Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
NOTAS DE AULA DE A´LGEBRA I Valmecir Bayer 10 de setembro de 2007 2 Suma´rio 1 CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA 7 1.1 Conjuntos e Subconjuntos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1.2 Operac¸o˜es com conjuntos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10 1.3 Func¸o˜es . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 1.4 Imagens diretas e imagens inversas . . . . . . . . . . . . . . . 16 1.5 Composic¸a˜o de func¸o˜es e func¸o˜es invers´ıveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 1.6 Relac¸o˜es de Equivaleˆncia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 1.7 Um pouco de linguagem lo´gica . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 1.8 Apeˆndice do Cap´ıtulo I . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 2 OS NU´MEROS INTEIROS 63 2.1 A definic¸a˜o de anel . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63 2.2 Ane´is ordenados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 2.3 Homomorfismos de ane´is . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81 2.4 O princ´ıpio da induc¸a˜o matema´tica . . . . . . . . . . . . . . . 85 2.5 Conjuntos finitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90 2.6 A construc¸a˜o dos nu´meros racionais . . . . . . . . . . . . . . . 94 2.7 O algoritmo da divisa˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101 2.8 Representac¸a˜o dos inteiros em bases . . . . . . . . . . . . . . . 105 3 DOMI´NIOS EUCLIDIANOS 111 3.1 Domı´nios euclidianos e ideais . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111 3.2 O anel de polinoˆmios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123 3.3 O teorema da fatorac¸a˜o u´nica . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133 3.4 Equac¸o˜es diofantinas lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . 140 3.5 Congrueˆncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 143 3.6 A aritme´tica das classes residuais . . . . . . . . . . . . . . . . 154 3 4 SUMA´RIO 4 O CORPO DOS NU´MEROS COMPLEXOS 163 4.1 O corpo C . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163 4.2 Ra´ızes de nu´meros complexos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 174 4.3 Os inteiros de Gauss . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 179 5 APEˆNDICES 191 5.1 A construc¸a˜o dos nu´meros reais . . . . . . . . . . . . . . . . . 191 5.2 Os nu´meros p-a´dicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 191 SUMA´RIO 5 NOTAC¸O˜ES Anel = Anel comutativo com unidade N = {1, 2, 3, . . .} = Conjunto dos nu´meros naturais Z = {. . . ,−2,−1, 0, 1, 2, . . .} = Anel dos nu´meros inteiros Z+ = {0, 1, 2, 3, . . .} = Subconjunto dos nu´meros inteiros na˜o negativos Q = Corpo dos nu´meros racionais R = Corpo dos nu´meros reais C = Corpo dos nu´meros complexos Y X = Conjunto da func¸o˜es de X em Y A∗ = Conjunto dos elementos invert´ıveis do anel A Kern ϕ = nu´cleo do homomorfismo ϕ 6 SUMA´RIO Introduc¸a˜o Estas notas teˆm o objetivo de servir como texto para as disciplinas de A´lgebra I e A´lgebra II do curso de Matema´tica da UFES. A intenc¸a˜o e´ apresentar os conteu´dos seguindo as ementas propostas pelo Colegiado do Curso de Matema´tica. Ha´ va´rios textos que cobrem estas ementas, no entanto e´ dif´ıcil encontrar um que seja completamente adequado. A vantagem atual de escrever textos para serem utilizados em disciplinas vem da facilidade de se processar mudanc¸as apo´s terem sidos experimentados. Talvez nunca chegaremos a um texto ideal mas isto na˜o tem importaˆncia pois mudanc¸as para aprimorar e atualizar conteu´dos sa˜o sempre positivas. O objetivo final e´ proporcionar um aprendizado mais eficaz e agrada´vel. O material abordado esta´ distribu´ıdo da foirma seguinte. No cap´ıtulo I e´ apresentada a linguagem ba´sica dos conjunto e func¸o˜es bem como uma pequena introduc¸a˜o a` lo´gica matema´tica. No cap´ıtulo II, axiomatizamos os nu´meros inteiros e estudamos as suas primeiras propriedades. O cap´ıtulo III tem como objetivo uniformizar as propriedades comuns dos inteiros e dos polinoˆmios em uma indeterminada sobre um corpo atrave´s da introduc¸a˜o dos domı´nios euclidianos. Terminamos o volume I destas notas com o estudo dos nu´meros complexos. Deixamos para os alunos mais curiosos a leitura dos apeˆndices onde tratamos a construc¸a˜o dos nu´meros reais, os nu´meros p-a´dicos e o Teorema Fundamental da A´lgebra. Cap´ıtulo 1 CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA A noc¸a˜o de conjunto e´ fundamental na Matema´tica. Trata-se de uma linguagem ba´sica que permite a comunicac¸a˜o em Matema´tica. Formalmente a teoria dos conjuntos esta´ associada a uma sub-a´rea da Matema´tica que podemos denominar Fundamentos da Matema´tica. A formalizac¸a˜o dessa teoria tem origem no se´culo XIX com os que hoje denominamos ”formalistas”. Matema´ticos como Cantor e Dirichlet (veja uma breve nota bibliogra´fica sobre cada um desses Matema´ticos no final deste cap´ıtulo) sa˜o representantes desta corrente de pensamento. Atualmente a teoria dos conjuntos como linguagem esta´ presente em todos os campos da Matema´tica e tambe´m nas a´reas afins. Acompanhada da noc¸a˜o de conjunto vem a noc¸a˜o de func¸a˜o. Numa lin- guagem informal, poder´ıamos dizer que a noc¸a˜o de conjunto trata de cole- cionar objetos e a noc¸a˜o de func¸a˜o trata de relacionar objetos traduzindo uma ide´ia que pode sugerir movimento. O nosso objetivo neste primeiro cap´ıtulo e´ introduzir de forma elementar, sem no entanto deixar de ser formal, esses conceitos para servir como uma iniciac¸a˜o a` linguagem e a` comunicac¸a˜o no mundo da Matema´tica. 1.1 Conjuntos e Subconjuntos A noc¸a˜o de conjunto e´ uma ide´ia primitiva na Matema´tica. Queremos dizer com ide´ia primitiva que na˜o fazemos nenhuma definic¸a˜o formal. Uti- 7 8 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA lizamos o conceito de conjunto para significar a ide´ia usual de colec¸a˜o de ob- jetos ou elementos. Poder´ıamos utilizar tambe´m o termo colec¸a˜o ou famı´lia, para expressar a mesma ide´ia. Um conjunto e´ constitu´ıdo de elementos ou pontos. Quando um elemento x esta´ num conjunto X dizemos que x pertence a X ou que X conte´m x e utilizamos a notac¸a˜o x ∈ X. Desta forma fica estabelecida uma relac¸a˜o entre elementos e conjuntos que denominamos relac¸a˜o de pertineˆncia. Se x na˜o pertence ao conjunto X utilizamos a notac¸a˜o x /∈ X. Para ilustrar esta linguagem pense no conjunto X cujos elementos sa˜o os s´ımbolos 1, 2, 3. Assim, por exemplo, 2 ∈ X enquanto o s´ımbolo 4 na˜o esta´ em X, e portanto 4 /∈ X. A teoria dos conjuntos procura na˜o enfatizar a natureza dos elementos que constituem um determinado conjunto, mas sim as relac¸o˜es entre elementos e conjuntos. Em nosso contexto, a teoria dos conjuntos na˜o apenas e´ u´til para tratar conjuntos nume´ricos, mas tambe´m e´ fundamental para tratar conjun- tos de natureza geome´trica e abstrata como conjuntos de retas, conjuntos de figuras geome´tricas, conjuntos de func¸o˜es, conjuntos de conjuntos etc... Dois conjunto A e B sa˜o iguais, e escrevemos A = B, se eles conte´m os mesmos elementos. EXEMPLO 1.1. O plano euclidiano pode ser visto como um conjunto de pontos. As retas do plano euclidiano tambe´m podem ser vistas como conjuntos de pontos. Por outro lado, as retas do plano euclidiano tambe´m formam um conjunto. Assim podemos perceber que um determinado elemento, no nosso exem- plo, uma reta, em outro contexto, pode ser considerado como um conjunto. O exemplo acima da´ uma ide´ia de quanto esta noc¸a˜o de conjunto pode ser relativa. E´ preciso estar atento ao contexto! Com o objetivo de facilitar a abstrac¸a˜o de pensamentos e definic¸o˜es e´ muito u´til, e tambe´m recomenda´vel, representar conjuntos por meio de figuras retil´ıneas ou figuras do plano. E´ importante, no entanto, ficar atento que es- tas representac¸o˜es na˜o devem ser utilizadas como argumentos para se demon- strar afirmac¸o˜es. O seu usodeve ser apenas ilustrativo. 1.1. CONJUNTOS E SUBCONJUNTOS 9 Para se definir um conjunto frequ¨entemente utilizamos uma ou mais condic¸o˜es a que devem satisfazer os seus elementos. Utilizamos a notac¸a˜o A = {x | p(x)} para indicar que A e´ o conjunto dos elementos x que satis- fazem a condic¸a˜o p(x). Por exemplo, A = {x | x e´ um triaˆngulo equila´tero}. Dois conjuntos A e B podem ser comparados pela relac¸a˜o que deno- minaremos relac¸a˜o de inclusa˜o: Dizemos que A e´ um subconjunto de B se todo elemento de A esta´ tambe´m em B. Neste caso, utilizamos a notac¸a˜o A ⊂ B. Podemos tambe´m utilizar a linguagem A esta´ contido em B ou B conte´m A. Contrariamente, se algum elemento de A na˜o esta´ em B enta˜o dizemos que A na˜o e´ um subconjunto de B. A relac¸a˜o de inclusa˜o goza de algumas propriedades que destacamos na proposic¸a˜o seguinte: PROPOSIC¸A˜O 1.1. Quaisquer que sejam os conjuntos X, Y e Z, temos 1. X ⊂ X 2. Se X ⊂ Y e Y ⊂ Z, enta˜o X ⊂ Z 3. Se X ⊂ Y e Y ⊂ X, enta˜o X = Y DEMONSTRAC¸A˜O: A primeira propriedade e´ uma consequ¨eˆncia ime- diata da definic¸a˜o da relac¸a˜o de inclusa˜o. Para demonstrar a segunda pro- priedade, precisamos verificar que X ⊂ Z. Ora, se x ∈ X, como X ⊂ Y enta˜o, pela definic¸a˜o de inclusa˜o, x ∈ Y . Por sua vez temos que Y ⊂ Z, e novamente, pela definic¸a˜o de inclusa˜o, x ∈ Z. Isto nos permite concluir que X ⊂ Z. A terceira propriedade e´ uma consequ¨eˆncia do conceito de inclusa˜o e de igualdade de conjuntos. � A propriedade 1 da proposic¸a˜o 1.1 chama-se propriedade reflexiva a se- gunda chama-se propriedade transitiva e a terceira crite´rio de igualdade. Ale´m disso, a propriedade 1 esta´ dizendo que todo conjunto e´ parte de si mesmo. Quando um conjunto X e´ parte de outro conjunto Y , isto e´, X ⊂ Y , mas X 6= Y dizemos que X e´ um subconjunto pro´prio de Y . Um conjunto Y e´ denominado vazio, e o representamos com o s´ımbolo φ, quando ele na˜o tem elementos. Observe que o conjunto vazio e´ subconjunto de qualquer outro conjunto. De fato, para verificarmos isto basta observar que a inclusa˜o φ ⊂ Y so´ seria falsa se exib´ıssemos um elemento de φ que na˜o 10 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA estivesse em Y . Mas isto e´ imposs´ıvel, uma vez que o conjunto φ na˜o possui elementos. Dado um conjunto X, podemos definir um novo conjunto associado a ele, a saber, o conjunto de suas partes que chamaremos de conjunto das partes de X e o denotaremos por ℘(X). Assim, ℘(X) = {A | A ⊂ X} Observe que φ ∈ ℘(X) e X ∈ ℘(X). Por exemplo, se X = {a, b, c} enta˜o teremos ℘(X) = { φ, {a}, {b}, {c}, {a, b}, {b, c}, {a, c}, {a, b, c} } 1.2 Operac¸o˜es com conjuntos Dados dois conjuntos A e B podemos construir ou definir novos conjuntos a partir deles. Estes processos se chamam operac¸o˜es com os conjuntos A e B. A seguir vamos definir quatro operac¸o˜es com os conjuntos A e B. 1. Unia˜o dos conjuntos A e B: A ∪B = {x | x ∈ A ou x ∈ B} Assim, x ∈ A ∪ B se, e somente se, pelo menos uma das duas afirmac¸o˜es seguintes e´ correta x ∈ A ou x ∈ B. Note que ”x ∈ A ou x ∈ B”na˜o exclui a possibilidade de x pertencer simultaneamente a A e a B. O significado matema´tico do conectivo ”ou”na˜o e´ exclusivo como na linguagem usual. 1. Intersecc¸a˜o dos conjuntos A e B: A ∩B = {x | x ∈ A e x ∈ B} Assim, x ∈ A ∩ B se, e somente se, x pertence simultaneamente a ambos os conjuntos A e B. Por exemplo, se A = {x | x e´ um triaˆngulo retaˆngulo} e B = {x | x e´ um triaˆngulo iso´sceles} enta˜o, A∩B e´ o conjunto de todos os triaˆngulos simultaneamente retaˆngulos e iso´sceles. 1.2. OPERAC¸O˜ES COM CONJUNTOS 11 1. Diferenc¸a dos conjuntos A e B: A−B = {x | x ∈ A e x /∈ B}. Quando A ∩B = φ diremos que A e B sa˜o disjuntos. Por exemplo, se A = {x | x e´ um triaˆngulo equila´tero} B = {x | x e´ um triaˆngulo retaˆngulo} enta˜o A ∩B = φ. Observe que a unia˜o e a intersecc¸a˜o de conjuntos sa˜o operac¸o˜es bina´rias e comutativas. Sendo assim elas podem ser iteradas e portanto definidas para uma quantidade qualquer de conjuntos. Em geral na˜o exigimos que A seja um subconjunto de B para definirmos a diferenc¸aB−A. No entanto, quando isto ocorre, isto e´, seA ⊂ B chamammos a diferenc¸a B − A de complementar do conjunto A no conjunto B. Caso o contexto permita fixar o conjunto B, denotaremos enta˜o a diferenc¸a B − A por CB(A), isto e´, CB(A) = B − A = {x | x ∈ B e x /∈ A} A operac¸a˜o diferenc¸a goza de algumas propriedades que listamos na proposic¸a˜o seguinte: PROPOSIC¸A˜O 1.2. Sejam A, B e B′ conjuntos quaisquer. Enta˜o 1. A− (B ∪B′) = (A−B) ∩ (A−B′). 2. A− (B ∩B′) = (A−B) ∪ (A−B′). 3. Se B ⊂ B′ enta˜o A−B′ ⊂ A−B. DEMONSTRAC¸A˜O: Para demonstrar uma igualdade entre dois conjun- tos podemos utilizar o crite´rio da igualdade estabelecido na proposic¸a˜o 1.1. Assim, para provar a primeira propriedade acima basta mostrar que A− (B ∪B′) ⊂ (A−B) ∩ (A−B′) e que (A−B) ∩ (A−B′) ⊂ A− (B ∪B′). 12 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA Seja enta˜o x ∈ A − (B ∪ B′). Pela definic¸a˜o de diferenc¸a entre conjuntos temos que x ∈ A e x /∈ B ∪ B′. Ora, pela definic¸a˜o de unia˜o de conjuntos, necessariamente x /∈ B e x /∈ B′. Assim podemos concluir que x ∈ A − B e x ∈ A − B′. Logo, pela definic¸a˜o de intersecc¸a˜o de conjuntos temos que x ∈ (A−B)∩(A−B′) e isto demonstra a primeira inclusa˜o. Reciprocamente, suponha que x ∈ (A − B) ∩ (A − B′). Enta˜o x ∈ A − B e x ∈ A − B′, isto e´, x ∈ A e x /∈ B e x /∈ B′. Assim x ∈ A e x /∈ (B ∪ B′), o que nos permite concluir que A− (B ∪B′). Para demonstrar a segunda propriedade utilizamos a mesma te´cnica. Suponha que x ∈ A− (B ∩B′). Enta˜o x ∈ A e x /∈ (B∩B′), isto e´ x ∈ A e, pela definic¸a˜o de intersecc¸a˜o de conjuntos, x /∈ B ou x /∈ B′. Portanto x ∈ A−B ou x ∈ A−B′, isto e´, x ∈ (A−B)∪ (A−B′) . Isto demonstra que A− (B∩B′) ⊂ (A−B)∪ (A−B′). Reciprocamente, se x ∈ (A−B)∪(A−B′) enta˜o x ∈ A e x /∈ B ou x ∈ A e x /∈ B′. Assim x ∈ A e x /∈ (B∩B′), isto e´, x ∈ A−(B∩B′) o que mostra que x ∈ A−(B∩B′). Isto mostra a igualdade no ı´tem 2. Para demonstrar a terceira propriedade, seja x ∈ A−B′, enta˜o x ∈ A e x /∈ B′. Ora, mas B ⊂ B′, enta˜o necessariamente, x /∈ B, o que mostra que x ∈ A−B. Isto mostra que A−B′ ⊂ A−B. � COROLA´RIO 1.1. Sejam B e B′ subconjuntos de um conjunto A, onde A esta´ fixado. Enta˜o 1. CA(B ∪B′) = CA(B) ∩ CA(B′). 2. CA(B ∩B′) = CA(B) ∪ CA(B′). 3. Se B ⊂ B′ enta˜o CA(B′) ⊂ CA(B). DEMONSTRAC¸A˜O: Segue imediatamente da Proposic¸a˜o 1.2 . � 1. Produto cartesiano dos conjuntos A e B: Antes de definir o produto cartesiano de dois conjuntos precisamos in- troduzir a noc¸a˜o de pares ordenandos. Dados dois objetos quaisquer a e b podemos definir o par ordenado (a, b). Este par ordenado consiste dos obje- tos a e b (que podem ser distintos ou na˜o) e da escolha de um deles para ser o primeiro objeto do par. Assim a notac¸a˜o (a, b) significa que a e´ primeiro objeto e b e´ o segundo objeto do par ordenado. Cuidado! na˜o confundir o conjunto {a, b} com o par ordenado (a, b). Observe que {a, b} = {b, a}, enquanto (a, b) 6= (b, a), a na˜o ser que a seja igual a b. 1.2. OPERAC¸O˜ES COM CONJUNTOS 13 Um par ordenado e´ caraterizado pela condic¸a˜o: (a, b) = (a′, b′) se, e somente se a = a′ e b = b′. Dados os conjuntos A eB podemos definir um novo conjunto que chamaremos de produto cartesiano de A por B, e o denotaremos por A× B, da seguinte maneira: A×B = {(a, b) | a ∈ A e b ∈ B}. Em outras palabras, o produto cartesiano de A por B e´ o conjunto dos pares ordenados (a, b) onde a ∈ A e b ∈ b. Dado o par ordenado (a, b), o objeto ”a”sera´ denominado a sua primeira coordenada e ”b”a sua segunda coordenada. O subconjunto do produto cartesiano A×A formado pelos elementos (a, a) de coordenadas iguais e´ chamado de diagonal de A × A e o representamos por ∆, isto e´, ∆ = {(a,b) ∈ A× A | a = b} PROPOSIC¸A˜O 1.3. Sejam A, B, C, A′ e B′ conjuntos quaisquer. Enta˜o 1. (A ∪B)× C = (A× C) ∪ (B × C). 2. (A ∩B)× C = (A× C) ∩ (B × C). 3. (A−B)× C = (A× C)− (B × C). 4. Se A ⊂ A′ e B ⊂ B′ enta˜o A×B ⊂ A′ ×B′. DEMONSTRAC¸A˜O: 1. Seja (x, y) ∈ (A ∪ B) × C. Enta˜o x ∈ A ∪ B e y ∈ C, isto e´, x ∈ A ou x ∈ B e y ∈ C. Logo, (x, y) ∈ A×C ou (x, y) ∈ B×C. Isto mostra que (A∪B)×C ⊂ (A×C)∪ (B×C). Reciprocamente, suponha que (x, y) ∈ (A×C)∪(B∪C), enta˜o (x, y) ∈ A×C ou (x, y) ∈ B×C. Enta˜o x ∈ A ou x ∈ B e y ∈ C, isto e´, x ∈ A∪B e y ∈ C, isto e´, (x, y) ∈ (A∪B)×C. Isto mostra que (A× C) ∪ (B × C) ⊂ (A ∪ B)× C. Isto mostra a primeira igualdade. Os ı´tens 2, 3 e 4 sa˜o deixadas como exerc´ıcio para o leitor. � 14 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA EXERCI´CIOS 1.1. 1. Seja A um conjunto qualquer. Mostre que: (a) A∪φ = A. (b) A∩φ = φ. (c) A∪A = A. (d) A∩A = A. 2. Sejam A e B conjuntos quaisquer. Mostre que: (a) A ∪B = B ∪ A. (b) A ∩B = B ∩ A. (c) A ∪B = A se, e somente se, B ⊂ A. (d) A ∩B = A se, e somente se, A ⊂ B. 3. Sejam A, B e C conjuntos quaisquer. Mostre que: (a) (A ∪B) ∪ C = A ∪ (B ∪ C). (b) (A ∩B) ∩ C = A ∩ (B ∩ C). (c) A ∪ (B ∩ C) = (A ∪B) ∩ (A ∪ C). (d) A ∩ (B ∪ C) = (A ∩B) ∪ (A ∩ C). No exer´ıcio 3, as propriedades a) e b) significam que a unia˜o e a inter- secc¸a˜o de conjuntos sa˜o operac¸o˜es associativas enquanto os ı´tens c) e d) significam que a unia˜o distribui a intersecc¸a˜o e vice-versa. 4. Sejam A e B subconjuntos de um mesmo conjunto I fixo. Denotando por C (X) o complementar de um subconjunto X de I em I, mostre que: (a) A ∩B = φ se, e somente se, A ⊂ C (B) (b) A ∪B = I se, e somente se, C (B) ⊂ A 5. Sejam A, B, A′ e B′ conjuntos quaisquer. Mostre que: (a) Se A ⊂ B e A′ ⊂ B′ enta˜o A ∪ A′ ⊂ B ∪B′. (b) Se A ⊂ B e A′ ⊂ B′ enta˜o A ∩ A′ ⊂ B ∩B′. 6. Sejam A, B e C conjuntos quaisquer. Mostre que vale a seguinte ”lei do cancelamento”: Se A ∪ C = B ∪ C e A ∩ C = B ∩ C enta˜o A = B. 1.3. FUNC¸O˜ES 15 7. Fixe um conjunto I e sejam A e B subconjuntos de I. Mostre que CI(φ) = I e CI(I) = φ. 8. Estenda as definic¸o˜es de unia˜o e intersecc¸a˜o para uma quantidade qual- quer de conjuntos. 9. Sejam A, B, C, A′ e B′ conjuntos quaisquer. Mostre que (a) (A ∩B)× C = (A× C) ∩ (B × C). (b) (A−B)× C = (A× C)− (B × C). (c) Se A ⊂ A′ e B ⊂ B′ enta˜o A×B ⊂ A′ ×B′ 1.3 Func¸o˜es A noc¸a˜o de func¸a˜o foi introduzida na Matema´tica por Dirichlet (veja uma breve nota bibliogra´fica sobre Dirichlet no final deste cap´ıtulo) para tratar se´ries trigonome´tricas no conjunto dos nu´meros reais. Esta noc¸a˜o evoluiu e hoje ela e´ extremamente u´til para tratar relac¸o˜es entre conjuntos mais abstratos. Assim como a noc¸a˜o de conjunto, a noc¸a˜o de func¸a˜o e´ fundamental na linguagem atual da Matema´tica. Como ressaltamos no in´ıcio do cap´ıtulo, a func¸a˜o transmite a ide´ia de movimento. Uma func¸a˜o definida num conjunto X e assumindo valores num conjunto Y e´ uma correspondeˆncia que a cada elemento de X associa um u´nico ele- mento de Y . Sa˜o sinoˆnimos de func¸a˜o os termos aplicac¸a˜o ou transformac¸a˜o. A notac¸a˜o atual de func¸a˜o e´ a seguinte. Denotando a func¸a˜o pelo s´ımbolo f por exemplo, se X e´ o conjunto onde ela esta´ definida e Y e´ o conjunto onde ela assume seus valores, escrevemos f : X −→ Y . Se x ∈ X enta˜o denotaremos por f(x) o valor de f em Y . O conjunto X recebe o nome de domı´nio da func¸a˜o f e Y recebe o nome de contradomı´nio de f . Pode ocorrer de X ser igual a Y , isto e´, o domı´nio ser igual ao contradomı´nio. E´ comum abreviar todas estas informac¸o˜es sobre a func¸a˜o f com a seguinte notac¸a˜o: f : X −→ Y x 7−→ f(x) Se o domı´nio e o contradomı´nio esta˜o completamente claros, isto e´, na˜o precisam ser enfatizados, podemos tambe´m usar a notac¸a˜o x −→ f(x) para significar que ao elemento x esta´ associado o elemento f(x) pela func¸a˜o f . 16 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA Uma observac¸a˜o importante e´ que a definic¸a˜o de func¸a˜o envolve dois conjuntos e uma associac¸a˜o de elementos. Assim e´ fundamental ter em mente que para que duas func¸o˜es sejam iguais e´ necessa´rio que os seus domı´nios sejam iguais, seus contradomı´nios sejam iguais e que a associac¸a˜o a cada elemento do domı´nio seja a mesma por estas func¸o˜es. Em s´ımbolos, temos: dadas as func¸o˜es f e g, digamos, f : X −→ Y e g : Z −→ W x 7−→ f(x) x 7−→ g(x) enta˜o, f = g se, e somente se, X = Z, Y = W e f(x) = g(x) para todo x ∈ X. Dois exemplos fundamentais de func¸o˜es sa˜o os seguintes: 1. Func¸o˜es identidades - Seja X um conjunto na˜o vazio. Considere a func¸a˜o Id com domı´nio e contradomı´nio iguais a X que a cada elemento x ∈ X associa o pro´prio x, isto e´ Id(x) = x. Claramente isto define uma func¸a˜o de X em X. Esta func¸a˜o e´ chamada func¸a˜o Identidade de X. 2. Func¸o˜es constantes - Sejam X e Y conjuntos na˜o vazios. Fixe um elemento b ∈ Y . Considere a func¸a˜o f : X −→ Y que a cada x ∈ X associa o elemento b. Novamente e´ claro que isto define uma func¸a˜o de X em Y que denominamos func¸a˜o constante (com valor b). 1.4 Imagens diretas e imagens inversas Dada uma func¸a˜o f : X −→ Y , classicamente o domı´nio X e´ tambe´m chamado conjunto de definic¸a˜o de f . Ja´ o subconjunto de Y formado pelos elementos y para os quais existe x ∈ X tal que y = f(x) e´ chamado con- junto de valores de f . Assim o conjunto de valores de f e´ uma parte de Y , podendo coincidir ou na˜o com o contradomı´nio Y . O fato do conjunto dos valores ser um subconjunto pro´prio de Y quer dizer que o contradomı´nio e´ desnecessariamente grande para a func¸a˜o f . Quando o conjunto de valores coincide com o contradomı´nio diremos que a func¸a˜o f e´ sobrejetiva. Assim a func¸a˜o f e´ sobrejetiva quando Y = {f(x) | x ∈ X}. 1.4. IMAGENS DIRETAS E IMAGENS INVERSAS 17 Considere um subconjunto A ⊂ X. O subconjunto de Y f(A) = {y ∈ Y | y = f(x) para algum x ∈ A} = {f(x) | x ∈ A} e´ denominado imagem direta de A pela func¸a˜o f . Trata-se do conjunto de valores que a func¸a˜o f assume em B. Observe que se A = X enta˜o o conjunto de valores de f e´ exatamente f(X) como acabamos de definir. Observe tambe´m que f(A) ⊂ f(X) ⊂ Y . Por outro lado, considere agora um subconjunto B ⊂ Y . O subconjunto de X f−1(B) = {x ∈ X | f(x) ∈ B} e´ denominado imagem inversa de B pela func¸a˜o f . Trata-se do subconjunto deX cujos elementos sa˜o associados a elementos de B pela func¸a˜o f . Observe que f−1(X) = Y uma vez que todo elemento de X precisa estar associado a algum elemento de Y pela definic¸a˜o de func¸a˜o. Naturalmente f−1(B) ⊂ X. E´ curioso notar que sempre que A ⊂ X e´ um conjunto na˜o vazio enta˜o f(A) tambe´m e´ na˜o vazio, ao passo que pode ocorrer que B ⊂ Y seja na˜o vazio mas f−1(B) seja vazio. Para isto basta que B ∩ f(X) seja vazio. Quando o conjunto B ⊂ Y se reduz a um u´nico ponto, digamos, B = {b}, utilizaremos a notac¸a˜o (mais simples) f−1(b) em vez de f−1({b}) para denotar a imagem inversa do conjunto B. Assim como a noc¸a˜o de imagem direta deu origem ao conceito de func¸a˜o sobrejetiva, a noc¸a˜o de imagem inversa da´ origem a um outro conceito que e´ o de func¸a˜o injetiva. Diremos que uma func¸a˜o f : X −→ Y e´ injetiva quando quaisquer dois elementos distintos de X esta˜o associados a elementos distintos de Y pela func¸a˜o f . Resumidamente podemos dizer que f e´ injetiva quando pontos distintos deX teˆm imagens distintas. Podemos formular o conceito de func¸a˜o injetiva em termos de imagem inversa da seguinte forma: f e´ injetiva quando f−1(y) conte´m no ma´ximo um ponto qualquer que seja y ∈ Y . Deixamos a verificac¸a˜o da equ¨ivaleˆncia destas formulac¸o˜es a cargo do leitor. 18 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA EXERCI´CIOS 1.2. 1. Sejam f : X −→ Y uma func¸a˜o, A,A′ ⊂ X e B,B′ ⊂ Y . Mostreque (a) Se A ⊂ A′ enta˜o f(A) ⊂ f(A′). (b) Se B ⊂ B′ enta˜o f−1(B) ⊂ f−1(B′). (c) f(A ∪ A′) = f(A) ∪ f(A′). (d) f−1(B ∪B′) = f−1(B) ∪ f−1(B′). (e) f(A ∩ A′) ⊂ f(A) ∩ f(A′). Mostre tambe´m que vale a igualdade para quaisquer A,A′ ⊂ X se, e somente se, f e´ injetiva. (f) f−1(B ∩B′) = f−1(B) ∩ f−1(B′). 2. Sejam f : X −→ Y uma func¸a˜o, A,A′ ⊂ X e B,B′ ⊂ Y . Mostre que (a) f−1(B′ −B) = f−1(B′)− f−1(B). (b) f(A′)− f(A) ⊂ f(A′ −A) e vale a igualdade se, e somente se f e´ injetiva (c) Deˆ exemplos onde a igualdade no item b) na˜o seja va´lida. 3. Sejam f : X −→ Y uma func¸a˜o, A ⊂ X e B ⊂ Y . Mostre que (a) f(A) = φ se, e somente se, A = φ. (b) f−1(B) = φ se, e somente se, B ∩ f(X) = φ. (c) f−1(B) = f−1(B ∩ f(X)). 4. Sejam f : X −→ Y uma func¸a˜o e A ⊂ X. Mostre que A ⊂ f−1f(A)). Ale´m disso, vale a igualdade para qualquer subconjunto A de X se, e somente se, f e´ injetiva. 5. Seja f : X −→ Y uma func¸a˜o e B ⊂ Y . Mostre que f(f−1(B)) ⊂ B. Ale´m disso, vale a igualdade para qualquer subconjunto B de Y se, e somente se, f e´ sobrejetiva. 1.5. COMPOSIC¸A˜O DE FUNC¸O˜ES E FUNC¸O˜ES INVERSI´VEIS 19 1.5 Composic¸a˜o de func¸o˜es e func¸o˜es invers´ıveis Como ja´ salientamos anteriormente a noc¸a˜o de func¸a˜o esta´ associada a` ide´ia de movimento. Esta ide´ia fica mais evidente na hipo´tese de poder- mos iterar func¸o˜es, isto e´, aplicar seguidamente a mesma func¸a˜o ou func¸o˜es diferentes. Ha´ casos em que podemos fazer isto e ha´ casos em que na˜o podemos. Vejamos: Suponha que nos sejam dadas duas func¸o˜es f : X −→ Y e g : W −→ Z. Por exemplo, suponha que quize´ssemos aplicar a func¸a˜o g aos elementos da forma f(x). Para que esta ide´ia tenha sucesso e´ evidente que precisamos ter f(x) no domı´nio da func¸a˜o g. Ora, enta˜o a condic¸a˜o que precisamos e´ que f(X) ⊂ W . Esta e´, digamos, examente a condic¸a˜o necessa´ria. No entanto, uma condic¸a˜o suficiente para que possamos aplicar a func¸a˜o g aos elementos f(x) para todo x ∈ X e´ que Y = W , isto e´, o domı´nio da func¸a˜o g seja igual ao contradomı´nio da func¸a˜o f . Em geral esta u´ltima condic¸a˜o e´ mais fa´cil de ser verificada. E´ com ela que vamos trabalhar. DEFINIC¸A˜O 1.1. Sejam f : X −→ Y e g : Y −→ Z duas func¸o˜es. A func¸a˜o com domı´no X, contradomı´nio Z que a cada x ∈ X associa o elemento g(f(x)) ∈ Z e´ denominada func¸a˜o composta de f com g e a denotaremos por g ◦ f Podemos enta˜o pensar na composic¸a˜o de func¸o˜es como um tipo de operac¸a˜o no conjunto das func¸o˜es. Ha´ pore´m uma restric¸a˜o, pois como observado acima, dadas duas func¸o˜es arbitra´rias, nem sempre e´ possivel compoˆ-las, isto e´, nem sempre e´ possivel realizar a ”operac¸a˜o”. Apesar disso, quando a composic¸a˜o for poss´ıvel, ela goza de algumas propriedades importantes que destacamos nas proposic¸o˜es seguintes. PROPOSIC¸A˜O 1.4. Sejam f : X −→ Y , g : Y −→ Z e h : Z −→ W func¸o˜es . Enta˜o h ◦ (g ◦ f) = (h ◦ g) ◦ f . Em outras palavras, no caso em que a composic¸a˜o de func¸o˜es for poss´ıvel ela e´ associativa. DEMONSTRAC¸A˜O: Observe que h ◦ (g ◦ f) e (h ◦ g) ◦ f teˆm X como domı´nio e W como contradomı´nio. Ale´m disso, se x ∈ X, pela definic¸a˜o 1.1 acima temos (h ◦ (g ◦ f))(x) = h((g ◦ f)(x)) = h(g(f(x))) = = (h ◦ g)(f(x)) = ((h ◦ g) ◦ f)(x) Portanto, h ◦ (g ◦ f) = (h ◦ g) ◦ f . � 20 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA PROPOSIC¸A˜O 1.5. Seja f : X −→ Y uma func¸a˜o qualquer e considere a func¸a˜o identidade de X, IX : X −→ X e a func¸a˜o identidade de Y , IY : Y −→ Y . Enta˜o f ◦ IX = f e IY ◦ f = f . DEMONSTRAC¸A˜O: Claramente f e f ◦ IX teˆm o mesmo domı´nio X e o mesmo contradomı´nio Y . Ale´m disso, para cada x ∈ X temos (f ◦ IX)(x) = f(IX(x)) = f(x). Portanto, f ◦ IX = f . De maneira ana´loga, obtemos IY ◦ f = f . � A proposic¸a˜o 1.5 nos afirma que IX desempenha o papel de ”elemento neutro a` direita”para o conjunto das func¸o˜es de X em Y e IY desempenha o papel de ”elemento neutro a` esquerda”. Assim se X = Y enta˜o o conjunto das func¸o˜es de X em X possui um elemento neutro que e´ a func¸a˜o identidade de X. A seguir vamos estudar a questa˜o da existeˆncia de func¸o˜es inversas. Dada uma func¸a˜o f : X −→ Y , dizemos que g : Y −→ X e´ uma inversa a` direita de f se f ◦ g = IY , isto e´, f(g(y)) = y para todo y ∈ Y . E´ fa´cil construir um exemplo de func¸a˜o que na˜o possui inversa a` direita, veja: Sejam X = {1} e Y = {1, 2} e considere a func¸a˜o f : X −→ Y definida por f(1) = 1. A u´nica func¸a˜o que podemos definir de Y em X e´ a func¸a˜o (constante) g = 1, isto e´, g(1) = g(2) = 1. Logo f(g(1)) = f(1) = 1 = f(g(2)) e, portanto, claramente f ◦ g 6= IY . Fac¸a um diagrama que ilustre este exemplo. Na˜o e´ muito dif´ıcil perceber que o que esta´ impedindo a na˜o existeˆncia da inversa a` direita neste caso e´ o fato de f na˜o ser sobrejetiva. Na verdade esta e´ a u´nica restric¸a˜o em qualquer caso, como mostra a proposic¸a˜o seguinte: PROPOSIC¸A˜O 1.6. Seja f : X −→ Y uma func¸a˜o. Uma condic¸a˜o necessa´ria e suficiente para que f possua uma inversa a` direita e´ que f seja sobrejetiva. DEMONSTRAC¸A˜O: Suponha que f : X −→ Y possua uma inversa a` direita g : Y −→ X. Assim, f ◦ g = IY , isto e´, f(g(y)) = y para todo y ∈ Y . Queremos verificar que f e´ sobrejetiva, isto e´, que a imagem direta de X, f(X) coincide com o contradomı´nio Y de f . Ora, como f(X), por definic¸a˜o, e´ um subconjunto de Y , basta verificar que Y ⊂ f(X). Assim, sempre que quizermos verificar que uma func¸a˜o f : X −→ Y e´ sobrejetiva basta verificar que para cada y ∈ Y tem-se que y ∈ f(X), isto e´, existe x ∈ X tal que 1.5. COMPOSIC¸A˜O DE FUNC¸O˜ES E FUNC¸O˜ES INVERSI´VEIS 21 y = f(x). No nosso caso, como f(g(y)) = y para todo y ∈ Y , basta tomar x = g(y). Portanto a func¸a˜o f e´ sobrejetiva. Reciprocamente, suponha que f seja sobrejetiva. Defina uma func¸a˜o gY −→ X da seguinte forma: dado y ∈ Y , usando a sobrejetividade de f , existe x ∈ X tal que f(x) = y. Fixe um desses x ∈ X e defina g(y) = x. A func¸a˜o g assim definida e´ uma das func¸o˜es que queremos. � De maneira ana´loga temos a noc¸a˜o de func¸o˜es inversas a` esquerda, como segue. Considere uma func¸a˜o f : X −→ Y . Dizemos que uma func¸a˜o h : Y −→ X e´ uma inversa a` esquerda de f se h ◦ f = IX , isto e´ h(f(x)) = x para todo x ∈ X. Novamente e´ fa´cil construir exemplos de func¸o˜es que na˜o possuem inversas a` esquerda. Deixamos esta tarefa como exerc´ıcio para o leitor. E tambe´m, de maneira ana´loga, de forma dual, existe um crite´rio de existeˆncia de inversas a` esquerda, a saber: PROPOSIC¸A˜O 1.7. Seja f : X −→ Y uma func¸a˜o. Uma condic¸a˜o necessa´ria e suficiente para que f possua uma inversa a` esquerda e´ que f seja injetiva. DEMONSTRAC¸A˜O: Suponha que f possua uma inversa a` esquerda, dig- amos h : Y −→ X, isto e´, h(f(x)) = x para todo x ∈ X. Queremos verificar que f e´ injetiva. Para isto precisamos verificar que se x1 6= x2 em X enta˜o f(x1) 6= f(x2); ou de maneira equivalente, se f(x1) = f(x2) enta˜o x1 = x2. Ora, se f(x1) = f(x2) enta˜o h(f(x1)) = h(f(x2)), isto e´ x1 = x2. Recip- rocamente, suponha que f : X −→ Y seja uma func¸a˜o injetiva. Queremos encontrar uma func¸a˜o inversa a` esquerda para f . Defina h : Y −→ X da seguinte maneira. Fixe um elemento a ∈ X. Dado y ∈ Y , temos duas alter- nativas (exclusivas): y esta´ na imagem direta de X, isto e´, y ∈ f(X) ou y na˜o esta´ na imagem direta de X, isto e´ y /∈ f(X). No caso em que y /∈ f(X) defina h(y) = a. No caso em que y ∈ f(X), como f e´ injetiva existe um u´nico x ∈ X tal que f(x) = y. Defina h(y) = x. E´ claro que h(f(x)) = x para todo x ∈ X. E´ imediato verificar que h assim definida e´ uma inversa a` esquerda para f . � Nas duas proposic¸o˜es acima nada e´ mencionado sobre a unicidade da in- versa. Na verdade, podemos verificar que em geral na˜o temos esta unicidade. No entanto,temos um crite´rio muito claro para garantir esta unicidade. Este e´ o conteu´do do teorema a seguir. 22 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA TEOREMA 1.1. Seja f : X −→ Y uma func¸a˜o. Suponha que f possua uma inversa a` direita g e uma inversa a` esquerda h. Enta˜o g = h e neste caso, g e´ a u´nica inversa a` direita de f e tambe´m e´ a u´nica inversa a` esquerda de f . DEMONSTRAC¸A˜O: Sejam g : Y −→ X uma inversa a` direita de f e h : Y −→ X uma inversa a` esquerda., isto e´, f(g(y)) = y para todo y ∈ Y e tambe´m h(f(x)) = x para todo x ∈ X Seja y ∈ Y , como f e´ sobrejetiva, existe x ∈ X tal que f(x) = y. Assim f(g(y)) = y e f(h(y)) = f(h(f(x))) = f(x) = y. Como f e´ injetiva temos que g(y) = h(y). Logo g = h. Assim f(g(y)) = y para todo y ∈ Y e g(f(x)) = x para todo x ∈ X. Suponha que g′ e´ outra inversa a` direita. Enta˜o f(g′(y)) = y = f(g(y)) para todo y ∈ Y . Como f e´ injetiva, temos que g′(y) = g(y) para todo y ∈ Y . Portanto g′ = g e temos enta˜o a unicidade da func¸a˜o g. � DEFINIC¸A˜O 1.2. Uma func¸a˜o f : X −→ Y e´ invers´ıvel se existe uma func¸a˜o g : Y −→ X tal que f ◦ g = IY e g ◦ f = IX . Observe que a func¸a˜o g da definic¸a˜o e´ u´nica. Assim f : X −→ Y e´ invers´ıvel se existe uma func¸a˜o g : Y −→ X tal que g(f(x)) = x para todo x ∈ X e f(g(y)) = y para todo y ∈ Y . Vamos denominar esta func¸a˜o de inversa da func¸a˜o f e vamos denota´-la por f−1. Pelas proposic¸o˜es acima, f e´ invers´ıvel se, e somente se, ela e´ injetiva e sobrejetiva. Neste caso, a nomenclatura cla´ssica denomina a func¸a˜o f bijetiva. Isto e´, uma func¸a˜o e´ chamada bijetiva se ela e´ injetiva e sobrejetiva. Assim, uma func¸a˜o e´ invers´ıvel se, e somente se, ela e´ bijetiva. PROPOSIC¸A˜O 1.8. Sejam f : X −→ Y e g : Y −→ Z duas func¸o˜es. 1. Se f e g sa˜o injetivas enta˜o g ◦ f tambe´m e´ injetiva. 2. Se f e g sa˜o sobrejetivas enta˜o g ◦ f tambe´m e´ sobrejetiva. 3. Se f e g sa˜o bijetivas enta˜o g ◦ f tambe´m e´ bijetiva. 1.5. COMPOSIC¸A˜O DE FUNC¸O˜ES E FUNC¸O˜ES INVERSI´VEIS 23 DEMONSTRAC¸A˜O: 1. Suponha f e g injetivas. Queremos mostrar que g ◦ f tambe´m e´ in- jetiva. Para isto, sejam x1, x2 ∈ X e suponha que (g ◦ f)(x1) = (g ◦ f)(x2), isto e´, g(f(x1)) = g(f(x2)). Como g e´ injetiva temos que f(x1) = f(x2). Por sua vez, como f e´ injetiva, temos que x1 = x2. Portanto g ◦ f e´ injetiva. 2. Suponha f e g sobrejetivas. Queremos mostrar que g ◦ f tambe´m e´ sobrejetiva. Fixe z ∈ Z. Como g e´ sobrejetiva podemos garantir que existe y ∈ Y tal que g(y) = z. Por sua vez, como f e´ sobrejetiva, para este y ∈ Y existe x ∈ X tal que f(x) = y. Logo, (g ◦ f)(x) = g(f(x)) = g(y) = z, o que garante a sobrejetividade de g ◦ f . 3. Segue dos itens a) e b) acima. � PROPOSIC¸A˜O 1.9. Sejam f : X −→ Y e g : Y −→ Z duas func¸o˜es invers´ıveis. Enta˜o g ◦ f e´ invers´ıvel e (g ◦ f)−1 = f−1 ◦ g−1. DEMONSTRAC¸A˜O: Observe que o item 3) da proposic¸a˜o 1.8 garante que g ◦ f e´ invers´ıvel. Para mostrar que (g ◦ f)−1 = f−1 ◦ g−1 observe que, pela unicidade da inversa de uma func¸a˜o, basta verificar que (f−1 ◦ g−1) ◦ (g ◦ f) = IX e que (g ◦ f) ◦ (f−1 ◦ g−1) = IZ . Mas, usando a associatividade da composic¸a˜o de func¸o˜es e a proposic¸a˜o 1.5, temos (f−1 ◦ g−1) ◦ (g ◦ f) = f−1 ◦ ((g−1 ◦ g) ◦ f) = f−1 ◦ (IY ◦ f) = f−1 ◦ f = IX (g ◦ f) ◦ (f−1 ◦ g−1) = (g ◦ (f ◦ f−1)) ◦ g−1 = (g ◦ IY ) ◦ g−1 = g ◦ g−1 = IZ . O que demonstra o que quer´ıamos. � EXERCI´CIOS 1.3. 1. Sejam X, Y e Z treˆs conjuntos. (a) Dadas duas func¸o˜es g : Y −→ Z e h : X −→ Z, enta˜o existe pelo menos uma func¸a˜o f : X −→ Y tal que h = g ◦f se, e somente se, h(X) ⊂ g(Y ). Alem disso, f e´ u´nica, se e somente se, g e´ injetiva. 24 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA (b) Dadas duas func¸o˜es f : X −→ Y e h : X −→ Z, enta˜o existe pelo menos uma func¸a˜o g : Y −→ Z tal que h = g ◦ f se, e somente se, sempre que f(x) = f(x′) tem-se h(x) = h(x′), (isto e´, se os valores de f em dois pontos de X forem iguais, enta˜o os valores de h nestes pontos tambe´m sa˜o iguais). Ale´m disso, g e´ u´nica se, e somente se, f e´ sobrejetiva. 2. Sejam f : X −→ Y e g : Y −→ Z duas func¸o˜es. Mostre que (a) Se A ⊂ X enta˜o (g ◦ f)(A) = g(f(A)) (b) Se C ⊂ Z enta˜o (g ◦ f)−1(C) = f−1(g−1(C)). 1.6 Relac¸o˜es de Equivaleˆncia Alguns problemas fundamentais da Matema´tica tratam da classificac¸a˜o de objetos. Uma boa classificac¸a˜o permite compreender melhor o comporta- mento e a natureza de certos conjuntos. Em geral, o princ´ıpio desta te´cnica consiste em separar os elementos por propriedades ou caracter´ısticas comuns. Um dos exemplos mais ilustrativo desta natureza e´ o conjunto das frac¸o˜es que e´ o resultado de uma identificac¸a˜o de elementos que denominamos frac¸o˜es equivalentes. Teremos a oportunidade de voltar a este contexto quando es- tudarmos o conjunto dos nu´meros racionais. Este exemplo, fundamental na Matema´tica elementar, por si so´, ja´ justifica o estudo sistema´tico das relac¸o˜es de equivaleˆncia. Considere A um conjunto na˜o vazio. Uma relac¸a˜o de equivaleˆncia em A e´ uma relac¸a˜o ∼ entre cada par de elementos de A que satisfaz as seguintes propriedades: 1. Todo elemento de A esta´ relacionado com ele mesmo. Em s´ımbolos: a ∼ a para todo a ∈ A. 2. Se um elemento a ∈ A esta´ relacionado com um outro elemento b ∈ A, enta˜o este elemento b esta´ relacionado com a, isto e´, se a ∼ b enta˜o b ∼ a. 1.6. RELAC¸O˜ES DE EQUIVALEˆNCIA 25 3. Se um elemento a ∈ A esta´ relacionado com um elemento b ∈ A e, por sua vez, b esta´ relacionado com um terceiro elemento c ∈ A, enta˜o a esta´ relacionado com c, isto e´, se a ∼ b e b ∼ c enta˜o a ∼ c. As treˆs propriedades acima sa˜o denominadas respectivamente, propriedades reflexiva, sime´trica e transitiva da relac¸a˜o. EXEMPLO 1.2. Relac¸a˜o de igualdade O exemplo mais simples de relac¸a˜o de equivaleˆncia e´ a relac¸a˜o de igual- dade em um conjunto qualquer. E´ claro que todo elemento de um conjunto e´ igual a ele mesmo, portanto vale a reflexividade. Se um elemento x e´ igual a y enta˜o y e´ igual a x, isto e´, vale a simetria. E, finalmente se x e´ igual a y e y e´ igual a z enta˜o trivialmente x e´ igual a z, valendo assim, a transi- tividade. Naturalmente a igualdade e´ um exemplo trivial que na˜o justificaria uma definic¸a˜o sofisticada como e´ a definic¸a˜o de relac¸a˜o de equivaleˆncia. EXEMPLO 1.3. Relac¸a˜o de semelhanc¸a de triaˆngulos Considere o conjunto de todos os triaˆngulos num plano. Considere S a relac¸a˜o de semelhanc¸a de triaˆngulos. S e´ reflexiva, sime´trica e transitiva. Portanto a relac¸a˜o de semelhanc¸a e´ uma relac¸a˜o de equivaleˆncia no conjunto dos triaˆngulos do plano. EXEMPLO 1.4. Relac¸a˜o de paralelismo de retas A relac¸a˜o de paralelismo entre duas retas no plano (ou no espac¸o) tambe´m e´ reflexiva, sime´trica e transitiva e portanto uma relac¸a˜o de equivaleˆncia no conjunto das retas do plano (ou do espac¸o). Neste exemplo admitimos que retas coincidentes sa˜o paralelas. EXEMPLO 1.5. Relac¸a˜o de congrueˆncia de triaˆngulos A relac¸a˜o de congrueˆncia no conjunto dos triaˆngulos do plano e´ uma relac¸a˜o de equivaleˆncia. EXEMPLO 1.6. Relac¸a˜o de equivaleˆncia definida por uma func¸a˜o 26 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA Sejam X e Y conjuntos na˜o vazios quaisquer e f : X −→ Y uma func¸a˜o qualquer. Defina em X a seguinte relac¸a˜o: a ∼ b se, e somente se, f(a) = f(b). Esta relac¸a˜o e´ trivialmente reflexiva, sime´trica e transitiva, portanto e´ uma relac¸a˜o de equivaleˆncia em X. Dada uma relac¸a˜o de equivaleˆncia ∼ num conjunto A e dado um ele- mento a ∈ A, definimos a classe de equivaleˆncia de a como sendo o sub- conjunto de A formado por todos os elementos de A que esta˜o relacionados com a e o denotamos por Ca ou, simplesmente a¯, isto e´, na linguagem de conjuntos,Ca = a¯ = {x ∈ A | x ∼ a} Naturalmente a ∈ Ca, uma vez que a ∼ a, pela propriedade reflexiva. Assim Ca 6= φ para todo a ∈ A. PROPOSIC¸A˜O 1.10. Seja ∼ uma relac¸a˜o de equivaleˆncia num conjunto A. Sejam ainda a, b ∈ A e Ca e Cb respectivamente as classes de equivaleˆncia de a e b. Enta˜o Ca ∩ Cb = φ ou Ca = Cb DEMONSTRAC¸A˜O: De fato, se Ca ∩ Cb 6= φ enta˜o existe x ∈ Ca ∩ Cb. Assim, por definic¸a˜o de Ca e de Cb temos que x ∼ a e x ∼ b. Logo, pelas propriedades transitiva e sime´trica, a ∼ b. Assim, se y ∈ Ca enta˜o y ∼ a e como a ∼ b enta˜o y ∼ b. Portanto y ∈ Cb. Isto mostra que Ca ⊂ Cb. Um argumento ana´logo mostra que Cb ⊂ Ca, e da´ı conclu´ımos que Ca = Cb. � A proposic¸a˜o 1.10 afirma que as classes de equivaleˆncia de uma relac¸a˜o de equivaleˆncia, num conjunto qualquer, parte este conjunto em subconjuntos disjuntos. Este processo e´ o que chamamos de partic¸a˜o de um conjunto, como formalizamos a seguir. DEFINIC¸A˜O 1.3. Seja X um conjunto na˜o vazio. Uma partic¸a˜o P de X e´ uma famı´lia de subconjuntos de X satisfazendo: 1. Se A e B sa˜o dois subconjuntos distintos da famı´lia P enta˜o A∩B = φ. 2. X e´ a unia˜o dos subconjuntos da famı´lia P . 1.6. RELAC¸O˜ES DE EQUIVALEˆNCIA 27 Como salientamos acima, claramene as classes de equivaleˆncia de uma relac¸a˜o de equivaleˆncia num conjunto X determinam uma partic¸a˜o em X. Na verdade, os conceitos ”relac¸a˜o de equivaleˆncia”e ”partic¸a˜o”esta˜o liga- dos no sentido seguinte. Toda relac¸a˜o de equivaleˆncia R num conjunto X determina uma (u´nica) partic¸a˜o de X, a saber, PR = {C ⊂ X | C e´ classe de equivaleˆncia de R}. Reciprocamente, toda partic¸a˜o P determina um (u´nica) relac¸a˜o de equivaleˆncia RP em X, a saber, dados x, y ∈ X, dizemos que x RP y se, e somente se, existe C ∈ P tal que x, y ∈ C DEFINIC¸A˜O 1.4. O conjunto das classes de equivaleˆncia de uma relac¸a˜o ∼ em A e´ chamado conjunto quociente da relac¸a˜o ∼ . Denotaremos este conjunto por A∼ . Assim. Na linguagem dos conjuntos, A ∼ = {a¯ | a ∈ A} = {Ca | a ∈ A}. Podemos ver o conjunto quociente como o conjunto que identifica os ele- mentos de A que esta˜o numa mesma classe de equivaleˆncia como um u´nico elemento. Algumas vezes precisamos nos referir a um elemento do conjunto quo- ciente na˜o esquecendo que sua origem e´ um subconjunto de A. Elegemos enta˜o em A um conjunto que possa representar os elementos do conjunto quociente. Denominamos um tal subconjunto de conjunto de representantes do conjunto quociente. Para ser mais claro, um conjunto de representantes da relac¸a˜o de equivaleˆncia em A e´ qualquer subconjunto S de A satisfazendo: 1. Se a, b ∈ S enta˜o Ca ∩ Cb = φ, isto e´ a e b esta˜o em classes de equivaleˆncia distintas. 2. Dada uma classe de equivaleˆncia C, existe a ∈ S tal que a ∈ C. Assim, existe uma bijec¸a˜o entre o conjunto de representantes S e o con- junto quociente da relac¸a˜o de equivaleˆncia. 28 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA EXEMPLO 1.7. Considere a relac¸a˜o de paralelismo no conjunto das retas do plano. Fixe um ponto P no plano. A famı´lia das retas que passam por P formam um con- junto de representantes desta relac¸a˜o de equivaleˆncia. De fato, dada qualquer reta L do plano existe uma, e somente uma, reta por P paralela a L. No exemplo 1.6 acima vimos que toda func¸a˜o f : X −→ Y determina uma relac¸a˜o de equivaleˆncia no domı´nio X da func¸a˜o, a saber, x ∼ y se, e somente se, f(x) = f(y). Na verdade, vale uma espe´cie de rec´ıproca, vejamos. Seja X um conjunto na˜o vazio qualquer e ∼ uma relac¸a˜o de equivaleˆncia em X. Seja Y = X∼ o conjunto quociente da relac¸a˜o ∼ . Defina a func¸a˜o pi : X −→ Y = X∼ x 7−→ x¯ Claramente vemos que x1 ∼ x2 se, e somente se, pi(x1) = pi(x2), isto e´ x¯1 = x¯2. A func¸a˜o pi e´ chamada projec¸a˜o de X sobre o conjunto quociente X∼ . Natu- ralmente pi e´ sobrejetiva. TEOREMA 1.2. Dada uma func¸a˜o sobrejetiva f : X −→ Y , considere a relac¸a˜o de equivaleˆncia ∼ definida por f em X, a saber, x ∼ y se, e somente se f(x) = f(y). Considere tambe´m a projec¸a˜o pi : X −→ X∼ de X sobre o conjunto quociente de ∼ que associa a cada elemento de X a sua classe. Enta˜o existe uma u´nica bijec¸a˜o f¯ de X∼ em Y tal que f = pi ◦ f¯ . DEMONTRAC¸AˆO: A definic¸a˜o de f¯ e´ a definic¸a˜o natural, a saber, f¯(x¯) = f(x). Como x¯ = pi(x) temos imediatamente que f = pi ◦ f¯ . Precisamos verificar que a definic¸a˜o de f¯ na˜o depende da escolha do representante x¯ em sua classe. De fato, se u ∈ X e´ outro elemento que esta´ na classe de x, isto e´, x ∼ u enta˜o f(x) = f(u). Isto mostra que f¯(x¯) = f¯(u¯). A unicidade de f¯ e´ clara. � 1.7. UM POUCO DE LINGUAGEM LO´GICA 29 EXERCI´CIOS 1.4. 1. Determine todas as relac¸o˜es de equivaleˆncia no conjunto {1, 2, 3, 4}. Em cada caso encontre o conjunto quociente. 2. Seja U um conjunto na˜o vazio, A um subconjunto de U e ℘(U) o conjunto das partes de U . Defina em ℘(U) a relac¸a˜o X ∼ Y se, e somente se, X ∩ A = Y ∩ A. Mostre que ∼ e´ uma relac¸a˜o de equivaleˆncia. 3. Sejam f : X −→ Y e g : X −→ Z duas func¸o˜es sobrejetivas que determinam a mesma relac¸a˜o de equivaleˆncia em X. (a) Mostre que existe uma func¸a˜o h : Y −→ Z tal que h ◦ f = g. Mostre tambe´m que h e´ invers´ıvel. Fac¸a um diagrama para ilustrar esta situac¸a˜o. (b) Seja φ : Z −→ Y ume func¸a˜o tal que φ ◦ g = f . Mostre que φ ◦ h = IY e h ◦ φ = IZ . Conclua que φ = h−1. (c) Se f e g na˜o forem sobrejetivas, e´ poss´ıvel encontrar h de tal forma que h ◦ f = g? 4. Sejam X e Y dois conjuntos tais que em cada um deles esteja definida uma relac¸a˜o de equivaleˆncias. Suponhamos que exista uma func¸a˜o f : X −→ Y satisfazendo a condic¸a˜o: se x1 ∼ x2 em X enta˜o, necessariamente, f(x1) ∼ f(x2) em Y . Mostre que existe uma, e ape- nas uma, func¸a˜o g : X∼ −→ Y∼ tal que g ◦ piX = piY ◦ f , onde piX e piY sa˜o as projec¸o˜es canoˆnicas nos respectivos conjuntos quocientes. Fac¸a um diagrama para ilustrar esta situac¸a˜o. 1.7 Um pouco de linguagem lo´gica Esta secc¸a˜o tem como objetivo fazer uma breve introduc¸a˜o a` formalizac¸a˜o de alguns conceitos que surgem naturalmente na linguagem matema´tica. O me´todo utilizado para se estabelecer resultados va´lidos em Matema´tica e´ o me´todo dedutivo, portanto e´ necessa´rio que se tenha uma linguagem clara, coerente e uniforme. Quando se inicia este processo de aprendizagem nos deparamos com um certo dilema. Seria conveniente termos a linguagem lo´gica para estudar os 30 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA conceitos matema´ticos. Por outro lado, precisamos de alguns conceitos para tornar a linguagem palata´vel e, ate´ mesmo, para justificar a sua formali- dade. Nestas notas preferimos fazer esta secc¸a˜o apo´s a breve apresentac¸a˜o de conjuntos e func¸o˜es, na esperanc¸a que estes conceitos fornec¸am uma fonte natural de exemplos no contexto da Matema´tica. Na˜o e´ por acaso que a lo´gica e´ quase ta˜o antiga quanto a Matema´tica, tendo a sua origem no se´culo IV antes de Cristo com Aristo´teles. Ela teve dois grandes impulsos em dois momentos cruciais da Histo´ria da Matema´tica. O primeiro com Leibniz e Newton com a descoberta do Ca´lculo Infinitesimal. O segundo com a corrente formalista de Frege, Peano, Whitehead e Russel. A nossa linguagem usual muitas vezes e´ pouco precisa e causa ambigu¨ida- des que geram du´vidas, dependendo da pessoa que comunica e da pessoa que recebe a comunicac¸a˜o. A lo´gica matema´tica e´ uma tentativa de estabele- cer uma linguagem formal, livre de ambigu¨idades, para se estabelecer uma comunicac¸a˜o, oral e escrita, precisa no contexto matema´tico. O principal objeto na linguagem da lo´gica matema´tica e´ a proposic¸a˜o. Trata-se de um conceito primitivo, isto e´, sem definic¸a˜o. No entanto queremos atribuir-lhe as caracter´ısticas seguintes: uma proposic¸a˜odeve ser declarativa, sem ambigu¨idades e possuir um valor lo´gico verdadeiro ou falso. EXEMPLO 1.8. p1. Se A, B e C sa˜o conjuntos e A ⊂ B, B ⊂ C enta˜o A ⊂ C. p2. Todas as func¸o˜es sa˜o injetivas. p3. Se uma func¸a˜o e´ injetiva e sobrejetiva enta˜o ela e´ bijetiva. Nestes exemplos, as proposic¸o˜es p1 e p3 teˆm valor lo´gico verdadeiro e a proposic¸a˜o p2 tem valor lo´gico falso. Por simplicidade, diremos que se uma proposic¸a˜o p tiver valor lo´gico verdadeiro enta˜o ela e´ uma proposic¸a˜o verdadeira e utilizaremos v(p) = V para simbolizar isto. Por outro lado, se p tiver valor lo´gico falso enta˜o diremos que ela e´ uma proposic¸a˜o falsa e utilizaremos v(p) = F para simbolizar este fato. Assim, nos exemplos acima, temos: v(p1) = V, v(p2) = F e v(p3) = V Existem dois princ´ıpios ba´sicos na lo´gica matema´tica: 1. Princ´ıpio da na˜o contradic¸a˜o: Toda proposic¸a˜o tem um u´nico valor lo´gico 1.7. UM POUCO DE LINGUAGEM LO´GICA 31 2. Princ´ıpio do terceiro exclu´ıdo: Uma proposic¸a˜o tem valor lo´gico V ou F e na˜o ha´ outra alternativa. Para formular proposic¸o˜es podemos utilizar o que denominamos conec- tivos lo´gicos. Os principais conectivos lo´gicos sa˜o: ∧ , ∨ , ∼ , −→ e ←→ Quando combinamos proposic¸o˜es e conectivos lo´gicos apropriadamente pode- mos encontrar outras proposic¸o˜es. Uma proposic¸a˜o assim obtida e´ denom- inada proposic¸a˜o composta. Assim, os conectivos lo´gicos podem ser vistos como operac¸o˜es no conjunto das proposic¸o˜es. Para se determinar o valor lo´gico de uma proposic¸a˜o composta muitas vezes e´ conveniente utilizar uma forma organizada que denominaremos tabela- verdade. A seguir construiremos algumas tabelas-verdades utilizando conec- tivos lo´gicos. 1. Negac¸a˜o de uma proposic¸a˜o A negac¸a˜o de uma proposic¸a˜o p e´ a proposic¸a˜o ∼ p (na˜o p) que tem valor lo´gico definido pela tabela-verdade abaixo: p ∼ p V F F V Assim, a negac¸a˜o da proposic¸a˜o p e´ a proposic¸a˜o ∼ p cujo valor lo´gico e´ V se v(p) = F e e´ F se v(p) = V . Exemplo: p : x ∈ A ∼ p : x /∈ A 2. Conjunc¸a˜o de duas proposic¸o˜es: A conjunc¸a˜o das duas proposic¸o˜es p e q e´ a proposic¸a˜o p ∧ q (p e q) cujo valor lo´gico e´ definido pela seguinte tabela-verdade: 32 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA p q p ∧ q V V V V F F F V F F F F Assim, a conjunc¸a˜o p ∧ q das proposic¸o˜es p e q so´ e´ verdadeira se cada uma das proposic¸o˜es p e q for verdadeira. Podemos associar a conjunc¸a˜o de proposic¸o˜es a` intersecc¸a˜o de conjun- tos: sejam A e B conjuntos quaisquer, enta˜o, A ∩B = {x | x ∈ A e x ∈ B} EXEMPLO 1.9. p: A func¸a˜o f : X −→ Y e´ uma func¸a˜o injetiva. q: A func¸a˜o f : X −→ Y e´ uma func¸a˜o sobrejetiva. Enta˜o, p ∧ q: A func¸a˜o f : X −→ Y e´ uma func¸a˜o bijetiva. 3. Disjunc¸a˜o de duas proposic¸o˜es: A disjunc¸a˜o das duas proposic¸o˜es p e q e´ a proposic¸a˜o p ∨ q (p ou q) cujo valor lo´gico e´ definido pela seguinte tabela-verdade: p q p ∨ q V V V V F V F V V F F F Assim, a disjunc¸a˜o p ∨ q das proposic¸o˜es p e q so´ e´ falsa se cada uma das proposic¸o˜es p e q for falsa. Podemos associar a disjunc¸a˜o de proposic¸o˜es a` unia˜o de conjuntos: sejam A e B conjuntos quaisquer, enta˜o, A ∪B = {x | x ∈ A ou x ∈ B} 1.7. UM POUCO DE LINGUAGEM LO´GICA 33 EXEMPLO 1.10. p : x ∈ A ; q : x ∈ B. Se v(p) = F e v(q) = V enta˜o v(p ∨ q) = V EXEMPLO 1.11. Dadas as proposic¸o˜es p e q, a tabela verdade da proposic¸a˜o p ∨ ( ∼ q) e´: p q ∼ q p ∨ ( ∼ q) V V F V V F V V F V F F F F V V 4. Condicional de duas proposic¸o˜es: A condicional das duas proposic¸o˜es p e q e´ a proposic¸a˜o p −→ q (p implica q ou se p enta˜o q) cujo valor lo´gico e´ definido pela seguinte tabela-verdade: p q p −→ q V V V V F F F V V F F V Assim, a proposic¸a˜o p −→ q so´ e´ falsa se p for verdadeira e q for falsa. A tabela verdade da negac¸a˜o da proposic¸a˜o p −→ q e´: p q p −→ q ∼ (p −→ q) V V V F V F F V F V V F F F V F 34 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA EXEMPLO 1.12. Dadas tres proposic¸o˜es p, q e r, a proposic¸a˜o (p∧q) −→ r tem a seguinte tabela-verdade p q p ∧ q r p ∧ q −→ r V V V V V V F F V V F V F V V F F F V V V V V F F V F F F V F V F F V F F F F V Assim, a proposic¸a˜o (p ∧ q) −→ r (se p ∧ q enta˜o r) so´ e´ falsa quando p e q sa˜o verdadeiras e r e´ falsa. 5. Bicondicional de duas proposic¸o˜es: A bicondicional das duas proposic¸o˜es p e q e´ a proposic¸a˜o p←→ q (p se, e somente se q) cujo valor lo´gico e´ definido pela seguinte tabela-verdade: p q p←→ q V V V V F F F V F F F V Assim, a proposic¸a˜o p←→ q (p se, e somente se q) e´ verdadeira somente quando ambas as proposic¸o˜es p e q forem verdadeiras ou ambas forem falsas. Tautologias e Contradic¸o˜es Uma proposic¸a˜o composta e´ uma tautologia quando o se valor lo´gico for sempre verdadeiro, independentemente dos valores lo´gicos de suas proposic¸o˜es componentes. 1.7. UM POUCO DE LINGUAGEM LO´GICA 35 EXEMPLO 1.13. p ∨ ( ∼ p) e´ uma tautologia (Verifique!) Uma proposic¸a˜o composta e´ uma contradic¸a˜o quando o se valor lo´gico for sempre falso, independentemente dos valores lo´gicos de suas proposic¸o˜es componentes. EXEMPLO 1.14. p ∧ ( ∼ p) e´ uma contradic¸a˜o (Verifique!) Dadas as proposic¸o˜es compostas p e q, dizemos que ha´ uma implicac¸a˜o lo´gica entre p e q ou que p implica logicamente q quando a proposic¸a˜o condi- cional p −→ q e´ uma tautologia. Neste caso, usaremos a notac¸a˜o p =⇒ q. Cuidado: Os s´ımbolos −→ e =⇒ que utilizamos aqui entre proposic¸o˜es teˆm significados diferentes. O s´ımbolo −→ e´ um conectivo que utilizado entre duas proposic¸o˜es p e q da´ origem a uma nova proposic¸a˜o p −→ q cujo valor lo´gico pode ser tanto verdadeiro quanto falso. O s´ımbolo =⇒ e´ um conectivo que utilizado entre duas proposic¸o˜es p e q indica que a proposic¸a˜o p −→ q tem valor lo´gico verdadeiro, ou seja, e´ uma tautologia. EXEMPLO 1.15. p ∧ q −→ p e´ uma tautologia. Portanto p ∧ q =⇒ p. De fato, a tabela verdade de p ∧ q −→ p e´ a seguinte: p q p ∧ q p ∧ q −→ p V V V V V F F V F V F V F F F V Dadas as proposic¸o˜es compostas p e q, dizemos que ha´ uma equivaleˆncia lo´gica entre p e q ou que p e´ logicamente equivalente a q se v(p) = v(q). Neste caso, utilizamos a notac¸a˜o p⇐⇒ q. 36 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA EXEMPLO 1.16. (p −→ q) ∧ (q −→ p)⇐⇒ (p←→ q) Observando a tabela-verdade p q p −→ q q −→ p (p −→ q) ∧ (q −→ p) p←→ q V V V V V V V F F V F F F V V F F F F F V V V V Vemos que a proposic¸a˜o acima e´ uma equivaleˆncia lo´gica. Cuidado: Novamente observamos que os s´ımbolos ←→ e ⇐⇒ que uti- lizamos aqui teˆm significados diferentes: p⇐⇒ q se a proposic¸a˜o p←→ q e´ uma tautologia, isto e´, tem valor lo´gico sempre verdadeiro. EXEMPLO 1.17. (p ∧ q)⇐⇒ [ ∼ ( ∼ p ∨ ∼ q)] Verifique isto construindo a tabela-verdade. Negac¸a˜o de proposic¸o˜es compostas Considere as proposic¸o˜es p e q 1. As proposic¸o˜es p e ( ∼ ( ∼ p)) sa˜o logicamente equivalentes, isto e´ p⇐⇒ ( ∼ ( ∼ p)). De fato, observe a tabela-verdade seguinte p ∼ p ( ∼ ( ∼ p)) V F V F V F Vemos que a proposic¸a˜o p ←→ ( ∼ ( ∼ p)) e´ uma equivaleˆncia lo´gica. Assim, a negac¸a˜o da negac¸a˜o e´ logicamente equivalente a` pro´pria proposic¸a˜o. 1.7. UM POUCO DE LINGUAGEM LO´GICA 37 2. As proposic¸o˜es ∼ (p∧q) e ( ∼ p) ∨ ( ∼ q) sa˜o logicamente equivalentes, isto e´, ∼ (p ∧ q) ⇐⇒ ( ∼ p) ∨ ( ∼ q) De fato, observe a tabela verdade seguinte p q p ∧ q ∼ (p ∧ q) ∼ p ∼ q ( ∼ p) ∨ ( ∼ q) V V V F F F F V F F V F V V F V F V V F V F F F V V V V Vemos que a proposiac¸a˜o acima e´ uma equivaleˆncia lo´gica. 3. As proposic¸o˜es ∼ (p∨q) e (∼ p)∧ ( ∼ q) sa˜o logicamente equivalentes, isto e´, ∼ (p ∨ q) ⇐⇒ (∼ p) ∧ ( ∼q) (Verifique isto!) 4. As proposic¸o˜es ( ∼ p −→ q) e p∧ ( ∼ q) sa˜o logicamente equivalentes, isto e´, ( ∼ p −→ q) ⇐⇒ p ∧ ( ∼ q) (Verifique isto!) Proposic¸o˜es associadas a` proposic¸a˜o condicional Considere a proposic¸a˜o condicional p −→ q. Podemos associar as seguintes proposic¸o˜es: 1. A proposic¸a˜o rec´ıproca: q −→ p 2. A proposic¸a˜o contrapositiva: ( ∼ p) −→ ( ∼ q) 3. A proposic¸a˜o inversa: ( ∼ p) −→ ( ∼ q) Observe que a proposic¸a˜o contrapositiva e´ logicamente equivalente a` proposic¸a˜o original, isto e´, (p −→ q) ⇐⇒ ( ∼ q) −→ ( ∼ p) De fato, basta observar a seguinte tabela verdade: 38 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA p q p −→ q ∼ q ∼ p ( ∼ q) −→ ( ∼ p) V V V F F V V F F V F F F V V F V V F F V V V V EXERCI´CIOS 1.5. 1. Dadas as proposic¸o˜es p e q, construir a tabela verdade das seguintes proposic¸o˜es: (a) p ∨ ( ∼ p) (b) p ∧ ( ∼ p) (c) p ∨ ( ∼ q) (d) p ∧ ( ∼ q) (e) ( ∼ p) ∨ ( ∼ q) (f) ( ∼ p) ∧ ( ∼ q) No quadro seguinte, p, q e r sa˜o proposic¸o˜es quaisqeur τ e´ uma tautologia e γ e´ uma contradic¸a˜o 1.7. UM POUCO DE LINGUAGEM LO´GICA 39 Quadro Resumo Dupla Negac¸a˜o ∼ ( ∼ p) ⇐⇒ p Leis Idenpotentes { p ∧ p ⇐⇒ p p ∨ p ⇐⇒ p Leis Comutativas { p ∧ q ⇐⇒ q ∧ p p ∨ q ⇐⇒ q ∧ p Leis Associativas { p ∧ (q ∧ r) ⇐⇒ (p ∧ q) ∧ r p ∨ (q ∨ r) ⇐⇒ (p ∨ q) ∨ r Leis Distributivas { p ∧ (q ∨ r) ⇐⇒ (p ∧ q) ∨ (p ∧ r) p ∨ (q ∧ r) ⇐⇒ (p ∨ q) ∧ (p ∨ r) Leis de De Morgan { ∼ (p ∨ q) ⇐⇒ ( ∼ p) ∧ ( ∼ q) ∼ (p ∧ q) ⇐⇒ ( ∼ p) ∨ ( ∼ q) Leis de Identidade p ∨ γ ⇐⇒ p p ∧ γ ⇐⇒ γ p ∧ τ ⇐⇒ p p ∨ τ ⇐⇒ τ Leis Complementares p ∨ ( ∼ p) ⇐⇒ τ p ∧ ( ∼ p) ⇐⇒ γ ( ∼ τ) ⇐⇒ γ ( ∼ γ) ⇐⇒ τ Condicional p −→ q ⇐⇒ ∼ (p∧ ∼ q)⇐⇒ ( ∼ p) ∨ q p −→ q ⇐⇒ ( ∼ q) −→ ( ∼ p) ∼ (p −→ q)⇐⇒ (p∧ ∼ q) Bicondicional { p←→ q ⇐⇒ (p −→ q) ∧ (q −→ p) ∼ (p←→ q) ⇐⇒ p←→ ( ∼ q)⇐⇒ ( ∼ p) −→ q) 40 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA O que e´ um teorema? Na linguagem da Matema´tica utilizamos a lo´gica formal para comunicar resultados. Para se identificar os objetos com os quais vamos lidar, utilizamos as definic¸o˜es. Uma definic¸a˜o relaciona o objeto a ser definido com outros ja´ conhecidos. Desta forma, podemos perceber que alguns objetos iniciais na˜o podem ser definidos. Estes sa˜o denominados objetos primitivos. Por exemplo: o ponto, a reta, o plano sa˜o objetos primitivos na Geometria Euclidiana. Uma proposic¸a˜o tautolo´gica envolvendo os objetos primitivos que na˜o decorre de outras proposic¸o˜es sa˜o denominadas axiomas. Poder´ıamos dizer que um axioma e´ uma tautologia primitiva aceita sem questionamento. Um teorema e´ uma implicac¸a˜o lo´gica onde a primeira proposic¸a˜o desta implicac¸a˜o e´ denominada hipo´tese, e a segunda e´ denominada tese. Em outras palavras, um teorema e´ uma proposic¸a˜o da forma h =⇒ t onde h e´ a hipo´tese e t e´ a tese. Lembrando-se que dizer que h =⇒ t e´ o mesmo que dizer que a proposic¸a˜o h −→ t e´ uma tautologia, isto e´, na˜o pode ocorrer que o valor lo´gico de h seja verdadeiro e o valor lo´gico de t seja falso. Isto significa que se v(h) = V enta˜o v(t) = V . Assim, para se verificar a validade de um teorema, isto e´, demonstra´-lo, e´ preciso garantir a veracidade da tese sempre que a hipo´tese seja verdadeira. Isto pode ser feito utilizando-se uma das treˆs alternativas seguintes. 1. Demonstrac¸a˜o direta: Supor a hipo´tese verdadeira e concluir que a tese e´ verdadeira. 2. Demonstrac¸a˜o por absurdo: Supor a hipo´tese verdadeira, a tese falsa e concluir uma contradic¸a˜o. 3. Demonstrac¸a˜o indireta: Supor a tese falsa e concluir que a hipo´tese e´ falsa. De acordo com cada situac¸a˜o, uma destas treˆs alternativas e´ mais conve- niente ou menos conveniente. Vamos exemplificar isto com o teorema seguinte: 1.7. UM POUCO DE LINGUAGEM LO´GICA 41 TEOREMA 1.3. Sejam A, B e C treˆs conjuntos . Se A ⊂ B e B ⊂ C enta˜o A ⊂ C. A hipo´tese do teorema acima e´ composta por duas proposic¸o˜es p1 e p2, sendo h = p1 ∧ p2 e p1 : A ⊂ B e p2 : B ⊂ C. A tese e´ a proposic¸a˜o t : A ⊂ C. 1. Demonstrac¸a˜o direta Se h = p1 ∧ p2 e´ verdadeira enta˜o p1 e´ verdadeira e p2 e´ verdadeira. Isto e´, estamos supondo que A ⊂ B e B ⊂ C. Assim, se x ∈ A enta˜o x ∈ B e, como B ⊂ C, temos que x ∈ C. Portanto, para todo x ∈ A necessariamente x ∈ C. Logo A ⊂ C, o que garante que t e´ verdadeira. 2. Demonstrac¸a˜o por absurdo Vamos supor t falsa, isto e´, A na˜o esta´ contido em C. Neste caso, necessariamente existe x ∈ A tal que x /∈ C. Mas vamos tambe´m supor h verdadeira, isto e´, A ⊂ B e B ⊂ C. Logo se x ∈ A enta˜o x ∈ B e, portanto x ∈ C. Conclu´ımos que x ∈ C e que x /∈ C. Assim, se p e´ a proposic¸a˜o x ∈ C enta˜o, a proposic¸a˜o p∧ ( ∼; p) e´ uma contradic¸a˜o. 3. Demonstrac¸a˜o indireta Vamos supor t falsa e concluir que h e´ falsa. Ora, se t e´ falsa enta˜o A na˜o esta´ contido em C. Logo, existe x ∈ A tal que x /∈ C. Queremos concluir que h = p1∧ p2 e´ falsa, isto e´, queremos concluir que p1 e´ falsa ou p2 e´ falsa. Caso p1 seja verdadeira enta˜o A ⊂ B e, portanto, x ∈ B. Assim, x ∈ B e x /∈ C, o que garante que B na˜o esta´ contido em B, isto e´, p2 e´ falsa. Caso p2 seja verdadeira, isto e´, B ⊂ C enta˜o, x /∈ B. Logo x ∈ A e x /∈ B, o que garante que A na˜o esta´ contido em B, isto e´, p1 e´ falsa. Em qualquer caso,p1 e´ falsa ou p2 e´ falsa. Logo h = p1 ∧ p2 e´ falsa. Observe que as treˆs alternativas acima teˆm graus de dificuldades difer- entes. Isto frequ¨entemente ocorre. Precisamos estar atentos para escolher a melhor alternativa. 42 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA Argumento Um argumento e´ uma proposic¸a˜o condicional da forma p1 ∧ p2 ∧ · · · ∧ pn −→ c onde p1, p2, . . . , pn e c sa˜o proposic¸o˜es. Neste caso, as proposic¸o˜es p1, p2, . . . , pn sa˜o denominadas premissas e c e´ denominada conclusa˜o. Dizemos que o ar- gumento e´ va´lido quando p1 ∧ p2 ∧ · · · ∧ pn implica logicamente c, isto e´, p1 ∧ p2 ∧ · · · ∧ pn =⇒ c No caso contra´rio dizemos que o argumento e´ na˜o va´lido, isto e´ c e´ verdadeira mas alguma das proposic¸o˜es pi e´ falsa. Um argumento na˜o va´lido tambe´m e´ denominado sofisma ou fala´cia. Claramente vemos que um argumento p1 ∧ p2 ∧ · · · ∧ pn −→ c e´ va´lido se, e somente se, ele e´ uma tautologia. Sentenc¸a Aberta Uma sentenc¸a aberta e´ uma proposic¸a˜o que envolve um objeto na˜o expl´ıcito. Ela pode ser verdadeira ou falsa dependendo da determinac¸a˜o do objeto. EXEMPLO 1.18. Considere a proposic¸a˜o p : x ∈ {1, 2, 3, 4}. Ora, na˜o podemos afirmar que p e´ verdadeira nem que e´ falsa, depende da determinac¸a˜o do objeto x. Por exemplo, se x = 3 enta˜o p e´ verdadeira e se x = 5 enta˜o p e´ falsa. Neste caso, x e´ denominado varia´vel. 1.7. UM POUCO DE LINGUAGEM LO´GICA 43 Quantificadores: Os quantificadores sa˜o expresso˜es que eventualmente ocorrem numa proposic¸a˜o ligadas a` ide´ia de quantidade. Ha´ dois tipos de quantificadores: 1. Quantificador universal : Observe a seguinte proposic¸a˜o: p : toda func¸a˜o e´ injetiva A palavra toda e´ um quantificador chamado universal. Outras formas do quantificador universal: para todo, qualquer que seja ou qualquer. Utilizaremos o s´ımbolo ∀ para significar o quantificador universal. Assim no exemplo acima poder´ıamos escrever: ∀ f ; f e´ injetiva. 2. Quantificador existencial : Observe a proposic¸a˜o seguinte: q : existem func¸o˜es sobrejetivas. A palavra existem e´ um quantificador existencial. Outras formas do quantificador existencial sa˜o: existe algum ou existe pelo menos um. Utilizaremos o s´ımbolo ∃ para significar o quantificador existencial. Assim no exemplo anterior poder´ıamos escrever: ∃ f tal que f e´ sobrejetiva. Negac¸a˜o de proposic¸o˜es envolvendo quantificadores. Vamos novamente considerara proposic¸a˜o do exemplo de quantificadores universais: p : toda func¸a˜o e´ injetiva. 44 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA O que seria a negac¸a˜o de p? Claramente vemos que sua negac¸a˜o e´: ∼ p : existe uma func¸a˜o que na˜o e´ injetiva. No exemplo do quantificador existencial: q : existem func¸o˜es sobrejetivas. A sua negac¸a˜o seria: ∼ q : todas as func¸o˜es na˜o sa˜o sobrejetivas. Os exemplos acima evidenciam que para expressar a negac¸a˜o de uma proposic¸a˜o envolvendo um quantificador universal precisamos utilizar um quantificaor existencial e vice versa, para expressar uma proposic¸a˜o envol- vendo uma quantificador existencial precisamos utilizar um quantificador uni- versal. Na verdade estes exemplos sa˜o casos especiais da situac¸a˜o mais geral seguinte: Seja p(x) uma sentenc¸a aberta num conjunto U qualquer. Considere as proposic¸o˜es: 1. q1 : ∀ x ∈ U ; p(x) 2. q2 : ∃ x ∈ U ; ∼ p(x) Enta˜o, q2 e´ logicamente equivalente a ∼ q1, isto e´, q2 ⇐⇒ ( ∼ q1), e q1 e´ logicamente equivalente a ∼ q2, isto e´, q1 ⇐⇒ ( ∼ q2). Contra-exemplo: Para verificar que uma proposic¸a˜o da forma ( q : ∀ x ∈ U ; p(x)) e´ falsa, basta mostrar que a sua negac¸a˜o ( ∼ q : ∃ x ∈ U ; ∼ p(x)) e´ verdadeira, isto e´, existe pelo menos um elemento u ∈ U tal que ∼ p(u) e´ verdadeira, isto e´, p(u) e´ falsa. Um tal elemento u e´ chamado contra-exemplo da proposic¸a˜o q. 1.7. UM POUCO DE LINGUAGEM LO´GICA 45 EXEMPLO 1.19. Considere a proposic¸a˜o (q : ∀ func¸a˜o f ; f e´ injetiva). A sentenc¸a aberta utilizada aqui e´: p(f) : f e´ injetiva. A func¸a˜o f : {1, 2} −→ {2} definida por f(1) = f(2) = 2 e´ portanto um contra-exemplo para a proposic¸a˜o q. EXERCI´CIOS 1.6. 1. Construir a tabela-verdade para as seguintes proposic¸o˜es a) p ∧ ( ∼ p) d) ( ∼ p) ∨ ( ∼ q) g) ∼ (p ∨ q) b) p ∨ ( ∼ p) e) p ∧ ( ∼ q) h) ∼ (p ∧ q) c) (∼ p) ∧ (∼ q) f) (∼ p) ∧ q 2. Construir a tabela-verdade para as seguintes proposic¸o˜es a) ∼ (p −→ ( ∼ q)) b) (p ∧ q) −→ (p ∨ q) c) ( ∼ p) −→ (q −→ p) d) (p −→ q) −→ (p ∧ q) e) (( ∼ p) ∧ r) −→ (q ∨ r) f) ((p −→ q) ∧ (q −→ r)) −→ (p −→ r) 3. Se v(p −→ q) = F que valor lo´gico pode ter a) (p −→ q) ∧ r ? e b) (q ∨ r) −→ (p −→ r) ? 4. Construir a tabela-verdade para as seguintes proposic¸o˜es a) (p ∧ (q ∨ r)) −→ (p −→ (r ∨ q)) b) (q −→ r)←→ ( ∼ q) ∨ r c) ( ∼ p)∨ ∼ (r ∧ s) d) ∼ (q ←→ (( ∼ p) ∧ s)) e) (p←→ q) ∨ (q ←→ ( ∼ p)) f) (p←→ q) ∧ (( ∼ r) −→ s) g) ∼ (( ∼ q) ∧ (p ∧ ( ∼ s))) h) ( ∼ p) ∨ (q ∧ (r −→ ( ∼ s))) i) (( ∼ p) ∨ r) −→ (q −→ s) j) ∼ (( ∼ p) ∨ (q ∧ s)) −→ (r −→ ( ∼ s)) k) ( ∼ q) ∧ ((( ∼ r) ∨ s)←→ (p −→ ( ∼ q))) l) ∼ (p −→ (q −→ r)) −→ s 46 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA 5. Quais das proposic¸o˜es abaixo sa˜o tautologias? Quais sa˜o contradic¸o˜es? a) ((p ∨ q) −→ ( ∼ p)) −→ (q ∧ p) b) (p←→ ( ∼ q)) ∨ r c) ( ∼ r) ∨ (p←→ q) d) ((p −→ q) −→ r)←→ (p −→ (q −→ r)) e) ( ∼ ( ∼ ( ∼ (p ∧ ( ∼ q))))) ∧ (( ∼ p) ∧ ( ∼ r)) f) ((p ∨ q)←→ (q ∧ p)) −→ ((r ∧ p) ∨ q) g) (p −→ (q −→ r)) −→ ((p ∧ (q ∧ r)) −→ (p ∧ (q ∨ r))) h) ( ∼ p)←→ (q ∨ (( ∼ r) −→ s)) i) ( ∼ ( ∼ (p ∧ q)))←→ (( ∼ p) ∨ ( ∼ q)) j) (p −→ q) −→ ((q −→ r) −→ (p −→ r)) 6. Mostre que a) ∼ (p ∧ q ∧ r)⇐⇒ (( ∼ p) ∨ ( ∼ q) ∨ ( ∼ r)) b) ∼ (p ∨ q ∨ r)⇐⇒ (( ∼ p) ∧ ( ∼ q) ∧ ( ∼ r)) c) ∼ (p←→ q)⇐⇒ (p←→ ( ∼ q))⇐⇒ (( ∼ p)←→ q) d) ((p←→ q)←→ r)⇐⇒ (p←→ (q ←→ r)) e) (p ∧ (p ∨ q))⇐⇒ p f) (p ∧ (p ∧ q))⇐⇒ p 1.8. APEˆNDICE DO CAPI´TULO I 47 1.8 Apeˆndice do Cap´ıtulo I Notas Bibliogra´ficas Apresentamos neste apeˆndice uma curta biografia dos principais pen- sadores que contribu´ıram para o desenvolvimento da lo´gica matema´tica. Es- paramos que isto motive o leitor a um estudo mais aprofundado sobre os seus pensamentos. A fonte utilizada para estas biografias foi Wikipe´dia, a enciclope´dia livre - na Internet Georg Cantor Georg Ferdinand Ludwig Philipp Cantor (Sa˜o Petersburgo, 3 de Marc¸o de 1845 - Halle, Alemanha, 6 de Janeiro de 1918) foi um matema´tico alema˜o de origem russa conhecido por ter criado a moderna Teoria dos con- juntos. Foi a partir desta teoria que chegou ao conceito de nu´mero trans- finito, incluindo as classes nume´ricas dos cardinais e ordinais, estabelecendo a diferenc¸a entre estes dois conceitos que colocam novos problemas quando se referem a conjuntos infinitos. Nasceu em Sa˜o Petersburgo (Ru´ssia), filho de um comerciante dinamar- queˆs, Geor Waldemar Cantor, e de uma mu´sica russa, Maria Anna Bo¨hm. Em 1856 a sua famı´lia mudou-se para a Alemanha, continuando a´ı os seus estudos. Estudou na Escola Polite´cnica de Zurique. Doutorou-se na Uni- versidade de Berlim em 1867. Teve como professores Ernst Kummer, Karl Weierstrass e Leopold Kronecker. Em 1872 foi docente na Universidade alema˜ de Halle, onde obte´m o t´ıtulo de professor em 1879. Toda a sua vida ira´ tentar em va˜o deixar Halle, tendo acabado por pensar que era v´ıtima de uma conspirac¸a˜o. Cantor provou que os grupos infinitos na˜o teˆm todos a mesma poteˆncia (poteˆncia significando ”tamanho”). Fez a distinc¸a˜o entre grupos numera´veis (ou enumera´veis) (em ingleˆs chamam-se countable - que se podem contar) e grupos cont´ınuos (em ingleˆs uncountable - que na˜o se podem contar). 48 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA Provou que o conjunto dos nu´meros racionais Q e´ (e)numera´vel, enquanto que o conjunto dos nu´meros reais IR e´ cont´ınuo (logo, maior que o ante- rior). Na demonstrac¸a˜o foi utilizado o ce´lebre argumento da diagonal de Cantor ou me´todo diagonal. Nos u´ltimos anos de vida tentou provar, sem o conseguir, a ”hipo´tese do cont´ınuo”, ou seja, que na˜o existem conjuntos de poteˆncia interme´dia entre os numera´veis e os cont´ınuos - em 1963, Paul Cohen demonstrou a indemonstrabilidade desta hipo´tese. Em 1897, Can- tor descobriu va´rios paradoxos suscitados pela Teoria dos conjuntos. Foi ele que utilizou pela primeira vez o s´ımbolo IR para representar o conjunto dos nu´meros reais. Durante a u´ltima metade da sua vida sofreu repetidamente de ataques de depressa˜o, o que comprometeu a sua capacidade de trabalho e o forc¸ou a ficar hospitalizado va´rias vezes. Provavelmente ser-lhe-ia diagnosticado, hoje em dia, um transtorno bipolar - vulgo man´ıaco-depressivo. A descoberta do Paradoxo de Russell conduziu-o a um esgotamento nervoso do qual na˜o chegou a se recuperar. Comec¸ou, enta˜o, a se interessar por literatura e re- ligia˜o. Desenvolveu o seu conceito de Infinito Absoluto, que identificava a Deus. Ficou na penu´ria durante a Primeira Guerra Mundial, morrendo num hospital psiquia´trico em Halle. Os conceitos matema´ticos inovadores propostos por Cantor enfrentaram uma resisteˆncia significativa por parte da comunidade matema´tica da e´poca. Os matema´ticos modernos, por seu lado, aceitam plenamente o trabalho de- senvolvido por Cantor na sua Teoria dos conjuntos, reconhecendo-a como uma mudanc¸a de paradigma da maior importaˆncia. Nas palavras de David Hilbert: ”Ningue´m nos podera´ expulsar do Para´ıso que Cantor criou.” Dirichlet Johann Peter Gustav Lejeune Dirichlet (13 de fevereiro de 1805, Du¨ren - 5 de maio de 1859, Go¨ttingen) foi um matema´tico alema˜o a quem se atribui a moderna definic¸a˜o formal de func¸a˜o. 1.8. APEˆNDICE DO CAPI´TULO I 49 Sua famı´lia era origina´ria da cidade de Richelet, na Be´lgica, origem de seu apelido ”Lejeune Dirichlet”(”o jovem de Richelet”). Dirichlet nesceu em Du¨ren, onde seu pai era chefe dos Correios. Foi educado na Alemanha e na Franc¸a, onde foi aluno dos mais renomados matema´ticos da e´poca. Sua primeira publicac¸a˜o foi sobre o U´ltimo teorema de Fermat, a famosa conjectura (hoje provada) que afirma que para n > 2, a equac¸a˜o xn+ yn = zn na˜o possui soluc¸o˜es inteiras, com excec¸a˜o da soluc¸a˜o trivial em que x, y ou z e´ zero, para a qual concebeu uma prova parcial para n = 5, que foi completadapor Adrien-Marie Legendre, que foi um dos avaliadores. Dirichlet tambe´m completou sua pro´pria demonstrac¸a˜o quase ao mesmo tempo; mais tarde, ele tambe´m forneceu uma prova completa para o caso de n = 14. Casou-se com Rebecca Mendelssohn, origina´ria de uma distinta famı´lia, a neta do filo´sofo Moses Mendelssohn e irma˜ do compositor Felix Mendelssohn. Ferdinand Eisenstein, Leopold Kronecker e Rudolf Lipschitz foram seus alunos. Apo´s sua morte, os escritos de Dirichlet e outros resultados em teoria dos nu´meros foram coletados, editados e publicados por seu amigo e colega matema´tico Richard Dedekind sob o t´ıtulo Vorlesungen u¨ber Zahlentheorie (Confereˆncias sobre Teoria de Nu´meros). Aristo´teles Aristo´teles nasceu em Estagira, na Calc´ıdica. Apesar de ser na Macedoˆ- nia, o grego era o idioma falado. Era filho de Nicoˆmaco, amigo e me´dico pessoal do rei macedoˆnio Amintas II, pai de Filipe II da Macedoˆnia e avoˆ de Alexandre, o Grande. E´ prova´vel que o interesse de Aristo´teles por biologia e fisiologia decorra da atividade me´dica exercida pelo pai. Com cerca de 16 ou 17 anos partiu para Atenas, maior centro intelectual e art´ıstico da Gre´cia. Como muitos outros jovens de seu tempo, foi para la´ prosseguir os estudos. Duas grandes instituic¸o˜es disputavam a prefereˆncia dos jovens: a escola de Iso´crates, que visava preparar o aluno para a vida 50 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA pol´ıtica, e Plata˜o e sua Academia, com prefereˆncia a` cieˆncia (episteme) como fundamento da realidade. Apesar do aviso de quem na˜o conhecesse Geome- tria ali na˜o deveria entrar, Aristo´teles decidiu-se pela Academia platoˆnica e nela permaneceu 20 anos, ate´ 347 a.C., ano que morreu Plata˜o. Com a morte de grande mestre e com a escolha do sobrinho de Plata˜o, Es- peusipo, para a chefia da Academia, Aristo´teles partiu para Assos com alguns ex-alunos. Dois fatos parecem se relacionar com esse episo´dio: Espeusipo representava uma tendeˆncia que desagradava imensamente Aristo´teles, isto e´, a matematizac¸a˜o da filosofia; e Aristo´teles ter-se sentido preterido (ou re- jeitado), ja´ que se julgava o mais apto para assumir a direc¸a˜o da Academia. Em Assos, Aristo´teles fundou um pequeno c´ırculo filoso´fico com a ajuda de He´rmias, tirano local e eventual ouvinte de Plata˜o. La´ ficou por treˆs anos e casou-se com P´ıtias, sobrinha de He´rmias. Assassinado He´rmias, Aristo´teles partiu para Mitilene, na ilha de Lesbos, onde realizou a maior parte de suas famosas investigac¸o˜es biolo´gicas. No ano de 343 a.C. chamado por Filipe II, tornou-se preceptor de Alexandre, func¸a˜o que exerceu ate´ 336 a.C., quando Alexandre subiu ao trono. Neste mesmo ano, de volta a Atenas, fundou o �Lykeion�, origem da palavra Liceu cujos alunos ficaram conhecidos como peripate´ticos (os que passeiam), nome decorrente do ha´bito de Aristo´teles de ensinar ao ar livre, muitas vezes sob as a´rvores que cercavam o Liceu. Ao contra´rio da Academia de Plata˜o, o Liceu privilegiava as cieˆncias naturais. Alexandre mesmo enviava ao mestre exemplares da fauna e flora das regio˜es conquistadas. Seu trabalho cobria os campos do conhecimento cla´ssico de enta˜o: filosofia, metaf´ısica, lo´gica, e´tica, pol´ıtica, reto´rica, poesia, biologia, zoologia, medicina e na˜o so´ estabeleceu as bases de tais disciplinas quanto sua metodologia cient´ıfica. Aristo´teles dirigiu a escola ate´ 323 a.C., pouco depois da morte de Alexan- dre. Os sentimentos antimacedoˆnios dos atenienses voltaram-se contra ele que, sentindo-se ameac¸ado, deixou Atenas afirmando na˜o permitir que a cidade cometesse um segundo crime contra a filosofia (alusa˜o ao julgamento de So´crates). Deixou a escola aos cuidados de seu principal disc´ıpulo, Te- ofrasto (371 a.C. - 287 a.C.) e retirou-se para Ca´lcis, na Eube´ia, onde morreu no ano seguinte. A tradic¸a˜o representa um elemento vital para a compreensa˜o da filosofia aristote´lica. Em certo sentido, Aristo´teles via seu pro´prio pensamento como o ponto culminante do processo desencadeado por Tales de Mileto. Sua filosofia pretendia na˜o apenas rever como tambe´m corrigir as falhas e imperfeic¸o˜es das filosofias anteriores. Ao mesmo tempo, trilhou novos caminhos para 1.8. APEˆNDICE DO CAPI´TULO I 51 fundamentar suas cr´ıticas, reviso˜es e novas proposic¸o˜es. Para Aristo´teles, a Lo´gica e´ um instrumento, uma propedeˆutica para as cieˆncias e para o conhecimento e baseia-se no silogismo, o racioc´ınio formal- mente estruturado que supo˜e certas premissas colocadas previamente para que haja uma conclusa˜o necessa´ria. O silogismo parte do universal para o par- ticular; a induc¸a˜o, ao contra´rio, parte do particular para o universal. Dessa forma, se forem verdadeiras as premissas, a conclusa˜o, logicamente, tambe´m o sera´. Gottfried Leibniz GottfriedWilhelm von Leibniz (Leipzig, 1 de julho de 1646 - Hanoˆver, 14 de novembro de 1716) foi um filo´sofo, cientista, matema´tico, diplomata e biblioteca´rio alema˜o. A ele e´ atribu´ıda a criac¸a˜o do termo ”func¸a˜o”(1694), que usou para de- screver uma quantidade relacionada a uma curva, como, por exemplo, a sua inclinac¸a˜o ou um ponto qualquer situado nela. E´ creditado a Leibniz e a Newton, o desenvolvimento do ca´lculo moderno, em particular por seu desenvolvimento da Integral e da Regra do Produto. Demonstrou geniali- dade tambe´m nos campos da lei, religia˜o, pol´ıtica, histo´ria, literatura, lo´gica, metaf´ısica e filosofia. O´rfa˜o de ma˜e aos seis anos, Leibniz foi educado por seu pai, professor de filosofia moral. Em 1663 ingressa na Universidade de Leipzig, como estudante de Direito. Em 1666 obte´m o grau de doutor em direito, em Nuremberg, por seu ensaio prenunciando uma das mais importantes doutrinas da sua posterior filosofia. Nessa e´poca afilia-se a` Sociedade Rosacruz, da qual sera´ secreta´rio durante dois anos. Foi o primeiro a perceber que a anatomia da lo´gica - ”as leis do pensamento- e´ assunto de ana´lise combinato´ria. Em 1666 escreveu De Arte Combinatoria, no qual formulou um modelo que e´ o precursor teo´rico de computac¸a˜o moderna: todo racioc´ınio, toda descoberta, verbal ou na˜o, e´ redut´ıvel a uma combinac¸a˜o ordenada de elementos tais como nu´meros, palavras, sons ou cores. Na sua visa˜o da existeˆncia de uma ”caracter´ıstica universal”, Leibniz encontrava-se dois se´culos a` frente de sua e´poca, no que concerne a` matema´tica 52 CAPI´TULO 1. CONJUNTOS, FUNC¸O˜ES E LINGUAGEM LO´GICA e a` lo´gica. Aos 22 anos, foi-lhe recusado o grau de doutor, alegando-se sua juventude. Tinha vinte e seis anos, quando passou a ter aulas com Christiaan Huygens, cujos melhores trabalhos tratam da teoria ondulato´ria da luz. A maior parte dos pape´is em que rascunhava suas ide´ias, nunca revisando, muito menos pub- licando, encontra-se na Biblioteca Real de Hanoˆver aguardando o paciente trabalho de estudantes. Leibniz criou uma ma´quina de calcular, superior a` que fora criada por Pascal, fazendo as quatro operac¸o˜es. Em Londres, compareceu a encontros da Royal Society, em que exibiu sua ma´quina de calcular, sendo eleito membro estrangeiro da Sociedade antes de sua volta a Paris em marc¸o de 1673. Em 1676, ja´ tinha desenvolvido algumas fo´rmulas elementares do ca´lculo e tinha descoberto o teorema fundamental do ca´lculo, que so´ foi publicado em 11 de julho de 1677, onze anos depois da descoberta na˜o publicada de Newton. No per´ıodo entre 1677 e 1704, o ca´lculo leibniziano foi desenvolvido como instrumento de real forc¸a e fa´cil aplicabilidade no continente, enquanto na Inglaterra, devido a` relutaˆncia de Newton em dividir suas descobertas matema´ticas, o ca´lculo continuava uma curiosidade relativamente na˜o procurada. Durante toda a sua vida, paralelamente a` Matema´tica, Leibniz trabal- hou para aristocratas, buscando em suas genealogias provas legais
Compartilhar