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Fundação Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro Centro de Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro AVALIAÇÃO À DISTÂNCIA – AD1 Período - 2018/1º Disciplina: Turismo e Patrimônio Coordenador: Euler David de Siqueira AD1 – (Valor até 100 pontos) A primeira avaliação a distância consiste de uma única questão geral. Porém, você precisará articular diferentes conceitos e discussões presentes em outras apostilas. Assim, para responder a essa questão você terá de articular as apostilas n° 01, 02, 03, 04 e 05. Leia atentamente o enunciado abaixo. A apostila n° 01 discute o que é patrimônio assim como suas diversas subdivisões: patrimônio artístico, natural, paisagístico, etnológico, arquitetônico, histórico, patrimônio cultural, etc. Em todas essas classificações encontra-se presente a ideia de valor. Perceba que o patrimônio é entendido como algo dotado de um grande valor a ponto de ser conservado e transmitido às gerações futuras. Nem sempre essa transmissão se faz de forma consciente e intencional. Assim como a cultura, o patrimônio é vivido pelos membros do grupo sem que se tenha muito consciência disso. Isso é válido principalmente para as sociedades tradicionais, mas entre as sociedades modernas também algo parecido ocorre. Dois aspectos aqui são importantes reter: 1 - não é tudo e tão pouco qualquer coisa que são tidas como um valor pelos membros de uma dada sociedade. Ou seja, há valores que são situados em um tipo de hierarquia; 2 - o patrimônio é sempre transmitido, o que implica em uma continuidade ao longo do tempo assegurada pela educação e pela socialização. Não há tradição se não há transmissão da cultura e a transmissão somente se dá pela via da educação. Observe que quando digo que o patrimônio é transmitido não estou querendo dizer que ele é transmitido sempre da mesma forma; não, não se trata disso. Isso que chamamos de patrimônio terá sempre de ser interpretado à luz de um dado sistema de coordenadas simbólicas que para ir rápido chamamos de cultura. Entenda cultura como um esquema que alia percepção, representação, memória, classificação, identificação, rotulação, etc. O detalhe é que não nos damos conta de que vivemos imersos na cultura assim como o peixe na água. Não percebemos a cultura enquanto esquema de classificação devido ao fato de a naturalizarmos. Naturalizar a cultura significa concebê-la como uma realidade independente e autônoma dos sujeitos que a sustentam ou a portam. Quando começar a perceber que há algo mais presente na nossa forma de perceber o mundo do que somente nossos olhos você nunca mais o verá da mesma forma. Lembre-se de que vemos o mundo de acordo com critérios construídos pelos membros de uma sociedade ou grupo social. Esses critérios podem variar enormemente de grupo para grupo, o que leva a conflitos, mal entendidos, visões distintas da realidade, etc. Os membros de uma sociedade jamais percebem o mundo todos da mesma forma. Mesmo os sujeitos que integram o mesmo grupo social também não enxergam o mundo da mesma forma, da mesma maneira porque as “lentes culturais” que usam para perceber o mundo não são as mesmas. Entenda cultura como uma lente através da qual percebemos o mundo: isso é uma metáfora, obviamente. A constituição do patrimônio sempre levará em conta a cultura ou as culturas de uma sociedade. Então falaremos sempre de patrimônios no plural. Mesmo a natureza é uma invenção da cultura, do homem vivendo em sociedade. A ideia de natureza, de algo separado do humano, do social, é, por mais absurdo que possa parecer uma construção social. Claro, utilizamos o que nos é dado para fazer essa construção. Os homens não inventaram as plantas e os animais; eles estão no mundo; possuem uma existência, mas a ideia de natureza não é uma ideia que apareceu por si só; ela é o fruto de uma reflexão sistemática feita principalmente no Ocidente. A concepção de uma natureza oposta à cultura ou ao social é própria do Ocidente. Outros povos e culturas não concebem a natureza como algo separado deles; somente no Ocidente o homem se pôs fora da natureza, rompendo com ela. Bom, mas o importante é simplesmente utilizar isso para pensar o patrimônio natural como sendo também a obra da cultura e da sociedade, claro, ambos inscritos em uma determinada história. Leia mais na apostila n° 05. Sempre houve a preocupação em se conservar e proteger isso que chamamos de patrimônio? De uma certa maneira, não. Lembre-se de que aquilo que é um valor para os membros de uma sociedade nem sempre o é de forma consciente. A tomada de consciência do valor de algo não é algo evidente. Por mais paradoxal que possa parecer, foi a França da revolução de 1789 que primeiro preocupou-se com uma política de preservação de seus bens mais caros. Foi preciso que a destruição dos bens da nobreza e da Igreja pelos revolucionários franceses ocorresse para que soasse o alarme da possibilidade do desaparecimento para sempre de bens tidos como herança de todo o povo francês, o que muitos chamam da retórica da perda. É quando algo está em vias de se perder para sempre que passamos a nos preocupar com ele. Mas para que isso aconteça é preciso que concepções de tempo e espaço apontem para a ideia de um passado que jamais se repetirá; de um tempo que é único, que não volta, que não há retorno, que aponta sempre para o futuro. Ora, essa concepção de tempo é um traço marcante da própria modernidade. É nesse sentido que faz todo o sentido preocupar-se com objetos que foram feitos em um determinado contexto histórico que é único e irreversível. Lembre-se que essa concepção de tempo, a moderna, de algo que avança continuamente e é irreversível, não é universal. Há povos e culturas que concebem o tempo de maneira circular, como em um eterno retorno. No Ocidente a preocupação primeira com o patrimônio foi de ordem dita material. Afinal, a destruição engendrada pela França revolucionária se atacou primeiro aos objetos, prédios, construções, enfim, tudo o que pudesse concretamente representa a monarquia e a Igreja. Em um primeiro momento, portanto, valorizou-se o patrimônio material e, principalmente, os bens tidos como sendo de grande excepcionalidade artística e histórica. Note que esses não são os únicos principios norteados para definir algo como patrimônios. A dimensão espiritual, simbólica, cultural ou ainda representacional, sempre acompanhou os bens materiais, mas não eram explicitados como hoje o fazemos. Note que a discussão sobre patrimônio material e imaterial são temas das aulas 02 e 04. Leia com atenção essas duas apostilas também. Em grande medida, as noções de cultura erudita, elaboradas pelas elites culturais e políticas, ou ainda as versões oficiais dos grupos poderosos, eram os fatores considerados relevantes para dotar o bem como sendo patrimônio. Observe que em uma sociedade circulam diferentes visões de mundo ou ethos ou ainda sistemas de pensamento que não necessariamente são compartilhados por todos os membros da formação social. A diferença social é produzida pela própria forma como os membros de uma sociedade pensam a si próprios e aos demais. Fatores religiosos, políticos e econômicos, principalmente, também são responsáveis por produzir diferença social. Por diferença social entenda a forma como os membros de uma sociedade dividem-se entre proprietários de capitais econômicos, mas, principalmente, simbólicos ou culturais. Somente na modernidade a profissão ou o ramo de produção passou a ser um elemento decisivo à classificação entre operários e burgueses, por exemplo. Na Idade Média as profissões também eram aspectos levados em consideração na divisão social, mas não eram os principais. Pertencer à nobreza, ao clero ou a plebe, pesavam muito mais na atribuição de status deuma pessoa. Uma sociedade, principalmente a moderna, urbana e industrial, admite uma gama vasta de grupos cujos valores não são sempre os mesmos. Acontece que pelo poder da persuasão, da ideologia e com o auxílio dos meios de comunicação, por exemplo, um grupo é capaz de impor sua visão de mundo para o restante da sociedade. Pense um pouco: quem são os proprietários dos meios de produção? Burgueses, empresários, etc. Eles também são os donos ou estão associados com os donos dos meios de produção espiritual ou simplesmente das ideias. Reflita por um momento: você assiste a quais programas de televisão1? Os feitos pelos trabalhadores ou pelos donos dos meios de comunicação? Contudo, isso não significa que todos os membros da sociedade aceitem e, muito menos, estejam de acordo com os pontos de vista hegemônicos das elites. Conflitos, tensões, disputas e lutas são o reflexo ou o efeito de como os grupos distintos de uma sociedade travam batalhas para impor ou negociar a sua visão da realidade. Isso é muito importante, pois o patrimônio é constituído nessas lutas e utilizado de diferentes maneiras pelos grupos dominantes. Esses princípios nortearam durante muito tempo as políticas relacionadas ao patrimônio provocando todo tipo de injustiça em relação aos patrimônios dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, por exemplo. Todos os grupos de uma sociedade têm o direito de eleger seus patrimônios e de geri-los segundo suas crenças e valores, claro, sempre respeitando a legislação em vigor e os demais patrimônios existentes. Mas, em geral, os grupos populares e historicamente marginalizados (Índios e Afrodescentes) são sub- representados no que diz respeito a seus patrimônios. O patrimônio no Brasil organizou-se no governo de Getulio Vargas, nos anos 1930, durante o Estado Novo. A ênfase foi o patrimônio material. Para registrar os bens brasileiros foram criados 4 livros do tombo. Esses quatro livros focam principalmente no patrimônio material: 1 – Livro de Tombo arqueológico, paisagístico e etnográfico; 2 – Livro de Tombo Histórico; 3 – Livro de Tombo das Belas Artes e 4 – Livro de Tombo de Artes Aplicadas. Hoje admitimos que não somente bens materiais e dotados de excepcionalidade artística e histórica figurem como patrimônio. Esses critérios foram elaborados no 1 É verdade que hoje a televisão aberta é deixada de lado em detrimento da Internet e das redes sociais, mais ainda ela é um fator importante na construção do sistema de ideias de uma sociedade. Ocidente e em uma determinada época. Outros povos não compartilham desses preceitos, valorizando outros aspectos, como as coordenadas sociais e culturais utilizadas para se fabricar algo ao invés de somente o resultado final. Valorizar o saber- fazer implica em lidar com uma dimensão diferente da do objeto; implica em lidar com o conhecimento, o saber necessário para se chegar a um resultado. Valoriza-se a técnica ou as técnicas e, principalmente, como transmiti-las ao longo do tempo. Cerimônias, rituais, festas, danças, contos, lendas, mitos, lugares, etc., constituem isso que chamamos de patrimônio imaterial ou intangível. Não podemos tocar, segurar, reter, guardar esse patrimônio porque ele se encontra entre as pessoas, não nas pessoas, mas entre as pessoas. Ninguém detém a totalidade do saber de uma sociedade ou de um grupo; não somos todos socializados na totalidade do conhecimento de uma sociedade, logo, precisamos sempre do outro ou dos outros para, juntos, tecer, construir, enfim, fabricar algo e esse algo também é a própria sociedade. Discutir patrimônio nos remete ao universo cultural, a própria ideia de cultura. Durante muito tempo entendeu-se cultura como um tipo de saber distintivo que pode ser aprendido ou cultivado em detrimento de outras formas de ser, tidas como menores, inferior, insignificantes. É comum ainda hoje escutarmos pessoas dizendo-se mais cultas do que outras, como se cultura fosse algo que se pudesse ter ou conquistar. Cultura, no sentido antropológico, quer dizer toda e qualquer manifestação secretada por um grupo social. Cultura no sentido aprendizado, de saber, de capital distintivo não nos ajuda muito na difícil tarefa de compreender o homem como sujeito histórico. Vista como um conjunto de coordenadas simbólicas que fornecem as pistas para compreendermos, identificarmos e classificarmos os entes no mundo abre enormemente o leque de possibilidades, inclusive no campo do patrimônio. A cultura popular também passou a integrar o universo de bens materiais e imateriais vistos como patrimônio, como herança, podendo ser preservado e transmitido. Assim, também paisagens, modos de se fazer, festas, musica, letras, lugares, línguas, etc., em grande parte fruto das culturas populares passaram a integrar o universo patrimonial de uma sociedade. Após ter lido cuidadosamente o texto acima discuta criticamente as seguintes questões: 1 – Qual a importância do conceito antropológico de cultura para se pensar o patrimônio como uma construção social? 2 – É possível separar o patrimônio material do imaterial? Justifique sua resposta. 3 – Em que medida o conceito antropológico de cultural permitiu a valorização disso que chamamos de patrimônio imaterial ou intangível? 4 – Como pensar o patrimônio dito natural (Parques, Jardins, etc.) sem levar em conta a noção antropológica de cultura? É possível conceber uma natureza separada da cultura? Seja original e criativo. Evite copiar simplesmente a resposta da apostila ou da Internet. Desenvolva sua capacidade analítica e utilize suas próprias palavras. Boa AD1, Euler David de Siqueira
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