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CICATRIZAÇÃO

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Cicatrização da Pele
Henrique Cardoso Tardelli • Carolina Souto
• INTRODUÇÃO
A cicatrização da pele é um processo rigidamente or
questrado, que segue um padrão altamente reprodutível e
com múltiplos níveis de complexidade, visando restaurar a
integridade tecidual local, com a formação de uma cicatriz
como produto final.12 A cicatriz apresenta diferenças e des
vantagens em relação à pele não lesada, mas foi a estratégia
adotada para reparação de feridas nos vertebrados superio
res (muitos anfíbios, por exemplo, apresentam regeneração
tecidual em vez de cicatrização) numa provável troca de acu
rada por velocidade3 - uma troca que a maioria dos seres
humanos da sociedade moderna desfaria de bom grado.
O processo de cicatrização é didaticamente dividido em três
fases: inflamatória, proliferativa e de maturação,"' embora es
sas três fases se sobreponham e se complementem (Fig. 1.1).
• FASE INFLAMATÓRIA (FIG. 1.2)
• início imediato
• protagonistas: plaquetas e macrófagos
A fase inflamatória tem início imediatamente após o trau
ma. Tem por objetivos principais: a remoção de tecido lesado
e desvitalizado, a restauração dos mecanismos de defesa lo
caise o estabelecimento dos sinais adequados para o prosse
guimento das fases subsequentes.3
LESÃO
\
MATURAÇÃO
FIBROPLASIA
INFLAMAÇÃO
HEMOSTASIA
• III
TEMPO
Fig. 1.1 • Representação esquemática da relação temporal entre as di
versas fases do processo cicatricial evidenciando a grande sobreposição
que ocorre entre elas.
Fig. 1.2 • Representação da fase inflamatória. Nota-se a presença do
coágulo preenchendo a lesão, onde se vêem as plaquetas (em amarelo)
entremeadas com fibrina. Observa-se também a migração e diapedese
dos polimorfonucleares (em azul-claro) dando seqüência ao processo in-
flamatório.
Podemos subdividi-la em duas etapas: hemostasia e in
flamação.
Hemostasia
A ruptura da integridade tecidual causada por evento
traumático provoca lesão de vasos locais e perda sangüínea,
o que permite o contato das plaquetas com o colágeno suben-
dotelial, ativando a via intrínseca da cascata de coagulação,
com o objetivo de estancar o sangramento.M Assim, ocorrem
a agregação de plaquetas e seu entrelaçamento em uma rede
de fibrina (os monômeros de fibrina, formados a partir da
ação da trombina sobre o fibrinogênio circulante, são ligados
entre si pelo fator XIII), formando o coágulo, que, além de
sua função hemostática, irá prover uma matriz extracelular
(MEC) provisória, funcionando como um verdadeiro andai
me por onde se deslocarão e/ou se fixarão células inflamató-
rias, fibroblastos e fatores de crescimento.3'1
CAPÍTULO 1 > CICATRIZAÇÃO DA PELE
Fig. 1.3 • Representação esquemáticadas múltiplas ações e funçõesdo macrófago no processocicatricial
Nesse primeiro momento ocorre vasoconstrição local me
diada pela liberação de aminas vasoativas por células lesa
das no trauma e por ativação do sistema nervoso simpático
no local.4
Inflamação
A agregação e degranulação das plaquetas com liberação
de diversos fatores de crescimento [principalmente fator de
crescimento derivado de plaquetas (PDGF), frações a e (3 do
fator transformador do crescimento (TGF-a e TGF-p), fator
de crescimento de fibroblastos (FGF), fator de crescimento
semelhante à insulina (IGF) e o fator de crescimento epidér
mico (EGF)J, juntamente com os mediadores inflamatórios
das células lesadas no trauma, são os sinais que iniciam o
processo inflamatório, criando um gradiente quimiotáxico
para atração e migração de células inflamatórias, além de
provocarem vasodilatação e aumento da permeabilidade
vascular no local.
As primeiras células inflamatórias a responder e adentrar
o sítio são os neutrófilos ou polimorfonucleares (PMN), que
atingem seu pico populacional entre 24 e 48 horas e, então,
decaem rapidamente; mas, nesse período, realizam duas im
portantes ações: a limpeza do local, com remoção de tecido
lesado, partículas exógenas e bactérias; e a liberação de me
diadores [principalmente interleucinas e o fator de necrose
tumoral (TNF-«)| para amplificar o processo e atrair mais
células inflamatórias.'
As próximas células a adentrar a ferida são os monócitos,
que, uma vez no local, se diferenciam em macrofagos ativeis,
atingindo pico populacional em 48 a 72 horas e permanecen
do por semanas. Eles são atraídos por vários fatores (exemplo:
trombina, sistema complemento, fibronectina e fatores de cres
cimento, como TGF-[3, PDGF e TGF-cx) e, além da ação fago-
citária, desempenham a função de verdadeiros maestros do
processo cicatricial ao produzirem diversas citocinas e fatores
de crescimento que estimulam a angiogênese, a reepitelização,
a migração e multiplicação de fibroblastos e a produção de co-
lágeno, além de manterem o processo inflamatório local1 *(Fig.
1.3). Prova dessa importância é o fato de que a sua supressão
implica a inibição quase total do processocicatricial (aocontrá
riodo que ocorrequando se suprimem os neutrófilos).3-7
Os linfócitos têm ação secundária como reguladores do
processo através das suas diferentes subpopulações, assim,
por exemplo, a supressão de linfócitos CD4enfraquece a ci
catriz final, enquanto a supressão de linfócitos CD8 tem efei
to oposto.'
$> FASEPROLIFERATIVA
(OU TRANSICIONAL OU DE
FIBROPLASIA) (FIG. 1.4)
• início em 2 a 4 dias
• protagonistas: fibroblastos, macrofagos, queratinócitos e
células endoteliais
CAPÍTULO 1 • CICATRIZAÇÃO DA PELE
Fig. 1.4 • Representação da fase proliferativa.Amigração dos queratinó
citos divide progressivamente o coágulo numa porção superficial, que se
torna a crosta, e outra profunda, que se torna o tecido de granulação. Os
PMN são substituídos pelos macrofagos (em amarelo). Ocorrem a multipli
cação e a inosculação de brotos vasculares. Hámultiplicação e migração de
fibroblastos (células fusiformes esverdeadas) com produção de colágeno
(fibras azuis).
Os principais objetivos dessa fase são: restauração da co
bertura epidérmica, produção da MEC, contração da ferida
e angiogênese.3 As várias ações que ocorrem nessa fase são
sumarizadas a seguir.
Migração e Proliferação de Fibroblastos
Os fibroblastos presentes na ferida advêm de duas fontes:
a migração de fibroblastos maduros das vizinhanças e a dife
renciação de células-tronco mesenquimais locais.4 Uma vez
no local, os fibroblastos são estimulados a proliferar, aumen
tando ainda mais a sua população. Tanto a migração quanto
a proliferação são estimuladas principalmente por citocinas
liberadas pelos macrofagos, sobretudo o PDGF, o TGF-p", o
FGFe o fator de crescimento do tecido conjuntivo (CTGF)."
Produção da MEC
Nessa fase, a matriz inicialde fibrina e fibronectina origi
nária da hemostasia passa a ser substituída pela MEC cica
tricialsintetizada pelos fibroblastos, que são os responsáveis
pela produção de todos os seus elementos estruturais: colá-
genos, glicosaminoglicanos e proteoglicanos.2"5 Éimportante
observar que a elastina não é produzida durante o processo
de cicatrização,4 o que justifica,em parte, a perda de flexibili
dade do tecido cicatricial em relação à pele normal.
A produção de colágeno tem início em 3 a 5 dias e atin
ge seu pico em torno de 21 dias; a partir de então, entra em
equilíbrio coma degradação.1'34 O fibroblasto produz inicial
mente o procolágeno, que sofre, no retículo endoplasmático,
o processo de hidroxilação dos resíduos de lisina e prolina,
ação dependente de vitamina C e ferro,4 podendo então ser
exportado para a MEC na forma de uma tripla hélice, que
tem seuspeptídeos-C terminais clivados por proteases espe
cíficas, permitindo a formação de fibrilas.1'2
A proporção entre colágenos I e III, que, na pele sã, é de
90% para 10%, está alterada nessa fase, quando então o co
lágeno tipo III alcança 30% (o que aparentemente facilita a
penetração de novos capilares).3
A alta taxa de produção (fibroplasia) pode ser observadaclinicamente nessa fase como elevação ou hipertrofia transi
tória da cicatriz.4
Contração da Ferida
Acontração da ferida tem início com 4 a 5 dias e se prolonga
por 2 a 3semanas, prazo que pode prolongar-se indefinidamen
te em feridas crônicas. E promovida pela alteração fenotípica
dos fibroblastos para miofibroblastosw' (mediada por PDGFe
TGF-[31), que se ligam, então, a elementos da MEC através da
expressão de integrinas na sua superfície e apresentam função
contrati1graças à presença de filamentos de actina no seu citoes-
queleto. A produção da enzima lisil-oxidase pelos fibroblastos
produz ligação cruzada covalente entre as fibrilas de colágeno,
estabilizando a redução obtida com a contração dos miofibro-
blastos.3 Uma ferida fechando por segunda intenção se contrai
à velocidade de aproximadamente 0,6a 0,75mm por dia.4
Neovascularização
Amultiplicação das células endoteliais, sua penetração na
MEC(inosculação) e o posterior processo de tubulização cons
tituem a angiogênese, que é de suma importância ao levar flu
xosangüíneo à ferida, provendo suas demandas energéticase
facilitando a chegada de células inflamatórias ao local.
Vários fatores estimulam esse processo, entre os quais se
destacam Iactato elevado, baixa tensão de oxigênio e baixo
pH, além de vários fatores de crescimento [principalmen
te FGF-2 e o fator de crescimento do endotélio vascular
(VEGF)9]. Éa proliferação vascular dessa fase a responsável
pelo aspecto avermelhado da cicatriz imatura.4
Epitelização
A ruptura da integridade do epitélio causada por um
evento traumático precipita o processo de reepitelização,
com subsequente estímulo adicional por parte dos fatores de
crescimento liberados nas fases inflamatória e proliferativa,
principalmente o FGF (o FGF-7 e o FGF-10 são conhecidos,
respectivamente, por fator de crescimentode queratinócitos
1 e 2 - KGF1 e KGF2), o TGF-p, o fator de crescimento de
nervos (NGF) e o fator de crescimento epidérmico (EGF).7-9
Uma ferida fechada primariamente já estará completa
mente epitelizada entre 24 e 48 horas;4 já uma ferida se fe
chando por segunda intenção terá o tempo de reepitelização
dependente do seu tamanho. Nesse caso, os queratinócitos
das bordas se diferenciam morfologicamcnte e passam a mi
grar em direção à borda oposta através da MEC provisória,
dividindo-a em uma porção superior - que será a crosta - e
outra inferior- que será transformada em tecidode granula
ção ao longo da fase proliferativa'' (Fig. 1.4).
Aoencontrar os seus pares da borda oposta, os queratinó
citos sofrem o processo de inibição por contato, que aborta
sua migração e os estimula a retomar seu padrão de matu
ração em camadas como na pele sã, ocorrendo então a libe
ração da crosta.
Em feridas maiores, os queratinócitos e células-tronco
multipotentes presentes nos apêndices cutâneos (folículos
pilosos, glândulas sebáceas e sudoríparas) no interior da le
são também funcionam como focos de reepitelização secun
dários, auxiliando no processo.8
A presença do epitélio sobre a ferida exerce intensa in
fluência sobre a fibroplasia, e, quanto antes a cobertura de
queratinócitos se restabelecer, menor a fibrose no local3- o
que justifica o debridamento e a enxertia precoce de queima
duras de 2Ü grau profundo e 3° grau, melhorando o resultado
final.
• FASE DE REMODELAÇÃO (MATURAÇÃO)
(FIG.1.5)
• início em 6 a 8 semanas, perdurando por 1 ano ou mais
• protagonistas: macrofagos e fibroblastos
Aprincipal ocorrência nessa fase é a remodelação da MEC,
quando então o excesso de colágeno produzido na fase pro
liferativa de forma desorganizada e aleatória é degradado e
substituído por fibras de colágeno com um maior número
de ligações cruzadas (cross-link) e alinhadas de acordo com
as forças de tensão a que está submetida a pele no local. Isso
não apenas reduz o volume da cicatriz como aumenta sua
força tênsil: assim, na terceira semana, quando a produção
de colágeno atingiu seu pico, a força da cicatriz é apenas de
20%a 30%da sua força final, enquanto, na sexta semana -já
na fase de remodelação -, a quantidade total de colágeno foi
reduzida, mas a força tênsil atinge 80% a 90% da sua resis
tência final2"4'*' (embora a cicatriz vá atingir no máximo 80%
da força da pele íntegra).
O principal agente dessa remodelação é o fibroblasto,
que, além do seu papel como produtor de colágeno, glicosa-
minoglicanos e proteoglicanos, também é o responsável pela
sua degradação mediante a produção de metaloproteinases
(MMP) - uma família de ao menos 25 enzimas dependentes
Fig. 1.5 • Representação da fase de maturação. Observam-se a regressão
do excesso de vasos formados previamente e a redução das populações
celulares na ferida, principalmente macrofagos e fibroblastos. O epitélio
está completamente restaurado e a matrizcicatricial virtualmente acelular
é formada por grossas fibras de colágeno (fibrasazuis)orientadas no senti
do de maior tensão da pele.
CAPÍTULO 1 • CICATRIZAÇÃO DA PELE
de zinco, dentre as quais se incluem a colagenase, a gelatina-
se e a matrilisina; essas enzimas, em conjunto, são capazes de
degradar quaisquer elementos da MEC.47 Elas exercem ação
vital também na angiogênese, reepitelização e migração de
fibroblastos e células inflamatórias, abrindo caminho para a
migração celular no interior da MEC, atuando como verda
deiros limpa-trilhos4" (estão envolvidas também na infiltra
ção tumoral e no desenvolvimento de metástases).
Nessa fase também ocorre grande redução na densidade
de capilares e no número de fibroblastos e macrofagos resi
dentes mediante apoptose, tornando a cicatriz madura rela
tivamente acelular.4'57
t> TIPOS DE CICATRIZAÇÃO
Existem quatro protótipos básicos de cicatrização, que
têm diferentes tempos de resolução, diferentes fases pre
dominantes e diferentes resultados finais. Essa classifica
ção permite prever os resultados de determinado caso,
bem como estabelecer o protocolo de atendimento ade
quado.
Primeira Intenção
Trata-se da cicatrização que ocorre nos ferimentos em que
os bordos são apostos cirurgicamente logo após a lesão ou
até algumas horas depois (idealmente, menos de 6 horas).
Nesse modelo, as fases inflamatória, proliferativa e de matu
ração ficam abreviadas, havendo menor deposição de tecido
fibrótico e melhor resultado estético final.
Segunda Intenção
Nesse caso, as bordas da ferida não são aproximadas (ha
bitualmente em grandes perdas de substância ou ausência de
condições locais - má circulação, deficiências nutricionais, ra-
dioterapia, infecção). Ocorre um prolongamento exacerbado
das fases de cicatrização (proporcional ao tempo de fechamen
to da ferida), principalmente da inflamação e da fibroplasia,
com formação de tecido cicatricial de má qualidade e grande
hipertrofia. A contração da lesão pelos miofibroblastos tem
grande importância no fechamento dessas lesões - podendo
evoluir posteriormente com contraturas, bridas e sinéquias.
Terceira Intenção (ou Primeira Intenção
Retardada)
Trata-se de uma ferida na qual a sutura dos bordos (pri
meira intenção) é postergada por alguns dias com o intuito
de melhorar as condições locais. São usualmente lesões con
taminadas, que, nesse intervalo, se beneficiam tanto dos cui
dados médicos (curativos e antibióticos) como da infiltração
de polimorfonucleares no local, reduzindo assim as chances
de supuração.
Reepitelização
Ocorre nas lesões que interessam apenas a epiderme ou
até a derme superficial. Essas lesões se fecham basicamente
CAPÍTULO 1 • CICATRIZAÇÃO DA PELE
pela migração e multiplicação de queratinócitos com míni
mo estímulo cicatricial, encurtando sobremaneira as fases
cicatriciais e cursando com virtual ausência de cicatriz ou
apenas alterações pigmentares.
• FATORES DE CRESCIMENTO
Existem vários fatores de crescimento envolvidos na es-
timulação, inibição, ativação e regulação dos diversos pas
sos do processo cicatricial,tendo muitos deles sido desco
bertos nos últimos anos (o primeiro foi o NGF, em 1952),
e os seus efeitos e mecanismos de ação ainda são objetos
de intenso estudo. Apresentamos aqui apenas um sumá
rio dos principais fatores de crescimento e suas ações mais
importantes:2'4'6'7-9
PDGF
• produzido por plaquetas, macrofagos, queratinócitos e
células endoteliais
• mais poderoso mitógeno para fibroblastos
• quimioatraente para PMN, fibroblastos, macrofagos
• estimula síntese da matriz
• produção de colagenase
EGF
• produzido por plaquetas e queratinócitos
• proliferação de queratinócitos, fibroblastos e células en
doteliais
TGF-a
• produzido por plaquetas, macrofagos e queratinócitos
• estimula a angiogênese
• mitógeno para fibroblastos
• estimula a contração da ferida
TGF-pi eTGF-p2
• produzido por plaquetas, macrofagos e linfócitos
• estimula a síntese da MEC
• proliferação de fibroblastos, queratinócitos e células en
doteliais
• estimula a angiogênese
TGF-P3
• ação antagonista e inibitória do TGF-(31 e (32
• reduz fibroplasia
FGF
• produzido por macrofagos, plaquetas, queratinócitos e
fibroblastos
• proliferação de célulasendoteliais, fibroblastos e querati
nócitos
• potente fator angiogênico
• estimula síntese de elementos da MEC e de colagenases
(tunwver)
Quadro 1.1 • Fatores de crescimento envolvidos nos diferentes processos
integrantes da cicatrização apresentados de forma resumida
Processo Fatores de crescimento envolvidos
Migraçãode neutrófilos TGF-f3l,TGF-32, interleucinas
Migraçãode macrofagos PDGF,TGF-P1,TGF-(32,VEGF, IGF, NGF
Angiogênese VEGF, FGF, TGF-p1,TGF-f32
Fibroplasia PDGF, TGF-p1/(32, EGF, IGF, FGF, CTGF
Reepitelização FGF,TGF-p1,TGF-p2,EGF,NGF
VEGF
• produzido por macrofagos e queratinócitos
• mitógeno e quimioatraente para células endoteliais
• aumenta a permeabilidade vascular
• CICATRIZAÇÃO FETAL
O advento da cirurgia fetal na década de 1980 levou à ob
servação de que os recém-nascidos previamente operados
durante a gestação não apresentavam cicatrizes nas áreas de
incisão. Sabe-se hoje que esse fato se processa apenas nos
dois primeiros trimestres da gestação (até a 24asemana).311
O mecanismo que norteia esse fenômeno, todavia, ainda
não é totalmente conhecido, mas vem sendo exaustivamente
pesquisado a fim de ser aplicado no tratamento ou preven
ção de cicatrizes nos seres humanos após o nascimento. Al
guns autores defendem que esse mecanismo de regeneração
não é perdido nos adultos, mas sim que a formação do tecido
cicatricial se processa mais rapidamente, bloqueando a mo
vimentação das células regeneradoras e a deposição de MEC
similar à da pele sã.7-8
Os estudos sobre cicatrização fetal baseiam-se principal
mente nas diferenças intrínsecas e extrínsecas entre o feto e
o adulto. As extrínsecas se relacionam ao líquido amniótico
no qual o fetoé imerso e no ambiente relativamente hipóxico
em que vive. As intrínsecas consistem em distinções quanto
ao processo inflamatório, fatores de crescimento e MEC.
Fatores Extrínsecos
O feto é continuamente banhado em líquido amniótico
quente, estéril e rico em fatores de crescimento e glicosami-
noglicanos; vive também com baixa pressão parcial de oxi
gênio (PaO,), pois depende da extração do gás a partir do
sangue materno, o que só é possível graças à maior afinidade
da hemoglobina fetal pelo O,.
Para investigar a influência desses elementos sobre a au
sência de cicatriz no feto, foram implantados enxertos de
pele adulta em fetos de carneiro, sendo feitas incisões na
pele normal e enxertada desses animais. Após o nascimen
to, constatou-se que a pele adulta, mesmo no ambiente fetal,
apresentou formação de tecido cicatricial, o que não ocorreu
na pele do feto.3 Destarte se comprovou que os fatores ex
trínsecos por si sós não explicavam essa diferença.
Fatores Intrínsecos
Várias dissonâncias foram observadas no processo in
flamatório do feto em relação ao do adulto, que podem ser
assim sumarizadas: virtual ausência de neutrófilos no infil
trado inflamatório fetal, menor atividade dos macrofagos,
menor agregação plaquetária mediante exposição ao colá
geno, menor resposta inflamatória global. Estudos com re
lação a esse tópico mostraram que a indução de resposta
inflamatória mais intensa - mediante aplicação de agentes
irritantes, bactérias ou interleucinas - causa formação de ci
catriz no feto.3
Quanto aos fatores de crescimento, as lesões em fetos
apresentam menores concentrações de PDGF, TGF-81 e (32,
bem como maiores concentrações de TGF-(33 e VEGF." Mo
delos animais mostram que a adição de PDGF ao ferimento
de fetos estimula a formação de cicatriz. Por outro lado, o
uso de TGF-(33 em modelos animais e, mais recentemente,
em humanos12 (uso de avotermina - TGF-(33 recombinante
humano) evidenciou redução do tecido cicatricial com me
nor deposição de colágeno na MEC.
A MEC da pele nos fetos também apresenta diferenças:
tem maior proporção de colágeno tipo III (podendo chegar
até a 60%) e menor quantidade de ligações cruzadas entre
as fibras de colágeno, tem maior quantidade de ácido hia-
lurônico e menor de decorina, todas essas diferenças contri
buindo para a formação de uma MEC bem mais fluida que
a do adulto, constituindo um meio mais hidratado e mais
condutivo para a movimentação celular e penetração de no
vos vasos sangüíneos.311
A opinião dos pesquisadores, atualmente,812 é que, para
obter tal grau de regeneração em adultos, será necessária a
CAPÍTULO 1 > CICATRIZAÇÃO DA PELE
utilização de uma abordagem em várias frentes, com ma
nipulação de fatores de crescimento, uso de substitutos de
MEC, terapia gênica, terapias celulares (emprego de células-
tronco) e manipulação de forças mecânicas (curativos com
pressão negativa, por exemplo).
k REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Cirurgia PlásticaFundamentos e Arte- PrincípiosGerais.Rio de Janeiro:
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Cicatrização Patológica:
Diagnóstico e Tratamento
Carolina Souto • Henrique Cardoso Tardelli
• INTRODUÇÃO
O processo cicatricial, na maioria das vezes, ocorre de forma
rápida e satisfatória. A cicatrização patológica pode dever-se a
inúmeros fatores, como infecção, hipoalbuminemia, má perfu-
são tecidual, doenças preexistentes - como diabetes e obesida
de - irradiação, tabagismo e uso de corticoide, entre outros.1"3
Também interferem na velocidade e qualidade da cica
trizaçãoo tamanho, a localização da lesão, o mecanismo de
trauma, raça, idade e fatores genéticos do paciente.
Tão importante quanto a formação do tecido cicatricial
provisório é a sua degradação, que, se ocorrer de maneira
inadequada, pode levar à fibrose excessiva, como parece
acontecer nas doenças do tecido conjuntivo, como cirrose e
esclerodermia.3
A cicatriz patológica pode levar a situações graves e in-
capacitantes, como nas seqüelas de queimadura (estenoses
Quadro 2.1 • Distúrbios causadores de cicatrização patológica
1. Distúrbios fibroprolíferativos
2. Distúrbios da contração cicatricial
3. Distúrbiosda pigmentação
4. Distúrbios de resistência
5. Distúrbios da cicatrização em áreas irradiadas
6. Tabagismoe cicatrização
7. Cicatrização no diabetes
8. Corticoterapia sistêmica
9. Malignizaçãode cicatrizes
Cicatrizes hipertróficas
Queloides
>• Contraturas
Hipercromias
Hipocromias
Deiscências
Alargamentos
orificiais e bridas palpebrais, cervicais ou interdigitais) e na
estenose cáustica do esôfago, por exemplo.
Podemos dividir os distúrbios causadores de cicatrização
patológica como apresentado no Quadro 2.1.
E papel primordial do cirurgião plástico compreender e
dominar os mecanismos de ação e tratamento da cicatriz pa
tológica, visando buscar sempre a profilaxia ou tratamento
precoce, para obtenção de cicatrizes de boa qualidade e a sa
tisfação do paciente.
• DISTÚRBIOS FIBROPROLÍFERATIVOS
Cicatrizes Hipertróficas
São cicatrizes elevadas, tensas, lisas, sem sulcos, poros ou
pelos, de coloração avermelhada, que não ultrapassam os
limites da lesão original e tendem a regredir, total ou par
cialmente, ao longo do tempo.1 Podem apresentar dor e/ou
prurido e são decorrentes de distúrbios fibroprolíferativos
da derme, por trauma ou inflamação local.
Fig. 2.1 • Cicatriz hipertrófica esternal, apresentando área normal no ter
ço inferior.
10 CAPÍTULO 2 • CICATRIZAÇÃO PATOLÓGICA: DIAGNÓSTICO ETRATAMENTO
Fig. 2.2 • Lesão queloidiana pediculada retroauricular.
Queloides
São cicatrizes de forma tumoral (nodulares, multinodu-
lares, pediculadas ou não), de consistência endurecida, de
superfície lisa, com tonalidade avermelhada, violácea ou
acastanhada, dolorosas e pruriginosas e que ultrapassam os
limites da lesão inicial, apresentando recidivas freqüentes
após a excisão.13 Também decorrem de desordens fibroproli-
ferativas da derme após traumatismos ou inflamações locais,
porém, algumas vezes, não há referências a trauma prévio,
como ocorre na síndrome de Rubinstein-Taybi1 (que cursa
com o surgimento espontâneo de queloides, entre outras al
terações).
São mais comuns nas raças negra e oriental e acometem
mais pacientes jovens (que podem ter a tendência atenua
da na velhice). Os hormônios sexuais também influenciam o
aparecimento de queloides, justificando sua maior freqüên
Quadro 2.2 • Comparação entre queloide e cicatriz hipertrófica
Fig. 2.3 • Lesão queloidiana em lóbulo auricular anterior e posterior por
perfuração para colocação de brinco.
cia entre 10 e 30 anos, sendo mais intensos na puberdade e
durante as gestações e mais escassos na menopausa.
São mais freqüentes em indivíduos com história familiar
positiva, porém não há padrão genético estabelecido ligado
ao sexo. O fato de haver pacientes com cicatrizes queloidia-
nas e história familiar negativa, favorece a hipótese de pene-
trância genética variável, porém ainda sem comprovações.
As regiões do corpo mais acometidas são deltoide, ester-
no, dorso, pescoço, ângulo da mandíbula e lóbulos de ore
lhas (principalmente por perfuração). Na mesma região, e
até na mesma cicatriz, podem coexistir áreas de queloides e
áreas normais.
Patogênese
A matriz extracelular (MEC) da derme é composta por
substância amorfa e fibras colágenas e elásticas, todas deri-
Queloide Cicatriz hipertrófica
Extensão Cresce além das bordas da ferida inicial Mantém-se nos limites da lesão inicial
Início Até meses após a lesão Habitualmente, semanas após a lesão
Contraturas Ausentes Presentes
Regressão Rara Freqüente após 1 a 2 anos
Prurido/eritema Sim Sim, porém menos freqüentes e menos intensos
Resposta ao tratamento cirúrgico Pobre, com possível piora Boa, principalmente com terapia adjuvante
CAPÍTULO 2 • CICATRIZAÇÃO PATOLÓGICA: DIAGNÓSTICO ETRATAMENTO 11
vadas de fibroblastos. Estes, bem como os macrofagos, mas-
tócitos e células endoteliais, produzem também proteases
(exemplos: colagenases e proteogliconases).
O desequilíbrio entre a síntese exagerada de colágeno e
outros elementos e a degradação e o remodelamento inade
quados da MECcausam hipertrofia cicatricial.5
O prurido e o eritema estão relacionados como maior nú
mero de mastócitos e, consequentemente, maior liberação de
histamina.
Histopatologia
Acentuação da rede conjuntiva da derme. Nos queloides,
há feixes colágenos hialinizados irregularmente dispersos ou
em arranjos nodulares persistentes com o passar do tempo.
Nas cicatrizes hipertróficas, há estruturas mais ordena
das, paralelas à epiderme em oposição aos vasos sangüíneos
perpendiculares. Com o passar do tempo, os nódulos de fi
bras colágenos tornam-se mais finos e organizados.6
Tratamento
A presença ou não de infecção, a orientação da ferida
em relação às linhas de força da pele, a síntese adequada
por planos com debridamento de necrose e de tecido de
granulação excessivo, a tensão dos pontos, a idade, a raça,
a história familiar, a região acometida, todos esses fatores
nos ajudam a adotar medidas profiláticas no tratamen
to das cicatrizes hipertróficas e dos queloides. Além da
observação dos fatores supracitados, medicações tópicas
e/ou intralesionais, compressão ou pressoterapia, cirurgia,
radioterapia, crioterapia e laser são opções de tratamento.3-7
A cicatriz hipertrófica geralmente é tratada com medidas
locais, pois tendem a regredir espontaneamente. Já o que
loide, devido à chance de recidiva, deve ser tratado de for
ma mais agressiva, principalmente com associações de mé
todos terapêuticos.8
Substâncias de Uso Tópico
Cremes com óleo de silicone a 20% podem ser utilizados,
em associação com a pressoterapia, para cicatrizes hipertró
ficas menos elevadas. Cremes com ácido retinoico a 0,05%
de uso diário podem tornar as cicatrizes mais amolecidas e
levemente menos volumosas.8
Compressão ou Pressoterapia
O uso de malhas elásticas para compressão de cicatrizes
tem mecanismo de ação ainda não muito bem esclarecido.
Acredita-se que haja hipóxia por oclusão vascular e dimi
nuição na síntese de colágeno e do número de mastócitos,
com melhora na organização das fibras e diminuição do
prurido local.
As placas ou tiras de gel de silicone, também com me
canismo de ação ainda não muito bem compreendido,
atuariam por compressão, como as malhas, e também au
mentariam a temperatura da cicatriz, levando ao aumento
da ação de enzimas, como a colagenase. A diminuição da
perda de água pela cicatriz, levando a uma hiperidrata-
ção local, também seria um dos efeitos benéficos do gel de
silicone.812 O seu uso deve ser diário, por no mínimo 12
horas, durante 3 a 4 meses, e deve-se ter cuidado especial
com a higiene do produto e sua troca periódica, evitando-se
assim dermatites.
Infiltrações Intralesionais de Corticoide
A triancinolona tem efeito supressivo direto na síntese
de colágeno e reduz elementos inibidores da colagenase.
Pode ser usada pura ou diluída em anestésico local e deve
ser injetada, com seringas de 1 mL e agulha de insulina,
apenas dentro da cicatriz, em baixa concentração e em pe
quenas quantidades, com intervalos de 3 a 4 semanas entre
as aplicações. Esse procedimento, quando utilizado em altas
doses, pode levar à atrofia do tecido subcutâneo, telangiec-
tasias, necrose, ulcerações e discromias.38 A concentração
de triancinolona mais utilizada nas cicatrizes hipertróficas
é de 20 mg/mL e,nos queloides, é de 40 mg/mL, em forma
de suspensão injetável.
Outras Substâncias de Uso Intralesional
Outras drogas que também atuariam ativando a colage
nase, como VERAPAMIL (bloqueador de canais de cálcio)
e TRIFLUOPERAZINA (inibidor de Calmodulina) têm sido
usadas. Substâncias como INTERFERON-ALFA2B EINTER-
FERON-GAMA têm tido resultado em lesões queloidianas,
porém ainda em estudo (ação antifibrinogênica).81" Podem
ser uma opção na terapia quando há falha com o uso de cor
ticoide. O sulfato de BLEOMICINA (antibiótico citotóxico)
tem mostrado redução significativa do volume das cicatrizes
hipertróficas e queloides, porém necessita de estudos mais
aprofundados.
Radioterapia
A radioterapia pode ser utilizada como terapia comple
mentar no tratamento de queloides, sendo a betaterapia (ra
diação corpuscular) e a radioterapia superficial (emissora de
raios X) as técnicas de escolha usadas no pós-operatório da
ressecção total das lesões. Preferencialmente, devem ser ini
ciadas logo no í° dia pós-operatório e seguidas diariamente
sem interrupções por período médio de 10 dias, seguindo
orientação do radioterapeuta, que faz a avaliação do pacien
te em conjunto com a cirurgia plástica no pré-operatório.13
Não deve ser realizada como terapia isolada e nem mostra
eficácia no pré-operatório.
A radiação ionizante inibe a síntese de colágeno e auxi
lia no equilíbrio entre sua síntese e sua degradação. Deve-se
lançar mão desse recurso em caso de queloides recidivados
após tentativas sem sucesso de outros métodos, já que a ra
dioterapia pode ter feitos adversos graves, sobretudo em
crianças e adolescentes.
Laser
Os lasers de C02, argônio e Nd:YAG são não seletivos e
utilizados para vaporizar lesões. Eles são pouco eficazes no
12 CAPÍTULO 2 • CICATRIZAÇÃO PATOLÓGICA: DIAGNÓSTICO ETRATAMENTO
tratamento das cicatrizes hipertróficas e queloides, causando
recidivas freqüentes.14
Oflashlamp pulsed dye laser de 585 nm, desde o final da
década de 1980, tem sido utilizado com melhora na textu
ra e na redução do volume das cicatrizes, assim como dos
seus sintomas de dor e prurido, em até 60%dos pacientes
tratados. Os queloides mais volumosos não respondem
satisfatoriamente ao tratamento, e o próprio uso do laser
- nas suas mais diversas indicações - pode até gerar cica
trizes hipertróficas como complicação inerente ao proce
dimento.15
Crioterapia
A crioterapia é o método que utiliza, mais comumente,
o nitrogênio líquido como criógeno, em spray ou pela téc
nica de contato, sem ultrapassar as bordas da lesão. Pode
ser usada como método isolado, porém é mais utilizada
em associação com a excisão cirúrgica ou com a infiltração
de corticoide intralesional, facilitando a difusão deste den
tro do tecido cicatricial lesionado. As baixas temperaturas
provocadas pelo procedimento levam ao congelamento da
lesão e, assim, à formação de microtrombos e necrose teci
dual. São necessárias de 3 a 10 sessões, com intervalo médio
de 30 dias, período em que ocorre a cicatrização completa
da lesão.8
Fig. 2.4 • Queloide em região deltoidiana pós-trauma.
Cirurgia
Aexcisãocirúrgica isolada pode levar à recidiva do queloi
de em até80% nos primeiros2anos e de até 100% nos primei
ros 4 anos, sendo ideal a associação com outros métodos de
tratamento, como a radioterapia ou a infiltração de corticoide
intralesional.7'10 mais importanteé que os pacientes sejam in
formados da possibilidade de recidivas (algumas vezes, com
lesões ainda maiores do que as iniciais), da necessidade de
aderir à terapia complementar estabelecida e de serem acom
panhados a longo prazo para monitorização das lesões.
Pode-se usar zetaplastias, retalhos e enxertos de pele, vi
sando remover grandes lesões ou apenas aliviar a tensão lo
cal. A pele que recobre as lesões queloidianas pode ser usada
como área doadora de enxertos sem que haja queloide no
local enxertado.
A técnica mais utilizada é a exérese intralesional do que
loide, deixando borda mínima, suficiente para suturar, sem
lesara pelesadia ao redor da lesão.Utiliza-seessa técnica para
lesõesem que é possível a sutura simples, sendo vital o uso de
terapia adjuvante, como a infiltração do corticoide - realizada
na base e nas bordas do sítio cirúrgico, no intraoperatório e
após a retirada de pontos, com intervalo de 3 a 4 semanas, por
3 a 4 meses ou mais, se necessário. Pode ser associada também
a compressão local (que, no caso dos lóbulos auriculares, pode
ser feita através de brincos de pressão).
Fig. 2.5 • Ressecção intralesional.
CAPITULO 2 • CICATRIZAÇÃO PATOLÓGICA: DIAGNÓSTICO ETRATAMENTO
Fig. 2.6 • Ressecção intralesional. Nota-se manutenção de queloide em
bordas da ferida. Nesse momento, infiltra-se a triancinolona.
• DISTÚRBIOS DACONTRAÇÃO
CICATRICIAL
Contratura
Acontração cicatricial é um processo fisiológico no reparo
das lesões com perda de substância, visando à coaptação de
suas bordas.2A persistência da contração além do período de
reepitelização gera a contratura dos tecidos, que deforma e
causa resultados estéticos insatisfatórios, limitações na mo
vimentação de membros e articulações e perda de funções,
principalmente nas contraturas orificiais (exemplos: boca e
ânus).
As células que protagonizam esse processo são os fibro
blastos e os miofibroblastos, que estão presentes, sobretudo,
no tecido de granulação, fundamental para contração das
feridas.1,2'3
Tratamento
• Não cirúrgicos: dilatações, massagens e fisioterapia.
• Cirúrgicos: zetapastias e/ou resseções cicatriciais - com
fechamento primário, enxertos ou retalhos.
13
Fig. 2.7 • Pós-operatório imediato.
Fig. 2.8 > Brida cervical após queimadura.
14 CAPÍTULO 2 • CICATRIZAÇÃO PATOLÓGICA: DIAGNÓSTICO ETRATAMENTO
Fig. 2.9 • Cicatriz após queimadura com áreas de hipercromia em face e
hipocromia em tórax.
• DISTÚRBIOS DA PIGMENTAÇÃO
Os distúrbios da pigmentação são divididos em hipocro-
mias (ou hipomelanoses) e hipercromias (ou hipermelano-
ses). São causados pela resposta dos queratinócitos e mela-
nócitos ao trauma, seja pela sua proliferação e estimulação
excessivas, seja pela alteração na função dos mesmos.
Fitzpatrick classificou a pigmentação cutânea em essen
cial, que é irreversível (influenciada pela genética celular),
ou facultativa, que é reversível16 (dependente da exposição
solar ou influenciada por hormônios, como na gestação ou
na doença de Addison, em que ocorre a hiperpigmentação
difusa da pele com acentuação nas dobras do corpo, dorso
das articulações e mucosa gengival3).
Medicamentos também podem gerar hipercromias, como,
por exemplo: ciclofosfamida, clorpromazina e antimaláricos.
Pacientes portadores de patologias dermatológicas, como
vitiligo, psoríase e líquen plano, quando submetidos a trau
matismo cirúrgico ou não, podem apresentar as mesmas le
sões nas áreas afetadas, caracterizando o fenômeno isomór-
fico ou de Koebner.
Tratamento
• Hipocromia: expectante-tempo, exposição solar modera
da e maquiagem corretiva.
• Hipercromia: expectante-tempo, proteção solar (química
e/ou com roupas e acessórios) e agentes despigmentan-
tes, como: hidroquinona (2%a 4%), ácido azelaico (15% a
20%)e ácido kójico (1%a 2,5%).3-8
• DISTÚRBIOS DE RESISTÊNCIA
Deiscência e Alargamento de Cicatrizes
As feridas cirúrgicas, ou não, desenvolvem uma resistên
cia mínima nos primeiros 5 dias da cicatrização. As fibras de
colágeno se organizam e se remodelam, promovendo, por
volta da sexta semana (45 dias), maior resistência à tensão,
que vai então crescendo nos 24meses subsequentes.
Os objetivos da síntese de uma ferida são:
• hemostasia
• realinhamento dos tecidos
Fig. 2.10 • Alargamento cicatricial. Notam-se, pela transparência da pele
fina, pontos internos inabsorvíveis.
• obliteração de espaços mortos
• resistência tecidual
Cada estrutura possui tempo próprio para o seu reparo
completo. Pele, fáscia e tendões,por exemplo, são estrutu
ras de cicatrização mais demorada. Portanto, quando o ci
rurgião escolhe um fio de sutura com degradação precoce,
inadequado ao período de total cicatrização da estrutura
reparada, podem ocorrer deiscências ou alargamento cica
tricial, conferindo aspecto esgarçado e, às vezes, deprimido
às cicatrizes.3
Em alguns casos, podemos palpar ou até visualizar suturas
de camadas mais profundas, como tecido celular subcutâneo
ou fáscias, através da pele fina que cobre essas cicatrizes. Pontos
extrusos subdermicos de fios inabsorvíveis também são mais
freqüentes nesse tipo de situação. Retirada precoce de pontos
também pode causar alargamento de cicatrizes ou deiscências.
Tratamento
• Prevenção: repouso relativo, cintas elásticas, micropora-
gem, curativos e retornos freqüentes ao consultório, reti
rada de ponto no período correto, seguindo característi
cas da pele de cada região tratada.
• Correção cirúrgica da cicatriz.
• DISTÚRBIOS DA CICATRIZAÇÃO EM
ÁREAS IRRADIADAS
Na prática clínica, freqüentemente nos deparamos com
reconstruções de deformidades causadas por remoção de
tumores malignos que necessitam de complementação com
radioterapia. Caso a reconstrução seja imediata, corre-se o
risco de a área reconstruída ser irradiada no pós-operatório
e nas reconstruções tardias; muitas vezes, teremos de traba
lhar sobre uma região já irradiada previamente.
Os principais efeitos da radiação ionizante sobre a pele
e a cicatrização são: alterações pigmentares, espessamento
e fibrose cutânea, surgimento de telangiectasias, necrose e
CAPITULO 2 • CICATRIZAÇÃO PATOLÓGICA: DIAGNÓSTICO ETRATAMENTO 15
oncogênese. Além disso, afeta diretamente os vasos, criando
um ambiente hipóxico crônico sem resposta angiogênica.17
Os queratinócitos, devido à sua rápida multiplicação, são
mais sensíveis à radiação, provocando descamação variável,
que pode até expor a derme. Os fibroblastos também são
muito afetados, reduzindo a força tênsil da pele e das cicatri
zes, podendo culminar em úlceras e necrose.17
k TABAGISMO ECICATRIZAÇÃO
O tabagismo tem sabidamente efeito deletério sobre a cica
trização. Estudos em animais identificaram redução na produ
ção de colágeno em fumantes; enquanto a nicotina, além de ter
efeito vasoconstritor que persiste por até uma hora após a ina
lação, aumenta a adesividade plaquetária e inibe a proliferação
de glóbulos vermelhos, macrofagos e fibroblastos. O monóxido
de carbono presente na fumaça do cigarro reduz a oxigenação
tecidual ao ocupar o lugar do oxigênio nas hemácias.17
Estudos clínicos evidenciaram que pacientes tabagistas
têm risco 12 vezes maior de infecção, quando submetidos a
abdominoplastia, e risco 12,46 vezes maior de sofrimento no
retalho, quando submetidos a ritidoplastias.1*
A suspensão do fumo 2 semanas antes da cirurgia torna
a taxa de cicatrização estatisticamente semelhante à do não
tabagista.17
k CICATRIZAÇÃO NO DIABETES
Os pacientes diabéticos têm um risco aumentado de
problemas cicatriciais. A causa dessas alterações não é to
talmente elucidada, mas sabe-se que a isquemia secundá
ria à arterosclerose (principalmente nas artérias fibulares e
tibiais) tem importante participação, bem como alterações
hemorreológicas (maior viscosidade sangüínea e menor de-
formabilidade das hemácias) e alterações imunes, como me
nor opsonização e disfunção da fagocitose pelos neutrófilos
e macrofagos.3 O controle glicêmico adequado, o combate à
obesidade e a monitorização de possíveis infecções em feri
das cirúrgicas são importantes medidas de prevenção a alte
rações de cicatrização nesses pacientes.
k CORTICOTERAPIA SISTÊMICA
O uso sistêmico de corticoides altera toda a resposta ce
lular no processo de cicatrização com diminuição na proli
feração de fibroblastos, redução do tecido de granulação, da
epitelização e da contração da ferida de forma dosedepen-
dente (baixas doses por curtos períodos praticamente não
têm impacto, enquanto o uso crônico de altas doses pode ter
efeito residual por até 1 ano).
Esses efeitos anti-inflamatórios podem ser revertidos
com o uso de vitamina A (provavelmente por antagoni-
zar a ação estabilizadora da membrana lisossomal exerci
da pelo corticoide, que impede a liberação de mediadores
inflamatórios).2'17
• MALIGNIZAÇÃO DE CICATRIZES
Feridas crônicas e cicatrizes instáveis têm risco aumen
tado de desenvolver câncer, transformando-se em úlceras
Fig. 2.11 • Úlcera de Marjolin em cicatriz instável após queimadura em
membro inferior.
de Marjolin. A transformação é mais comum em cicatrizes
de queimaduras, mas pode ocorrer em úlceras flebopáticas,
úlceras de pressão, lesões de lúpus e áreas de enxerto de
pele.19
O tempo médio para o surgimento de neoplasias é de 35
anos, mas pode ocorrer até com menos de 1 ano, sendo o car-
cinoma espinocelular (CEC) o tipo histológico mais comum,
com agressividade exacerbada e mau prognóstico. Sua inci
dência estimada é de 1:300 úlceras crônicas ou de 0,77% a 2%
das cicatrizes de queimaduras. O índice de metástases é de
aproximadamente 30% a 61%, contra 0,5% a 3% dos CEC de
outras origens.19
O tratamento padrão é a ressecção cirúrgica com margens
de 2 cm e uso de radioterapia complementar em casos es
pecíficos. O mais importante, em se tratando das úlceras de
Marjolin, todavia, é a prevenção, com o tratamento precoce
de cicatrizes instáveis (ressecção e posterior reconstrução
com enxertos ou retalhos) e cobertura ou acompanhamento
clínico e biópsias de feridas crônicas.
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