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TEMAS DE PSICOLOGIA, JURIDICA Organização LEILA MARIA TORRACA DE BRITO UNIMEP BIBLI:JTfCA________.-.--------1 'r """),"-",~- N.o de ::)'-I::) ", ::J -m:~-"t'\;'----•...-~,~"'A" f\.k.,; Chamada U 1./-1ci) 1- ww '. -:.'-=---------------- mu .mmhn.h G:.(\,~ ._um_m _ Tombo _u....1-1'001'OQ-----u_---- RELUME ~ DUMARÁ Rio de Janeiro 1999 INTRODUÇÃO OS PRIMÓRDIOS DA PSICOLOGIA JURíDICA AnaMaria Jacó-Vilela' _Q..:m:inçípio~~pjªç"n1sUW..12ire.it,QJJlQ.de.mo~IJ.iyersalid<ldedo homemnel.e.E-presentadº-=-.s..1Jjci1.Q.Jj.aJ.aZ.ãQJiYre~iguª-1..aQs..Jl~mais ..s.er<:shnlll;.]nos.Esseprincípio,decertafonna,sinalizaaresultanteda- quelesmovimentosque,dosestertoresdaIdadeMédiaaoséculoXVIII, vãoconstituindoo ideárioliberaldasociedadeburguesa. Explicitandomelhorestaproposição:encontr<llllOSn;.]Td;.]deMr\di::! 11111;']visi'íode m11nc!oholist~l,tot::!li7::!nte,emqlle::!reIieii'íoenquanto .YalOL.ellC..OIDp<lSSaas demaise.sfrrasdavida. A representaçãode ho- memnesse.ll.I1ÍY..eISCLeIa,...p.ortanto,...s:ubjugada.à.r.ecte..deJelações.so.ciais em.que.cada.nill.est<lv<IinseridQ,..illl.s.eja,..aidel11ida.d.e..p~s.slli}1secons:- -1ituíaapartir dosesp<lçossoci<lis- osestamentos,afamília,a comuni- dade- Ukupa.dos_Ilo.:uadaJillLA.identidade.....neste...s.entido•..se...situaya _e~OlLd.as...P.QS.içõ.s<s...r.elatiyas(nobre,servo,pai, filho, artesão...), istor\,er;.]clem;.]rr.;.Jc!::!reI::!difPrença orror.essoc!efr:Jement:Jçi'íodessemundohoJist:J,rebcion:J]- pro- cessoespecíficodas sociedadesocidentaismodernas1 - ~.ns1i1ui ~QIlLaS.llQ"\[ílSexplic<lçõesr:JT:Jesfer:Jsdonmnclohnlll::Jno,explic<lções que.JiUp.s<nlmo signific<ldoexclusivo<Itéentãod<ldopela..religião.As- sim, sãomomentosimportantes,nesselongoperíododetransição,a revoluçãocientíficadeGálileu (adescobertadasleis danaturezapela ~.~ observaçãoe experimentação,ou seja,não mais a verdaderevelada pelasAutoridadesda Igreja),a expansãodo capitalismo- desuafade mercantilparaa industrial(implicandonovaformadeorganizaçãodo trabalho,agora"racional"-, arefornlaprotestante,principalmenteem •ProfessoradoInstitutodePsicologiadaDERJ; doutoraemPsicologiapelaDSP. II ANA MARIA JACÓ,VILELA suaproposiçãoda"liberdadedeconsciência"e,por fim, asrevoluções políticasque,emboraocorrendoemperíodosdiferentes(a Inglesano séculoXVII, a Americanae a Francesano séculoXVIII), explicitam umanovavisãodehomem:aquelequetem,comodireitosnaturais,a igualdadeea liberdade. O~, portanto, surge_coffi-a--quebra.da.tradição embasadan~religião.Nestemundonãohámaisposiçõesestáveis,fi- xas; P, 11mm11nrlop,mmovimp,nto- seugrandesímbolosãoexatamente "as grandesnavegações",rompendocomasamarrasque,no uníverso feudal,cerceavamohomem.TOCQUEVILLE sintetizabrilhantemen- te estagrandetransformação:"A aristocraciafizera detodososcida- dãosuma longa cadeia,quesubiado camponêsao rei; a democracia desfaza cadeiaepõecadaeloàparte"(1977:387). É bom ressaltarque esseprocessonão ocorreudeforma linear e simples,comoadescriçãosucintaacimapodedaraentender.As análi- -0k- sessobreesseperíodoapontamcomplexidadese contradiçÇíesa que ~ I" nãosefez referência,poiso objetivo,aqui,éapontarparaumávis.ão,d~ mundoregularmenteassociadaà sociedadeocicl~ntalmoderna,cujo eixo centralé o individu·alism()~{}1.~'''sija:/iiãô~l~if~,perspe~~i~':.~? homemdefi~dºJ~~osições queocu~, masa presenç-ª,.QQ.indiví- ~r_l!l()r.ªt Ü1dt<pe[lg'~1l!~'autô~'!..~02_~~I1~~~doJi~~~rbi!r~ ~_?st~ie~t()jll!Íclico,o cidagi:lQpQrtª,c1()rda razão,cuja interaçãocom_ outros- igualmenteindivíduos- nã~ser~gulª_n!ªi~PQ~lJ.!!l~éticavin~ culadaà religiãoeporrelaçõesfamiliare§Qudegrupº.snacomunidade ._._."' n_ n_ ._~ -----.. t!élc!icional.S_e,nhoresdarazão,os indivíduo~agoraseassociam,esta- belecemconlrato_errLSociedade--)(íZA.lJN"I Estaconcepçãodeindivíduo,então,seapresentacomoumaredes- cobertadanaturezahumana: o indivíduolivre e igualé, portanto,partedanatureza.Uma natureza, porém,desencantada,desligadade qualquercosmologiareligiosa,cujas leis de funcionamentosão,por isso,passíveisdeseremcompreendidas e desvendada~pelarazãohumana.(00') O indivíduo-cidadãoé sujeito darazãoemdoissentidos- porqueestá,enquantohomemnatural,sub- metido(sujeitoà) razão(pois é compreensívelatravésdela)e ao mes- mo temposujeitao mundo(e a si próprio)atravésda razão.Esta, na verdade,seráa basede suaautonomia.Livre-arbitrioe razãoseinter- ligam de formainextricável(RUSSO, 1997:13). 12 .\ Os PRIMÓRDIOS DA PSICOLOGIA JURíDICA olemadaRevoluçãoFrancesasintetizaa resultantedesteprocesso emqueas"Luzes" secontrapõemàtradição.Comarazão,o liberalis- moeoindividualismosefirmamcomopnncípiosdeorganizaçãopolí- tica e econômica,de organizaçãodavida eu; socied.ade.Entretanto,estesprincípiossevêememcontradiçãoconyumavidasocialmarcada por profundasdesigualdadese injustiça~A afirmaçãoda igualdade- intrínsecaànaturezahumanaredescoberta- produzanecessidadede sepensarasdiferençasexistentes. O Romantismoalemãoé umadessasalternativas,ao sublinhara singularização,uma"desigualdade"sinalizadorado queé "próprio", peculiaracadaum.Engendra-seassimumaconcepçãodeque,mesmo garantidaa igualdadejurídica, sepodeapontara diferença,situada, então,em outroplano: na interioridade.SIt"fMEL (1971)denomina uniqueness(individualismoqualitativo)essavisãoromântica,emcon- traposiçãoàsingleness,o individualismoquantitativo,iluminista,ba- seadono ideáriodeliberdadeeigualdade. Seestasingularidaderomânticaseapresentaprincipalmentenasartes (o"gênio"sendoseugrandesímbolo),rapidamenteelaseespraiapara outrasesferas.Como,porém,retomarà diferença,semmaculara re- descobertada naturezahumana?A Biologia fornecea resposta:não maisa diferençacentradanosvínculoscomunitáriosereligiosospre- sentesna tradição,masumadiferençaque,tambémela,faz parteda natureza.São,portanto,doisos entendimentosdenatureza:comora- zão,afirmaa igualdadedoshomensquelhespropiciaconstruiravida em sociedade;por outrolado, apontaumadesigualdadequesesitua aquémda sociedade,queébiológica,pertenceao "organismohuma- no".2 Não ésomenteestaconcepçãoquedecorredaprimaziadoconheci- mentobiológicono séculoXiX. Um dosconceitosqueentãoemergeé o de "raça"que,emborad~notea herançade característicasfisicas pertencentesaosdiferentesgruposhumanos,no contextodereaçãoao ideário iluministaaproxima-semuitodo conceitode "povo";acres- centando-seo conceitodanvinistadeseleçãonatural,forma-seumcal- dopropícionãosóàafirmaçãodadiferença- biologicamentedetermi- nada- comoàhierarquizaçãodasdiferentesraças,justificativaparao domínioocidental,dohomembranco,sobreos"povosprimitivos". SeaBiologiaprocuraexplicaraquiloqueestáaquémdasociedade, 13 ANA MARIA JACÓ.vILELA épré-societário,épossívelentãoqueexpliquetambémos comporta- mentoshumanos.SãodestaépocatantoafrenologiadeGalton- inter- pretaçãodacapacidadehumana(caráter,funçõesintelectuais)através do tamanhoe confonnaçãodo crânio-, quantoa antropologiacrimi- nal,comCesareLombrosoargumentandoseracriminalidadeumfenô- menohereditário,passíveldeserreconhecidopelascaracteristicasfísi- casdoindivíduo. A Pslq].liaJria,sabersobrealoucuraqueseinstauraapartir daprá- tica clínica doséculoXVIII - principalmentecomPhillipe Pinel, den- tro de um espíritoiluminista-, adere,ao longo do séculoXIX, aos novostempos- assimcomoa frenologiafornec~jll~ti!l~~.tiYJt12~tO~ tratamentosmoraisentãoempregados,as teoriasda degenerescência ( procuramestabelecerligaçãoentrea OpClmli11di.w'du~ _ tão rac~aJA degeneraçãoé,então,a categoriamédico-moralporexce- lência.ConfonneDELGADO: A degeneraçãorespondeà exigênciade umaexplicaçãosobreas cau- sasdasenfermidadesmentais,fornecendoumachaveetiológicacapaz de englobartantoasdoençasnitidamenteorgânicascomoos distúrbios morais.Superaa exigênciade identiticaçãoda baseorgânicada doen- ça, alojandoas causasnuma"constituição"ora visível,orainvisível,e queatravessagerações.EstabeleceC ... ) uma novasemiologia,dos es- tigmas,capazdeveremtàtosmoraise marcast1sic,~sos sinaisdaano- maliaconstitucional.C... ) E, principalmente,permiteo trânsitofácil e eficientede valorese categoriasdo corpoe da alma,da tisiologiae do comportamento,na clínicae nosologiada alienação(1992:80-81). Se a degeneraçãotemsuficientevalor explicativoda causalidade dos "distúrbiosmorais",ela pode,então,explicaros atosdesviantes da normasocial.Na disputaentreos saberesmédicoejurídico (cujo primeiro embaterelatadoprovavelmentefoi o casoPierre Riviere3), assiste-sea lima ':nsiquiatdzação" dQJ;time~aYeI:dadejurídic:léohti- ~ (FOUCAULT, 1996),pelo escrutíniode suasmotivaçõese intenções,emqueotestemunhodo atocriminosose transformaempeçasecundáriafrenteaoconhecimentoespecializado, que"sabemais"sobreaspotencialidadesdecadaum,O Direito Clás- sico,quesefundamentanauniversalidadedarazão,compreendendoo crime como decorrentedo livre-arbítrio do indivíduo - motivopelo 14 .~ Os PRIMÓRDIOS DA PSICOLOGIA JURíDICA qual estepode(e deve)serresponsabilizadopelo seuatodelituoso-, perdeespaçoparaoDireitoPositivo,parao questionamentodaautono- mia do indivíduo,d~suacapacidadedeseautogovernare dedetermi- nar suavontade. Senosdetivemosatéaquinasinter-relaçõesentrePsiquiatriaeDi- reito,éporqueesteéoterrenoinicial danossaproblemática:a Psiqui- atria,enquantosaberepráticasobrealoucura,seconstituicomodisci- plina autônoma(dentrodocampomaiordaMedicina) muitoantesda Psicologia.Como descrevemosacima,no séculoXIX a "crisedara- zão" - istoé,a necessidadedejustificaradesigual,dadeexistenteentre iguais- éacompanhadapelarespostaromânticada singularidade,da interioridade.Emergetambémo queFOUCAULT (1977) denomina disciplina - o exame,a medída,a análise,a classificação,enfim, os diferentesdispositivosorganizativo-adnúnistrativosqueindividualizam os homens- "As 'luzes' quedescobriramas liberdadesinventaram tambémasdisciplinas"(p.195). É nestecontextoque surgemas Ciências Humanas,entreelasa Psicologia.Suasfronteiras,aindatênues,situam-naentreaFilosofiae a Biologia, entrea normae a função.Se a consciênciado indivíduo autônomo,donodolivrearbítrioe,portanto,capazdeseautogovernar deacordocomasregrasdocontratosocial,éoprincípio daunidadedo indivíduo,nãoé,todavia,umatotalidadefechada.Nela estãopresentes diversosprocessos- sensitiv~erceptivos, emocionaise volitivos- quecabeàPsicologiaestudar.~Nãoécomoumasimplesentidade,mas comoumaunidadeordenadademuitoselementos~uea mentehumanaseapresenta"(Wundt, apudRIEBER, 1980:177)) Wundté um dosnomesmaisconhecidosda Psicologia,principal- mentepor suaresponsabilidadenacriaçãodoprimeiroLaboratóriode PsicologiaExperimental,em1879, emLeipzig, laboratórioqueserviu de modeloa muitosoutro~que,posteriormente,surgiramem países europeus,nosEstadosUnidos e,mesmo,no Brasil. Entretanto,é im- portanteressaltarque,paraele,G!sicOlOgia et;uma ciência dupla: experimental,namedidaemqueestudaas"atividadesmentaisinferio- ~ res"; social,ao investigarosprocessosmentaiss~rior~s atravésda- ~0c...._'1' d d 1'" d 1 -::\ /o.h;ct) dana lse ospro utos llstoncos amente lUman~ stesegun oenten- dimentoé comumenteesquecidona históriaoficial daPsicologia,re- duzindo-seaproeminênciadeWundtàcriaçãodolaboratórioedaPsi- 15 ANA MARIA JACÓ'YILELA cologiaExperimentalquelá iniciou seudesenvolvimento.No jogo de verdadesda constituiçãodo saberpsicológico,estafoi a vertenteven- cedora. Assim, aPsicologiainicia§JlHr:ªj~ió.riacientíficaatravé~doestudo experimentaldosprocessospsicológicos,os "elementosdamente:.4 Seu-Objetorportanto,.é.bemniferentedodaPsiquiatria=llão-aloucllra .ellllasimhricaçiies_com.a.razão,masaanálisedaqueles.processos..co- muns.-a1odo..seLhumano.(ouniversalismo),procurandoestabeleceL.as. condições~.'normais'~,ideais, de seufuncionamento·eaquelasoutras __condiçõeSquedeterminamseuaparecimentodiferenciado.Percepção, associaçãodeidéias, memória,motivação,tempode reaçãoetc" são rrl1!IÜplQ.~-º~PJ:9_Ç~§.sºlL@J:>.mejictºsàverjfjcaçãº.~x.R~ri;I1lental. Coma acumulação.dessesab.er,..é.PQssíyeLsa.iLdo.e.spaçorestritodo laboratório,Il1aptellgº:.s~.§!@u:egrª.s..d~rnuÇ.iOll(Ul1entQ.Ostestesindi- camoprescindirdosinstrumentosdequeseachavamdotadososlabo- ratórios(mecânicos,elétricos),transformando-seem"test~sdelápise papel", cujafacilidadedeaplicação- tantoemtermosdelocal quanto emrelaçãoàquantidadepossíveldepessoastestadasao mesmotempo - faz comquesetornematécnicaprivilegiadadeproduçãodossaberes epráticaspsicológicas. áatraYés.de.s.s.e.instmmentQ.qlte.a.I>.siGP1Qgi.a.se.aPIQximadoDirei- to, semdeslocaraPsiquiatria.:Nãosetrata.entãQ.aqui.daloucura,mas, por exemplo,dafidedignidadedQJestemunho>~questãoparaaqual é importanteo conhecimentodapercepção,da motivaçãoe emoção,do funcionamentodamemória,domecanismodeaquisiçãodehábitos,do --papeldarepressão. FOUCAULT (1996),aohistoriaraverdadesegundoasformasjurí- dicasdesuaconstituição,destacaprimeiramentea"prova"- queMIRA y LÓPEZ descreve,emseuclássico"ManualdePsicologiaJurídica" (1945), ao compararos antigosjulgamentospersascom os métodos atuaisde exameatravésde diferentestestes-, seguidado "testemu- nho" daquelequeviu e,porúltimo,o "exame",a avaliaçãopsicológica docriminoso.A "PsicologiadoTestemunho",1Ji.storkamente3primeir3 grande.articulação.entre.Psicologia.ej)ireito,...demonstra.apsico1ogiza~ çãoqueseencontra.emcurso:..não.só.ocriminoso.deveser.examinado, Jilaslambémaquelequevêerelataaquiloqueviu - queprocessosinter- nosestarãopropiciandooudificultandoaveracidadedeseurelato? 16 Os PRIMÓRDIOS DA PSICOLOGIA JURíDICA Entretanto,apsicologizaçãonãoíLsQ.doDireito,emsuavertentedo DireitoPositivo.Comaênfasenasingularidadeenainterioridade,he- rançado romantismo,e a existênciademúltiplos- efragmentados- possíveissistemasdeordenaçãodomundo,o indivíduomodernobusca cadavezmaisdentrodesi ascertezaseossignificadosparaasuavida. Paraisto,recorreaoespecialista,aoencarregadodocuidadodasubje- tividade. A.questão.que..p.ermane.ce,...1les.te...momento..de...expansãíUla.área.de PsicologiaJurídica.p1lIa.a1ém_daJustiça.Criminal,...enYolvendo..princi- palmente.Jamília,..infância_e.adolescência,refere.::se_à.lllaneira_col11o.0 .psicólogo.aceitarlÍl.atuaráfrentea.este.encargo:.será.oestritoavaliador daintimidade,aperfeiçoando.seus.lllétodos.de.exallle?Ou lelllbrar-se~ . á queestesujeito~singulartal11béméumsujeitQ~cidadão,cujosdireitos edeveres_se.collStituemnoespaçopúblico,territórioondeperpassam . outros.discursO.Se.práticas_que_nã.o..o_ex.clusiY':lln~nte.psicológico? NOTAS 1Cf., a respeito,DUMONT (1985). 2 Em oposiçãoaomundofragmentadodo liberalismo/individualismo,o romantis- mopropõeumretornoàtotalidadecapazdefornecerumsentidoaosdiversosele- mentos.Na mesmalinha,assiste-se,no séculoXIX, ao predomíniodo "organis- mo" comometáforaparaa vidaemsociedade- umatotalidade,porém,emque funçõesdiferentessãodiferentementevaloradas(cl'.RUSSO, 1997). 3 Cf. CASTEL (1977).O "casoFebrônio",ocorridonosanosvintedesteséculo, podeserconsideradoparadigmático,emnossasplagas,dessadisputaentre"médi- cosejuizes"(cf. FRY, 1982;1985). 4 É importantelembrarque,mesmocomo surgimentodeescolase sistemasteóri- cosemPsicologiaqueseafastamdoestruturalismodeWundt,ametodologiaexpe- rimentalpermanece.Esteé o casoda Gestalt,por exemplo:emborase postule contrariamentea Wundt ao enfatizara totalidade(a forma,a configuração)em oposiçãoaoselementos,investigasuasproposiçõesatravésdaexperimentação. 5Cf. MORAES (1939). REFERÊNCIAS BIBLlOGRÁFICÁS CASTEL, Robert."Os médicose osjuizes". In: FOUCAULT, Michel (coord.). Eu,PierreRiviere,quedegoleiminhamãe,minhairmãemeuirmão.5. ed. Rio de Janeiro:Graa!,1977. 17 ANA MARIA JACÓ·VILELA DELGADO, PedroGabriel.As razõesda tutela- psiquiatria,justiça e cida- dania do loucono Brasil.Rio deJaneiro:Te Corá, 1992. DUMONT, Louis. a individualismo-' umaperspectivaantropológicada ide- ologia moderna.Rio de Janeiro:Rocco, 1985. FOUCAULT, Michel. A verdadee asformasjurídicas. Rio de Janeiro:Nau, 1996. Vigiar epunir: nascimentodaprisão. Petrópolis:Vozes,1977. FRY, Peter."FebrônioÍndio do Brasil:ondecruzama Psiquiatria,a Profecia,a homossexualidadee a Lei". ln: EULÁLlO, A. et alii. Caminhos cruzados: Linguagem,AntropologiaeCiênciasNaturais.SãoPaulo:Brasiliense,1982, p. 65-80. ____ o "Direito Positivo versusDireito Clássico:a psicologizaçãodo crime no Brasil no pensamentode Heitor Carrilho". ln: FIGUEIRA, S. (org.)Cultura da Psicanálise. SãoPaulo:Brasiliense,1985,p. 116-141. :MIRA Y LOPEZ, Emilio. Manual de Psicología Jurídica. 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EI Sabery el Poder Rosa.I:>.§1.º~~Ol(1987:23)comienzasutrabajo"La caraoculta deIa droga"citandoestediálogoentreunimportantetoxicólogoinglés y suhijo: - i,Papá,quéesuna droga? - Una droga,hijo mío, es una sustanciaque inyectadaen un perro produceun trabajode investigación. Lo parcialdeIa respuesta,y deallí el conflicto,resultaráevidente cuandoestediálogoseamantenidoentresujetosque,obienpreguntan 10queyacreensaber,esperando,sin10grarIo,unarespuestàqueconfir- me,legitimeesesaber,obiencuandoellugardesdeelquesehablay se escucha,eI espacioeneLquesedialoga,noescoincidente. Continuemosconel diálogoentreeIpadrey eIhijo. Queel nino le preguntea supadre,ya nos refiereciertascuestiones.AquéI, eI nino, reconoceenesteúltimoun sabersobreIacuestión.Y noporquesetrate •Lic. en Psicología, Psicoanalista, SupervisardeI Area Psicológica de Ia ProsecretaríadePatronatodeIa Excma.CámaraNac.deApelacionesen10Crimi- nalyCorreccionalFederaldeIaCiudaddeBuenosAires,PresidentedeIaAsociación dePsicólogosForensesdeIa RepúblicaArgentina. 19 GEYSA MARIA BRASIL XAUD MIRANDA JÚNIOR, Hélio Cardoso."Psicologiae Justiça- A Psicologiae asPráticasJudiciáriasna Construçãodo IdealdeJustiça".RevistaPsicolo- gia Ciência eProfissão- PublicaçãoQuadrimestraldo CFPICRP. Brasília, 1998:28-37. PEREIR.4., Tâniada Silva.Direito da Criança e do Adolescente- Umapro- postainterdisciplinar.Rio deJaneiro:Renovar,1996. ZAGURY, Tânia - Educar semculpa - A gêneseda Ética. Rio de Janeiro: Record,1995. 102 HISTÓRICO DA INSERÇÃO DO PROFISSiONAL PSICÓlOGO NO TRIBUNAL DE JUSTiÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO - UM CAPíTULO DA PSICOLOGIA JURíDiCA NO BRASil DayseCesarFrancoBernardi* ORIGENS DA PSICOLOGIA JURíDICA E DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO No Brasil, a atuaçãodopsicólogona áreajurídica teveseuinício marcadopeloenfoquetradicional,daaplicaçãodaPsicologiaCientífi- ca aoDireitoPositivo,postuladoemnossoscódigoslegais. A idéiadequetodoo Direito,ou grandepartedele,estáimpregnadode componentespsicológicos,justificaa colaboraçãodaPsicologiacomo propósitode obtençãode eficáciajurídica (BRITO, 1993:24). Pressupostospositivistasqueestruturaramasciênciashumanaseso- ciaisnosmoldesdasciênciasnaturaisalicerçaramumapráticapsicológi- cavoltadaparao "o exame"e diagnóstico(processosdeinvestigação). O modeloinicialdaPsicologiaJurídicacorrobora,assim,comoenfoque pericialestrito,entendidocomoaquelequevisaaofereceraojuiz subsí- diosparaumadecisãoconsideradajusta,dentrodoqueimpõealei. Tal tendênciaencontrarespaldonasorigensdaPsicologiaJurídica, vinculadasàchamada"PsicologiadoTestemunho"(STERN,1903 ln: ANASTAS1,1972:74). Ela estádocumentadacomoum conjuntode pesquisas,sobreatradiçãojurídicareferenteàvalidadedotestemunho, quedemonstroua granderelatividadedovalorprobatóriodosmétodos deinquisiçãodaverdadeemprocessospenais. * PsicólogaJurídicadoTribunaldeJustiçadeSãoPaulo,especialistapelaUSP em ViolênciaDomésticaContraaCriançaeoAdolescente,cx-ConselheiradoConselho RegionaldePsicologia,(CRP-06) e RepresentanteBrasileiradaAssociaçãoIbero- AmericanadePsicologiaJurídica. 103 DAYSE CESAR FRANCO BERNARDi .Tradicionalmente,o~métodoscoercitivosde obtençãode confis- sõesforamsendosubstituídoseaperfeiçoadospormétodosdeexplora- çãopsicológica,q~evisavama reconhe,cer"averdade"nosprocessos criminais.Essatradiçãoassumia~Ildagação_a.veracidadedeuma declaraçãojudiciária, submetendoa examepsíquic~.g:u.:~.I~~-ª.prestou; el~lTã(nlísavã-p-orêi1i:-~lapÜtafécel1feri1i:id~ldéou-acriminalidade.Daí oschamadosinterrogatórios"stressantes";form.asdedetecçãodemen--·· tiras,métodosdeexploraçãopsicológicadamemória,consciência,aten- ção, imaginação,quocienteintelectualetc.Nesseenfoque,o exame psicológicoseriauminstmmentopericialparaavaliaçõescriminológi- cas,estreitamentevinculadoaomodelomédico. Historicamente,a introduçãodasciências"PSI" naestmturajudi- ciária,_guarda..semelh-'111((.ª.s_C.gQ1JUngIeSSQ_do..?..!1!c.~4ic9_S_A9.âmbito..da j.ustiçapenal...g~t~s"'.12asprin.le..I.·.r..a.s..de..'cada.sd.ose.'.c.ul.o.X IX.,passar31.n '.'1 reivindicar a competêildil'paia"esfabelecey"o"dÜlgÚostlco"dã''folicurã:' yisilndo_çlu§eP!!.r:9.ç·~t9__cio_s_c;r:imi!lQs.Qsjo.ucoS__dQ.S.IIl~iit(ÜÚj~Ii:Jcj~~~~-~_ Medj911a.P.é1SSOUa.rávindicaLa.avaliação..daresponsabilidade_m.Qxal.. dedeterminadoscriminosos,leval1ci().ª.sii~tillção.dasprisões.edosasi- .los(QUEIROLO, 1984:85). Na décadade 30, a justiça penal adotoua medicinapsiquiátrica comoum sabernecessárioaosprocessosjudiciáriosparaa avaliação da responsabilidade,atravésdapericiapsiquiátrica.A doençamental já estavainserida,nessetempo,na ordemdodesviodocomportamen- to,dodesregramentodaspaixõesedaperversãodavontade.O concei- to depericulosidadeseoriginoudestainterseçãodepoderese de co- nhecimentoentrea JustiçaeaMedicinapsiquiMrica,pontodeencon- troentreMedicinaeDireito. A históriarecentedaciêncicípsicológicanosmostraqueseuentre- cmzamentocomoDireitopareceseguirosmesmosmoldesdaMedici- napsiquiátrica,quando,em1940,PACHECO E SILVA nosrelatou: consideraro criminosoe nãoo crime,sóseriapossívelatravésda inter- prctaçãodapersonalidadehumana(...) o quclevarámaiscedoou mais tardca introduçãoda psicanálisena saladojulgamento(p. 111). A análisedahistóriadaimplantaçãodaPsicologianoTribunal de JustiçadeSãoPaulopodenosauxiliarnestatarefadecompreensãoda 104 l HlSTÓRICO DA iNSERÇÃO DO PROFISSIONAL PSICÓLOGO ••• relaçãoPsicologia-Direito.Trata-sedorelatodeumaexperiêncialo- calizada,recenteecontemporânea,masqueilustraqueassimcomoa Medicina adentrouao fónlln via o conceitode loucura,a Psicologia adentrouvia osproblemasdafamília no tratocomseusfilhos. RELATO DA IMPLANTAÇÃO DO SERViÇO DE PSICOLOGIA NO TRIBUNAL DE JUSTiÇA DE SÃO PAULO A inserçãodoPsicólogo,comoumprofissionaldo PoderJudiciá- rio, noâmbitodoTribunaldeJustiçadoEstadodeSãoPaulofoi poste- rior à doAssistenteSocial,eocorreuvia VaradaInfânciaeJuventude, no tratodasquestõesdamenoridade. Haviaum lugarvirtual a serocupadona instituição,já explicitado no CódigodeMenoresde 1979(Lei Federaln° 6.697),quedefiniao carátertutelardoDireitodoMenor eassumiaqueaoJuiz caberiadar "ASSISTÊNCIA,PROTEÇÃO E VIGILÂNCIA" amenoresde18anos queseencontrassememsituaçãoirregular,conceituadapeloInstituto InteramericanoDeI Nino (SAJON, 1973:280)dasel:,'1lÍnteforma: é aquelasituaçãoem queseencontrao menor,tantoquandoincorreu num fato anti-social,como quandose encontraem estadode perigo,' abandonadom,lterialc moralmenteou sc graduede um déficit ílsico ou mental.Diz-se,também,dosmenoresquenãorecebemo tratamen- to, a educaçãoc os cuidadosquecorrespondcmÚssuasindividualida- des, O CódigodeMenorespreviaemseuart.4°, III, "que(),_~Stl~ª2,,~~__ , cadacasofosserealizadopor equipetécnica,semprequepossível". Essadisposiçãopermitiua criaçãodasAudiênciasInterprofissionais, queincluíamaatuaçãodopsicólogocomoum,ltlxiliardiretodojuiz e membrodaequipemultidisciplinar. Dois psicólogosiniciaram,emSãoPaulo,umaatuaç~ovoluntária emjulho de 1979,colaborandocomo ServiçodeColocaçãoFamiliar (Lei Estadualn°560de 1949),comumtrabalhoterapêuticadeinter- vençãojuntoàsfamílias,numaperspectivaclínica.Elesforamestagiar naFEBEM paradarinício aumtrabalhonoTribunal, 105 DAYSE CESAR FRANCO BERNARDI emfunçãodoProvimentoCXX do ConselhoSuperiordeMagistratura de São Paulo, quepossibilitoua integraçãodo Serviçode Colocação Familiaraoprocessode verificaçãoda situaçãodo menor(CAMAR- GO, 1982:21). Em 1980,iniciou-seotrabalhodospsicólogosvoluntáriosnasagên- ciasdeColocaçãoFamiliar,distribuídasnasregiõesdacapital.Dentre asatribuições,constavama avaliaçãoe o acompanhamentodasfamí- liasbeneficiadaspelaLei na560.O objetivodaatuaçãopsicológicaera oferecerapoioàsfamílias,visandoàsuareestruturaçãoeàmanutenção dacriançano lar comomedidapreventivadainternação,alémdepro- cederaencaminhamentospararecursosdacomunidade,quandoneces- sário.A modificaçãodadoutrinalegal,como CódigodeMenoresde 1979,estabeleceua demandadecasosa serematendidosno escopo judiciário distintodo daPromoçãoSocial, queassumiaa proteção,a vigilânciaeo controledapopulaçãoinfanto-juvenilemcondiçãoirre- gular. Em agostode 1980,a atuaçãodospsicólogosvoluntáriospassoua ocorrernasAudiênciaslnterprofissionais,já na áreajudicante,'com baseno art.4°,lU: Foi instituídaem São Paulo, capital,umaforma de atendimentodos casos,em Juizo, atravésda préviaapuraçãopor equipetécnica,com- postapor AssistenteSocial e Psicólogo,queparticipam,ativamente, dasAudiênciasInterprofissionaise não só orientamas medidasdentro desuasrespectivasáreas,como,também,apresentamo relatórioparaa prontadecisãodo processo(CAMARGO, 1982:22). Em 1981,ospsicólogosforamcontratadospeloTribunal ejá esta- vamemtodasasregionaisdacapital.As funçõesdo ServiçodePsico- logiaeramassessoraro magistradoconl.Q....lO.st.1J!:tQ.dO_C.'lS.0....desde-a-.ava- 1iação.psiçºJQgi.Ç,ª._PL~Jj.IE:~I!.9E..~~postasde intervenção.~lém disso,o profissionalatuavanas sitüaç7íesõê-"cris"e;-apr~;~;ta-cÍas-p'êfã-"" criançaousuafamíliaeindicava.ostratal,1~~Ilt?spsicológicosnecessá- rios, encaminhandoaos\~~9E:.t§9S.ºQJl1unitált2.ê~Sua açãoia alémda períciae o colocavacomoumagentedainstituição,namedidaemque seutrabalhopressupunha,alémdarealizaçãodediagnósticossituacio- nais,a atuaçãodo profissional"sobreo problemapsicológicodo me- 106 H ISTÓRICO DA INSERÇÃO DO PROFISSIONAL PSICÓLOGO ••• nor oudafamília", atravésdeacompanhamentopsicológico,orienta- ção e encanúnhamentosaosrecursosda comunidade,colocandonos indivíduosasrazõesdasituaçãoirregular(idem,ibid.,p. 26). Assumiresselocusexigiudopsicólogomuitasadaptações,emfun- çãodosconflitosinerentesàs suaspremissasdeaçãoeminentemente clínicasecontradiçõesbásicasentresuaformaçãovoltadaparaa pro- moçãoda autonomiae a açãorestritivada instituição.Os problemas forammuitos,desdea indefiniçãodopapelnosfórunsatéo estabeleci- mentodeumaidentidadeprofissionalnoâmbitodessainstituiçãojudi- ciária. Em 1985,ocorreuo primeiroconcursopÚblicoparaa capitalde SãoPauTo,coma criaçãode65cargosefetivose 16cargosde chefia. Ele refletiuabuscadeumaimplantaçãodefinitivadaprofissãonaárea judiciária.O provimentodeLei naCCXXXVI, do ConselhoSuperior deMagistratura,regulamentoua atuaçãodospsicólogosdo Tribunal deJustiça,disciplinandoasfunçõesnasVarasdeMenoresenasVaras de Famíliae Sucessõescumulativamente.Dava-se,assim,um passo emdireçãoaumanovaáreadeatuação,asVarasCíveis,comdistinção deritosjurídicosenovospersonagens:advogados,assistentestécnicos eperitosdeoutrasáreas,comoopsiquiatraforense. As equipesinterprofissionaisforamabsorvidascomoobrigatórias apósaimplantaçãodoEstatutodaCriançaedoAdolescente(Lei Fede- ral na8.069/90),quandosuasfunçõesforamdefinidasnosart. 150e 151,comoum ServiçoAuxiliar daJustiça: Art. 150- Cabeao Poder Judiciário, na elaboraçãode sua proposta orçamentária,preverrecursosparamanutençãode equipeinterprofis- sionaldestinadaa assessorara Justiçada Infânciae da Juventude(...) Art. 151- Competeà equipeinterproíissional,dentreoutrasatribui- ções que lhes foremreservadaspelalegislaçãolocal, fornecersubsí- díos por escrito,mediantelaudosverbalmente,na audiência,e bem assimdesenvolvertrabalhosde aconselhamento;orientação,encami- nhamento,prevençãoe outros,tudosobimediatasubordinaçãoà auto- ridadejudiciária, asseguradaa livre manifestaçãodo pontode vista técnico(...) A ocupaçãodesselugardepsicólogojudiciário ocorreucomouma experiêncianova,decriaçãodecampodetrabalho,atravésdeaproxi- 107 DAYSE CESAR FRANCO BERNARDI maçõessucessivas;deumaconstmçãosocial,conformeo Cronograma Históricoemanexo. Essainserçãopaulatinafoi constmídaconforme: 1 - Alteraçãodosdispositivoslegais(CódigodeMenores"Mello Matos",CódigodeMenoresde1979,EstatutodaCriançaedoAdoles- cente); 2 - MudançanaPolíticadeAtendimentoàCriançaeaoAdolescen- te:diretrizesdaFUNABEM, FCBIA; 3 - RedistribuiçãodasfunçõesentreosPoderesJudiciário eExecu- tivo, conformeasDoutrinasdoDireitoe osprincípioslegais; 4 - Expansãoeespecializaçãodasfunçõesno PoderJudiciário; 5 - EstabelecimentodeProgramasdeIniciaçãoFuncionaleReci- c1agemProfissional,coma sistematizaçãodasexperiências,ea cons- tmçãodeprincípiosfll1ldamentaisdeumprojetoprofissional. AS ATRIBUiÇÕES DO PSICÓLOGO NAS VARAS DA INFÂNCIA EJUVENTUDE A importânciadaatuaçãodopsicólogona instânciajudiciária re- pousanapossibilidadedesseprofissionalabordarasquestõesdasubje- tividadehumana,as particularidadesdossujeitose dasrelaçõesnos problemaspsicossociais,expressosnasVarasdaInfânciae Juventude, como contextosocialepolíticoqueasdefinem. Assessoraro magistradona distribuiçãodajustiça é, portanto,a tarefacapitaldoprofissional,quetemváriasatribuições: -y-realizarestudosde casos,oferecendoelementosparasebuscar alternativamaisviável,no estritocumprimentodoECA, emdefesade direitosfundamentaisdecriançaseadolescentes; - discutiras medidasdeproteçãoe/ousócio-educativasmaiscoe- rentesà situaçãodecriançase adolescentes,diagnosticadano estudo decaso,contextualizandoo problemaeosrecursoscomunitários; - participardaaudiênciaeapresentar,por escritoou oralmente,o parecertécnicosobreo caso,esclarecendo-osemprequenecessário, resguardandoosprincípioséticosdaprofissão; 1":7 - procedera orientações,acompanhamentóse encaminhamentos necessáriosà fanúliaeàcriançaouadolescente,renunciandoaausência ouo malfuncionamentodeprob'Tamasdeatendimentodomunicípio; 108 HISTÓRICO DA INSERÇÃO DO PROFISSIONAL PSICÓLOGO ••• - estimulareefetivarrelaçõesdainstituiçãojudiciáriacomasenti- dadeseconselhosdomunicípio(dedireitosetutelar),numaaçãointer- institucionalquepromovao intercâmbioem redee umapolítica de atendimentoeficaz; verificar o cumprimentodo ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, conhecendoe analisandoosprogramasdeatendi- mentodomunicípio,edenunciandosuaviolação; .-.y-promoverapolíticadeatendimentoàcriançaeaoadolescenteno municípioenquantoosconselhostutelaresmunicipaisnãoestãoinsta- lados,e/ouauxiliá-losemsuarealização; - participarepromovereventosrelacionadosà área(cursos,simpó-sios,palestras,supervisões),quepermitamaatualizaçãoeareciclagem penml11ente; - procederestudosepromoverdebatesvisandoàanálisedefatores quepredispõem,reforçamoucontribuemparaamanutençãodofenô- menodamenoridade,bemcomoasproblemáticasdafamília,buscando realizarumtrabalhoefetivocomaspessoasemharmoniainterdiscipli- nar,contribuindoparao avançodaspolíticaspÚblicas,daprofissãoe daciência. Para cumprir essasatribuições,o psicólogo,comopartede uma equipeinterprofissional,atuaemconsonânciacom o ServiçoSocial Judiciário,o representantedoMinistérioPÚblicoc o Juiz daInfânciac Juventude,todosinseridosno contextoinstitucional,que contacom oficiaisdejustiça,cartonírios,advogadosetc. Ao psicólogocabea análisedasalternativasdisponíveispara se buscarcondiçõescapazesdesatisfazeremasnecessidadespsicológicas dascrianças/adolescentes,cujo destinoestásendodecididojudicial- mente.Há a indicaçãode salvaguardaro bem-estarpsicológicoda criança,tantoquantoseubem-estarfisico, tratando-acomo"sujeito" emcondiçãopeculiardedesenvolvimento.O' universodeatuaçãoen- volve,portanto,acriança,oadolescente,suafamíliaouresponsáveise colaterais,nabuscadacompreensãodeseumundorelacionalno con- textosócio-culturalondevive. A organizaçãodo serviçodepsicologiarefletea demandainstitu- cionaleasmedidasjudiciaisprevistasparaassituações-problema,di- vidindoosatendimentosporáreas: 109 DAYSE CESAR FRANCO BERNARDI 1 - Colocaçãodecriançaemfamília substitutae/oudeapoio,que pressupõeasmedidasjudiciaiscorrespondentes: - guarda; - tutela; - adoção; -delegaçãoe destituiçãodopátriapoder; - utilizaçãoderecursoscomo:abrigostemporários;cadastrodepes- soasinteressadasemadoção;cadastrodefamíliasdeapoio;cadastro decriançaseadolescentesdisponíveisparaadoção;cursosdeesclare- cimentoparapaissubstitutos. 2 - Orientação,apoioeacompanhamentotemporáriosàcriança,ao adolescentee à família, emsituaçõesdedesajustesfamiliar e desvios de conduta,como:fugado lar, usodetóxicos,pedidosdeinternação, consentimentoparacasamento,suprimentodeidadeetc. 3 - Atendimentodedenúnciassobrenegligência,maustratos,abu- sosexual,violênciapsicológica,intraeextrafamiliar. 4 - Atendimentoa jovens compráticade delitos,comestudode caso,visandoà discussãoeavaliaçãodemedidassócio-educativasede proteção,taiscomo:advertência,liberdadeassistida,prestaçãodeser- viçosà comunidade,semi-intemaçãoeinternação. (Art. 186)- comparecendoo adolescente,seuspaisou responsável,a autoridadejudiciáriaprocederáà oitivadosmesmos,podendosolicitar opiniãode profissionaljustificado. 5 - Fiscalizaçãodasentidadesde atendimentogovernamentaise não-governamentais. 6 - Apuraçãodeirregularidadesementidadesdeatendimento. 7 - Proteçãojudicial dosinteressesindividuais,difusosecoletivos (açõescíveis). Buscar compreendero papeldo psicólogocomoum profissional específicona instituiçãojudiciária exigeo conh.ecimentodasaltera- çõesdocontextoedaconjunturadesuapráticaqueseestabeleceue se transforma,emtomodosprincípiosdesuaciênciaedosparâmetrosda JustiçadaInfânciaedaJuventude,a quemserve. 110 HISTÓRICO DA INSERÇÃO DO PROFISSIONAL PSICÓLOGO ••• ATRIBUiÇÕES DO PSICÓLOGO JUDICIÁRIO NAS VARAS DE FAMíLIA E SUCESSÕES Os PsicólogosJudiciários,concursadosecontratadosparaasVaras da InfânciaeJuventude,foramincorporadosaosJuizadosdaFamília, atravésdeprovimentodoTribunaldeJustiçadeSãoPaulo,em 1985. Na capital,osprofissionaissãodesignadospelosjuízes dasVarasde Família paraatuaremcomoperitos,emprocessoscontenciosos,que envolvamdecisõessobreo futurodefilhos. O trâmitejudicialdessescasosmantémumaestruturabélicade,ce-! . tato,naqualafaladaspessoasémuitasvezesconduzidae/oucerceada\ I por seurepresentante,quetrazparaosautososargumentoslógicosqueI possamlevá-Iasa ganhara causa,enão,necessariamente,ofereceràs jpessoasumaoportunidadededirimir seusconflitosconjugaise/oufa- miliaressemintervençãodeterceirosqualificados. No Fórum João MendesJúnior (Fórum Central),há uma equipe própria,comchefiaespecíficaeindependente,queatendeàsvinteVa- rasinstaladas(juízestitulareseauxiliares). Os trabalhosdepesquisae investigaçãona área(BRITO, 1993; SAMPER, 1995)apontamparaoutrasformasdeintervençãodiferenci- adasdasperícias,emqueaspartesassumemum papelmaisdiretoe participativonasdeliberaçõessobresuaprópriavida, quandovistase tratadascomosujeitosdaação,numdiagnósticocompreensivo.Neste sentido,os resultadossãotrabalhadosprincipalmentecomos indiví- duosdo casoe expressosao magistradocoma anuênciadosimplica- dos,quepodem,muitasvezes,assumirumaaçãomaisresponsávele menosreativanassituaçõesdeaudiência,buscandoincrementarsolu- çõesqueevitemo confrontoeviabilizemconciliaçõesouacordoscom- partilhados,notratodosfilhos, sujeitosprincipaisdasações. Observa-seumacrescentepráticadousodamediaçãoemescritó- riosdeadvocaciaemSãoPaulo,comprofissionaiscontratadosemações preliminaresantesde dar inicio aosprocessosjudiciais, evitando-se iniciar causasdesnecessáriasou litigiosas. A criaçãodafunçãoespecíficadepsicólogojudiciário nosquadros doTribunaldeJustiçadeSãoPaulosetornouummarcohistórico,con- solida,'ldoo quea práticaacumuladanesses19anoscriou:umanova áreadesaberpsicológico- saberespecíficoeespecializado. 111 II IiU DAYSE CESAR FRANCO BERNARDI EsseprocessonãosedeusemconflitoseangÚstiaseaindahojenos revelaa necessidadedeespecificarasfunçõessegundoosparâmetros darealidadedademandaatendida,percebendoo alcancedenossaatu- açãosobreaproblemáticadacriançaedoadolescente,alémdoscasos individuais,enquantofenômenosocial. A análisecríticadahistóriadeimplantação(oudaconstmção)da Psicologia Judiciária em SãoPaulo permiti concluir que,da mesma formaqueascategoriasjurídicasseinseremnumaperspectivaideoló- gica, comprescriçõesmoraisde vida e formaspolíticasde controle social,as categoriaspsicológicasquea elasseopõemsãoformasda representaçã.osocialdarealidade,sobrea qualsepretendeoperar.Os fmtosdainteraçãoentreóticasdiversasdecriança,família,deformas depensaro agirhumano,doembateentreasformasdeé1l1alisarofenô- menoda menoridade,e de setraçardiretrizesde açã.o,parecemser, alémda inquietação,a constituiçãodepossibilidadedemudança,em quea práticacotidianaimpulsionaa constmçãodeumprojetoprofis- sionalquerepercutenumprojetodesociedade. Daí, anecessidadedeseenfocaravivênciana instituição,parava- lorizaçãodotrabalhopsicológicorealizado.Ossentimentostã.ocomuns de impotência-onipotênciavividosna instituiçãoparecemsinalizara necessidadedeo psicólogoterassegmadoseupoderdedecisãonains- tituição,terdefinidoseulugarnasrelaçõesinstitucionaiseocupá-lode umaformaclara,ondepossaseidentificarprofissionale eticamente. Há entravespara a consolidaçãodaprática psicológica na institui- çãojudiciária a seremlidados;há conquistasquenãosepodemne- gligenciar,sobpenadeestigmatizaçãodeumaáreadeatuaçãoprofis- sional,ondeo enfoquepsicológicosefaznecessárioecujaaçãopode edevesertransformadora.Haveráumtempopara a transdisciplinari- dade? CRONOLOGIA HISTÓRICA DA IMPLANTAÇÃO DA PSICOLOGIAJUDIClÁRIA EM SÃO PAULO 1924- Criaçãodo cargode Juiz deMenorespara "assistênciae proteçãoaosmenoresde 18 anosde ambosos sexos,abandonados, bemcomoo processoejulgamentode delinqÜentesde 14a 18anos" (Lei nO2.059,de31dedezembrode 1924). 112 t I í l I!, i ;~,i j f I I, I I HISTÓRICO DA INSERÇÃO DO PROFISSIONAL PSICÓLOGO ••• 1925- InstalaçãodoJuízo PrivativodeMenores- atravésdaregu- lamentaçã.odalei, pordecreto,quepreviaemseuart.38acontribuição deummédicopara"procedertodososexamespericiaiseobservações dosmenoressujeitosàsdecisõesdoJuizo evisitasàsfamíliasdosme- noresparainvestigaçõesdosantecedenteshereditáriosepessoaisdes- tes"(Decreton°3.828,de25demarçode 1925). 1927- CódigodeMenores"Mello Matos"- Leis deassistênciae proteçãoamenores(DecretonO17.943- A, de12deoutubrode1927). 1948- O assistentesocialjá estáinseridoinformalmentena insti- tuição.1949- Lei EstadualnO560,de27 dedezembrode1949- Serviço deColocaçãoFamiliar- prevêafunçãodoassistentesocialcomocoor- denadordoProgramaquetemporfim oamparoeconômicoesocialàs famíliascarenciadas,quepossuammenoressobsuaguarda,proporcio- nandoa essesmenoresambientefavonívelao seuplenodesenvolvi- mento(COSTA, 1975:67). 1953- ProvimentonOXXIII, de10desetembrode1953do Conse- lho SuperiordeMagistratura,dispõesobreaorganizaçãodoServiçode ColocaçãoFamiliar earequisição,paratal fim, defuncionárioshabi- litados.Em seuart. 2°consideraa conveniênciada criaçãode uma clínica deorientaçãojuvenil, composta,no mínimo,deummédicoe umpsicologista (art.6°, § 4°) 1956- O psicólogoetambéminseridoinformalmentenoTribunal de Justiça, integrandoasequipesinterprofissionaisdo Recolhimento Provisório de Menores (RPM), do Centrode ObservaçãoFeminina (COF) e da Clínica deEstudoJuvenil (CEJ) comtrabalhosdeavalia- çãoediagnóstico.A FUNÇÃO antecipavaa profissãoquefoi regula- mentadaem1964. 1965- Serviço de ComissõesTécnicascriado pela Portaria n° 1.201/59edevidamenteestruturaàapelaPortariadoTribunal deJus- tiçadeSãoPaulo,n.o3.791/65,destinadoaestabelecerosníveisetários dosespetáculos,na áreadejurisdiçãoda Comarcadacapital;autori- zar ou não o trabalhoe/ouparticipaçãode menoresem atividades relacionadascomosmeiosdecomunicação,analisarpublicações,ten- do em vista a apreensãodaquelasque ofendama moral e os bons costumes;previa,parao desempenhodesuasfunções,assistentesso- ciais epsicólogos. 113 ~ / INFÂNCIA E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA: UM TEMA DA MODERNIDADE HebeSignoriniGonçalves' No início doséculoXX, aspolíticaspÚblicaspassarama servistas comoumveículodebem-estar.Mais recentemente,difundiu-sea idéia~ de quetambémas criançasdeveriamser alvos dessaspolíticas,com basena concepçãodequeacriançaéum "sujeitoaserprotegido"pela família, pelasociedadee peloEstado.Quandoum grupodemédicos dos EstadosUnidos reconheceu,nos anos60, quealgumascrianças estariamsendovítimasdaviolênciade seusprópriospais, começoua ganharcorpoa idéiadeque,emalgumascircunstâncias,acriançade- veriaserprotegidainclusivedaprópriafamília. Comisso,começaaser desenhado~1 modeloquejustifica e sugerea ~Qj:Jre a fa-mília, e!)lAfomedaproteçãoà criança.No início do século,essacon-~---"--~-~---""--,---""-------- cepçãosoariacomoum contra-senso,já que as noçõesde família e infânciaestavamestreitamentevinculadasàlógicadorecolhimentono interiordolar,vistocomoterritórioinviolávelelugardeproteção.Para os especialistasemviolênciadoméstica- psicólogos,médicos,assis- tentessociais,advogados-, intervirna família paraprotegera criança representaum dilema:qual o limite entrea proteçãoaosdireitosdaI criança e o respeitoél convivênciafamiliar? Que nível de viOlência!\intrafamiliarjustificaa intervenção?Em quecircunstânciasafastaruma) criançadeseuspaisbiológicospoderepresentarumbeneficio? Em 1959,a OrganizaçãodasNaçõesUnidas firmou a Declaração dosDireitosdaCriança,elegendoa família ea comunidadecomoins- tituiçõespor excelênciado exercícioe asseguramentodaquelesdirei- ff ~ ••.• ON 'J ,,~. /" " ••.• '~·•.•r.l'U - "l C!...'i\'-.'··,C/·."v.,. ~' \-{)'\:. "-',.:".' ..•.•.\,;'"' ~'..-ç~'~ •CoordenadoradoNúcleodeAtençãoa CriançasVítimasdeViolênciadoIPPMG - UFRJ. EspecialistaemPsicologiaJurídica pelaUERJ. DoutorandaemPsícolo~ . . I pue RJ .~•., ,..., Jglapea -. Cv"'_(C".jV'><' c\..,. ,,"-' '. as...·, ct,.·...Q.A;LC"" 133 "1 "~ .. ! .1'1 HEBE SIGNORINI GONÇALVES tos.A funçãodoEstado,naconcepçãode 1959,estariarestritaàoferta de suporteemcondiçõesdeexceção,quandocircunstânciasespeciais impedissemou dificultassemo exercíciodasfunçõesprotetorasdafa- mília. Em conseqÜência,osprogramasdebem-estareramconcebidos deformaaproverassistênciaprioritáriaàfamília,admitindo-seapenas em casosextremosqueumafamíliasubstitutapudesseocuparo lugar da famíliabiológica.Em todoo mundo,criou-seumaextensaredede serviçosdestinadaa atenderàscriançasqueviviam emfamíliascom dificuldadesgeradaspelaenfermidade,pelodesempregoou pelaau- sênciadeum ouambosospais. En(í9~s termosdanovaConvençãodaONU sobreosDireitos daCriançaimprimemumaalteraç~í.ibSiãílclâlnãÓticacomqueenfoca a família: consolidano direitointernacional<:l~§.~~CQ~.~~. éll~2.'.l~~sobreyivê~:!a,à educa2~?c~~.E!:~eç~ocontrar: abusoe a exp.lº~a2ª().Scib~aégidedaConvençãode 1989,váilas~rÚlçõesalteram dispositivoslegaisdemodoatornarobrigatóriaa itúormaçãodeinci- dentesdeabusocontracrianças.Profissionaisdesaúdeeeducaçãoem todo o mundo(no Brasil inclusive)sãohoje legalmenteobrigadosa itúormaraosetorpÚblicoa ocorrênciadecasossuspeitosouconfirma- dos deviolênciacontraa criança.A rededeagênciassociaispassaa desenvolvernãoapenasprogramasdeassistênciaàcriançaeàfamília, comotambémprogramasdestinadosa identificarecoibir a violência depaiscontrafilhos,queemcasosextremospodeminvocara interven- çãojurídica destinadaapromovero afastamentotemporáriooudefini- tivo deumacriançavivendoemlaresabusivos.O nÚmeroprecisode vítimasé desconhecido,masnosEstadosUnidos os casosnotificados deviolênciacontraacriançaalcançamacifradosmilhões,eumnúme- ro expressivodecriançaséafastadodeseuspaisbiológicos.O temase difundepor todoo mundo,e a questãoda violênciacontraa criança passaà ordemdodia. Mas - afinal- qualanaturezadessefenômeno?A violênciacontra a criançatemraízesnafamília,ou foradela?É recente,ourepresenta um problemaantigo,apenashojeidentificado?Por quea ciência- a Medicina,deinício, eagoraasCiênciasSociais,aAntropologia,aPsi- cologia- ~omaa si atemáticadaviolênciacontraa criança,numapro- fusãodeestudos,eaindaassimsequerconsegueestabelecerconceitos mínimos,delineara naturezadaquestãoe estabelecercomsegurança 134 INFÂNCIA E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ••• padrõesdeconduta,intervençãoeprevenção?Por quea CiênciaJurí- dica, que sempresedeclaraavessaa conceitospoucoestabelecidos, abraçao temae se aplicaem aprimorara legislaçãoque sustentaa intervençãonafamília? ~ BREVEHISTÓRICO DA VIOLÊNCIA CONTRA A CRIANÇA Os fatosquehojeaciênciaclassificasoba categoriaviolênciacon- tra a criança têm lugar na história da humanidadedesdetempos imemoriais.Livros religiosos,comoa Bíblia, registrama matançade criançasordenadaporHerodes;naGréciaenaRomaAntiga, erarela- tivamentecomumo infanticídio;noséculopassado,apopulaçãonova- iorquinachocou-secoma revelaçãode~'qu.eapequenaMary Ellen ha- via sidovítimadeseverosespancament\ infligidos por seuspaisado- tivos.Mas éprecisocuidadoao tomaress fatoscomosemelhantes. Cadaumdelesserefereaperíodoselugaresdistintos,aculturasdiver- sas,e comotal têmsignificadosquesãoessencialmentediferentesou emcertosaspectosdiametralmenteopostos. A violênciadomésticaimperana humanidadedesdesempre.Afir- maçõesdesteteorabremmuitostrabalhossobreo temada violência contraa criança,etornaram-seumareferênciaquaseobrigatóriapara aquelesquedesejam,invocandooargumentodahistória,âesqualificar o discursodosqueaindainsistememnegaraexistênciadaviolênciana família,ouminimizarsuaimportâncianasociedadecontemporânea. À afirmação,seguem-seosexemplosqueatestariamsuaveracidade: osgregoseliminavamsumáriaeimediatamenterecém-nascidosportado- resdedeficiênciafísica(RADBILL, 1988);noséculoXIX, milharesde criançasfrancesasmorreranlemdecorrênciadofilicídio (AZEVEDO e GUERRA, 1997);aindahoje,emalgumastribosafricanas,meninassão iniciadassexualmenteporfamiliares(LEVETT, 1989),e recém-nasci- dossãovendidoscomoescravosparatribosvizinhas(RADBILL, 1988).. Práticasdesseteorsãoregistradastanto'emdocumentoshistóricos quantoempesquisascontemporâneas,eosregistrospassama serrepe- tidosemartigosportodoo mundo,comodemonstraçãocabaldequea violênciacontraacriançaéfenômenoonipresentecomo qualseconvi- ve desdetemposimemoriais.Ao primeiro impacto,o relatochocae 135 ~1' 1I ;1 " ! HEBE SIGNORINI GONÇALVESdespertamesmoumacertaincredulidade.Por querazão pais gregos, franceseseafricanossacrificariamseusprópriosfilhos? Quequalidade devínculo,quetipodecrençaequevalorsocialjustificariao infanticídío ou a entregadoprópriofilho à escravidão? Prevaleciaentreosgregosa crençadequeo defeitofísico deuma criançanãoapenasatingiaseuportadorcomocomprometeriatodaa suadescendência,jé1quepoderiasertransmitidopor hereditariedade. Essacrença,referendadapelaciênciagrega,eratransmitidaaoscida- dãospormédicoscomo50ranoefilósofos,entreelesPIatãoeAristóteles (RADBILL, 1988).A culturagrega- que,por guerreira,valorizavao indivíduo forte,saud,lvele corajoso- ofereciasolo fértil paraqueos pais,acatandoarecomendaçãodeeliminarportadoresdedefeitosfísi- cos, aceitassemcometero assassinatocontraseusprópriosfilho~.Jb.--. sim,emboraatradiçãorecomendasseo exercíciodoinfanticídiocontra criançasdefeituosasna antigaGrécia,essapré1ticanãofala do desejo dospais,masantesdeumdesejosocialfundadona ciênciaenatradi- ção quesesobrepõeà vontadepessoal.Os paisgregosnãodesejavam filhos defeituosos(mesmoporqueo defeitofisico era indício de seu própriofracasso),masantessubmetiam-seaoqueeracrençacoletivae recomendaçãocientificamenteendossada. A FrançadoséculoXIX assistiaaumaalteraçãoprofundadecostu- mesevalores.ConflitosintrafamiIiares,antessolucionadosno espaço privadodacasa,passarama sesubmeterao crivo do olharpÚblico.A herança,o dinheiroesobretudoa honraforamelevadosà condiçãode bensfamiliares,umaespéciedepatrimônioa serguardadoa qualquer preço.No períododasgrandestransformaçõesburguesas,a honrada família é seubemmaioresetraduznafidelidadeda mulhercasadaa seu marido, e na reclusãoda mulher solteirano lar, em respeitoao nomepaterno.Para ocultaro deslizedo sexoextramarital,a mulher nãohesitaemrecorreraoinfanticídio,poisoscostumeslheensinaram queo crimesexualé maisgravequeo assassinato(PERROT, 1992). Ironicamente,muitosdosfilhos ilegítimosoubastardosresultavamdo incestooudo estuproque,ignoradospelasnormasmoraisejuridicas, erampré1ticascorrentesnaépoca(COREIN, 1992).A mulherquea lei condenavapeloinfanticídioeraamesmamulhervitimadapelaviolên- cia sexualnafamília eforadela. Nos anos70,algunspesquisadorestomaramconhecimentodeque 136 INFÂNCIA E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ••• meninasdeKaroo, pequenacidadedaÁfrica do Sul, aocompletarem cinco~ anosde idade,eraminiciadassexualmentepor irmãos, parentesoupelosprópriospais.Ao nomearessapré1ticacomoagressi- vaeviolenta,defrontaram-secomasurpresadassupostasvítimas,que recusaramo rótulo. As adolescentesficamchocadase indignadasao ouvir estapráticaser descritacomoviolênciasexualcontracrianças.(...) a noçãodetrauma psicológico,nas formastãoamplamentedescritasna literaturaociden- tal, não faz partedestecenáriode modoalgum(LEVETT, 1994:53). Aos olhosdaquelasmeninas,a iniciaçãosexualrepresentaum re- conhecimentodadrópriaexistênciacomosujeito,eabre-lheso acesso a um conjuntode'b\~ efavorespessoaisantesinatingíveis.Suprimiressapráticaequivale,laraelas,atolheroacessoaosfavoresrecebidos emesmoaomundoadulto,condenando-asparasempreà condiçãode crianças.Em outrastribosafricanas,atradiçãoidentificanaposiçãode nascimentoo destinodosujeito,eacredita-sequeacriançaquevemao mundode cócorastemparentescocomo mal e destinodebruxa.Por essarazão,a família recusa-sea seuconvívioe descarta-sedela,por meiodavenda,aumatribovizinha,comoescrava,aindanasprimeiras horasdevida (RADBILL, 1988). A incipientemedicinagrega,osconflitosmoraisdaFrançaburgue- sa,oscostumescentenárioseascrençasreligiosasdospovosafricanos vêmmostrarqueatosgratuitosaosolhosdamodernaculturaocidental ganhamsentidonainscriçãocultural.Ao secompreendercadaatona culturaqueo sustentae o produz,vê-sequeo fenômenodaviolência torna-semaiscomplexo,eficademonstradaa ineficáciaemtentarfazê- 10 linear: o infanticídiogregoe o espancamentode Mary Ellen não compartilhamo mesmosentido.Além do mais,a mesmaculturaque sustentaaviolênciapodedesencorajé1-la,oumesmopuni-Ia,eRADBILL (1988)registraváriosindíciosdessalutadacivilizaçãocontraaviolên- cia. A tradiçãoegípcianãopuniao infanticídio,masospaisquematas- semumacriançatinhampor deverninarseucorpomortodurante72 horas;acreditava-secomissodesencorajararepetiçãodoato.NasIlhas Britânicas,acomunidadeaceitavao filicídio sobacondiçãodequeele fossepraticadonasprimeirasvintee quatrohorasdevida dacriança; um filho quesobrevivesseao primeirodia vida passavaa seralvo da 137 HEBE SIGNORINI GONÇALVES proteçãodetodaa comunidade,ecomotalnãopoderiasermorto.Há registrodapuniçãocoma mortepeloesquartejamentodeumpai que abusoudaprópriafilha,já noanode 1305. A sociedadeencarrega-sedenormatizarcomportamentoseestabe- lecersançõesaosdesvios.Issonãoimplica,contudo,quea culturate- nhaopoderdeerradicaroscomportamentosquecondena.A violência - se pudermosusar o mesmodesignativoparatodaa gamade atos acimadescrita- persistia,comopersisteaindahoje,apesardesancio- nadamoralmente,epunidalegalmente. À luz dessasconsiderações,seriapossívelafirmarqueaviolênciaé hoje mais (ou menos)presentequeem outrasépocasda históriada humanidade?AutorescomoARIES (1978)eDEMAUSE (1982)sus- tentamqueosdireitosdacriançaconheceramumavançoincontes'''' I" --, na história,ecomotal acriançaéalvodaviolênciaemescalacadavez menor.Ao mesmotempo,organismosinternacionaisquetratamdavi- olênciadomésticatêmanunciadoqueos índicesdeviolênciacontraa criança,apesardeelevados,sãosubestimadosecrescentes.A títulode exemplo,a OrganizaçãoMundial de SaÚdeafirmouem 1986queos casosreconhecidosrepresentavamapenasa quartapartedaquelesque realmenteacontecemnascomunidades(citadoemSANTOS, 1987). A explicaçãoparaessaaparentecontradiçãodeveserbuscadaem duasvertentesdiversasecomplementares.Emprimeirolugar,épreci- soreconhecerqueaconsciênciadaviolência,ea intolerânciaa ela,são fenômenosrecentes.Como avançodaconsciênciacivilizada,aviolên- cia antesostentadasedissimula,seinterioriza,manifesta-seemespa- ços e formasantesimunesa ela (DOMENACH, 1981).Em segundo lugar,o quehojesecompreendepor"violênciadoméstica"ou"violên- cia contraa criança"abarcaum enormeelencodeatose fatos,ainda carentesde umaconceituaçãorigorosa.Ambosos pontosserãoreto- mados,masiniciemospelosegundo. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA: UM CONCEITO EM CONSTRUÇÃO I. A produçãodoconceito DesdequeSoranoaprovouna Gréciaantigaa eliminaçãodecrian- çasportadorasdedefeitofisico,a ciênciapoucosemanifestousobreo 138 INFÂNCIA E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ••• temadaviolênciacontraa criança.O próximoregistrodisponívelna área~neiro de1860,quandoAmbroiseTARDIEU - médicofran- cês- publicounosAnnalesD 'HygienePubliqueetdeMédicineLégale seu"Étudemédico-1égalesurlessévicesetmauvaistraitementsexercés sur desenfants".Médico 1egista,TARDIEU eraativoparticipanteda criminologiafrancesa,e comotal buscavaintegraro sabermédicoà áreajurídica. Em seusestudosdemedicinalegal,TARDIEU identifi- couferimentosdeetiologiadesconhecidaem32crianças,oitodasquais levadasàmortepelaslesões;os estudoslevaram-noa concluirqueos ferimentosteri~l;lsidoproduzidosporviolênciaousevíciaconduzidaspelospais. Est~ apenasum dos estudospublicadospor TARDIEU sobreo temado mfanticídio.O vínculo entrea criminologiaea área jurídicapodetercontribuídoparaqueo trabalhodeTARDIEU ecoasse nosmeiosjurídicos:em1895,ojuristaBonjeanpublicaEnfantsrévoltés et parents coupables, adotando as teses defendidaspor Tardieu (PERROT, 1992).O temapermaneceuesquecidodesdeentão,paraser retomadoapenasno início do século,nosEstadosUnidos. Em 1925,Caffeytorna-seo encarregadodoDepartamentodeRadi- ologiadeumHospitalInfantil emNew York. Um radiologistausual- menteagena retaguarda,com poucocontatocom os clientese sua históriadevida.Caffey,pediatraalémderadiologista,envolve-secom as criançasexaminadas,com seuspais e com os temasprópriosà dinâmicada família. A novidadedessaarticulaçãolevou-oa colher históriasquenãoapresentavamrelaçãológicacomostraumasidenti- ficadosnosexamesradiológicos.Dessaincoerênciaé queCaffeyfez nascera hipótesedequeaslesõespoderiamserexplicadascomotendo origemem agressõesdos pais, semconseguirno entantoconvencer seuscolegasmédicossobrea etiologiadotrauma.Ainda assim,publi- couem1946umtrabalhointituladoMultiplefracturesin thelongbones ofinfantsu.fJeringfromchronicsubduralhematoma,insistindonames- maargumentação.Em 1951,Silvermann,tambémradiologista,fezeco às interpretaçõesde Caffey,e atribuiuo fator intencionalàs injúrias identificadas,relacionandootraumaàfamíliadascrianças.A partirde então,algunsmédicospassaramaatentarparaosargumentosdeCaffey e Silvennann,e em 1955Whooley e Evans criticaramdiretamentea classemédicapelahesitaçãoemaceitarqueinjÚriasmÚltiplasemcri- ançaspudessemsercometidasintencionalmenteporseuspais.Em 1961, 139 li1, 11 " I! '" HEBE SIGNORINI GONÇALVES Kempe- presidentedaAcademiaAmericanadePediatria- organiza umaconferênciasobreotema,apartirdaqualoassuntoexplodiudefi- nitivamentenosEstadosUnidos e emto~ mundo.À realizaçãoda conferênciaseguiu-seapublicação,emlif&de artigohojeconsidera- do um clássico.O artigo,de autoriade Kempe,Silvermane Steele, intítulado"The BatteredChíld Syndrome",estabeleceo conceitode é~-;busofisic6; e foi publicadoem váriosperiódicos.Nele, os autores âíertavamo{Ínédicosa suspeitarda síndromeem qualquercasode criança com evidênciasexternasde negligência,contusãode órgãos internos,inchaçodetecidosmoles,contusõesna pele,evidênciasde fraturaspassadasou presentes,ou sintomasclínicos queparecessem estranhosà descriçãoqueamãefaziadasinjÚriasdacriança. O artigodeKempemarcouo usodomodelomédico,enfatizandoa patologiadospaisabusivos.Tipificadoscomoimaturos,sexualmente promíscuos,usuáriosdedrogasepsicopatas,ospaiseramtomadoscomo responsáveisisoladospelaslesõese ferimentosidentificadosnascri- anças.Na mesmalinha, muitosoutrosestudos,conduzidosprincipal- menteporpsiquiatras,identificavamospaisagressorescomoportado- resdecaracterísticaspsicopatológicas,sustentandoquesuapatologiaé quejustificariaaagressãoexercidacontraosprópriosfilhos. Num se- gundomomento,trabalhosfora daáreamédicacomeçarama questio- nar aquelasconclusões;demonstrou-sequeapenasdois traçosdeper- sonalidadeeramtípicosdepais abusivos:a depressãoe a ansiedade; observou-seaindaqueessestraçosnãopodemsertomadoscomopato- lógicos,umavez queconstituemreaçõescomunsao estressecrônico ou agudo(Wolf, 1985,apudBELSKY, 1993).Pesquisadoresda área socialemgeral,edaSociologiaemparticular,passaramentãoa traba- lhar sobreo temada violência contracriançascolocandoênfasena questãodo estresse;essesestudosmostraramquea m,l qualidadede vida (pobreza,desemprego)são fatoresgeradoresde estresse,o que nãoimplicaestabelecerassociaçãomecânicaentrepobrezaeabusomas estabeleceo vínculoentreo abusoefatoressociaismaisamplos.Essas pesquisasmostravamque,emborao abusoestivessepresenteemtodas asclasses,eramaiscomumentreoperáriosefamíliascommenorgrau de instrução,sujeitosa condiçõesdevida maisprecáriaseexpostosa riscosmaisagudosdeestresse(BELSKY, 1993). A contribuiçãodaPsicologiaaoestudodaviolênciacontraacrian- 140 "~ INFÂNCIA E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ••• çavemcolocarênfasenadinâmicadorelacionamentofamiliar.Toma- da comoo lugarondea violênciaeclode,a família abusivacom~ a serestudadadopontodevistadesuadinâmicainternae externa!Pes- quisadorescomoGarbarinoe Crouterdefendemqueo isolamentoso- cial dafamíliaéumimportantefatoraprecipitaraocorrênciadeeven- tosviolentos.O distanciamentoda vida comunitária,argumenta-se, sujeitaafamíliaacondiçõesdeestresse,namedidaemquetornaescas- sasasatividadesdelazer,bemcomoreduza possibilidadedeauxílio e apoioemmomentosdificeisdoconvíviofamiliar (BELSKY, 1993).1 BELSKY (1993)atribuia Bronfenbrennera grandealteraçãoque seproduziu,então,nosmodelosqueanalisamaviolênciacontraacri- ança:o abusoéhojeamplamentereconhecidocomoprodutodemÚlti- plasdetenninações,efeitodeforçasqueatuamemconexãono indiví- duo,nafamília,nacomunidadee nacultura.Segundoapostulaçãode Bronfenbrenner,o quedeterminase o abusovai ocorreré o balanço entrefatoresdeestresse(oupotencializadores,ou derisco) e suporte (ou compensatórios,ouprotetivos).A essemodelo,Co1'I'aI~QnOU-se chamarecológico. Nessanovaótíc<p;algunsfatoresjá correlacionadosaosabusofo- ramreinterpretados.01sesabiaquealgunstraçosdapersonalidadedos pais (depressãoe ansiedade)precipitavamaviolência,e quealgumas característicasdas crianças(temperamentodifícil, retardomentale hiperatividade)tornavam-nasvítimaspreferenciaisdo abusoJNo mo- delo ecológico,entende-sequeessesfatoresnão podemser tomados comodetenninantesdoabuso,masantescomofatoresqueprecipitam aviolêncianasfamíliasexpostasaoutrascondiçõesderisco,taiscomo crisesfinanceirasou emocionais.Decorredaí quea intervençãoque visea minoraraocorrênciaeosefeitosdaviolênciaésemprepromis- soravisto que,Giãohavendouma causaÚnica,não há tambémuma soluçãoÚnicájl prevençãoeo t:çatamentodaviolênciacontraacriança podemchegara resultadossatisfatóriosatuandosobrequalquerdas causas,ouqualquersubconjuntodecausas.Mas oqueéumavantagem podesertambémum obstáculo.A literatura,argumentao autor,não permiteindicarquaismedidassãomaisefetivas,nemquaissãoosas- pectosmaisfacilmentepassíveisdemodificação(BELSKY, 1993).10'- quesobressaino modeloéquea família estáimersana cultura,e é a culturaqueestabeleceasbasesquepermitemdiferenciarentreo queé 141 '>< ",I'( ,,//" HEBE SIGNORINI GONÇALVES aceitocomonãoviolentoe o queécondenadocomoviolento.Osfatos quetêmlugar"no cursodevida de um indivíduo, emsuafamília ou commiidade,vinculam-se,aindaqueparcialmente,aocontextocultu- ral maisamploqueenvolvepess0,a,s,casasebairros"(Bronfenbrenner, citadoemBELSKY, 1993:422).)Assim,valorese normassociaispo- ,-, ~ < demcontribuirparaa aceitaçãoou mesmoparaa tolerânciadoabuso -f~ contracrianças(KORBIN, 1988)~1 Como sevê,o conjuntode salJeresproduzidonessepercursoam- I,pliou a óticadeanálise:~tes concebidocomoprodutodapersonalida- lI" dedoentiadospais,o abusopassaaserrelacionadoàscondiçõesgerais 'i , devida dafamília,à dinâmicadasrelaçõesintraeextrafamiliareseàs \\concepçõesglobaisdasociedadesobreinfânciaepráticasdeeducação Ilecriaçãoinfantil.A violênciacontraacriançacomeçaasercontextua- lizada,vistaemsuasimplicaçõeslocaiseculturais"._ KORBIN (1991)lembraqueem 1961,quandoo temadaviolência contraa criançapassouamereceraatençãodeespecialistasnorte-ame- ricanoseganhouespaçonamídia,estudiososdeoutrospaísesnegaram ocorrênciassimilaresemsuasnaçõesdeorigemparasómaistardepas- sarema reconhecere estudaro fenômeno.Estesestudosvierama de- monstrarquevaloresculturaistêminfluênciaimportantesobreasformas eaincidênciadaviolênciacontraacriemça.Em culturasondeapunição ,jlsica é rard,o abusode criançasé tambémincomum.Contaaindaa '!~!itudegeraldasociedadeparacomacriança,emparticularacrençade quea criançaéumapropriedadecoma qualospaislidamcomomelhor lhesaprouver.Emoutraspalavras,atolerânciasocialparaaltosníveisde violênciapaviinentao terrenoparaaocorrênciadaviolênciafamiliar. A partir dessaconsideração,fundadaespecialmentenaAntropolo- gia, diferençasculturaispassarama sertomadasemconsideraçãono i;üerior dosmodelosteóricosdeanáli~e-.dgudQl~ciacontraa criança. E combasenavisãoantropológicaqU\ KORBINJsustentaque,naprá- tica,é impossívelchegara umadefiniçãouniversaldeabuso:seavio-I), I lência ocorreno interiordacultura,sódeveserdefinidacombaseem I . seusparâmetrosespecíficos.Os estudostransculturaisconsideramqueV1/ a defiriiçãodo queé "bom"ou "mau" paraa criançadependebasica- mentedospadrõesculturaisnosquaisafanúliaeacriançaestãoinseridas (KORBIN,1988; KORBIN, 1991).De talprincípio decorremimplica- çõesimportantesparaoestudodotema. 142 -, INFÂNCIA E VIOL~NCIA DOMÉSTICA ••• A primeiraimplicaçãoé quesedeveabrir mãodedefiniçõesuni- versaisdoabuso,vistoqueumatosósetornaabusivoesótrazprejuí- zosparaacriançasea culturaespecíficalheconferesignificaçãonega- ______ ~------------ ,-o .---- •.----- .•..-- •.- ...• '---.~- .---.-- .••.---..-----.-.~~ ,.'--" ••.-.,.-"- - ~a. Assim, qualquerdefiniçaouniversaldeveantessÚbnieter-seao crivo particulardogmposocialemestudo.KORBIN (1988)chamaa atençãoparaquedefiniçõesculturalmenteapropriadasdevemlevarem contaumolharinternoàcultura(emicperspective)assimcomoo olhar de um observadorexterno(eticperspective).A primeiraperspectiva refere-seaossignificadostais comosãoentendidospelos sujeitosde umamesmarealidadefllltural, ea segundaaossignificadosdadosporobservadoresexternos,---KORBIN propõequeabusoe negligênciase-I' jamdefinidoscomoo danopara a criança quer~~çultadiretamentede!I umaaçãoproscritaquesepodeprevenir(p. 68).:Estadefinição,susj! tentao autor,serveadoispropósitos:distingueoãbusoea negligência deoutrosproblemassociais,econômicose desaÚdequeafetamigual- menteacriançaeafamília,aomesmotempoqueseaplicaaoelencode situaçõesquevariamna dependênciadocontextosocialecultural,nas diversasnaçõesecomunidades(KORBIN, 1991). Como sevê, há ainda muitapolêmicaem torno do tema,e essa polêmicaterminapor setraduziremdefiniçõesdeviolênciaqueguar- dam diferençasimportantesentresi. Algumas definiçõessão mais abrangentes,abarcandotodae qualquerformadeabuso,inclusiveas maisbrandas,enquantoqueoutrasrestringema aplicaçãodo termo apenasàsformasmaisgraves.Por exemplo,umalevepalmadapodeou não serconsideradaum atodeviolênciafísica, conformeo autor.As divergênciasna conceituaçãosãocontaminadasaindapeladiferença cultural,já queum comportamentopodeser consideradoabusivoem umacultura,enãoemoutra.Por exemplo,a manipulaçãodagenitália debebêspodeserclassificadacomoabusivaempaíseseuropeus,masé tidacomodemonstraçãodeafetoemalgumascomunidadesafricanas. Ocorrequedestasdivergências,nemsemprenítidas,derivamestimati- vasdiferentesquantoà incidênciadeabusoe, maisimportanteainda, práticasdiversasnosprogramasdeintervençãoetratamento. 2. Implicaçõesdapolêmicano dimensionamentodaviolência No anode 1984,realizou-senaFinlândia umlevantamentonacio- naldaincidênciadeviolênciacontracrianças;osresultadosindicaram 143 HEBE SIGNORINI GONÇALVES quenaqueleano18%dascriançasfinlandesashaviamsofridoalguma formadeviolêncialevee5% haviamsidovítimasdeabusosgraves.O mesmoestudo,repetidoapenasumanomaistarde,encontrou72%de vítimas deviolêncialevee 8%vítimasde abusosgraves(HUERTAS, 1997).Em 1992,oNationalCenteronChild AbusePreventionResearch estimouque20%detodasasmulherese7% detodososhomensame- ricanosjá teriamsidovítimas, pelo menosumavez, de episódiode abusosexualnainfância(MARQUES, 1994).No Brasil, estima-seque 6 milhõesdemeninase3,1milhõesdemeninosa cadaanosejamvíti- masdeagressõessexllais(AZEVEDO e GUERRA, 1993). HUERTAS (1997)nãooferecedetalhesdoslevantamentoscondu- zidosnaFinlândia,masa significativaelevaçãodosíndicesdeviolên- cia contraa criança,entreos anosde 1984e 1985,sugerealgumas indagações.Teriahavidona Finlândia,entreosanosde84e 85,uma sÚbitaexplosãodeviolência?Ou seráqueo levantamentode 1985fez usodeumconceitomaisabrangentedeviolência,numreflexodaquilo queKORBIN (1991)já referiucomoo reconhecimentoprogressivoda existênciado fenômeno,depoisdeHelfer eKempehaveremestabele- cido o conceitodeabusonosEstadosUnidos?No campodaviolência sexual,asestatísticasbrasileirasenorte-americanasapontamumapro- porçãodiferentedevítimasconformeo sexo.Pode-sesuporcomisso queosmeninosbrasileirosestãomaisexpostosqueosnorte-america- nosao abusosex1.tal? Tem-se aqui os primeirosproblemasdecorrentesda imprecisão conceitual.Cadaestudodeincidênciapauta-seemumadefiniçãoespe- cífica do queconsideraabuso,e portantoos levantamentosretratam realidadesparticulares,aindaqueserefiramaumamesmabasecultu- ral egeográfica.Comonemsempreseconhecemosconceitosquere- gemo levantamentodedados,a comparaçãopodesetornarinócua,ou mesmoenganosa.Esseproblematorna-seaindamaisgravequandoa comparaçãoéfeitaentreculturasdistintas,já queosdadospercentuais, resultantesdosdiversoslevantamentos,poucosignificampersi. Como MINAYO (1997)já lembrou,os estudosepidemiológicossãoimpor- tantesmasnãosuficientesparaapreendera complexidadeestmtural, cultural e conjunturaldo fenômenoda violência. Eles oferecemum suporteimportanteparaapreendera dimensãodofenômeno.Mas de- vemsercomplementadosporanálisesqualitativase,aindamaisimpor- 144 INFÂNCIA E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ••• tantequeisso,permitemconclusõesapenasesomentenouniversoana- lisado,impedindogeneralizaçõesparaalémdaconjunturaemquese produzem. JPor conjuntura,entenda-seinclusiveahistóriadaproduçãodocon- ceÚadeviolênciacontraacriança.As estatísticasindicamumnÚmero cadavezmaiordecasosconhecidosdeviolênciadepaiscontrafilho(2 Mas issonãosignifica necessariamenteumaampliaçãodo fenômeno daviolência.É precisoconsiderar,emprimeirolugar,queabusoe ne- gligênciasãoconceitosmuitorecentes,e osdadosreferem-sena me- lhor dashipótesesaumperíododeapenas30anos,curtoparasereco- nhecersuareal extensão;em segundolugar,os conceitosrecentes,e aindamuitocontroversos,divergememtermosdeseveridade,falamàs vezesdeviolênciaepisódicae outrasvezesdeviolênciacrônica,e re- fletemfenômenosdiferentes,dificultandocomparaçõesentrepaíses, ou entreperíodos,ao longodasÚltimastrêsdécadas. A partir de extensolevantamentoda literatura,BELSKY (1993) apontaoutrasdificuldadesdapesquisanaárea.A primeiradelasreside na discriminaçãoentreosvários tiposde abuso;embora~_!iteratura admitaquatrotiposdeabuso(abusojlsico, abusosexual,abusopsico- lógico e negligência),atéhojea maiordificuldaderesideemfazer a distinçãopráticaentreestestipos.A maioriadosestudosanalisavários tiposde abusoao mesmotempo~-etodosos indíciosapontampara a hipótesede qUC,llviolêncianãoexistaemestado"puro", sendomais, -l pr_º-,::ável_m'-~i1sd~ver.~';lsforIllas_c1~.aQusoseassocien~_indicandoum feIl~m~~~~o-mórbicio.A segundadific~ida{fedlZresI>eltoàdef111Íção préviadofenômenoa serinvestigado.Quandoospesquisadoresvãoa campo,precisamantesdemaisnadalocalizaroscasosa seremestuda- dos,e a fontemais comumsãoas agênciasdeatendimento.Ao usar comofontede estudoos casosdas agências,os estudosvalem-sede umaqualificaçãoqueresultadenegociaçõesentreafamíliaeasautori- dadesjurídicas, e não decritériospredefinidos,dadospelaliteratura, como seria desejável. Um terceiro problema são as técnicas de amostragemquedefinemosgruposestudados,queporutilizaremclas- sificaçãobaseadanaconveniênciaounaoportunidade(sic),produzem amostrasinadequadas,viesadas,e comissocomprometemtodaa in- vestigação.Mais importante:é nessesresultadosqueas agênciasde atendimentopautamseusprogramasdeação,eénessesresultadosque 145 HEBE SIGNORINI GONÇALVES sepautaa legislaçãoacercadaviolênciacontraacriança.Essaéamais importanteimplicaçãodacontrovérsiaconceitual. 3.Jmplicações dapolêmicano trato social e jurídico do tema r Emboraos autoresmaisconceituadosna áreareconheçamo peso dos-determinantesculturaise sociaisna ocorrênciado abuso,é certo que- por definição- a violênciadomésticatemlugar no interio~_da família, e maisespecificamentefala da relaçãoentrepais e filhos. A títulodeexemplo,sãotranscritasaseguiralgumasdefiniçõesadotadas na literaturanacional: - Maus-tratosí1sicosé o usoda força tlsicade formaintencional,não -acidental, ou os atosde omissãointencionais,nãoacidentais,pratica- dos por partedos pais ou responsáveispelacriançaou adolescente, com o objetivodeferir,danificarou destruir estacriançaou adolescen- te,deixandoou nãomarcasevidentes(MONTEIRO FILHO e PHEBO, 1997:10). Os maus-tratosna infânciasãogeralmenteimpostospelosprópriospais ou responsáveis,presentesindistintamenteemtodasas categoriassó- cio-econômicas,não respeitandocredo,raçaou cor (SANTOS, 1987: 75). A violênciadomésticacontracriançase adolescentesrepresentatodo atoou omissãopraticadoporpais,parentesou responsáveiscontracri- ançase/ouadolescentesque- sendocapazdecausardanoí1sico,sexu- al e/ou psicológicoà vítima- implica,de um lado,umatransgressão do poder/deverde proteçãodo adultoe, de outro,umacoisificaçãoda infância, isto é, uma negaçãodo direitoquecriançase adolescentes têm de ser tratadoscomo sujeitose pessoasem condiçãopeculiarde desenvolvimento(GUERRA, 1998:32-33) .~ Definir aviolênciacontraacriançacomofenômenoquetemlugar na relaçãoentrepais e filhos não implica queasagênciasde atendi- mentodevamrestringir-seaatuarnessaesfera.A definiçãodeabusoe negligênciaéumguiaparalocalizarofenômeno,masdeformaalguma ésuficienteparapautarosprogramasesustentaraçõesquetenhampor propósitominorá-lo.O quesetemvisto,contudo,é quea definição, tomadaisoladamente,condicionaper si a ação,mesmoquandoo dis- cursoreconheceosavançosqueinscrevemaviolênciacontraa criança na culturae nasociedade.Com essamanobra,sustenta-seuma inter- 146 INFÂNCIA E VIOLêNCIA DOMÉSTICA ••• vençãotécnicaqueinterferedemodoquaseexclusivosobreaspráticas educacionaisno espaçoprivadodafamília. EssenãoéumproblemaexclusivodoBrasil.Ao comentarasrecen- tesmodiflcaçõesnalegislaçãocanadense- tidapormuitosautorescomo a maisavançadaemtermosdotratamentodispensadoàviolência se- xualcontracrianças-, SULLIVAN afirmaque: 1=~ltravésdacriaçãodaviolênciasexualenquantoumacategoriaunificada a sertratadacomo Ülto empírico,o Comitêimpedea investigaçãode suascausasou atributossociais;como, por exemplo,a característica patriarcalda família e das relaçõesdomésticasnestasociedade,e a questãodo motivo,nestecontexto,pelo qual a violênciarelacionada ao sexo é perpetradaprincipalmente por homens heterossexuais (SULLIVAN, 1992:99). A tensãopolíticaé,assim,transformadaempatologiaindividual. Corre-seo risco,comisso,decircunscreveraoespaçofamiliar um fenômenoquetemraízessociaiseculturais,efazerdaviolênciacontra a criançaum dispositivodecontrolesobreafamília,aexemplodoque já seviu com a figura do criminoso'(FOUCAULT, 1987)e com os dispositivos higiênicos que fundaram a família nuclear moderna (DONZELOT, 1980).No campodaviolênciadoméstica,a evolução teóricamostrouseresteum fenômenoqueresultadefatorescomple- xos,queinteragemnafamília, indicandoafaláciadetentarminorá-Io agindoapenassobreo espaçoprivadodafamília.Não obstante,con- formecriticaKELLY (1989),grandepartedosestudose dosprogra- masnorte-americanoseeuropeusaindainsisteemadotarum enfoque empiristaepositivista,apresentandoe tratandoaviolênciadoméstica comoumproblemadeordemindividual,familiar,psicológicaoumes- modeclassesocial. Outroproblemaadvémda generalizaçãoindevidade estudosepi- demiológicos,o que tem levadoalguns profissionaisde saúdeque atuamjunto~criançasvítimasdaviolênciaabuscarno sujeitoo efeito traumáticodaviolência,surpreendendo-sequandonão o encontram. Supondocomonecessárioqueaoabusosegue-seotrauma,osprofissi- onaisesquecem-seporvezesqueossujeitostêmdireitoà singularida- de, ou mesmoquepodemcontarcom algum nível de suporteque 147 HEBE SIGNORINI GONÇALVES minimize O efeitodaviolência sofrida.Por exemplo,ao relataremo atendimentoa criançasabusadas,BRUNET eDUBOURGEAL-QUEY (1994:57)afirmamteremencontrado"com freqÜência'criançasque desestabilizamasequipespordarema impressãodenãohaversofrido com suasituação[deabuso]"(os grifos sãomeus).Uma intervençãq fundadana premissade quea criançaé portadoranecessáriade um distúrbio,aindaqueestenãoestejavisível,podeincutirno sujeit()um ~sentimentodeinadequaçãoeproduzirefeitostãoperniciososguantoaJI.- - . "'. " .. , __ .'.__ ._.,_. _ 11própriayi2!ência: .' O risco maÍorem definirprogramasdeatendimentotomandopor baseestudosconduzidosempaíses,culturasouperíodosdiversosda- quelesnos quaíssepretendeagir é qud~faltadeparâmetrossegurosI} ~_ !para iniciar um processode íntervençãona dinâmicada família e a ausênciadeindicadoressobreaeficáciadessaintervenção,terminapor justificaro quequerquesefaçaemnomedobem-estardeumacriança I sujeitaàviolêncianolar.Taisprogramascolocamparaafamíliaorisco deserinvadidaporaçõesquenãosesabeporquecomeçar~m,nãotêm garantiasdeeficáciaenãosesabecomoeporqueparar._ A verdadetransitóriaea discordânciadominantenesseterrenonão impedem,contudo,queleiscontinuemaserprom~llgadas,quefamílias sejamseparadas,equesevivahojesoba égidedeumaintervençãoque podesertãoprejudicialeviolentaquantoo atoquea gerou._Crianças de tenraidadesãoacusadasde assédiosexualemrazãodeum terno beijo na face de um amigo. Famílias sofremo efeitodevastadorda suspeitadeincestocometidopelafigurapaterna.Exagerosgeradospor um saberincipiente,masqueaindaassimpromoveefeitossociaiscon- cretos. Hoje,ganhaforçao movimentomundialpararegular..nentarjuridi- camenteo controlesobrea violência contracrianças!.N:0Brasil, al- guns autoresdefendemque os agressoresdevemser alvo de trata- mento,alémdanecessáriapun.!ção,comoforma decontenção(AZE- VEDO eGUERRA, 1997:13).Discute-se,alémdisso,acriminaliza- çãodoabusocontrafamiliares;-como encarceramentodosagressores.. O esforçopelaadoçãodemedidasjudiciárias temsido reforçadope- los dispositivosinternacionaisquetratamdotema.A Convençãoso- bre os Direitos da Criança, adotadapela AssembléiaGeral da ONU em 1989,proclama: 148 INFÂNCIA E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ••• Art. 19- 1- Os EstadosPartesadotarãotodasasmedidaslegislativas, administrativas,sociaise educacionaisapropriadasparaprotegera criançacontratodasas formasde violênciafisicaou mental,abusoou tratamentonegligente,maus-tratosou exploração,inclusiveabusose- xual, enquantoa criançaestiversoba custódiados pais,do represen- tantelegalou de qualqueroutrapessoaresponsávelpor ela. Art. 19 - 2 - Essasmedidasde proteçãodeveriamincluir, conforme apropriado,procedimentoseficazesparaa elaboraçãode programas sociaiscapazesde proporcionarumaassistênciaadequadaà criançae às pessoasencarregadasde seucuidado,bemcomoparaoutrasformas de prevenção,paraa identiticação,notificação,transferênciaa uma instituição,investigação,tratamentoe acompanhamentoposteriordos casosacimamencionadosde maus-tratosà criançae,conformeo caso, paraa intervençãojudiciária. Desdequeo temafoi inseridona legislaçãointernacional,vários outrospaísesbuscaramuma"atualização"deseuscódigosjurídicos, naintençãodeadequar-seaprincípiosqueacomunidadeinternacional definiacomoosnovosdireitosdainfâncianaeramoderna.A Escócia, quecriminalizavaoincestocombaseno Leviticus,livro bíblicodatado de 1567,promulgaem1986o IncestandRelatedOflences/lct (BELL, 1993).A legislaçãocanadensedatade 1991.As legislaçõesdosdiver- sospaísesvão,poucoapouco,incorporandoo dispostona Convenção daONU. O Brasil nãoconstituiexceção.A ConstituiçãoFederalbrasi- leira traz ao cenáriojurídico nacional,em'1988,um temaatéentão relegadoa l~gislaçõesmenores:aregulaçãodaviolênciano interiorda família.Q art.226,emseuparágrafo8°,afirma: Art 226,§ 8' - O Estadoasseguraráa assistênciaà família,napessoa de cadaum dosquea integram,criandomecanismosparacoibira vio- lênciano âmbitode suasrelações. Emjaneiro de 1990,O Brasil ratificoua ConvençãosobreosDirei- tosdaCriançae emjulho domesmoanopromulgoua Lei n°8.069,o EstatutodaCriançae do Adolescente,queinclui o temadaviolência emváriosartigos,dentreosquaisdestacam-se: Art. 5 - Nenhumacriançaou adolescenteseráobjetode qualquerfor- ma de negligência,discriminação,exploração,violência,crueldadee 149 I, yX:. Apenasnasegundametadedo séculoXX aviolênciafoi qualifica- da comoo mal do século,e apontadapelaOrganizaçãoMundial da Saúdecomo um fenômenoendêmico,responsávelpor significativo percentualdos gastosdo sistemainternacionalde saúde(MINAYO,
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