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criança em ambiente penitenciario_realidade brasileira

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CRIANÇA EM
AMBIENTE
PENITENCIÁRIO:
UMA ANÁLISE DA 
EXPERIÊNCIA
BRASILEIRA.
The Child in CorreCTional insTiTuTios: 
a Brazilian sTudy Case
L’enfant en anbiance carcéraL :
Une anaLyse de L’expérience brésiLienne
Rosangela Peixoto Santa Rita*
resumo: O fio condutor deste trabalho refere-se à análise 
de uma situação particular vivenciada por mulheres 
presas, com filhos, no espaço de execução penal. Trata-se, 
portanto, de demonstrar a existência de complexidades 
relativas à institucionalização da mãe presa, ainda sem 
visibilidade na agenda pública brasileira. Com base nos 
estudos desenvolvidos, o presente ensaio descreve como 
as ações institucionais do encarceramento feminino 
* Assistente Social. Mestre em Política Social pela Universidade de Brasília. 
Especialista em Política Criminal, Penitenciária e de Segurança Pública pela 
Universidade do Rio de Janeiro e Escola de Governo do Distrito Federal. 
Atua como Coordenadora-Geral de Tratamento Penitenciário do Sistema 
Penitenciário Federal - DEPEN/MJ. Autora da obra Mães e Crianças atrás 
das grades: em questão o princípio da dignidade da pessoa humana – Ministério da 
Justiça, 2007. e-mail: ro.santarita@hotmail.com
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confrontam-se com abusos de poder, ausência de garantias 
jurisdicionais e omissões do Estado para com a efetivação 
do respeito à dignidade da pessoa humana, da prioridade 
absoluta, da proteção integral e do interesse superior de 
crianças e adolescentes. Aponta, assim, para a urgência 
de implementação de políticas públicas que respeitem a 
pessoa e contemplem as particularidades do cumprimento 
de pena de mulheres. Torna-se imprescindível que isso se 
faça numa perspectiva transdisciplinar de atuação integrada 
de políticas sociais, criminais e de execução penal.
Palavras-Chave: Mulher; Prisão; Criança; Direitos 
Humanos.
aBsTraCT: This work’s objective is to analyze a particular 
situation lived by imprisoned women with children in 
the space of criminal execution. It aims, therefore, to 
demonstrate the existence of complexities relative to the 
institutionalization of the imprisoned mother, still invisible in 
the Brazilian public schedule. On the basis of the developed 
studies, the present essay describes how the institutional 
actions of the feminine imprisonment are collated with 
power abuse, absence of jurisdictional guarantees and 
omissions from the part of the State to execute the respect 
to the human being dignity, of the absolute priority, the 
integral protection and the superior interest of children and 
adolescents. It points, thus, the urgency in the implementation 
of public politics that respect the person and contemplate 
the particularities of the fulfillment of penalty of women. It 
is of major importance that a multiple perspective is applied 
to social, criminal and legal execution policies.
Key-words: Woman; PRISION; Child; Human Rights
résumé: Le fil conducteur de ce travail se rapporte 
à l’analyse d’une situation particulière vécue par des 
femmes prisonnières qui ont leurs enfants dans l’espace de 
l’exécution pénale. Il s’agit donc de démontrer l’existence 
de complexités relatives à l’institionnalisation de la mère 
prisonière, encore sans visibilité dans l’agenda publique 
brésilienne. Basé sur les études développées, ce travail 
essaye de décrire comment les actions institutionnelles de 
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l’emprisonnement des femmes se confrontent avec les abus 
de pouvoir, absence des garanties de droits et omissions 
de l’État en ce qui concerne au respect et à la dignité 
de l’être humain, de la priorité absolue, de la protection 
intégrale et de l’intérêt supérieur des enfants et adolescents.
Il indique ainsi l’urgence de l’implémentation de politiques 
publiques qui respectent la personne et contemplent les 
particularités de l’accomplissement des peines des femmes. 
Il est indispensable que cela soit fait dans une perspective 
transdisciplinaire de action intégrée de politiques sociales, 
criminelles et d’exécution pénale.
moTs-Clés: Femme ; Prision ; Enfants ; Droits de 
l’homme.
1. inTrodução 
A busca incessante para dialogar com os problemas do Sistema Penitenciário 
Brasileiro, além de ser algo complexo, traz contradições no campo das visibilidades 
e invisibilidades. É certo que um conjunto significativo de pesquisadores dedica-
se a estudos sobre a problemática da violência e da criminalidade. Poucos, porém, 
preocuparam-se especificamente com o Sistema Penitenciário, menos ainda com 
a prisão de mulheres. 
No contexto do encarceramento feminino, quase inexistem estudos sobre a 
situação de mães, com crianças, atrás das grades. A maternidade torna-se limitada em 
razão dos muros (visíveis e invisíveis) de uma prisão. Apesar de serem assegurados 
em lei aspectos importantes, como a existência de unidades prisionais exclusivas 
para as mulheres, o direito ao aleitamento materno, a instalação de berçários, entre 
outros, o que, de fato, ocorre é a não institucionalização dessas ações, que poderiam 
contribuir para o reconhecimento das diferenças e do direito a ter direito. 
Constata-se, assim, que as ações institucionais se desenvolvem sem nenhum 
planejamento que leve em consideração a humanização da execução penal. São 
precárias, isoladas, pontuais, ineficazes e têm contribuído para a degradação e 
violação do direito a uma vida digna. Nota-se que todas as formas de encarceramento 
são complexas, e isso implica pensar no agravamento dessa situação, especialmente 
quando seres humanos, reconhecidos legalmente como prioridade absoluta, estão 
em uma de suas fases mais significativas: os primeiros anos de vida.
Dentro desse âmbito de particularidade do Sistema Penitenciário Brasileiro, ainda 
invisibilizado pela agenda pública, este ensaio toma corpo. Em face da complexidade 
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e hostilidade de um ambiente prisional, pode-se dizer que diversas crianças já se 
encontram em situação de “prisão por tabela”. Portanto, a contribuição deste ensaio 
passa pela perspectiva de abertura do cárcere à comunidade, da efetiva necessidade 
de integração de políticas sociais com as políticas criminais e de execução penal. 
2. o desComPasso enTre o arCaBouço legal e
a realidade PeniTenCiária 
O contexto de garantia da cidadania1 e a consolidação da democracia política em 
nosso País foram marcados, nos últimos vinte anos, pelas lutas sociais e conquista 
da chamada “Constituição Cidadã”. A Constituição Federal de 1988, ao marcar o 
início de uma nova ordem democrática, incorporando os direitos estabelecidos 
na Declaração de 1948, estabelece a dignidade da pessoa humana como um dos 
princípios básicos da estrutura constitucional brasileira, ou seja, como fundamento 
maior da construção do Estado Moderno.
Embora reconhecendo que no Brasil não se efetivou, de fato, um Estado de Bem 
Estar, as políticas sociais da década de 1980 refletem direitos sociais estabelecidos na 
Carta Magna. O capítulo 2 da Constituição Federal, que aborda os Direitos Sociais, 
define, em seu art. 6º, que são direitos sociais: a educação, a saúde, o trabalho, o 
lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, e a 
assistência aos desamparados. Contudo, sabe-se que esses direitos garantidos por 
lei funcionam, muitas vezes, como “letra morta”. No âmbito de uma instituição 
prisional, esse fator se agrava ainda mais pela primazia da política de segurança e 
segregação, em detrimento da efetividade de políticas sociais. 
A manifestação do Estado Penal, por intermédio de políticas repressivas, 
comprova-se diretamente, não somente nas políticas criminais, mas também nas 
políticas de execução penal. Segue a mesma lógicaestrutural das desigualdades sociais, 
na ampliação do quadro de pessoas excluídas e vulneráveis e, consequentemente, na 
minimização das políticas sociais, para efetivação de direitos sociais. 
1 Cidadania é aqui entendida em sua relação com o Estado de Direito, com 
a sociedade capitalista, com as instituições democráticas e os movimentos 
sociais. Segundo Covre, (2003. p.11) a cidadania é o próprio direito à 
vida no sentido pleno. Trata-se de um direito que precisa ser construído 
coletivamente, não só em termos do atendimento às necessidades básicas, 
mas de acesso a todos os níveis de existência, incluindo o mais abrangente, 
o papel dos homens no universo.
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Entendendo-se o sistema penitenciário como uma instituição complexa, na 
qual existe todo um conjunto de normas legais garantidoras de um tratamento 
humanitário aos apenados, observa-se, na prática, que não há ações para o efetivo 
cumprimento desse objetivo. O locus da prisão é concebido como lugar de perda 
da dignidade humana, onde as injustiças se agravam ainda mais pelas concepções 
estruturais, arquitetônicas e comportamentais do Sistema Penitenciário. Sobre isso, 
vale a pena citar Foucault: “O sistema carcerário junta numa mesma figura discursos 
e arquitetos, regulamentos coercitivos e proposições científicas, efeitos sociais reais 
e utopias invencíveis, programas para corrigir a delinquência e mecanismos que 
solidificam a delinqüência” (FOUCAULT, 1987, p. 40).
A ocorrência de superpopulação carcerária em quase todas as unidades prisionais 
brasileiras e indicadores, como: o alto índice de reincidência criminal, a carência de 
pessoal servidor do sistema penitenciário com qualificação especializada, a falta de 
tratamento individualizado da pena, a ausência e/ou precária assistências à saúde, 
jurídica, social, laborativa, educacional, dentre outros, agravam ainda mais o quadro 
complexo e perverso do encarceramento brasileiro. Vale lembrar a afirmativa bem 
difundida na sociedade, de que “o problema da prisão é a própria prisão”. 
As diversas formas de assistência regidas pela Lei de Execução Penal – LEP 
– como dever do Estado e direito da pessoa presa – não adquirem status de 
direitos sociais e ficam à mercê da dinâmica burocrática de funcionamento da 
unidade prisional e do poder discricionário das Direções dos presídios. Observa-
se a existência de precárias condições do Sistema Penitenciário Brasileiro, refletida 
em inúmeras violações de direitos humanos, apesar da existência de leis voltadas 
à humanização da execução penal e de diversos tratados internacionais, dos quais 
o Brasil é signatário. 
De uma forma genérica, pode-se dizer que esses avanços legais e normativos 
não foram alvos de ações na efetivação dos direitos a serem reconhecidos. As 
atividades voltadas aos presos e presas dão-se de forma fragmentada e descontínua, 
não lhes proporcionando o mínimo de dignidade, de respeito à sua integridade 
física e moral e preservação de seus direitos assegurados em lei. Compreende-se, 
assim, que o Sistema Penitenciário Brasileiro, tão conhecido pelo simbólico termo 
de “universidade do crime”, reflete o descompasso entre o seu ideário e a sua 
realidade. 
Vale situar aqui as ações institucionais voltadas para a mãe presa, como forma 
de compreender melhor a realidade e o descompasso dos direitos declarados em lei. 
Destacam-se também aqueles ainda não pautados na agenda pública do Estado, o que 
remete a questões específicas e particulares do “todo feminino”. Como essa temática 
está referida ao quadrilátero mulher/prisão/criança/direitos humanos, é preciso 
considerar esses embates no reflexo da política penitenciária, que, de uma maneira 
geral, não apresenta diretrizes definidas quanto à singularidade da mãe presa.
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O encarceramento feminino, além de relacionar-se às diversas restrições 
“intramuros”, como a visita íntima, ultrapassa o ambiente de prisão. Longe de ser um 
espaço para “reintegração”, a prisão de mulheres parece ter seu efeito mais perverso 
na quebra dos vínculos familiares, no abandono de crianças, que, mesmo estando 
além dos muros de confinamento, se encontram em outros muros de exclusão e de 
miserabilidade, com a ausência da figura materna.
Apesar da existência do dispositivo legal, a realidade prisional brasileira 
vem mostrando que, em algumas unidades da Federação, existe um complexo 
penitenciário polivalente, em que o local para mulheres é uma de suas unidades, 
ainda que tenha separação por gênero; ou, pior ainda, existe apenas uma cela 
destinada a essa categoria.
O ingresso de mulheres gestantes para cumprimento de pena privativa de 
liberdade já se constitui como uma questão que merece reflexão e ações no âmbito 
da gestão dos complexos prisionais. São inegáveis as precárias condições de 
habitabilidade em que se encontram as penitenciárias brasileiras. Esse problema 
se agrava à medida que as unidades femininas não dispõem de recursos humanos 
especializados e espaços físicos necessários à saúde da mulher, em especial ao 
tratamento pré-natal e pós-natal. Com isso, pode-se afirmar que há um descompasso 
da lei (e também sua omissão) frente às particularidades do encarceramento feminino 
brasileiro.
Relacionando-a ao que Goffman (1999) chamou de “mortificação do 
eu”, categoria inerente às chamadas “instituições totais”, como a prisão, a 
detenção incorpora, além da privação de liberdade, outras perdas profundas das 
individualidades. Alguns exemplos são: o despojamento da aparência física, o uso 
de uniformes-padrão, a forma de caminhar com as mãos para trás, entre outros, 
significando uma série de degradações e humilhações. 
Embora esses rompimentos das prisões tenham sido pensados para o “homem 
criminoso”, eles não são diferentes para uma prisão de mulheres. Observa-se 
que a rotina de uma instituição total e, aqui, especificamente de uma prisão, tem 
uma peculiaridade de controle delimitada pelo corpo dirigente e pelo corpo dos 
funcionários. Nesse contexto de perda de autonomia, a mulher, quando inserida 
no sistema penitenciário, é despojada também, como o homem, de seus papéis e 
das relações sociais com o mundo externo às grades. Contudo, a mulher apresenta 
uma singularidade em relação à quebra dos vínculos e papéis familiares. O fato de 
ocorrer nascimento e/ou permanência de crianças no interior da prisão já remete 
a situações que extrapolam a condenação legal e que apresentam reflexos sociais 
na ultrapassagem da pena para os familiares, impondo a implantação de políticas 
sociais, criminais e penitenciárias de respeito à diversidade. 
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3. a Criança no esPaço PeniTenCiário 
O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA –, produto de um amplo 
processo organizativo da sociedade para a superação do comportamento tradicional, 
alicerçado no abandono, na carência e na delinquência, assegura a prioridade absoluta 
à criança e ao adolescente como dever da família, da sociedade e do Estado. 
Nesse ordenamento jurídico brasileiro, meninas e meninos são definidos como 
pessoas, sujeitos de direitos, em condição peculiar de desenvolvimento. À medida que 
se preconiza que nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de 
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punindo, na 
forma da lei, qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais 
(art. 5º), impõe-se ao Poder Público, às instituições e aos empregadores o dever 
de propiciar condições adequadas ao aleitamento materno, inclusive aos filhos de 
mães submetidas à medida privativa de liberdade (art. 9º). 
Relativamente aos filhos de mães submetidas à medida privativa de liberdade, 
mais uma observação se impõe. Nos termosda Constituição da República, “às 
presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus 
filhos durante o período de amamentação” (art. 5º, inc. L). Por esse motivo, a 
Lei 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal – LEP –, foi alterada 
pela Lei 9.046, de 18 de maio de 1995, para incluir o seguinte mandamento: «os 
estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário, onde as 
condenadas possam amamentar seus filhos» (art. 83, § 2º). Nessa proteção legal, está 
prevista a instalação de ambiente prisional específico para a mulher, com destinação 
de um berçário, ficando facultativa a instalação de creches.
Os preceitos da Lei n. 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB, 
no que se refere à educação infantil, estabelece que essa modalidade é a “primeira etapa 
da educação básica e tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até os 
seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicointelectual e social, complementando 
a ação da família e da comunidade” (art. 29). Assim, prevê-se a integração de creches 
e pré-escolas aos sistemas de ensino, atuando com quadro de educadores providos de 
profissionalização específica. Nessa sistemática de política educacional, a modalidade 
de atenção às crianças até os seis anos de idade corresponde ao quadro da educação 
infantil, subdividida da seguinte forma: creche, para crianças de até três anos; pré-
escola, para crianças de quatro a seis anos de idade.
Sabe-se, porém, que, numa conjuntura marcada por agravantes processos de 
desigualdade e exclusão social, a política brasileira de educação infantil ainda está 
calcando os patamares de efetividade no campo das políticas públicas, onde já se 
podem inferir, de imediato, as complicações de inserção desta na esfera da política 
penitenciária.
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Uma pesquisa2 desenvolvida por esta pesquisadora aponta que apenas 53% das 
unidades prisionais brasileiras têm exclusividade para as mulheres, e 47% são alas ou 
celas femininas em complexos prisionais masculinos.3 Não obstante, ainda que sejam 
consideradas exclusivas para as mulheres, essas primeiras são, na maioria, estruturas 
físicas adaptadas para o recebimento de mulheres em privação de liberdade. 
Do total de unidades prisionais femininas estudadas, 59,9 % não dispõem de 
estrutura física adequada ao atendimento às crianças; 21,6 % indicam a existência de 
berçário, e 18,9% destas informam que as crianças ficam em creche. Isto significa que, 
na maioria das unidades da Federação, a criança fica na cela coletiva junto com a sua 
mãe durante o cumprimento da pena. Atrelado a esse ponto problemático de falta de 
estrutura física para o atendimento infantil, soma-se a dificuldade de entendimento 
do que venha ser denominado de berçário e creche. Infelizmente, a realidade não 
condiz com o ideário de estruturas voltadas ao desenvolvimento infantil. 
Outro fator bastante problemático refere-se ao período ou idade máxima para 
a permanência da criança junto à mãe que cumpre pena de prisão, havendo uma 
variação de 04 meses a 06 anos. Apesar de 63% informarem um período de até 
06 meses, o que se percebe, na realidade brasileira, é a falta de discussão científica 
sobre este procedimento. 
Sabe-se que a própria Constituição Federal e a Lei de Execução Penal não 
definem um período de tempo mínimo para a permanência da criança junto à 
mãe que cumpre pena de prisão; apenas mencionam o direito que têm as mães de 
amamentar os seus filhos ou filhas. Assim, em termos legais, a mulher presa tem 
o direito de permanecer com o filho no período de aleitamento, em instalação de 
berçário. Entretanto, o preceito legal parece colidir com aspectos subjetivos da gestão 
prisional. Com isso, a maternidade na prisão pode constituir-se de forma ambígua: 
de um lado, como fator de felicidade; de outro e, ao mesmo tempo, como dupla 
penalização, face ao momento de separação entre a criança e a mãe-presa.
Mas, até quando esse dever de amamentar deve ser exigido da mãe? O Ministério 
da Saúde e a Organização Pan Americana da Saúde editaram o Guia alimentar para 
crianças menores de dois anos, no qual se mencionam diversos estudos e pesquisas. 
2 Dissertação de Mestrado defendida no programa de pós-graduação em 
Política Social do Departamento de Serviço Social da Universidade de 
Brasília sob o título “Mães e Crianças atrás das grades: em questão o 
princípio da dignidade da pessoa humana” (2007). 
3 A pesquisa apontou um quantitativo de 79 ambientes penitenciários com 
existência de mulher presa (dados de 2006, informados pelas unidades 
da Federação) . 
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Nesse documento, explicita-se que os Estados Membros da Organização Mundial 
da Saúde (OMS) devem fortalecer as atividades e elaborar novos critérios para 
proteger, promover e apoiar o aleitamento materno exclusivo durante seis meses, 
como recomendação de saúde pública mundial, tendo em conta as conclusões da 
reunião consultiva de especialistas da OMS sobre a duração ótima do aleitamento 
materno exclusivo.
Os Estados também devem proporcionar alimentos complementares 
apropriados, junto com a continuação da amamentação, até os dois anos de idade 
ou mais, dando ênfase a esses conceitos nos canais de divulgação social, a fim de 
induzir as comunidades a desenvolverem essas práticas (Organização Mundial da 
Saúde. Resolução WHA 54.2, par. 2[4]. WHO, 2001). Dessa forma, a amamentação 
exclusiva até os seis meses e, a partir daí, complementada por outros alimentos, que 
serão introduzidos gradativamente, é medida de saúde pública.
Além das normas constitucionais, internacionais e do Estatuto da Criança e do 
Adolescente, a melhor interpretação para o direito à amamentação, à convivência familiar 
e comunitária e, assim, à vida e a condições dignas de sobrevivência, hoje, talvez esteja 
contida no Projeto de Diretrizes das Nações Unidas Sobre Emprego e Condições 
Adequadas de Cuidados Alternativos com Crianças, apresentado pelo Brasil ao Comitê 
dos Direitos da Criança da ONU, em 31 de maio de 2007, no qual se propõe:
Quando o único ou o principal responsável pela criança 
for condenado à privação de liberdade ou estiver em prisão 
preventiva, os interesses da criança devem ser considerados 
acima de tudo. Sentenças que não prescreverem a custódia ou 
a decisão de novo julgamento deverão ser aplicadas sempre 
que possível. Os Estados devem levar em consideração o 
que seria melhor para a criança, ao decidirem pela retirada 
de crianças nascidas na prisão ou que viverem com um dos 
pais na prisão. A sua retirada deve ser tratada da mesma 
forma que a retirada em outros casos. No caso de crianças 
abaixo de três anos, a retirada não deve, em princípio, ser feita 
contra a vontade do pai em apreço. Deve-se fazer o máximo 
esforço para assegurar que a criança que ficar na prisão com 
o pai ou a mãe receba cuidados e proteção adequados, de 
modo a garantir-lhe a liberdade e a convivência comunitária. 
(BRASIL, 2007, p. 17)
Esta sugestão apresentada pelo Brasil deve possuir o significado mínimo de 
que todos os brasileiros assumam o compromisso de tratar nossas crianças da 
forma sugerida.
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Com relação ao tempo de permanência com a mãe, especificamente, estudos 
psiquiátricos recomendam que, para o pleno desenvolvimento da saúde mental, a 
separação entre mãe e filho não deve ocorrer antes que a criança complete três anos 
de idade. Nessa concepção, chega-se a apontar alguns malefícios da privação da 
presença da mãe na primeira infância, a exemplo da possibilidade de que, quando 
se tornarem adultos, terão muito mais transtornos depressivos, mais transtorno 
borderline anti-social, drogalização, entre outros.
Sobre essaquestão, vale citar uma boa experiência de um Estado Brasileiro. 
Documentos4 do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (7ª 
Promotoria da Infância e da Juventude) registram que, no ano de 2003, foram 
realizadas discussões entre membros desse Órgão, da Superintendência dos Serviços 
Penitenciários – SUSEPE – e do Programa de Assistência à Mulher Apenada – 
PAMA, com o intuito de aprofundar questões referentes à permanência das crianças, 
filhas de mulheres presas, na penitenciária feminina Madre Pelletier. Nesse período, 
a direção da unidade prisional havia adotado o seguinte critério: as crianças ficariam 
apenas até os seis meses de idade em companhia das mães.
Nesse referido período foi realizado o seminário estadual intitulado “Privilegiar 
vínculo afetivo entre mãe e filho – solução ou problema?” e, como fruto 
desse processo, no ano de 2004, foi firmado um “Termo de Compromisso de 
Ajustamento” pelo Ministério Público, envolvendo os diversos órgãos correlatos, 
com a finalidade de ajustar critérios para a viabilização da permanência de crianças, 
com suas respectivas mães apenadas, na creche, na idade compreendida entre zero 
e três anos de idade. Acredita-se, assim, que essa mobilização social represente 
importantes contribuições, ao problematizar essa temática, visando à garantia dos 
direitos da mãe e da criança em ambiente de prisão.
Apesar de não termos, ainda, um aprofundamento sobre essa pauta nos 
diversos países, é importante situar que não há uma homogeneidade de práticas 
institucionais. Para exemplificar, pode-se citar que na França adota-se o período de 
dezoito meses e, na Espanha, a criança pode permanecer com sua mãe-presa até 
a idade de três anos.
4 Foi possível ter acesso a esses documentos, por meio da colaboração 
dessa organização não-governamental. Consta nesse documento que 
o PAMA discordava dos critérios adotados pela direção, propondo 
que houvesse uma discussão mais ampla, envolvendo outros setores 
da sociedade e órgãos governamentais, no sentido de contribuir para 
uma melhor definição desse critério institucional quanto ao período de 
permanência da criança.
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Países como a Argentina e a Colômbia adotam uma política de regulamentação 
da idade-limite da criança em ambiente intramuros, da seguinte forma: no primeiro, 
é permitido o período de até quatro anos de permanência da criança junto à mãe, e, 
no segundo, a permanência é de até três anos. Outro fator extremamente relevante 
desses dois países da América Latina, que difere da realidade brasileira, relaciona-se aos 
protocolos de interface de políticas: no caso argentino, na Lei de Educação Nacional, 
há um capítulo dedicado à educação em contextos de privação de liberdade, onde se 
detalha a pauta da atenção educativa de nível inicial às crianças até quatro anos de idade 
nascidas ou criadas em ambiente penitenciário; no caso Colombiano, no próprio Código 
Penitenciário e Carcerário, há menção ao dever do Estado de possibilitar a permanência, 
em estabelecimentos de reclusão, de crianças até três anos, filhos de mulheres presas. 
Nesse segundo caso, o Programa de atenção a essas crianças se ajusta metodologicamente 
às diretrizes do Instituto Colombiano de Bem Estar Familiar – ICBF.
Diante de uma análise mais critica sobre esses dados da realidade brasileira, 
pode-se considerar que a situação do atendimento infantil aos filhos de mulheres 
encarceradas, além de ser assunto polêmico, parece não dialogar com o campo dos 
direitos da política para a infância. Essas crianças, por não terem a necessária e efetiva 
visibilidade, apesar de consideradas legalmente como pessoas em desenvolvimento, 
estão relegadas ao “abandono” e ao “fechamento social” de uma instituição como 
a prisão.
Ao tratar do comprometimento das diversas práticas do encarceramento 
feminino, verifica-se que há vários problemas que são negados, desconhecidos 
e que se tornam invisíveis, como, por exemplo, o da existência de mulheres 
desamparadas, com filhos inseridos em diferentes destinos familiares ou entregues 
a estabelecimento de abrigo para crianças abandonadas. Vale aqui reproduzir a fala 
de uma mulher-mãe-presa5:
Tem uma presa aqui que tem cinco filhos que estão com 
o tutelar; não teve com quem deixar, e tem muitas aqui 
que o filho está na casa de um vizinho, na casa de uma 
tia, a outra está na casa de um irmão, aí você vê como é 
triste aqui o dia-a-dia. Uma outra presa aqui, a menina dela 
5 Fala extraída durante o processo de pesquisa de campo (2006), onde foram 
realizadas 10 (dez) entrevistas com presas em cumprimento de pena nos 
Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro. Outras falas 
estão presentes na obra: Mães e Crianças atrás das grades: em questão o princípio 
da dignidade da pessoa humana. (Ministério da Justiça, 2007). 
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foi pra casa da ex-sogra, e a outra filha foi para a casa do 
ex-marido, que são em casas separadas, daí ela vai acabar 
perdendo as duas crianças. Ela chora muito, então a gente 
vê muita tristeza aqui dentro (Presa da Penitenciária Madre 
Pelletier – Estado do Rio Grande do Sul). 
Aliada ao fator abandono, incorpora-se uma experiência de criminalidade, 
o que pode ser extremamente agravante para o processo de relacionamento no 
futuro social da criança. Outra grave situação se estabelece quando a mãe-mulher-
presa não participa de nenhum programa adequado à fase de separação da criança. 
Dessa forma, percebe-se que infelizmente o processo de separação da criança 
no ambiente prisional ainda não é tratado de forma aprofundada em relação aos 
aspectos biopsicossociais da mãe e da criança. 
Na falta de uma maior discussão e aprofundamento sobre o tempo mínimo 
e máximo para a permanência de criança em ambiente de pena, as unidades da 
Federação decidem, conforme sua livre vontade e diferente interpretação legal, 
refletindo, assim, ações institucionais diferenciadas e descaracterizadas de qualquer 
diretriz de política pública minimizadora de violação de direitos humanos, seja para 
a mãe presa, seja para seu filho. 
Entende-se que a prisão, na esfera de uma política penitenciária, apesar de ser 
uma instituição complexa e fechada, que cumpre a função de segregação social, 
deveria necessariamente (Verificar hifenização,porque não estou conseguindo 
corrigir a divisão silábica. O computador está separando erradamente o a da sílaba 
–ria.) efetivar o direito a ter direitos. Nessa concepção, também não se ignora o fato 
de que a permanência de uma criança junto a sua mãe na prisão é algo problemático 
e polêmico. Portanto, não é possível pensar essa relação sem incluir argumentos 
sobre os benefícios e os malefícios advindos desse procedimrnto.
No caso específico da temática deste ensaio, observam-se as tendências dos 
tipos de violência, dada, inclusive, a “invisibilidade”, ou seja, o lado oculto das ações 
institucionais voltadas à mãe presa, com criança, em ambiente de confinamento. 
Não se pode deixar de denunciar as diversas ambivalências dessa área, no campo dos 
direitos humanos, como: a falta de unidades prisionais específicas para as mulheres 
e por separação de regime penal; a falta de espaços apropriados para o atendimento 
à infância; a inexistência de políticas específicas voltadas para a maternidade como 
um todo; o direito da criança à convivência familiar e comunitária, entre outros.
O que se procura enfatizar refere-se à necessidade dessa díade mãe/criança, no 
contexto prisional, ser objeto de novos olhares, novas discussões e novas práticas institucionais, 
para a efetivação de uma política de respeito à diversidade e de garantia de direitos 
humanos. 
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4. Breves Considerações Para (novos) Possíveis CaminhosAtualmente, o Brasil possui aproximadamente 27.0006 (vinte e sete mil) mulheres 
presas e, segundo dados obtidos junto ao Departamento Penitenciário Nacional, 
a taxa média de crescimento de encarceramento das mulheres7, no último ano, foi 
de aproximadamente 12%, em comparação ao masculino, que ficou em torno de 
5%.
Para qualquer reflexão a respeito das vicissitudes do encarceramento feminino, 
não se deve esquecer a relação existente entre a situação das mulheres presas que, 
além de representar a condição ideológica do papel feminino nas relações sociais, 
fruto de uma ideologia patriarcal, acha-se em um plano institucional voltado para 
homens e reconhecidamente falido, em termos de garantias legais.
Infelizmente, a nova conjuntura, caracterizada pelo aumento expressivo 
de mulheres presas, e os agravamentos no cumprimento da pena não têm sido 
pautados no âmbito das políticas criminais, sociais e penitenciárias. Destacam-se a 
fragilização nas relações familiares, o agravamento da situação financeira, a posição 
de subalternidade em relação ao homem no cometimento de ato ilícito e as crianças 
que são separadas das mães sem nenhum tipo de acompanhamento psicossocial, 
entre outros. 
Ainda que se acredite ser difícil o cumprimento de pena para homens e 
mulheres – contexto prisional pouco propício ao convívio social, associado a formas 
degradantes de habitabilidade – como imaginar essa situação para uma criança que 
compartilha o espaço de prisão junto com sua mãe? Dessa forma, uma inquietação 
que se manifesta nessa abordagem gira em torno da existência de uma temática (??? 
Confesso que não entendi.) de uma problemática relacionada com diversos direitos 
sociais e políticas públicas, emoldurada numa tessitura (???) inscrita num contexto 
penitenciária marcada pela falência institucional e pelo “fechamento” social. (Não 
sei. Este parágrafo é realmente problemático.)
Na prática, ao invés de serem reconhecidas com a devida proteção legal, as 
“crianças presas por tabela” acabam seguindo os mesmos rituais de controle e 
disciplina de uma prisão, ficando presas a horários até para banho de sol, ou para usar 
6 Fonte: Departamento Penitenciário Nacional /Ministério da Justiça. 
Dados de Dezembro de 2007. Total de pessoas presas (homens e 
mulheres): 422.590. 
7 Importante registrar que, apesar do aumento considerável do número 
de mulheres presas, em nível nacional, esse quantitativo não tem 
ultrapassado, ainda, a m
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uma colônia infantil. Em lugar de um progressivo desenvolvimento biopsicossocial, 
tem-se a não garantia do direito à liberdade, à convivência familiar e comunitária, 
ao respeito e à dignidade, como pessoas em processo de desenvolvimento, como 
determina o Estatuto da Criança e do Adolescente. Nessa linha, acredita-se que 
o conhecimento e a positivação dos direitos humanos através de instrumentos 
jurídicos não bastam, ou não têm impedido as constantes violações aos direitos de 
todos os homens e mulheres. Isto significa que os direitos humanos não podem 
ser vistos apenas como “letra no papel” e acordos internacionais, mas na prática 
dos homens históricos.
Norberto Bobbio (1992), mesmo apresentando uma linha de pensamento 
positivista, incorporou a visão das condições históricas do elenco dos direitos do 
homem. O autor menciona que “os direitos do homem são direitos históricos, que 
emergem gradualmente das lutas que o homem trava por sua própria emancipação 
e das transformações das condições de vida que essas lutas produzem” (BOBBIO, 
1992, p. 32). Essa concepção demonstra que o problema atual em relação aos direitos 
humanos não passa apenas pela sua proclamação ou proteção, pois depende de um 
certo desenvolvimento da sociedade, desafiando até a evolução da Carta Magna, e 
pondo em crise até mesmo os mecanismos mais efetivos de garantia jurídica.
Defende-se, aqui, a necessidade da efetivação de direitos que devem ser 
aplicados de forma específica às mães presas e suas crianças. Apesar de a inserção 
das crianças em ambiente de prisão ser algo polêmico, é a única forma de contribuir 
para o vínculo maternal e evitar o abandono e a separação da mãe numa etapa 
fundamental da infância. 
Avalia-se que a questão aqui tratada torna-se ainda mais relevante, ao entender 
a necessidade de tratamento desigual, respeitando a diversidade no cumprimento 
da pena privativa de liberdade como forma de incluir as peculiaridades do 
encarceramento da mulher. Assim, faz-se necessário reforçar o pressuposto de 
defesa dos direitos humanos – expressa no respeito à dignidade da pessoa humana 
–, num entendimento ético e político de que a pessoa presa é cidadã com direito 
a ter direitos. 
 Nessa linha, portanto, a permanência de crianças em ambiente intramuros é 
uma questão merecedora de posição e atuação firme do Estado e da Sociedade. 
Não se pode deixar de denunciar a omissão histórica de diversas instituições 
governamentais, a exemplo do Ministério Público, do Poder Judiciário (Varas 
especializadas de execução penal e Varas da Infância e da Adolescência), do Poder 
Legislativo, do Poder Executivo (Administração dos sistemas penitenciários locais), 
da Defensoria Pública, do Ministério da Justiça, do Conselho Nacional de Defesa 
dos Direitos da Criança e do Adolescente e organismos correlatos e da Sociedade 
Civil Organizada, frente a essa particularidade do sistema penitenciário brasileiro. 
De fato, é preciso reconhecer que há muito que fazer na perspectiva do direito 
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a ter direito. Não é possível a perpetuação de violações de direitos humanos, 
representada pela falta de diretrizes de uma política pública nacional direcionada 
para esse segmento social.
Tratar da realidade de mães presas revela a urgência na implantação e 
implementação de políticas públicas que respeitem a pessoa e contemplem as 
particularidades apontadas neste ensaio. E mais, que se faça numa perspectiva 
transdisciplinar de atuação integrada de políticas sociais, criminais e de execução 
penal. 
Além das muitas vertentes no campo das ciências sociais e jurídicas, e 
da psicologia, ousamos sugerir os seguintes caminhos: reformas legislativas; 
estabelecimento de normas e diretrizes sobre a idade limite de permanência de uma 
criança junto à mãe que cumpre pena de prisão – o que nos parece não poder ser 
inferior a três anos; elaboração de diretrizes voltadas ao processo de separação entre 
mãe e o seu filho; reconhecimento de que o direito da mãe presa deve conjugar-se 
com o direito das crianças, de terem uma vida digna, um desenvolvimento integral e 
não sofrerem com os estigmas e condições da privação de liberdade; efetivação das 
garantias legais pela inter-relação das políticas sociais de proteção infanto-juvenil, 
da mulher, da saúde e da educação no contexto da execução penal; readequação dos 
espaços de atendimento infantil e regulamentação da etapa de educação infantil em 
ambiente prisional, reafirmando os pilares das funções assistenciais, pedagógicas 
e socializadoras. 
Dentro de uma perspectiva ampla, que alinha defesa de direitos com necessidade 
de estruturação de políticas públicas, torna-se evidente que os caminhos a serem 
traçados no campo do encarceramento feminino brasileiro são bastante complexos. 
Partindo, por exemplo, do motivo pelo qual se defende aqui a idade limite de três 
anos de idade como parâmetro para a permanência da criança junto à mãe que 
cumpre pena de prisão, faz-se necessário perceber, entre tantos outras, as seguintes 
perspectivas: a) relacionar a dinâmica penitenciária intramuros com a política pública 
extramuros de educação e atendimento infantil, na ótica da garantia da liberdade 
e da convivência comunitária; b) perceber os pilares da etapa da primeira infância, 
os quais envolvem processosbiopsicossociais significativos no desenvolvimento 
infantil; c) compreender questões singulares de individualização da execução 
penal que podem suscitar procedimentos diferenciados, a exemplo do tempo de 
pena a cumprir, da estruturação do núcleo familiar e da participação nos serviços 
assistenciais ofertados. 
De forma concreta, é possível perceber que a discussão sobre particularidades 
e necessidades da mulher encarcerada ainda é pífia, postergando, assim, o debate 
sobre os papéis sociais diferenciados, dentro de uma política de defesa dos direitos 
humanos. Essas reflexões não podem ser separadas da percepção da complexidade 
que há entre igualdade e diferença, superando visões positivistas de entendimento do 
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direito como simples afirmação da igualdade. Dessa forma, como não reconhecer 
que a questão do encarceramento feminino suscita implicações no campo de uma 
política pública, na perspectiva da diversidade e do respeito à dignidade da pessoa 
humana para garantia dos direitos humanos? Concorda-se com Oliveira, quando 
se posiciona em relação a esse direito:
A construção da dignidade é um processo tanto mais 
complexo e longo quanto maiores as desigualdades 
sociais e os preconceitos e discriminações enraizadas no 
cotidiano da sociedade. Mudanças socioculturais exigem 
a consciência de sua necessidade, a disposição para luta e 
o conhecimento da causa dos problemas e, entre outras 
coisas, o próprio conhecimento de quais são os problemas 
a serem equacionados (OLIVEIRA, 2003, p. 82).
Avalia-se que a questão aqui tratada torna-se ainda mais relevante, ao entender 
a necessidade de tratamentos desiguais, respeitando a diversidade no cumprimento 
da pena privativa de liberdade, como forma de incluir as peculiaridades do 
encarceramento da mulher. 
Esperamos que nosso trabalho possa contribuir não somente para a visibilidade dessa 
temática, mas também para a ressignificação de práticas de um sistema penitenciário que 
tem introduzido uma situação perversa: a de criança “presa por tabela”.
Reconhece-se que há muita dificuldade em analisar uma realidade tão complexa, 
em refletir sobre direitos humanos numa instituição fechada como a prisão, em 
discutir as ações institucionais que envolvem tantos problemas e que se chocam 
com a concepção de programas e políticas emancipatórias e de inclusão social, mas 
não há como ficar inerte a tudo isso.
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