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PRINCÍPIOS E REGRAS FUNDAMENTAIS

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PRINCÍPIOS E REGRAS FUNDAMENTAIS 
NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Constitucionalização do Processo Civil
O artigo 1º. do novo diploma expressa a ideia de que não é possível compreender o processo civil sem antes examinar a Constituição. Todas as normas processuais devem ser interpretadas de acordo com a Constituição. Um Código produzido atualmente não pode se desvencilhar da Constituição. Do ponto de vista normativo, o artigo reproduz uma obviedade, ou seja, qualquer norma jurídica brasileira somente pode ser construída e interpretada de acordo com a Constituição Federal. Mas nem por isso deixa de ser importante a afirmação da moderna indumentária do processo. Isso representa, claramente, uma tomada de posição do legislador no sentido de reconhecer a força normativa da Constituição.
2)  Solução Consensual dos Conflitos
O art. 3.º, § 2.º, e § 3.º, do Novo Código, estabelece nova diretriz fundamental processual. Trata-se do princípio de promoção pelo Estado da solução por autocomposição. Consagra uma verdadeira política pública de solução consensual dos conflitos. Consagra a Resolução 125/10 do CNJ, que disciplinava a temática. Todo o Código é estruturado nesse sentido: no sentido de estimular a autocomposição. O não pagamento de custas em caso de transação é exemplo de estímulo à solução consensual de conflitos. A adição, no acordo, de outras lides e pessoas, segue a mesma sistemática.
Duração Razoável do Processo e Primazia da Decisão de Mérito
O art. 4.º, NCPC, prevê a consagração da duração razoável do processo. Com propriedade, as partes têm o direito à solução de mérito: decorre de um princípio novo – o princípio da primazia da decisão de mérito. A solução de mérito prefere à solução que não é de mérito. A decisão de mérito deve ser considerada decisão prioritária. As partes têm o direito à satisfação da decisão – é o direito à efetividade. Consagra-se, também, o princípio da efetividade do processo. Pela primeira vez temos um artigo que expressamente diz isso.
            Nesse sentido, o art. 139, XI do Código de Processo Civil, traduz corolário do princípio da primazia da decisão de mérito. De igual modo, o juiz não pode indeferir a petição inicial, sem antes mandar que o autor a emende. Mais a mais, não pode o relator de um recurso, sem antes conceder à parte o direito à emenda, inadmitir o recurso por ausência de requisito sanável. Da mesma forma, a apelação contra qualquer sentença sem exame de mérito permite retratação, para permitir que o juiz possa reconsiderar e julgar o mérito. Nessa mesma linha, vem o art. 1.029, § 3.º. Seu propósito é facilitar a decisão de mérito desses recursos. É um marco na concretização no princípio da primazia da decisão de mérito. 
Princípio do Contraditório
A previsão vem no art. 9.º, do CPC-15, com as exceções do parágrafo único, que não é exaustivo. Há outros exemplos espalhados na legislação, de decisões provisórias concedidas sem a oitiva do réu, a exemplo da liminar possessória, liminar de despejo, liminar em mandado de segurança. A Constituição Federal prevê o contraditório no inciso LV, do art. 5º., como exigência para o exercício democrático do poder. Democracia é participação, e a participação no processo opera-se pela efetivação da garantia do contraditório. Essa é a dimensão formal do princípio do contraditório (garantia de ser ouvido, participar do processo, de ser comunicado, poder falar no processo). Há ainda, a dimensão substancial do princípio do contraditório. Trata-se do “poder de influência”, que vai além, pois não basta apenas garantir a parte que participe do processo, é necessário mais, é necessário que se garanta condições mínimas de poder influenciar na decisão do órgão jurisdicional. 
Princípio da boa-fé processual
O art. 5.º, por sua vez, consagra o princípio da boa-fé processual. Antes, era preciso extrair o princípio da boa-fé do devido processo legal. A redação deixa claro que o princípio da boa-fé se dirige a todos os sujeitos do processo, inclusive ao juiz. A redação é cópia do Código de Processo Civil Suíço. Assim, acaba a discussão se o princípio incide apenas para a parte. Não se pode confundir o princípio da boa-fé objetiva e boa-fé subjetiva. Esta é um fato da vida, o fato de alguém acreditar que está agindo licitamente; aquela, não é fato, é norma, um princípio segundo o qual os comportamentos humanos devem estar pautados em um padrão ético de conduta.
O art. 5.º é exemplo de cláusula geral processual. O que significa isso? Significa que se trata de um dispositivo normativo construído de maneira indeterminada tanto em relação a sua hipótese normativo quanto a sua consequência normativa. Caberá aos Tribunais decidir os comportamentos de acordo com a boa-fé.
Os alemães já identificaram a concretização do princípio da boa-fé em quatro grupos de situações:
1.      O princípio da boa-fé torna ilícita qualquer conduta de má-fé;
2.      Abuso do direito no processo (considerado comportamento ilícito porque contrário à boa-fé – “o mero capricho não se tutela”);
3.      Comportamento contraditório (proibição do venire contra factum proprium);
4.      Supressio processual (supressio é a perda de um direito pelo fato de não ter exercido esse direito por um tempo tal que gerou na outra parte a expectativa de que não mais se exerceria). O silêncio no controle de admissibilidade do processo gera nas partes processuais a expectativa de que o processo estava regular. Eis um exemplo de supressio.
O princípio da boa-fé ainda produz os deveres de cooperação e exerce uma função hermenêutica, porque orientará a interpretação da postulação e da decisão. Petição inicial e decisão devem ser interpretadas de acordo com a boa-fé.
Dever de Consulta / Proibição de decisão-surpresa
O contraditório garante à parte a possibilidade de opinar sobre qualquer questão que seja relevante para a solução da causa, ainda que se trate de questão cujo conhecimento pode dar-se de ofício pelo juiz. Em síntese: deve ser submetida ao diálogo processual, evitando decisões surpresa. Fala-se que essa exigência decorre do dever de consulta, que é dever do juiz. O juiz tem o dever de consultar a parte sobre questões sobre as quais elas não se manifestaram. O art. 10, CPC-15, consagra o dever de consulta. Não se trata de artigo que enuncia o princípio do contraditório; enuncia uma regra de que o juiz tem que ouvir as partes antes de decidir com base em uma questão. Esta regra concretiza o princípio do contraditório.  Tal regra, porque importante, foi repetida em outras disposições do Código, de que é exemplo o art. 493, parágrafo único, 933 e art. 927, que trata da formação dos precedentes, todos do CPC-15. A regra, uma vez desrespeitada, gera nulidade da decisão por afronta ao contraditório.
Princípio da Igualdade Processual
Vem previsto no art. 7.º, sendo uma das novidades do CPC-15, porquanto o disseca. O princípio da igualdade no processo se observa em quatro aspectos:
a. A imparcialidade do juiz;
b. É preciso que haja igualdade no acesso à justiça;
c. Redução das dificuldades de acesso à justiça (financeira, geográfica – possibilidade expressa de sustentação oral por videoconferência, comunicação – deficiência auditiva: o código prevê expressamente a exigência de utilização da LIBRAS quando houver partes ou testemunhas que dela precisem);
d. Paridade de informações.
O Código não só cria o art. 7º, mas traz várias concretizações da cláusula geral da igualdade. Outro exemplo de manifestação do princípio da igualdade é a regra da tramitação prioritária, prevista no art. 1.048, CPC-15. 
Análise do art. 8.º, CPC-15
A primeira parte reproduz dispositivo da LINDB. A segunda parte é “para demonstrar que o legislador está bem atualizado”, o que é incompatível com a primeira parte, com terminologia autoritária. A dignidade da pessoa humana aparece aqui para iluminar a interpretação do Novo Código, de que são exemplo a regra da Linguagem Brasileira de Sinais, extenso rol debens impenhoráveis (direito ao patrimônio mínimo), tramitação prioritária de processos envolvendo pessoas portadoras de doença grave, humanização da interdição. A terceira parte, por sua vez, tem origem no art. 37 da Constituição Federal[15], a exceção da impessoalidade e moralidade, não mencionadas porque a impessoalidade corresponde ao juiz natural, e moralidade no âmbito do direito administrativo corresponde ao princípio da boa-fé.
O dispositivo substitui a expressão lei por ordenamento jurídico, de modo a deixar claro que o juiz aplica o Direito como um todo, e não só a lei. Entretanto, o mesmo legislador que disse isso, findou rendendo atributos ao princípio da legalidade. Nesse passo, o Código ajuda na reconstrução do princípio da legalidade, que passa a ser compreendido como obediência ao Direito.
No que tange ao princípio da eficiência processual, consiste ou em norma de direito administrativo, repercutindo no Poder Judiciário enquanto entidade administrativa, ou em norma de direito processual, que recai sobre o juiz enquanto administrador de um processo. Observar a eficiência é obter o máximo de uma finalidade com um mínimo de recursos; e buscar atingir tal finalidade da melhor forma possível. A ideia é fazer com que o juiz se comporte como um bom administrador.
O princípio da eficiência servirá para a interpretação das leis processuais, que passarão a ser interpretadas para prestigiar a eficiência. Outra utilidade prática é a possibilidade de o juiz fazer adequações atípicas no processo: promover ajustes no processo sem autorização legal, como reunir processos, mesmo que não sejam conexos, se, por acaso, precisarem de uma mesma prova pericial. Enquanto eficiência diz respeito à gestão de recursos humanos e financeiro, a efetividade liga-se ao resultado final do processo.  Dessa feita, a eficiência não se basta, é preciso ser eficiente para algo. Um processo inefetivo, não pode ser considerado eficiente.
Princípio da Cooperação
Vem inserida no art. 6.º, CPC-15, tendo por objetivo transformar o processo num ambiente cooperativo. É dizer, transformar o processo numa comunidade de trabalho em que vigorem a lealdade e o equilíbrio entre os sujeitos do processo.  Fica entre dois extremos: modelo publicista (juiz como personagem central do processo) e modelo adversarial ou liberal clássico (aquele em que a proeminência é das partes).
O princípio da cooperação impõe que os sujeitos do processo dialoguem, evitando assimetria entre eles. É um corolário do princípio da boa-fé. Cooperar é agir em conformidade com os deveres da boa-fé, são quase que deveres de não atrapalhar. É a transformação do processo em um ambiente de diálogo e equilíbrio.
O princípio da cooperação gera para o juiz alguns deveres:
a. O dever de consulta;
b. O dever de prevenção: o juiz ele tem o dever de apontar as falhas do processo, e indicar de que forma esse defeito processual pode ser corrigido;
c. O dever de esclarecimento: também se manifesta quando o juiz tem o dever de pedir a parte esclarecimentos quando não entende a postulação, porque ou a postulação é incompreensível ou há um problema cognitivo do juiz;
d. O dever de auxílio: de auxiliar as partes na remoção de obstáculos processuais, formais ou de mérito, que é um dever muito consagrado no direito alemão ou austríaco.  Segundo Didier, não existe um dever geral de auxílio no Brasil.
Aliás, a colaboração das partes para um processo mais efetivo e que busque uma célere solução é tendência de diversas legislações pelo mundo. Podemos citar, como exemplo, o art. 266 do CPC Português (Decretos-Leis 329A/95 e 180/96), que reforça a necessidade da cooperação subjetiva transformando o processo numa verdadeira “comunidade de trabalho”, nas palavras de Miguel Teixeira de Souza,  professor da Faculdade de Direito de Lisboa: “O art. 266, nº I, dispõe que, na condução e intervenção no processo, os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes devem cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio. Este importante princípio da cooperação destina-se a transformar o processo civil numa ‘comunidade de trabalho’ e a responsabilizar as partes e o tribunal pelos seus resultados. Este dever de cooperação dirige-se quer às partes, quer ao tribunal”. 
O dever de cooperação se arrima na boa-fé processual (art. 266-A do CPC Português), destacando o autor supra sua especial aplicação na seara das provas e no dever de cooperação quando do processo de execução.
Por fim, o juiz deve obrar de forma eficaz e comprometida com o Estado Democrático de Direito, aproximando as partes, buscando soluções e conduzindo o feito para uma solução.
 
Fonte: Fredie Didier Jr. Curso de Direito Processual Civil, vol. 1.

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