Buscar

Texto 02 Repensando as praticas da psicologia juridica na pos modernidade

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 9 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 9 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 9 páginas

Prévia do material em texto

30 Revista do UNIPÊ, 12 (2), 2008.
REPENSANDO AS PRÁTICAS DA PSICOLOGIA JURÍDICA NA PÓS
MODERNIDADE
Giovanna Marafon/UNIPÊ
Dávila Teresa de Galiza F. Pinheiro/UNIPÊ
RESUMO
Este trabalho aborda o movimento de construção histórica da Psicologia Jurídica, apresentando
as forças que interagiram nesse contexto, bem como os conceitos utilizados para se referir a
tal área, seus espaços e possibilidades de atuação. Situa as articulações entre Psicologia e
Direito, as demandas que motivaram essa aproximação e as práticas que se estabeleceram
nesse campo. Retoma a perícia como principal atividade realizada em Psicologia Jurídica,
porém não a única, afirmando a necessidade de se implementarem novas práticas psicológicas
comprometidas com o bem-estar e as potencialidades do ser humano nas questões que se
relacionam com o Direito. Nesse atravessamento, descortinam-se novos fazeres e a
interferência de outros saberes, compondo um campo de trabalho transdisciplinar.
Palavras-chave: Direito, perícia, transdisciplinaridade.
RETHINKING THE PRACTICES OF JURIDICAL PSYCHOLOGY IN POST
MODERNITY
ABSTRACT
This work is about the movement of the historic construction of Juridical Psychology, presenting
the forces that have interacted in that context, as well as the terms used to refer to that are as,
its spaces and possibilities for action. It establishes an articulation between Psychology and
Law, the needs that motivated this approach and the practices that were established in that
field. It incorporates the forensic evaluations as the main activity carried out in Legal Psychology,
stating the need to implement new psychological practices committed to the welfare and
potential of the human being in matters concerned to the Law. In that intersection, new actions
and interference from other knowledge are shown, composing a field of transdisciplinary
work.
Key-words: Law, forensic evaluation, transdisciplinarity.
 31Revista do UNIPÊ, 12 (2), 2008.
Introdução
A escrita deste texto está comprometida com o movimento histórico de constituição e
afirmação da Psicologia Jurídica, considerada uma disciplina emergente e entendida como
um ramo da Psicologia que se caracteriza por sua interface com o Direito. Para isso, algumas
passagens pelas engrenagens históricas que instituíram a Psicologia como ciência serão
necessárias para, enfim, percorrer a trilha da Psicologia Jurídica, bem como seus desvios,
junto ao Direito até os dias atuais.
A Psicologia e um pouco de História
A Psicologia é considerada uma ciência recente quando comparada às demais. Além da
forte influência da Filosofia e da Religião, posteriormente, também a Biologia contribuiu de
maneira peculiar nesse contexto em que o mundo aspirava compreender o comportamento
humano.
Foi em 1879, com a criação do primeiro laboratório de Psicologia Experimental por
Wundt, na Universidade de Leipzig, que teve início, oficialmente, a história da Psicologia
enquanto ciência moderna. Os estudos nesse campo orientavam-se na investigação
experimental dos processos psicológicos relacionados à análise do comportamento, ao
desenvolvimento psicológico, à aprendizagem, percepção, memória, motivação, emoção,
inteligência etc.
Aqueles estudos eram realizados por intermédio de instrumentos laboratoriais de exame
que, rapidamente, foram substituídos por simples testes. Conforme assevera Jacó-Vilela (2002,
p. 16):
Os testes indicam o prescindir dos instrumentos de que se achavam
dotados os laboratórios (mecânicos, elétricos), transformando-se em
‘testes de lápis e papel’, cuja facilidade de aplicação – tanto em
termos de local quanto em relação à quantidade possível de pessoas
testadas ao mesmo tempo – faz com que se tornem a técnica
privilegiada de produção dos saberes e práticas psicológicas.
A partir de então, houve uma verdadeira aproximação da Psicologia ao Direito. Tal
aproximação, na verdade, traduzia o interesse do Direito em descobrir como apreciar a
qualidade dos testemunhos de indivíduos envolvidos em processos judiciais e essa foi uma
questão direcionada à Psicologia, a qual procurou respondê-la através da aplicação de testes
psicológicos.
Que demandas aproximaram Psicologia e Direito?
Diante desse panorama, no final do século XIX, desponta a primeira grande articulação
da Psicologia com o Direito: a Psicologia do Testemunho. Esta tinha a finalidade de avaliar,
por intermédio do estudo experimental dos processos psicológicos, a veracidade dos
testemunhos, as falsas confissões, as simulações ou mesmo prever certos tipos de
32 Revista do UNIPÊ, 12 (2), 2008.
comportamentos para que assim fosse possível uma eficaz atuação e aplicação da norma
jurídica.
Na clássica obra Manual de Psicologia Jurídica, de 1945, que marca a formulação
da Psicologia Jurídica como disciplina e área de estudo, Emílio Mira Y López afirma que o
testemunho dado por uma pessoa sobre um fato está sujeito a cinco fatores essenciais, quais
sejam: o modo como aquela pessoa percebe determinado acontecimento, o modo como sua
mente foi capaz de conservar o fato, a maneira de evocá-lo, o modo como quer expressá-
lo, e, por fim, o modo como pode expressá-lo.
Todos esses fatores foram estudados por influentes mecanismos advindos da Psicologia
Experimental que, no começo, era aplicada de modo quase que exclusivo aos interrogatórios
judiciais que abordassem casos delituosos, pois nesse período o estudo sobre a personalidade
do indivíduo que praticava uma conduta delituosa, o delinqüente, estava em evidência. Mira
Y López denominou esse estudo de Psicologia Anormal (termo esse não mais em uso), o
qual era considerado um ramo da Psiquiatria.
A Psicologia Anormal regeu a vida do Direito durante muito tempo e até hoje é
possível encontrar resquícios dessa teoria, a qual entendia que havia uma patologia individual
ou anormalidade em todo aquele que rompia com as regras sociais cometendo delitos. Tal
teoria trouxe sérias conseqüências, uma vez que culpabilizava individualmente certa pessoa
pela prática de um delito, acreditando que esta o praticava pelo fato de possuir uma anomalia
intrínseca. Descartavam-se, assim, quaisquer conexões e fatores externos que compusessem
um contexto mais amplo, relevante para o entendimento da criminalidade e da relação das
pessoas com o crime.
Naquele período, o ideário positivista, inspirado nas Ciências Naturais, influenciou
sobremaneira as Ciências Humanas e Sociais ao estabelecer a necessidade de aperfeiçoar os
instrumentos de exame, como as perícias, as quais expandiram sua atuação aos mais diversos
setores da Psicologia e também do Direito.
Como bem pontuou Brito (2001, p. 120):
A perícia psiquiátrica, inicialmente restrita à investigação da
responsabilidade penal do adulto, estende-se, a partir do final do
século XIX, a outras áreas do Direito, visando os dispositivos de
correção a serem aplicados e a aferição de “verdades” que deveriam
auxiliar os trâmites jurídicos, percurso recomendado aos primeiros
psicólogos que se aproximaram do campo do Direito.
É possível depreender de tudo isso que havia o anseio por técnicas cada vez mais
apuradas que possibilitassem a obtenção de dados exatos, a fim de auxiliar os operadores do
Direito, tendo em vista a fé depositada nos diagnósticos advindos da avaliação psicológica.
Portanto, observa-se que, no princípio, a Psicologia era uma ciência totalmente identificada
com a prática de psicodiagnósticos.
Nessa primeira fase, a maioria dos psicólogos desempenhava suas funções como
auxiliares dos psiquiatras, o que acontecia da seguinte forma: médicos psiquiatras eram os
responsáveis pelas perícias e os psicólogos eram seus auxiliares, realizando apenas a testagem
(aplicação de testes psicológicos).
 33Revista do UNIPÊ, 12 (2), 2008.
Psicologia Jurídica: de que se fala?
Como ainda não havia o cargo de psicólogo jurídico junto ao Poder Judiciário, durante
muito tempo, a práticada Psicologia restringiu-se à realização de perícias feitas por psicólogos
autônomos, os quais atendiam incontáveis solicitações de pedidos de avaliação acerca de
disputa de guarda de crianças, análise da cessação da periculosidade, interdições etc.
No exercício de tais práticas, o termo mais usual para se definir essa área foi Psicologia
aplicada ao Direito. Percebe-se aí uma relação de subordinação, na medida em que a
Psicologia Jurídica apresentava-se como disciplina a serviço do Direito, uma disciplina
meramente auxiliar.
Não se quer dizer com isso, que a Psicologia Jurídica não possa responder às demandas
do jurídico, muito pelo contrário, o que se objetiva esclarecer é que ela não se deve paralisar
na relação com o saber jurídico, mas transcender as solicitações da seara jurídica, através de
um constante diálogo que é ao mesmo tempo psicojurídico.
Nesse sentido, assevera Trindade (2004, p. 27):
A Psicologia Jurídica, na sua totalidade, não é apenas um instrumento
à serviço do jurídico. Ela analisa as relações sociais, muitas das quais
não chegam a serem selecionadas pelo legislador. Em outras palavras,
não se jurisdicizam, isto é permanecem destituídas de incidência
normativa e constituem a grande maioria de nossos comportamentos
sociais.
Assim, com o passar do tempo, a Psicologia Jurídica tem procurado se afastar das
funções exclusivamente psicotécnicas, orientando-se cada vez mais para o bem-estar do
homem e suas potencialidades, trazendo uma preocupação ética com o seu fazer. E, com o
Direito, busca-se uma relação baseada na complementaridade e não na subordinação, criando,
desse modo, um terreno propício para o diálogo transdisciplinar, não-subordinante.
Logo, a Psicologia Jurídica vai muito além do estudo do comportamento humano no
âmbito da Justiça, pois esse se configura em uma das manifestações da subjetividade, a qual
conforme ensinamentos de Bock, Furtado e Teixeira (2002, p. 23) refere-se ao “mundo de
idéias, significados e emoções construído internamente pelo sujeito a partir de suas relações
sociais, de suas vivências e de sua constituição biológica; é, também, fonte de suas manifestações
afetivas e comportamentais”.
De acordo com o pensamento de Michel Foucault, em sua obra intitulada A verdade
e as formas jurídicas (1974), França (2004, p. 76) traz o seguinte entendimento:
Tanto as práticas jurídicas quanto as judiciárias são as mais
importantes na determinação de subjetividades, pois por meio delas
é possível estabelecer formas de relações entre os indivíduos. Tais
práticas, submissas ao Estado, passam a interferir e a determinar as
relações humanas e, conseqüentemente, determinam a subjetividade
dos indivíduos.
Por esse prisma, entende-se que a Psicologia Jurídica interfere nas relações entre os
indivíduos como algo oriundo das próprias práticas jurídicas, as quais também são capazes
de determinar a subjetividade dos sujeitos envolvidos. Por conseguinte, a Psicologia Jurídica
vai se preocupar igualmente em enfocar “as determinações das práticas jurídicas sobre a
34 Revista do UNIPÊ, 12 (2), 2008.
subjetividade, não mais enfocaria apenas o comportamento do indivíduo para explicá-lo de
acordo com a necessidade jurídica” (FRANÇA, 2004, p. 77). Essa idéia ultrapassa a
perspectiva que o Direito possui em relação à Psicologia Jurídica.
Longe de apresentar um conceito formado e acabado acerca da Psicologia Jurídica,
tarefa praticamente impossível, preferiu-se trazer à tona as forças que disputaram terreno na
construção desse novo campo. Interessante se faz expor a constatação de Thomas Herbert
(1972) citado por Arantes (2005, p. 18-19) acerca da própria Psicologia, que nos permite
lançar questões também à Psicologia Jurídica:
(...) colocar a uma ciência as questões ‘quem és tu?’, ‘por que estás
aqui?’ e ‘quais suas intenções?’ pode parecer impertinência à qual
ela tenderia a responder que ‘está aqui porque existe’ e quanto às
suas intenções ‘ela não as tem’ mas apenas problemas a resolver’.
No entanto, considera importante a distinção feita por Louis Althusser
entre ciência desenvolvida e ciência em constituição. Na ciência
desenvolvida o objeto e o método são homogêneos e se engendram
reciprocamente, o que não acontece com as ciências em
desenvolvimento, como a Psicologia.
Isso mostra o quão difícil se faz tecer qualquer tipo de conceituação acabada em
torno da Psicologia Jurídica, vez que surge de encontros históricos entre Psicologia e Direito.
Nesse percurso não-linear, cabe interrogar os saberes e fazeres da Psicologia Jurídica,
desnaturalizando verdades e abrindo passagem para novos fluxos e novas práticas.
Psicologia Jurídica ou Psicologia Forense?
É importante ressaltar, sucintamente, a discussão existente entre Psicologia Jurídica e
Psicologia Judicial, Forense ou Legal. Embora alguns autores confundam referidas
terminologias, essas são duas modalidades de atuação com diferenças marcantes.
A Psicologia Judicial, Forense ou Legal que inicialmente se ligava à Psicologia Criminal
e à Psicologia do Testemunho é aquela que aparece no intuito de facilitar a inserção ou
aplicação dos processos psicológicos à prática de trabalho do jurista.
 O termo forense, conforme o Pequeno Dicionário Jurídico, quer dizer: “pertencente
ao foro judicial ou que nele é usado; relativo a juízes e tribunais”, logo mostra-se como uma
terminologia que restringe o campo de atuação da disciplina, uma vez que o profissional
ligado a essa área atuaria exclusivamente na conjuntura do fórum, tendo, portanto, sua atividade
limitada ao referido contexto.
De outra banda, encontra-se a Psicologia Jurídica que trata da fundamentação
psicológica e social do Direito e da Justiça. A palavra jurídica é bem mais abrangente, pois
envolve além de procedimentos inerentes aos Tribunais, aqueles que são de interesse do
jurídico, sem, contudo, serem frutos da atividade do jurista.
Deste modo, a psicologia jurídica interessa-se por temas e atuações não apenas
circunscritas aos Tribunais de Justiça, mas, também àquelas que envolvem as instituições
jurídicas – Conselhos Tutelares, prisões, abrigos, unidades de internação, organizações não-
governamentais, instituições de cumprimento de medidas socioeducativas para adolescentes
 35Revista do UNIPÊ, 12 (2), 2008.
que cometeram atos infracionais, entre outras. E assim os temas que interessam à Psicologia
Jurídica não se restringem ao âmbito forense.
A perícia psicológica: novamente ou, ainda, uma prática a ser transposta?
A prática da perícia, conforme mencionado anteriormente ganhou espaço em virtude
da influência do ideário positivista predominante no século XIX, em que se almejava obter
dados cada vez mais exatos no intuito de dar maior sustentabilidade e exatidão às decisões
jurídicas. Desse modo, “a perícia estabeleceu o campo de atuação da Psicologia Jurídica na
busca da verdade através da prova pericial” (SILVA, 2003, p. 7).
Nesse período, o exame pericial era realizado visando principalmente averiguar as
condições dos indivíduos acerca de sua sanidade mental, capacidade de discernimento e
periculosidade. Conforme estudos de Rauter (1994), Altoé(2001) lembra-nos que os exames
periciais quando feitos nas penitenciárias e hospitais psiquiátricos penais eram usados para
instruir processos de livramento condicional, comutação de penas, indulto e, freqüentemente,
para avaliar se um detento poderia sair da cadeia ou não, se ele poderia retornar ao chamado
convívio social, se ele merecia uma progressão de regime etc.
Destarte, o que se constata é que a grande maioria do conteúdo destes laudos advindos
de exames criminológicos trazia uma densa carga de preconceito, além de estigmatizar a
pessoa que ia para a prisão. Ademais, muitas vezes tais laudos nada tinham de teor científico,
pois repetiam a mesma visão preconceituosa advinda da própria sociedade.
Com o passar do tempo, a prática da perícia expandiu-se em múltiploscontornos.
Ela não mais se fixava somente na elaboração de psicodiagnósticos de natureza criminal,
tornava-se, sim, uma prática freqüente em diversos setores da Psicologia, tais como: escolar,
clínico, industrial e, notadamente, jurídico. Na esfera jurídica, ainda são freqüentes as
solicitações de psicodiagnósticos em torno de pedidos de interdição, incapacidade para os
atos da vida civil, guarda de filhos, indenização, cessação de periculosidade, dentre outros.
A perícia visa a assessorar os órgãos judiciários, dando subsídios através de
conhecimentos técnico-científicos especializados, no intuito de levar, para os autos de um
processo, informações, as quais muitas vezes escapam ao saber jurídico, servindo, dessa
forma, para orientar a tomada de decisão por parte da autoridade judicante. Esta não está,
entretanto, obrigada a seguir o laudo pericial, uma vez que o magistrado norteia-se pelo
Princípio do Livre Convencimento Motivado, podendo, por conseguinte, criticar, acolher ou
rejeitar o laudo, de acordo com seu convencimento.
Válido ressaltar que o laudo consiste no resultado de uma perícia, em outras palavras,
é a forma de materialização da perícia no processo, cujo objetivo é apresentar resultados
conclusivos (diagnósticos) acerca da matéria posta em análise, servindo, de prova ou mesmo
de consulta elucidativa sobre determinado ponto. De acordo com Cruz (2002, p. 272):
No exercício da peritagem e na elaboração do laudo, cabe ao psicólogo
organizar as informações decorrentes da avaliação psicológica
realizada em linguagem cientificamente aceitável, pautando-se pela
objetividade nas afirmações, argumentos e descrições dos dados
coletados. Enquanto resposta a um quesito legal é da natureza do
laudo subsidiar e contribuir à tomada de decisão judicial.
36 Revista do UNIPÊ, 12 (2), 2008.
Todo esse cuidado na realização da perícia e na elaboração do laudo se faz necessário,
tendo em vista a possibilidade de invalidação dos mesmos, em caso de comprometimento da
qualidade e do teor dos instrumentos utilizados. Igualmente, é de fundamental importância
uma leitura interdisciplinar, capaz de unir os conhecimentos produzidos pela ciência psicológica
e jurídica, justamente visando à compreensão do diagnóstico produzido.
Do ponto de vista legal (Código de Processo Civil), a perícia, notadamente a
psicológica, constitui o único recurso previsto, passível de utilização pela Psicologia Jurídica,
como forma de auxiliar a Justiça (CEZAR-FERREIRA, 2004, p. 118). Isso se explica em
função de o Código de Processo Civil Brasileiro (2002) apresentar no seu Livro I: Capítulo
V do Título IV, intitulado: Dos Auxiliares da Justiça, através dos arts. 139 e 145 a 147, o
perito como auxiliar da Justiça, trazendo ainda os critérios referentes à habilitação e nomeação
do mesmo; como também o Capítulo VI, do Título VIII, intitulado como Das Provas, indicar
nos arts. 420 a 439, todo o procedimento para a realização da prova pericial.
Cabe lembrar também que, com a revisão de 1984 e a entrada em vigor da Lei de
Execuções Penais (LEP), os presos e internados para o cumprimento de suas sanções passaram
a ter direito à assistência material e à saúde, bem como assistência jurídica, educacional e
religiosa. Conforme aponta Kolker (2005), curiosamente, não há menção à assistência
psicológica. Fala-se somente em classificação dos apenados, por meio da avaliação a ser
feita por uma Comissão Técnica de Classificação (CTC), presidida pelo Diretor do
estabelecimento prisional e composta, no mínimo, por dois chefes de serviço, um psiquiatra,
um psicólogo e um assistente social. Além de avaliar para orientar a individualização da
execução penal, até 2003, coube à CTC também realizar exame criminológico com presos
com direito a livramento condicional ou progressão de regime. Desde 2003, esta deixou de
ser uma obrigação, permitindo tais profissionais desenvolverem trabalhos terapêuticos e de
ressocialização com os apenados.
 A criação do cargo de psicólogo jurídico se deu somente a partir de 1990, quando
os mesmos passaram a atuar como funcionários concursados, nas diversas Varas: Infância e
Juventude, Família e Execução Penal, desempenhando atividades distintas daquelas exercidas
pelos peritos autônomos.
Assim, a atuação nessa nova área de saber pode se fazer por outros caminhos e
possibilidades, que não somente a realização de perícias. Como bem demarcou França (2004,
p. 75), a realização da perícia é uma das possibilidades de atuação da Psicologia Jurídica,
mas não a única.
Tudo isso encontra respaldo ao se reconhecer na perícia uma forma limitada e
reduzida de produzir conhecimento a partir de um recorte parcial da realidade individual, a
qual não vislumbra a totalidade humana, mas tão somente uma parte dela. E o que é pior, essa
visão é tratada, por muitos, como a verdade absoluta sobre o indivíduo.
Hoje, a própria Psicologia reconhece que teve suas práticas e seu olhar historicamente
direcionados para a identificação das deficiências e patologias humanas. Exige-se, portanto,
da Psicologia Jurídica uma postura mais crítica, repensando a prática da perícia, distante das
antigas funções, puramente psicotécnicas e, assim, reafirmando o compromisso da Psicologia
com a ética e o bem-estar do ser humano.
 37Revista do UNIPÊ, 12 (2), 2008.
Apostas finais: atuações psicojurídicas e a construção transdisciplinar do
conhecimento
Sendo assim, também têm sido possibilidades de atuação em Psicologia Jurídica:
colaborar com o planejamento e a execução de políticas preventivas de combate à violência,
à criminalidade e à exploração sexual infanto-juvenil; criar condições favoráveis ao
cumprimento efetivo dos direitos humanos; investigar as implicações do jurídico sobre a
subjetividade individual; realizar a mediação por intermédio de intervenções que contribuam
para que, eticamente, as pessoas se responsabilizem por seus conflitos e procurem resolvê-
los; além de acompanhar e oferecer a devida orientação para cada caso pertencente aos
diversos setores da Justiça, tais como: separações, divórcios, processos de disputa de guarda,
adoção, violência de gênero, tratamento de pessoas com transtornos mentais que cometeram
crimes etc.
Apesar da resistência para se sintonizar saberes produzidos em diferentes loci numa
esfera transdisciplinar, a aposta está na força que os atravessa e faz implodir as certezas
construídas, deixando aparecer novas questões e novas formas para respondê-las. Assim,
um novo campo de conhecimento e de atuação psicojurídico, não somente psicológico, nem
somente jurídico, desponta no cenário atual. Mostra-se com uma forma recém desenhada e
temporária, passível, ainda, de ser afetada por novos encontros, com a Antropologia, a
Criminologia Crítica, a Sociologia Jurídica, a Filosofia, os Direitos Humanos, a Saúde Mental,
entre outros.
Referências
ALTOÉ, S. Atualidade da psicologia jurídica. PsiBrasil – Revista de pesquisadores da
Psicologia no Brasil. Juiz de Fora, ano I, n. 2, jul-dez, 2001.
ARANTES, E. Pensando a Psicologia aplicada à Justiça. In: GONÇALVES, Hebe Signorini;
BRANDÃO, Eduardo Ponte (Orgs). Psicologia Jurídica no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro:
NAU, 2005.
BOCK, A. M; FURTADO, O; TEIXEIRA, M. L. Psicologias: uma introdução ao estudo
de psicologia. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
BRASIL, Código de processo civil. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Leis/L5869.htm. Acesso em 14 de março de 2008.
BRITO, L. M. T. Psicologia Jurídica: desafios do cotidiano. In: SOARES, J. C.; EWALD,
A.; DAMAS, C. (Orgs). Anais das terças transdisciplinares: experimentando a fronteira
entre a Psicologia e outras práticas teóricas (2000-2001: Rio de Janeiro). Março 2000 –
Junho 2001. Rio de Janeiro: UERJ, NAPE, 2001.
CEZAR-FERREIRA, V. Família, separação e mediação: uma visão psicojurídica. São
Paulo: Método, 2004.
38 Revista do UNIPÊ, 12 (2), 2008.
CRUZ, R. M. Perícia empsicologia e laudo. In: CRUZ, R. M.; ALCHIERI, J. C.; JÚNIOR,
J. J. S.(Orgs). Avaliação e medidas psicológicas: produção do conhecimento e da
intervenção profissional. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002.
FRANÇA, F. Reflexões sobre Psicologia Jurídica e seu panorama no Brasil. Psicologia:
Teoria e Prática, vol. I, n. 1, p. 73-80, 2004.
JACÓ-VILELA, A. M. Os primórdios da psicologia jurídica. In: BRITO, L. Temas de
Psicologia Jurídica. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1999.
KOLKER, T. A atuação dos psicólogos no sistema penal. In: GONÇALVES, H &
BRANDÃO, E. P. Psicologia Jurídica no Brasil. Rio de Janeiro: NAU, 2004.
PAULO, Antonio de. Pequeno Dicionário Jurídico. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.
SILVA, D. M. P. Psicologia Jurídica no processo civil brasileiro: a interface da Psicologia
com Direito nas questões de família e infância. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.
TRINDADE, J. Manual de psicologia jurídica para operadores do Direito. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2004.
Recebido: 01.04.2008
Avaliado: 18.07.2008

Continue navegando