As instituições podem e devem ser importadas, mas importar institui-
ções significa introduzir alterações substanciais nas experiências estrangeiras 
e desenvolver novas idéias, de forma a alcançar instituições adaptadas às ne-
cessidades do país. 
A Reforma da Gestão Pública de 1995/98 é um exemplo do que afirmo. 
Ela nasceu da observação da experiência e da discussão das idéias sobre a 
reforma da gestão pública que estavam ocorrendo em alguns países desen-
 
 
volvidos – mas fomos capazes de formular novas idéias e de iniciar uma re-
forma voltada para a realidade e para os interesses nacionais. 
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CLAD – Conselho Científico, org. (2000) Responsabilización en la 
Administración Pública. Buenos Aires: EUDEBA; Caracas: CLAD – 
Consejo Latinoamericano de Administración para el Desarrollo. 
 
 
DIMENSTEIN, Gilberto (2004) ―Por que o Brasil não explode?‖ Folha de 
S.Paulo, 29 de fevereiro de 2004. 
MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL E REFORMA DO 
ESTADO – MARE (1995) Plano Diretor da Reforma do Aparelho do 
Estado. Brasília: Imprensa Nacional, novembro 1995. Plano aprovado pela 
Câmara da Reforma do Estado da Presidência da República em setembro de 
1995. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TENDÊNCIAS DA GESTÃO PÚBLICA NOS 
PAÍSES DA OCDE 
Flávio da Cunha Rezende 
Nas duas últimas décadas do século passado, diversas razões combina-
das produziram, em escala global, um acelerado movimento rumo à constru-
ção de novos papéis e esferas de atuação para os Estados nacionais. Demo-
cratização combinada com globalização impulsionaram a consolidação de 
amplos processos de formulação e implementação de políticas de reforma 
dos Estados nacionais, nos países desenvolvidos e em desenvolvimento. 
Problemas relativos à redistribuição, à justiça social e à eficiência dos 
governos fizeram crescer a demanda por reflexões e práticas que culminaram 
em um movimento vigoroso de reinvenção das estruturas e instituições soci-
ais e políticas. As reformas do Estado (em suas diversas manifestações visí-
veis) ocuparam lugar privilegiado nos debates havidos nos países ricos e na-
queles de menor renda. Por diversas razões e por diferentes vias, conforme 
comentaremos adiante, os processos endógenos de reforma serviram funda-
mentalmente para redefinir os limites de atuação do Estado, dos mercados e 
da sociedade civil, dentro de novos modelos de desenvolvimento econômico 
e social, consolidando uma ―era de reformas‖. 
Encontrar um novo papel para o Estado, redefinir e reorganizar os pa-
drões de gestão e intervenção pública – no contexto de uma nova ordem cada 
vez mais globalizada, democrática e com restrições fiscais severas – repre-
sentaram um complexo desafio mesmo para sociedades com elevados pa-
drões de renda e de desenvolvimento humano. Esse desafio foi ainda mais 
intenso para países em desenvolvimento, nos quais foram repensados os le-
gados de políticas em que o Estado desempenhou papel fundamental no de-
senvolvimento, tal como foi o caso brasileiro, em contextos marcados por 
intensa pressão por equilíbrio das contas públicas, das funções e do papel do 
Estado, e de redução de desigualdades sociais profundas. O Brasil, bem co-
mo a América Latina, foi alvo de transformações significativas nas institui-
ções políticas, administrativas, econômicas e financeiras, reformas essas 
marcadas por agudas tensões entre o equilíbrio fiscal, a mudança institucio-
nal e a redução das desigualdades sociais e econômicas que ainda persistem 
nessas regiões. 
 
 
Reformar o Estado e suas instituições tornou-se requisito para se alcan-
çarem padrões de governabilidade e governança no mundo desenvolvido, e o 
êxito em promover padrões mais eficientes de gestão fiscal e maior redistri-
buição moldou os contornos das políticas de reforma do Estado nos países da 
OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico). 
Processos combinados de privatização, de reforma administrativa, de ajuste 
fiscal e de redução do tamanho do Estado e dos seus gastos atuaram decisi-
vamente na agenda dos governos dos países ricos (e daqueles de menor renda 
e desenvolvimento), consolidando uma tendência a ver o Estado como um 
dos principais problemas a serem enfrentados pelos governos e sociedades. 
Reduzir os elevados níveis de déficit e de carga tributária e, ao mesmo tem-
po, produzir políticas públicas voltadas para favorecer uma maior redistribui-
ção social foram os eixos que balizaram as políticas de reforma do Estado. 
Programas nacionais de reforma – tais como o National Performance Revi-
ew, nos Estados Unidos, e o Next Steps, na Inglaterra – fundaram as bases do 
discurso ―gerencialista‖, no qual fazer o Estado funcionar melhor dentro de 
padrões de menores custos tornou-se condição fundamental para a organiza-
ção e o funcionamento do Estado. 
O propósito mais geral de criar novas instituições e novos modelos bu-
rocráticos dentro de bases organizacionais preferencialmente voltadas para 
os resultados modelou, de forma decisiva, o desenho das políticas de reforma 
na Europa, nos países asiáticos e no mundo em desenvolvimento, criando as 
chamadas reformas gerenciais. As reformas gerenciais foram acompanhadas 
da consolidação de um novo paradigma de gestão pública, no qual se assen-
tam as bases e os princípios lógicos e operacionais para o novo papel do Es-
tado. Ampliar os padrões de eficiência e efetividade na intervenção pública, 
por meio de uma nova matriz institucional organizada pelo desempenho, foi, 
e tem sido, um dos maiores desafios para os gestores públicos contemporâ-
neos. No Brasil, a reforma desencadeada em 1995 pelo Ministério da Admi-
nistração Federal e Reforma do Estado (Mare) foi um caso típico de reforma 
gerencial na qual a administração brasileira foi concebida em novas bases, 
sob novos modelos de delegação e controle burocrático e, fundamentalmente, 
visando a uma maior pressão por ajuste das contas públicas. 
A reformada administração pública nos moldes orientados pelo desem-
penho tornou-se central na agenda de políticas públicas de diversos gover-
nos, e raros foram os casos em que as reformas não constituíram o eixo prin-
cipal das mudanças setoriais em outras políticas públicas. A remodelagem do 
aparelho burocrático a partir de tipos ideais – tais como: maior capacidade 
administrativa, maior eficiência dos processos de formulação e implementa-
 
 
ção de políticas e programas sociais, redução do volume de gastos com a 
máquina administrativa – foi marcante nos processos de reforma. Tentativas 
para implementar ganhos de desempenho em um contexto de grande pressão 
por recursos fiscais passam a depender, cada vez mais, de novos padrões 
administrativos voltados para a maior racionalidade fiscal e capacidade ge-
rencial. 
Por outro lado, pela primeira vez na história, o desempenho político 
passa a depender de maior capacidade administrativa. A relação desejável 
entre política e administração passa a ser orientada, ao menos no plano das 
intenções, pela tentativa de reduzir a interferência da política nos processos 
administrativos. Não sem razão, as chamadas políticas de modernização da 
administração pública passaram a ser ingrediente decisivo nas mudanças es-
truturais, citadas anteriormente. Tornar a administração pública mais transpa-
rente, mais democrática, mais profissional e mais voltada para atingir objeti-
vos e resultados sociais passou a ser um longo e tortuoso caminho, em que 
obstáculos, tensões e paradoxos marcaram a implementação dessas reformas 
no mundo real. O confronto com a realidade mostra que as reformas apresen-
tam resultados bastante diversos e que – mesmo em contextos de Estados e 
sociedades de maior renda – os processos de reforma são marcados por con-
flitos estruturais que derivam da própria formulação e implementação dessas 
políticas. 
Em sentido mais amplo, as políticas de reforma gerencial enquadram-se 
em um conjunto de reformas de ―segunda geração‖, as quais trazem consigo 
a necessidade de focalizar as transformações institucionais a fim de produzir 
impactos sobre os processos de estabilidade macroeconômica. Ao propor um 
novo modelo institucional de delegação e controle para a organização do Es-
tado, as reformas gerenciais identificam que grande parte dos problemas de 
desempenho do setor público resulta de uma combinação de fatores, dentre 
os quais são centrais os problemas nas instituições e nos incentivos internos à 
burocracia. 
Operacionalmente, mudanças institucionais desencadearam um conjun-
to massivo de reformas voltadas (i) para a emergência e o desenvolvimento 
de políticas de reformulação da administração pública, das relações trabalhis-
tas, do judiciário, do legislativo, dos mecanismos regulatórios, (ii) para a 
modernização tributária, (iii) para os programas massivos de privatização, 
bem como (iv) para a revisão das relações entre governos centrais e subnaci-
onais, especialmente em países federalistas. A explicação de que as institui-
ções importam para o êxito ou o fracasso das reformas conquistou considerá-
vel espaço nas pesquisas comparadas sobre as reformas (Pollitt e Bouckaert, 
2000; World Bank, 1997, e.g.). 
 
 
Quadro 1. Conflitos estruturais nos processos de implementação de 
reformas gerenciais, nos países da OCDE 
CONFLITO ESTRUTURAL QUESTÕES 
Grandes expectativas de mudança 
versus peso da inércia institucional 
 As reformas esbarram-se muitas vezes, dadas 
as elevadas expectativas ante os legados 
institucionais. 
Ajuste fiscal versus mudança 
institucional voltada para o 
desempenho 
 
O ajuste fiscal demanda maior controle 
sobre a burocracia; a mudança institucional 
orientada pelo desempenho demanda menor 
controle. 
Ampliação dos controles 
burocráticos versus demanda por 
maior autonomia, pelas burocracias e 
gestores públicos 
 Como compatibilizar os novos mecanismos 
de controle com as demandas por maior au-
tonomia gerencial? 
Eficiência administrativa versus 
desempenho na provisão de serviços 
 Como promover políticas de redução dos 
custos que não confrontem com a elevação 
do desempenho? 
Papel e função das organizações 
públicas versus novas demandas 
sociais 
 Como realinhar o papel e a missão das 
organizações públicas, dada a demanda por 
mais complexas políticas públicas? 
Mudança interna dos incentivos ver-
sus demandas por redução, por esta-
bilidade e por corte nos gastos públi-
cos 
 Como criar incentivos para a formação de 
uma nova burocracia, em um contexto de 
demandas por novos padrões nas relações 
de trabalho, no setor público? 
Focalização versus coordenação de 
políticas públicas 
 Como equacionar os processos de 
focalização das organizações públicas com 
mecanismos de coordenação e ação coletiva 
em políticas públicas? 
Tempo e cooperação versus pressões 
por ajustes estruturais 
 Reformas demandam tempo e ação coletiva. 
Interesses setoriais no processo político não 
demandam. 
Fonte: Elaborado a partir de Rezende (2004). 
Quando observados comparativamente, os países da OCDE foram deci-
sivamente marcados por reformas segundo os modelos gerenciais, nos quais 
a idéia de downsizing (o encolhimento da quantidade de funcionários) e a 
orientação por desempenho adquirem contornos mais intensos. Os ataques ao 
problema fiscal, em países como os EUA e a Inglaterra, tornaram-se para-
digmáticos. Os casos alemão e francês representaram movimentos ―dissonan-
tes‖ em grande medida, dada a sua reduzida voracidade em questões como a 
 
 
redução do tamanho e o envolvimento do Estado nas políticas sociais e eco-
nômicas. Comparativamente, todavia, Rezende (1996 e 2002) mostra que os 
Estados mais ricos continuam a exibir padrões marcados por forte interven-
ção social e econômica, a despeito de uma retórica de reforma. 
A era das reformas, conforme discutiremos adiante, não recolocou ―os 
Leviatãs no lugar‖, como pretendiam as reformas ambiciosas no início dos 
anos 1990. Reformar padrões de gastos e modelos institucionais de políticas 
públicas não constitui tarefa fácil – e não é menos complexa em países de 
maior renda. A experiência comparada mostra que os países em desenvolvi-
mento, por contraste, são aqueles nos quais se realizaram maiores mudanças 
estruturais no perfil de gastos públicos. 
Outro ponto de grande interesse para a comparabilidade é a forte ade-
são a novos modelos e paradigmas de delegação e de controles burocráticos. 
Esse novo paradigma – o paradigma pós-burocrático – propõe a criação de 
padrões de articulação entre formulação e implementação de políticas públi-
cas, regulados pelo desempenho. Esse tem sido um dos principais eixos or-
ganizadores dos processos de reforma, centrados na idéia de que as organi-
zações e instituições do setor público devem funcionar dentro de padrões de 
eficiência como os adotados em organizações privadas, a depender dos in-
centivos internos que modelam a produção, o gerenciamento e a provisão de 
serviços. Exceto para os casos de provisão de bens, que se aproximam dos 
chamados ―bens públicos puros‖ (produção das regras e das políticas, plane-
jamento, coordenação de políticas, fisco etc.), os governos podem ser orien-
tados pelo desempenho, com resultados perfeitamente mensuráveis. 
Baseados nas recentes teorias do agente-principal e do novo institucio-
nalismo econômico, os defensores do gerencialismo público têm buscado 
consolidar um novo modelo de gestão pública em que modelos tradicionais 
de responsabilização (rule-based) são progressivamente substituídos por 
modelos voltados para os resultados operacionais (performance-basedac-
countability). No limite, os modelos gerenciais propõem novos padrões de 
implementação de políticas, a partir de incentivos e mecanismos de controle 
que privilegiam o desempenho e a orientação por resultados. A comparação 
da experiência pela qual passaram os países ricos mostra que as chances de 
êxito desses novos modelos organizacionais – conhecidos como PBO (per-
formance-based organizations) – têm sido reduzidas no mundo real, e que 
não tem sido fácil mensurar e avaliar resultados em diversas áreas de inter-
venção do governo. 
Quanto ao financiamento dos programas de reforma, uma diferenciação 
importante deve ser feita. Nos países de maior renda, os processos de refor-
 
 
ma quase sempre são financiados com recursos internos, o que dá maior au-
tonomia e estabilidade em termos da condução, implementação e orientação 
dos resultados a serem perseguidos com tais políticas. Por contraste, nos paí-
ses em desenvolvimento as políticas de reforma são financiadas por meio de 
projetos (setoriais ou multissetoriais) apoiados por agências multilaterais 
(tais como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento). 
No período 1997-2000, em que se intensificou a difusão das reformas nos 
países em desenvolvimento (a reforma brasileira, por exemplo, foi iniciada 
em 1995 e teve o apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento), as 
operações de empréstimo do Banco Mundial para projetos classificados co-
mo Reforma do Estado e Governança totalizaram cerca de U$ 5 a U$ 7 bi-
lhões por ano, para as seis regiões do globo, materializados em 1.600 proje-
tos de larga escala. A análise da composição temática desses projetos mostra 
que existe uma prioridade: 40,6% dos empréstimos aprovados tinham como 
destino reformas institucionais, que envolviam iniciativas voltadas para 
transformar o papel do Estado e desenvolver capacidades na gestão pública. 
As políticas de reforma implementadas nos anos 1990 tiveram como 
centro uma tensão entre o ajuste fiscal e a mudança institucional. Reduzir os 
gastos públicos e, ao mesmo tempo, criar mecanismos para que as institui-
ções funcionassem melhor foram os temas centrais das reformas. A compa-
ração entre os programas de reforma gerencial mostra que havia esse formato 
programático e que, na maioria deles, preponderava o ajuste fiscal sobre a 
mudança institucional – embora tais objetivos sejam aparentemente comple-
mentares à elevação do desempenho. Isso se explica pelo fato de a pressão 
por ajuste fiscal ter sido uma razão decisiva para que se desse início às re-
formas, especialmente nos países de maior renda, ou mesmo naqueles de 
renda intermediária. Intensas pressões por equilíbrio fiscal em contextos de 
democratização inibiram a adoção de mudanças institucionais mais qualitati-
vas. A prioridade política gerada pelo componente ―ajuste fiscal‖ comprimiu 
as outras dimensões da reforma. Os casos brasileiro e latino-americano apre-
sentaram, tipicamente, essa natureza, que contribuiu decisivamente para mu-
danças mais significativas no papel do Estado. 
A associação de êxito das reformas e redução do tamanho do Estado – 
muito marcada pelas ―ideologias neoliberais‖ – foi outro ponto crítico no 
legado das reformas gerenciais. Os casos nacionais revelam, com maior regu-
laridade, um certo vigor e, por que não dizer, um sucesso relativo em dimen-
sões ―visíveis‖, tais como a redução dos gastos públicos, o encolhimento da 
quantidade de funcionários públicos (downsizing), o corte em programas 
sociais, a extinção de agências governamentais e a reorganização superficial 
 
 
de estruturas administrativas. O mesmo não se pode afirmar quanto à propa-
lada transformação no modelo institucional que, supostamente, fundaria as 
bases para uma nova burocracia e, no limite, um novo padrão de funciona-
mento do Estado. Apesar disso, a implementação da parte mais delicada de 
qualquer reforma – qual seja, transformar as instituições (regras formais e 
informais), alterando os incentivos que afetam o papel e a qualidade da inter-
venção pública – ainda representa um desafio crucial. 
A comparação das experiências revela que as reformas são lentas e de-
pendem da montagem de complexas redes de cooperação entre atores institu-
cionais em torno dos dois objetivos. As evidências analisadas também apon-
tam para o interessante fato de que a implementação das reformas está nega-
tivamente correlacionada à qualidade e ao desempenho institucional ex-ante. 
Em casos marcados por elevadas ineficiências históricas, as evidências mos-
tram que as reformas não constituem incentivos para elites que ―se benefici-
am‖ com padrões de ineficiência. Parece difícil, nesses contextos, cooperar 
com os propósitos de ampliação dos controles, de maior responsabilização 
burocrática e de maior orientação pela eficiência do Estado e da gestão pú-
blica. O que os dados demonstram é que as reformas são abandonadas, modi-
ficadas ou descontinuadas. 
Outro ensinamento obtido por comparação é o de que projetos de re-
forma que desconsideram as especificidades (one size fits all approaches) 
dos sistemas burocráticos e administrativos alcançam resultados pouco efeti-
vos. Programas de reforma que levem em conta a flexibilidade institucional 
de cada contexto podem ser mais desejáveis. 
Comparativamente, os resultados da mudança institucional são tímidos. 
Raros são os casos em que ambiciosas mudanças propostas foram implemen-
tadas a contento, embora os desafios políticos, institucionais e técnicos para 
conseguir a cooperação, com os objetivos da reforma gerencial, continuem 
intensos. Reformas gerenciais não encontram cooperação espontânea dos 
atores para criar uma cultura orientada pelo desempenho. Por outro lado, em 
reduzidos casos as performance-based organizations, a pedra de toque no 
novo modelo gerencial, foram criadas a contento. 
O caso brasileiro de 1995 foi típico de que, apesar das mudanças cons-
titucionais empreendidas, a criação de novas organizações redefiniram as 
relações entre policy-making e service delivery. Mesmo nos casos em que 
mudanças foram introduzidas, grandes são os desafios para definir, monitorar 
e controlar os padrões de desempenho. Existe, ainda, grande dissenso entre o 
que significa o desempenho, sobretudo porque o Estado e a administração 
pública contemporânea são, na realidade, compostos de grande diversidade 
 
 
de agências com objetivos altamente heterogêneos, o que dificulta estabele-
cer padrões comparáveis de desempenho. As reformas gerenciais ainda estão 
longe de ter introduzido um padrão coerente e aceitável de administração 
pública. Os estudos de caso disponíveis sobre as experiências nacionais e 
subnacionais revelaram que as reformas encontram dificuldades para trans-
formar a burocracia e o seu modus operandi. 
Outro ponto a ser considerado em uma análise comparativa das refor-
mas é a questão do ajuste das contas públicas, ou o ajuste fiscal. Dados com-
parados mostram que as reformas foram relativamente efetivas no controle 
da expansão acelerada dos gastos públicos e do desequilíbrio fiscal que se 
vinha consolidando desde os anos 1980. Um grupo reduzido de países – tan-
to desenvolvidos quanto em desenvolvimento – apresenta casos concretos de 
redução do patamar dos gastos públicos. 
Também um ponto interessante a ser comparado é a transformação da 
composição dos gastos públicos. Nesse particular, tal como demonstrei em 
dois estudos empíricos (Rezende, 1996 e 2002), existe uma clara tendência à 
minimalização dos gastos públicos nos países em desenvolvimento, o que 
não ocorre nos países desenvolvidos. Os dados revelam que, no período pós-
1980, os países em desenvolvimento passaram

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