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Aula 16.temp.doc

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CEDERJ – CENTRO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA DO
ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CURSO: Letras
DISCIPLINA: LITERATURA BRASILEIRA II
CONTEUDISTAS: Luiz Fernando Medeiros de Carvalho e Fabio Marchon Coube
Aula 16 - Resistência social e política em Armando Freitas Filho
Meta
Apresentar a dinâmica formal da poesia de Armando Freitas Filho.
Objetivos
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:
1. Identificar detalhes formais da poesia de Armando Freitas Filho;
2. Reconhecer como a poesia dialoga com o contexto social e político em épocas
determinadas;
3. Realizar uma leitura críticorreflexiva da obra do autor.
Introdução
Essa aula tem como interesse primário desenvolver algumas considerações acerca da
resistência social e política na obra do poeta carioca Armando Freitas Filho. No
entanto, faz-se necessário contextualizar o leitor em relação à vasta obra de um dos
nossos principais autores contemporâneos. Com o livro Dever, Armando completou em
2013 cinquenta anos de uma vasta atividade poética iniciada em Palavra, de 1963.
Logo, percebemos desde início um produtivo poeta que nos proporciona desde a
minuciosidade de um ÁTIMO à amplitude existente na vida humana. O leitor irá se
guiar por uma tortuosa viagem poética, desde a complexidade dos temas sociais até a
metalinguagem em nome de uma herança que vai da arte, do cinema, às mais variadas
obras literárias.
Verbete
ÁTIMO
Refere-se a uma parte pequena de algo, uma porção mínima.
Fim do verbete
1. Primeiras considerações acerca do maquinário poético de Armando Freitas Filho
Antes de começarmos o tema específico da aula, seria necessário apresentar alguns
poemas que marcam a poesia mais recente de Armando Freitas Filho. Pois a obra do
referido poeta pode ser vista também como algo contínuo, tal e qual a vida humana,
com anseios e angústias que permanecem em características de um enxerto que se
estabelece na pele de quem sente. Mas também é uma poesia que se abre para aquilo
que não conseguimos deduzir quando sentimos. 
A poesia de Freitas Filho procura aguçar os sentidos do corpo, a mobilidade, os
arrepios, o calor dos poros, como uma escrita poética produzida com lentes de aumento
em relação aos acontecimentos cotidianos.
Em seu livro Numeral, Nominal, de 2003, há um poema muito significativo, intitulado
Móvel. Vejamos o poema:
Móvel
Mesa seca, no osso, sem o viço de origem.
Com os quatro pés de esqueleto, já sem raízes
pisando na terra, prestes a se quebrarem.
A madeira é quase lenha que não lembra mais
quando ousou folha flor fruto, vergou sua copa
o tronco, com os ramos estalando sob o vento.
Quando deu sombra e intervalo ao sol.
Quando foi árvore de onde a ave deriva.
(FREITAS FILHO, A. 2003, 58)
Neste poema, muitos elementos da obra toda ressurgem e são dispostos na construção
de sua arquitetura. Como, por exemplo, a árvore, o bosque, a madeira como símbolos
da vida. É o que ocorre também em outro poema de Numeral, Nominal, intitulado 10
anos, Flor masculina do meu bosque/ seu cheiro começa a ser íngreme/ árduo – de
cabelo e músculo/ – de dias ardidos de escalada. (FREITAS FILHO, A. 2003, p. 58)
Trata-se de um poema sobre o tempo, a origem de uma árvore e o estágio atual de um
móvel derivado daquela árvore. Trata-se de uma meditação sobre o trabalho do tempo
sobre as coisas. 
O poema reproduz em sua estrutura esse aproveitamento das letras em seu interior. Por
exemplo, a aliteração existente em “folha, flor, fruto”, assim como “ave deriva”. As
letras retornam no poema e causam efeitos metamórficos, a constante transformação das
coisas em relação ao tempo. A árvore agora é móvel, e quase não lembra mais de sua
origem. É uma descrição plástica de uma natureza tornada morta.
Início do Boxe Explicativo
Para prolongar a discussão acerca do poema “Móvel”, ver: CARVALHO, L. A folha
como véu. Rio de Janeiro: Caetés, 2012.
Fim do Boxe Explicativo
Início do boxe de curiosidade
Figura 16.1: Antes de se tornar mariposa, o animal passa por um processo de metamorfose,
passando pelas fases de lagarta e crisálida.
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Metamorfose.jpg
Autor da imagem: Gilberto Santa Rosa
Metamorfose tem a ver com a transformação de uma coisa em outra, exatamente como
no caso ilustrado na imagem. Na poesia de Freitas Filho é pode-se perceber a
metamorfose como a natureza que se transforma em outra coisa, deixando de ser o que
um dia foi.
Fim do boxe de curiosidade
Assim, dividido em duas metades nítidas, o poema contrasta ostensivamente com o que
se arquiva da árvore/natureza com seu estágio atual na dimensão da cultura. Para isso, o
olhar retrocede no tempo de modo a flagrar os possíveis cenários de onde o objeto do
presente teria vindo, numa leitura exemplarmente transgressora: para fora do temático,
para fora do utensílio e para fora do humano. 
E com esse procedimento o poema apresenta aquilo que a armadura geral de todo o
livro e também seu particular ensinamento, constituído pelo registro obstinado de um
modo de olhar que instaura um outro modo de usar o objeto sobre o qual se debruça –
ambos, não por acaso, móveis.
Trata-se de um móvel, apenas. É como se o olhar testasse nas coisas o que vai percorrer
nas pessoas. Da constatação, entretanto, surge um visgo contido naquela exuberante e
antiga árvore. Esse traço de melancolia é a componente da aporia. 
A árvore é viva, lugar de vivacidade e o poema também se quer vivo, vai para o papel
não para morrer. Como suporte metonímico do poema, a mesa, entretanto, envia o aviso
de que pode se quebrar. A mesma mesa que produz a vivacidade do vivo no poema é
pensada como lugar de impasse.
O deslocamento do olhar concentra-se no humano. A corrosão no tempo, agora não mais
na perspectiva da origem, mas na perspectiva do deslocamento para o futuro. Entre a
origem e o futuro.
Além desses comentários, há que se destacar outros aspectos muito interessantes no
poema. Há uma animização da madeira, uma espécie de subjetivação. Como se a
madeira, no seu estágio atual de móvel carcomido pelo tempo, tivesse uma espécie de
Alzheimer, um esquecimento proveniente de um desligamento da origem árvore. 
Esta madeira não lembra mais quando “ousou folha flor fruto”. Tudo é muito
interessante neste verso. O verbo ousar indicando a juventude da madeira, o seu caráter
aventureiro de assumir riscos. A sequência folha flor fruto, sem vírgulas, indica um
composto da árvore, como imagem que vibra na memória. Do ponto de vista formal é
uma herança da prática modernista de abolir as vírgulas e liberar as palavras na frase. A
frase “não lembra mais” entra só uma vez no poema, e fica em elipse provocando o
leitor que precisa acioná-la por mais duas vezes enquanto lê os versos seguintes:
“Quando deu sombra e intervalo ao sol./Quando foi árvore de onde a ave deriva.”
Este último verso é interessantíssimo porque constrói uma relação formal entre árvore e
ave, uma espécie de etimologia poética, somente oferecida como dom do poema à
compreensão do leitor. A ave efetivamente deriva da árvore como lugar de espaço, como
habitat usual do pássaro e no poema como derivação da forma árvore, já que seus
fonemas já estão contidos no interior da sequência /árvore/.
Início de Boxe de Curiosidade
(NP: Profs, confesso que não consegui entender porque falamos de Francis Ponge
neste momento. Acho que é preciso explicar melhor qual a ligação deste poeta com
a poética de Armando Freitas Filho para que o estudante consiga relacioná-los.) 
(NP: Poderia esclarecer a relação entre Francis Ponge e Freitas Filho?)
Figura 16.2: Retrato de Francis Ponge.
Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Francis_Ponge#/media/File:Francis-Ponge.jpgNascido em 1899, em Montpellier, França, o poeta Francis Ponge, tem como
característica trabalhar o que é natural como parte integrante de seu ser. O mundo dos
objetos o fascina, e faz com que boa parte de sua obra seja dedicada a eles. Os objetos
emudecidos são ricos para uma poética das palavras que se destina às coisas. Assim
como há certo fascínio de Armando Freitas Filho pela mesa que segura o poema, a
caneta, a máquina de escrever, etc. A palavra por si só, é algo rude, mas é o material que
serve para transbordar o fazer poético. Vejamos como exemplo seu poema denominado
A Mesa, de 1967:
A mesa
Mesa que foi minha mesa
Lembrar-me-ei/ de ti, minha mesa, , mesa
Não importa qual, mesa qualquer que seja.
A mesa, quanto a mim, é onde me apoio para escrever, [mas]
No entanto na verdade
 Que eu me instale nela, não que eu me sente
 e mãos
com pernas e pés embaixo, braços em cima, minha escrivaninha
deitada em cima dela para o que eu inclinaria um pouco o busto e a cabeça e dirigiria
meu olhar
(PONGE, 2002, p. 177)
Fim de Boxe de Curiosidade
O poema “Móvel” resume, em parte, a obra de um poeta em vigília com aquilo que o
cerceia. Escrever poesia é como um talhar de uma madeira, causando tremor ou barulho
nas paredes de um quarto. Sentir o fremir constante de um vento brando, soar
ruidosamente as palavras diante dos acontecimentos. É perceber uma folha a cair da
árvore prestes a se tornar mesa.
Nessa perspectiva, o poeta se interessa não apenas pelo que está presentificado ou
facilmente visível. Escrever poesia é uma atividade que procura os talhos, é algo
influenciado pelo som do dedo na tecla, do barulho externo, do olho que fecha e abre,
como se tudo pudesse fazer parte de uma verdadeira engrenagem que produz poesia.
Para isso, os sentidos precisam estar aguçados. E nessa esteira, a origem da árvore do
poema anterior pode ser vista não como retorno à árvore, mas tudo aquilo que a rodeia,
sendo a folha caída também, e continua na mesa.
Início de Boxe de Curiosidade
Figura 16.3: Máquina de escrever Valentine, da marca Olivetti, de 1970.
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Olivetti-Valentine.jpg#/media/File:Olivetti-
Valentine.jpg">
Objeto de inspiração do fazer poético, a máquina de escrever é um instrumento
mecânico capaz de imprimir caracteres sobre uma folha de papel. Este objeto maquínico
é datado de 1714. Com o advento do computador, muitas máquinas de escrever se
tornaram objetos obsoletos, dada a sua limitada funcionalidade. No entanto, o contato
direto com o texto produzido, assim como a impossibilidade de “deletar” a letra, uma
vez escrita, imprime até hoje marcas nos poetas contemporâneos.
Fim de Boxe de Curiosidade
Segundo Viviane Bosi, em “Objeto Urgente”, Armando Freitas Filho vem:
Adensando ao ponto de transfiguração todos os elementos que
compõem o seu percurso, sempre numa profundidade superior, que nos
permite ver com clareza a consistência de uma poética, tanto em sua
particularidade quanto nos pontos comuns com seus contemporâneos
(BOSI, V. 2003, p. 5).
Para tanto, a autora propõe percebermos o diálogo oriundo da tensão existente à
presença do homem em relação ao seu tempo de vida. Essa complexa existência é
numerada por datas, atos nomeados que remetem às coisas. Nesse sentido, Bosi dirá que
“Há uma coragem entre a raivosa e erótica, que arremete para dentro das coisas – não
em consonância, mas em desafio” (BOSI, V. 2003, p. 5).
Para continuarmos essa discussão, vejamos o seguinte poema:
4 VII 98
A mão é que pensa, pesa e apanha 
o que a cabeça imagina. As veias
de hoje, grossas, no dorso, não dormem.
No início foram invisíveis. Depois
diante da vida, durante – firmes.
Só se desenhando nítidas no instante
Do impulso, susto, pegada. Agora
ao fim, não se apagam. Saltadas sempre
não precisam de nenhum empenho.
para surgirem, azuis, paradas no esforço
cheias de sangue, passando por dentro:
duro, batido. 
(FREITAS FILHO, A. 2003, 576)
Logo, para o poeta, traçar já é re-traçar, sem ter uma origem acessível entre as lacunas
existentes em um pensamento, como porosidades. O poeta considera a mão como
continuação do pensamento. Uma máquina de escrever é o prolongamento da mão. Mão
que faz o poema, com suas veias esguias, que pode ser vista desde a sensibilidade da
palma ao copo ao lado da mesma. Com suas marcas de tempo e de uso. E mesmo assim,
ainda produz um poema. É o que podemos ver também no numeral 19:
19
Escrever o pensamento à mão
Reescrever passando a limpo
passando o pente grosso, riscar
rabiscar na entrelinha, copiar
segurando a cabeça, pelos cabelos
batendo à máquina(...)
 (FREITAS FILHO, A. 2003, 43)
Perceba que o poema nos faz pensar no erro como objeto de construção também do
texto. É como se estivéssemos com aflição de apagar o que agora não pode mais ser
apagado. Nessa perspectiva nos resta aprender a conviver com esse maquinário errante
que é escrever a palavra, fazer poesia.
Início da atividade
Atividade 1
Atende ao objetivo 1
A partir da leitura sobre a produção poética em Armando Freitas Filho, explique como
um objeto pode servir de inspiração para o poeta.
(DIAGRAMAÇÃO: Deixar 10 linhas para resposta)
Resposta comentada:
Como você pode ver nos poemas citados até agora, em Armando Freitas Filho, escrever
poesia por si só já é algo muito relevante e inspirador. Logo, para o poeta, faz-se
necessário aguçar os sentidos das coisas que o rodeia e perceber, por exemplo, na mão
que segura a caneta, na respiração de quem escreve, no toque das teclas, na mesa que
não somente sustenta o poeta ao produzir o poema, mas também é vida, já foi árvore
que quase “não lembra mais”, teve folhas que caíam, eras o habitat de aves, é vida que o
poema quer ter para não morrer entre outros pensamentos.
Fim da atividade
2. Contexto social e político
As características sociais e políticas começam a influenciar o contexto da poesia de
Armando Freitas Filho a partir dos acontecimentos ditatoriais e, sobretudo, após o AI-5
em 1968. Palavras que remetem à violência começam a ganhar força, paulatinamente,
na configuração do poema, na perspectiva social vivenciada pela repressão, e a
legitimação da força a partir dos generais e outros líderes da ditadura brasileira.
É nesse momento que vemos temas serem inseridos, como a passagem do tempo ao
encontro da ação da força. Em Numeral/Nominal, último dos livros que integram a
alentada edição de sua poesia reunida, intitulada Máquina de Escrever (2003), o poeta
Armando Freitas Filho formula a obsessão com o tempo como força do limite - como se
o ponto extremo a que sua obra estava alcançando naquele momento ameaçasse
paralisar a mão que escreve através do exercício minucioso e exaustivo do testemunho
da passagem do tempo que impregna todas as coisas. 
Em “10 anos”, é o numeral que aparece seguido pela dedicatória ao filho Carlos. O que
é dito é ainda força de futuro, irrupção. Tudo é preparação para o aguçamento do
princípio corrosão: “Mas a infância já se feriu, inevitável/ ao entrar na casa dos dois
dígitos para sempre”. Vejamos:
(...) a pele lisa que a barba e a acne
Ainda não contrariam, o ar de entrega
Que se mantém embalsamado 
pelo sono ou por algum sonho
de maldade, com mulher de celofane,
Mas a infância já se feriu, inevitável
ao entrar na casa de dois dígitos para sempre.
A dor de alterar-se, de altear-se
Estala, e a inocência também é de sangue.
Uma e a outra se quebram e reanimam-se:
têm o mesmo comportamento,prazo
bravio e breve, das ondas do mar.
(FREITAS FILHO, A. 2003, p. 58)
Observe-se a utilização da expressão adverbial “para sempre” como acelerador do
processo TELEOLÓGICO da corrosão até chegar à palavra “prazo”: “A dor de alterar-
se, de altear-se/ estala, e a inocência também é de sangue./Uma e outra se quebram e
reanimam-se:/têm o mesmo comportamento, prazo/ bravio e breve, das ondas no mar.”
Verbete
TELEOLÓGICO
Refere-se à teleologia, estudo dos propósitos das coisas, das finalidades do universo.
Fim do verbete
As preocupações com o tempo e com o rumo dos acontecimentos do mundo aumentam
com chegada do primogênito aos 10 anos de idade. Sabendo que dessas dezenas não irá
passar. A dimensão em relação à vida e uma simples onda na arrebentação é um dos
sintomas da brevidade do tempo, e para isso, o poeta lança seu olhar, com hesitação,
configurando sua poesia aos rumos do contemporâneo. À vinda do acontecimento.
No livro Raro mar, o mar como cenário paradisíaco registra também uma natureza apta
às modificações humanas através do cimento, como as construções habitacionais que
compõem a cena e encurralam cada vez mais a margem natural da cidade. É o que
podemos ver em “Litoral”:
Cheiro de suor morto à luz latejante
Da sirena, com sonoplastia feita
De rumores, dos sustos curtos sob o cerco
Das amontoadas montanhas atormentadas
Não pelo raio, nem por nuvens pretas
Ou a chuva de pedra, trovoada, tempestade.
A natureza, num instante, sai do lugar
Da margem do risco que o mapa permite:
Nada, como um dia depois do outro, nada.
(FILHO, A. 2006)
A violência inserida no contexto social de uma grande cidade. O contraste entre o que se
vivencia entre o mar e o cimento tem em Raro mar um registro tormentoso, asfixiante,
barulhento, capaz de tornar cada instante um risco que contorna as ruas. A natureza
impetuosa e inquieta é ocultada, afunilando-se à morte implícita. O cimento avança
sobre a natureza retraída, que dá lugar cada vez mais ao solapamento do cinza das casas
e do asfalto. Paisagem rarefeita e aberta ao caos da violência urbana. Exemplifiquemos
com mais uma passagem:
Susto de montanha, detalhe de mar
Morrendo – o sol flagrante.
Vista de helicóptero, as casas se alastram
Sob o rap, o zap, o bater das hélices
Como jogos de armar que não acabam
Pois faltam peças da mesma marca
E se repuxam, nas lajes.
(FREITAS, A. 2006)
Sobre as montanhas, as casas se ramificam, mesmo sob as hélices e as armas, oriundos
de conflitos gerados pela guerra estabelecida pelo tráfico. A poesia de Armando marca
no poema “Morro” esse duplo sentido de morar e morrer, pois a vida fica em suspensão
do “peso de cada dia indeciso” (FREITAS, A. 2006). 
Início de Boxe de curiosidade
Uma influência perceptível de Armando Freitas Filho em relação à representação da
violência e da transgressão pode ser vista no poema “Riviera”. Nesse poema, há alusão
em relação ao filme Acossado, de Jean-Luc Godard. Inserido na Novelle Vague, o filme
de 1960 retrata a história de amor entre Michel, um criminoso, e Patrícia, uma jornalista
que acaba envolvida e se apaixonando pelo transgressor. Vejamos o traço apaixonado e
transgressor inseridos no poema:
RIVIERA 
Acossado, no subsolo, pelo gesto gratuito 
preso na cadeira durante duas sessões 
sob o pulso entrecortado do crime e do amor 
livre, errático, debaixo do lençol 
e da morte, disparada na rua: 
Traído! Denunciado! Entregue! 
Atingido nas costas, correndo até cair no asfalto 
de cara para o céus e para o rosto do anjo delator 
distante, indiferente, americano(...)
(FREITAS FILHO, 2009, p.81)
Fim de boxe de curiosidade
Os meios de comunicação transmitem a morte em código, através dos aparelhos
celulares. Não há mais como vislumbrar a cidade sem reparar em aspectos de violência.
É nessa perspectiva que podemos ver uma influência de elementos externos, sejam eles
sociais ou políticos, em relação à poesia de Armando Freitas Filho. É o que acontece,
por exemplo, no poema “Império”. Vejamos um trecho do poema:
Torres. Terror. Cada uma parece
Um 1. As duas juntas marcam
o dia do espetáculo e a soma
dos alvos prateados em fundo
azul matinal 1 minuto antes.
1 minuto depois o que foi 1
Número íntegro se parte em N
(FILHO, A. 2006)
Segundo Carvalho, 
O poema ‘Império’ reúne as referências sobre a data onze de
setembro e encena oantes e o depois do acontecimento. Agora
toda a concentração corrosiva funciona para pensar o
acontecimento político. Forma plástica de dizer o poema através
da experiência concretista visual, dizer com outros signospara
além do verbal. (CARVALHO, L. 2012, p. 34). 
Vejamos mais um trecho do livro para exemplificar a referida abordagem acerca do
poema:
Poema da meditação sobre o estilhaçamento da unidade. Nomeia
o número, identifica o número e trabalha a ruptura de sua unidade.
No poema “Império” concentra-se toda a poética do livro: fazer
surgir de um todo as microformas da dispersão e do corte, ao
mesmo tempo ponto máximo da encenação da corrosão e resposta
múltipla à paralisia. Ali onde existe a ponta de resistência do uno,
a divisibilidade age (CARVALHO, L. 2012, p. 34).
Dentro dessa conjuntura, podemos notar que é proporcionada no poema uma cena que
nos projeta a imaginar a dispersão da unidade, a cena em que o poema apresentado nos
leva a perceber o disfarce de uma unidade. Logo, o efeito é de provocar poeticamente o
múltiplo.
Não se trata de um poema sobre um acontecimento. O exercício é sobre a linguagem na
sua poderosa proliferação transgressiva, para fora da organização de um centramento do
olhar.
O ponto central do poema é a realização visual das duas concentrações de unidade
assinaladas pelo numeral no início e no fim do poema: “1 minuto depois o que foi 1”
realização formal da ideia de unidade, da ideia de centramento da soberania, e sua
transformação visual em N, semioticamente realizando a queda , a transição para o
nada, para o zero.
1 minuto depois o que foi 1
número íntegro se parte em N
em 1001 decimais do que era
uno de sol, vidro, aço, pedra e
esplendor no dia 10 e agora é 0.
(FREITAS FILHO, A. 2006, p.73)
E já que falamos em poema político, destaque-se o poema de cunho social que está em
seu livro Raro mar de 2006, Unready-made. Trata-se da descrição e composição no
poema de um carro-carroça-casa que vai sendo montado enquanto o poema se mostra ao
longo de seus versos, para evidenciar o processo de sobrevivência de um morador de
rua, processo que o poema tenta elaborar enquanto se mostra na invenção das palavras:
Unready-made
Mix de catre-carro-arca feito de desmanche
De madeira disparatada, céu aberto, desastre.
Motor arcaico de músculo moído, suor, berro-
/arcacatrecarro/ - empurrado pedra acima.
Ponto de partida, de chegada de récamier primitivo
Carroarcatre cheio de jornal, cacareco, catapapel
(...) e junta parcelas no chão do percurso
carrocatrearca rangendo no asfalto sobre rolimãs
movido a álcool, cola, a calão na fala estropiada.
(FREITAS FILHO, A. 2006, p.59)
O título remete à expressão “ready-made”, ou uma coisa pronta deslocada do seu uso
normal para ser instalada em outro ambiente e assim ganhar novo sentido, desenvolvida
pela primeira vez por Marcel Duchamps. No entanto, essa coisa pronta é o que resta, o
que sobra sobre o asfalto, como em um carro de mão de um catador de papel. O que está
pronto na cidade é a pobreza, o lixo lançado às margens da rua a céu aberto. O que já
está pronto não é objeto de desautomatização da arte, mas a vida lançada nas indecisas
ruas da vida cotidiana na cidade.
Início de boxe de curiosidade
Figura 16.4: Retrato doartista francês Marcel Duchamp (1887-1968).
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Marcel_Duchamp_01.jpg
Autor da imagem: George Grantham Bain Collection (Library of Congress)
O artista, escultor e pintor Marcel Duchamp nasceu na França, em 1987. É considerado
o inventor do ready made, que traria uma revolução na percepção da arte ao se projetar
para aquilo que já está pronto. A transposição da arte pelas coisas para fora do seu uso
habitual provocava o que podemos chamar de desautomatização da arte, como a obra de
grande impacto na época denominada “A fonte”. Essa obra, rejeitada como objeto
artístico em um júri dos Estados Unidos, é objeto de inspiração para discussões que vão
da arte até ao pensamento psicanalítico, devido a sua forma passível de sexualização.
Figura 16.5: A Fonte.
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Fontaine_Duchamp.jpg
Fim de boxe de curiosidade
O acréscimo do prefixo- un - designa o caráter interminável da combinatória formal do
poema entre as palavras carro, catre e arca. Destaque-se também o poema político,
inscrito no livro “longa vida”, de 1982, intitulado As paredes têm ouvidos:
As paredes têm ouvidos/ainda/ recordam e guardam/ as manchas, a
impressão/dos gritos feito grades/do sangue salpicado/das sombras/dos guardas/
ainda/não foram abertas/ as janelas/ e pelas aberturas/rasgadas/ o vento não
passa/ não sopra/ o céu não corre livre/ esvoaçante/em desfraldado azul/embora
lá fora/é bom lembrar/noventa milhões em ação/cantaram/pra frente Brasil/pra
não escutar/dos nossos corações/o susto-soluço-síncope/pois enquanto a
bola/rolava/ fora das quatro linhas/ o pau-de-arara cantava/ comia o sarrafo,
baixava a botina/e a cortina/ sobre os Arquibaldos/os Geraldinos/ e todos juntos
vamos/pra frente, pros porões/ levados pelos Macários / (...)diante das tevês/o
esquadrão de ouro da morte/toca a bola, manda bala/ é bom no samba/é
bom(principalmente)no couro/e se a Copa do Mundo/ é nossa/ para sempre/
como brasileiro/não há quem possa/se esquecer que fora do estádio/expulsa das
arquibancadas/ a torcida explodia/ e vaiava/ a dor de tantos gols contra/ em
silêncio”.
(FREITAS FILHO, A. 2003, p. 327)
Neste poema aparece o aproveitamento dos clichês, dos provérbios que são
estratificações da língua popular, aproveitamento de marchas que compuseram a
ideologia de expansão consumista e ufanista no período autoritário do regime militar
porque passou o Brasil. 
Início do boxe de curiosidade
Figura 16.5: Militares protegendo o Palácio da Guanabara, no Rio de Janeiro, durante o Golpe
de 64.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Guanabarasandbag.jpg
Autor da imagem: Arquivo Nacional
Em 31 de março de 1964, militares contrários ao governo de João Goulart
(PTB) destituíram o então presidente e assumiram o poder por meio de um golpe. O
governo comandado pelas Forças Armadas durou 21 anos e implantou um regime
ditatorial. A ditadura restringiu o direito do voto, a participação popular e reprimiu com
violência todos os movimentos de oposição. 
Fonte: http://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia-brasil/ditadura-militar-1964-1985-breve-
historia-do-regime-militar.htm
Fim do boxe de curiosidade
Tudo isto é revisto neste poema que nasce desses interstícios e mostra uma outra face, o
poema que nasce desse jogo com as palavras. O poema convoca e mostra outros
sentidos ocultos pela superfície ideológica do sistema vigente: “(...) E salve a seleção” é
trecho de marcha triunfalista da campanha de 70 da seleção brasileira de futebol,
seguido pela enunciação do sujeito lírico “ salve-se quem puder”. 
Desse confronto vai nascendo o poema como atrito e mostrador dos conflitos. O poema
recua em slogans de campanhas futebolísticas anteriores a 70, mergulha no inconsciente
da língua das marchinhas populares para produzir um novo fraseamento: “‘e se a Copa
do Mundo/ é nossa/ para sempre/ como brasileiro/ não há quem possa’... E então chega
ao poema o novo fraseamento, este do poema que nasce para meditar no cristalizado
pela operação ideológica”. (FREITAS FILHO, A. 2003, p. 327)
Após essa passagem, a inserção do futebol como escape dos problemas políticos
inerentes à ditadura militar, uma vez que, dentro do estádio, o brasileiro passava a ser
torcedor, com direito a voz que não poderia ter enquanto manifestante ou oposição
naquela conjuntura “(...) como brasileiro/ não há quem possa/ se esquecer/ que fora do
estádio/expulsa das arquibancadas/ a torcida explodia/ e vaiava/a dor de tantos gols
contra/ em silêncio”. (FREITAS FILHO, A. 2003, p. 327)
A poesia de Armando Freitas Filho é mais que uma voz, é vibração e sopro, fôlego
captado e inserido no poema. Do cimento que encurrala o mar à torcida incandescente
louca por um grito de liberdade, o poeta se faz vivo em traços e retraços do tecer a vida
com a morte. Pois é entre essa linha tênue que encontramos seu poema.
Início da atividade
Atividade 2
Atende ao Objetivo 2
Com base na leitura da aula, como você entende a situação política brasileira através do
poema “As paredes têm ouvidos”?
(DIAGRAMAÇÃO: Deixar 10 linhas para resposta.)
Resposta comentada:
Para entendermos o poema, faz-se necessário compreender o contexto social e político
vivenciado pelos brasileiros na época. O livro Longa Vida, datado de 1982, ano que
precedeu as primeiras manifestações em torno das eleições diretas para Presidência da
República no Brasil, ressoa vários aspectos que contemplam a necessidade de
representação através do grito da torcida, do desejo de reivindicação e questionamento
através do futebol, instante singular de clamor público, uma vez que era também ano de
Copa do Mundo. No momento em que se encontra dentro da torcida, há a voz popular,
silenciada pela repreensão da ditadura militar fora dos estádios. E, voltando ao poema, a
maneira de silenciar a população, segundo o poeta, era como um verdadeiro gol contra.
Fim da atividade
Início da atividade
Atividade Final
Atende ao Objetivo 3:
Em “À flor da pelo, no livro “À mão livre”, de 1979, Armando Freitas Filho constrói
um poema derivado de um verbete do Aurélio, intitulado “pele”. Vejamos dois trechos:
 
I. Pele áspera, por doença ou carência, por doença ou carência. 2. Pele
arrepiada pelo medo, pelo desejo, pelo choque elétrico, pelo frio cimento de
um animal muito magro. Cair na pele de. Cair na pele de, com cassetete
em punho. Bras. Pop. Zombar ou escarnecer de você algemado; gozar!
Cortar a pele de. Fazer mal (a alguém); torturar; tosar a pele de. Estar na
pele de, e enfiar agulhas sob as unhas. Estar na posição, situação, etc.,
ocupada por (alguém), e então avaliar todo esse sofrimento; estar; estar no
lugar de. Salvar, de qualquer maneira, a pele. Bras. Esquivar-se da
responsabilidade em mau ato porque o Brasil é grande; livrar-se de castigo
ou reprimenda. Sentir a pele do torturado. Ressentir-se profundamente de
(alguma coisa) que, agora, só e cicatriz, lembrança envergonhada, nem isso
talvez; sofrer na própria carne sua invasão blindada. (...) 
II. Sentir a pele do torturado, do empalado. Ressentir-se profundamente de
(alguma coisa) que, agora, com a possível mudança da história e do regime
de encolha, só é cicatriz, lembrança envergonhada, nem isso talvez; sofrer na
própria carne sua invasão blindada, marcial. Tirar a pele (ah!). Explorar,
defraudar, violar, matar (alguém) sem nenhum remorso, pois o país não tem
memória nacional; tirar a pele de, até o osso, e xingar. Tirar sua pele de
você, sua identidade. Gozar na pele de, impunimente, com a polícia a seu
favor, para sempre. Cortar a pele de, e esquecerde tudo isso bem depressa,
pois agora a história é outra, as águas passadas não movem o moinho, e o
Brasil é feito por nós? (FREITAS FILHO, 2003, p. 291-293).
A partir da leitura dos dois trechos, leia o verbete “pele” no dicionário. Em seguida,
acompanhe horizontalmente o verbete e destaque as possíveis alterações. Compare as
transformações das outras frases do verbete “pele” com as demais transformações
existentes no poema e responda quais são as principais diferenças através das palavras
escritas para além do seu sentido literal.
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Resposta comentada:
Para entendermos o poema em prosa “Á flor da pele”, faz-se importante notar que o
significado literal, ou seja, aquele inserido em um dicionário, nem sempre reproduz tudo
o que pode ser registrado dentro de um contexto. Logo, o poeta desenvolve a ideia da
tortura e da perseguição “à flor da pele”, algo que fica marcado no corpo e incapaz de
ser deletado. Esse poema faz alusão ao sofrimento de muitas vítimas existentes no
período da ditadura militar no Brasil. O poeta nos atenta também para o apagamento da
memória desse período, uma vez que o rumo do país é trilhado sem resolver problemas
inerentes ao passado.
Fim da atividade
CONCLUSÃO
Ao longo de mais de cinqüenta anos de produção poética, Armando Freitas filho nos
convida a contextualizar a poesia com os aspectos sociais e políticos brasileiros. Com
um olhar clínico em torno dos acontecimentos sociais, em sua obra, encontram-se
representadas as mazelas da pobreza a do descaso político em relação às habitações
periféricas, às camadas hierarquicamente rebaixadas ou deixadas de lado dentro da
cidade. O contexto político também é retratado através da repreensão da ditadura militar
que desemboca no poema de maneira criativa a representada coletiva através do clamor
popular pelos rumos da política brasileira. Trata-se de um autor que trabalha de maneira
peculiar a complexidade da existência humana tecendo a vida sobre a morte, elucidada
pela periculosidade de viver dentro das grandes cidades brasileira. Freitas Filho nos
convida e nos desperta para pensar a alteridade inerente a toda e qualquer relação com o
outro.
RESUMO
(NP: Profs, precisamos elaborar um resumo da aula. Fiz uma proposta para suas
apreciações e análises. Percebam que fiz uso de trechos de sua aula e os articulei de
modo que o estudante consiga retomar os principais conceitos abordados.)
O objetivo dessa aula foi desenvolver algumas considerações acerca da resistência
social e política na obra do poeta carioca Armando Freitas Filho. 
A poesia de Freitas Filho procura aguçar os sentidos do corpo, a mobilidade, os
arrepios, o calor dos poros, como uma escrita poética produzida com lentes de aumento
em relação aos acontecimentos cotidianos.
O poema “Móvel” resume, em parte, a obra de um poeta em vigília com aquilo que o
cerceia. Trata-se de um poeta que se interessa não apenas pelo que está presentificado
ou facilmente visível. 
Em sua obra é possível notar que traçar é re-traçar, sem ter uma origem acessível entre
as lacunas existentes em um pensamento, como porosidades. O poeta considera a mão
como continuação do pensamento. 
Características sociais e políticas começaram a influenciar o contexto da poesia de
Armando Freitas Filho a partir dos acontecimentos ditatoriais, sobretudo, após o AI-5
em 1968. É nesse momento que vemos temas serem inseridos, como a passagem do
tempo ao encontro da ação da força. 
No livro Raro mar, o mar como cenário paradisíaco registra também uma natureza apta
às modificações humanas através do cimento, como as construções habitacionais que
compõem a cena e encurralam cada vez mais a margem natural da cidade. 
Os meios de comunicação transmitem a morte em código, através dos aparelhos
celulares. Não há mais como vislumbrar a cidade sem reparar em aspectos de violência.
É nessa perspectiva que podemos ver uma influência de elementos externos, sejam eles
sociais ou políticos, em relação à poesia de Armando Freitas Filho. Será possível notar a
inserção do futebol como escape dos problemas políticos inerentes à ditadura militar,
uma vez que, dentro do estádio, o brasileiro passava a ser torcedor, com direito a voz
que não poderia ter enquanto manifestante ou oposição naquela conjuntura “(...) como
brasileiro/ não há quem possa/ se esquecer/ que fora do estádio/expulsa das
arquibancadas/ a torcida explodia/ e vaiava/a dor de tantos gols contra/ em silêncio”.
(FREITAS FILHO, A. 2003, p. 327)
A poesia de Armando Freitas Filho é mais que uma voz, é vibração e sopro, fôlego
captado e inserido no poema. Do cimento que encurrala o mar à torcida incandescente
louca por um grito de liberdade, o poeta se faz vivo em traços e retraços do tecer a vida
com a morte. Pois é entre essa linha tênue que encontramos seu poema.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOSI, Viviane. “Objeto urgente”. IN: Máquina de escrever. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2003.
CARVALHO, Luiz Fernando Medeiros de. A folha como véu. Rio de Janeiro: Editora
Caetés, 2012.
FREITAS FILHO, Armando. Lar,. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
_______________________.Máquina de escrever. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
2003.
_______________________. Raro mar. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
PONGE, F. A mesa. São Paulo: Iluminuras, 2002.
	Assim, dividido em duas metades nítidas, o poema contrasta ostensivamente com o que se arquiva da árvore/natureza com seu estágio atual na dimensão da cultura. Para isso, o olhar retrocede no tempo de modo a flagrar os possíveis cenários de onde o objeto do presente teria vindo, numa leitura exemplarmente transgressora: para fora do temático, para fora do utensílio e para fora do humano.
	E com esse procedimento o poema apresenta aquilo que a armadura geral de todo o livro e também seu particular ensinamento, constituído pelo registro obstinado de um modo de olhar que instaura um outro modo de usar o objeto sobre o qual se debruça – ambos, não por acaso, móveis.
	O deslocamento do olhar concentra-se no humano. A corrosão no tempo, agora não mais na perspectiva da origem, mas na perspectiva do deslocamento para o futuro. Entre a origem e o futuro.
	Além desses comentários, há que se destacar outros aspectos muito interessantes no poema. Há uma animização da madeira, uma espécie de subjetivação. Como se a madeira, no seu estágio atual de móvel carcomido pelo tempo, tivesse uma espécie de Alzheimer, um esquecimento proveniente de um desligamento da origem árvore.
	Esta madeira não lembra mais quando “ousou folha flor fruto”. Tudo é muito interessante neste verso. O verbo ousar indicando a juventude da madeira, o seu caráter aventureiro de assumir riscos. A sequência folha flor fruto, sem vírgulas, indica um composto da árvore, como imagem que vibra na memória. Do ponto de vista formal é uma herança da prática modernista de abolir as vírgulas e liberar as palavras na frase. A frase “não lembra mais” entra só uma vez no poema, e fica em elipse provocando o leitor que precisa acioná-la por mais duas vezes enquantolê os versos seguintes: “Quando deu sombra e intervalo ao sol./Quando foi árvore de onde a ave deriva.”
	Este último verso é interessantíssimo porque constrói uma relação formal entre árvore e ave, uma espécie de etimologia poética, somente oferecida como dom do poema à compreensão do leitor. A ave efetivamente deriva da árvore como lugar de espaço, como habitat usual do pássaro e no poema como derivação da forma árvore, já que seus fonemas já estão contidos no interior da sequência /árvore/.
	Em “10 anos”, é o numeral que aparece seguido pela dedicatória ao filho Carlos. O que é dito é ainda força de futuro, irrupção. Tudo é preparação para o aguçamento do princípio corrosão: “Mas a infância já se feriu, inevitável/ ao entrar na casa dos dois dígitos para sempre”. Vejamos:
	(...) a pele lisa que a barba e a acne
	Ainda não contrariam, o ar de entrega
	Que se mantém embalsamado
	pelo sono ou por algum sonho
	de maldade, com mulher de celofane,
	Mas a infância já se feriu, inevitável
	ao entrar na casa de dois dígitos para sempre.
	A dor de alterar-se, de altear-se
	Estala, e a inocência também é de sangue.
	Uma e a outra se quebram e reanimam-se:
	têm o mesmo comportamento, prazo
	bravio e breve, das ondas do mar.
	(FREITAS FILHO, A. 2003, p. 58)
	Observe-se a utilização da expressão adverbial “para sempre” como acelerador do processo TELEOLÓGICO da corrosão até chegar à palavra “prazo”: “A dor de alterar-se, de altear-se/ estala, e a inocência também é de sangue./Uma e outra se quebram e reanimam-se:/têm o mesmo comportamento, prazo/ bravio e breve, das ondas no mar.”
	Verbete
	TELEOLÓGICO
	Refere-se à teleologia, estudo dos propósitos das coisas, das finalidades do universo.
	Fim do verbete
	As preocupações com o tempo e com o rumo dos acontecimentos do mundo aumentam com chegada do primogênito aos 10 anos de idade. Sabendo que dessas dezenas não irá passar. A dimensão em relação à vida e uma simples onda na arrebentação é um dos sintomas da brevidade do tempo, e para isso, o poeta lança seu olhar, com hesitação, configurando sua poesia aos rumos do contemporâneo. À vinda do acontecimento.
	No livro Raro mar, o mar como cenário paradisíaco registra também uma natureza apta às modificações humanas através do cimento, como as construções habitacionais que compõem a cena e encurralam cada vez mais a margem natural da cidade. É o que podemos ver em “Litoral”:
	A violência inserida no contexto social de uma grande cidade. O contraste entre o que se vivencia entre o mar e o cimento tem em Raro mar um registro tormentoso, asfixiante, barulhento, capaz de tornar cada instante um risco que contorna as ruas. A natureza impetuosa e inquieta é ocultada, afunilando-se à morte implícita. O cimento avança sobre a natureza retraída, que dá lugar cada vez mais ao solapamento do cinza das casas e do asfalto. Paisagem rarefeita e aberta ao caos da violência urbana. Exemplifiquemos com mais uma passagem:
	É nessa perspectiva que podemos ver uma influência de elementos externos, sejam eles sociais ou políticos, em relação à poesia de Armando Freitas Filho. É o que acontece, por exemplo, no poema “Império”. Vejamos um trecho do poema:
	Segundo Carvalho,
	O poema ‘Império’ reúne as referências sobre a data onze de setembro e encena oantes e o depois do acontecimento. Agora toda a concentração corrosiva funciona para pensar o acontecimento político. Forma plástica de dizer o poema através da experiência concretista visual, dizer com outros signospara além do verbal. (CARVALHO, L. 2012, p. 34).
	Vejamos mais um trecho do livro para exemplificar a referida abordagem acerca do poema:
	No livro Raro mar, o mar como cenário paradisíaco registra também uma natureza apta às modificações humanas através do cimento, como as construções habitacionais que compõem a cena e encurralam cada vez mais a margem natural da cidade.
	É nessa perspectiva que podemos ver uma influência de elementos externos, sejam eles sociais ou políticos, em relação à poesia de Armando Freitas Filho. Será possível notar a inserção do futebol como escape dos problemas políticos inerentes à ditadura militar, uma vez que, dentro do estádio, o brasileiro passava a ser torcedor, com direito a voz que não poderia ter enquanto manifestante ou oposição naquela conjuntura “(...) como brasileiro/ não há quem possa/ se esquecer/ que fora do estádio/expulsa das arquibancadas/ a torcida explodia/ e vaiava/a dor de tantos gols contra/ em silêncio”. (FREITAS FILHO, A. 2003, p. 327)

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