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ensaio
7 4 • C i ê n C i a H o j e • v o l . 4 4 • n º 2 6 1
en
sa
io HISTÓRIA DA CIÊNCIA Autoria da teoria da evolução deve ser dividida entre Darwin e Wallace
Um nome fundamental
Cleber Macedo Polegatto, 
Eurípedes Garcia Silveira-Jr.
e Pamela de Souza Joaquim
Centro Universitário Claretiano (Batatais, São Paulo)
A lfred Wallace é o nome de um naturalista ainda pouco co­
nhecido, ao menos no Brasil, mes­
mo entre pesquisadores e estudan­
tes de biologia. Muitos cientistas, 
em todas as áreas, são praticamen­
te desconhecidos porque seu lugar 
na história foi ocupado por outros 
que, pela real importância de seu 
papel na ciência ou por diversos 
outros motivos, ganharam fama e 
garantiram o título de ‘gênio’. Es­
tes têm lugar de destaque na his­
tória da ciência e em nossa memó­
ria. É o caso, por exemplo, do au­
tor da primeira classificação ra­
cional de animais e plantas, o sue­
co Carl von Linné (1707­1778), 
mais conhecido como Carl Lineu; 
do alemão Albert Einstein (1879­
1955), cujas teorias lançaram as 
bases da física moderna; do inglês 
Charles Darwin (1809­1882), cria­
dor da teoria da evolução dos se­
res vivos, e de mais alguns.
Esses cientistas, no entanto, 
não desenvolveram suas ideias iso­
ladamente. Outros pensadores, 
antes deles ou na mesma época, 
deram contribuições valiosas pa ­
ra suas realizações ou já trabalha­
vam com as mesmas teorias. É 
cu rioso que, nos meios acadêmi­
cos e na educação pré­universitá­
ria, muitos desses outros cientis­
tas, embora fundamentais para a 
formulação das teorias a que estão 
vinculados, tenham seus nomes 
e suas obras ou descobertas ig­
noradas.
Quem foi Wallace e qual sua 
importância na profunda modifi­
cação causada pela teoria da 
evolução no curso da ciência e da 
educação?
Nascido em 1823, o britânico 
Alfred Russel Wallace pode ser 
visto como um homem à sombra 
de Darwin, seu conterrâneo bem 
mais famoso. Vale observar que 
Darwin e Wallace lançaram prati­
camente ao mesmo tempo as bases 
da teoria da evolução, que explica 
a origem e a diferenciação de to­
dos os seres vivos. Embora tenha 
passado por grandes revisões, a 
teoria é amplamente apoidada no 
meio científico, mas sua aceitação 
depende de uma visão de mundo 
racional e científica, que não per­
mite abordagens pessoais ou 
místicas.
Wallace na Amazônia
Em 1848, junto com o entomolo­
gista Henry W. Bates (1825­1892), 
Wallace partiu da Inglaterra em 
uma viagem ao Brasil, para cole ­
tar insetos e outros animais, estu­
dar a rica fauna tropical e buscar 
explicações para a evolução dos 
organismos e sua imensa diversi­
dade. O próprio Darwin já estive­
ra no Brasil, em 1832, passando 
18 dias na Bahia e três meses na 
então província do Rio de Janei ­
ro. Os outros dois naturalistas, 
porém, estiveram na Amazônia, 
onde conheceram uma realidade 
biológica bastante diferente da 
que viam na Europa. Bates ficou 
na Amazônia por 11 anos, e tex ­
tos escritos por ele sobre os inse­
tos amazônicos, em particular as 
borboletas, deixam claro o seu 
espanto com a biodiversidade bra­
sileira. 
Wallace voltou à Inglaterra em 
1852, bem antes de Bates, mas no 
período em que esteve na Amazô­
nia estudou animais e plantas. Na 
volta para a Inglaterra, em 1852, 
perdeu a coleção que fez no Brasil 
e parte de suas anotações no in­
cêndio e naufrágio do navio em 
que viajava. Mesmo assim, pu­
blicou vários artigos e dois livros 
so bre suas experiências na flo ­
resta tropical. Um dos trabalhos 
salvos do naufrágio foi uma sé ­
rie de descrições e ilustrações de 
peixes, que permaneceu inédita 
e foi recentemente publicada no 
ensaio
j u l h o d e 2 0 0 9 • C i ê n C i a H o j e • 7 5 
Brasil, na coleção ‘Uspiana – Bra­
sil 500 Anos’. Depois, viajou para 
o arquipélago malaio, onde de 
1854 a 1862 continuou a investi­
gar a diversidade biológica. Após 
retornar à Inglaterra, publicou vá­
rios livros sobre suas pesquisas, 
entre eles um trabalho clássico, 
The geographical distribution of 
animals (A distribuição geográfica 
dos animais), lançado em 1876. 
Essa obra, que continua válida, é 
a base da área científica denomi­
nada biogeografia (a geografia dos 
seres vivos).
A importância histórica de 
Wallace – e nunca é demais falar 
nisso – está no fato de ter escrito 
em 1858 um texto intitulado On 
the tendency of varieties to depart 
indefinitely from the original type 
(Sobre a tendência das variedades 
de se afastarem indefinidamente 
do tipo original). O envio desse 
trabalho, por carta, a Charles Dar­
win, levou este último a escrever 
um esboço da teoria da evolução 
e a permitir que os dois textos fos­
sem lidos, juntos, na Sociedade 
Linneana, em Londres, em 1858. 
Darwin percebeu que Wallace ti­
vera ideias semelhantes às suas e 
que precisava tornar públicas as 
suas pesquisas, para não perder a 
prioridade sobre a teoria.
Após esse anúncio, Darwin ace­
lerou a elaboração de seu famo ­ 
so livro, A origem das espécies, 
publicado no final de 1859. O li­
vro, um marco na história da 
ciên cia, teve um grande peso nas 
diversas áreas de estudo que en­
volviam a explicação de fenôme­
nos biológicos, ao mostrar que 
toda a diversidade dos seres vi ­ 
vos e a própria posição da espécie 
hu mana na natureza deveriam 
ser vistas como resultado de cons­
tantes processos de modificação. 
Sua abordagem evolutiva substi­
tuía a ideia de um mundo fixo, 
como a maioria das pessoas acre­
ditava na época. O impacto da obra 
estende­se a áreas sociais, com ­
portamentais, culturais e políticas, 
embora tenham ocorrido, desde 
o início, grandes erros de inter­
pretação de suas ideias, não com­
preendidas por muitos devido à 
falta, em grande parte dos leitores, 
de um embasamento científico. 
Wallace só voltou à Inglaterra em 
1862, quando o livro de Darwin já 
era intensamente discutido. Nas 
décadas seguintes, publicou vá­
rios livros, alguns sobre a teoria 
da evolução, e morreu em 1913 
(ver, na internet, ‘The Alfred Rus­
sel Wallace Page’: www.wku.edu/ 
~smithch/index1.htm).
Segundo o historiador da ciên­
cia, irlandês Peter Bowler, autor 
do livro Evolution: the history of 
an idea (Evolução: a história de 
uma ideia), Darwin escreveu so­
bre a di ferença entre “indivíduos” 
na mesma população, enquanto 
Wallace tratou das “variações” ou 
“variedades” de uma espécie. Para 
Darwin, os seres mais adaptados 
a certo ambiente permaneceriam 
ali, enquanto os menos aptos de­
sapareceriam, por meio de uma 
seleção natural. A seleção natural 
é uma abstração e não um fator 
concreto; ela representa os fatores 
reais que interferem na sobrevi­
vência dos organismos. Para que 
a seleção natural aconteça, são 
necessários fatores genéticos, po­
pu lacionais, geográficos e outros. 
A seleção natural é aleatória, não 
tendo, portanto, uma finalidade 
ou um objetivo. Também não de­
vemos achar que os animais anti­
gos (dinossauros, por exemplo) se 
extinguiram porque foram inaptos 
– em suas épocas, eles foram ap­
tos, ou seja, bem adaptados.
Retornando à biogeografia, po­
demos dizer que a história da es­
pécie humana tem ligação com a 
distribuição de outros animais e de 
plantas, pois muitos alimentos, 
roupas, remédios, utensílios, ma­
teriais para ritos e diferentes as­
pectos culturais dependeram de 
fontes regionais. Alguns exemplos 
são animais e plantas relatados em 
pinturas, lendas e textos antigos, 
 
Darwin e Wallace 
lançaram praticamente 
ao mesmo tempo as bases 
da teoria da evolução, 
que explica a origem e a 
diferenciação de todos 
os seres vivos
ou ilustrados em bandeiras e bra­
sões, além dos costumes alimenta­
res de cada população do mundo.
A seleção natural
Embora o próprio Wallace tenha 
apresentado mais tarde ideias 
diferentes, inclusive envolvendomisticismo, seu grande legado foi 
ter percebido o mecanismo prin­
cipal da evolução, a seleção natu­
ral. Seria mais correto, portanto, 
se todas as referências à autoria 
da teoria da evolução usassem 
sempre os dois nomes: Darwin­
Wallace.
Uma das poucas e importantes 
referências, no Brasil, sobre a im­
portância de Wallace é o livro Ba-
tes, Dar win, Wallace e a teoria da 
evolução, do químico e his toriador 
da ciên cia Ricardo Ferreira (edito­
ra UnB, 1990). Também chama a 
atenção a matéria sobre Wallace 
publicada na edição brasileira da 
revista Scientific American-Histó-
ria, este ano (nº 7). Wallace e Ba­
tes, bem como o alemão (radicado 
no Brasil) Johann Friedrich Müller 
(1822­1887), mais conhecido como 
‘Fritz’ Müller (que desenvolveu es­
tudos sobre mimetismo e foi um 
dos primeiros cientistas a apoiar 
as teorias de Darwin) devem ter 
seus nomes colocados ao lado do 
de Darwin na história da ciên ­ 
cia, para que ganhem o reconheci­
mento que merecem e sejam mais 
bem conhecidos pelos brasilei ­ 
ros, já que realizaram estudos em 
nosso país. n

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