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1 DIRETRIZES GERAIS PARA TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA Analice Gigliotti Angela Guimarães CAPÍTULO 1 DA NEUROBIOLOGIA AO TRATAMENTO BIOPSICOSSOCIAL DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA Tadeu Lemos AnaliceGigliotti Angela Guimarães INTRODUÇÃO Conjugar as recentes descobertas neurocientíficas ao conjunto de conceitos psicológicos e sociais inerentes à compreensão do comportamento humano é um desafio contemporâneo. Esta integração de saberes é imprescindível para o entendimento, diagnóstico e tratamento da dependência química. Nestas afecções, os fatores determinantes interagem de maneira tão complexa que se torna difícil determinar um agente etiológico presente em todos os indivíduos afetados. Sendo a dependência química uma síndrome multifatorial, pode-se prever alguns conjuntos de fatores envolvidos no seu desenvolvimento:os aspectos genéticos e neurobiológicos; as comorbidades psiquiátricas; a estrutura psicológica do indivíduo e os seus recursos de defesa para o manejo de emoções e situações desestabilizadoras; a oferta e a disponibilidade da droga; o tipo de substância e a via de administração escolhidos; o histórico familiar e suas disfunções; a presença de hereditariedade, de estresse e de eventos traumáticos de vida; e vários outros fatores. Um dos atuais desafios científicos é descobrir quais elementos neurobiológicos e diferenças individuais são capazes de vulnerabilizar pessoas para a dependência química. Genótipo e fenótipo em dependência química Por genótipo entende-se, de maneira geral, o conjunto de tendências biológicas que as pessoas apresentam individualmente. A ação do meio ambiente sobre as condições biológicas do indivíduo produz a expressão do fenótipo. Conforme Messas&Vallada: “A herdabilidade efetiva é das condições de vulnerabilidade e não da doença ou do transtorno em si. No caso da dependência química, portanto, devemos falar, em nome do rigor linguístico, de genética das condições de vulnerabilidade ou suscetibilidade.” Este modelo, que abrange a herança genética das vulnerabilidades e sua modulação ao longo dos anos pelos efeitos ambientais, é denominado modelo epigenético. Com base nos achados destes mesmos autores, fatores como nível de atividade comportamental, emotividade, capacidade de arrefecimento emocional, persistência da atenção e sociabilidade são indicados como traços de personalidade possivelmente relacionados com a vulnerabilidade ao alcoolismo. Estudos realizados com o intuito de encontrar um gene para a dependência de álcool apresentaram resultados iniciais otimistas, no entanto não puderam ser replicados, o que levou à afirmação de que “a resolução do problema não poderia resumir-se à procura de genes únicos”. Outras pesquisas que têm apresentado resultados interessantes são aquelas direcionadas às vulnerabilidades comuns às dependências de álcool, de drogas e a outros traços fenotípicos comportamentais. Nesse modelo, diversos transtornos da psiquiatria apresentariam uma base genética comum, ficando a cargo do desenvolvimento epigenético o papel da produção de um fenótipo ou de outro. Ainda em relação à hereditariedade, trabalhos que examinaram a questão no contexto da dependência de álcool ou de outras drogas encontraram, invariavelmente, uma prevalência significativamente maior dessa dependência em filhos de pais biológicos com diagnóstico semelhante. Utilizando uma modelagem de dados mais complexa, Cadoret e cols. demonstraram dois trajetos genéticos que levariam à dependência de álcool e de outras drogas: um com proveniência direta de um pai com diagnóstico semelhante e outro através de um diagnóstico paterno/materno de transtorno de personalidade antissocial. Na busca de evolução do entendimento acerca dos fatores genéticos preditores da dependência química, estudos com alcoolistas revelaram os seguintes achados: 2 Estudos com gêmeos, pessoas adotadas e variações fisiológicas, embora demonstrem a existência de um componente genético, não permitem a identificação do mecanismo patológico e dos genes predisponentes à dependência. A predisposição genética para o alcoolismo também foi proposta em diversos estudos com pessoas adotadas: filhos de pais biológicos alcoolistas, quando criados por pais adotivos não alcoolistas, apresentam maior risco de desenvolver o alcoolismo, quando comparados a filhos de não alcoolistas sujeitos ao mesmo tipo de adoção. A herdabilidade do alcoolismo é compartilhada, em parte, com a do tabagismo, o que explica a forte associação dos dois problemas. Já o abuso de outras drogas não parece ser preditivo do alcoolismo em parentes. Como bem destacam vários estudiosos da área, quando se trata de síndromes e doenças multifatoriais, pressupõe-se que haja muitos genes participantes, a maioria contribuindo para um pequeno efeito, o que dificulta identificá-los em estudos de ligação. “É preciso, então, focalizar o interesse em certos genes que apresentam maiores chances de aumentar a suscetibilidade.” O que se pode afirmar é que as pessoas apresentam determinadas tendências genéticas e, por vezes, algumas vulnerabilidades neurobiológicas que se manifestam de diferentes formas.O desenvolvimento da dependência química vai depender de um amplo conjunto de fatores, incluindo o genótipo e o fenótipo. Ou seja, quando houver predisposição genética para a dependência de álcool e de outras drogas, esta condição poderá ser potencializada por aspectos disfuncionais de natureza psicológica, familiar, social e ambiental, o que os configura como fatores de risco. Quando estes mesmos fatores psicossociais contribuírem para o bom manejo das dificuldades e das tendências do indivíduo, serão considerados fatores de proteção. Processo neurobiológico do desenvolvimento de dependência Podemos utilizar a noção de “patologias da vontade”, conforme Palmini as nomeia, para o entendimento do processo neurobiológico envolvido na dependência química. O circuito cerebral ligado às vontades e à tomada de decisões para satisfazer as vontades (denominado sistema cerebral de recompensa [SCR]) tem dois lados “antagônicos”: um polo subcortical, muito antigo, representado por estruturas cerebrais que lidam com as emoções e os instintos, o sistema Límbico, e um polo cortical, muito mais recente, constituído pelas regiões pré-frontais. Nos seres humanos, a ativação do polo subcortical do SCR desencadeia sensações de bem-estar e de prazer, e sua inativação ou seu “hipofuncionamento” levam a sensações opostas, de disforia e de ansiedade. Para a compreensão das bases biológicas dos comportamentos decorrentes da dependência química, deve-se considerar o fato de que a nossa cultura descobriu que substâncias como álcool e drogas ativam especificamente estas regiões, agindo no SCR como se fossem as experiências habituais que, naturalmente, causam ativação destas regiões. A compreensão dos sistemas biológicos envolvidos na dependência química e nos demais comportamentos compulsivos ainda é parcial. Sabemos que, embora as drogas de abuso apresentem diferentes perfis neurofarmacológicos, todas, de alguma forma, ativam o sistema dopaminérgico mesocorticolímbico. Este é o sistema que modula nossas emoções e comportamento. A ativação deste sistema, em especial de uma estrutura denominada núcleo accumbens e de suas inter-relações com o prosencéfalo, é responsável pelos efeitos reforçadores prazerosos ou de gratificação. Apesar de o sistema dopaminérgico ser o ator principal deste intrincado fenômeno, importantes vias glutamatérgicas, serotoninérgicas, GABAérgicas, opioidérgicas e canabinoides também o modulam Estudos indicam que o núcleo accumbens não seria apenas uma estrutura moduladora de prazer e de reforço comportamental, mas também uma espécie de filtro ou de amplificadorde informações oriundas de várias áreas límbicas e corticais em direção a áreas motoras do cérebro. Assim, a ativação da via mesocorticolímbica induz à liberação de dopamina no núcleo accumbens, amplificando informações relacionadas com reforço condicionado, resposta sensoriomotora, tomada de decisão e com outros comportamentos de busca, os quais estariam também associados a outros transtornos compulsivos ou da motivação. Compreendemos que o efeito reforçador das drogas no cérebro é uma consequência não somente da ativação de mecanismos reforçadores positivos de recompensa (gratificação, satisfação, prazer), mas também da busca de alívio de sinais e sintomas desagradáveis da abstinência, o reforço negativo. Mais recentemente, Koob & Le Moal vêm descrevendo um terceiro mecanismo, denominado antireward (antirrecompensa), o qual estaria em oposição ao mecanismo reforçador de recompensa. 3 Conexões entre o córtex pré-frontal e o núcleo accumbenstêm importante papel no controle da busca pela substância, pois é o córtex pré-frontal que modula a adequação deste comportamento, da frequência e da quantidade de uso da substância. Conforme alguns autores,a repetição contínua do ciclo “uso da droga e obtenção de prazer”, seguido pelo ciclo “queda dos níveis plasmáticos da droga e sensações de desprazer, disforia, tristeza, apatia”, relaciona-se com modificações moleculares duradouras nos neurônios subcorticais do SCR. Palmini descreve o desenvolvimento deste percurso: o uso repetido das substâncias psicoativas modifica as células e isto gera um estado químico cerebral no qual a vontade do indivíduo em buscar a droga fica cada vez maior, para poder amenizar ou interromper as sensações disfóricas. Ou seja, a vontade já não é por busca de prazer; ela passa a ser um imperativo para “escapar do desprazer”. Por consequência, a realização desta vontade tende a perpetuar este círculo vicioso, caracterizando uma verdadeira “patologia da vontade”. Quando um indivíduo dependente consegue, por meio de diversas modalidades de tratamento, manter-se em abstinência por um período prolongado, as alterações moleculares nos neurônios do SCR lentamente revertem. Porém, as alterações já ocorridas tornam este indivíduo muito mais vulnerável se recair no uso da droga ou de álcool, vai recriar o mesmo ciclo de dependência. Por isso, pode-se afirmar que, embora em abstinência das substâncias psicoativas das quais se tornou dependente, o indivíduo jamais voltará a usufruir daquelas condições do seu cérebro anteriores ao processo de dependência, e por isso será tão fácil ter recaídas. Recaída A recaída é compreendida como a reinstalação do padrão de uso da substância após um período de abstinência. Estudos comportamentais mostram que, mesmo após longos períodos de abstinência, o dependente químico continua vulnerável a estímulos desencadeadores de recaída. Esses estímulos podem estar relacionados com a própria substância ou com eventos estressores. A exposição crônica à droga sensibiliza aqueles circuitos do sistema de neurotransmissão envolvidos nos mecanismos de reforço e nos eventos estressores associados ao comportamento do dependente químico. CRAVING(FISSURA) Há evidências de que a persistente desregulação destes sistemas neurais de reforço e o estresse, mesmo após períodos prolongados de abstinência, configurariam um processo de neurotoxicidade funcional. Estas alterações neurotóxicas, associadas àquelas subjacentes aos processos de aprendizado e memória, autocontrole e motivação, envolvendo a região do cíngulo anterior, do córtex pré-frontal e do córtex orbitofrontal, representariam um estado alostático de vulnerabilidade à recaída e perpetuação do ciclo de dependência. Tais alterações neurobiológicas se expressam comportamentalmente como fissura ou craving. O craving-manifestação de um desejo ou necessidade intensa por uma droga é um fenômeno multidimensional, que inclui - disfunções relacionadas com desejo e satisfação, - intensificação do estado de alerta e do direcionamento motivacional para o uso, - prejuízos cognitivos temporários e elaboração de imagens visuais referentes ao comportamento de uso. Envolve múltiplos sistemas de neurotransmissão e diferentes estruturas anatômicas. É um fenômeno contínuo, que pode ser experimentado repetidamente pelo dependente químico, sendo, por isso, um fator de recaídas. O que mudará ao longo do tempo é a forma como o indivíduo poderá lidar com esta necessidade ou desejo pela droga. O craving pode ser desencadeado pela falta da substância, a exemplo do que acontece com a nicotina; por uma dose inicial, como acontece com o álcool, e também por uma série de fatores 4 condicionantes ambientais, sejam estímulos visuais, olfativos, ou mesmo o estresse.Esses fatores estão condicionados a uma resposta emocional relacionada com o uso da substância. Há grande variabilidade individual nas manifestações do craving. As manifestações orgânicas variam de acordo com a droga usada pelo indivíduo, sendo predominantes os sinais/sintomas autonômicos em graus diversos, como sudorese, taquicardia e redução da temperatura da pele. O craving é -uma manifestação da síndrome de abstinência e -um fator predisponente para a recaída, em que a lembrança do prazer e o desejo de consumo aparecem acompanhados de desconforto físico e psíquico. A intensidade do quadro pode variar de acordo com a substância usada e observa-se, ainda, maior variação em nível individual, tornando-se difícil afirmar qual droga leva ao pior craving. ABORDAGENS TERAPÊUTICAS PARA LIDAR COM O CRAVING Voltar a consumir a substância é inicialmente visto pelo usuário como a melhor alternativa para aliviar esta situação. Saber lidar com o craving é um grande passo para a consolidação da abstinência. Cientificamente, há evidências de boa eficácia das abordagens cognitivas comportamentais no tratamento do craving,com ênfase nos fatores situacionais de risco ou de proteção e no treinamento de habilidades para lidar com as situações deflagradoras e reforçar as protetoras. Alguns medicamentos também podem ser úteis: por exemplo, no caso do dependente de nicotina as terapias de reposição são eficazes; a naltrexona, um antagonista opioide, tem-se mostrado eficaz no tratamento do craving pelo álcool. Uma maior evolução na compreensão e no tratamento do craving deverá emergir de estudos genéticos envolvendo a expressão gênica associada a funções neurobiológicas e suas expressões comportamentais, o que determinará um avanço na farmacogenética do craving e da dependência química. Função das psicoterapias Como estamos falando de uma doença multifatorial, a psicoterapia jamais deixará de exercer seu papel. Acreditando que todo aprendizado tem impacto mensurável no cérebro, a psicoterapia bem-sucedida a implicaria obrigatoriamente mudança observável. De que forma, então, os aspectos neurobiológicos e psicológicos se inter-relacionariam? As terapias — sejam comportamentais, psicodinâmicas ou analíticas — buscam a conscientização das emoções e suas associações cognitivas, e o sucesso terapêutico depende do grau de ativação dos processos internos de transformação, os quais devem apresentar correlações neurobiológicas. Já está bem definido que a amígdala, estrutura do sistema límbico que se conecta com estruturas superiores como o córtex pré-frontal, é responsável pela interpretação do ambiente, avaliação de riscos e segurança. Assim, medeia as reações emocionais, como o medo, a raiva e a percepção de segurança ou ameaça, modulando o afeto e as relações interpessoais. Além disso Stern e cols. publicaram, em 1998, um artigo afirmando que as mudanças ocorridas a partir da terapia psicoanalítica devem-se a modificações nos modelosde relacionamento implícitos, armazenados em áreas cerebrais inacessíveis à consciência. Espera-se que a evolução dos estudos comportamentais utilizando técnicas de neuroimagem esclareça como as diferentes técnicas psicoterapêuticas afetam os processos neurobiológicos das emoções e do comportamento. Conclusão A dependência de drogas é uma doença multifatorial, envolvendo aspectos biológicos, psicológicos e sociais que se inter-relacionam.Da mesma forma, seu tratamento deve ser também multifacetado, implicando o uso de medicamentos que atuam nos sistemas cerebrais envolvidos no craving, a abordagem psicológica e a atuação nos aspectos sociais que influenciam e são influenciados pelo uso de drogas. 5 CAPÍTULO 2 DIRETRIZES FARMACOLÓGICAS PARA TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA DE ÁLCOOL Ana Cecília PettaRoselli Marques Marcelo Ribeiro Araújo Ronaldo Laranjeira Marcos Zaleski INTRODUÇÃO Os problemas relacionados com o consumo do álcool só podem ser comparados àqueles causados pelo consumo do tabaco e pela prática de sexo sem proteção. As complicações referentes ao consumo de álcool não estão, necessariamente, relacionadas com o uso crônico.Intoxicações agudas, além de trazerem riscos diretos à saúde, deixam os indivíduos mais propensos a acidentes. Desse modo, problemas relacionados causados pelo consumo de álcool podem acometer indivíduos de todas as idades. Esta é uma condição que deve ser investigada por todos os profissionais de saúde, em todos os pacientes. O diagnóstico precoce melhora o prognóstico entre esses indivíduos. Aqueles com padrão nocivo de consumo devem ser motivados para a abstinência ou para a adoção de padrões mais razoáveis, ao passo que, em casos de diagnóstico de dependência de álcool, deve-se recomendar o encaminhamento para um serviço de tratamento especializado. EPIDEMIOLOGIA A dependência de álcool acomete 10% a 12% da população mundial. É por isso, ao lado do tabagismo, a forma de dependência que recebe maior atenção dos pesquisadores. Muitas características, como gênero, etnia, idade, ocupação, grau de instrução e estado civil, podem influenciar o uso abusivo de álcool, bem como o desenvolvimento da dependência. A incidência é maior entre os homens do que entre as mulheres. O mesmo se repete entre os mais jovens, especialmente na faixa etária dos 18 aos 29 anos, de modo que o consumo declina com a idade. Pesquisas realizadas no Brasil mostram que o álcool é responsável por cerca de 60% dos acidentes de trânsito e que aparece em 70% dos laudos cadavéricos das mortes violentas. O recente e pioneiro estudo probabilístico em nível nacional coordenado pela Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (UNIAD) da UNIFESP — o primeiro levantamento nacional do padrão de consumo de álcool na população brasileira — revelou que 52% dos brasileiros adultos consomem bebidas alcoólicas. Os jovens adultos (de 18 a 24 anos) consomem mais que os idosos, assim como os homens em relação às mulheres, definindo uma tendência mundial. Avaliação inicial, triagem e diagnóstico Algumas considerações acerca do consumo de álcool merecem atenção da prática clínica diária. Para que sejam contempladas, faz-se necessária a implementação de procedimentos de avaliações e triagem por profissionais de saúde dirigidos ao uso, ao abuso e à dependência de álcool. Tabela 2.1 Considerações importantes acerca do consumo de álcool o Não existe consumo de álcool isento de riscos. o O uso nocivo e a dependência de álcool são pouco diagnosticados. o A ênfase prática da clínica geral diária está dirigida apenas às complicações clínicas do consumo. o A demora em fazer o diagnóstico piora o prognóstico. PADRÃO DE CONSUMO O padrão de consumo de álcool é um aspecto relevante na avaliação inicial de qualquer paciente: - detecta os níveis de gravidade, - a investigação detalhada do padrão de consumo permite a observação de rituais de uso e auxilia no estabelecimento de estratégias de mudanças. O padrão de consumo de álcool aceitável pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é de até 21 unidades para os homens e de 14 unidades para as mulheres. O cálculo semanal das unidades de álcool permite determinar o uso de baixo risco, o uso nocivo e a dependência para os homens e para as mulheres. 6 TRIAGEM OU RASTREAMENTO Em serviços de atenção primária à saúde, recomenda-se a aplicação de questionários de triagem para determinar a presença de uso nocivo ou de risco. O questionário CAGE, um dos mais indicados, é de fácil aplicação. A partir desta avaliação inicial, critérios da Classificação Internacional das Doenças (CID-10) podem ser aplicados para o diagnóstico diferencial entre abuso e dependência de álcool. Todas estas etapas da avaliação fazem parte da fase mais importante do tratamento: o diagnóstico multidimensional.Dele dependerão o planejamento do tratamento e a intervenção subsequente. Intoxicação aguda Intoxicação é o uso nocivo de substâncias, em quantidades acima do tolerável para o organismo. Os sinais e sintomas da intoxicação alcoólica caracterizam-se por níveis crescentes de depressão central: Inicialmente há sintomas de euforia leve, evoluindo para tonturas, ataxia e incoordenação motora, passando para confusão e desorientação e atingindo graus variáveis de anestesia, entre eles o estupor e o coma. A intensidade da sintomatologia da intoxicação tem relação direta com a alcoolemia (Tabela 2.6). O desenvolvimento de tolerância, a velocidade da ingestão, o consumo de alimentos e alguns fatores ambientais também são capazes de interferir nessa relação. A partir de l50 mg% de alcoolemia deve-se intervir. A maioria dos casos não requer tratamento farmacológico. De acordo com os sintomas e sinais, deve-se conduzir medidas gerais de suporte à vida (Tabela 2.6). 7 Síndrome de abstinência do álcool CONCEITO A cessação da ingestão crônica de álcool ou a sua redução podem levar a um conjunto de sinais e sintomas de desconforto definidos pela Classificação Internacional de Doenças (CID-10) como síndrome de abstinência de álcool (SAA). BASES NEUROBIOLÓGICAS A SAA resulta de um processo neuroadaptativo do sistema nervoso centrar (SNC). Há dois tipos de adaptação. Frente à presença constante da substância, elas se estabelecem em busca de um novo equilíbrio [Figura 2.2]. A adaptação de prejuízo é a diminuição do efeito da droga sobre a célula. A adaptação de oposição é a instituição de uma força no interior da célula, antagônica ao efeito da droga. A síndrome de abstinência aparece quando da remoção do álcool. QUADRO CLÍNICO -A maioria dos dependentes (70% a 90%) apresenta síndrome de abstinência entre leve e moderada, caracterizada por: tremores, insônia, agitação e inquietação psicomotora. Ela se dá cerca de 24 a 36 horas após a última dose ingerida. Apenas medidas de manutenção geral dos sinais vitais são aplicadas nesses casos. -Por volta de 5% dos dependentes apresentarão síndrome de abstinência grave. - A SAA é autolimitada, com duração média de 7 a 10 dias (Figura 2.4). Crises convulsivas aparecem em 3% dos casos e geralmente são autolimitadas, não requerendo tratamento específico. A mortalidade gira em torno de l%. A relação entre a interrupção do uso de bebida alcoólica e o aparecimento dos sintomas de tremores, alucinações e delirium tremens está demonstrada na Figura 2.5. 8 O sintoma de abstinência mais comum é o tremor, acompanhado de irritabilidade, náuseas e vômitos. De intensidade variável, tais sintomas aparecem algumas horas após a diminuição ou parada da ingestão e são mais observados no período da manhã. Os tremores são acompanhados de hiperatividade autonômica,desenvolvendo-se taquicardia, aumento da pressão arterial, sudorese, hipotensão ortostática e febre (< 38°C). Os critérios diagnósticos para síndrome de abstinência do álcool, de acordo com a OMS (CID-10), estão listados na Tabela 2.7. 9 Tabela 2.7 • Critérios diagnósticos para SAA OMS ESTADO DE ABSTINÊNCIA (F 10.3) A. Deve haver evidência clara de interrupção ou redução do uso de álcool, após uso repetido, geralmente prolongado e/ou em altas doses. B. Três dos seguintes sinais devem estar presentes: 1. Tremores da língua, das pálpebras ou das mãos quando estendidas 2. Sudorese 3. Náuseas, ânsia de vômitos ou vômitos 4. Taquicardia ou hipertensão 5. Agitação psicomotora 6. Cefaleia 7. Insônia 8. Mal-estar ou fraqueza 9. Alucinações visuais, táteis ou auditivas transitórias 10. Convulsões tipo grande mal Se o delirium está presente, o diagnóstico deve ser estado de abstinência alcoólica com delirium (delirium tremens) (F10.4)*, e sem e com convulsões (F10.40 e 41).* * F10.3, F10, 4, F10.40 e F10.41: referências de localização no Catálogo DSM-IV. CRITÉRIOS DE GRAVIDADE DA SAA Conforme exposto anteriormente, a SAA tem diferentes níveis de gravidade, que podem variar desde quadro eminentemente psíquico (insônia, irritabitidade, piora das funções cognitivas) até outros, marcadamente autonômicos, com delirium e crises convulsivas. SAA NÍVEL I Trata-se de SAA leve a moderada.Aparece nas primeiras 24 horas após a ingestão da última dose. Instala- se em 90% dos pacientes e cursa com agitação, ansiedade; tremores leves de extremidades; alteração do sono, da percepção sensorial, do humor, do relacionamento interpessoal, do apetite; sudorese em surtos; aumento da frequência cardíaca, do pulso e da temperatura. Alucinações são raras (Tabela 2.9). SAA NÍVEL II Trata-se de SAA grave.Cerca de 5% dos pacientes evoluem do nível I para o II após cerca de 48 horas da ingestão da última dose. Os sinais autonômicos são mais intensos, os tremores se tornam generalizados, ocorrem alucinações auditivas e visuais e desorientação temporoespacial (Tabela 2.10). Em um estágio ainda mais grave, cerca de 3% dos pacientes do estágio II chegam ao delirium tremens 72 horas após a ingestão da última dose. O delirium piora ao entardecer (sundowning). Há risco de sequelas e de óbito entre aqueles que não recebem tratamento, dos quais 10% a 15% apresentam convulsões do tipo grande mal.Esta psicose orgânica é reversível, com duração de 2 a 10 dias, e cursa com despersonalização, humor intensamente disfórico, alternado da apatia até a agressividade. Deve-se fazer diagnóstico diferencial com traumatismo craniano e doenças epileptiformes. TRATAMENTO LOCAL PARA TRATAMENTO OU SETTING O local para aplicar qualquer medida assistencial depende da avaliação de cada caso e da disponibilidade dos serviços de saúde em cada local [Figura 2.6]. O atendimento em ambulatório, além de ser menos dispendioso, não interrompe a vida social do indivíduo, favorecendo sua permanência no trabalho e no seio familiar. A abordagem hospitalar destina-se àqueles com SAA nível II, por se tratar de um ambiente protegido 10 e mais seguro para manejar complicações. Neste setting, a recuperação pode ser mais rápida, em razão da possibilidade de controle do indivíduo e pelos recursos disponíveis. O nível de gravidade da SAA aferido pela CIWA-Ar (Escala da ClinicalInstituteWithdrawlAssessmentRevised) pode determinar a escolha do setting mais adequado: com escore igual a ou acima de 20, o paciente deve ser encaminhado para uma unidade hospitalar de emergência para internação. Escores menores permitem a desintoxicação domiciliar ou ambulatorial, dependendo dos recursos clínicos, psíquicos, sociais e do local. 11 TRATAMENTO CLÍNICO E MEDICAMENTOSO DA SAA O manejo clínico e medicamentoso dos pacientes também está condicionado à gravidade da SAA. Pacientes com SAA nível I podem receber tratamento ambulatorial, com consultas frequentes. O tratamento da SAA nível II é obrigatoriamente hospitalar, em razão do estado confusional do paciente, da presença frequente de complicações clínicas associadas, da necessidade de exames laboratoriais de controle e de manejo da dose dos medicamentos [Tabela 2.12]. Tratamento farmacológico da síndrome de dependência Em 1948, nos EUA, utilizou-se pela primeira vez uma medicação no tratamento, o dissulfiram. Este recurso tem apresentado resultados positivos como coadjuvante no tratamento. A naltrexona tem a função de diminuir o prazer ao beber por meio da liberação das endorfinas e consequente bloqueio da dopamina. O acamprosato, ao contrário da naltrexona, reduz o desejo compulsivo que aparece na abstinência por meio da redução da atividade glutamatérgica e do aumento da GABAérgica. O topiramato, antagonista do receptor AMPA do glutamato, reduz a propriedade de reforço positivo do etanol. Ainda não está aprovado para este fim, mas estudos mostram que reduz a fissura. Todo este arsenal tem efeitos adversos, pode desenvolver toxicidade hepática e lesionar o feto. Portanto, não deve ser usado em grávidas, hepatopatas, adolescentes e idosos. CAPÍTULO 3 DIRETRIZES FARMACOLÓGICAS PARA TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA DE MACONHA Ana Cecília PettaRoselli Marques Marcelo Ribeiro Araújo Ronaldo Laranjeira Marcos Zaleski INTRODUÇÃO A Cannabis sativa, arbusto da família das Moraceae, conhecido pelo nome de “cânhamo-da-índia”, cresce livremente nas regiões tropicais e temperadas. Seus efeitos medicinais e euforizantes são conhecidos há mais de 4 mil anos. Na China existem registros históricos das suas ações medicinais desde o século III a.C. No início do século XX, a maconha passou a ser considerada um “problema social”, sendo banida legalmente na década de 1930. Nas décadas de 1960 e 1970, seu consumo voltou a crescer significativamente, chegando ao ápice no biênio 1978/1979. 12 Epidemiologia A maconha é a droga ilícita mais usada mundialmente. O uso da maconha geralmente é intermitente e limitado. A dependência de maconha está entre as dependências de drogas ilícitas mais comuns: 1 em 10 daqueles que usam maconha torna-se dependente em algum momento dentro do período de 4 a 5 anos de consumo pesado. Este risco é mais comparável ao da dependência de álcool (15%) do que ao de outras drogas (tabaco 32% e opioides 23%). Farmacologia A Cannabis sativa contém aproximadamente 400 substâncias químicas, entre as quais se destacam pelo menos 60 alcalóides, conhecidos como canabinoides, que são os responsáveis pelos seus efeitos psíquicos. Em razão da sua lipossolubilidade, os canabinoides acumulam-se principalmente nos órgãos em que os níveis de gordura são mais elevados (cérebro, testículos e tecido adiposo). Alguns pacientes podem exibir sintomas e sinais de intoxicação por até 12 a 24 horas, devido à liberação lenta dos canabinoides a partir do tecido adiposo. Complicações agudas Os efeitos da intoxicação aparecem após alguns minutos do uso (Tabela 3.1). Déficits motores (p. ex., prejuízo da capacidade para dirigir automóveis) e cognitivos (p. ex., perda de memória de curto prazo, com dificuldade para lembrar-se de eventos que ocorreram imediatamente após o uso da Cannabis) costumam acompanhar a intoxicação (Tabela 3.2). 13 Tabela 3.2 Déficits motores e cognitivos observados durante a intoxicação aguda por maconha Redução da capacidade para solucionar problemas e classificar corretamente as informações (p. ex.: sintetizar da parte para o todo) Habilidades psicoespaciais prejudicadas (p. ex.: problemas para diferenciar tempo e espaço) Piora da compreensão diante de estímulos sensoriais apresentados Redução da capacidade para realizar atividades complexas (p. ex.: dirigir automóveis) Prejuízo da representação mental do ambiente Redução das atividades da vida diária Redução da capacidade de transferir material da memória imediata para a memória de longo prazo Piora das tarefas de memória de códigos Ressaca’ matinal Redução da formação de conceitos Piora da estimativa de tempo Piora da capacidade de concentração Sintomas psiquiátricos O consumo de maconha pode desencadear quadros temporários de natureza ansiosa, como reações de pânico, ou sintomas de natureza psicótica. Ambos habitualmente respondem bem a abordagens de reasseguramento e, na maioria dos casos, não há necessidade de medicação. A maconha é capaz de piorar quadros de esquizofrenia, além de constituir importante fator desencadeador da doença em indivíduos predispostos. Complicações crônicas Ainda há pouco consenso a respeito das complicações crônicas do consumo de maconha. As investigações acerca da existência de sequelas ao funcionamento cognitivo e de dependência da maconha, como as descritas a seguir, têm merecido a atenção dos pesquisadores nos últimos anos. FUNCIONAMENTO COGNITIVO Há evidência de que o uso prolongado de maconha é capaz de causar prejuízos cognitivos relacionados com a organização e integração de informações complexas, envolvendo vários mecanismos de processos de atenção e de memória. Tais prejuízos podem aparecer após poucos anos de consumo. Processos de aprendizagem podem apresentar déficits após períodos mais breves. Prejuízos da atenção podem ser detectados a partir de fenômenos como aumento da vulnerabilidade à distração, afrouxamento das associações, intrusão de erros em testes de memória, inabilidade em rejeitar informações irrelevantes e piora da atenção seletiva. Tais prejuízos parecem estar relacionados com a duração, mas não com a frequência, do consumo de maconha. Porém um estudo recente comparando usuários pesados de maconha com ex-usuários pesados e com usuários recreacionais, constatou que os déficits cognitivos, apesar de detectáveis após sete dias de consumo pesado, são reversíveis e estão relacionados com o consumo recente de maconha, e não com o uso cumulativo ao longo da vida. DEPENDÊNCIA A dependência da maconha vem sendo diagnosticada, há algum tempo, nos mesmos padrões das outras substâncias. O risco de dependência aumenta conforme a extensão do consumo. Apesar disso, alguns usuários diários não se tornam dependentes ou desejam parar o consumo. A maioria dos usuários não se torna dependente, e uma minoria desenvolve uma síndrome de uso compulsivo semelhante à dependência de outras drogas. Para complementar a formalização da dependência da maconha, a síndrome de abstinência desta droga, apesar de reconhecida como fato pelo CID-10, só havia sido descrita em laboratório. Não existe uma síndrome de abstinência específica para a maconha, preferindo-se denominar os sintomas observados como sintomas de rebote (Tabela 3.3). 14 Tabela 3.3 Sintomas de abstinência da maconha Fissura Irritabilidade Nervosismo Sintomas depressivos Inquietação Insônia Redução do apetite Cefaleia Intervenções mínimas, de natureza motivacional ou cognitiva, têm-se mostrado de grande valia para esses indivíduos. Casos de dependência estabelecida devem ser encaminhados para atenção profissional especializada. Buspirona, bupropiona, nefazodona, entre outras substâncias, já foram testadas para controlar a síndrome de abstinência da maconha, mas sem sucesso. Agonistas canabinoides promoveram algum alívio. Antipsicóticos atípicos diminuíram o consumo da droga.Um antagonista canabinoide, o rimonabant, tem mostrado resultados positivosno tratamento. CAPÍTULO 4 DIRETRIZES FARMACOLÓGICAS PARA TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA DE COCAÍNA Ana Cecília PettaRoselli Marques Marcelo Ribeiro Araújo Ronaldo Laranjeira Marcos Zaleski Epidemiologia A cocaína e o crack são consumidos por 0,3% da população mundial. A maior parte dos usuários concentra- se nas Américas (70%). Nas salas de emergência, a cocaína é responsável por 30% a 40% das admissões relacionadas a drogas ilícitas, 10% entre todos os tipos de drogas e 0,5% das admissões totais. A população de usuários é extremamente jovem. Farmacologia A cocaína é um alcaloide extraído das folhas da coca. Genericamente, a obtenção da cocaína passa por duas etapas e origina diversos subprodutos. O refino da pasta origina a cocaína em pó (cloridrato de cocaína), apresentação mais conhecida em nosso meio. O crack e a merla são a cocaína em sua forma de base livre. Via de administração e dependência O consumo da substância pode se dar por qualquer via de administração, com rápida e eficaz absorção pelas mucosas oral e nasal e pela via pulmonar. A euforia desencadeada reforça e motiva, na maioria dos indivíduos, o desejo por novo episódio de consumo. Porém, quanto mais rápido o início da ação e quanto maior a sua intensidade e, ainda, quanto menor a sua duração, maior será a chance de o indivíduo evoluir para situações de uso nocivo e dependência. Esses fenômenos são todos influenciados pela via de administração escolhida. A via de administração é um importante fator de risco para o uso nocivo e para a dependência. Manifestações agudas A cocaína apresenta múltiplas ações periféricas e centrais: é um potente anestésico local com propriedades vasoconstritoras e também um estimulante do sistema nervoso central (SNC). Os efeitos agudos produzem quadro de euforia, com sintomas físicos de natureza autonômica 13 (Tabela 4.2). 15 Complicações agudas As complicações relacionadas com o consumo de cocaína capazes de levar o indivíduo ao atendimento médico são geralmente agudas e individuais. A via de administração escolhida pode ocasionar complicações específicas. As complicações psiquiátricas são as que mais levam os usuários de cocaína ao atendimento médico.Quadros agudos de pânico e de transtornos depressivos e psicóticos são os mais relatados. O prognóstico dos indivíduos portadores de comorbidades é mais comprometido e aumenta a necessidade de procura por atendimento médico. Tabela 4.2 Principais sintomas decorrentes do consumo de cocaína SINTOMAS PSÍQUICOS SINTOMAS FÍSICOS Aumento do estado de vigília Euforia Sensação de bem-estar Autoconfiança elevada Aceleração do pensamento Aumento da frequência cardíaca Aumento da temperatura corpórea Aumento da frequência respiratória Sudorese Tremor leve de extremidades Espasmos musculares (especialmente língua e mandíbula) Tiques Midríase Fonte: Gold MS (1993) INTOXICAÇÃO AGUDA Além da toxicidade inerente à substância, a presença concomitante de comprometimentos nos órgãos mais afetados pela ação simpaticomimética da cocaína torna seus portadores ainda mais suscetíveis a complicações — coronariopatias, hipertensão arterial sistêmica (HAS), aneurismas, epilepsias e doenças pulmonares obstrutivas crônicas (DPOC). OVERDOSE Dentre as complicações agudas relacionadas com o consumo de cocaína, a overdoseé a mais conhecida. Pode ser definida como: a falência de um ou de mais órgãos decorrente do uso agudo da substância (Figura 4.2). Seu mecanismo de ação está relacionado com o excesso de estimulação central e simpática. A overdose de cocaína é uma emergência médica e, por isso, requer atenção imediata. As complicações referentes ao aparelho cardiovascular e ao sistema nervoso central recebem algunscomentários, em razão da maior incidência de ambas e do valor que representam para o manejo clínico. 16 COMPLICAÇÕES NO SISTEMA CARDIOVASCULAR As complicações cardiovasculares decorrentes do uso de cocaína são as mais frequentes entre as complicações não psiquiátricas. COMPLICAÇÕES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL Cerca de um terço dos acidentes vasculares encefálicos (AVE) e adultos jovens está associado ao consumo de drogas. Entre os indivíduos de 20 a 30 anos de idade, este índice chega a 90%. A cocaína é a substância ilícita mais associada a distúrbios cerebrovasculares. COMPLICAÇÕES PSIQUIÁTRICAS AGUDAS As complicações psiquiátricas são o principal motivo de busca de atendimento médico entre os usuários de cocaína.Elas podem decorrer tanto de episódios de intoxicação aguda quanto da síndrome de abstinência da substância e ser responsáveis pelo aparecimento de uma série de transtornos psiquiátricos (agudos e crônicos) (Tabela 4.4). Tabela 4.4 Principais sinais e sintomas psiquiátricos agudos entre usuários de cocaína Disforia Ansiedade Agitação Heteroagressividade Sintomas paranoides Alucinações Para boa parte das admissões nas salas de emergência, o diagnóstico psiquiátrico é sindrômico ou sintomático. Há vários fatores que justificam tal procedimento. Primeiro, a abordagem premente está voltada para a complicação psiquiátrica que trouxe o indivíduo para o atendimento médico. Segundo, a questão temporal: há escassez de tempo e necessidade de uma história mais elaborada — que raramente ocorre nesse ambiente. Por último, o quadro apresentado é muitas vezes mascarado ou potencializado pela presença do consumo de drogas ou pela síndrome de abstinência. Desse modo, medicar de acordo com os sintomas apresentados, dar suporte clínico e tranquilizar o paciente com abordagens voltadas para a realidade, que demonstrem segurança profissional, consistem na melhor conduta. SINTOMATOLOGIA DE NATURESA ANSIOSA: quadros de inquietação de natureza ansiosa. SINTOMATOLOGIA DE NATURESA PSICÓTICA: podem desaparecer espontaneamente após algumas horas. Agitação extrema, decorrente destes sintomas, pode necessitar de sedação. Gravidez O consumo de cocaína na gravidez está associado a complicações como baixo peso ao nascer, abortos espontâneos e déficits cognitivos no recém-nascido. Não há evidência de síndrome teratogênica. Síndrome de abstinência Cessados os efeitos euforizantes, sobrevêm os sintomas opostos, depressivos.Durante a abstinência: períodos de desejo intenso pelo consumo de cocaína (craving [fissura]) associados a outros sintomas de abstinência, como fadiga, anedonia e depressão, acabam por levar ao retorno de uso da droga, estabelecendo o círculo vicioso da dependência química. Uma síndrome de abstinência bem definida é observada em muitos usuários crônicos ou mesmo naqueles que utilizam a droga por poucos dias, em forma de binge (consumo excessivo). A abstinência de cocaína ocorre tipicamente em três fases: crash,síndrome disfórica tardia e extinção. Estas fases representam a progressão de sinais e sintomas após a cessação do uso de cocaína, descritas a seguir. Fase I crash:drástica redução no humor e na energia. Instala-se cerca de 15 a 30 minutos após cessado o uso da droga, persistindo por cerca de 8 horas, e podendo estender-se por até 4 dias. Está associada à depleção de neurotransmissores na tenda sináptica, decorrente do uso de cocaína. O usuário pode sentir depressão, ansiedade, paranoia e intenso desejo pelo consumo da droga (craving). Este último sintoma diminui após 1 a 4 horas. O craving inicial pelo uso 17 da droga é substituído pelo sono. Instala-se a hipersonia, aversão ao uso de mais cocaína, e o indivíduo desperta em algumas ocasiões para ingerir alimentos em grande quantidade. Esta última parte pode durar de 8 horas até 4 dias. Fase II síndrome disfórica tardia:inicia-se cerca de 12 a 96 horas após cessado o uso, seguindo-se ao crash, e pode durar de 2 a 12 semanas. Nos primeiros 4 dias, há sonolência e desejo pelo consumo da droga. Após esse período, inicia-se uma síndrome de abstinência protraída (prolongada), disfórica, em que predominam anedonia (perda ou ausência da capacidade para ter prazer), irritabilidade e apatia, com presença de craving, que varia em intensidade de indivíduo para indivíduo.O usuário pode ficar deprimido, apresentar problemas de memória e até mesmo manifestar ideação suicida. Ocorrem recaídas frequentes, como forma de tentar aliviar os sintomas disfóricos. Fase III fase de extinção:aqui os sintomas disfóricos diminuem ou cessam por completo. O craving torna- se intermitente, mas pode manifestar-se eventualmente, com tendência a diminuir de intensidade, mas podendo estender-se por meses ou até mesmo anos. Complicações crônicas A dependência é a principal complicação crônica relacionada com o consumo de cocaína. Até o momento, nenhum medicamento se mostrou eficaz para proporcionar alívio aos sintomas de abstinência, tampouco para atuar sobre o comportamento de busca da substância. Condutas a esse respeito têm sido tomadas a partir da prática clínica, sem, no entanto, haver evidências científicas com probatórias. Farmacoterapia com evidências Pesquisadores e clínicos continuam tentando encontrar uma medicação que bloqueie ou reduza de forma significativa os efeitos da cocaína. Também é objeto de pesquisa a síntese de medicamentos que aliviem os graves sintomas do craving. O dissulfiram tem sido utilizado no tratamento da dependência de cocaína em razão de sua ação inibitória sobre a enzima dopamina-hidroxilase, que determina uma inibição da conversão da dopamina em noradrenalina esta ação aumenta a ansiedade e os sintomas desagradáveis, como a paranoia. Antidepressivos, como a mirtazapina e a desipramina, assim como agonistas do glutamato, como o modafinil, estão sendo estudados. Uma vacina de cocaína está sendo testada, mas ainda precisa ser bastante aperfeiçoada. Conclusão Até o momento, não há evidência clínica suficiente para o uso eficaz dos diversos fármacos disponíveis. Assim, em associação com a farmacoterapia, abordagens psicossociais, em especial a terapia cognitivo- comportamental, podem ser mais efetivas para reduzir o consumo de cocaína nos pacientes em tratamento. Em resumo, prover um tratamento para cada indivíduo em particular é fundamental para o resultado do processo terapêutico. CAPÍTULO 5 DIRETRIZES FARMACOLÓGICAS PARA TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA DE ANFETAMÍNICOS Ana Cecília Petta Roselli Marques Marcelo Ribeiro Araújo Ronaldo Laranjeira Marcos Zaleski INTRODUÇÃO As anfetaminas foram sintetizadas na década de 1930, para o tratamento do transtorno de déficit de atenção e da hiperatividade (THDA), então denominado hiperatividade ou disfunção cerebral mínima. Atualmente são indicadas para o tratamento da THDA, da narcolepsia e da obesidade, com restrições. Nos últimos 20 anos, anfetaminas modificadas têm sido sintetizadas em laboratórios clandestinos para serem utilizadas com fins não médicos. A mais conhecida e utilizada no Brasil é a 3,4-metienodioximetanfetamina (MDMA), o ecstasy, uma metanfetamina inicialmente identificada com os clubbers em suas festas, conhecidas por raves. 18 Epidemiologia As anfetaminas são consumidas por 0,6% da população mundial, sendo alguns países asiáticos responsáveis por 50% deste consumo. O consumo no Brasil é pouco conhecido. Entre estudantes, o uso das anfetaminas predomina na população feminina, provavelmente com o intuito de perder peso. Tabela 5.2 Tipos de usuários de anfetamina USUÁRIOS INSTRUMENTAIS Consomem anfetamina com objetivos específicos, como melhorar o desempenho no trabalho e emagrecer.USUÁRIOS RECREACIONAIS Consomem anfetamina em busca de seus efeitos estimulantes. USUÁRIOS CRÔNICOS Consomem anfetamina com a finalidade de evitar o desconforto dos sintomas de abstinência. Farmacologia As anfetaminas são estimulantes do sistema nervoso central (SNC), capazes de gerar quadros de euforia, provocar a vigília, atuar como anorexígenos e aumentar a atividade autonômica dos indivíduos (Tabela 5.3). Tabela 5.3 Sinais e sintomas do consumo de anfetaminas Redução do sono e do apetite Aceleração do curso do pensamento Verborragia Diminuição da fadiga Euforia Midríase (dilatação da pupila) Taquicardia Elevação de pressão arterial Complicações agudas Quadros agudos de ansiedade, com sintomas de pânico e de inquietação, podem aparecer na intoxicação aguda, ou overdose. Irritabilidade, tremor, ansiedade, labilidade do humor, cefaleia, calafrios, vômitos, sudorese e verborragia podem acompanhar este estado, que necessitará de farmacoterapia. O uso endovenoso (pouco frequente no Brasil) produz quadro de intenso prazer (rushou flash), sensação de poder, hiperexcitabilidade, euforia e aumento da libido. Comportamentos agressivos podem aparecer. A tolerância e fissura pelo flash levam a um padrão de uso compulsivo por longo período, seguido de exaustão e períodos prolongados de descanso. Sintomas paranoides podem surgir durante a intoxicação. Há problemas relacionados com o uso injetável, como infecções, endocardites e abscessos. Ecstasy O ecstasy(MDMA), habitualmente consumido em tabletes ou cápsulas, contém cerca de l20 mg da substância. Produz quadro de euforia e de bem-estar, sensação de intimidade e proximidade com os outros. Outros efeitos são anorexia, taquicardia, tensão maxilar, bruxismo e sudorese. As principais complicações ameaçadoras à vida na overdose por anfetaminas incluem: hipertermia, hipertensão, convulsões, colapso cardiovascular e traumatismos. Edemas pulmonares cardiogênicos também são possíveis. Síndrome de abstinência A síndrome de abstinência chega a atingir cerca de 87% dos usuários de anfetamina. Sintomas de depressão e de exaustão podem suceder a períodos prolongados de uso ou abuso (Tabela 5.4). Sintomas mais pronunciados de abstinência foram observados em usuários de metanfetaminas pela via inalatória (ice e crystal). 19 Tabela 5.4 Sinais e sintomas de abstinência das anfetaminas Fissura intensa Redução da energia Ansiedade Lentificação Agitação Humor depressivo Pesadelos Tratamento O tratamento medicamentoso para a remissão dos sintomas de abstinência das anfetaminas não tem se mostrado promissor. Complicações crônicas Pessoas que desejam melhorar seu convívio social utilizam anfetaminas cronicamente em baixas doses (20 a 40 mg/dia) e de modo socialmente imperceptível. Tais indivíduos expõem-se a atividades e esforços desnecessários, resultando em fadiga excessiva. Sua crítica sobre a relação entre fadiga e uso prolongado de anfetaminas é prejudicada. A tentativa de abandonar ou diminuir o uso resulta em depressão e letargia. A utilização crônica torna-o distante da realidade, irritado, paranoide e impulsivo, descuidado com a aparência e com seus compromissos. Pode haver suicídio decorrente da impulsividade do uso ou da depressão nos períodos de exaustão. Sintomas psicóticos com sintomas de primeira ordem podem ocorrer em qualquer modo de uso. Normalmente, os acometidos são usuários crônicos, que utilizam anfetaminas em grande quantidade. As principais características são a presença de delírios persecutórios e autorreferentes, além de alucinações auditivas e visuais. O tratamento pode ser feito com neurolépticos ou benzodiazepínicos. Quanto às complicações clínicas, o uso crônico leva a estados de desnutrição e a complicações como infarto agudo do miocárdio, cegueira cortical transitória, cardiopatias irreversíveis, vasoespasmos sistêmicos e edema agudo de pulmão. Dependência O uso crônico de anfetamina ou de seus derivados pode resultar em uma síndrome de dependência, em razão do desenvolvimento do fenômeno de tolerância. A dependência grave e significativa foi diagnosticada clinicamente em usuários regulares por uma escala modificada de dependência, o AmphetamineDependenceQuestionnaire— SamDQ. Antes do desenvolvimento de tolerância, os efeitos estimulantes são proporcionais aos níveis plasmáticos de anfetamina, mas o uso crônico leva à tolerância dos efeitos euforizantes, com uma escalada no uso para manter os mesmos efeitos, fenômeno comum a outros estimulantes, como a cocaína. Com o uso crônico e o desenvolvimento de tolerância, os usuários tendem a aumentar o consumo, ingerindo maiores doses da droga e, com maior frequência, modificando o padrão de uso. Muitos usuários começam, então, a fazer ingestão em binge, o que é caracterizado pela administração repetida por até 12 a 18 horas, e podendo chegar a 3 a 7 dias seguidos. Há o afastamento das atividades sociais, tendendo ao isolamento, com foco apenas na compra e obtenção dos efeitos da droga. No final do período de binge, o indivíduo entra na fase de crash, caracterizada por depressão inicial seguida de agitação, ansiedade, persistência do desejo para continuar o consumo (craving), que é vencido pela fadiga e depressão, e, finalmente, perda do interesse pela droga e sonolência.Após este período, se não houver retomado o uso do estimulante, o usuário crônico começa a apresentar os sinais e sintomas da síndrome de abstinência, que se caracteriza por fissura intensa, ansiedade, agitação, pesadelos, fadiga e humor depressivo. Apesar das complicações agudas e crônicas e dos sinais e sintomas de dependência, a maioria dos dependentes não procura auxílio especializado. Por outro Lado, observa-se que não há abordagens específicas e fundamentadas em evidências para esses pacientes. Considerar o consumo de anfetamina entre indivíduos que apresentam complicações decorrentes do consumo da substância, bem como motivá- los a buscar tratamento especializado melhora o prognóstico. Em razão da importância do tema, a busca de consenso tem sido constante nos vários encontros de especialistas em diferentes oportunidades. 20 CAPÍTULO 6 DIRETRIZES FARMACOLÓGICAS PARA TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA DE NICOTINA Ana Cecília Petta Roselli Marques Marcelo Ribeiro Araújo Ronaldo Laranjeira Marcos Zaleski INTRODUÇÃO O consumo do tabaco, um dos maiores problemas de saúde pública, atinge proporções internacionais. O combate ao fumo e a seus malefícios ganhou fôlego apenas nos últimos 20 anos. Além da abordagem preventiva, novas técnicas terapêuticas e farmacoterápicas efetivas foram desenvolvidas, tornando o tratamento desta dependência bastante promissor e digno de atualização. Epidemiologia O consumo diário de cigarros atinge 20,3% da população paulista, o correspondente a 3.019 milhões de pessoas. O cigarro e outras formas de uso do tabaco são capazes de levar à dependência, decorrente da ação da nicotina. A idade média de início de consumo situa-se entre 13 e 14 anos, mas a vulnerabilidade para dependência não se relaciona apenas com a idade. O uso das demais drogas pelos adolescentes declina com a idade. Isto, no entanto, não acontece com relação ao tabaco. Estima-se que 60% daqueles que venham a fumar por mais de seis semanas irão continuar fumando por mais 30 anos e que 30% a 50% das pessoas que começam a fumar criam dependência decorrente do uso problemático. Embora o uso do primeiro cigarro seja tipicamente marcado por efeitos desagradáveis, como dor de cabeça, tonturas, nervosismo, insônia, tosse e náuseas, estes diminuem rapidamente, possibilitando novas tentativas, até que se desenvolve a tolerância à droga e se estabelece um padrãotípico de consumo diário. Em poucos meses, alguns fumantes já começam a apresentar os primeiros sintomas da síndrome de abstinência. Os sintomas e a magnitude desta síndrome podem persistir por meses e, dependendo de sua gravidade, são pouco tolerados. A expectativa de vida de um indivíduo que fuma muito é 25% menor que a de um não fumante. Entre as 25 doenças relacionadas com o hábito de fumar, todas são causas de morte: doenças cardiovasculares (43%); câncer (36%); doenças respiratórias (20%) e outras (1%). Farmacologia A queima de um cigarro libera nicotina, substância que é responsável pela dependência do tabaco. Diagnóstico O consumo de tabaco geralmente começa na adolescência; quanto mais precoce, maior a gravidade da dependência e dos problemas a ela associados. Assim, todos os indivíduos que chegam aos serviços de saúde devem ser questionados quanto ao hábito de fumar. Os que fumam devem ser aconselhados a interromper o uso de tabaco. Caso não seja possível aconselhar adequadamente, é melhor encaminhar o fumante para um serviço especializado. O Questionário de Tolerância de Fagerström pode ser aplicado para a avaliação da gravidade da dependência de nicotina. Os pacientes em condições mais graves deverão receber mais recursos para auxiliar o tratamento, principalmente em relação à síndrome de abstinência. Tratamento A escolha do melhor tratamento depende de uma boa avaliação. Tanto os fatores extrínsecos (do modelo disponível, das condições socioeconômicas) quanto os intrínsecos (da motivação do paciente e do diagnóstico) devem ser levados em consideração. TÉCNICAS DE ABORDAGEM O tratamento pode ser definido a partir do consumo de cigarros e dos problemas associados, levando-se em consideração a disponibilidade de intervir de cada local. 21 Os métodos de tratamento de primeira linha são: a terapia de reposição de nicotina (TRN) e a terapia comportamental breve em grupo. Os grupos de autoajuda e outros medicamentos, ambos considerados de segunda linha, podem ser coadjuvantes efetivos. A associação de mais de um recurso melhora a efetividade do tratamento. Nos serviços de atendimento primário um aconselhamento mínimo pode ser aplicado com dois objetivos: orientar aqueles que desejam parar de fumar motivar aqueles que não querem largar o cigarro. As sessões de aconselhamento podem ser mínimas (3 minutos); de baixa intensidade (3 a 10 minutos) e intensivas (10 a 30 minutos). Caso o fumante não esteja interessado em interromper o uso, estratégias motivacionais devem ser implementadas. A estratégia de “prós e contras” é um dos exemplos. Tabela 6.4 Intervenção mínima para o dependente de nicotina o Perguntar sobre o consumo diário de tabaco e problemas a este associados. o Investigar o desejo do paciente de interromper o consumo. o Aconselhar a cessação do uso. o Oferecer assistência durante o processo. o Efetuar o seguimento ABORDAGEM DO CRAVINGOU FISSURA Em todos os tratamentos, a abstinência é a meta mais importante e mais difícil de ser mantida. A maioria dos fumantes em tratamento tem recaída em poucos dias. A abordagem de um dos sintomas mais proeminentes da síndrome de abstinência, o cravingou “fissura”, deve ser cuidadosamente considerada, já que este é o maior obstáculo para parar de fumar (ver Tabela 6.6). Tabela 6.6 Como ajudar o paciente a lidar com a fissura O que é a fissura Trata-se de uma situação comum que se manifesta na forma de um mal-estar súbito (disforia), com sintomas de ansiedade e, por vezes, a ideia fixa de que aquilo só passará após o consumo. Não significa que há algo errado com o indivíduo, tampouco que ele quer voltar ao consumo. A fissura é o resultado de neuroadaptações sofridas pelo sistema nervoso É autolimitada É importante que o paciente saiba disso. Na verdade, qualquer episódio se resolve em menos de uma hora, caso a pessoa permaneça abstinente. Conseguir atravessar um episódio fortalece a resistência para o seguinte. 22 Tipos de fissura Para muitos, a fissura é puramente somática (“sinto algo em meu estômago”, “meu coração dispara”). Para outros, é cognitiva (“não consigo tirar a ideia de usar da cabeça”). Há, ainda, aqueles que a sentem de modo mais afetivo (“sinto um tédio enorme”) Negação da presença da fissura Isso faz as pessoas agirem de modo impulsivo, muitas vezes, identificar que a fissura está na base de muitas atitudes impensadas ajuda o paciente a estabelecer o controle sobre si e seu consumo É desencadeada por gatilhos. Evite-os Gatilhos são situações, locais ou lembranças que desencadeiam a fissura, Procure mapear as principais situações de risco com o paciente e oriente-o no sentido de evitá-las. Maneiras de o indivíduo lidar com a fissura Distração. Prepare uma lista do que pode ser feito nessa hora (atividade tísica, arrumação do quarto etc.). Conversar com alguém sobre ela. Eleja pessoas de fácil acesso e de confiança com as quais possa se comunicar com facilidade. “Entrar” na fissura. Vivenciar as fases da fissura (pico súbito e descendente). Lembrar as consequências negativas do consumo, que o levaram a buscar a abstinência. Conversar consigo. Fazer uma contraposição aos pensamentos que o estimulam ao consumo nessa hora. Farmacoterapia TERAPIA DE REPOSIÇÃO DA NICOTINA O único tratamento farmacológico considerado de primeira linha licenciado na Inglaterra é a terapia de reposição da nicotina [TRN], que tem como objetivo aliviar os sintomas da síndrome de abstinência da substância. Qualquer profissional de saúde treinado pode aplicar a terapia de reposição ou substituição de nicotina para os pacientes que consomem mais de 10 cigarros/dia. Este tratamento pode ser aplicado por meio de quatro formas de apresentação. No Brasil, estão disponíveis apenas o adesivo de nicotina e a goma de mascar. Adesivo de nicotina:pode ser indicado mesmo para aqueles que consomem baixos níveis de tabaco. Esta forma de TRN é a mais indicada por ter menos efeitos colaterais. Os adesivos devem ser trocados diariamente. A utilização é feita por um prazo médio de oito semanas. A redução da dose é progressiva e pode durar até um ano. Goma de mascar:cada unidade contém 2mg de nicotina ativa. Este método não deve ser indicado para grávidas, para menores de 18 anos e para aqueles pacientes portadores de doenças cardiovasculares instáveis, como infarto do miocárdio recente, angina instável ou determinadas arritmias. A TRN deve ser acompanhada de aconselhamento. Não há necessidade de que este seja intensivo. O método tem produzido resultados positivos quando aplicado em adultos sem outras comorbidades. FARMACOTERAPIA PARA REDUÇÃO DA FISSURA A bupropiona, substância de primeira linha para o tratamento nos EUA, está indicada para adultos que consomem 15 cigarros ou mais ao dia. Para fumantes com depressão a indicação é mais precisa. A bupropiona é um antidepressivo que atua como bloqueador da recaptação de dopamina e noradrenalina. Supõe-se que o aumento dos níveis de dopamina esteja diretamente relacionado com a diminuição da “fissura” ou craving. 23 O tratamento pode ter duração de 7 a 12 semanas. A associação da TRN com a bupropiona tem aumentado a efetividade da intervenção, quando comparada ao uso de bupropiona isoladamente. A bupropiona apresenta algumas contraindicações (Tabela 6.7) absolutas que devem ser sempre e cuidadosamente investigadas. Tabela 6.7 Contraindicações ao uso da bupropiona Condições que implicam risco de crises convulsivas Episódios anteriores Traumatismo cranioencefálico Retirada recente de álcool Transtorno bulímico ou anorexia nervosa Uso concomitante de inibidores da monoamina oxidase (IMAO) Uso concomitante de compostos contendo bupropiona A clonidina e a nortriptilina, consideradas intervenções de segunda linha, estão indicadas para aqueles que se tornaram inelegíveis ou não se beneficiaram do tratamento com a bupropiona. A Tabela 6.8 resume a abordagem ao fumante. A associação da psicoterapia com a farmacoterapia tem-se mostrado a intervenção mais efetiva. A terapia comportamental e a TRN aparecem como a associação mais indicada.Materiais didáticos de autoajuda, aconselhamento por telefone e estratégias motivacionais ajudam a melhorar a efetividade do tratamento. Se todas estas ações falharem, o paciente deve ser encaminhado a um especialista. Nestes casos, deve ser indicada uma abordagem mais intensiva, com intervenções mais estruturadas e associadas com outras medicações. Uma nova linha de pesquisa, decorrente da evidência de que mesmo com a aplicação das terapias de primeira e segunda linha acontece a recaída, vem buscando o estudo dos diferentes genótipos relacionados com a dependência. 24 Tabela 6.8 Farmacoterapia para o tratamento da dependência de nicotina FARMACOTERAPIA DE PRIMEIRA LINHA Terapia de reposição de nicotina (TRN) Adesivo de nicotina Duração do tratamento: 6 a 8 semanas Apresentação: adesivos com 7, 14 e 2l mg Dosagem: tabagista de < 20 cigarros/dia: 14 a 2l mg/dia tabagista de 20 a 40 cigarros/dia: 21 a 35 mg/dia tabagista de > 40 cigarros/dia: 42 a 44 mg/dia Contraindicações: menores de idade, grávidas e idosos com doenças cardiovasculares ativas Goma de mascar Duração do tratamento: 8 a 12 semanas Apresentação: tabletes com 2mg cada Dosagem: 10 a 15 tabletes/dia (dosagem inicial) Contraindicações: menores de idade, grávidas e idosos com doenças cardiovasculares ativas Bupropiona Duração do tratamento: 7 a 12 semanas Apresentação: comprimidos de 150 mg Dosagem: dose inicial de 150 mg ao dia por 3 dias a partir do quarto dia: 150mg pela manhã e l50 mg após oito horasda primeira dose Contraindicações: antecedente de crises epilépticas, bulimia, anorexia nervosa,uso de inibidores da monoaminoxidase (IMAO) FARMACOTERAPIA DE SEGUNDA LINHA Indicada para aqueles que não se beneficiaram da terapia de reposição ou da bupropiona Clonidina Duração do tratamento: 2 a 6 semanas Dosagem: 0,1 a 0,4 mg/dia (dose inicial), com ajustes ao longo do tratamento Nortriptilina Duração do tratamento: 7 a 12 semanas Dosagem: 75mg/dia (dose inicial), com ajustes ao longo do tratamento Novas medicações estão sendo testadas para tratar os diferentes casos. Entre elas destacam- se o baclofen — antagonista do receptor GABA B — a reboxetina — um inibidor de recaptação na noradrenalina — e a mecamilamina — antagonista de receptor nicotínico. A utilização do rimonaband, antagonista canabinoide do receptor CB1, com ação na neurotransmissão dopaminérgica, e de vacinas é uma estratégia moderna em desenvolvimento. O tartarato de vareniclina, agonista parcial da nicotina [receptor atfa-4-beta-2), já disponível no Brasil, tem mostrado resultados promissores. Conclusão O desenvolvimento de terapêutica mais moderna, a partir dos estudos relacionados com a genética da dependência, vem recebendo muitos investimentos e tem-se mostrado bastante promissor. A integração das informações, a educação continuada e as políticas públicas também devem ser focos importantes nesta investigação. O transtorno por dependência de substâncias psicotrópicas é um fenômeno complexo que necessita de amplo direcionamento de recursos humanos e financeiros voltados à prevenção, com o objetivo claro de proteger as crianças e os jovens do resultado previsto e devastador do consumo de tabaco. 25 Questões: 1- CSM-2012 2- QT-2012 3- De acordo com o livro de Gigliotti, como podemos nomear o fenômeno que é uma manifestação da síndrome de abstinência e um fator predisponente para a recaída no qual a lembrança do prazer e o desejo de consumo aparecem acompanhados de desconforto físico e psíquico? A) Ambivalência. B) Overdose C) Transtorno compulsivo D) Craving E) Tolerância 4- Em relação ao consumo de álcool algumas considerações merecem atenção da prática clínica diária. Assinale a alternativa incorreta. A) O uso nocivo e a dependência de álcool são pouco diagnosticados. B) A ênfase prática da clínica geral diária está dirigida apenas às complicações clínicas do consumo. C) Apenas o padrão de baixo consumo de álcool é isento de riscos. D) A demora em fazer o diagnóstico piora o prognóstico. 5- Dos sintomas abaixo, quais estão relacionados na síndrome de abstinência de maconha? A) Fissura, irritabilidade e alucinação. B) Nervosismo, sintomas depressivos e aumento do apetite. C) Inquietação, insônia e fissura. C) Redução do apetite, cefaleia e alucinação. 6- Dentre as complicações advindas do uso de cocaína, as complicações psiquiátricas são o principal motivo de atendimento médico. Marque a alternativa que descreve os principais sintomas psiquiátricos agudos entre usuários de cocaína. A) Disforia, ansiedade e cefaleia. B) Disforia, heteroagressividade e alucinações. C) Ansiedade, agitação e sudorese. D) Ansiedade, cefaleia e sintomas paranoides. 7- (QT-2013, questão 37) 26 8- (CSM-2013, questão 2) 9) (CSM- 2015) 27 Gabarito: 1)A; 2) B; 3)D ;4) C ;5) C; 6) B; 7)E; 8) D; 9) D DIRETRIZES GERAIS PARA TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA CAPÍTULO 7 Introdução à abordagem psicossocial da dependência química Ana Cecília PettaRoselli Marques Introdução A grande variedade das propostas de tratamento para dependência de álcool e de outras drogas ilícitas decorre da diversidade dos conceitos sobre sua etiologia e de como estes são assimilados nas diversas culturas. Isto pode ser notado pela presença do tema, na literatura médica, como também na psicologia e na sociologia. Visto que a etiologia da dependência é multidimensional, o diagnóstico e os tratamentos variam em razão da importância atribuída a cada uma destas dimensões, pelos diferentes profissionais ou instituições. Evolução histórica Os tratamentos especializados só apareceram a partir do século XIX. Foram eles dirigidos, em geral, a casos crônicos e graves, com ênfase no modelo médico. As intervenções mais antigas tinham cunho religioso, ritualístico, ou se restringiam ao encaminhamento para os antigos e punitivos asilos de pacientes “inebriados”. 28 Por volta de 1935, surgiram nos EUA os Alcoólicos Anônimos [AA], propondo o tratamento para o alcoolismo por intermédio da participação do indivíduo em grupos de ajuda mútua, abordagem que acompanhou o período de transição do conceito moral, predominante na maioria dos países, para o conceito de doença, reintroduzido na época. Mais tarde, os AA passaram a coadjuvantes de diversos serviços de saúde na Europa e nos EUA. Na década de 1940, a forma de tratar os dependentes de álcool recebeu também a influência do Movimento de Temperança, além dos AA e do modelo médico. Em todos eles, a abstinência era considerada a única meta possível. Apesar da evolução do conceito de dependência de álcool do modelo moral para o modelo de doença, ainda nesta mesma época, nos países socialistas, o alcoolismo continuava sendo visto como um comportamento desviante, um crime, sendo o indivíduo “tratado” sob as penas da Justiça. Além das bebidas alcoólicas, outras drogas psicotrópicaspassavam a ser alvo de preocupação em diversos países e sob diferentes contextos, como o ópio, a morfina, a nicotina e a cocaína. Nos anos seguintes, por influência da psiquiatria e da neurologia, o modelo médico se tornou preponderante, destacando também o papel da família e da sociedade no seu desenvolvimento.Decorrente dele, a internação foi amplamente utilizada. A psicanálise convencional não foi considerada, desde o início de sua aplicação, um bom remédio para tratar a dependência. Esta teoria sobre o psiquismo emprestou, então, alguns de seus pressupostos fundamentais para intervenções psicodinâmicas que não se mostraram eficientes. Um dos problemas prioritários ficava sem solução: a manutenção do comportamento de busca pela droga, ligado às pistas internas incontroláveis e às pistas advindas do ambiente Na década de 1970, a preocupação econômica, ligada aos gastos com a saúde, no mundo, deu origem à avaliação dos tratamentos em uso. A proposta do tratamento hospitalar deixou de ser a opção preferencial, e os tratamentos ambulatoriais, mais baratos e mais breves, passaram a ser oferecidos principalmente para pacientes mais jovens e em estágio inicial de problemas. Além do modelo médico de tratamento, surgiram outras propostas de intervenção advindas da teoria cognitivo-comportamental e fundamentadas na visão da dependência como um hábito adquirido, um comportamento aprendido, automático e, portanto, passível de ser modificado. Arnold &Lazarus ampliaram este pensamento explicando o estresse e sua relação com um comportamento habitual. A emoção estava vinculada a muitas reações e, portanto, a cognição e o comportamento não poderiam ser vistos separadamente. Logo, o entendimento da cognição pôde ser uma ferramenta essencial para a modificação do comportamento. Também na década de 1960, nas ciências sociais, Bandura desenvolveu a teoria do aprendizado social, discutindo mais uma vez o determinismo recíproco da cognição e do comportamento. Este conceito foi retomado pela teoria psicológica de Beck na qual o enfrentamento de situações estressantes por meio da mudança do comportamento disfuncional era utilizado no tratamento de pacientes deprimidos. O uso da bebida alcoólica, ou de outras drogas psicotrópicas, foi então explicado como um comportamento automático, aprendido e possível de ser redimensionado. A terapia cognitivo- comportamental foi avaliada por meio de vários estudos e se mostrou tão efetiva quanto as demais para o tratamento de dependentes. Alguns pesquisadores propuseram sua utilização no início da intervenção, pois a aplicação de tarefas auxiliava os pacientes ainda muito intoxicados. A técnica de “beber moderadamente” e a da “prevenção da recaída” foram desenvolvidas com o mesmo referencial teórico e técnico e resultados diferentes no tratamento de dependentes de álcool. Intervenção breve Ainda na década de 1970, um grupo de pesquisadores reformulou a intervenção psicossocial, abreviando o tempo de intervenção e reduzindo o foco para diferentes etapas do tratamento, desenvolvendo a intervenção breve (briefintervention), proposta como uma abordagem psicoterapêutica para 29 dependentes de álcool pela primeira vez em 1972 por Sanchez-Craig e cols., no Canadá. Com a aplicação de quatro sessões focalizadas e simples, seus autores observaram imediata redução do consumo de álcool em dependentes graves e, consequentemente, a melhora na saúde, quando comparados a uma amostra semelhante de pacientes sem tratamento. A técnica canadense, clara e diretiva, que podia ser aplicada por profissionais de várias formações, desde que bem treinados por curto tempo. Os serviços ambulatoriais e as terapias breves passaram a ser mais solicitados que os tratamentos hospitalares, cujo custo era muito alto: comprovadamente, a intervenção ambulatorial mais breve se mostrava tão efetiva quanto os tratamentos intensivos e o custo era bem menor. Assim, a intervenção breve foi utilizada com os seguintes objetivos: 1. Possibilitar a utilização de um modelo de tratamento mais simples e, da mesma forma, efetivo, além de menos custoso, para indivíduos em estágio inicial de problemas com o uso do álcool. 2. Intervir junto a pacientes que procuravam ajuda espontaneamente, realizando a triagem direcionada para o consumo, ampliando a possibilidade de elaborar um diagnóstico precoce na atenção primária à saúde. 3. Incluir, mais tarde, a intervenção na avaliação inicial dos pacientes em atendimentos de diversas especialidades, para encaminhamento adequado daqueles que necessitassem de avaliação especializada. 4. Ser aplicada na etapa inicial de tratamento dos serviços especializados, com foco na motivação e no desenvolvimento do vínculo. Para ampliar sua aplicabilidade e utilizá-la em diferentes contextos e de acordo com os recursos de cada local, incrementou-se o modelo original, agregando-se telefonemas, materiais didáticos e o envio de cartas para sensibilização. Todos estes métodos produziram resultados efetivos. Em estudos preliminares, a oferta de maior ou menor número de sessões mostrou-se um fator de influência na efetividade do tratamento. A aplicação de uma sessão apenas, comparada aos tratamentos formais e mais prolongados, produziu resultados semelhantes quanto à efetividade. A intervenção breve tem-se mostrado mais efetiva do que não receber qualquer intervenção e apresentado o mesmo impacto que intervenções intensivas e, portanto, deve ser utilizada. Em razão deste aspecto e da brevidade da técnica, introduziu-se a entrevista motivacional na estrutura da intervenção breve. A motivação foi então estudada e considerada como um fator preditor de efetividade no tratamento. Para usuários de risco, a intervenção breve tem sido muito utilizada e se mostrado efetiva, reduzindo em até 30% o consumo de álcool, com objetivos diversos. É uma abordagem adaptável a qualquer local de tratamento, desde o serviço básico de saúde, nas salas de emergência, até os serviços especializados. Aplicada a populações especiais, adolescentes, grávidas e idosos, teve bons resultados. Os indivíduos com dependência grave também se beneficiaram deste tratamento. Na década seguinte, houve expansão das internações domiciliares, da terapia química aversiva, da terapia familiar sistêmica, das comunidades terapêuticas, do acompanhamento terapêutico, entre outras abordagens. As psicoterapias multimodais que combinam mais de um referencial teórico das escolas de psicologia vêm sendo utilizadas. A “intervenção breve” adaptada ao formato brasileiro foi desenvolvida e adaptada também para o grupo terapêutico. Panorama atual A utilização de algumas substâncias vem sendo proposta para o alívio dos sintomas da abstinência e do forte desejo de consumir a droga. Os agentes farmacológicos agem em várias vias do sistema nervoso 30 central e, associados com as psicoterapias, melhoram o resultado dos tratamentos.O pareamento do paciente com o tratamento mais adequado também tem sido uma premissa necessária a ser adotada. No Brasil, os tratamentos para dependência ainda não acompanham esta tendência mundial de utilização de psicoterapias mais breves. A associação da intervenção psicossocial com a farmacoterapia é preconizada, pois diversos outros aspectos do dependente devem ser abordados, como, por exemplo, as morbidades psiquiátricas e as morbidades orgânicas, que impedem a estabilização da dependência, caso não sejam tratadas. Conclusão Em suma, o tratamento do dependente depende: Do conceito de dependência adotado. Da sua assimilação pela cultura e da política de cada local. Do tipo de substância mais prevalente utilizada pela população que se quer cuidar. Da motivação do
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