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EA D Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus 6 1. OBJETIVOS • Compreender as razões teológicas sobre a unidade e a pluridimensionalidade da pessoa humana. • Identificar as razões teológicas da pessoa humana como ser constitutivo de esperança, de liberdade e de agracia- mento de Deus. • Interpretar os argumentos sobre o mal, o pecado e a morte. 2. CONTEÚDOS • Questão da unidade e dimensões da pessoa humana. • Ser humano "diante" de Deus. • Ser humano como ser de esperança. • Ser humano como ser agraciado e Teologia da Graça. • Ser humano como ser livre e questão da liberdade. © Antropologia Teológica158 • Ser humano "contra" Deus. • Ser humano e mal. • Ser humano e pecado. • Ser humano e morte. 3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que você leia as orientações a seguir: 1) Para o estudo desta unidade, sugerimos que você com- pare as ideias teológicas sobre a liberdade com as ideias filosóficas, expostas no caderno Antropologia Filosófica. Ao estudar, procure ver as diferenças e as aproximações. 2) Sugerimos, também, para um maior aprofundamento do tema, a leitura da seguinte obra: HÄRING, Hermam. Il male nel mondo. Potenza o impotenza di Dio? Brescia: Queriniana 2001. 3) Para saber mais sobre o mal hoje e, também, sobre os lutos para o ser humano, leia: Concilium: Revista Interna- cional de Teologia. 329-2009/1. Petrópolis: Vozes, 2009. 4) Convém lembrar que cristãos protestantes e ortodoxos não dão tanta ênfase à questão do pecado. Os cristãos da Igreja da reforma ressaltam mais o ser humano pe- cador que sua pecabilidade. Já a Igreja Católica faz, em geral, o caminho inverso. 5) Informação: a referência ao teólogo e pastor luterano Die- trich Bonhöeffer (1906-1947), prisioneiro nos campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial, pode ser encontrada no livro: BONHÖEFFER, Dietrich. Resistên- cia e submissão. Anotações escritas na prisão. São Leopol- do: Sinodal, 2003. Bonhöeffer fez a famosa pergunta que causou enorme impacto na Europa e é repetida constan- temente: "Onde estava Deus, em Auschwiz"? 6) Para maior compreensão do assunto tratado aqui, leia: KESSLER, H. Cristologia. In: SCHNEIDER, T. (Org.). Manual de dogmática. Petrópolis: Vozes, 2000. v. 1. 159 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus 7) Bento XVI, no ano de 2007, lançou sua segunda encíclica sobre a esperança, intitulada Spes salvi e fundamentada em Rm 8,24. Sugerimos que você leia essa obra. 8) Diante do Esquema conceitual a seguir, procure interpretá- -lo em vista da unidade que você começa a estudar agora. Um ser de esperança Dimensões da pessoa humana Corpo e alma (antigo dualismo cristão) Dimensões da pessoa humana Diferentes dimensões DIANTE DE DEUS SER HUMANO O próprio da esperança A esperança esperante De esperança em esperança Esperança como direito humano Teologia da Graça Dom e processo Deus é libertador, o homem é libertado Viver em liberdade Um ser agraciado Ser livre “CONTRA DEUS” O ser humano justo e pecador O Mal A Morte (Significado) O Pecado Morte eterna Passagem para a vida Ressurreição da carne Mistério do mal Origem do mal A experiência do pecado Ênfase amartiocêntrica O pecado original © Antropologia Teológica160 4. INTRODUÇÃO À UNIDADE Em unidades anteriores, tratamos da compreensão da ori- gem humana. Vimos, particularmente, o sentido teológico da cria- ção, a compreensão da origem humana na história da Igreja e a explicação das ciências naturais, terminando com uma discussão sobre a dignidade humana dos pontos de vista natural e cristão, respectivamente. Nesta unidade, você vai refletir e aprofundar alguns temas de Antropologia que são marcantes na vida concreta da pessoa humana. Dividimos a unidade em dois blocos de três questões cada um, além da introdução. No primeiro bloco, você encontrará questões que estão diretamente relacionadas a Deus, a saber: a esperança, a graça e a liberdade. No segundo, as questões são "contra" Deus: a morte, o pecado (inclusive o pecado original) e o mal. Sabemos que os temas são bem interessantes para seu es- tudo e sua vida. Esperamos que você pense o mesmo e, ao final, perceba que, realmente, valeu a pena. Mãos à obra! Antes de introduzir os três blocos, você deverá ter bem presentes os conceitos já estudados ("nephes", "ruah", "basar") e as seguin- tes afirmações, também já estudadas anteriormente: a) o ser humano é perfectível (não nasceu perfeito nem imperfeito); b) é portador de uma dignidade especial; c) existe como relação com Deus, consigo mesmo, com os outros e com o universo; d) é filho da Terra e imagem de Deus; e) mesmo quando se usa o termo "homem", quer se entender a pessoa ou o ser humano com base na Bíblia, nas filosofias atuais e na concepção da Igreja; f) o conceito e a ideologia grega sobre o homem não são sufi- cientes para o cristão. 161 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus 5. QUESTÃO DA UNIDADE E DIMENSÕES DA PESSOA HUMANA A Antropologia, praticamente apresentada até aqui, fez uma teologização do ser humano na sua relação transcendente com Deus: ele é criatura filial, imagem de Deus e destinado a ele. Essa é uma Antropologia descendente. Agora, você deve voltar-se teologicamente mais para a pes- soa na história. É uma Antropologia mais horizontal, à luz de Deus. E, claro, todas as questões anteriores vão servir de base para sua nova teologização. A pessoa humana é um ser de relações situadas. Ela é: 1) sempre concreta e real. Quer dizer: a pessoa é João, Ma- ria, Pedro, Ana e outros; 2) existe sempre e tão somente na relação com outros, com Deus e com o mundo. A pessoa humana é filha do cosmo, parente de Deus e irmã dos outros (esposo, filho, parente, vizinhos etc.), que são indivi- dualidades com ela e como ela. Como individualidade, ela se confirma diante dos outros. O outro é quem confirma seu sentido. Ao situar-me na vida, percebo minhas dimensões humanas, conforme as circunstâncias. O outro – humano e/ou divino – faz-me ser mais eu mesmo. No ou- tro, vejo a face de Deus historicizada e localizada. No outro, eu me situo no tempo e no mundo (contexto sociocultural e religioso). No outro, vejo a face de Deus historicizada e localizada. Por causa do outro, sou chamado a presencializar, para mim mesmo, quem sou eu! Ao mesmo tempo, o outro obriga-me a localizar-me no tempo e no espaço. Ao situar-me na vida, percebo minhas dimensões humanas, conforme as circunstâncias. © Antropologia Teológica162 Corpo e alma A Teologia Cristã e a Igreja foram herdeiras – até a exaustão – de uma concepção dualista sobre o ser humano: a questão "corpo e alma". 1) O pitagorismo introduziu-a na cultura helênica. Ressal- tou o dualismo ético e ontológico: o corpo é perecível e extremamente limitado pela matéria. Só a alma é forte e significativa, real e imortal. 2) O gnosticismo (entre os séculos 2º e 4º d. C.) desqualifi- cou o corpo e sua existência histórica. Valorizou a alma por ser capaz de transcendência. 3) O cristianismo primitivo, ao inculturar-se fora do pensa- mento semita, aceitou o dualismo helênico-neoplatôni- co. Entretanto, valorizou o corpo, a carne, por dois moti- vos: a encarnação do Verbo e o mistério da ressurreição, mesmo que a ressurreição da carne, do corpo, ocorra só no final dos tempos. 4) Na escolástica (entre os séculos 10º e 19º), Santo Tomás (1227-1279) superou o dualismo anterior e usou a An- tropologia Aristotélica (Aristóteles 348-322 a. C.). Acen- tuou a unidade do homem:corpo e alma são dois as- pectos de um só homem indivisível. É somente por meio do corpo que a alma pode existir e expressar-se. Após a morte, a alma aguarda, numa feliz contemplação de Deus, a ressurreição do corpo para restabelecer sua uni- dade originária. As atuais concepções antropológicas são mais globais. Por exem- plo, o Vaticano II, na Gaudium et spes, superou o modelo dualista. Em 1994, a Conferência dos Bispos da Alemanha afirmou: "A alma não é uma parte do homem ao lado do corpo, mas o centro da pes- soa". É a pessoa humana inteira que entra na vida junto com Deus. Mas também o corpo não é simplesmente uma parte do homem. Ele é pessoa na sua relação completa com o mundo. Pela dificuldade de compreender a questão da ressurreição, o modelo dualista parecia melhor. Todavia, as novas compreen- 163 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus sões facilitam o estabelecimento de novos paradigmas sobre as dimensões do ser humano. Você pode perceber inúmeras consequências dessas ideias, ainda presentes na Igreja e na sociedade. Esse modelo de interpretação se impôs de maneira hegemônica. No entanto, o modelo dualista vem sendo superado já há, aproximadamente, 40 anos. A Antropologia Teológica e a Escatolo- gia atual consideram-no, no mínimo, insuficiente. A nova concep- ção explora mais o conceito de pessoa como ser de relações. Dessa maneira, compreender a pessoa é percebê-la na to- talidade de sua existência. Toda pessoa cresce. E cresce sempre rumo à perfeição definitiva (destinação final). Esse processo é uma construção, um enovelamento ou uma rede tecida na vida. Cada experiência produz consequências históricas. Só em Deus, passada a morte, é que se terá conhecimento total de quem se é, de quem se foi e de quem se há de ser. Diferentes dimensões humanas Para formular uma compreensão atual da pessoa humana, agora, voltam a ser importantes as ideias bíblicas ("nephes", "ruah" e "basar"), somadas às novas descobertas científicas e filosóficas. Assim, o ser humano é compreendido de forma multidimensional ou global. Ele possui as dimensões psíquica, física (corpórea), emo- cional, pessoal, social, histórica, cósmica etc. Por essas dimensões múltiplas é que situamos a pessoa no mundo (presente e futuro). Assim, é com base nas diferentes dimensões humanas que você poderá aprofundar as questões propostas no início desta uni- dade. Comecemos com o primeiro bloco, que contém elementos transcendentes, mas tornam-se muito reais na vida de cada um. © Antropologia Teológica164 6. SER HUMANO DIANTE DE DEUS Neste tópico, você deverá compreender as três dimensões humanas que são, positivamente, constitutivas da pessoa huma- na. Elas têm uma grande ligação entre si. A ordem proposta não é fixa. Poderia ser estudada, inicialmente, a dimensão da graça; de- pois, a da esperança etc. Não é isso, contudo, o mais importante. Com base na Antropologia, não se pode compreender o ser humano na sua concretude sem estes três aspectos: como um ser de esperança, agraciado por Deus e livre. Essas três questões estão profundamente relacionadas a Deus; por isso, a ênfase: "diante de Deus". Aliás, poderia ser bem interessante se você, antes de começar este importante estudo, escrevesse, em seu caderno, alguma coi- sa sobre cada um dos temas, para comparar seu conhecimento e o possível "novo" a ser adquirido agora. Assim, nesta atividade de reflexão, tenha como base as seguintes indagações: - Por que Deus dá graças ao ser humano? - Por que somos livres? - Por que somos seres de esperança? Ser humano como ser de esperança Na unidade anterior, afirmamos isto: mais importante que a nossa origem é o fim (destinação) a que fomos chamados. A bon- dade divina revelou-nos isso. E mais: porque conhecemos, esperamos esse fim. Faz parte de nossa estrutura humana o desejo da plenitude nossa em Deus. Essa esperança marca o nosso modo de viver. Talvez seus avós digam que, "no tempo deles", se vivia pensando na vida eterna, quase desprezando a vida presente. Não é assim nossa esperança hoje. Esperamos, é certo, uma garantida pro- messa de nosso futuro feliz. Contudo, vamos vivendo de esperan- ça em esperança. Damos passos e esperamos. Cremos esperan- do. De passo em passo, vamos construindo nossa vida presente. 165 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus Buscamos sempre algo melhor e superior. Lutamos com essa certeza. Queremos ser felizes; por isso, nossos atos são movidos pela esperança de conseguir tal felicidade. Isso é um constitutivo antropológico da pessoa humana. Somos seres da esperança que esperam e, por isso, agem. Por natureza, o ser humano é um ser de esperança. É um ser aberto que transcende a si mesmo. Ninguém vive fechado em si. Thomas Merton (1915- 1968) dizia: "Ninguém é uma ilha". Ninguém é humano sozinho. Todos somos seres relacionais. Esse fato nos remete à consequente ideia de sermos seres de es- perança. Ninguém vive sem ela. É verdade que são muitos os ní- veis da esperança que se vive. Quanto maior a consciência de si e de percepção do outro "eu", maior será a esperança antropológica que se vive. Esse constitutivo humano está presente desde a vida intrauterina até a morte. Certamente, você já ouviu falar das reações de um feto, cujos pais tentaram abortá-lo. Essas reações estão ligadas à imperiosa necessidade de sobreviver. Elas são regidas pela esperança de poder viver. Nascer, crescer, casar-se, formar-se, aposentar-se etc. são si- tuações que não existiriam sem esse desejo de ver as esperanças se realizarem. A esperança é sempre um olhar para frente e, ao mesmo tempo, é dadora de sentido ao viver presente. Essa "aber- tura para [...]" é, na realidade, um constitutivo humano que não indica simplesmente uma insatisfação com o presente ou uma re- volta contra a vida. É, antes e, sobretudo, o desejo de ser mais, de crescer, de ser feliz. Somos limitados por natureza, mas nossa constituição hu- mana quer e almeja sempre o mais, o infinito. Até diante da morte, que parece ser o fim histórico de tudo, o coração humano põe a esperança de vencê-la e ultrapassá-la. © Antropologia Teológica166 Ser esperançoso não é um modo de ser só do indivíduo. As comu- nidades e as nações, os grupos científicos e religiosos, também se constituem de esperança. O próprio da esperança Santo Tomás (1225-1274) diz que é próprio da esperança "tender para um bem, para um bem de difícil acesso, para um bem futuro, enfim para um bem possível". Essa espera afeta nosso modo de ser e nosso processo de aperfeiçoamento. A não posse do esperado é um estímulo ao empenho de vida na ordem tanto histórico-natural quanto escatológica. Abertos ao futuro O ato de esperar faz de nós seres abertos ao futuro histórico e escatológico. No futuro histórico, certamente, por melhores que sejam nossas esperanças, não conseguiremos tudo. É certo que Deus é a nossa garantia do futuro escatológico. A fé e a história re- velam que aqueles que esperam são capazes de crescer. O deses- pero, dizia Kierkegaard, é um segredo da experiência pagã. Aquele que se fecha no presente mediato ou imediato parece perder a esperança. Todavia, na verdade, é um ser desesperante. Por isso, espera ter razões para não colaborar no aperfeiçoamento de si, dos outros e do cosmo e, muito menos, para buscar sua realização histórica e definitiva em Deus. Esperança como direito humano Parece, a muitas pessoas e povos "emancipados", "adultos", que a esperança está restrita ao conservar o bem-estar conquista- do. Todavia, há, no mundo contemporâneo, milhares de pobres e excluídos – os irmãos comuns – que olham à mesa dos "ricos epu- lões" como "Lázaros" (cf. Lc 16,19-31) e esperam a justiçae a liber- tação. Para estes, a esperança é algo não só mais desejado, como 167 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus também de direito humano. No grito da esperança e da libertação dos pobres, pode-se medir mais significativamente o quanto é pro- fundamente antropológica a questão da esperança como realida- de constitutiva da pessoa humana. Esperança fechada em si mesma A ciência, a economia e a política vivem de esperanças tam- bém. Entretanto, é uma esperança encerrada em si, controlada e autossuficiente. O ateísmo, o nada existencial e a angústia são, previamente, círculos fechados em si mesmos, incapazes de dar sustentabilidade ao significado de "ser-se" humano, pois o ser hu- mano não se encerra nem si nem sequer no processo natural da vida. Se todo ser humano evolui, é porque lhe é possível (em espe- rança e na vida) continuar, crescer, aperfeiçoar-se. A revelação afirma que não existimos somente para a vida natural. Nós a transcenderemos. Por isso, é esperança escatológi- ca, a qual não é nem indefinida nem cíclica De esperança em esperança O compromisso com a vida move a pessoa de esperança em esperança, e transforma-a em um ser de decisões, de projetos. Todo ato humano, mesmo movido pela penúria ou pela necessida- de, pela inquietação ou pela busca, pelo desejo ou pela vontade, é uma certeza de que algo melhor há de vir (inclusive o próprio suicídio). De fato, se é ser de esperança, todos os desafios incitam o ser humano ao compromisso solidário (às vezes, para o mal) de desenvolvimento. As situações pessoais (nascer, casar, trabalhar, curar-se do sofrimento etc.) e as sociais (a política, o desenvolvi- mento, o combate às pandemias, as construções de moradias, a pesquisa científica, o voluntariado etc.) são sempre movidas por esse modo de ser da pessoa humana. © Antropologia Teológica168 Dom gratuito A história é construída, de modo marcante e radical, pela es- perança humana. Isso implica uma abertura permanente a uma ple- nitude que não se pode conquistar. A plenitude da esperança é um dom gratuito que transcende o próprio humano. Ao mesmo tem- po, é um dom escatológico da eternidade no amor de Deus – como os cristãos creem e esperam para todos. A esperança manifesta-se como solidariedade, como libertação e, também, como justiça. Ela é, também, uma virtude teologal que, em vez de alienar, exige o compromisso radical, na história, de todos os homens e mulheres. Ela implica liberdade. Quer dizer: a esperança exige, an- tropologicamente, a liberdade (tópico 3 desta unidade). A Antropologia Cristã evidencia: a fonte da esperança é, na verdade, a promessa de Deus. O ser humano não é apenas atraído para Deus. É sabedor, também, de que sua esperança é factível para que haja, previamente, uma promessa de Deus. O fundamento úl- timo da esperança é a realização plena e feliz de cada ser humano. Como isso poderia acontecer sem que Deus nos tenha pro- metido tal futuro? Nós cremos que a esperança última é a certeza do encontro com Deus: essa é a sua promessa. Além disso, o que esperariam aqueles que não creem em Deus e no seu Cristo? Estes não alcançarão a felicidade plena? Nossa simples compreensão humana alerta que qualquer ser hu- mano vivente na história realiza sonhos e vive momentos de feli- cidade. Uns são mais felizes que outros. Mesmo que a revelação divina ajude os cristãos a verem a felicidade plena em Deus, eles necessitam, com outros homens e mulheres, de experiências e de concretizações da esperança numa forma de felicidade. Todavia, a felicidade última é a esperança de repousarem em Deus. Para os que creem, esta esperança é certeza, por causa das promessas divinas. É importante recordar que tal realização da es- perança é sempre um dom gratuito de Deus. Ele não está obrigado a ela senão porque Deus é amor. Porque Deus é Pai de todos e ama a todos, quer estender a todos tal felicidade. Porque é dom dele, 169 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus não importa que muitos não saibam dela e, consequentemente, não a busquem. Entretanto, os que creem são a boca, as mãos e o coração de Deus diante dos outros como testemunhas daquilo que esperam e, ainda, da promessa que Deus quer cumprir. Irmãos do Verbo A esperança escatológica está fundada na certeza de que já somos criaturas e filhos de Deus, irmãos do Verbo, herdeiros da eternidade, mas nós ainda não recebemos a plenitude do que seremos. A estrutura ôntica da esperança humana indica que a realidade é maior do que vemos e percebemos. A realidade é processual, em que nada já está decidido ou previamente destina- do (como a "moira" grega ou o "maktub" árabe). Na patência da realidade, está embutida a latência da própria realidade. Está aí a esperança de que, um dia, se evidenciará como nova realidade humana em Deus. Ser de esperança É em Deus que a vida realiza a esperança última. É nele que ela se concretiza. Todavia, afirmar isso não é confirmar que, em Deus, tudo se acaba, tudo morre. A realidade escatológica em Deus é dinâmica e eterna. Deus, que é amor, é eterno. Quem vive em Deus vive a eternidade. Não necessita mais da esperança; vive na realidade dinâmica do amor. Isso é vida eterna em Deus. A es- trutura ôntico-histórica do ser humano, como ser de esperança, transforma-se em estrutura eterna de amor (cf. 1 Cor 13,1-15). A pessoa humana é um ser de esperança que, inclusive, espera. A esperança, por um lado, é uma virtude e, por outro lado, é modo de ser da pessoa humana. Ser humano como ser agraciado e a Teologia da Graça Você deve lembrar-se de que: © Antropologia Teológica170 1) Somos seres em processo. Nós nos aperfeiçoamos como indivíduo e como espécie. 2) A evolução é um processo aberto (que muitos dizem ser casual e, até, cheio de improbabilidades). 3) A criação é um ato contínuo de Deus, também aberto e multidirecional. Se você relacionar essas lembranças, poderá perceber isto: 1) A processualidade do aperfeiçoamento que envolve o ser humano não nasce dele mesmo. O improvável que se tornou real – nós o sabemos pela fé – é obra de Deus. Ele chama-o à vida, mantém-no e leva-o à plenitude. Essa ação de Deus é graça. A graça é algo que vem de fora do ser humano, de Deus. Deus, como Criador, como Pai e como Providência, acompanha-nos imediatamente com suas graças. Somos livres para recebê-las ou recusá-las. Entre a graça e a liberdade (o dom de Deus e a aceitação humana) parece haver uma tensão. Se Deus agracia-nos, estaria privando- -nos da liberdade? Seríamos obrigados a aceitar a graça, inclusive a de viver? Não seria a graça uma violência contra o ser humano? Pode a graça ser causa de nossa libertação? 2) Se Deus faz-nos seres em processo, também nos faz ca- pazes de receber seu acompanhamento (graça) para nos levar à destinação/salvação plena (graça última). Na ver- dade, tudo é graça, dom de Deus. Na Teologia, sobretudo desde Santo Agostinho, passan- do por vários sínodos e teólogos, como Santo Tomás de Aquino, Lutero, Bayo, Jansênio e Quesnel, além do Con- cílio de Trento, foram feitas grandes discussões sobre a graça como algo necessário ao ser "humano pecador". Esse tema, em muitos cursos de Teologia, aparece como uma dis- ciplina autônoma. Aqui, você verá apenas alguns conceitos ime- diatamente pertinentes à questão antropológica. 171 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus 3) O ser humano – independentemente da fé, que é uma graça – está marcado pela graça desde a criação/origem pessoal até a visão/salvação de Deus. Para aperfeiçoar- -se e, inclusive, superar o mal, ele é agraciado por Deus. Só se é humano por ser agraciado por Deus, isto é, so- mente se vivepor graça de Deus. Esse modo de Deus agir conosco não fere nossa liber- dade nem quer ser um "remédio" à sua obra criada. Ao estabelecer a presença da pessoa humana no seu plano de salvação, Deus chamou-a, elegeu-a para ser santa e perfeita a seus olhos (cf. Ef 1,3) por Cristo, em Cristo e para ele, por ação do Espírito Santo. Faz parte do ser humano receber e viver (mesmo de for- ma não consciente) da graça de Deus. Deus vive em nós, e nós vivemos nele e dele. Nos tradicionais Tratados da Graça, parte-se (quase sem- pre) do pressuposto de que a graça é algo complementar, dada por Deus por causa do pecado. Isso seria a forma de Deus corrigir o ser humano, pecador desde o início. A graça seria um remédio ou um auxílio para vencer o pecado. Essa perspectiva tem uma longa história e está muito difundida. Ela caracterizou boa parte das discussões teológicas de Idade Média. Nessa Antropologia Teológica, nós partimos de outro pres- suposto. Deus agracia-nos, concede-nos sua graça, porque somente podemos viver nele e para ele – mesmo com nos- sa autonomia ou independência, até mesmo quando nos voltamos contra ele. Quando se fala em criação contínua, está-se falando também da graça do viver, que é anterior e independente (ou acima) do pecado. Ninguém vive (mes- mo que esteja em pecado) sem a graça de Deus. Aqui, temos como pressuposto que a graça é o dom permanente de Deus para que o ser humano viva. Ela se torna graça especial nesta ou aquela circunstância. Seria inimaginável um ser humano viver sem a constante graça de Deus. Ela é a permanente forma de Deus estar conosco. © Antropologia Teológica172 4) Por ser dom de Deus, ela não depende da pessoa huma- na, que – isso sim – pode rejeitá-la. Pela graça, todo ho- mem e toda mulher são envolvidos amorosamente por Deus. A partir dessa experiência, é possível viver sempre diante de Deus, apesar dos males. Viver sempre diante de Deus foi o que Jesus viveu – "passou pelo mundo fazendo o bem" (At 10,32). Assim viveu Maria, "a cheia de graça" (Lc 1,28). Deus acompanhou-os e eles, por força da própria graça, responderam à graça de Deus. "Tudo contribui para o bem daqueles que amam a Deus" (1Jo 5,19). 5) A graça cria em nós o gosto, o otimismo e a alegria de vi- ver, de crer e de esperar a realização plena. Ela nos abre a uma relação de comum-união (comunhão) não apenas entre Deus e nós, mas também entre nós mesmos. Isso confirma o ser de relações que somos como pessoas. Ela é o garante da vitória final de Deus sobre todo o mal. É, também, a garantia divina em nós para vencermos os males que nos assolam ou que provocamos. Por não sermos perfeitos (carecemos, ainda, da per- feição), a presença de Deus em nós vai agraciando-nos para a perfeição. Ele nos auxilia com novas graças, a fim de não abusarmos da liberdade pelo pecado. Ele nos dá graças para vivermos em santidade e para evitarmos o pecado e o mal. Contudo, ele não se permite impedir- -nos de pecar e de praticar o mal. 6) Por sermos seres agraciados por Deus, somos cocriado- res com ele. Não somos meros participantes ou espec- tadores do mundo em que nos situamos. Nossa missão é colaborar na obra criacional toda. Para isso, recebe- mos a graça de Deus. O que somos adquire existência por essa gratuita expressão do amor de Deus. A atuação no mundo, a colaboração na construção de um mundo melhor, a recepção da conquista humana e o empenho por legar uma herança maior: tudo isso vem impulsiona- do por essa amorosa e gratuita relação de Deus em nós e conosco. 173 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus 7) Diante dos revezes das pessoas, das sociedades, dos paí- ses e do meio ambiente, Deus oferece, de muitos mo- dos, sua bênção (sua graça) para a renovação de tudo. Os próprios cristãos tornam-se portadores e mediadores privilegiados da graça de Deus em prol do bem comum – mesmo quando Deus utiliza outros crentes e religiosos para esse fim. 8) Ser agraciado por Deus é algo conatural ao ser huma- no, independentemente de sua vontade e de sua ação. Fomos escolhidos por ele desde antes da criação do mundo para ser santos e perfeitos, como diz São Paulo. Somos chamados por ele para que seja completado em nós graciosamente todo o processo de humanização a ser realizado. Sem prejuízo da liberdade, a pessoa huma- na pode acolher esses favores divinos exatamente para seu amadurecimento e plenificação. 9) A graça não é oferecida só ao indivíduo. Também é ofe- recida à coletividade humana, quer no conjunto, quer nos grupos derivados. Nesse último sentido, ela se apre- senta, ainda, como iluminação da atividade humana nos laboratórios de pesquisa, na organização social, no pro- cesso da educação e da cidadania, no trabalho, no lazer, na vida, enfim. 10) Há, porém, um aspecto especial da graça: é dada aos homens e às mulheres uma consciência libertária para produzir a libertação dos pobres, dos oprimidos e dos marginalizados. Essa situação de pobreza, que é, nor- malmente, produto intencionado por grupos humanos, exige a atenção de todos (especialmente dos cristãos) para a graça da fraternidade à mesa comum dos filhos e filhas de Deus. Se a pessoa humana foi criada para viver da graça, então, a ação libertária de Deus e dos seres hu- manos (graça) em prol dos mais necessitados (questão antropológica) torna-se um dever empenhativo (ques- tão moral) de todos. O ser humano é permanentemente agraciado por Deus; por isso, ele vive. Ele vive da graça constante da Providência Divina não porque é pecador, mas porque Deus o ama desde toda a eternida- © Antropologia Teológica174 de. Viver a vida de agraciado é, constitutivamente, o modo do viver humano. O ser humano pode até dizer que rejeita a graça e agir contrariamente a Deus, mas isso não impede Deus de agraciá-lo até mesmo nesses casos. Do contrário, a pessoa humana não viveria. Viver a graça é viver na alegria, na solidariedade, na comu- nhão com todos e na construção de um mundo melhor. É ser ima- gem do ser humano como filho e irmão de Deus. Ser humano como ser livre e questão da liberdade. Certa- mente, as suas experiências de liberdade já o convenceram de que você não é livre para fazer o que quer. Ninguém consegue isso. Às vezes, alguns acham que ser livre é poder fazer o que se deve. Entretanto, o "se deve" seria uma obrigação. Isso, então, não contrariaria a liberdade? Imagine, agora, a seguinte situação: numa roda de amigos, falava-se de fidelidade conjugal. Bem que poderia ser outro tema. Uma esposa de meia idade diz: "Sempre confiei no meu marido. Ele viaja muito. Tem toda a liberdade. Ele pode fazer tudo o que quiser. Por isso, sei que ele jamais me trairá". Responda, agora: a esposa está certa? A concepção de liberdade, em sentido antropológico, é dife- rente da concepção do sentido moral. Na base deste (moral), está aquele (antropológico). Também é diferente a concepção grega da atual concepção personalista de liberdade. As concepções filosóficas, uma vez que são filhas da própria razão, não são conceitos exaustivos para a Teologia. Isso acontece porque, naquelas, o ser humano basta-sei; nesta, o ser humano é um ser de relações com Deus e com os irmãos. Apenas o ser humano pode ser livre, pois é o único chamado a sê-lo. Você pode entender melhor o porquê de a pessoa humana ser chamada a ser livre quando a compara com os animais. Na li- 175 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus berdade, há componentes de consciência, de relação, de vontade, de possibilidade de decisão, de memória, de responsabilidade, de adesão e, até, de renúncia. A consciência de liberdade tem uma história. Para os gregos em geral, era condição de ser cidadão e não escravo. Para Sócra- tes, eraa capacidade de fazer o melhor. Já para Aristóteles, era a capacidade de escolher. Santo Agostinho, por sua vez, definia-a como a capacidade de decidir. Finalmente, para Kant, era a capaci- dade de agir autonomamente. Na Bíblia, há outras concepções. Consulte, em um dicionário teológico, o verbete "liberdade". Convém diferenciarmos isto: • liberdade de Deus; • liberdade do ser humano. Deus é libertador, o ser humano é libertado É Deus quem liberta e capacita as pessoas para entrarem em comunhão com ele e com os outros. Para São Paulo, a liberdade é um bem salvífico universal e gratuito que liberta o ser humano de todos os poderes, inclusive o da morte (cf. Rm 8,2-9.21). É, tam- bém, um dom escatológico. • O ser humano é livre porque recebeu a liberdade Deus, o único capaz de libertá-lo de todos os condicionamentos. • O ser humano é livre quando opta por Deus e quando se integra em obediência à ordem criada por Deus. • Ser livre é ter a capacidade de se autodeterminar dentro do plano de Deus. • O fundamento das liberdades está na comunhão com Deus. • Ela é uma atitude diante do pecado e da lei. Ser livre é um modo humano de existir. É a liberdade de Deus que torna o ser humano livre. Isso implica uma vocação, um cha- © Antropologia Teológica176 mado de Deus. Em contrapartida, é uma conquista que, pela graça de Deus, se faz ao longo da vida. Comblin (1998, p. 238) afirma: Ninguém ‘é’ livre. A liberdade está no agir para se libertar. Esta é a nossa vocação humana: tornar-se alguém, uma pessoa, fazer-se uma personalidade mediante uma luta, um trabalho, uma ativida- de que consiste em libertar-se. A libertação tem uma finalidade: tornar-se livre, dar-se a si próprio uma personalidade realmente mais livre. A liberdade é seu fim próprio, e ela se constrói no decor- rer da vida, no meio das oportunidades, dentro das vicissitudes de uma existência humana terrestre. O livro Vocação para a liberdade, de José Comblin, é muito inte- ressante, sobretudo na reflexão que ele faz sobre os processos libertários. O ser humano não tem um destino cego ("moira", como di- ziam os gregos), nem sua vida está selada ("maktub", como dizem os árabes). Não tem uma meta histórica e escatológica irrecusável de antemão. A vocação para a liberdade é um chamado e uma graça de Deus. Ela se torna uma experiência fundante e fundamental para o ser humano. Deve fazê-lo superar a si, seus desejos e medos, seus temores e egoísmos, seus traumas e subserviências, suas "posses" e sua história. Desse modo, livre é aquele que pode pôr-se a serviço dos ou- tros. Pôr-se a serviço dos outros é não ser escravo; antes, o contrá- rio. É claro que não é livre aquele que é obrigado a estar a serviço dos outros, pois, aí, ele pode estar, inclusive, desumanizado. Só no serviço voluntário de amor é que se conquista a liber- dade. Nesse sentido, o exemplo de Jesus Cristo, que passou pelo mundo fazendo o bem (cf. At 10,38), é ímpar. Ele se tornou livre exatamente porque se esvaziou totalmente de si (cf. Fl 2,6) para servir a Deus e aos seus irmãos, especialmente aos marginalizados e aos pobres. Ele foi um homem livre. 177 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus Nem sempre, homens públicos (presidentes, governantes e outros mais) são homens livres. Nem pública nem privadamente. Procu- re, em contrapartida, analisar, sob o prisma da liberdade, a vida de alguns homens e mulheres livres, tais como: Gandhi, Mandela, Tereza de Calcutá, Helder Câmara e Luther King. No processo de libertação, surge uma aparente contradição: Cristo libertou-nos para a liberdade, diz São Paulo. Só ele nos fez livres para a liberdade. Ser livre é um processo a ser construído. Nada está previa- mente determinado. O nosso futuro está aberto. Quanto mais nos libertamos, mais livres nos tornamos. Contudo, a nossa libertação é um colocar-nos sob o senhorio de Cristo. Eis, aqui, a questão: ao colocarmo-nos sob o senhorio dele, não nos tornamos seus escravos? Sim! Mas é apenas nos colocando a serviço dele que con- quistamos nossa liberdade. Só nele nos tornamos verdadeiramen- te livres. Então, podemos dizer: somos escravos de Cristo (afirmação negativa); por isso, somos livres (afirmação positiva). A liberdade é um dom de Deus. Em outras palavras: somos criados em Cristo como imagens e filhos de Deus para nos realizarmos em plenitude nele, vendo-o face a face – em função disso é que somos livres. Somos livres à medida que vivemos esse processo. Fora dele, que futuro se pode ter? Não é por acaso que, em Deus, conquis- tamos nossa plenitude (apesar de sermos livres para recusá-la). Se só aí estará nossa humanização completa, então, somente sob o seu senhorio é que atingiremos a razão de nosso viver. Ele é o Senhor que, na força do espírito, nos liberta para a liberdade. • Desse modo, concluímos: • Ser livre é, na verdade, colocar-se sob a vontade de Deus em vista da realização de seu plano salvífico. Seremos livres à medida que realizamos aquilo que Deus quis para nós. © Antropologia Teológica178 • A libertação última é poder viver em Deus. Só aí seremos plenamente humanos. Então, não mais precisaremos nem da própria liberdade nem mais da esperança. Viveremos na eterna graça como salvos, isto é, plenificados e realizados. Só o ser humano é um ser livre, porque Deus o liberta para a liber- dade, que consiste em fazer a vontade de Deus. Para situar o ser humano, afirmamos que sua vida tem várias dimensões, sem dicotomias. Deus fez o homem como um ser de esperança, para que ele tomasse em suas mãos o próprio cresci- mento. Também, o fez capaz de receber suas graças, a fim de que crescesse. E, finalmente, fez o homem livre, para que crescesse e assumisse seu destino final, construído num processo de liberta- ção. Esse processo de aperfeiçoamento envolve tanto a espécie humana quanto cada um pessoalmente. 7. SER HUMANO "CONTRA" DEUS Veremos agora algumas questões que não são marginais na Antropologia Teológica. Não se pode, portanto, ignorar seu peso sem falsificar a realidade humana. Embora elas não sejam o centro da fé, têm forte incidência sobre ela. Assim como vimos anteriormente que Deus nos criou, como imagem sua, em Cristo. Somos seus filhos e irmãos de Cristo Jesus. Vimos, ainda, que, no uso abusivo da liberdade, o ser humano e a humanidade alienaram-se de si próprios e de Deus; perderam a capacidade de dialogar com ele. Além disso, perverteram a própria vida e desviaram-se da história da salvação, colocando-se contra DeusDa alienação dialogal com Deus, degenera-se, também, o diá- logo com os irmãos. O mal, o pecado (o pecado original) e a morte (espiritual e eterna) excluem a pessoa da comunhão universal com Deus e da comunhão próxima com os irmãos. 179 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus Essa infeliz condição humana cria um aparente fracasso nos desígnios amorosos e gratuitos de Deus, que só pode ser "reme- diado", sanado, por Cristo. Deus criou-nos para nos salvar, isto é, para nos realizar plenamente nele. Todavia, necessita, também, no processo de aperfeiçoamento, redimir-nos (salvar-nos) de nos- sos pecados. Ser humano e mal Experimentamos, cotidianamente, tanto o mal quanto o bem. Você se depara, sempre, com a questão do mal. Nós o expe- rimentamos no sofrimento, na angústia, no medo, na morte, em nossas atitudes e na consciência moral. Diante dele, somos víti- mas e/ou vitimadores. De modo ativo, podemos ser causadores; de modo passivo, podemos ser vítimas. Mistério do mal O mal tem uma misteriosidade de muitas faces, a ponto de não se conseguir nem conhecê-lo nem erradicá-lo definitivamen- te. Antes mesmo de uma coisa ser boa ou ser má (questão moral),o mal está aí e atinge profundamente a vida humana, bem como o próprio ser humano. Por essa sua negatividade, torna-se uma questão antropológica também. Mesmo que se revolte contra o mal, a pessoa humana sente- -o por toda a parte. Muito se discutiu (e discute-se) sobre ele. É fá- cil encontrar tais discussões nos dicionários de Teologia, nos livros de Teologia Moral etc. Atualmente, um teólogo que discute muito esse assunto é Andrés Torres Queiruga em suas diversas obras. As discussões sobre o tema privilegiam as abordagens sobre o mal físico, moral e metafísico. O tema foi, particularmente, estu- dado na Teodiceia. Essa grande discussão, própria da Teodiceia e da Teologia Fun- damental, pode ser sintetizada no dilema de Epicuro (1949, p. 80): © Antropologia Teológica180 Ou Deus quer tirar o mal do mundo, mas não pode; ou pode, po- rém não quer; ou pode e quer. Se quer e não pode, é impotente; se pode e não quer, não nos ama; se não pode e não quer, não é Deus e além disso é impotente; se pode e não quer – e isto é o mais se- guro –, então de onde vem o mal real e por que ele não o elimina? Você pode perceber que, posto dessa maneira, o problema do mal é uma questão de Deus, de seu querer e de seu poder ou, ainda, do seu não querer e do seu não poder. Todavia, se a questão fosse do querer e do poder de Deus, dever-se-ia perguntar: por que ele ainda não resolveu a questão? Esta, no entanto, não se resolve assim. Neste estudo, você não vai abortar a questão pelo lado ontológico; será uma abordagem da Antropologia Teológica, com base na cotidianidade. O fato é que o mal e as coisas más estão aí, e eles tomam nomes e rostos diversos, conforme o tempo, as circunstâncias e as culturas. Origem do mal Em nenhum lugar da história humana, você encontra as ra- zões da origem do mal. Donde ele vem? Por que ele existe? Você deve se lembrar de que temos afirmado sempre a ques- tão da perfectibilidade (aperfeiçoamento) do cosmo e do ser hu- mano. Dizer "aperfeiçoamento" implica aceitar um crescimento, uma parada ou, até, uma frustração de crescimento. Isso pode ser identificado como uma limitação ou como uma finitude da criação. Deus não disse querer fazer um mundo perfeito. Num primeiro sentido, o mal que conhecemos se apresen- ta como inevitável no mundo e na humanidade. Nada e ninguém existem prontos e acabados, sem necessidade de evoluir. Na fini- tude e na limitação, seja da natureza cósmica, seja da humana, estão contidos as imperfeições, as falhas, os desajustes, as carên- cias etc. Estes se manifestam em preocupações, em dores e em sofrimentos. 181 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus Todavia, se a finitude revela crescimento e limitação, poder- -se-ia perguntar: por que não os abreviar ou buscar logo a perfei- ção? Por duas razões simples: • a história não dá saltos; • como tal, a finitude não é má. Sobretudo, as ciências, diante do chamado "mal físico", vão to- mando posições de prevenção e de correção da natureza, sejam estas físicas ou biológicas. Lembre-se de que não há nenhuma necessidade de Deus ter criado a natureza perfeita. Antes, Deus deu ao homem a missão de cuidar dela, de protegê-la e de desenvolvê-la. Assim, as ciências vão ajudando progressivamente na superação de falhas, de defeitos, de carências, de doenças etc. Não só ela é responsável, mas, também, o ser humano é capaz de superar muitos males naturais (físi- cos e biopsiquícos). É importante você perceber que certas situações, encaradas como defeituosas ou carentes, partem do (falso) princípio da necessidade de um mundo ou de um sistema perfeito. Tal percep- ção é falsa e irreal, afinal, quem é que pode estabelecer que, sempre e em toda parte, as coisas ou a própria saúde não possam ter limites, inclusive por causa de outras circunstâncias? Para a antropologia teológica, importa muito mais a questão do mal como produto da liberdade e a questão (inexplicável) dos sofrimentos dos inocentes. Numa "definição provisória", o mal hu- mano está ligado à liberdade. Ele produz uma situação "ruim", prejudicial, que agride as pessoas em sua vida (física, psíquica ou espiritual). É uma questão de malfeitores e de vítimas que, no pla- no religioso, se chama de "pecado". Desse modo, para a Antropologia, importa o mal como uma questão situada, concreta, porque é profundamente humana, prá- tica, política e espiritual. O mal está na maldade, construída em questões que prejudicam o ser humano em si e nos outros. No processo de libertação, aparece o mal, porque a liber- dade é uma construção e uma conquista, cujo resultado também pode aparecer como fracasso ou como derrota. © Antropologia Teológica182 O ato dos malfeitores, ou seja, o mal, está na exploração que produz a miséria, a fome e a pauperização e na exploração da dignidade da pessoa. O mal dos malfeitores é uma afronta, em primeiro lugar, a Deus e aos seus filhos: os outros. Depois, o mal vitima também o próprio agressor na sua humanidade mais pro- funda. Ele se autodesumaniza, obsecado em seu pretenso poder e idolatria. O mal prejudica os outros e o produtor do mal. Os profe- tas, na Bíblia, são vozes de Deus que se erguem constantemente contra os vitimadores. O mal das vítimas produz a sua desuma- nização. Castro Alves –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Sofrem inocentemente. Diante do sofrimento, surge, constantemente, a pergunta que Castro Alves já fi zera bem antes de Bonhöefer no poema Vozes da África. Veja-o a seguir: Deus, ó Deus onde estás que não respondes? Em que mundo, em qu’estrelas Tu t’escondes, Embuçado nos céus? Há dois mil anos te mandei meu grito Que embalde desde então corre o infi nito... Onde, estás, Senhor Deus? [...] (CASTRO ALVES, Antonio de. Poesias comple- tas. São Paulo: Ediouro s.d. Prestígio). O poema pode ser facilmente encontrado na internet, pois é obra de domínio público. Para vê-lo na íntegra, basta digitar: Vozes da áfrica, de Castro Alves. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– O dever moral, que é questão da Teologia Moral, exige, sob a pena da falta (pecado), a prestação de ajuda na superação ou na eliminação do mal. É paradigmática a parábola do Juízo Final, apre- sentada por Jesus (cf. Mt 25,31-46). Contudo, a raiz mais profunda da superação do mal é uma questão de Antropologia. Exemplos não faltam. Diante de seus vitimadores, Jesus, vítima inocente, na cruz, pede ao Pai que os perdoe: "eles não sabem o que fazem" (Lc 23,34). Foi um samaritano quem resgatou a dignidade do homem ferido entre Jerusalém e Jericó (cf. Lc 10,30-37). 183 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus A solidariedade e a misericórdia, com a justiça, são os ele- mentos fundamentais da superação do mal produzido pela mão do ser humano. Tais virtudes pertencem à estrutura da natureza humana. O mal só é combatido com "a recuperação da vista, com a libertação dos prisioneiros com a evangelização das vítimas e a proclamação do ano aceitável ao Senhor, como anunciou Jesus em sua ação programática, no início de sua missão" (Lc 4,18-19). O ser humano e o pecado Outra questão referente à origem do mal é a atitude huma- na. O mal também provém do coração humano. A liberdade cria a "infeliz" possibilidade de se fazer o mal. Além disso, o ser humano também é produtor de males. Basta pensarmos na fome, no de- semprego, na escravidão e em toda sorte de opressões, de injus- tiças, de violações da dignidade e dos direitos humanos etc. Tais atitudes são tanto individuais quanto sociais. Isso não depende da finitude, mas da vontade do ser humano. A experiência do pecado Nesse aspecto, o mal toma a forma de pecado. Ele vitimiza tanto o ser humano quanto o próprio Deus. No primeiro caso, o serhumano sofre as consequências pessoalmente, como vítima ou como vitimador (a causa). No segundo caso, Deus é ofendido na ofensa aos seus filhos. O pecado é inerente à pessoa humana O pecado/mal está tão misteriosamente arraigado na espé- cie humana que surge em quaisquer indivíduos, grupos, povos e culturas. Daí que os pecados pessoais não estão isolados uns dos outros. Eles procedem de contextos socioculturais – o que não isenta ninguém das responsabilidades individuais. Querendo ou não, estamos implicados nessas situações de pecado, mesmo que ninguém, individualmente, seja obrigado a pecar (cf. Sl 50). © Antropologia Teológica184 Solidariedade no bem e no mal Não se pode afirmar que o ser humano é pecador por na- tureza. É verdade: há uma solidariedade no pecado, e "parece" que esse mal é inseparável do ser humano desde a origem. Em contrapartida, há, também, uma solidariedade para o bem, cuja origem é Cristo. Mas não se pode (não se deve) criar uma tensão dualista entre o pecado e a graça (bem ou mal), tampouco aceitar a inevitabilidade ("moira") do pecado. Centralidade do pecado Na história da Igreja, existiram (e continuam existindo) cer- tas correntes que enfatizam a centralidade do pecado (amartio- centrismo). Disso, decorreriam as razões da encarnação do Verbo. No início do século 12, Santo Anselmo ( Aosta, 1033/1034 - Cantuária, 21 de abril de 1109 afirmou com todas as letras: o motivo da necessidade da encarnação do Verbo era o perdão de nossos pecados). Foi Tertuliano o primeiro a teologizar sobre a centralidade do peca- do nas grandes discussões cristológicas. Queria, assim, justificar o papel redentor de Cristo. Entretanto, as razões da encarnação por causa do pecado (amartiocentrismo) ficaram sacramentadas no famoso livro Cur Deus homo?, de Santo Anselmo. Outros teólogos tentaram amenizar essa afirmação falando do amor de Deus, que nos perdoou pela encarnação de seu Filho. Todavia, o amartiocentrismo impôs-se ao cristianismo, sobretudo a partir da Idade Média. Esta ideia de hamartiocentrismo, está presente, hoje , em muitos programas de televisão, sejam católicos, sejam evangélicos (pentecostais). Quanto menos se conhece e se ama a Deus, mais se apela ao pecado e ao demônio 185 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus Ênfase amartiocêntrica A ênfase amartiocêntrica é perversa no cristianismo, porque esconde tanto o amor de Deus e do próximo quanto o amor a Deus e ao próximo, que estão no centro da revelação e da própria encar- nação. Sem dúvida, o Verbo encarnado encontrou o ser humano e a humanidade em estado de pecado. Por ser nosso Salvador desde antes da criação, torna-se, também, nosso Redentor. "Ele se fez pecado, para a nossa salvação" (cf. 2Cor 5,21; Gl 3,13; Rm 8,32). Em contrapartida, convém ressaltar que Jesus é "em tudo igual a nós" (Heb 4,15). O texto paulino, porém, acrescenta a expressão: "menos no pecado" (cf. Jo 14,30). Deve-se prestar atenção ao significado do texto. Paulo não quer e nem poderia dizer: Nós somos pecadores e Cristo não o foi. Antes, Paulo – e essa é a exegese do texto, enfati- zada na Cristologia – ensina que Jesus não pecou porque, em tudo, fez a vontade do Pai, colocando-o em primeiro lugar. Por isso, não pecou. Aqueles que negam a "possibilidade" de Jesus pecar esta- riam negando, na verdade, sua humanidade, igual à nossa. A constatação da "impecabilidade de Jesus" só pode ser feita após sua morte. "Aquele que passou pela vida fazendo o bem" (At 10,38) não pecou. A afirmação que alguns fizeram no passado de que Jesus não podia pecar porque era Deus anularia sua igual con- dição à nossa natureza. Ele não seria, então, verdadeiro homem. Uma pessoa tem a liberdade e a possibilidade de pecar sem, no entanto, ser obrigada a isso. Sem dúvida, não pecar é possível somente quando se coloca a vida na vontade de Deus, como Jesus o fez. Assim, Jesus é, em tudo, igual a nós e não pecou porque nós, como ele, também não somos obrigados a pecar. Vencedor do pecado Há, ainda, outro aspecto: é do fato de Jesus não ter pecado que decorre nossa redenção (perdão de nossos pecados). Aquele – igual a nós – venceu o pecado e destruiu-o. Assim, é, inclusive, © Antropologia Teológica186 realçada a própria vida humana de Jesus, que se torna salvação e exemplo para nós: nosso irmão maior não pecou. O ser humano, justo e pecador É uma questão intrigante para a Antropologia Teológica o conceito de "pecador", ou seja, o ser humano como pecador. À Teologia Moral compete o aprofundamento dessa questão. Nor- malmente, com base na questão do pecado em si, passa-se a en- tender muito rapidamente que quem faz pecado é o pecador Você pode retomar, sob esse prisma, os conceitos emitidos no ca- derno Moral, a saber: "pecado" e "graça". Compare-os e diferen- cie-os com os que estamos afirmando. Desse modo, você deverá perceber a diferença e a validade dos conceitos das duas disci- plinas. Além disso, é interessante conferir os conceitos propostos em: BORN, A. Van den. Dicionário enciclopédico da Bíblia. Petró- polis: Vozes, 1971. Col. 1162-1165. O pecado original Ensinamento da Igreja A Igreja, em relação ao pecado original, fez afirmações dog- matizadas para indicar sua propagação desde as origens da huma- nidade. Convém lembrar que: 1) O pecado original não é um pecado pessoal, meu. Ele atinge a todos. No ensino da Igreja, afirma-se que todos se tornam mais "im-potentes" na vontade e no discernimento humanos e que todos ficam privados da graça divina – sem ela, o ser humano traz a morte dentro de si. 2) A doutrina do pecado original foi elaborada em paradig- mas diferentes dos atuais. Com base em interpretações bíblicas de Santo Agostinho sobre a Carta aos Romanos, cresceu um ensino que não estava baseado na histórica 187 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus evolução da humanidade, mas nos princípios da criação perfeita de Deus. Deus fez o homem perfeito; logo, "Adão e Eva" pecaram por desobediência (cf. Gn 3), por perversão em relação ao outro (Caim x Abel – cf. Gn 4), nas relações familiares (causa do dilúvio – cf. Gn 6) e nas relações sociais (Torre de Babel – cf. Gn 11). Aqui, também deve ser aplicado o princípio etiológico sapiencial já citado. A experiência do pecado original, na Bíblia, não é um relato histórico; antes, é um relato etiológico. 3) Nos últimos 50 anos, muito se tem discutido sobre o sig- nificado do pecado original. Aliás, tentam se recuperar aspectos esquecidos no decorrer dos tempos. O peca- do original, cujo texto básico é a Carta aos Romanos (cf. Rom 5,12-21), não é o objeto primeiro da fé. O funda- mento da fé cristã é a esperança, não a desgraça e nem a maldade. 4) Outro aspecto importante nessa questão é a redenção realizada em Cristo. "Deus inclui todos os homens na de- sobediência para dar a todos a misericórdia" (Rm 11,23). Só a restituição do amor torna a humanidade capaz de ser livre outra vez. Muitos teólogos relacionam esse pecado ao pecado estru- tural, cuja origem está nos primórdios da humanidade, afirmando que ele está presente ainda hoje e continua a ferir o ser humano em um amor desordenado e egoísta. Também, o Vaticano II assi- nalou dessa forma as questões contrárias ao reino de Deus (cf. LG 16; NA 2; GS 8, 13,37). Todavia, a histórica "invencibilidade" do pecado/mal, sejam nas origens ou na própria história, precisa ser compreendida à luz da relação profunda da pessoa humana com Cristo. Como afirma o Catecismo da Igreja Católica n. 386:"Fora desta relação, o mal do pecado não é desmascarado na sua verdadeira identidade de recu- sa e oposição face a Deus, embora continue a pesar sobre a vida do homem e sobre a história".© Antropologia Teológica188 1) A realidade do pecado das origens não é um fato obje- tivo, datado ou testemunhado documentalmente. Mas sua memória perdida não pode ser ignorada, mesmo que se lhe deem nomes diversos, como, por exemplo, a na- tural agressividade dos machos, a ambição pecaminosa, o pecado estrutural etc. Só em Cristo é que ele pode ser compreendido e explicado. Seu significado transcende os fatos históricos, apesar das consequências históricas. Suas explicações podem ser ancoradas na encarnação, na morte e na ressurreição de Jesus e, por consequên- cia, na nossa ressurreição. 2) Do prisma da fé, o mal humano recebe o nome de "pe- cado" (e, também, de "pecado original") por causa da redenção salvífica de Cristo. Influências negativas do mal/pecado atuam sobre situações pessoais e comuni- tárias, bem como sobre estruturas sociais. Esses frutos do pecado humano são identificados no Evangelho de São João como "pecado do mundo" (Jo 1.29). 3) A vitória de Cristo sobre o pecado, o mal e a morte é, também, nossa herança escatológica. Deus é o vencedor final. O ser humano é salvo nele, por ele e para ele. A justiça de Deus é maior que tudo. Paulo afirma de outro modo: "onde abundou o pecado, superabundou a gra- ça" (Rm 5,20). 4) No sentido antropológico, o mal/pecado é uma relação perversa com Deus que divide o ser humano por que- rer ocupar o lugar dele, por confiar só em si, por usar a liberdade contra Deus e por buscar ídolos, prestando- -lhes cultos. O pecado agrava-se aqui porque, na verda- de, despotencializa o ser humano, que se faz escravo de si mesmo, além de prejudicar os irmãos. 5) Aqui, volta a questão candente na relação com as Igrejas da Reforma sobre a justificação e a graça. Essa tensão histórica tem sido superada nos diálogos ecumênicos bi- laterais da Igreja de Roma e Luterana ao se compreender que só Jesus torna justo o ser humano e que – agraciada por Deus mesmo – a pessoa age ao responder positiva- mente a Deus. 189 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus O fundamento teológico do pecado original está, nos escri- tos bíblicos, em Rm 5 (Teologia Paulina). O Adão que mergulhou no pecado e na morte se opõe a Jesus, fonte de vida e justiça. Nos quatro primeiros séculos, os padres da Igreja não leva- ram muito em conta o relato do(s) pecado(s) da origem. Todavia, nunca negaram os males e a situação de pecado entre os homens, mesmo divergindo das explicações. Foi Santo Agostinho quem pas- sou a enfatizar a doutrina do pecado original como transgressão de Adão. Esse pecado passou, então, a marcar toda a humanidade por causa da cobiça decorrente. Na Idade Média, por meio da confirmação do Concílio de Trento, falou-se da privação da justiça como o verdadeiro sentido do pecado original. Em algumas Teologias, ainda se afirmava que Adão e Eva, moradores do jardim do Éden, eram perfeitos e, por terem desobedecido a Deus, perderam os seus dons preternaturais. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Você sabia que os dons preternaturais foram estabelecidos pela Teologia Es- colástica, que imaginava que Deus os teria dado a Adão e Eva? Esses dons teriam sido perdidos por causa da autossufi ciência deles, o que resultou na sua expulsão do paraíso. Eles, que, extensivamente, estariam perdidos para toda a humanidade, de todos os tempos, são: imortalidade corporal, integridade ou isenção da concupiscência, ciência extraordinária e impassibilidade ou isenção de qualquer sofrimento. Uma vez portadores desses dons, Adão e Eva teriam sido criados perfeitos. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Sem dúvida, o pecado original não é, hoje, uma questão pacífica na Igreja. Há muitos e novos questionamentos, inclusive por causa da questão da evolução humana, em contraposição aos textos bíblicos que deveriam ser compreendidos em seu caráter etiológico; contudo, alguns se aferram às interpretações historici- zantes. De exageros medievais, passa-se, hoje, a uma sobriedade muito intensa, como se pode verificar nos documentos do Concílio Vaticano II e do Catecismo da Igreja Católica. Nesses dois docu- mentos, diz-se o mínimo necessário, confirmando-se a leitura da © Antropologia Teológica190 presença do pecado no mundo desde suas origens. Essa realidade mística, ou melhor, etiológica, quer, na verdade, enfatizar a (cul- pável) distância de Deus produzida pelo ser humano. "Distância", aqui, pode ser entendida como incapacidade dinâmica de amar a Deus (MOSER, 2002). A questão do pecado original só pode ser entendida na perspectiva da história da salvação. Nesse sentido, é preciso com- preender o papel salvador de Jesus, que, pela sua ação, revela o pecado do ser humano (ato negativo e segundo); ele é o único salvador, sem ser apenas salvador do pecado. Ele é o salvador por- que é o caminho que nos leva à plenitude de vida em Deus (ato primeiro e positivo). Significado da morte Antes de começar a estudar esse tema, sugerimos que você reflita sobre os significados do termo "cultural" e da expressão "re- ligiosidade popular sobre a morte". Convém que recorde, ainda, que outros grupos (religiosos ou não) podem ter ideias bem dife- rentes das cristãs, tais como: reencarnação, desintegração do ser, volta à energia cósmica etc. Ainda na questão do ser humano "contra" Deus, deve-se uma palavra sobre a morte. Na Bíblia, mais que a caducidade da vida, ela tem uma conotação de "morte espiritual" e de "morte eterna" – por causa do pecado. Fora de Deus, o ser humano morre, e somente ele lhe pode restituir a vida. A própria morte natural, frequente na Bíblia, também é o preço do pecado. Leia, nos textos de exegese, o significado da morte em Rm 5,12-21. A morte cria uma radical separação entre os que morrem e os vivos. Diz-se, muitas vezes, que ela é a única realidade certa. Mas, inexoravelmente escandalosa, faz terminar a vida sem ra- zões. Ela é produtora de angústia, solidão e tristeza. 191 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus Passagem para a vida Para os cristãos, porém, ela torna-se uma passagem para a vida, ou melhor, o lado contrário da morte é a ressurreição para a vida eterna, em que a vida não mais depende de tempo e espaço. Os cristãos creem que a vida continua, apesar da morte. Somos cidadãos de duas pátrias: a histórica e a escatológica. A morte é a passagem certa e requerida para entrar na vida eterna. Tem aspec- to trágico e saudoso para os que ficam, mas, para o que parte, ela é a possibilidade de atingir a plenificação na glória de Deus. Pode-se dizer: só por ela, antropologicamente, se atinge a mais radical e irreversível humanização. Ela conduz à vida em Deus. A ressurreição de Jesus é a garantia da vitória sobre a morte: "aquele que estava morto [...] Deus o ressuscitou" (cf. At 2,23) [...] "e dis- to somos testemunhas" (At 2,32). "Deus, que ressuscitou Jesus da morte, ressuscitará também a nós, pelo seu poder (1Cor 6,14). "Cristo ressuscitou como primícias dos que morrem (1Cor 15,20). Se, em Cristo, a morte não é a última palavra, se Deus vivo é o Deus dos vivos e não dos mortos, então, nossa esperança con- valida-se na ressurreição. Por um lado, é o acabamento pessoal e espiritual do ser humano (a conquista plena de sua livre realidade espiritual) e, por outro, é a interrupção de sua vida biológica (o mais radical desapossamento de si, como diz Rahner (1904-1984), e ser todo possuído pelo Salvador). Só pela morte nós iremos nos tornar totalmente de Deus, em Deus e para Deus. A morte, para o homem do AT, era compreendida como des- graça maior. O ser humano morto iria para o "sheol". Certamente, esse não é o único modo de compreender a morte. Há muitas referências, nem sempre claras, ainda no AT,so- bre o fato de Deus ser o Deus dos vivos e não dos mortos. Assim, ele é o Deus de Abraão, de Jacó e de Moisés, os quais vivem nele. Jesus reflete, também, essa mentalidade e indica na parábola do rico epulão e do pobre Lázaro que, após a morte, há uma destina- ção diferente: uns vivem no seio de Abraão, e outros, na mansão dos mortos, lugar de tormentos (cf. Lc 16,19-31). © Antropologia Teológica192 Jesus, porém, faz de sua morte – segundo o Evangelho de João – a ocasião de retomar a sua glória, como nesse excerto: "a glória que tinha antes junto do Pai" (Jo 17,5). Entretanto, ela tam- bém o atemoriza, como em: "Afasta de mim este cálice [...]. A car- ne é fraca" (Lc 22,41), e faz ele sentir-se só (cf. Mc 15,34). Ela pode, ainda, ser a prova de profundo amor pelos amigos (cf. Jo 15,13) ou dar frutos, como o pão de trigo que morre (cf. Jo 12,24). Mas a invasão de Jesus é sua vitória sobre ela (cf. 2Tm 1,10). Conforme a Antropologia Unitária da Bíblia, na morte, o ser humano, em sua unidade e totalidade, seu "eu" como princípio vital, torna-se não acósmico, mas pancósmico, como diz Rahner (1904-1984) em sua Teologia sobre morte. A questão teológica da morte pode ser resumida assim: 1) É profundamente ambígua, necessária e portadora de um mistério que angustia o ser humano. 2) Envolve a interrupção da vida biológica, que é o mais ra- dical despojamento de si, o acabamento (plenificação) da pessoa com portadora da ruah divina. 3) Só pode ser compreendida e vivida pelo cristão como manifestação trágica da força do pecado (ruptura com Deus) ou como lugar crucial do encontro definitivo com Deus. 4) Ela torna-se o sacramento pascal da passagem deste mundo para o Pai – o mais radical encontro do homem com Deus, o qual é intermediado por Jesus; é o caminho de Deus para o homem e do homem para Deus. 5) É a possibilidade última da decisão final do ser humano diante de Deus. É só com a ajuda divina que o ser huma- no pode garantir o final feliz de sua vida ou evidenciar o seu desprezo por ela. A vida é um dom de Deus e não uma propriedade humana. Nisso, evidencia-se a diferen- ça radical entre Deus e o homem. Por sua finitude e tem- poralidade, o ser humano não se iguala a Deus, o eterno e incriado. Pela morte, o homem volta ao Pai, mas só Deus pode ressuscitá-lo. Apenas Deus pode conceder- -lhe a vida eterna, ressuscitando-o. 193 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus 6) A ressurreição de Jesus, que é a vitória sobre a morte, é a garantia do nosso futuro. 7) O cristão precisa, em vida, aprender a morrer, dando sentido à sua vida, como o fez Jesus, para dar o sentido à sua morte. 8) Mais que preocupação com a morte, ao cristão, com- pete a esperança, pois, em Deus, há muitas moradias, e Cristo ressuscitado prometeu prepará-las para os que ressuscitarem no Pai. Você pode continuar desenvolvendo essas ideias pela leitura de (entre outros): BREKEMEIER, Gottfried. O ser humano em bus- ca de identidade. Contribuições para uma Antropologia Teológica. São Leopoldo (RS): Sinodal; São Paulo: Paulus, 2002. Leia, espe- cialmente, o Capítulo VI. Ressurreição da carne A morte, porém, deixa entre os vivos um saldo: o corpo bio- lógico. É exatamente isto: enquanto a pessoa é chamada à imor- talidade, parte de si – o corpo biológico – morre e decompõe-se até desaparecer. Segundo a fé cristã, a transformação sofrida na morte é como a semente que morre para adquirir uma vida maior. A vida nova transforma-se em vida do espírito. Vida pneumatifica- da, no dizer de São Paulo. Novamente, aqui, a Antropologia deve relacionar-se com a Escatologia e relembrar a ressurreição da "carne" (do corpo) ou dos mortos. Nesse ponto, os conceitos não podem trair a fé. Você deve se lembrar de que muito da Antropologia Cristã foi afirmado sobre os conceitos gregos do homem como uma uni- dade dual, ou seja, de corpo e alma. Então, seguia-se este pensar: na morte, separam-se as duas realidades. A alma, na eternidade, aguardaria a ressurreição de seu corpo (biológico) no fim dos tem- pos para readquirir sua completude. © Antropologia Teológica194 Todavia, a Sagrada Escritura e a Teologia Contemporânea não convalidam mais essa posição. O ser humano, na morte, é transformado. Torna-se pleno, pneumatificado. Você lembra que a palavra "pneuma" significa: "sopro", "es- pírito". Mas você se lembra da ideia de "ruah"? A ressurreição é um fato escatológico, fora do tempo. Para a pessoa ressuscitada, o fim dos tempos já chegou. Sua vida, agora, é em Deus, em que não há tempo. Não há um "tempo" de espera na felicidade com Deus. Caso contrário, não seria uma visão beatí- fica e feliz de Deus. O ser humano ressuscitado é identificado pelo "ruah"; por isso, pode-se falar em pneumatizado. É a pessoa em sua dimensão espiritual. É algo mais que apenas a "alma" grega. Mas e o corpo? O cadáver de uma pessoa (não a pessoa) é sepultado, ou seja, posto na terra, ou cremado, transformando-se materialmente. Desde os povos primitivos, cultiva-se o respeito pelos cadá- veres e pelos sepultamentos. Os cristãos também o fazem, por- que creem que, enquanto vivo, naquele ser, habitava o Espírito de Deus, Deus mesmo. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– A Igreja Católica, atualmente, não se opõe mais à cremação dos cadáveres, dentre outros, por estes motivos: a) a cremação não é mais entendida como recusa à ideia da ressurreição dos mortos; b) a Igreja também leva em conta as questões ambientais e de falta de espaço nos cemitérios, sobretudo nas grandes cidades; c) ela respeita a liberdade de escolha da pessoa nesse aspecto. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– No processo de aperfeiçoamento humano, a corporeidade é uma dimensão fundamental, jamais desprezível. Entretanto, a partir da morte, perde o valor – não o respeito – porque a pessoa humana passa a ter uma dimensão maior. 195 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus Daí, a morte não tem mais poder sobre ela. Para os cristãos, ela evidencia uma feliz e inaudita libertação que nenhum outro ser humano tem o direito de antecipar. Desse modo, como São Francisco de Assis, pode-se até bendizer a "irmã morte", pois ela assinala o início da vida em Deus. As ideias teológicas sobre a morte, certamente, vão de encontro às lágrimas, à tristeza e à cultura da morte. O cristão maduro deve perceber que, se a tristeza da morte cria a saudade, a certeza da ressurreição leva-nos ao coração de Deus. Você pode procurar, no Missal, especialmente nos prefácios para os fiéis defuntos, a concepção da Igreja sobre a morte. O alienante diálogo humano com Deus desconstrói a comu- nhão por causa do mal, do pecado e da morte. Hoje, por um lado, enfatiza-se o mal como finitude cósmica e humana e, por outro, sabe-se que ele está presente por toda parte, em múltiplas faces. Desde o ponto de vista da fé, é identificado como pecado. Ele tem dimensões tanto antropológicas quanto morais (estas são estuda- das na Teologia Moral). O pecado, com sua misteriosidade, está em toda parte da vida humana. Ele atinge a todos. A memória cristã localiza-o desde as nossas origens. Nele, movemo-nos. Mas, em contrapartida, ele não é tudo nem é o critério humano e cristão para a explicação do mistério da vida. A graça de Cristo "resgata-nos" dele e salva-nos para a vida eterna. A graça é maior que ele. Os cristãos olham para além do mal, do pecado e da morte. Na ressurreição de Cristo, aguardam a própria ressurreição ao se tornarem pessoas espirituais que atingem a sua perfeição plena: ver e viver em Deus, o que é motivo de imensa gratidão. Então, a morte – que deixa angústia e saudade – torna-se fonte de liberta- ção, segundo afé cristã. © Antropologia Teológica196 8. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Confira, na sequência, as questões propostas para verificar seu desempenho no estudo desta unidade: 1) No inico desta da unidade, apresentamos um esquema de conceitos. Re- tome o esquema e analise: Você seria capaz de evidenciar quais os pontos novos você conseguiu compreender? 2) Explique o que você entendeu do tópico 5, "Questão da Unidade e Dimen- sões da Pessoa Humana". 3) Quais ideias teológicas você acrescentaria ao tópico 6 "O Ser Humano Diante de Deus" ? 4) No tópico 7, "Ser Humano ‘Contra’ Deus", há alguma ideia que deveria ser eliminada? Por quê? 9. CONSIDERAÇÕES Nesta unidade, você foi convidado a refletir sobre algumas situações humanas diante de Deus. Além disso, estudou questões fundamentais do ser humano, a saber: 1) o ser humano como ser de esperança, agraciado por Deus e livre; 2) problemas do mal, do pecado e da morte. Deus, em seu plano de salvação, pensou desde a eternida- de no ser humano como ser de esperança, isto é, um ser voltado para se realizar plenamente em Deus. Para poder sê-lo, a pessoa é, constitutivamente, um ser agraciado desde o seu nascimento até a sua morte. Todavia, sem autonomia, o ser humano não pode ser livre e responsável. Cristo liberta-o para que ele seja livre. Há situações que afastam o ser humano de Deus, e atingem- -no profundamente. Por todos os lados, ele se vê diante do mal e dos males, frutos não apenas da contingência e da finitude da criação, mas, também da vontade e da autossuficiência humanas. Sem ser naturalmente pecador, o ser humano vive num contexto 197 Claretiano - Centro Universitário © U6 - Ser Humano Diante de Deus e Contra Deus de pecado desde as origens, e encontra-o dentro de si e das es- truturas sociais. Impotente, só lhe resta Deus para salvá-lo desses pecados e, assim, reafirmar o processo de aperfeiçoamento (sal- vação para). A morte, que, por um lado, é o sem sentido, é, por outro, a possibilidade mais radical de nos colocarmos nos braços de Deus. Ela é o passo decisivo que separa a caminhada histórica do ser hu- mano e sua definitividade em Deus. Na próxima unidade, você estudará algumas questões perti- nentes ao significado cotidiano da vida: o ser humano em sua au- tonomia (a história, a cultura e o trabalho). Sem dúvida, na Antro- pologia Cristã, há muitos outros temas interessantes. Escolhemos esses porque são "ferramentas" para você continuar a sua própria reflexão ou o seu fazer Teologia depois do nosso estudo. Até lá! 10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, B. Pecado original... ou graça do perdão? São Paulo: Paulus, 2007. BINGEMER, M. C; FELLER, V. G. Deus-Amor: a graça que habita em nós. São Paulo: Paulinas; Valencia (Esp): Siquém, 2003. BUR, J. O pecado original. O que a Igreja disse de fato. São Paulo: Loyola, 1991. COMBLIN, J. Vocação para a liberdade. São Paulo: Paulus, 1998. EPICURUS. Ed. de O. Gigon, Zurich, 1949. FRANÇA MIRANDA, M. de. A salvação de Jesus Cristo. A doutrina da graça. São Paulo: Loyola, 2004. GESCHÉ, A. O mal. São Paulo: Paulinas, 2003. MOSER, A. O pecado, do descrédito ao aprofundamento. Petrópolis: Vozes, várias edições. QUEIRUGA, A. T. Recuperar a salvação. Por uma interpretação libertadora da experiência cristã. São Paulo: Paulus, 1999. THEVENOT, X. O pecado. O que é? Como se faz? São Paulo: Loyola, 2003.
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