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Educacao e Amancipação

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO 
Seminário Temático: Teoria Crítica e Cultura Digital 
Profª. Drª. Elaine Conte 
 
Resenha 
 
Educação e Emancipação 
 
Ivani Schuster 
 
A obra Educação e Emancipação é um livro que inclui uma coleção das 
falas em conferências, que foram ministradas por Adorno, e debates 
transmitidos pela rádio do estado de Hessen na Alemanha, no período de 1959 
a 1969 que foram transcrevidos para textos. Em alguns desses debates Adorno 
discute suas ideias com Helmut Becker, diretor do Instituto de Pesquisas 
Educacionais da Sociedade Max Planck em Berlim, que se mostra favorável as 
ideias e teses adornianas. 
Theodor Ludwig Wiesengrund Adorno nasceu em Frankfurt em 11 de 
setembro de 1903. Sua formação inclui filosofia, sociologia, psicologia, e 
incluindo também a musicologia ao ser compositor pela Universidade de 
Frankfurt. Fundou a Escola de Frankfurt da teoria social interdisciplinar 
neomarxista ao lado Max Horkheimer, Walter Benjamin e Herbert Marcuse. 
Oscar Alexander Wiesengrund e Maria Bárbara Calvelli-Adorno eram 
seus pais. Seu pai era um alemão judeu, mas foi convertido à religião 
protestante e sua mãe era de origem italiana e sua paixão era a música erudita 
e ensinava o catolicismo. 
Frequentou sua formação musical com o auxílio de sua meia-irmã 
Agathe pelo lado de mãe que era uma excelente pianista. Além de sempre ter 
estupendos resultados na academia Kaiser-Wilhelm-Gymnasium, também 
frequentou com o compositor Bernhard Sekles um curso particular e realizou-se 
como especialista nos estudos do filósofo Immanuel Kant, a partir das aulas 
sobre ‘expert’ na Sociologia do Conhecimento de Siegfried Kracauer. 
Com o término da Segunda Guerra, Adorno dava aulas envolvendo o 
Instituto de Pesquisa Social para Frankfurt, com auxílio de seus membros. 
No primeiro capítulo, O que significa elaborar o passado, inicia seu 
diálogo ao analisar os preceitos e conceitos que levariam a possível 
emancipação a partir de um discurso epistemológico filosófico criticando com 
base na teoria crítica da educação baseada na razão da natureza filosófica. 
Desenvolvendo argumentos com base na sua vasta formação na 
sociologia e psicologia, Adorno afirma que as condições que levaram aos 
acontecimentos vividos na Segunda Guerra mundial e todas as barbáries que 
ocasionaram nesses eventos ainda permanecem pela razão de estarem 
enraizadas no inconsciente da sociedade segundo uma racionalidade que é 
puramente instrumental. Levando isso em consideração, o esclarecimento só 
deve ser alcançado a partir da educação da massa populacional. 
Nessa medida, o esquecimento do nazismo pode ser explicado muito 
mais a partir da situação social geral do que a partir da psicopatologia. Até 
mesmo os mecanismos psicológicos que operam na recusa de lembranças 
desagradáveis e inescrupulosas servem a objetivos extremamente realistas. Os 
próprios agentes da recusa acabam revelando os mesmos, quando, munidos 
de sentido prático, afirmam que a lembrança demasiadamente concreta e 
incisiva do passado poderia prejudicar a imagem da Alemanha no exterior. 
(ADORNO, p.33) 
Não importando como eles encaram o nacionalismo atualmente, o povo 
alemão sempre será lembrado pelos fatos ocorridos na Segunda Guerra 
Mundial. Não importando o quanto tenham mudado. 
No segundo capítulo, A filosofia e os professores, Adorno crítica a prova 
de filosofia realizada pelos candidatos à docência. 
Quando afirmava que os mais aptos ao exame frequentemente são 
aqueles que participaram ativamente dos seminários de filosofia, não tinha a 
intenção de exercer pressão institucional. Levo a ideia da liberdade acadêmica 
extremamente a sério e considero inteiramente indiferente a maneira pela qual 
um estudante se forma, se como participante de seminários e aulas ou 
unicamente mediante a leitura por conta própria. De modo algum pretendia 
identificar o sentido desse exame com a formação filosófica específica. Apenas 
queria dizer que aqueles que são impelidos para além do empreendimento das 
ciências particulares para aquela autoconsciência do espírito, que afinal é a 
filosofia, de uma maneira geral correspondem à concepção do exame. Seria 
infantil esperar que qualquer um queira ou possa se tornar um filósofo 
profissional; é justamente esta a concepção em relação à qual tenho profundas 
desconfianças. Não queremos impor aos nossos estudantes a deformação 
profissional daqueles que automaticamente consideram sua própria área de 
atuação como sendo o centro do mundo. A filosofia só faz jus a si mesma 
quando é mais do que uma disciplina específica. (ADORNO, p.53) 
Para Adorno, tal processo não chega a ser um processo sólido, pois 
quem for aprovado nessa prova, não significa os mesmos estão para função de 
ser docente. Para se exercer essa atividade é necessário amar o saber. Um 
dos maiores problemas apontado pelo autor é a falta de amor, gerando assim a 
falta de competências para assumir o oficio da docência. 
Com frequência ouvimos a queixa de que a filosofia sobrecarrega os 
futuros professores com uma disciplina a mais, e ainda por cima uma disciplina 
com que a maioria não mantém vínculos. Sou obrigado a devolver a 
provocação: muitas vezes não somos nós, mas os próprios candidatos os 
responsáveis pela transformação do exame numa avaliação profissional 
específica. Quando, como se diz, me é atribuído um candidato, então costumo 
conversar com ele acerca de seu próprio assunto, procurando cristalizar a partir 
daí um posicionamento tal em relação ao tema que possibilite obter uma 
espécie de autoavaliação intelectual do seu trabalho. Porém não existe por 
parte dos candidatos nenhuma satisfação ou entusiasmo quanto a esse 
procedimento. (ADORNO, p.58) 
Nesse contexto é possível perceber que a avaliação do candidato não 
deve ser só o que eles respondem no questionário. Existe uma pessoa por trás 
daquelas respostas. Um mundo singular em cada candidato. E isso deve ser 
levado em conta quando se está avaliando. 
De certa forma a maioria dos candidatos não possuem segurança de 
expressar seus pensamentos por medo de represálias. Suas ideias eram 
reprimidas por si mesmos. O medo de errar. O medo de falar algo errado. Tudo 
isso são barreiras invisíveis que impedem o desenvolvimento livre do 
pensamento. Seus Eu não eram expressos, mas ao invés disso eles procuram 
as respostas perfeitas que imaginavam que os avaliadores possuíam. A busca 
pela verdade universal. 
No terceiro capítulo, Televisão e formação, Adorno nos apresenta alguns 
fatores importantes sobre a utilização do meio de comunicação em massa que 
é a televisão. Um dos principais pontos que o autor nos mostra é que esse 
aparato é na verdade uma forma como que representantes de ideologias 
podem espalhar seus ideais e conceitos para toda a população, mesmo que 
estejam distantes. O que se torna uma grande resistência para a sua utilização. 
Kadelbach — Ultimamente a televisão ocupou um espaço crescente nas 
discussões relacionadas à formação de adultos. Durante muitos anos as 
Escolas Superiores de Educação Popular (Volkshochschulen) que ofereciam 
formação para adultos consideraram-se prejudicadas pela televisão, alegando 
que o público teria se afastado pela entrada era cena deste novo meio de 
comunicação de massas. (ADORNO, p.75) 
Adorno demonstra pontos de destaque aos quais a televisão pode ter 
influência, como o primeiro sendo a habilidade de moldar o consciente e com 
isso alterar a formação do indivíduo. 
Por um lado, é possível referir-se à televisão enquanto ela se coloca 
diretamente a serviço da formação cultural, ou seja, enquanto por seu 
intermédio se objetivam fins pedagógicos: na televisão educativa, nas escolas 
de formação televisivas e em atividades formativas semelhantes. Por outro 
lado, porém, existe uma espécie de função formatava ou deformativaoperada 
pela televisão como tal em relação à consciência das pessoas, conforme 
somos levados a supor a partir da enorme quantidade de espectadores e da 
enorme quantidade de tempo gasto vendo e ouvindo televisão. (ADORNO, 
p.76) 
Outro ponto levado em questão é a habilidade da televisão de controlar 
e moldar a mente de um indivíduo para alterar sua consciência. A única forma 
de evitar isso é imprescindível uma moderação do conteúdo socialmente 
distribuído por causa do imenso potencial que o meio televisivo pode ter. 
Atualmente é muito comum perceber a terceirização da educação 
oriunda da televisão ao invés dos pais. Uma babá virtual que não cobra salário 
e tem milhares de horas de entretenimento à um clique do controle de 
distância. As crianças passam tanto tempo em frente de uma tela que sua 
realidade se torna aquilo. Tudo o que é passado na televisão acaba por se 
tornar verdade a partir da interpretação das mentes inocentes. Seus 
inconscientes ainda não possuem a habilidade de discernir entre o correto e o 
errado, e ao transferir a educação para a televisão é ela quem vai determinar 
esses dois pontos para a sua criança. 
No quarto capítulo, Tabus acerca do magistério é nos mostrado algumas 
bipartições sobre o ser docente que Adorno pode observar em seus vastos 
anos de observação. As marcas infligidas na mentalidade dos professores de 
primeiro e segundo grau, pode ser realidade por causa das repreensões que 
possuem a autoridade para proteger a forma antiquada do professor que deve 
ser considerado, pela interpretação deles, como um ser superior e distante dos 
alunos que nesse caso eram oprimidos e castigados quando não obedeciam às 
vontades que eram impostas a eles. Esse meio de controlar ainda é algo que 
espreitas pelos campi de ensino do mundo. 
Ao docente pertence o caminho de transcender todos os obstáculos que 
sem encontram em seu caminho de lecionar suas matérias. Com essa 
mentalidade é possível usar o conhecimento como uma ferramenta para a 
socialização e identificação do ser humano como parte da sociedade, e não 
como um ser isolado da ética mesmo que o mesmo seja acompanhado de 
hostilidades sofridas pelo professor como uma forma de o desmotivar de 
lecionar da forma que mais bem entende, pois, essas ações contrárias são a 
maneira de desmotivar o docente e impedi-lo de exercer sua função de 
conscientizador das mentes inertes de seus alunos. 
No quinto capítulo Educação após Auschwitz responsabiliza a forma que 
a racionalização restrita ainda tem lugar para guardar os acontecimentos 
bárbaros ocorridos em Auschwitz. Evidencia dessa maneira a importância da 
atuação da educação para que a emancipação do ser humano ocorra a partir 
do início da reflexão sobre o seu papel na sociedade. 
Para Adorno, a reflexão é uma faca de dois gumes, aonde ele pode ser 
tanto utilizado para o desenvolvimento pessoa alcançando a transcendência do 
seu Eu quanto para a manipulação do consciente alheio a partir de uma 
lavagem cerebral levando outros seres à crença cega. 
A reflexão a respeito de como evitar a repetição de Auschwitz é 
obscuredda pelo fato de precisarmos nos conscientizar desse elemento 
desesperador, se não quisermos cair presas da retórica idealista. Mesmo assim 
é preciso tentar, inclusive porque tanto a estrutura básica da sociedade como 
os seus membros, responsáveis por termos chegado onde estamos, não 
mudaram nesses vinte e cinco anos. Milhões de pessoas inocentes — e só o 
simples fato de citar números já é humanamente indigno, quanto mais discutir 
quantidades — foram assassinadas de uma maneira planejada. (ADORNO, 
p.120) 
As reflexões precisam, portanto, ser transparentes em sua finalidade 
humana. Acreditasse também que um ensino que se realiza em formas 
humanas de maneira alguma ultima o fortalecimento do instinto de competição. 
Quando muito é possível educar desta maneira esportista, mas não 
pessoas desbarbarizadas. A educação deve conduzir o indivíduo a 
independência de pensar, isto é, a razão objetiva. 
Pessoas que se enquadram cegamente em coletivos convertem a si 
próprios em algo como um material, dissolvendo-se como seres 
autodeterminados. Isto combina com a disposição de tratar outros como sendo 
uma massa amorfa. Para os que se comportam dessa maneira utilizei o termo 
"caráter manipulador" em Auihoritarian personality (A personalidade 
autoritária), e isto quando ainda não se conhecia o diário de Hõss ou as 
anotações de Eichmann. Minhas descrições do caráter manipulador datam dos 
últimos anos da Segunda Guerra Mundial. Às vezes a psicologia social e a 
sociologia conseguem construir conceitos confirmados empiricamente só muito 
tempo depois. (ADORNO, p.129). 
No sexto capítulo Educação: para quê? Nos tempos modernos a 
ferocidade é tratada como uma trivialidade constante da atualidade. E é nesse 
contexto que a escola possui o seu maior papel de modificador da sociedade. É 
ao refletir e entender os fatores que levam aos atos bárbaros que é quando a 
transformação do inconsciente é tangível. Novos pontos de vista só podem ser 
descobertos quando nossas realidades são encaradas por terceiros e 
discutidas abertamente em um ambiente seguro e acolhedor, como por 
exemplo numa sala de aula. Segundo Adorno: “A situação é paradoxal. Uma 
educação sem indivíduos é opressiva, repressiva. Mas quando procuramos 
cultivar indivíduos da mesma maneira que cultivamos plantas que regamos 
com água, então isto tem algo de quimérico e ideológico. A única possibilidade 
que existe é tornar tudo isso consciente na educação” (ADORNO, p. 154). Se 
uma ação, mesmo que maléfica é aceita pela maioria, é nesse ponto devemos 
refletir sobre os nossos conceitos éticos. 
Qual é o verdadeiro papel da educação ? Simplesmente criar mão de 
obra alfabetizada que pode se encaixar em qualquer lugar da sociedade não é 
a maneira correta de moldar o futuro. Dessa forma a próxima geração será de 
seguidores cegos que irão perseguir a mensagem mais bonita ao invés de 
refletir e ponderar sobre as ações e consequências de cada ato. 
A situação é paradoxal. Uma educação sem indivíduos é opressiva, 
repressiva. Mas quando procuramos cultivar indivíduos da mesma maneira que 
cultivamos plantas que regamos com água, então isto tem algo de quimérico e 
de ideológico. A única possibilidade que existe é tornar tudo isso consciente na 
educação; por exemplo, para voltar mais uma vez à adaptação, colocar no 
lugar da mera adaptação uma concessão transparente a si mesma onde isto é 
inevitável, e em qualquer hipótese confrontar a consciência desleixada. Eu diria 
que hoje o indivíduo só sobrevive enquanto núcleo impulsionador da 
resistência. (ADORNO, p.154). 
O papel da educação é proporcionar o direito de cada indivíduo de se 
desenvolver individualmente. Procurar as suas próprias respostas. Nenhuma 
mente é igual a outra. Cada pessoa é uma singularidade com o seu próprio 
universo interno. 
No sétimo capítulo A educação contra a barbárie A continuidade da raça 
humana só é possível a partir do entendimento da ferocidade contida em 
nossos inconscientes, pois é oriunda dela a nossa energia inerte de 
autodestruição. Desde os tempos primitivos, a nossa violência física sempre foi 
um fator constante em nossas vidas. Seja para sobrevivência no período das 
cavernas ou para liberar o estresse acumulado, nosso Eu sempre se reverte 
para o nosso lado primitivo. Sendo que o período mais maleável da mente 
humana é durante a infância, é nesse ponto em que a educação deve se focar 
pois o sentido de hierarquia e papel de autoridade já estão consolidados. Ao 
colocar em prática uma forma positiva de autoridade ao invés de suprimir na 
base da força, isso já acelera o processo de extinção da nossa origem primitiva 
e selvagem da violência. Mas dentro da escola é somente o primeiro passo 
para a desconstrução da nossa ferocidade,o ponto de partida. É preciso que 
essas práticas sejam utilizadas abertamente em todos os ambientes da 
sociedade, seja no trabalho ou numa loja. A sociedade deve abraçar esse 
processo como um todo e colocar em ação práticas de não-violência. 
Exterminando de vez a justificação da violência como uma resposta padrão, 
normal e comum de ser dada quando de encontro de pontos opostos. O papel 
do governo será de manter a congruência dos fatores colocados em prática 
desse projeto de modificação da nossa mentalidade primária, pois não adianta 
somente alguns sujeitos desenvolverem e o governo realizar uma campanha 
realçando que isso não é algo correto de ser reproduzido. 
No oitavo e último capítulo Educação e emancipação, é no qual o autor 
define que o sistema educacional deve ser o ponto de partida da emancipação 
das massas populares ao guiar os alunos a autorreflexão e elucidação. A 
educação deve ser o principal meio de abolição dos pensamentos e conceitos 
retrógrados que são considerados normais na sociedade atual. É preciso 
esclarecer as mentes dos alunos desde o primeiro dia que eles chegarem na 
escola. Fazer com que eles tenham ciência de que eles têm um papel na 
sociedade e que eles importam. 
É possível averiguar que a intenção do autor era de problematizar e 
desmistificar a origem da emancipação do sujeito como parte da sociedade 
contemporânea de forma a extinguir os comportamentos primitivos a partir do 
esclarecimento do inconsciente da mente conturbada durante a educação 
escolar e desenvolver um método de moldar as futuras gerações para que as 
mesmas não tenham mais os comportamentos citados. Dessa forma 
analisamos que a melhor forma de modificar o futuro é através do 
comprometimento para o engajamento sistemático de atitudes positivas e de 
aceitação incondicional partindo da educação com o apoio do sistema 
democrático da sociedade. A emancipação do ser humano só é encontrada a 
partir da educação. 
 
Referência 
 
ADORNO, Theodor W. Educação e emancipação. Trad. Wolfgang Leo Maar. 
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995.

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