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DIREITO CIVIL CONTRATOS CURSO A DISTÂNCIA MÓDULO XI 1 CURSO A DISTÂNCIA – MÓDULO XI DIREITO CIVIL - CONTRATOS – PROFº FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS INTERPRETAÇÃO DOS CONTRATOS INTRODUÇÃO A hermenêutica é a ciência que cuida da interpretação das leis. O contrato, à semelhança da lei, requer uma interpretação, sobretudo, quando existe divergência entre as partes sobre o sentido de uma determinada cláusula. Assim, interpretar o contrato significa revelar o real significado de seu conteúdo. A interpretação do contrato, como salienta Maria Helena Diniz, “é indiscutivelmente similar à da lei, podendo-se até afirmar que há certa coincidência entre as duas. Aplicam-se, por isso, à hermenêutica do contrato princípios concernentes à interpretação da lei”. Todavia, enquanto na hermenêutica da lei, prevalece o lado objetivo do exame desta, e não a vontade do legislador, na interpretação dos contratos, sobressai, em primeiro lugar, o aspecto subjetivo da intenção comum dos contratantes, e, em segundo lugar, o exame objetivo das cláusulas contratuais. Com efeito, dispõe o artigo 112 que “nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciadas do que o sentido literal da linguagem”. O Código Civil de 2002, a exemplo do Código de 1916, não sistematizou o assunto referente à interpretação dos contratos, limitando-se a fixar a regra do artigo 112, situada no livro da Parte Geral, relegando à doutrina o desenvolvimento da matéria atinente à exegese dos contratos. TEORIAS De acordo com a teoria subjetiva ou voluntarística, o intérprete deve investigar a real vontade dos contratantes. Esta prevalecerá sobre a vontade externada por palavras nas cláusulas contratuais. Assim, a vontade pode ser analisada até além do exame objeto do contrato. Pela teoria objetiva ou da declaração, o intérprete deve ater- se ao sentido das palavras consignadas nas cláusulas contratuais, desconsiderando a vontade interna dos contratantes. Sobre a adoção de uma ou outra teoria, ensina-nos Sílvio Venosa que “é evidente que nenhuma dessas posições haverá de ser adotada isoladamente, razão pela qual a doutrina engendrou uma série de outras intermediárias, de pouco interesse prático. Em qualquer situação, deve o hermeneuta comportar-se de forma que evite o apego excessivo a uma só dessas posições, sob pena de atingir conclusões inóquas e distorcidas”. Vimos que o Código Civil, no artigo 112, salienta que “nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciadas do que ao sentido literal da linguagem”. Com essa redação, porém, o legislador não quis esquivar-se da teoria subjetiva (motivos psicológicos do 2 CURSO A DISTÂNCIA – MÓDULO XI DIREITO CIVIL - CONTRATOS – PROFº FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS agente), ou abraçar a teoria objetiva (interpretação fiel ao texto da declaração), mas sim, como salienta Antônio Junqueira de Azevedo, abraçar um critério intermediário, onde avulta a preocupação com a confiança despertada no destinatário da declaração de vontade, e onde ressalta a responsabilidade do declarante. O artigo 112, acima transcrito, como enfatiza Renan Lotufo, se refere à vontade consubstanciada na declaração, portanto na vontade já objetivada, não na intenção, vontade interna. Aliás, como já dizia Eduardo Espínola, o intérprete deve buscar a intenção consubstanciada na declaração, e não ao pensamento íntimo do declarante. Do exposto dessume-se que o Código abraçou uma teoria intermediária ou eclética, porque a interpretação deve partir de dados objetivos consubstanciados no contrato, buscando-se, a partir daí, a real intenção dos contratantes, atentando-se, sobretudo, para a boa-fé e confiança das partes. Como afirma Sílvio Venosa, “não é dado pois, ao intérprete, alçar vôos interpretativos que o levem para longe do fulcro do negócio jurídico em exame”. Finalmente, se a clareza da claúsula não deixa dúvida sobre o seu sentido, a vontade íntima não pode prevalecer, pois o código não adotou, na pureza, a teoria subjetiva. Aliás, o artigo do 112 Código Civil enfatiza muito bem que o contrato não pode colidir contra o seu conteúdo. MEIOS AUXILIARES DA INTERPRETAÇÃO Conquanto o objeto da interpretação seja o conteúdo do contrato, consubstanciado em suas diversas cláusulas, o certo é que são meios auxiliares da interpretação: as tratativas preliminares, o caráter habitual das relações mantidas entre as partes, as manifestações anteriores do declarante e do destinatário, que reconhecidamente se ligam à declaração, tais como uma expressão típica do declarante, conhecida pelo destinatário, bem como o lugar, o tempo e as circunstâncias inerentes. Nesse sentido, Renan Lotufo. REGRAS DE INTERPRETAÇÃO O Código Civil, embora não tenha sistematizado a matéria, contém algumas normas sobre interpretação dos contratos, a saber: a. a transação interpreta-se restritivamente, e por ela não se transmitem, apenas se declaram ou reconhecem direitos (artigo 843 do CC); b. os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente (artigo 114 do CC); c. a fiança não admite interpretação extensiva (artigo 890); d. quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente (artigo 423); e. os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração (artigo 113). 3 CURSO A DISTÂNCIA – MÓDULO XI DIREITO CIVIL - CONTRATOS – PROFº FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS O Código de Defesa do Consumidor ainda prescreve que: a. o contrato não obrigará o consumidor se o respectivo instrumento for redigido de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance (artigo 46); b. as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor (artigo 47). Por outro lado, cumpre destacar que, na interpretação dos contratos, levar-se-á em conta a emissão da vontade e o significado extraído desta pelo declaratário. Afinal, a relação contratual é bilateral, de modo que o significado curial é o que deram coincidentemente o proponente e o aceitante. Nessa análise, como afirma Renan Lotufo, deve ser considerada a possibilidade de compreensão do destinatário da declaração, outrossim, a responsabilidade do proponente pelo significado da declaração contida na proposta. Outras regras de interpretação devem ser lembradas, a saber: a. os negócios sobre direitos autorais devem ser interpretados restritivamente (artigo 4º da Lei nº 9.610/98); b. na interpretação dos contratos, levar-se-á em conta a boa-fé, a necessidade do crédito e a equidade; c. quando uma cláusula contém dois ou mais sentidos, deve prevalecer aquele em que ela pode ter efeito; e não aquele em que ela não teria efeito algum; d. quanto a palavra for suscetível de mais de um sentido, deve prevalecer o sentido que mais se amolda à natureza do contrato; e. não se deve interpretar uma cláusula isoladamente, mas em conjunto ou as demais. Trata-se aqui da chamada interpretação sistemática; f. as cláusulas duvidosas devem ser interpretadas contra o contratante que redigiu o contrato; g. na dúvida se o contrato é oneroso ou gratuito, presume-se que seja oneroso; h. as cláusulas genéricas devem ser interpretadas restritivamente, no sentido de abrangerem apenas o objeto do contrato; i. o negócio envolvendo uma universalidade compreende todas as coisas singulares que integram esse bem coletivo, ainda que delas não tivessem conhecimento os contratantes. Assim, na venda de um rebanho, reputam- se abrangidas as crias concebidas; j. na locação as dúvidas são resolvidas contra o locador; k. na compra e venda as dúvidas são resolvidas contra o vendedor, inclusive, no tocante ao preço; l. na interpretaçãodos contratos, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum; m. na interpretação dos contratos, presume-se a boa-fé dos contratantes; 4 CURSO A DISTÂNCIA – MÓDULO XI DIREITO CIVIL - CONTRATOS – PROFº FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS n. no caso de ambigüidade das cláusulas contratuais, deve prevalecer o costume do país ou do lugar em que o contrato foi celebrado; o. nas cláusulas duvidosas, prevalecerá a interpretação que favorece aquele que se obriga; p. reputa-se não escrita a cláusula contratual sem sentido algum; q. se houver dúvida entre a cláusula impressa e a datilografada, prevalecerá a segunda; r. na hipótese de o contrato ser modificado parcialmente por outro, o intérprete deverá considerar os dois como um todo orgânico; s. a conduta dos contratantes, que já vinham cumprindo o contrato anteriormente, de comum acordo, revela a real intenção das partes; t. quando, em determinado contrato, há referência a um caso a título de esclarecimento, não se presumem excluídos os casos não expressos, os quais podem ser abrangidos pela convenção. Assim, como ilustra Sílvio Rodrigues, citando Pothier, se em pacto antenupcial os nubentes adotam o regime da comunhão universal e esclarecem que ela abrangerá os bens móveis que vierem a receber a título hereditário, tal cláusula não afasta da comunhão os bens imóveis, havidos “causa mortis”, pois entende-se que a clausula em questão derivou da ignorância dos contraentes, que a acreditaram necessária, quando era supérflua. DESTINATÁRIOS DA INTERPRETAÇÃO As regras de interpretação são dirigidas às partes, que, por isso, podem substituí-las por outras, derrogando-as, ainda quando estampadas em lei. De fato, a avaliação sobre a forma de cumprimento do contrato deve ser feita, em primeiro lugar, pelos contratantes, que são os maiores interessados. Se não chegarem a um acordo, daí sim, o juiz passa a ser o destinatário final das regras interpretativas, devendo segui-las à risca, sobretudo, quando previstas em lei. Todavia, na hipótese de o magistrado contrariar uma norma legal de interpretação contratual, não é cabível o recurso extraordinário dirigido ao STF nem o recurso especial endereçado ao STJ, porque trata-se de questão de fato (Súmula 454 do STF), ao passo que nesses dois recursos só é possível a discussão de questões jurídicas. 5 CURSO A DISTÂNCIA – MÓDULO XI DIREITO CIVIL - CONTRATOS – PROFº FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS QUESTÕES 1. Qual a semelhança entre a interpretação dos contratos e a interpretação das leis? 2. Qual a distinção entre a teoria subjetiva e a teoria objetiva? 3. Qual a teoria adotada pelo Código Civil para a interpretação dos contratos? 4. Quais os meios auxiliares da interpretação? 5. Quais os negócios que devem ser interpretados restritivamente? 6. Como se interpreta a cláusula que contém dois ou mais sentidos? 7. O que é interpretação sistemática? 8. Na dúvida, o contrato é oneroso ou gratuito? 9. Como se interpretam os negócios que envolvem uma universalidade? 10. Na compra e venda e na locação como se resolvem as dúvidas? 11. Quem é o destinatário final da interpretação dos contratos?
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