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- .~'-.~~ •. -, ..•.• ~. ''-.' .•. ·C· Não obstante, esses hábitos podem imprimir certos tra- \o~; dI' inflexibilidade a suas ações. Para evitar esse efeito inde- St'j;!Vl'I,o sujeito deve, antes detudo, estar consciente de que os h"11l Também tem de revisá-los algumas vezes, para impedir 1I'I\"rx 1r.ipolcrn seus limites, e para procurar modificá-los quan- do uuul.uu seus pontos de referência. I':xislc outrotipo ~e.E~~_~~?-~m~~~is,para o qual reser- V,IIIIII" 11111IIlICde virtudes. Estas apresentam duas notas adicio- 11,11';1'01 IIJI1lado, const~t.!:leE!J!m h..ábito aQ.erf~içoado, pE9.~?- "leio :lC)111Vl"1da excelência, mediante um treinamento sustenta- 01111:,',111'1"1111ite ao agente alcançar um desémpeilh~ ~orarde ;dlll iu vrl IIC1n-xpcctivo campo, em benefício próprio e dos de- 111;11',I'c1111111/'t) lado, as virtudes se referem a aspectos centrais 1111c",11111I1Iais 110caráter de um indivíduo, a dimensões básicas oIc ·,ILIIII"ISolI;l!idadc. Uma virtu~erepre~entél. assim u~_~~bu- Ic)1IIIIIIal1lI levado a seu máximo desenvolvimento. A valentia, a 1111LIII'/;I, a autenticidade, a sabedoria, a prudência, a serenida- dc', ,',:lCIC'xl'll1plos característicos de virtudes morais. Constitu- c'IIIC)I'J'tIt!lJI0de um trahulhn introversivo, que o agente pratica :.cIIII\' ,c, i IIWSlllO,;1propóxitn dos desafios e dificuldades apre- :,C'II!;ldt1.'.11("1;1vida.' Capítulo II ÉTICA E MORAL Para orientar o desenvolvimento deste tema formulez.n0s a seguinte pergunta: I].opl~~oPE~~ico, o que se pod~ c?nS~$U1r com o estudo teórico da moral ?"".- o 0_0,0 Antes de entrar na matéria, vejamos o que é a ética, pois o fenômeno moral já foi estudado. O Que é ética . A_ éticapode s~~.~~finida como uma disciplina filosófica cujo obj~to de estudo é o f(!on~IIl~no_!p-O~-ªl.Este só pode ser tratado filosoficamente, porque não envolve apenas questões de fato, abordáveis empiricamente, com os métodos das ciências particulares, mas também questões de validade que devem ser ~x/aminadas. filosoficamente. Por exemplo, as regras morais e os JUIZOSmorais nã~ envolvem unicamente fatos e situações dadas; envolvem t~mbem - e antes de tudo - exigências acerca do que deve ser. Nao tomam em conta somente as condutas reais dos ser~s hun:~nos, mas certos modelos de comportamento cuja validade e mdependente dos fatos, certas formas de agir que se nos apresentam como merecendo existir, independentemente de que sejam ou não realizadas. O tratamento destes assuntos deve ser f~ito em termos filosóficos, posto que implicam questões r~latlVas à abrangência do conhecimento humano, ao sentido da vida e à verdadeira índole da realidade. Todavia, __o aporte das ciências SOCiaIS é muito iI?~orta~te pctrª.a étÍc~o.'Aiuíirôp~íôgia'cultu~al, a etnologia, a SOCIOlogia, a psicologia, a economia, etc., têm proporcionado 28 29 informação muito valiosa sobre a grande diversidade de c?~igos morais existentes, assim como sobre os contextos SOCIaISda conduta moral e a enorme complexidade do comportamento humano. A ética é,pois,_ uma disciplina, um ca~12~9.~studos que tem a moral'com(). objet.o.~~.i~teress~. ': relação. que há entre elas é análoga à que existe entre a agronorma e a agncultura, entre o processo econômico e a ciência econômica: ª_ moral é uma prática social e.ª. éti~~, o s~~~~_9I!e_~2rr~~gº-º-E~~_~~,sa prá.iic~i.'A ética existe porque a JIl:oral.éum f~l1Qmeno ~oClal c~mplexo ed~difícil apreensão; um fe~ôITl~~<:)gl!~l!~~e~s~ta.~er estudado para ser entendido. Atrayés~t~sº.ª.IQ.º-g~}).I~~ona(de mais de dois mil anos), a ética f-ºÜ~laborandgQS.Ç9.llÇ~~tose...9s métodos para abordar apropri;dam~~te o-àludid?JenôIDe~o. Onde não há essa bondade, a ética pode, talvez, con- tribuir com argumentos para conseguir que o interesse indivi- dual, egoísta, bem entendido, inteligentemente planejado, reco- mende seguir comportamentos compatíveis com as exigências da moralidade. Ou seja, pode adotar-se, calculadamente, linhas de conduta objetivamente morais, embora sua motivação básica seja o interesse puramente pessoal. Isso ocorre quando o indiví- duo se torna capaz de compreender que o bem dos demais é sempre condição necessária de seu bem particular, sobretudo se quer assegurar o reconhecimento social a seu direito de desfru- tar esse bem. Estudar ética proporciona uma visão mais ampla e profunda da vida moral, o que pode repercutir positivamente sobre ela. Façamos algumas precisões pontuais: Por que e para que estudar ética 1-A ética busca um alto grau de compreensão racional da vida moral e, portanto, possibilita um exercício mais lúcido desse aspecto da convivência. Isso na medida em que permite compreender a razão de ser das normas morais, conhecer por que são socialmente necessárias e relevantes para a boa marcha dos assuntos humanos. Note-se que muita gente, talvez a maio- ria, não chega Jamais a tal compreensão. Porque geralmente se ensina aos indi víduos a respeitar as normas, sem dizcr-lhcs por que têm que fazê-lo. O estudo da ética pode ter conseqüências positivas sobre a vida moral. Não no sentido de que as pessoas se tornem moral mcntc melhores estudando ética. Uma pessoa pode apresentar IIIll" grande bondade moral, tenha ou não estudado l;lic;l, 1l'llha ou não cstudado qualquer coisa. Porque a bondade uuual Ilao dqwlldc do conhecimento; mas sim da retidão da v(lllladl', (' ('sta da qualidade humana da pessoa; o que, por sua V('/, l: pllldlllo de sua sensibilidade para com os assuntos hlllllallllS l' da formação de seu caráter. !\ ética não pode proporcionar essa bondade moral. S(l pode fa/.ê-la mais lúcida, mais consciente, mais illtL'ligL~l1tcmcnteconduzida. Numa metáfora: a ética não pode dar coração ao agente moral para que sinta e valorize; some~te vist;l aguda e cérebro treinado para que perceba melhor e analise mais apropriadamente as implicações morais das situações e das «ondutas humanas, 2- O fato de o indivíduo saber o porquê da norma moral possibilita um compromisso mais pessoal c autêntico COIIIela, já que nesse caso ele se torna capaz de perceber de maneira muito precisa tudo o que está em jogo com respeito ;'1 norma. Em geral, pode dar-se conta de como sem ela a vida se torna mais perigosa, mais insegura, menos satisfatória, 1llL'110S sujeita a seu próprio controle; e como com ela a vida se 10m;1 mais digna de ser vivida, por existirem melhores cOlHli,'(ll's para II 3 O 31 ~ ~ ••••• ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~,. ~ ~,;11 .ti ",. """,,-••••••••••••••--"""•••-'"••,.,. •••,.... ,~- seu desenvolvimento. Já não é o temor irracional, mas o conhe- cimento, o que move sua conduta moral. Por exemplo, seria possível a vida social se não vigo- rasse suficientemente a norma de não mentir? Que aconteceria se, em todos os casos, mentir fosse a conduta normal? Poderia dessa maneira existir a ciência? poderíamos confiar nos demais? fazer um contrato? aguardar um ônibus ou um avião? dar aten- ção a um letreiro ou cartaz? freqüentar aulas? comprar? ven- der? participar de qualquer atividade coletiva?". 3- A ética também permite ao indivíduo urna depura- ção de sua moral. Isto é, possibilita ter urna visão mais seletiva e crítica com relação ao código moral empírico vigente em sua sociedade. Isso porque faculta que ele distinga em tal código o que é genuinamente moral daquilo que são inércias históricas, boas maneiras, normas religiosas, usos habituais, regras de higi- cnc, critérios de normalização, padrões de reprodução da domi- nação social, entre outras coisas. É mau moralmente, por exemplo, que um garoto use "cola", como é moda atualmente entre jovens? Perguntemo- nos se com isso ele está lesando algum direito dos demais, se alellla contra os legílimos interesses destes, se obstrui a obten- ,:,10 do hCIII estar geral, se está incitando outros a seguir uma l'ollllllla qu« provoca algum dos efeitos apontados, ou se se está l'aIlS;\llIlo 11111danoinjustificável para si mesmo. Em não sendo nxxiru. xrn alo 1l;IOencerraria implicações morais. Iria, certa- 1l1l'1I1l".l'(Jlltra algumas regras de normalização vigentes, mas 1:,,',(Jl' 111IIaxxunto que corresponde a um campo completamente dlstillto, del1lro do qual não operam os critérios de bem e mal. 4- A ética também faz a pessoa mais capaz de com- prl"ellder a moral alheia, pertencente a outra sociedade, a outra cultura, a outro meio social. Isso porque lhe permite passar da 32 "letra" da norma ao "espírito" que a sustenta. Ou seja, lhe per- mite passar da maneira concreta como está formulada urna nor- ma em certo código moral à razão de ser que justifica a existên- cia da norma em apreço. Isso proporciona uma visão mais flexí- vel das questões morais, pois o sujeito se dá conta de que o importante não é a norma na forma particular adotada em uma sociedade determinada, mas sim o que a norma encerra, isto é, o tipo de situações sociais e relações humanas que ela pretende propiciar. Contextos diferentes podem dar lugar a normas que, embora sejam muito diferentes em sua formulação, obedecem não obstante a uma mesma ou parecida finalidade. É importante lembrar o anterior porque constuma ser muito forte a tendência a absolutizar (considerar única válida) a moral do próprio gru- po social. O seguinte constraste é ilustrativo: nos tempos do so- cialismo real, os setores populares dos países socialistas reivin- dicavam que houvesse certas esferas da vida social que esca- passem do controle do Estado, enquanto que nos países capita- listas seus homólogos se pronunciavam a favor da ampliação dos poderes estatais. Se consideramos, contudo, as condições reinantes em cada bloco, veremos que, no fundo, a demanda tem em ambos os casos o mesmo sentido: tratava-se de encon- trar formas de proteção para que os setores mais vulneráveis das respetivas sociedades se defendessem diante da exploração e da dominação. Como no socialismo, estas se implcmcntam a partir do Estado, e no capitalismo a partir da empresa privada, então se entende por que buscavam o mesmo através de c.uui- nhos praticamente opostos. 5- Pelas mesmas razões que vimos considerando, a l;li ca faz as pessoas mais abertas à possibilidade til: 1I11\(1;1I1~'a1110 ral, isto é, à mudança nas normas que constituem () l'l'Hli/',lJ1110 ral. Ao fazê-Ias valorizar mais a razão de ser das 1I01'lllaSlJlll" ;1 33 forma concreta que estas apresentam em um dado momento, permite-Ihes compreender que, em certas ocasiões, somente se pode preservar o sentido e a função de uma norma, variando sua forma, porque se aquela se mantém sem modificações quando mudam as circunstâncias, o único que pode acontecer é que se torne obsoleta, perdendo seu valor moral e sua função efetiva como reguladora da conduta humana. Durante a Idade Média, por exemplo, condenava-se como imoral a cobrança de juros por empréstimo de dinheiro. A essa atividade chamava-se usura; subentendia-se que suas víti- mas eram pessoas carentes que não tinham recursos suficientes para atender suas necessidades. Com as primeiras manifesta- ções de uma economia capitalista, essa situação muda. Agora quem pede emprestado é o empresário, para ampliar seus negó- cios. Isso se converte no caso típico. Por conseguinte, a norma moral referente ao empréstimo de recursos monetários tem que transformar-se. Hoje não se alcunha de usurário ao que sim- plesmente coloca seu dinheiro ajuros; reserva-se esse qualifica- tivo para quem cobra juros exagerados, em relação com as ta- xas usuais num dado mercado de capitais. Com referência ao ponto aqui analisado, a ética tem uma grande função a cumprir, já que a moral historicamente tem apresentado uma forte tendência à imobilidade. Isso não é só próprio dela, mas de todos aqueles aspectos da vida social ql\c dcmandum do ser humano uma atitude de respeito. No plano 1I10r"l,tal exigência faz com que, freqüenternente, os indivíduos demonstrem resistência com relação ao exame das normas que regem suas relações; que considerem indubitável que são preceitos absolutos e inamovíveis. Isso se agrava ainda mais quando a essas normas, além de seu valor moral, se confere um valor religioso. No obstante, essa propensão fixista torna-se contraproducente; ainda mais no mundo de hoje, que apresenta ritmos de mudanças muito acelerados. Ameaça gerar, em última análise, uma total desarticulação entre as circunstâncias reais e as normas que regulam a conduta humana em tal contexto. Em resumo, podemos dizer que a ética pode proporcionar ao agente moral uma atitude de firmeza e flexibilidade. Uma atitude de firmeza quanto àquilo que é substantivo da vida moral, e de flexibilidade em todo o restante. A ética e o verdadeiro sentido da vida moral Vimos, no capítulo anterior, que a moral é um meio de controle social que se aplica através do indivíduo mesmo. Às vezes fala-se sobre esse assunto como se o único problema que pudesse apresentar-se fosse o de que os indivíduos violem os preceitos morais. Mas na realidade ocorre outra dificuldade, em certo sentido, mais séria. Comecemos por indicar que a submissão do sujeito à norma costuma ser bastante cega. Obedece-a porque é a norma, porque assim aprendeu. Sente que tem que segui-Ia porque o condicionaram a fazê-lo. Nesse caso, a sujeição a ela tende a converter-se em um fim em si mesmo, como se os seres humanos existissem para cumprir a regulamentação moral. E, concordantemente, a moral mesma se entende como pura proibição, como férreo acatamento de ma~datos que não nos deixam ser. Essa é a idéia de moral que, multas vezes, se encontra em muitas pessoas, as quais não ~scondem um gesto de desagrado quando ouvem essa palavra. E que se, na verdade, a vida moral fosse somente restrição c imposição, nos causaria muito dano: impediria nossa real iza\-o âo , nos obrigaria a ser diferentes de como somos ou queremos ser. Na realidade, porém, não é esse o sentido ua verdadeira moralidade. Ela não está aí para impedir-nos de ser, max xiiu para permitir-nos ser mais. As regras morais possihi lit.un conviver e cooperar, sem o que não tcrf.unos cultura nem civilização; elas permitem que desenvolvamos nossos talL'lltosl' capacidades e que, portanto, tenhamos acesso a UIllmodo de 34 35 1".r1.··.'.' •• ~'.; u'.~7.' _ vida superior e a gozos mais elevados; possibilitam tamb~m ..maior controle sobre nós mesmos, libertando-nos da escravidão das paixões e impulsos. . Não existimos para cumprir as normas morais; estas I'X istcm para fazer nossas relações mais produtivas e sati~fatórias " para fazer os seres humanos mais felizes e dese~volvidos. Tem-se dito que a ética é um saber racional sobre a Vilb mora]. Mas ela não busca meramente que entendamos esse ":;pI'('lo da intcração humana. Pretende que, com base nisso, V;IIIIOS:dl-lI1.Que sejamos capazes de passar de urnamoral cega ti 11111/1 /110m! roflexiva. Ou, dito em outros termos, que possa- 11111:.Il·:;lilllir;\ vida moral um sentido mais amplo. Isso implica, na prática, que, além de cumprir as nor- 111;\:.. :.:lIl!alllos LII,n bom uso delas. Recordemos que as regras 111\11;w. ,'llllll"'11I;\ xabcdoria acumulada sobre assuntos humanos 111'1;\,·XIWlii'!lll·ia<k muitas gerações. Contudo, muitas ~ezes não ',1111111',I';tP;I/I'S < 11-l'lllprcgar com sabedoria essa sabedona. Acon- 11'1I· ql\!' aplil':1I110S:ISvl"l.es essas regras com muita estre~teza dI' VI:..III Al',iIIlOS('011111se o importante fosse, conforme disse- 11111',allll .... )1',<;1wilal':I proihit,,'Cicse obedecer os mandatos. Como ',1' 1'.'.11111:;:.1'Illlb ;1 virln moral. Ao proceder dessa maneira, "11111'.1111"1!1\l1I:,I' dl':.('( Ilori 1I10Snossa existência. Porque, na re- 1111.\111/1'.11vl'ld;ldl'lr:III\l·1I1t' importante é gerar e desfrutar os 111'11',qlll' a 0\1'.1·1V;III1·I:1d\'ssl'S preceitos toma possível. 1\'. 1IIIII1Ia:.11101.ux S:IOIórrnulas que nos indicam, com 1111',1'1I11111i1I'x111'111'II,i:1unilt issccular, como devemos organizar " Ildlllll1l',II;t1 1111'.:.:1vida p<lra tirar dela o máximo proveito e Idl 11111111uruu ,tllIlI:t (·ollvivêllcia. É verdade que muitas vezes "1/1'11'1'11111\('1\11:1111privar IIOS de algo ou limtar-nos em sua 11111111\1,1111.111:1:.·,"llIpn' é em vista de outra coisa melhor. ( 11'111111\1'1111'(".:.d·. 1I11rlll:ISpr()cedem nestes termos: "prive-se dlhi'" 1'111'1'Ihll!1 :\11'"111qllL' é melhor"; "prescinda disso, que é 1'1('1111'1li, 1',11iI , 1I11'.l')',lIiroutra coisa que é mais permanente"; "abstenha-se disso, que é prazeroso mas é daninho"; "consiga aquilo que, mesmo que custe, vale a pena". A ênfase tem de colocar-se sempre no ganho a conseguir, nunca na proibição ou mandato. Estes devem ser vistos invariavelmente como meios, como instrumentos para melhorar a qualidade de vida do sujeito e de sua convivência. A moral, assim entendida, não tem por que ser identificada com o clássico amargurado ou amargurada que se escandaliza de tudo, que censura tudo o que acontece e receita condenação eterna para todo aquele que se cruza em seu caminho. Essa é uma visão distorcida da vida moral. A ética não pode, naturalmente, confirmá-Ia. Compete-lhe, pelo contrário, corribatê~Iã.;'denimcíá-la e contribuir para a sua superação. A regra de ouro da moralidade E~s_<:.r~gra.supõe.havermos chegado ao nível da moral reflexiva, istoé, da moral ap.oiada no pensamento ético. Historicamente, uma de suas primeiras formulações se deve a Buda, líder espiritual indu, que viveu há uns 2.500 anos. Mais tarde voltaremos a encontrá-Ia em Jesus de Nazaré.? Estabelece essencialmente que não se deve fazer aos outros o que não se quer que façam à gente. No século XVIII, o filósofo Immanuel Kant lhe deu forma mais precisa: "Age de tal maneira que a máxima de tua vontade possa valer sempre, ao mesmo tempo, como princípio de uma legislação universal"." Isso significa que a fórmula de ação em que se baseia a situação do sujeito, para ser moralmente válida, deve poder ser convertida em norma de aplicação universal. Ou seja, a ação é moral se e somente se aceitamos que aquilo que nós fazemos o podem fazer todos os demais, se se encontrassem nessa mesma situação, mesmo no caso em que não fôssemos o agente, mas sim o que sofre as 36 37 conseqüências de seus atos. Assim, a maneira de saber se estou agindo bem, é perguntar-me se a qualquer outro, no mesmo caso, eu reconheceria o direito de agir como estou fazendo. Ou, corno diz J. Habermas: trata-se de que a norma em questão ohtcnha o reconhecimento geral em seu âmbito de aplicação, p(ir parte de todos os afetados." Observe-se que a regra suprema da moralidade não tem \1111conteúdo concreto. É puramente formal, pode ser aplicada ;\ qllalqucr situação, seja qual for a matéria de que se esteja I1;I(;\lldo. (~um procedimento muito genérico para determinar o \;\I;iln moral ou não de urna ação humana. Não obstante, ela exige grande maturidade de pensa- 1111"1110.( 'nda um de nós se olha a si mesmo a partir de dentro e ,1111;1;1todos os demais a partir de fora. Isso faz cada um acredi- t.u :;,' \'\1111um privilégio especial. A pessoa experimenta sem- 1'11';1SII;Iprópria subjetividade, pode entender seus atos à luz de ',.'11:.pll',prios propósitos, No entanto, aos demais o indivíduo """'111,' os Vl~corno meros c()mportamentos, como figuras que ',I' dl:;solvclll lia paisagem. Não há igualdade na maneira direta I ,II\11lli sujeito percebe a si mesmo e aos demais. Á regra de ouro da moral implica que os seres huma- ".1', 1;1u-uluun IIltrapassado essa etapa. Que cada um pode dar- ',1', IIllIa (il' q"l' os demais são tão sujeitos como ele. Que o olho '1111'"1(' olha como dizia o poeta Antônio Machado - não é I li lill pOliI'u- o vejo; é olho porque me vê.'? A mencionada regra ',I' ',II"tl·"I;I Il\'ssa experiência. Incorpora urna percepção reflexi- \'" ti" ,liItIo, SITUlldo a qual este é urna pessoa igual a mim, com • I', IIII",IIIOSdireitos que eu, tão humano como eu. Quando tomo I 1111',111'111'1;1disso, me dou conta de que assim como eu ajo em 111111,;111.111:-,"\l'''S próprios fins (desejos, planos), os demais tam- III~11I 11)'.1'1li ('1111'1I1l~:ã()dos seus. E que negar-lhes a possibilidade di' 10111'11:.:,1lI' Ilegar-lhes sua condição de seres humanos. I li' IlIlItlOque o que, ultimamente, estabelece a regra d.' 11111'1ILI III,)r:tlidadc é que não podemos tratar a ninguém como se essa pessoa nada mais fosse que um meio a serviço de meus fins. Como se estivesse no mundo unicamente para servir a mim. Ao contrário, devo ter sempre presente que cada qual tem sua própria vida, que todos temos o direito de agir em bus- ca das próprias metas. Em qualquer relação que estabeleçamos com o outro, isso tem de ser respeitado. Certamente que pode- mos servir de meio ao outro e o outro servir de meio a nós, isso é válido enquanto não reduzamos nossa contraparte a esse pa- pel de meio, sempre que não despojemos o outro do direito de perseguir suas próprias finalidades. 39 38
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