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Cap´ıtulo 2 Ga´s ideal 8 de dezembro de 2009 1 Propriedades gerais Func¸a˜o de partic¸a˜o molecular Neste cap´ıtulo estudamos as propriedades termodinaˆmicas de um ga´s cons- titu´ıdo de N mole´culas fracamente interagentes, confinadas num recipiente de volume V a` temperatura T . Em geral as mole´culas de um ga´s, ou de um l´ıquido, se repelem a curtas distaˆncias e se atraem a longas distaˆncias. A forc¸a de atrac¸a˜o entre duas mole´culas diminui com a distaˆncia e se torna desprez´ıvel a distaˆncias suficientemente grandes. Num ga´s, o nu´mero de mole´culas por unidade de volume N/V e´ pequeno o que acarreta uma grande distaˆncia elas. Se a densidade de um ga´s for suficientemente pequena, a distaˆncia me´dia entre mole´culas (V/N)1/3 sera´ enorme de modo que a forc¸a entre as mole´culas sera´ muito pequena e podemos desprezar as interac¸o˜es entre as mole´culas. Um ga´s nessas condic¸o˜es e´ denominado ga´s ideal. Como as interac¸o˜es entre as mole´culas sa˜o desprez´ıveis, as propriedades de um ga´s ideal sa˜o determinadas pela distribuic¸a˜o de probabilidades associada a uma mole´cula ou a uma representante de cada tipo de mole´cula, se o ga´s for constitu´ıdo por va´rios componentes. Os estados associados a uma mole´cula sa˜o descritos, em mecaˆnica cla´ssica, pelo conjunto dos pares de varia´veis formados pelas coordenadas e seus momentos conjugados, cada par constituindo um grau de liberdade. Denotando por γ o conjunto das varia´veis que definem o estado de uma mole´cula e por H(γ) a hamiltoniana cla´ssica associada a uma mole´cula enta˜o a distribuic¸a˜o de probabilidades canoˆnica 1 ρ(γ) e´ dada por ρ(γ) = 1 ζ∗ e−βH(γ), (1) em que ζ∗ e´ um fator de normalizac¸a˜o dado por ζ∗ = ∫ e−βH(γ) dγ. (2) As propriedades termodinaˆmicas do ga´s sa˜o determinadas por meio da func¸a˜o de partic¸a˜o molecular ζ = ζ∗/hn, em que h e´ a constante de Planck e n e´ o nu´mero de graus de liberdade da mole´cula, isto e´, ζ = 1 hn ∫ e−βH(γ)dγ. (3) O fator h−n e´ necessa´rio para que o nu´mero de estados seja aquele que ob- ter´ıamos utilizando o limite semi-cla´ssico da mecaˆnica quaˆntica. E´ impor- tante observar que esse fator afeta a entropia e a energia livre de Helmholtz, que esta˜o relacionadas com o nu´mero de estados, mas na˜o outras grande- zas termodinaˆmicas definidas como me´dias sobre a distribuic¸a˜o (1), que na˜o conte´m a constante de Planck, como e´ o caso da energia me´dia ou da pressa˜o. A hamiltoniana de uma mole´cula pode ser separada em duas partes, H = Htrans +Hint. (4) A primeira parcela esta´ relacionada com os graus de liberdade de translac¸a˜o e e´ simplesmente a energia cine´tica de translac¸a˜o, Htrans = 1 2m (p2x + p 2 y + p 2 z), (5) em que m e´ a massa da mole´cula e px, py e pz sa˜o os componentes cartesianos do momento total da mole´cula, conjugados a`s posic¸o˜es x, y e z do centro de massa da mole´cula. A segunda parcela esta´ associada com outros graus de liberdade relativos aos movimentos de rotac¸a˜o, vibrac¸a˜o, etc., que denomina- mos graus de liberdade internos. As varia´veis que descrevem os movimentos internos sa˜o denotadas coletivamente por σ. Tendo em vista que Htrans na˜o depende de σ e que Hint depende apenas de σ enta˜o ζ pode se escrita como um produto de dois fatores ζ = ζtrans ζint, (6) 2 em que ζtrans = 1 h3 ∫ eβHtrans dxdydzdpxdpydpz (7) e´ a func¸a˜o de partic¸a˜o relativa aos graus de liberdade de translac¸a˜o e ζint = 1 hn−3 ∫ eβHint dσ (8) e´ a func¸a˜o de partic¸a˜o relativa aos graus de liberdade internos. A integrac¸a˜o em x, y e z se estende sobre a regia˜o interna ao recipiente de volume V que conte´m o ga´s. O resultado da integrac¸a˜o nessas varia´veis e´ V e portanto ζtrans = V h3 ∫ e−β(p 2 x+p 2 y+p 2 z)/2mdpxdpydpz. (9) A integrac¸a˜o em cada componente px, py e pz se estende de menos a mais infinito e a func¸a˜o de partic¸a˜o de translac¸a˜o se reduz ao ca´lculo de treˆs integrais gaussianas ζtrans = V h3 ∫ ∞ −∞ e−βp 2 x/2mdpx ∫ ∞ −∞ e−βp 2 y/2mdpy ∫ ∞ −∞ e−βp 2 z/2mdpz, (10) cujo resultado nos da´ ζtrans = V h3 ( 2πm β )3/2 . (11) Definindo a grandeza λ por λ = ( h2β 2πm )1/2 , (12) podemos escrever ζtrans na forma ζtrans = V λ3 . (13) Note que λ possui unidade de comprimento e tem a ordem de grandeza do comprimento de onda de uma part´ıcula livre de massa m e energia kBT e por isso e´ denominada comprimento de onda te´rmico. De fato, a relac¸a˜o entre o comprimento de onda λ∗ de uma part´ıcula livre com a energia E e´ E = (h¯2/2m)(2π/λ∗)2. Se E = kBT = 1/β enta˜o λ ∗ = h(β/2m)1/2 que e´ da ordem de λ. 3 A func¸a˜o de partic¸a˜o molecular de um ga´s ideal pode finalmente ser escrita na seguinte forma ζ = V λ3 ζint. (14) Vale notar que ζint na˜o depende de V mas apenas de T . Propriedades termodinaˆmicas Vimos no cap´ıtulo 1 que a entropia esta´ relacionada com o nu´mero de estados acess´ıveis e que a func¸a˜o de partic¸a˜o ζ e´ uma soma sobre os poss´ıveis esta- dos de uma unidade constitutiva do sistema, no presente caso uma mole´cula. Vimos ainda que a func¸a˜o de partic¸a˜o Z do sistema e´ simplesmente o pro- duto das func¸o˜es de partic¸a˜o ζ de cada unidade constitutiva, isto e´, Z = ζN . Esse resultado, entretanto, e´ va´lido para um sistema composto por unidades constitutivas localizadas espacialmente. No presente caso, as unidades cons- titutivas, que sa˜o as mole´culas do ga´s, na˜o esta˜o localizadas mas se movem no espac¸o e podem ocupar qualquer posic¸a˜o dentro do recipiente. Quando per- mutamos os estados de duas unidades constitutivas quaisquer, admitimos que o estado do sistema na˜o se altera. Como o nu´mero de permutac¸o˜es poss´ıveis com N unidades constitutivas e´ N ! enta˜o o nu´mero de estados acess´ıveis para o sistema sera´ menor por um fator N !. Dessa forma, tendo em vista que Z e´ uma soma sobre estados do sistema, a fo´rmula correta de Z para o presente caso e´ Z = 1 N ! ζN . (15) A partir desse resultado obtemos lnZ = N ln ζ − lnN ! (16) e, utilizando o resultado (14), lnZ = N ln V λ3 +N ln ζint − lnN !. (17) Usando as duas parcelas dominantes da fo´rmula de Stirling lnN ! = N lnN −N + ln √ 2πN, (18) va´lida para N suficientemente grande, alcanc¸amos o resultado lnZ = N ( ln V Nλ3 + ln ζint + 1 ) . (19) 4 A energia livre de Helmholtz F = −kB lnZ vale pois F = −NkBT ( ln V Nλ3 + ln ζint + 1 ) . (20) A pressa˜o p do ga´s e´ dada por p = −∂F ∂V = NkBT V , (21) em que levamos em conta que ζint na˜o depende de V , ou pV = NkBT, (22) que e´ a equac¸a˜o de estado para um ga´s ideal. Como a mesma equac¸a˜o pode ser escrita na forma PV = nRT em que n e´ o nu´mero de moles e R a constante universal dos gases, enta˜o NkB = nR. Por outro lado, a constante de Avogadro NA e´ definida como o nu´mero de mole´culas num mol, isto e´, NA = N/n. Portanto, a constante de Boltzmann kB esta´ relacionada com a constante de Avogadro NA por meio de R = NAkB. (23) Para futura refereˆncia determinamos aqui a energia livre de Gibbs G, que se obte´m por meio de uma transformac¸a˜o de Legendre, G = F +pV . Usando os resultados obtidos para F e p obtemos a seguinte expressa˜o para a energia livre de Gibbs de um ga´s ideal G = −NkBT ( ln kBT pλ3 + ln ζint ) . (24) A energia interna U e´ obtida a partir de U = − ∂ ∂β lnZ = 3 2 NkBT −N ∂ ∂β ln ζint. (25) A energia me´dia por mole´cula u = U/N de um ga´s ideal depende portanto apenas da temperatura. A entropia S e´ calculada por S = −(∂F/∂T ) ou mais simplesmente por S = 1 T (U − F ). (26) 5 Ga´s monoatoˆmico A partir dos resultados acima podemos obter diretamente as propriedades termodinaˆmicasde um ga´s constitu´ıdo de mole´culas monoatoˆmicas. A hamil- toniana H associada a uma mole´cula monoatoˆmica e´ constitu´ıda apenas pela energia cine´tica de translac¸a˜o Htrans. Isso implica que a func¸a˜o de partic¸a˜o da molecula e´ dada por (6) com com ζint = 1. Para obter resultados va´lidos para um ga´s monoatoˆmicao basta colocar ζint = 1 nas fo´rmulas obtidas acima. Fazendo isso, obtemos a energia livre de Helmholtz F = −NkBT ( ln V Nλ3 + 1 ) (27) e a energia interna U = 3 2 NkBT. (28) A capacidade te´rmica a volume constante Cv = ∂U/∂T e´ dada por Cv = 3 2 NkB (29) e portanto o calor especifico a volume constante cv = Cv/N de um ga´s monoatoˆmico vale cv = (3/2)kB. A equac¸a˜o de estado para a pressa˜o permanece a mesma, isto e´, pV = NkBT. (30) A entropia e´ determinada por meio de S = −(∂F/∂T ) ou por S = (U − F )/T que fornecem o resultado S = NkB ( ln V Nλ3 + 5 2 ) , (31) conhecida como a equac¸a˜o de Sackur-Tetrode para um ga´s ideal monoatoˆmico. Usando a equac¸a˜o de estado pV = NkBT , podemos escrever equivalente- mente S = NkB ( ln kBT pλ3 + 5 2 ) . (32) 6 2 Ga´s diatoˆmico Mole´culas diatoˆmicas r´ıgidas As propriedades termodinaˆmicas de mole´culas diatoˆmicas ou, em geral, de mole´culas poliatoˆmicas sa˜o obtidas atrave´s da energia livre F dada por F = −kBT ln ζ N N ! , (33) em que ζ e´ a func¸a˜o de partic¸a˜o da mole´cula e portanto e´ uma integral sobre o espac¸o-γ da mole´cula, composto pelas coordenadas e momentos generalizados da mole´cula. Vamos considerar inicialmente um ga´s de mole´culas diatoˆmicas r´ıgidas. Nesse caso a hamiltoniana H correspondente a uma mole´cula e´ H = Htrans +Hrot, (34) em que Htrans e´ a parte translacional, dada por Htrans = 1 2m (p2x + p 2 y + p 2 z), (35) sendo m e´ a massa da mole´cula e px, py e pz os componentes cartesianos do momento linear da mole´cula, respectivamente conjugados a`s coordenadas cartesianas do centro de massa da mole´cula. A parte rotacional Hrot e´ dada por Hrot = 1 2I (p2θ + 1 sin 2θ p2φ), (36) em que θ e φ sa˜o os aˆngulos que definem o eixo da mole´cula, pθ e pφ sa˜o os respectivos momentos angulares conjugados e I e´ o momento de ine´rcia. As coordenadas do espac¸o-γ sa˜o x, y, z, θ, φ, px, py, pz, pθ, pφ, (37) em que x, y e z sa˜o as coordenadas do centro de massa da mole´cula. A func¸a˜o de partic¸a˜o molecular e´ dada por ζ = 1 h5 ∫ e−βH dxdydzdθdφdpxdpydpzdpθdpφ, (38) 7 em que introduzimos um fator h para cada par formado por uma coordenada generalizada e seu momento conjugado. A func¸ao de partic¸a˜o ζ se fatoriza na forma ζ = ζtransζrot, (39) em que ζtrans = 1 h3 ∫ e−βHtrans dxdydzdpxdpydpz (40) e ζrot = 1 h2 ∫ e−βHrot dθdφdpθdpφ. (41) Efetuando as integrais, obtemos ζtrans = V h3 ( 2πm β )3/2 (42) e ζrot = ∫ ( 2πI h2β )1/2 ( 2πI sin2 θ h2β )1/2 dθdφ = = ( 2πI h2β )∫ sin θdθdφ = 8π2I h2β . (43) Podemos escrever finalmente ζ = V ( 2πm h2β )3/2 8π2I h2β = V λ3 8π2I h2β . (44) A partir dessa expressa˜o podemos calcular a energia interna U = −N ∂ ∂β ln ζ = 5 2 NkBT, (45) da qual obtemos a capacidade te´rmica a volume constante, Cv = ∂U ∂T = 5 2 Nk. (46) A energia livre de Helmholtz e´ dada por F = −NkBT ( ln V Nλ3 + ln 8π2I h2β + 1 ) (47) 8 e a entropia por S = NkB ( ln V Nλ3 + ln 8π2I h2β .+ 7 2 ) . (48) Usando a equac¸a˜o de estado pV = NkBT , podemos escrever equivalente- mente S = NkB ( ln kBT pλ3 + ln 8π2I h2β + 7 2 ) . (49) Rotor quaˆntico Se a temperatura do ga´s for suficientemente alta o ca´lculo cla´ssico de ζrot que fizemos na sec¸a˜o anterior e´ adequado. Entretanto se a temperatura na˜o for suficientemente alta devemos substituir o ca´lculo cla´ssico por um ca´lculo quaˆntico. Nesse caso a parte rotacional da hamiltoniana da mole´cular deve ser substitu´ıda pela hamiltoniana quaˆntica de um rotor, dada por Hˆrot = Jˆ 2 2I , (50) em que ~J e´ o momento angular. Os autovalores de Jˆ 2 sa˜o h¯2ℓ(ℓ + 1), ℓ = 0, 1, 2, . . . e cada um possui degeneresceˆncia 2ℓ+ 1. Portanto os autovalores Eℓm de Hˆrot sa˜o Eℓm = h¯2 2I ℓ(ℓ+ 1), (51) em que o numero quaˆntico m toma os valores m = −ℓ,−ℓ + 1, . . . , ℓ− 1, ℓ. A func¸a˜o de partic¸a˜o da parte rotacional e´ obtida usando a expressa˜o ζrot = ∞∑ ℓ=0 ℓ∑ m=−ℓ e−βEℓm. (52) Como a energia na˜o depende de m podemos somar nessa varia´vel para obter ζrot = ∞∑ ℓ=0 (2ℓ+ 1)e−βh¯ 2ℓ(ℓ+1)/2I . (53) A partir desse resultado podemos obter a energia me´dia de rotac¸ao de uma mole´cula urot = −∂ ln ζrot/∂β e a partir dela o respectivo calor espec´ıfico crot = ∂urot/∂T . O gra´fico do calor espec´ıfico de rotac¸a˜o esta´ mostrado na 9 0 0.5 1 1.5 2 T / Θ r 0 0.5 1 1.5 c r o t / k B Figura 1: Calor espec´ıfico crot de um rotor quaˆntico como func¸a˜o de T/Θr em que Θr = h¯ 2/2IkB. A linha tracejada representa o resultado cla´ssico. 10 figura 1. Vemos que a altas temperaturas obte´m-se o valor cla´ssico kB. A baixas temperaturas ele se anula. Em seguida vamos obter os resultados de ζrot nos limites de altas e baixas temperaturas. Para altas temperaturas, basta aproximar a somato´ria em (53) pela integral ζrot = ∫ ∞ 0 (2ξ + 1)e−βh¯ 2ξ(ξ+1)/2Idξ = 2I βh¯2 = 8π2I βh2 , (54) que e´ ideˆntico ao resultado cla´ssico obtido na sec¸a˜o anterior. Para baixas temperaturas, conservamos somente a primeira e a segunda parcelas da somato´ria ζrot = 1 + 3e −βh¯2/I , (55) para obter ln ζrot = 3e −βh¯2/I . (56) Portanto, urot = − ∂ ∂β ln ζrot = 3 h¯2 I e−βh¯ 2/I , (57) que e´ va´lida para βh¯2/I >> 1 ou kBT << h¯ 2/I. Nesse regime, o calor espec´ıfico e´ dado por crot = ∂urot ∂T = 3kB ( βh¯2 I )2 e−βh¯ 2/I , (58) de modo que crot → 0 quando T → 0. Hidrogeˆnio Quando os a´tomos de uma mole´cula diatoˆmica sa˜o do mesmo tipo, como e´ o caso do hidrogeˆnio, devemos levar em conta que os estados quaˆnticos dos nu´cleos dos a´tomos podem ser sime´tricos ou anti-sime´tricos acarretando uma mudanc¸a no ca´lculo da func¸a˜o de partic¸a˜o molecular. Vamos aqui considerar apenas o hidrogeˆnio. Para a mole´cula de hidrogeˆnio, cujos a´tomos possuem spin igual a 1/2, um estado sime´trico corresponde a um estado singleto com spin total igual a 0 (para-hidrogeˆnio) e um estado anti-sime´trico corresponde a um estado tripleto com spin total igual a 1 (orto-hidrogeˆnio). Se a mole´cula de hidrogeˆnio estiver no estado singleto a func¸a˜o de partic¸a˜o molecular vale ζ0 = ∑ ℓ par (2ℓ+ 1)e−βh¯ 2ℓ(ℓ+1)/2I , (59) 11 0 1 2 3 4 5 6 T / Θ r 0 0.5 1 1.5 c r o t / k B Figura 2: Calor espec´ıfico crot de uma mistura de 1/4 de para-hidrogeˆnio e 3/4 de orto-hidrogeˆnio como func¸a˜o de T/Θr em que Θr = h¯ 2/2IkB. A linha tracejada representa o resultado cla´ssico. As curvas superior e inferior re- presentam o calor espec´ıfico do para-hidrogeˆnio e orto-hidrogeˆnio puros, res- pectivamente. Os c´ırculos pequenos representam dados experimentais para o hidrogeˆnio (Θr = 85.3 K), obtidos a baixa pressa˜o. em que a soma se estende sobre os valores pares de ℓ, correspondentes aos estados sime´tricos. Se ela estiver no estado tripleto a func¸a˜o de partic¸a˜o molecular vale ζ1 = ∑ ℓ impar (2ℓ+ 1)e−βh¯ 2ℓ(ℓ+1)/2I , (60) em que a soma se estende sobre os valores ı´mpares de ℓ, correspondentes aos estados anti-sime´tricos. Se as mole´culas do ga´s estiverem em equil´ıbrio, isto e´, se os dois tipos de mole´culas puderem se transformar um em outro, o quedeve ocorrer por coliso˜es, enta˜o a func¸a˜o de partic¸a˜o total sera´ ζrot = ζ0 + 3ζ1, (61) o fator 3 representando a degeneresceˆncia do estado tripleto. As probabili- 12 dades de que uma mole´cula esteja no estado singleto ou tripleto sa˜o, respec- tivamente, P0 = ζ0 ζrot e P1 = 3ζ1 ζrot . (62) A altas temperaturas obte´m-se P1 = 3/4 e P0 = 1/4 acarretando uma com- posic¸a˜o de 3/4 de mole´culas no estado singleto e 1/4 no estado tripleto. A baixas temperaturas, por outro lado, a raza˜o P1/P0 se anula rapidamente e todas as mole´culas passam para o estado singleto e se encontram no estado com ℓ = 0 quando T → 0. As transic¸o˜es entre os estados singleto e tripleto, entretanto, sa˜o muito lentas acarretando uma invariaˆncia na proporc¸a˜o de mole´culas no estado sin- gleto e tripleto. Dessa forma, o hidrogeˆnio se comporta termicamente como se fosse uma mistura de dois gases, isto e´, o para-hidrogeˆnio e o orto-hidrogeˆnio se comportam como dois gases distintos cujos nu´meros de mole´culas perma- necem invariantes. Supondo que a raza˜o seja a mesma daquela que ocorre com o sistema em equil´ıbrio a altas temperaturas, enta˜o o para-hidrogeˆnio e o orto-hidrogeˆnio permanecem na proporc¸a˜o de 3 para 1, respectivamente, independentemente da temperatura. A func¸a˜o de partic¸a˜o molecular relativa aos modos de rotac¸a˜o pode enta˜o ser escrita como ζrot = [ζ0] 1/4[ζ1] 3/4. (63) A partir desse resultado obtemos a energia me´dia por mole´cula urot = 1 4 u0 + 3 4 u1, (64) com u0 = − ∂ ∂β ln ζ0 e u1 = − ∂ ∂β ln ζ1. (65) O calor especifico vale pois crot = 1 4 c0 + 3 4 c1, (66) em que c0 = ∂u0 ∂T e c1 = ∂u1 ∂T . (67) Os gra´ficos de c1, c2 e crot esta˜o mostrados na figura 2. 13 Mole´culas diatoˆmicas ela´sticas Vamos examinar agora as propriedades te´rmicas de um ga´s ideal de mole´culas diatoˆmicas na˜o r´ıgidas. Admitimos que os a´tomos que compo˜em a mole´cula oscilam com uma frequeˆncia natural ω. A hamiltoniana correspondente a uma mole´cula e´ dada por H = Htrans +Hrot +Hvib, (68) em que Htrans e´ a parte translacional, dada por Htrans = 1 2m (p2x + p 2 y + p 2 z), (69) em que m e´ a massa da mole´cula, e Hrot e Hvib sa˜o a parte correspondente aos graus internos de liberdade, dadas por Hrot = 1 2µr2 (p2θ + 1 sin2 θ p2φ) (70) e Hvib = 1 2µ p2r + Φ(r), (71) em que θ e φ sa˜o os aˆngulos que definem o eixo da mole´cula, µ e´ a massa reduzida, r e´ a distaˆncia entre os a´tomos e Φ(r) e´ a energia de interac¸a˜o entre os a´tomos. As coordenadas do espac¸o-σ sa˜o x, y, z, r, θ, φ, px, py, pz, pr, pθ, pφ. (72) A func¸a˜o de partic¸a˜o molecular e´ dada por ζ = 1 h6 ∫ e−βH dxdydzdrdθdφdpxdpydpzdprdpθdpφ, (73) que se fatoriza como ζ = ζtransζint, (74) em que ζtrans = 1 h3 ∫ e−βHtrans dxdydzdpxdpydpz (75) e ζint = 1 h3 ∫ e−β(Hrot+Hvib) drdθdφdprdpθdpφ. (76) 14 Embora ζ se fatorize em uma parte relacionada aos graus de liberdade de translac¸a˜o, ζtrans, e uma parte relacionada aos graus de liberdade internos, ζint, essa u´ltima na˜o se fatoriza em uma parte relacionada aos graus de liber- dade de rotac¸a˜o e outra relacionada aos graus deliberdade de vibrac¸a˜o pois Hrot, assim como Hvib, depende da varia´vel de vibrac¸a˜o r. Entretanto, su- pondo que as amplitudes de vibrac¸a˜o sejam pequenas podemos aproximar a distaˆncia r entre os a´tomos relativamente a` parte rotacional pela distaˆncia de equil´ıbrio R. Dessa forma, substitu´ımos r por R na hamiltoniana rotacional de modo que Hrot = 1 2I (p2θ + 1 sin 2θ p2φ), (77) em que I = µR2. Agora ζint pode ser fatorizada na forma ζint = ζrotζvib, (78) em que ζrot = 1 h2 ∫ e−βHrot dθdφdpθdpφ (79) e ζvib = 1 h ∫ e−βHvib drdpr. (80) Efetuando as integrais, obte´m-se os resultados ζtrans = V h3 ( 2πm β )3/2 , (81) ζrot = 8π2I h2β (82) e ζvib = ( 2πµ h2β )1/2 ∫ ∞ 0 e−βΦ(r)dr. (83) Para efetuar a integral em r vamos expandir Φ(r) em torno do seu valor mı´nimo, que ocorre em r = R, Φ(r) = Φ(R) + 1 2 K(r −R)2. (84) Equivalemente, podemos supor que os a´tomos estejam ligados por uma mola de constante K relacionada a` frequeˆncia de oscilac¸a˜o ω por K = µω2. Por 15 simplicidade colocamos Φ(R) = 0 de modo que ζvib = ( 2πµ h2β )1/2 ∫ ∞ 0 e−βK(r−R) 2/2dr. (85) Em seguida supomos que K seja suficientemente grande de modo que o in- tegrando e´ muito agudo em r = R, anulando-se rapidamente para valores de r fora de um pequeno intervalo ao redor de r = R. Portanto, a substituic¸a˜o do limite inferior da integral por −∞ na˜o alterara´ substancialmente o valor da integral. Com boa aproximac¸a˜o temos pois ζvib = ( 2πµ h2β )1/2 ∫ ∞ −∞ e−βK(r−R) 2/2dr = ( 2πµ h2β )1/2 ( 2π Kβ )1/2 . (86) A partir de ζ obtemos o resultado U = −N ∂ ∂β ln ζ = 7 2 NkBT, (87) do qual obtemos a capacidade te´rmica a volume constante, Cv = ∂U ∂T = 7 2 NkB. (88) 3 Entropia de mistura A func¸a˜o de partic¸a˜o correspondente a uma mistura de gases ideais se obte´m da seguinte maneira. Suponha que a mistura de gases esteja confinada num recipiente de volume V , a` temperatura T e seja composta por NA mole´culas do tipo A e NB mole´culas do tipo B. Denotando por ζA e ζB as func¸o˜es de partic¸a˜o moleculares correspondentes aos componentes A e B, respectiva- mente, enta˜o a func¸a˜o de partic¸a˜o total Z deve ser dada por Z = ζNAA NA! ζNBB NB! , (89) pois o estado do sistema na˜o se altera se permutarmos mole´culas do mesmo tipo mas se altera se permutarmos mole´culas de tipos diferentes. Portanto, o fator correto e´ de fato NA!NB! e na˜o (NA + NB)!. De acordo com (14), a 16 func¸a˜o de partic¸a˜o molecular e´ dada por dois fatores relativos aos graus de liberdades de translac¸a˜o e internos. Assim, escrevemos ζA = V λ3A ζAint e ζB = V λ3B ζBint. (90) A energia livre da mistura dos gases se calcula por F = −kBT lnZ que pode ser escrita como F = FA + FB, (91) em que FA = −NAkBT ( ln V NAλ3A + ln ζAint + 1 ) (92) e FB −NBkBT ( ln V NBλ3B + ln ζBint + 1 ) . (93) A expressa˜o para F nos mostra que a energia livre de Helmoholtz de uma mistura de gases ideais e´ igual a` soma das energias livres de cada componente como se cada componente ocupasse isoladamente o recipiente. A partir de p = −∂F/∂V obtemos a equac¸a˜o de estado p = (NA +NB) kBT V , (94) ou seja, a pressa˜o de uma mistura de gases ideais e´ igual a soma das presso˜es parciais, isto e´, das presso˜es de cada componente do ga´s efetuaria se ocupasse isoladamente o recipiente. Em seguida determinamos a energia livre de Gibbs da mistura, dada por G = F + pV . Utilizando o resultado (94), obtemos G = G1 +G2, (95) em que G1 = −NAkBT ( ln NA +NB NA + ln kBT pλ3A + ln ζAint ) (96) e G2 = −NBkBT ( ln NA +NB NB + ln kBT pλ3B + ln ζBint ) . (97) A entropia S pode ser obtida a partir de S = −(∂F/∂T )V ou a partir de S = −(∂G/∂T )p. 17 Vamos considerar em seguida a entropia de mistura, entedida como a variac¸a˜o da entropia quando se misturam duas substaˆncias puras que se en- contram a` mesma temperatura T e pressa˜o p. Consideramos aqui dois gases ideais A e B com NA e NB mole´culas. Isoladamente, de acordo com (24), as energias livres de Gibbs dos dois gases sa˜o dados por GA = −NAkBT ( ln kBT pλ3A + ln ζAint ) (98) e GB = −NBkBT ( ln kBT pλ3B + ln ζBint ) . (99) As entropias de dois dois gases isoladamente sa˜o dadas por SA = −(∂GA/∂T )p e SB = −(∂GB/∂T )p. Depois de misturados, e em equil´ıbrio a` temperatura T e pressa˜o p, a energia livre de Gibbs e´ dadapelos resultados (95), (96) e (97), e a entropia S por S = −(∂G/∂T )p. A variac¸a˜o da entropia ∆S = S − SA − SB, que e´ a entropia de mistura, vale pois ∆S = − ( ∂G ∂T − ∂GA ∂T − ∂GB ∂T ) = − ∂ ∂T (G−GA −GB). (100) Mas G−GA −GB = −NAkBT ln (NA +NB) NA −NBkBT ln (NA +NB) NB , (101) a partir do que obtemos a entropia de mistura ∆S = NAkB ln (NA +NB) NA +NBkB ln (NA +NB) NB , (102) que pode ser escrita como ∆S = −NkB(xA ln xA + xB ln xB), (103) em queN = NA+NB e´ o nu´mero total de mole´culas da mistura, e xA = NA/N e xB = NB/N sa˜o as frac¸o˜es molares de cada componente da mistura. A entropia de mistura e´ claramente na˜o negativa, ∆S ≥ 0. 18 Exerc´ıcios 1. Mostre que a energia cine´tica Ec = 1 2 m1r˙ 2 1 + 1 2 m2r˙ 2 2 de duas part´ıculas de massas m1 e m2 pode ser escrita como a Ec = 1 2 MR˙ 2 + 1 2 µr˙ 2 em que M = m1 +m2 e´ a massa total, µ = m1m2/M e´ a massa reduzida, R˙ = (m1r˙1 + m2r˙2)/M e´ a velocidade do centro de massa e r˙ = r˙1 − r˙2 e´ a velocidade relativa. A primeira parcela e´ a energia cine´tica de translac¸a˜o Etrans e a segunda e´ a energia cine´tica de rotac¸a˜o Erot. Use coordenadas esfe´ricas para mostrar que a essa u´ltima parcela pode ser escrita na forma Erot = 1 2 µr˙2 + 1 2 µr2θ˙ + 1 2 µr2 sin2 θφ˙ ou ainda como Erot = 1 2µ p2r + 1 2µr2 ( p2θ + 1 sin2 θ p2φ ) em que pr = µr˙, pθ = µr 2θ˙ e pφ = µr 2 sin2 θ. 2. Determine a energia interna e a pressa˜o de um ga´s ideal de part´ıculas ultra-relativistas. A energia cine´tica de uma part´ıcula e´ dada por E = c √ p2x + p 2 y + p 2 z, em que c e´ a velocidade da luz. 3. Considere um ga´s ideal composto de N mole´culas diatoˆmicas, cada uma possuindo um momento de dipolo ele´trico µ, sob ac¸a˜o de um campo ele´trico E . A energia de uma mole´cula e´ dada por 1 2m (p2x + p 2 y + p 2 z) + 1 2I (p2θ + 1 sin2 θ p2φ)− µE cos θ, em que a primeira parcela representa a energia cine´tica de translac¸a˜o, a segunda, a energia cine´tica de rotac¸a˜o e a u´ltima, a energia de interac¸a˜o com o campo ele´trico. Determine as propriedades termodinaˆmicas do ga´s. Ache a polarizac¸a˜o P = N〈µ cos θ〉 e a susceptibilidade ele´trica χ = (∂P/∂E). Mostre que a campo nulo, χ e´ inversamente proporcional a` temperatura absoluta. 19 4. Considere o seguinte processo de mistura de dois gases ideais A e B. Os gases encontram-se num recipiente de volume V e inicialmente esta˜o sepa- rados por uma parede que divide o recipiente em dois compartimentos de volumes VA e VB. A parede e´ diate´rmica de modo que os dois gases possuem a mesma temperatura. A parede e´ enta˜o retirada, os gases se misturam e entram em equilibrio. Supondo que a temperatura na˜o se altere, mostre que a variac¸a˜o da entropia vale ∆S = kB ( NA ln V VA +NB ln V VB ) Suponha agora que a parede, ale´m de diate´rmica, seja mo´vel de modo que inicialmente as presso˜es dos dois gases A e B sa˜o iguais. Mostre que nesse caso a variac¸a˜o de entropia se reduz a` seguinte expressa˜o ∆S = kB ( NA ln NA +NB NA +NB ln NA +NB NB ) . 20
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