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Capítulo 02 - A Evolução dos Mecanismos Extraconvencionais de Controle na Comissão de Direitos Humanos

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2 
Os Direitos Humanos 
 
 
 
 
 
2.1. 
Conceito 
 
 
Os direitos humanos, como o próprio nome indica, são aqueles reconhecidos a 
todos pelos simples fato de serem humanos. Neste sentido, eles seriam universais 
(aplicáveis a todos, independentemente do papel social que desempenham) e 
inalienáveis (não seria possível perdê-los e continuar a viver dignamente como ser 
humano).1 Considerando que os mesmos destinar-se-iam a satisfazer as necessidades 
humanas, e sabendo que não há uma definição científica e objetiva do que sejam 
essas necessidades, pode-se concluir que a fonte desses direitos pertence ao campo da 
moral e não ao direito positivo. 
Ao definirem-se quais os requisitos mínimos para uma vida digna, percebe-se 
uma escolha social acerca da potencialidade humana que se busca efetivar. São, 
então, as possibilidades de determinada visão de natureza humana que se procuram 
realizar através dos direitos humanos. 
Assim, os direitos humanos não são dados, seja por Deus ou pela natureza, mas 
construídos pelo homem, segundo certa visão moral. 
 
 
2.2. 
As três gerações de direitos humanos 
 
 
Embora se observe uma tendência recente à integração dos direitos humanos e, 
até mesmo, ao abandono de qualquer divisão que pudesse dar margem a aplicações 
 
1 Jack Donnelly. The Social Construction of International Human Rights. In: Tim Dunne & Nicholas 
Wheeler (Eds.). Human Rights in Global Politics. Cambridge University Press, 1999, p. 80. 
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discriminatórias em favor de alguns direitos e em detrimento de outros2, é válido 
apresentar, a título de esclarecimento, os três grupos em que corriqueiramente se 
dividem os direitos humanos. 
O primeiro grupo diz respeito aos direitos de primeira geração, assim chamados 
por terem sido os primeiros a serem incluídos nas distintas constituições nacionais 
ocidentais, e que correspondem basicamente aos direitos civis e políticos. Estes 
teriam principalmente um caráter negativo, pois se destinariam a limitar o espaço de 
intervenção da autoridade pública, o Estado, no domínio privado. Este primeiro grupo 
engloba o que para muitos são os direitos mais importantes, pois seriam eles a base 
para a obtenção pacífica de todos os demais3. Outros, no entanto, sustentam que para 
pessoas privadas de educação, abrigo ou comida, os direitos civis e políticos passam a 
ser de pouca valia. 
Para estes últimos prevalecem, portanto, os chamados direitos de segunda 
geração, que correspondem essencialmente aos direitos sócio-econômicos Estes 
teriam um caráter positivo, pois obrigariam o Estado a alguma prestação, seja na 
forma de educação e saúde básica para todos ou através de programas de inserção 
social, por exemplo. 
Por fim, temos os chamados direitos de terceira geração, também chamados de 
direitos solidários. Estes correspondem àqueles direitos que seriam gozados por 
coletividades, mais do que por pessoas individuais, como, por exemplo, o direito à 
paz, ao desenvolvimento e a um meio-ambiente saudável. 
É importante notar, contudo, que nenhum direito é exclusivamente de caráter 
positivo ou negativo. O direito a voto, bem como o direito ao devido processo legal, 
por exemplo, requerem do Estado não apenas uma prestação negativa, ou abstenção, 
mas igualmente esforços positivos no sentido de assegurar o adequado gozo dos 
mesmos. Da mesma forma, o direito social a casar-se e fundar uma família não é 
 
2 A ex-Alta Comissária para Direitos Humanos das Nações Unidas, Mary Robinson, afirmou 
categoricamente que os direitos de primeira, segunda e terceira geração deveriam fazer parte de um 
mesmo “pacote”. Thomas Weiss; David Forsythe; Roger Coate. The United Nations and Changing 
World Politics. Westview Press, 2001, p. 155. 
3 Marice Cranston chega a afirmar, por exemplo, que só os direitos civis e políticos são 
verdadeiramente direitos humanos, conforme citado por David Forsythe em Human Rights in 
International Relations. Cambridge University Press, 2000, p. 29. 
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menos negativo do que o direito à liberdade de religião. Já no tocante aos direitos 
solidários, ou de terceira geração, nada impede que sejam pleiteados individualmente. 
 
 
2.3. 
Os direitos humanos e a história 
 
 
Os direitos humanos, como direitos universais e inalienáveis, igualmente 
aplicáveis a todos pelo simples fato de serem humanos constituem algo distintivo e 
historicamente incomum. Eles são fruto de uma visão moral própria que os reconhece 
como a melhor forma de realizar a natureza humana e moldar as relações sociais e 
políticas que caracterizam o mundo contemporâneo. Em várias sociedades pré-
modernas é possível identificar o compartilhamento de valores como justiça, 
equidade e compaixão, sem, no entanto, objetivar-se a realização dos mesmos através 
de direitos universais inalienáveis. De fato, tanto em sociedades ocidentais quanto 
não-ocidentais era comum fazer-se distinção entre nacionais e estrangeiros, entre 
homens e mulheres, cristãos e não-cristãos. Nestas, não existia a idéia de humanidade 
compartilhada, como base para o reconhecimento de direitos políticos e sociais 
básicos para todos igualmente. 
As sociedades tradicionais da Europa ocidental, por exemplo, caracterizavam-se 
por uma predominância da comunidade sobre o indivíduo, incluindo-se no que se 
convencionou chamar de “sociedades comunitárias”.4 Eram, grosso modo, sociedades 
estamentais, em que prevalecia a noção de tradição e não havia lugar para a 
autonomia do indivíduo, tão cara aos direitos humanos. De fato, o valor e os direitos 
dos indivíduos variavam de acordo com o espaço ocupado dentro da comunidade, 
bem como segundo critérios de raça, sexo e outras considerações hierárquicas, 
inexistindo qualquer noção de igualdade. Fora da comunidade as pessoas não tinham 
existência moral, ficando destituídas de quaisquer garantias. 
 
4 Jack Donnelly. Universal Human Rights in Theory and Practice. Cornell University Press, 1989, p. 
75. 
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A realização da dignidade humana ficava, então, restrita aos membros integrantes 
da comunidade, sendo variável segundo os papeis desempenhados, escapando a 
qualquer noção de direitos humanos inalienáveis e universais. 
Somente no século XVII, a idéia de direitos naturais ou direitos humanos entrou 
na teoria e prática política da Europa, em resposta às transformações introduzidas 
pela modernidade. O crescente poder coercitivo dos Estados e o avanço da economia 
moderna em base capitalistas, ensejou o surgimento de garantias capazes de preservar 
um mínimo de espaço para os indivíduos modernos autônomos. 
“Modern markets also created a whole new range of threats to human dignity and thus 
were one of the principal sources of the need and demand for human rights. And at 
roughly the same time, the modern state, both as an autonomous social actor and as an 
instrument of the newly ascendant bourgeoisie, was creating new institutions and 
practices that enabled it to invade the lives and threaten the dignity of a rapidly 
increasing number of people in new and increasingly ominous ways.”5 
 
Para a recém surgida classe média, esses direitos em bases naturais representavam 
um contrapreso aos privilégios aristocráticos. Contudo, considerando a grande 
mobilidade social da sociedade burguesa, afeita a uma contínua e imprevisível 
mudança nos seus quadros, não era possível vincular o gozo e fruição dos novos 
direitosa critérios fixos de nascimento ou posição social. Para assegurar o efetivo 
alcance dos mesmos à burguesia cumpria estendê-los, ainda que formalmente, a toda 
a sociedade. “Thus human rights came to be articulated primarily as claims of any 
individual against the state”6 
Os direitos humanos surgem, então, para atender aos anseios e interesses de 
determinada classe, a burguesia, preocupada em superar as limitações próprias do 
regime aristocrático que findava. “The bourgeoisie, who provided the principal 
support for early liberalism, did demand equality, simply as human beings, against 
the traditional inequalities of birth. (…) it was undeniably in their interest to make 
it”7 
Para os liberais do século XVII, a realização da dignidade humana passava, então, 
obrigatoriamente pela extensão de toda a gama de direitos humanos a cada membro 
da sociedade, consagrando-se os princípios da igualdade e da autonomia individual. 
 
5 Ibid., p. 64. 
6 Ibid., p. 70. 
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Assim, reconhecia-se o valor e a dignidade dos indivíduos independentemente de 
seus papeis na comunidade. Em face dessa prevalência do indivíduo sobre a 
sociedade e o Estado, cabia aos direitos humanos cuidar para que esse Estado fosse 
um instrumento garantidor da realização da dignidade humana e não a sua ameaça. 
Já em 1688, os direitos naturais à vida, a liberdade e à propriedade foram 
consagrados por Locke no seu Segundo Tratado sobre o Governo.8 É possível 
identificar em Locke um modelo essencialmente negativo, que indica muito mais 
como a sociedade e o governo não devem agir, do que como devem fazê-lo. De fato, 
há vários argumentos contrários ao poder absoluto, à arbitrariedade, aos privilégios 
reais, entre outros. Estas teorias liberais do contrato social constituem os primeiros 
registros históricos de indivíduos efetivamente dotados de direitos iguais e 
inalienáveis com vistas à realização da dignidade humana. “Locke does see the 
individual as having interests separate from those of society, and in the areas 
protected by human rights he does give individual interests prima facie priority over 
those of society.”9 
Percebe-se, contudo, que longe de almejarem uma proteção efetivamente 
universal, esses direitos ficavam restritos a proprietários europeus do sexo masculino. 
Ademais, segundo os preceitos do próprio Segundo Tratado Sobre o Governo e boa 
parte das teorias liberais dos séculos XVII e XVIII, os direitos humanos ficavam 
limitados a direitos de caráter civil e político, sendo o direito a propriedade o único de 
cunho econômico e social. No entanto, muito mais do que limitações inerentes ao 
tratamento liberal dos direitos humanos, essas características decorriam da 
contingência de fatos históricos. 
Assim, superadas essas contingências, foi inevitável para o liberalismo ir além 
das considerações lockeanas e entender que a realização da dignidade humana 
extrapolava o direito à propriedade, e que a proteção da vida e da liberdade exigia 
necessariamente considerar outras ameaças além das arbitrariedades do poder estatal, 
como, por exemplo, a escassez e a privação dos meios de subsistência. Foi, então, que 
 
7 Ibid., p.104 
8 Jack Donnelly,1999, p. 82. 
9 __, 1989, p. 92. 
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passaram a se consagrar direitos econômicos e sociais, de caráter eminentemente 
positivo, tais como o direito à alimentação e à saúde. 
“Liberalism is not a matter of fixed set of canonical details set out in Locke or anywhere 
else; (...) its essence is found instead in its fundamental principles – that is, in its 
commitments to equality and autonomy and to protecting these values through human 
rights”10 
 
Tendo o desenvolvimento inicial dos direitos humanos coincidido com a 
consolidação dos Estados soberanos após a Paz de Westfália em 1648, é evidente que 
as garantias, quando existentes, se restringiam ao âmbito doméstico. A independência 
dos Estados Unidos e a Revolução Francesa representaram inegavelmente enorme 
impulso à proteção individual de direitos. Cumpre notar, contudo, que este 
desenvolvimento ficou amplamente restrito a esses países, não tendo efeitos legais 
imediatos sobre os demais Estados. Os direitos humanos continuavam, então, a ser 
vistos como uma questão nacional, respeitando-se sempre o tão caro princípio da 
soberania. 
Em sociedades não-ocidentais como a China, por exemplo, a realização da 
dignidade humana e da justiça social continuava exclusivamente a cargo da boa 
vontade de governantes supostamente iluminados, confrontados apenas com limites 
de ordem religiosa. Esses líderes tinham o dever para com os céus de cuidar dos 
interesses do povo, sem criar-se, no entanto, qualquer direito correspondente nas 
mãos dos indivíduos. No Islã, igualmente, buscava-se a realização da dignidade 
humana segundo o cumprimento de certos deveres ou em função da posição legal ou 
espiritual de cada um, fugindo claramente às noções de igualdade e autonomia 
individual própria dos direitos humanos. Assim, fica evidenciado que à época, apenas 
algumas sociedades, essencialmente ocidentais, reconheciam a legitimidade dos 
direitos humanos e formulavam leis em conformidade com os mesmos, assegurando 
aos indivíduos direitos e garantias pelo simples fato de serem humanos, e, não, em 
função de determinado dever cumprido ou função desempenhada na comunidade. 
Segundo Donnelly:“(…) there can be little quarrel with my broader claims that 
Western liberalism is the source of the contemporary idea of human rights (…)”11 
 
10 Ibid., p. 103. 
11 Ibid., p. 106. 
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O século XIX na Europa caracterizou-se pelo surgimento de uma onda de 
sentimento internacional. Pela primeira vez na história as dificuldades e sofrimentos 
dos indivíduos passaram a ser pensados independentemente de sua nacionalidade. 
Esta moralidade de cunho internacional, embora ainda não diretamente ligada aos 
direitos humanos, sentaria as bases para o desenvolvimento futuro dos mesmos. 
Nesse período, um empresário suíço chamado Henry Dunant, chocado diante do 
fato de que soldados feridos eram abandonados à sua própria sorte, durante a batalha 
de Solferino (1859) pela Guerra de Sucessão Austríaca, criou o movimento da Cruz 
Vermelha e do Crescente Vermelho. Estas sociedades privadas encarregaram-se não 
apenas de ajudar e tratar soldados necessitados como também pressionaram pela 
assinatura de tratados destinados a proteger e resguardar soldados doentes ou feridos. 
Foi assim que se aprovou a primeira Convenção de Genebra para Vítimas de Guerra 
ainda no ano de 1864. Embora Dunant não tenha usado a linguagem dos direitos 
humanos, é inegável que seu legado constitui uma das primeiras manifestações de 
direitos humanos internacionalmente reconhecidos.12 De fato, quando confrontado 
com um problema que extrapolava as fronteiras nacionais, Dunant adotou solução 
igualmente internacional. Buscava-se promover a dignidade humana em bases 
transnacionais. 
O movimento antiescravidão do século XIX constitui outro exemplo do esforço 
inicial pela promoção da dignidade humana em bases internacionais. Tendo se 
iniciado na Inglaterra, tal movimento tinha na Sociedade Antiescravidão sediada em 
Londres um de seus pilares. Em função da veemente resistência dos Estados Unidos e 
outros países negociadores de escravos e a despeitodos acordos firmados no âmbito 
do Congresso de Viena (1815) e da forte pressão exercida pela marinha britânica, o 
tráfico negreiro só foi definitivamente banido no final daquele século, num acordo 
multilateral assinado em 1890 em Bruxelas. No século XX, a proibição do tráfico 
negreiro, da escravidão e de práticas correlatas passou a integrar o conjunto dos 
direitos humanos internacionalmente reconhecidos. Suas bases, sem dúvida, residem 
na moralidade transnacional dos movimentos do século XIX. 
 
12 Na verdade, nesse caso é mais apropriado falar em direito humanitário, ou seja, em direitos humanos 
em tempo de guerra. 
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O fim da Primeira Guerra Mundial, precipitada em função de rivalidades étnicas 
na região dos Bálcãs, deu margem à assinatura de alguns tratados para a proteção dos 
direitos de minorias, o que claramente colocava os direitos humanos no plano 
internacional. Ficou assegurado, por exemplo, o direito de petição a órgãos 
internacionais com o fim de reprimir quaisquer políticas discriminatórias realizadas 
pelas maiorias étnicas. Apesar de louvável, tal iniciativa não rendeu os frutos 
esperados, chocando-se em boa medida com as pressões nacionalistas que 
caracterizaram a década de 30 na Europa e colocaram em xeque qualquer proteção 
efetiva das minorias étnicas. Assim, na prática, esses tratados tiveram sua aplicação 
limitada a apenas alguns países do leste europeu. 
Embora de certa forma ligada à assinatura dos tratados supracitados, a Liga das 
Nações, surgida com o fim da Primeira Guerra Mundial numa tentativa de assegurar a 
paz internacional, não faz qualquer menção explícita aos direitos humanos 
internacionais em seus documentos constitutivos. É bem verdade que não faltaram 
esforços nesse sentido. Os Estados Unidos e o Reino Unido pressionaram, por 
exemplo, pela inclusão do direito de liberdade religiosa no Pacto da Liga das Nações 
durante a Conferência de Versalhes de 1919. Recuaram, contudo, como forma de 
bloquear a proposta japonesa de inclusão do princípio da igualdade racial, largamente 
temido pelo presidente Wilson. 
É inegável, outrossim, que a Liga estava permeada de um sentimento de 
solidariedade moral que extrapolava as fronteiras nacionais. Questões como tráfico de 
drogas, liberdade de comunicações e prevenção e controle de doenças foram 
expressamente incluídas no Pacto da Liga das Nações (art. 23). No âmbito da Liga, 
houve igualmente a criação da Comissão de Mandatos que supervisionava os Estados 
europeus que controlavam outros territórios, conclamando-os para o respeito e 
promoção dos interesses dos povos autóctones. Houve, por fim, a criação do 
Escritório para Refugiados da Liga das Nações, que mesmo na ausência de tratados 
específicos sobre o tema, encarregava-se de auxiliar esses indivíduos, representando 
importante precedente para a assinatura do tratado de 1951 no âmbito da ONU. 
Paralelamente à Liga e como parte integrante do seu sistema houve a criação da 
Organização Internacional do Trabalho com sede em Genebra. Além da efetiva 
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assinatura de diversos tratados e acordos internacionais reconhecendo direitos 
trabalhistas, esta organização seria uma das primeiras a exercer a função de 
monitoramento de direitos internacionalmente reconhecidos dentro dos Estados. O 
seu sucesso foi tal que mesmo com o fim da Liga a OIT foi absorvida pelas Nações 
Unidas, passando a figurar com uma de suas agências. 
Durante os anos da Liga houve esforços renovados pelo reconhecimento do 
caráter internacional dos direitos humanos. Nos anos 30, por exemplo, no âmbito da 
Assembléia da Liga, a França e a Polônia pressionaram pela assinatura de um acordo 
internacional de direitos humanos, não obtendo sucesso. Faltava à maioria dos 
Estados o empenho e a vontade política necessários para promover um adensamento 
legal e institucional das proteções e garantias individuais. Os arroubos de moralidade 
nem sempre se coadunam com a raison d’état tradicional. Assim, a moralidade 
transnacional nascida na Europa no século XIX, embora largamente expandida no 
âmbito da Liga das Nações só conseguiria traduzir-se em direitos humanos 
efetivamente reconhecidos no plano internacional anos mais tarde, com a criação das 
Nações Unidas, uma vez superados os entraves impostos pelo fascismo, militarismo, 
nacionalismo, racismo e isolacionismo característicos do período que findava. 
Percebe-se, então, que mais do que soluções duráveis ou definitivas para o 
problema da proteção dos direitos humanos no plano global, as etapas e processos 
históricos relatados acima serviram muito mais para amadurecer a idéia de que a 
violação dos direitos elementares à dignidade humana constitui um problema que 
extrapola as fronteiras nacionais e que deve ensejar, portanto, uma solução 
igualmente internacional. Os dissabores da Segunda Guerra Mundial constituem o 
passo que faltava em direção ao reconhecimento da necessidade do tratamento 
transnacional da questão, que ficaria consagrado com a criação das Nações Unidas. 
 
 
2.4. 
Os direitos humanos e a ONU 
 
 
Apesar de todas as dificuldades enfrentadas pela comunidade internacional para 
lidar com as violações de direitos humanos durante a Liga das Nações, o militarismo 
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japonês e o fascismo europeu renovaram os ímpetos em busca de uma proteção 
efetiva dos direitos humanos no plano internacional. 
É bem verdade, contudo, que a mudança de posição deveu-se mais ao 
desenvolvimento de novas concepções no plano intelectual do que propriamente à 
tomada de conhecimento das atrocidades especificamente praticadas por nazistas e 
japoneses, que só viriam a público anos mais tarde. Já no início dos anos 40, por 
exemplo, opiniões apresentadas por intelectuais nos Estados Unidos e Inglaterra 
conclamavam para o tratamento dos direitos humanos como uma questão inerente às 
motivações da Segunda Guerra Mundial. Nessa linha, Franklin Delano Roosvelt faz 
em 1941 o famoso discurso das “quatro liberdades” onde apresenta um quadro 
ideológico para a participação dos EUA na guerra e esboça uma possível paz para o 
pós-guerra, destacando direitos que futuramente estariam incluídos na Carta 
Internacional de Direitos Humanos. 
Roosevelt e, mais tarde, Truman compartilhavam da opinião de que a consagração 
dos direitos humanos nas relações internacionais constituía medida sine qua non para 
evitar e impedir novas agressões do tipo praticadas por Alemanha, Japão e Itália. 
Assim, estava estabelecida uma ligação entre direitos humanos e paz e segurança 
internacionais. As Nações Unidas deveriam, então, não apenas coordenar as relações 
diplomáticas entre Estados, mas igualmente prover as sociedades carentes das 
condições mínimas necessárias, em termos de garantias sociais e econômicas, para 
evitar que novos ditadores com discursos populistas fossem alçados ao poder e 
terminassem por aventurar-se em agressões internacionais. Assim, a preocupação 
com o caráter internacional dos direitos humanos na política externa americana foi 
fruto muito mais de uma consideração acerca da segurança internacional do que o 
resultado de uma crescente moralidade política. 
O próprio teor do artigo 55 da Carta das Nações Unidas parece não deixar dúvidas 
quanto à relação entre direitos humanos e paz internacional. O referido artigo reza 
assim: 
“Com o fim de criar condições de estabilidade e bem-estar, necessárias às relações 
pacíficas e amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio da igualdadede 
direitos e da autodeterminação dos povos, as Nações Unidas favorecerão: (c) o respeito 
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universal e efetivo dos direitos do homem e das liberdades fundamentais para todos, sem 
distinção de raça, sexo, língua ou religião” 13 
 
Não se pode, contudo, descartar de todo a presença de preocupações concernentes 
ao bem-estar e a dignidade humana, na política de direitos humanos internacionais do 
pós-Segunda Guerra Mundial. Conforme afirmado por Weiss & Forsythe, certamente 
ambos os fatores supracitados estiveram presentes na política diplomática que guiou 
as Nações Unidas em direção a uma proteção transnacional dos direitos humanos14. 
Vale notar, contudo, que apesar de constituir o primeiro exemplo histórico de 
proteção internacional dos direitos humanos, a Carta das Nações Unidas adota uma 
linguagem predominantemente vaga e genérica. Tal fato não causa qualquer 
estranheza considerando-se, por exemplo, as pressões exercidas por setores 
conservadores e racistas sobre o executivo americano, ou a contraditória política 
inglesa, interessada em preservar seus laços coloniais. Para Stalin, igualmente, não 
haveria possibilidade de acordo caso os compromissos firmados contemplassem 
obrigações diretas e específicas que pudessem ameaçar sua liberdade de ação. Na 
União Soviética, o endosso de uma linguagem genérica de direitos humanos era visto 
com uma forma de reduzir as desconfianças à política soviética sem, no entanto, criar 
embaraços ou constrangimentos para a mesma. 
Então, embora as grandes potências tenham reconhecido a correlação entre 
violações domésticas de direitos humanos e agressões externas, e estivessem 
empenhadas no reconhecimento internacional dos mesmos, elas não estavam 
dispostas a firmarem compromissos mais firmes e específicos capazes de limitar sua 
liberdade de ação ou criar-lhes constrangimentos maiores no plano internacional. 
O novo impulso dado pela Carta da ONU aos direitos humanos não representou, 
todavia, uma radical transformação do ordenamento das relações internacionais de 
modo a privilegiar os indivíduos. De fato, nem as Nações Unidas nem qualquer outro 
organismo internacional foram dotados de poderes supranacionais capazes de 
assegurar ou impor o cumprimento dos direitos humanos aos Estados. A proteção dos 
mesmos continuou a ser feita através de uma diplomacia estatal tradicional. Assim, se 
 
13 Carta das Nações Unidas e Estatutos da Corte Internacional de Justiça. New York: The United 
Nations, Departamento de Informações Públicas, 1957. 
14 Weiss et al., op. cit., p. 152. 
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de um lado houve a consagração dos direitos humanos universais, do outro, houve a 
reafirmação da soberania dos Estados sobre os assuntos domésticos, expressa, por 
exemplo, no artigo 2º (7) da Carta que contempla o princípio da não-intervenção. 
Essa contradição foi, desde o início, uma das marcas da política de direitos humanos 
do sistema ONU, ensejando vários debates acerca do tema. 
 
 
2.5. 
A Carta Internacional de Direitos 
 
 
Considerando que a Carta da ONU limitava-se a fazer referências aos direitos 
humanos, sem especificá-los, era preciso elaborar documentos capazes de listá-los de 
modo mais preciso. Assim, no dia 10 de dezembro de 194815 a Assembléia Geral das 
Nações Unidas aprovou o texto da Declaração Universal de Direitos Humanos, 
contando com 48 votos a favor, 9 em contra e apenas 8 abstenções (União Soviética, 
Bielorússia, Ucrânia, Polônia, Theco-eslováquia, Iugoslávia, Arábia Saudita e África 
do Sul). 
Este documento constituía apenas uma recomendação da Assembléia Geral, 
destituída de qualquer caráter vinculante sobre os países membros. Ademais, o 
documento em questão pouco inovava, consagrando, na verdade, aqueles direitos há 
muito aceitos e aplicados em países ocidentais, daí ter um reconhecido caráter liberal. 
Durante o período de negociações de 1946 a 1948 pouco se discutiu acerca de 
universalismo ou relativismo cultural ou sobre a divisão dos direitos em distintas 
gerações, evitando assim o tratamento de temas polêmicos16. Todos esses fatores 
contribuíram para a relativa facilidade com que foi aprovadas esta Declaração, 
considerada a pedra fundamental de todo o regime de direitos humanos das Nações 
Unidas. 
Embora não se tenha discutido à época acerca da preeminência de uma ou outra 
categoria de direitos humanos, é possível identificar claramente três grupos distintos 
de direitos dentre os trinta princípios consagrados na Declaração. Em primeiro lugar, 
 
15 Hoje reconhecido como Dia Mundial dos Direitos Humanos. 
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há direitos relativos à integridade física e espiritual da pessoa humana. Nesta 
categoria incluem-se o direito à vida, a proibição da escravidão ou servidão, a 
proibição da tortura e da punição cruel, desumana ou degradante e a restrição da 
prisão arbitrária e do exílio. A liberdade de pensamento, consciência e religião 
também pertencem a este grupo. Numa segunda categoria estão previstos os direitos 
que dizem respeito à vida política, garantindo-se a liberdade de opinião e expressão e 
a liberdade de associação e participação no governo, seja diretamente ou mediante 
representação. Por fim, o terceiro grupo compreende direitos sociais, econômicos e 
culturais, dentre os quais podemos destacar a seguridade social, livre escolha do 
emprego, condições justas de trabalho, participação na vida cultural da comunidade, 
descanso e lazer, educação e garantias contra o desemprego. 
Muito mais árduo foi o processo de transcrição da Declaração em tratados de 
conteúdo mais específico e de caráter cogente. A Guerra Fria representou um sério 
obstáculo para a continuidade da evolução dos direitos humanos, ao menos dentro do 
quadro de relativa tranqüilidade e rapidez que caracterizou o imediato pós - Segunda 
Guerra Mundial. 
Os direitos humanos passaram a ser mais uma arena para as disputas entre as 
superpotências. A Comissão de Direitos Humanos, por exemplo, predominantemente 
formada por países ocidentais privilegiava os direitos de caráter civil e político como 
o direito à liberdade de informação, garantia esta severamente violada pelos países 
comunistas. Estes, em contrapartida, centravam suas atenções sobre problemas como 
discriminação racial e desemprego, na tentativa de embaraçar seus rivais ideológicos. 
Da mesma forma, Estados Unidos e União Soviética não duvidavam em apoiar 
ditaduras e outros regimes aliados transgressores dos direitos humanos, em nome de 
interesses geopolíticos. 
Assim, o processo de redação, negociação e assinatura de tratados mais 
específicos sobre direitos humanos, embora reconhecidamente necessário, ficou 
entravado em meio a disputas ideológicas. Na década de 60, contudo, com o processo 
de descolonização dos países africanos e asiáticos e o conseqüente alargamento do 
número de países votantes no âmbito da ONU, deu-se novo alento à luta pelos 
 
16 David Forsythe, op. cit., p.38. 
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direitos humanos. Estes novos países, tendo sofrido as agruras da dependência 
colonial, tornaram-se, de fato, francos defensores dos direitos econômicos e sociais. 
Assim, após dez anos de longos trabalhos e negociações, os Pactos Sobre Direitos 
Civis e Políticos e Sobre Direitos Econômicos,Sociais e Culturais foram finalmente 
aprovados pela Assembléia Geral, em 16 de dezembro de 1966. Dez anos mais ainda 
se passariam, contudo, até que se obtivessem as 35 ratificações necessárias para fazê-
los entrar em funcionamento. Isso demonstra uma certa cautela dos Estados em 
passarem do compromisso vago e genérico, representado pela Declaração Universal 
de Direitos Humanos, para tratados mais específicos, capazes de limitar a liberdade 
de escolha em assuntos de política doméstica e externa. “Despite the fact that 
substantive negotiations for the two treaties were completed by 1966, it took another 
decade for the required number of legal adherences to be obtained in order to bring 
the treaties into legal force for the full parties”17 
Um dos principais obstáculos evidenciados durante os entendimentos pela 
aprovação dos pactos residiu na distinta ênfase dada, por um lado, aos direitos civis e 
políticos, e por outro, aos econômicos, sociais e culturais, que colocou em evidência 
as disputas Norte x Sul e Leste x Oeste. 
Para os países não-ocidentais, representados pelo bloco soviético, os países em 
desenvolvimento e as nações recém-independentes, a preeminência dos direitos 
econômicos e sociais justificava-se a partir da idéia de que é preciso fornecer abrigo, 
comida e vestimentas, para só depois pensar em “direitos de luxo” como participação 
política e liberdade negativa, entre outros. Além de contrariar as expectativas de 
governos ocidentais, principalmente o dos Estados Unidos (pressionado por forças 
ultranacionalistas, conservadoras e racistas), tal posicionamento representava firme 
ameaça à democracia, pois legitimava em última instância a violação de direitos 
fundamentais em nome do desenvolvimento, consagrando a atuação de regimes 
autoritários. Finalmente, uma solução foi alcançada com a aprovação de dois pactos 
em separado para cada um dos grupos de direitos, apoiados igualmente em diferentes 
mecanismos de fiscalização e monitoramento. Anos antes, em 1951, a Assembléia 
 
17 Ibid., pp. 39-40. 
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Geral já havia aprovado proposta relativa à separação, determinando a preparação de 
dois pactos distintos. 
Essa rígida separação dos direitos humanos em dois grupos apoiava-se não apenas 
em visões ideológicas contrastantes, mas também em considerações a respeito da 
aplicabilidade e implementação dos mesmos. Era comum afirmar-se, por exemplo, 
que os direitos civis e políticos poderiam ser aplicados de imediato (graças às 
vontades políticas já existentes) e poderiam ser impostos através de mecanismos 
judiciais. Em contrapartida, os direitos sócio-econômicos requereriam políticas de 
implementação mais demoradas, largamente afetadas por fatores econômicos e 
sociais exógenos, não podendo tampouco ser impostas judicialmente. 
Pode-se dizer, todavia, que a pertinência moral dessa divisão dos direitos 
humanos é altamente questionável. Jack Donnelly18, por exemplo, criticando os 
países que tentavam estabelecer a prevalência de uma categoria sobre a outra, 
pergunta se teriam qualquer significação moral as diferenças eventualmente 
encontradas entre um regime que tortura pessoas, mas alimenta bem a todos e outro 
que deixa as pessoas sofrerem de mal-nutrição e não tortura ninguém. 
Assim como a Declaração, os Pactos devem ser entendidos dentro do contexto 
histórico em que estão inseridos. A influência dos países africanos e asiáticos levou a 
uma ênfase sobre o direito à autodeterminação dos povos, finalmente aceito pelos 
países ocidentais e incluído no artigo 1º de ambos os documentos. As antigas nações 
coloniais insistiam em que deveriam estar aptas a governar seus destinos políticos e 
econômicos, livres da influência dos países imperialistas. 
Conjuntamente considerados, os Pactos e a Declaração Universal formam o que 
se convencionou chamar de Carta Internacional de Direitos. É certo haver, todavia, 
algumas pequenas discrepâncias entre os documentos. Assim, o direito à propriedade, 
o direito à nacionalidade e o direito a se buscar e gozar de asilo, muito embora 
previstos na Declaração, foram omitidos dos Pactos. Além disso, os Pactos muitas 
vezes aprofundam e especificam direitos já garantidos nas trinta normas da 
Declaração. 
 
18 Jack Donnelly. International Human Rights. Second Edition, Westview Press, 1998, p.25. 
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Conforme já foi afirmado, cada Pacto prevê um mecanismo próprio de 
fiscalização da aquiescência. O Pacto Sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, 
em vigor desde 3 de janeiro de 1976, exige que as partes forneçam periodicamente 
relatórios para o Secretário Geral da ONU que explicitem as medidas adotadas e os 
progressos feitos para se chegar à observância dos direitos. Estes relatórios serão 
submetidos ao Comitê para Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, constituído de 
18 especialistas e estabelecido em 1987 pelo ECOSOC. O papel do Comitê é analisar 
os relatórios nacionais e remeter suas conclusões à apreciação do ECOSOC, que 
poderá fazer recomendações de natureza geral. 
O Pacto Sobre Direitos Civis e Políticos, em vigor desde 23 de março de 1976, 
conta com o Comitê de Direitos Humanos para fazer o papel de supervisão. Este 
comitê também é formado por 18 membros dotados de alto caráter moral e de 
reconhecida competência no campo dos direitos humanos. O artigo 40 inciso I do 
Pacto de 1966 reza que as partes: “undertake to submit reports on the measures they 
have adopted which give effect to the rights recognized herein and on the progress 
made in the enjoyment of those rights”19 
Ainda no contexto do Comitê de Direitos Humanos, o artigo 41 autoriza o mesmo 
a receber e considerar reclamações proferidas por determinado Estado acerca de 
desrespeitos aos diretos humanos realizados em outro, desde que as partes envolvidas 
tenham-lhe reconhecido essa competência específica. 
Urge tratar, por fim, do chamado “Protocolo Facultativo”. Aos cidadãos dos 
países contratantes lhes é reconhecido o direito de comunicarem ao Comitê quaisquer 
violações a direitos humanos previstos no Pacto que tenham sido cometidas pelo 
Estado. Nestes casos, em julgando a comunicação admissível, o Comitê levará a 
questão à atenção do Estado interessado. Este terá, então, um prazo de seis meses 
para submeter explicações escritas ou declarações esclarecendo a questão e indicando 
as providências tomadas. Em seguida, caberá ao Comitê apresentar suas conclusões 
tanto ao indivíduo quanto ao Estado. Neste processo, o Comitê acabou por formar, ao 
longo dos anos, valioso histórico de recomendações e decisões (case law) que 
 
19 Documento disponível em: <http://www.unhchr.ch/html/menu3/b/a_ccpr.htm> Acesso em: Janeiro 
de 2004. 
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constitui notável fonte de interpretação de importantes artigos do Pacto. É importante 
esclarecer que o Comitê de Direitos Humanos não é uma corte, carecendo suas 
decisões de força vinculante, constituindo, na verdade, um mecanismo capaz de fazer 
a publicidade negativa de determinado Estado recalcitrante, o que para Donnelly, 
“may occasionally embarrass a state into altering its practices”20 
Em 1989, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou um “Segundo Protocolo 
Facultativo” ao Pacto de Direitos Civis e Políticos, destinado à abolição da pena de 
morte. 
Apesar de representarem uma evolução significativa em relação à Declaração 
Universal, os Pactos Internacionaisde Direitos Humanos mostraram-se, ainda, 
bastante respeitosos às soberanias nacionais, restringindo a capacidade de atuação dos 
Comitês para interferir de maneira substantiva no sentido de corrigir situações 
contrárias aos direitos estabelecidos. 
 
 
2.6. 
Os direitos humanos em convenções e declarações sobre temas 
específicos 
 
 
Considerando que os países estão muito mais dispostos a negociar tratados, do 
que a aceitar a criação de tribunais especiais ou outros mecanismos de enforcement 
para os direitos humanos, não restou às Nações Unidas outra alternativa que não a 
elaboração de tratados e convenções sobre temas cada vez mais específicos, como 
forma de expandir a proteção e ampliar o compromisso dos Estados. 
Assim, já em 194821, a Assembléia Geral aprovou a Convenção sobre Prevenção 
e Punição do Crime de Genocídio, definido como a deliberada erradicação de um 
povo ou de sua cultura. Em 1965, adotou-se a Convenção Internacional para a 
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, entendida como “qualquer 
distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou 
origem nacional ou étnica, que tenha o propósito ou o efeito de anular ou prejudicar o 
 
20 Jack Donnelly, 1998, p.58. 
21 A implementação efetiva desta convenção só se daria em 1951. 
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reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade dos direitos humanos e 
liberdades fundamentais”. Sem dúvida, o principal impulsor desse compromisso foi o 
movimento de emancipação das antigas colônias européias, que, uma vez 
independentes, passaram a buscar o fim das práticas segregacionistas e 
discriminatórias, dentre as quais já se destacava o apartheid. 
No tocante à discriminação baseada no sexo, há uma série de convenções 
específicas aprovadas pela Assembléia Geral. Dentre elas podemos destacar a 
Convenção Sobre os Direitos Políticos da Mulher de 1952 e a Convenção Sobre a 
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres de 1979. 
Sobre os direitos individuais dos presos, podemos destacar a Declaração Contra a 
Tortura, Punições Cruéis, Desumanas ou Degradantes de 1975, e a convenção sobre o 
mesmo tema de 1984. Vale mencionar, ainda, uma declaração de 1981 que 
propugnava a eliminação de todas as formas de discriminação baseadas em religião 
ou crença. Por fim, a Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada em 1989, 
exorta os Estados-parte a proteger a criança de todas as formas de discriminação e a 
assegurar-lhe assistência apropriada. 
 
 
2.7. 
A proteção regional dos direitos humanos 
 
 
No que concerne à proteção regional de direitos humanos, podemos citar, em 
primeiro lugar, o caso europeu. Este sistema tem por base a Convenção Européia dos 
Direitos Humanos de 1950, onde se define um conjunto de direitos civis e políticos. 
Para a implementação dos mesmos, o regime europeu apoiava-se, até 1998, na 
Comissão Européia de Direitos Humanos, na Corte Européia de Direitos Humanos e 
no Comitê de Ministros. 
A primeira funcionava como um mediador coletivo, que respondia a queixas 
estatais ou privadas22, exclusivamente no plano de direitos civis e políticos, e visava a 
alcançar um acordo fora dos tribunais. De início a Comissão procedia à tarefa de 
 
22 Apenas no caso dos países que expressamente aceitam tal procedimento opcional. 
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filtragem das comunicações recebidas dentro de critérios bastante rígidos, dentre os 
quais se destacava o esgotamento dos recursos internos. Em seguida, e uma vez 
acolhida a reclamação, havia uma investigação preliminar dos fatos e tentativa de 
solução amistosa entre as partes. No caso de não se alcançar um acordo, a Comissão 
elaborava um relatório sobre os fatos alegados e dava seu parecer acerca da 
configuração ou não de violação às obrigações previstas na Convenção. A partir daí 
remetia o caso para a Corte Européia de Direitos Humanos, no caso das partes 
aceitarem a jurisdição da mesma, ou para o Comitê de Ministros, no caso de não o 
fazerem. 
Na hipótese de julgar procedente a alegação de violação da Convenção, a Corte 
determinava a reparação do dano, ou de acordo com o artigo 50 da própria 
Convenção, impunha uma compensação material à parte lesada. Quando era o Comitê 
de Ministros que determinava que houve a violação, fixava-se um prazo para a 
reparação dos danos. No caso deste prazo não ser observado, podia o Comitê levar o 
assunto a conhecimento público, ou, ainda, proceder à expulsão do Estado-membro 
que não garantisse a todas as pessoas sob sua jurisdição o gozo dos direitos 
humanos23. 
Conforme observa Cançado Trindade, e diferentemente do sistema das Nações 
Unidas: “Aqui, quer se trate de parecer da Comissão Européia, de julgamento da 
Corte Européia, ou de decisão do Comitê de Ministros – os três órgãos da Convenção, 
– as petições, sejam elas interestatais ou individuais, são efetivamente julgadas”.24 
Vale dizer que em meados dos anos 90, os membros do Conselho da Europa 
começaram a considerar a possibilidade de os cidadãos remeterem diretamente suas 
demandas individuais à corte, sem necessidade da intermediação ou filtragem da 
Comissão. 
Além disso, em face do aumento do número de recursos, sua complexidade 
crescente e a ampliação do próprio Conselho que passou de 23 para 40 membros 
entre 1989 e 1996, procedeu-se, em 1998, a uma revisão do procedimento. Assim, 
 
23 Punição prevista no artigo 8º do Conselho da Europa. 
24 Antonio Augusto Cançado Trindade. A Evolução Doutrinária e Jurisprudencial da Proteção aos 
Direitos Humanos no Plano Global e Regional: as Primeiras Quatro Décadas. Revista de Informação 
Legislativa, nº 90, abr./jun. 1986, p. 243. 
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34 
 
pelo Protocolo número 11 da Convenção Européia de Diretos Humanos, foi 
estabelecido um tribunal único, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos, em 
substituição à Comissão e à Corte. A nova instituição, diretamente acessível aos 
indivíduos, cuida de todas as fases preliminares bem como da emissão das sentenças. 
Ao Comitê, instituição remanescente do sistema anterior, cabe, grosso modo, 
controlar a execução das sentenças do Tribunal, assegurando, por exemplo, o 
pagamento das indenizações à parte demandante. 
No âmbito das Américas, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos 
(CIDH) criada em 1959, teve inicialmente apenas a tarefa de promoção e não de 
proteção específica dos direitos humanos. O seu efetivo fortalecimento veio com o 
Protocolo de Buenos Aires de 1967, que emendou a Carta da OEA e estendeu o seu 
mandato. Assim, desde então, a CIDH foi elevada à categoria de órgão principal da 
OEA, devendo “promover o respeito e a defesa dos direitos humanos e servir como 
órgão consultivo da Organização em tal matéria” (artigo 150). Para tanto, pode 
receber e considerar queixas estatais e individuais, além de estar autorizada a dirigir-
se a qualquer dos Estados americanos a fim de obter informações e formular 
recomendações. 
A CIDH, composta por sete membros eleitos pela Assembléia Geral da OEA a 
título pessoal, passou a ser também o órgão encarregado de supervisionar o 
cumprimento da Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969, também 
conhecida como Pacto de San José. 
Vale dizer que, embora haja uma clara divisão, conforme se trate de países 
signatários do Pacto de San José ou simplesmente membros da OEA, as funções 
desenvolvidas pela CIDH é praticamentea mesma para as duas categorias. 
Praticamente, a única diferença está na base jurídica das decisões, que de um lado 
será o próprio Pacto e de outro, o Protocolo de Buenos Aires e os direitos definidos 
na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, de 1948. 
Diferentemente do sistema europeu, no âmbito da CIDH as queixas individuais 
serão apreciadas independentemente da assinatura de qualquer protocolo facultativo. 
É para o caso de queixas interestatais que se faz necessário tal compromisso. 
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No regime americano, há também uma Corte Interamericana de Direitos 
Humanos, criada e definida pelo Pacto de San José. Esta tem competências consultiva 
e contenciosa. A primeira, aberta a todos os países americanos, independentemente da 
ratificação do Pacto, destina-se tanto à interpretação das normas da própria 
Convenção Americana e de outros tratados de direitos humanos no âmbito das 
Américas, quanto à elaboração de pareceres acerca da compatibilidade dos 
ordenamentos nacionais com tais instrumentos jurídicos regionais. A segunda, 
contenciosa, só se aplica aos países signatários do Pacto e tem por escopo o 
julgamento de casos a ela submetidos, função esta muito pouco desempenhada se 
comparada à anterior. 
Neste sistema, é sintomática a evolução normativa ocorrida nos últimos anos, com 
a assinatura de diversas convenções que inegavelmente ampliam e fortalecem o 
regime de proteção regional dos direitos humanos. Em 1988, por exemplo, a 
Assembléia Geral da OEA aprovou um Protocolo Adicional sobre Direitos 
Econômicos e Sociais que complementa o Pacto de San José, através da enumeração 
de tais direitos e o estabelecimento de formas de supervisão. Mais recentemente, em 
1994, documentos como a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar 
a Violência contra a Mulher e a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento 
Forçado de Pessoas demonstram a continuidade do processo evolutivo de proteção 
aos direitos na região. 
 Por fim, é bom ressaltar a capacidade da Comissão Interamericana de Direitos 
Humanos de deslocar-se ao território de qualquer Estado americano, seja com a 
anuência ou a convite do respectivo governo, para observar in loco a situação dos 
direitos humanos. Ao final da visita, a CIDH elabora um relatório que será remetido 
ao Estado em questão. Ao longo dos anos a Comissão já realizou diversas visitas, 
sendo algumas marcantes, como no caso da Argentina, onde foi determinante para o 
fim dos desaparecimentos do regime militar. 
 Em outros regimes regionais de direitos humanos, como, por exemplo, o 
africano, os resultados alcançados não foram nada alentadores se comparados aos dos 
sistemas europeu e americano. 
 
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2.8. 
O direito humanitário, seus instrumentos legais e suas instituições 
 
 
Paralelamente à evolução normativa dos direitos humanos no âmbito das Nações 
Unidas, deu-se um avanço legal e institucional do chamado direito humanitário. 
Tendo também por objetivo final a promoção da dignidade da pessoa humana, o 
direito humanitário atua basicamente durante conflitos armados, daí ser conhecido 
igualmente por direitos humanos em tempo de guerra. Embora a regulamentação das 
condutas de guerra pelo direito internacional em muito preceda o aparecimento dos 
direitos humanos internacionais, a evolução recente de ambos os sistemas legais 
ocorreu quase que de forma paralela. De fato, as atrocidades cometidas durante a 
Segunda Guerra Mundial ensejaram também um aperfeiçoamento normativo das 
garantias individuais fundamentais durante os conflitos armadas. Assim, em 1949, 
apenas um ano após a aprovação da Declaração Universal de Direitos Humanos, 
adotam-se as quatro Convenções de Genebra para a Proteção das Vítimas de Guerra. 
Pela primeira vez na história um tratado contemplou o direito de assistência 
humanitária da população civil em conflitos armados e territórios ocupados. Houve, 
ainda, a extensão das garantias das convenções aos conflitos internos25. Consideradas 
a pedra fundamental do direito humanitário moderno, essas convenções foram 
complementadas em 1977 por dois Protocolos aprovados durante uma conferência 
convocada pelo governo suíço, historicamente reconhecido como o depositário 
natural do direito humanitário. O primeiro Protocolo tratava dos conflitos 
internacionais e proibiu, por exemplo, o uso da fome com instrumento legítimo de 
guerra. O segundo Protocolo representou o primeiro tratado individualizado sobre as 
vítimas de guerras internas. 
Tendo por objetivo principal a humanização da guerra, o direito humanitário visa 
a assegurar a proteção e assistência de prisioneiros de guerra, bem como de outros 
combatentes feridos ou doentes. A população civil, em última instância a maior 
vítima dos conflitos armados, também é alvo primordial das garantias desse sistema 
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legal, encarregado de prover-lhes, entre outros benefícios, abrigo, comida e cuidados 
médicos. O ponto fundamental, então, é que mesmo em tempos de guerra as partes 
beligerantes devem observar certos limites e regras com o objetivo de minimizar o 
sofrimento humano. 
No plano do direito humanitário, é fundamental o papel exercido pelo Comitê 
Internacional da Cruz Vermelha, tecnicamente uma associação privada suíça, que 
centra seu trabalho na assistência a vítimas de guerra, seja a soldados feridos ou 
presos seja a civis em zonas de conflito. Vale dizer, que esse Comitê atua também no 
patrocínio a tratados internacionais, tendo participado inclusive dos trabalhos de 
elaboração das Convenções de Genebra. Por fim, e conforme foi consagrado no bojo 
dessas convenções, o seu direito de visita a presos de guerras internacionais está 
assegurado no âmbito do direito internacional público. 
 
 
2.9. 
As relações entre direitos humanos e direito humanitário 
 
 
Embora tanto os direitos humanos quanto o direito humanitário objetivem grosso 
modo a promoção da dignidade humana, eles são aplicados, sob o conceito 
tradicional, em situações bem diferenciadas. 
Assim, os direitos humanos regulariam as relações dos Estados com os indivíduos 
submetidos à sua jurisdição, em todos os aspectos ordinários da vida, mas tornar-se-
iam inaplicáveis em situações de emergência que colocassem em risco a vida, a 
independência e segurança do Estado. Já o direito humanitário, governaria as relações 
em tempos de guerra entre os Estados beligerantes, bem como entre eles e os 
inimigos ou neutros de outros países, mas jamais os próprios nacionais. 
Hoje, diante de desenvolvimentos recentes ocorridos no bojo de ambos os 
sistemas legais, pode-se dizer que a clássica distinção apresentada fica por vezes 
comprometida. Nesse sentido, é possível encontrar direitos humanos de terceira 
geração que consagram, por exemplo, os direitos à paz e ao desenvolvimento, e se 
 
25 Todas as quatro Convenções de 1949 foram dotadas de um artigo 3º comum que estendia o direito 
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aplicam a indivíduos ou coletividades que não se restringem ao âmbito nacional.26 
Assim, surgem direitos solidários que podem ser alegados por povos de um Estado 
em face de outros Estados. Da mesma forma, com a adoção do Segundo Protocolo de 
1977 que cuida dos conflitos armados internos houve a expansão do alcance do 
direito humanitário para incluir também as relações entre os Estadose seus próprios 
nacionais. 
Vale ressaltar, outrossim, que a partir do final dos anos 60 verificou-se uma 
crescente interação entre direitos humanos e direito humanitário. Nesse momento, 
enquanto os direitos humanos viviam um período de grande expansão e afirmação 
após a aprovação dos Pactos Internacionais em 1966, o direito humanitário sofria uma 
certa paralisia evidenciada pela desconfiança com que foi recebida pela maioria dos 
países a proposta de aprovação de regras suplementares de proteção à população civil 
em tempos de guerra, feita pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha durante a 19ª 
Conferência da Cruz Vermelha em Nova Déli.27 
Assim, com a paradoxal retração do direito humanitário, por um lado, e a 
crescente necessidade de assistência e proteção em tempos de guerra em regiões 
como Argélia, Nigéria, Oriente Médio e Península da Indochina, por outro, não houve 
alternativa a não ser promover uma aproximação com o cada vez mais vigoroso 
regime de direitos humanos das Nações Unidas. 
Já na Conferência Internacional das Nações Unidas de Teerã, em 1968, ficou 
evidenciada a inclusão de questões relativas ao direito humanitário nos distintos foros 
de discussão. A primeira resolução da Conferência, intitulada de Respeito e 
Imposição dos Direitos Humanos nos Territórios Ocupados, conclamava Israel a 
aplicar tanto a Declaração Universal de Direitos Humanos, quanto as Convenções de 
Genebra de 1949 nos territórios ocupados. A resolução XXIII, intitulada de Respeito 
aos Direitos Humanos em Conflitos Armados, também adotada no âmbito da referida 
Conferência, afirmava em seu texto que “a paz constituía uma precondição para a 
plena observância dos direitos humanos, sendo a guerra a sua negação” e que 
 
humanitário escrito aos conflitos armado internos. 
26 René Provost. International Human Rights and Humanitarian Law. Cambridge University Press, 
2002, p.7 
27 Ibid., p.2 
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“mesmo em tempos de guerra os princípios humanitários deveriam prevalecer”. Esta 
resolução, a despeito de seu caráter vago e genérico, constitui um ponto de inflexão 
nas concepções até então existentes acerca da relação entre direitos humanos e direito 
humanitário.28 
Naquele mesmo ano, a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou a resolução 
2444, em que reafirmava o teor da resolução XXIII da Conferência de Teerã. Em 
1970, a resolução 2675, também da Assembléia Geral, afirmava explicitamente que 
“os direitos humanos fundamentais, aceitos pelo direito internacional e consagrados 
em instrumentos internacionais continuavam a ser plenamente aplicáveis em 
situações de conflito armado”. 
A partir dessa crescente e reconhecida interação entre direitos humanos e direito 
humanitário, as Nações Unidas passaram a desempenhar papel de destaque numa área 
até então considerada incompatível com os objetivos da organização e com a 
proibição de uso da força do artigo 2 (4) da Carta das Nações Unidas. 
 
 
2.10. 
A atuação dos órgãos principais das Nações Unidas na proteção aos 
direitos humanos 
 
 
2.10.1. 
O Conselho de Segurança 
 
Este órgão tem, segundo a Carta das Nações Unidas, a responsabilidade pela 
manutenção da paz e segurança internacionais. Assim, em identificando determinada 
situação como uma ameaça ou ruptura da paz, pode o Conselho de Segurança invocar 
o capítulo VII da Carta e aplicar medidas de força de caráter vinculante sobre os 
Estados, tanto no plano econômico, quanto no plano militar. Os demais assuntos que 
escapem à seara da segurança serão tratados através de resoluções destituídas de força 
cogente, elaboradas no âmbito do capítulo VI da Carta. 
Embora, num primeiro momento, a questão dos direitos humanos fuja às noções 
tradicionais de segurança, é inegável que em certas circunstâncias podem as violações 
 
28 Ibid., p.4 
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40 
 
desses direitos influir negativamente sobre a paz internacional, ensejando a aplicação 
pelo Conselho do capítulo VII da Carta. 
Mesmo durante a Guerra Fria, e apesar da relativa paralisia do Conselho em meio 
a disputas ideológicas, é possível vislumbrar dois exemplos de invocação do capítulo 
VII em episódios que de certa forma envolviam questões de direitos humanos. Assim, 
em 1968, o Conselho adota uma resolução que impunha sanções econômicas ao 
governo de Ian Smith na Rodésia, fazendo menção expressa à situação dos direitos 
humanos no país, bem como a secessão ilegítima do Reino Unido. Mais tarde, em 
1977, o Conselho aprova um embargo de armas à África do Sul, diante da “situação 
existente no país”.29 Mesmo sem uma referência explícita aos direitos humanos, 
sabia-se que a preocupação da comunidade internacional com a situação do país dizia 
respeito, principalmente, a assuntos como racismo, negação da autodeterminação dos 
povos e falta de participação política da maioria. 
Com o final da Guerra Fria houve uma clara expansão no uso do Capítulo VII 
para assuntos relativos a direitos humanos. Pode-se dizer que o Conselho de 
Segurança ampliou a noção de paz e segurança internacionais a tal ponto que fica 
difícil estabelecer uma clara distinção entre os assuntos que sejam relativos a 
segurança e os que sejam relativos a direitos humanos. Nesse sentido, segurança 
poderia referir-se também à segurança das pessoas dentro dos Estados, considerando 
o respeito aos direitos humanos, e não apenas a problemas de agressão militar 
transnacional.30 Assim, a atuação do Conselho foi marcante em conflitos cujas causas 
eram muito mais internas, e poucos reflexos tinham no plano internacional, como no 
caso da Somália, Camboja e Guatemala. Temas como liberdade de expressão e credo, 
participação política e eleições livres passaram a nortear muitas vezes os debates no 
Conselho. Desta forma, afetou-se inegavelmente o conceito de soberania estatal e o 
caráter exclusivista da jurisdição doméstica. 
Como exemplo desse novo perfil de atuação do Conselho vale citar a resolução 
794 de 1992. Aprovada no âmbito do capítulo VII, tal resolução visava a criar um 
ambiente seguro para a prestação de assistência humanitária na Somália, autorizando 
 
29 Weiss et al., op. cit., p.168. 
30 Ibid., p.168 e David Forsythe, op. cit., p.58. 
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para tanto o uso de “todos os meios necessários”. Dado o caráter predominantemente 
interno do conflito, muitos enxergam neste caso um valioso precedente para o uso do 
capítulo VII em ações puramente humanitárias, que fugissem ao alcance dos 
conceitos de ameaça à paz e segurança internacionais31. É certo, contudo, que para 
evitar constrangimentos futuros e facilitar a aprovação da resolução, o Conselho 
ressaltou o “caráter único” da situação na Somália, alegando, por exemplo, a 
inexistência de soberania estatal num Estado completamente falido e mergulhado no 
caos. 
Por fim, vale dizer, que embora tenha contribuído em certos casos para expandir o 
respeito aos direitos humanos, o Conselho de Segurança foi muitas vezes omisso 
diante de violações gritantes que deveriam ensejar uma atuação firme e decisiva. É 
inegável o caráter seletivo das incursões do Conselho, dando-se preferência a regiões 
que representem alguma ameaça a interesses dos países hegemônicos, como ocorreu 
no caso do Haiti, em que levas de refugiados preocupavam autoridades americanas. 
Em outros locais não tão atrativos,como Camboja e Ruanda, a inércia do Conselho, e 
das Nações Unidas como um todo, foi decisiva para o agravamento das crises e 
violações a direitos humanos. Os freqüentes vetos de China e Rússia a resoluções no 
âmbito do capítulo VII, em nome da defesa dos princípios da soberania estatal e não-
intervenção, demonstram, igualmente, a clara preocupação com possíveis 
interferências sobre sua política interna, muitas vezes marcada por violações a 
direitos e garantias individuais. Finalmente, é nítida a clivagem existente entre o teor 
das resoluções do Conselho, muitas dotadas de força e caráter vinculante, e a 
disposição e vontade política dos países em arcarem com os custos das mesmas, 
muitas vezes contabilizados em vidas humanas. O recuo da intervenção na Somália, 
após a morte de alguns soldados americanos em 1993, revela a inconsistência e 
fragilidade do compromisso dos Estados com as ações de caráter humanitário. 
 
2.10.2. 
A Assembléia Geral 
 
 
31 Vale notar que, formalmente, o Conselho alegou motivos de ameaça a paz e segurança 
internacionais, atendendo ao teor do artigo 39 da Carta das Nações Unidas. 
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Este órgão, além de elaborar declarações, pactos e tratados, também pratica uma 
proteção indireta dos direitos humanos, seja através da aprovação de resoluções que 
condenam ou chamam a atenção para violações de direitos, seja por meio da criação 
de agências ou convenções que financiam e lidam com esses direitos. 
Cerca de um terço das resoluções aprovadas pela Assembléia Geral tem por 
objeto os direitos humanos.32 É certo, contudo, que a eficácia de resoluções 
destituídas de força e caráter vinculante dá margem a questionamentos. Na questão do 
apartheid na África do Sul, por exemplo, é difícil aferir qual foi impacto exato das 
condenações emitidas pela Assembléia na queda do regime de segregação racial. 
Ao longo dos anos, é curioso notar a variação na ênfase dada aos direitos 
humanos pela Assembléia, segundo a composição da mesma. De 1945 a 1955, por 
exemplo, composta em sua maioria por países ocidentais, a Assembléia dava 
preferência a questões como trabalho forçado em países comunistas, em detrimento 
de discussões acerca de discriminação racial. No período seguinte, com a entrada de 
vários países em desenvolvimento recém-egressos dos processos de independência, e 
com a constituição de uma nova maioria, temas como autodeterminação dos povos e 
fim da discriminação racial passaram a permear os debates no referido órgão. 
No final dos anos 80 e início dos anos 90, ficou latente o conflito Norte-Sul, que 
contrapunha, de um lado, os defensores do direito de assistência humanitária, 
independentemente do princípio da não-intervenção e, de outro, os países que 
afirmavam a todo custo o princípio da soberania estatal. No decorrer dos anos 90, 
todavia, é possível observar um aumento no diálogo entre ambas as partes, com um 
maior comprometimento e abertura dos países do sul a temas como democracia e 
participação política. Assim, várias resoluções aprovadas endossaram tanto a 
preeminência da democracia, quanto a vinculação entre os direitos civis e políticos e 
os programas de desenvolvimento. 
 
2.10.3. 
O escritório do Secretário Geral 
 
 
32 Weiss et al., op. cit., p.173. 
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Preocupados principalmente com a promoção da paz e segurança internacionais, 
os primeiros secretários-gerais optaram por adotar um discurso mais cauteloso quanto 
aos direitos humanos, evitando assim embaraços e constrangimentos que pudessem 
comprometer o êxito de suas funções. De fato, qualquer discurso mais vigoroso sobre 
temas sensíveis, como os direitos humanos, poderia indispor de forma irreversível o 
secretário-geral com qualquer um dos blocos em disputa na Guerra Fria. Fica difícil, 
por exemplo, imaginar a posição de mediador de U Thant durante a crise dos mísseis 
em Cuba, em 1962, caso ele houvesse anteriormente condenado com veemência a 
violação dos direitos humanos na União Soviética. 
Trygve Lie e Dag Hammarskjiöld pouco interesse mostraram na promoção dos 
direitos humanos via Nações Unidas. O primeiro, tornou-se ineficaz e acabou por 
renunciar diante de sua clara oposição à invasão comunista da Coréia do Sul. Já o 
segundo, embora tenha se empenhado em assuntos de segurança no Congo Belga 
(atual Zaire), entrando em choque com a União Soviética, e tenha se dedicado 
intensamente a encontrar um papel de destaque para a ONU durante o conflito Leste-
Oeste, pareceu pouco devoto à causa dos direitos humanos. 
Kurt Wadhein, a despeito de seu passado como militar nazista, mostrou maior 
comprometimento com algumas questões relativas aos direitos humanos e direito 
humanitário, como no caso dos refugiados na África. Em seguida, o peruano Javier 
Pérez de Cuéllar foi ainda mais incisivo na proteção aos direitos humanos, tendo tido 
relevante participação em El Salvador e Nicarágua, onde percebeu que a paz e a 
segurança na região não poderiam ser dissociadas de uma maior garantia e progresso 
desses direitos. Assim, em El Salvador foi o mediador de acordos com vistas a 
promover uma reconciliação nacional, pondo fim a esquadrões da morte e outras 
violações maciças de direitos humanos. Na Nicarágua, igualmente, mediou um 
acordo de paz e o desarmamento de grupos rebeldes, bem como promoveu a primeira 
supervisão de eleições de um Estado Soberano. Por fim, patrocinou a supervisão de 
eleições no Haiti, em 1991, fato inédito num país tão devastado por guerras civis. 
Percebe-se, então, que os secretários-gerais aumentavam cada vez mais sua influência 
sobre questões de direitos, antes consideradas de competência doméstica e exclusiva 
dos Estados soberanos. Paradoxalmente, a gestão de Pérez de Cuéllar em relação aos 
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direitos humanos também foi marcada pela dispensa do ativista holandês Theo Van 
Boven como diretor do Centro de Direitos Humanos da ONU, em função de pressões 
da Junta militar argentina e de seus aliados no governo Reagan, por ter se mostrado 
um estorvo às práticas transgressoras dos direitos humanos, então correntes no país 
sul-americano. 
Boutros Boutros-Ghali foi decisivo na defesa dos direitos humanos, 
principalmente no tocante aos direitos civis e políticos. De fato, em sua Agenda para 
o Desenvolvimento, ele consagra a democracia e o respeito aos direitos de primeira 
geração como bases inexoráveis para o desenvolvimento. O secretário-geral tentou, 
assim, suprir a falta de integração entre direitos humanos e desenvolvimento nos 
programas das Nações Unidas. Coube a ele, igualmente, nomear o primeiro Alto 
Comissário para Direitos Humanos da ONU, na pessoa do equatoriano José Ayala 
Lasso, em 1994. 
Por fim, Koffi Annan deu um impulso definitivo à figura do secretário-geral 
como peça chave do regime de direitos humanos das Nações Unidas. Com efeito, ele 
colocou os direitos humanos como prioridade máxima de sua gestão, centrando todos 
os esforços de seu gabinete no avanço da proteção aos mesmos. Igualmente, exaltou a 
força da lei internacional e consagrou os valores universais de igualdade, tolerância e 
dignidade humana, conforme apresentados na Carta. Como exemplo de sua posição 
vale transcrever frase lapidar proferida durante um discurso perante a UNESCO: 
“Nossa crença na centralidade dos direitos humanos no trabalho e vida das Nações 
Unidas reside numa simples proposição: aqueles Estados que respeitam os direitos 
humanos, respeitam as leis da sociedadeinternacional. (...) Os Estados que tratam seu 
povo com respeito estão mais propensos a tratar seus vizinhos com o mesmo respeito”. 
 
A escolha da ex-presidente da Irlanda Mary Robinson, pessoa ativa e firme na 
busca de seus objetivos, para o cargo de Alto Comissário para Direitos Humanos, 
demonstra também o tamanho do comprometimento do senhor Annan com a causa 
dos direitos humanos. 
Assim, pode-se perceber claramente que a evolução da participação dos 
secretários-gerais em assuntos relativos aos direitos humanos ocorreu de forma linear 
ao longo do tempo e obedeceu a uma tendência da própria organização, que aos 
poucos se firmava na tarefa de guardiã e promotora dos direitos humanos 
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internacionais. Da mesma forma, considerando que é prioridade dos secretários-gerais 
promover e mediar a paz e segurança internacionais, é evidente que à medida que se 
reconhece a relação entre segurança e direitos humanos, dar-se-á maior destaque a 
estes na agenda dos mais altos funcionários da organização. 
 
2.10.4. 
A Corte Internacional de Justiça (CIJ) 
 
Este órgão, que tem seus 15 juízes eleitos pelo Conselho de Segurança e pela 
Assembléia Geral, e goza de certa independência, embora constitua um dos pilares do 
sistema ONU, não legou, até o presente momento, qualquer contribuição importante 
para o histórico e a evolução dos direitos humanos. Isto se deve, em parte, ao fato de 
só os Estados terem assento perante a Corte, os quais jamais demonstraram muito 
interesse em processar ou ser processados em cortes internacionais, principalmente no 
âmbito de direitos humanos. Mesmo hoje, com o fim da Guerra Fria, e considerando 
um aumento no número de casos submetidos perante a Corte, ainda é raro ocorrer um 
pronunciamento decisivo sobre direitos humanos. 
O estatuto da Corte prevê que os Estados podem reconhecer voluntariamente a 
jurisdição da corte para julgar acerca de um ou vários assuntos e pendências em que 
forem partes. Cumpre notar, contudo, que muitos poucos países adotaram tal 
procedimento. Mesmo na hipótese de alguns tratados em que se define a CIJ como o 
foro próprio para dirimir litígios e julgar os casos sob o tema em questão, surgem 
ressalvas excludentes de jurisdição. Exemplo disso é a Convenção sobre Genocídio 
de 1948, que prevê em determinado artigo a jurisdição compulsória da CIJ para os 
casos previstos no tratado, e que foi deliberadamente objeto de ressalva por parte dos 
Estados Unidos, que se recusou a ficar adstrito à competência da referida Corte. 
Conclui-se, então, que os Estados ainda não estão dispostos a submeter sua 
soberania à decisão de juízes independentes de várias nacionalidades, que julgam 
conforme a lei internacional e não em função dos interesses ou pressões dos distintos 
países. 
 
2.10.5. 
O Conselho Econômico e Social (ECOSOC) 
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Embora constitua um dos órgãos principais do sistema das Nações Unidas, este 
Conselho passou a funcionar basicamente como um canal de ligação entre seus 
órgãos subsidiários e a Assembléia Geral. No tocante aos diretos humanos, três 
decisões importantes resumem sua atuação desde 1945. A primeira definiu que a 
Comissão de Direitos Humanos seria composta por representantes dos Estados e não 
por especialistas. Ficava caracterizado, assim, o caráter político e não meramente 
técnico dessa importantíssima Comissão subsidiária do ECOSOC, o que será mais 
largamente discutido no âmbito do capítulo seguinte. Mais tarde, o Conselho 
Econômico e Social adotou a resolução 1235 que autorizava a Comissão a receber 
queixas específicas sobre países também específicos. Por fim, a resolução 1503 
permitiu que a Comissão analisasse reclamações individuais, sempre que 
evidenciassem um padrão consistente de violações flagrantes de direitos humanos. 
Vale destacar, também, a existência, no âmbito do Conselho, de um comitê 
encarregado de decidir quais ONG’s serão dotadas de caráter consultivo dentro do 
sistema das Nações Unidas, tendo assim a possibilidade de participar das reuniões e 
fazer circular documentos dentro da Organização. É evidente que este comitê foi 
muitas vezes objeto de pressões por parte de países interessados em negar o “status” 
consultivo a ONG’s que pudessem investigar ou denunciar fatos que lhes causassem 
embaraço. 
Em suma, pode-se dizer que o Conselho Econômico e Social não conseguiu 
promover uma maior integração dos direitos humanos com o campo econômico e 
social no sentido mais amplo. Aliás, é possível notar que o Conselho tem falhado até 
mesmo na sua função mais genérica de promover, guiar e coordenar os distintos 
órgãos e agências especializadas da ONU.33 Com tudo isso, verifica-se um certo 
esvaziamento de suas atribuições, perdendo importância não apenas para órgãos não 
diretamente submetidos a ele, que se reportam diretamente à Assembléia Geral, mas 
também para outros que, em tese, lhe são hierarquicamente inferiores, como é o caso 
da Comissão de Direitos Humanos. 
 
33 Declan O’Donovan. The Economic and Social Council. In: Philip Alston (Org.). The United Nations 
And Human Rights: A Critical Appraisal. Clarendon Paperbacks,1995, p. 122. 
 
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Uma vez apresentados os aspectos gerais e propedêuticos da proteção 
internacional dos direitos humanos, cumpre passar no próximo capítulo a um estudo 
mais detalhado do regime de direitos humanos das Nações Unidas, tendo como 
principal objeto de análise a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas em 
Genebra. 
Para Jack Donnelly: 
“The Commission on Human Rights has (…) firmly established itself as the single most 
important United Nations organ in the human rights field, despite its subordinate status 
as one of several specialized (‘functional’) commissions answerable to the Economic and 
Social Council and, through it, to the General Assembly”34 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
34 Philip Alston, op. cit., p.126 
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