Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
(1) Mecânica dos Solos Volume II- Orencio Monje Vilar & Benedito de Souza Bueno- Departamento de Geotecnia- Escola de Engenharia de São Carlos 23 CAPÍTULO 13 (1) RESISTÊNCIA AO CISALHAMENTO 1. INTRODUÇÃO Vários materiais sólidos empregados em construção normalmente resistem bem a tensões de compressão, porém têm uma capacidade bastante limitada de suportar tensões de tração e de cisalhamento. Assim ocorre com o concreto e também com os solos. No caso dos solos, a menos de situações específicas, são geralmente considerados apenas os casos de solicitação por cisalhamento, pois as deformações em um maciço de terra são devidas a deslocamentos relativos entre as partículas constituintes do maciço. Dessa forma, ao nos referirmos à resistência dos solos estaremos implicitamente falando de sua resistência ao cisalhamento. A resistência do solo forma, ao lado da permeabilidade e da compressibilidade, o suporte básico para resolução dos problemas práticos da engenharia de solos. Trata-se de uma propriedade de determinação e conhecimento extremamente complexos, pois às suas próprias dificuldades devem ser somadas as dificuldades pertinentes ao conhecimento da permeabilidade e da compressibilidade, visto que estas propriedades interferem decisivamente na resistência do solo. Dentre os problemas usuais em que é necessário conhecer a resistência do solo, destacam-se a estabilidade de taludes, a capacidade de carga de fundações e os empuxos de.terra. Tais problemas são usualmente analisados empregando os conceitos do equilíbrio limite, o que implica considerar o instante de ruptura, quando as tensões atuantes igualam a resistência do solo, sem atentar para as deformações em jogo. Esse tipo de análise é próprio da "Teoria de Plasticidade”, já que os conceitos.da Teoria da Elasticidade nem sempre podem ser convenientemente utilizados na representação do comportamento real dos solos. Várias são as formas de representar a resistência de um solo. A utilização de envoltórias, como a de Mohr, é uma das mais comuns e que melhor retratam o comportamento dos solos. Pode-se representar então, por exemplo, num sistema cartesiano ortogonal, em que nas abcissas se tenham as tensões normais (σ) e nas ordenadas a tensão de cisalhamento (τ), valores obtidos experimentalmente no plano de ruptura conforme se esquematiza na Figura 13.1. A adequação de uma reta (critério de Coulomb) aos pontos situados no diagrama σ x τ , dentro de uma determinada faixa de tensões de interesse ao problema em estudo, permite obter uma envoltória que segue a expressão geral: 21 rr ⋅σ+=τ Onde: τ- resistência ao cisalhamento r 1, r2 – parâmetros de resistência σ − tensão normal Costuma-se denominar os parâmetros r1 e r2 de "coesão" e de "coeficiente de atrito", respectivamente, com a seguinte notação: cr1 = )(tgr2 φ= onde φ é o ângulo de atrito do solo. 24 Figura 13.1 - Representação da resistência dos solos através de envoltórias. Assim a equação geral de resistência do solo assume a forma: )(tgc φ⋅σ+=τ onde as tensões a considerar podem ser totais ou efetivas. Esta expressão simples mascara uma série de características do solo que interferem na resistência. Uma equação geral que representasse a resistência dos solos deveria ser do tipo: ( ),...,,,,,,,,' TSHCwef εφστ = σ’ – tensão efetiva; e – índice de vazios; w – teor de umidade; φ - ângulo de atrito; C – composição; H– histórico de tensões; S – estrutura; ε - deformação; T – temperatura. Na prática é impossível quantificar as interferências citadas, porém constata-se que a utilização da envoltória de Mohr-Coulomb é uma maneira eficiente e confiável de representação da resistência do solo, residindo justamente em sua simplicidade um grande atrativo para aplicação na prática. É necessário destacar o fato de que c e φ variam para um mesmo solo com uma série de fatores. Isto enseja o aparecimento de várias "coesões" e de vários "ângulos de atrito" dependendo da faixa de carregamento aplicada ao solo, do tipo de ensaio efetuado e do histórico de tensões experimentado pelo solo, dentre outras condições. Assim deve-se reconhecer que os parâmetros de resistência não são intrínsecos do solo, devendo-se obtê-los em cada situação atentando para as condições peculiares do problema.em estudo. Além da determinação em laborat6rio empregando amostras naturais ou compactadas, pode-se conhecer a resistência de um solo através de ensaios "in situ" como, por exemplo, o “vane test", muito utilizado para estudar a resistência de argilas moles. Os resultados de ensaios de resistência à penetração efetuados em sondagens de simples reconhecimento também fornecem indicações úteis da resistência "in situ" de um solo (Capítulo X -1o Volume). Conquanto o conceito de resistência seja algo intuitivo, definir resistência para um solo não é tão simples, devido sobretudo à dificuldade de definir ruptura. A ruptura em um solo é um conceito complexo, pois envolve ruptura propriamente dita e deformação excessiva. A Figura 13.2 ajuda a esclarecer essa dificuldade apresentando curvas características tensão-deformação em solos. 25 Figura 13.2 - Curvas tensão-deformação características em solos. A curva l caracteriza a ruptura de tipo frágil, isto é o valor de tensão atinge um máximo bem definido (Tr) normalmente para pequenas deformações. Atingindo τr , a tensão necessária para manter uma certa taxa de deformação decresce e se aproxima de zero. A curva 2 caracteriza solos que apresentam ruptura do tipo plástico ("por deformação excessiva"), isto é, a tensão é crescente até um determinado valor e a partir daí as deformações continuam a crescer, praticamente sem variação de tensões. Como não se tem um valor característico como no caso 1, costuma-se definir a "ruptura" em função das deformações que estão em jogo. Na falta de um valor específico para a situação, tem sido utilizado como valor rotineiro a tensão correspondente a uma deformação de 20%. Na situação representada pela curva 3, a tensão atinge um valor definido (τmáx 3), para em seguida decrescer e caminhar para um valor constante, denominado de resistência última ou residual. Dependendo da situação, pode-se tomar o valor da resistência máxima (τmáx 3) ou da resistência residual (τres). 2. CAUSAS FÍSICAS DA RESISTÉNCIA DOS SOLOS 2.1 - Introdução Em linhas gerais, pode-se dizer que a resistência dos solos é proporcionada por forças de atrito resultantes de enlaces moleculares nas superfícies em contato. Segundo a lei de Coulomb, a resistência por atrito é função da força normal no plano de deslizamento relativo. Costuma-se representar a resistência por atrito de duas formas, segundo se esquematiza na Figura 13.3, onde dois corpos sólidos estão em contacto. Pode-se utilizar o coeficiente de atrito, f, ou a obliqüidade máxima (αmáx = φ) que a resultante forma com a normal, valor este atingido quando a força T é capaz de dar início ao deslocamento relativo dos corpos. O ângulo de máxima obliqüidade recebe o nome de ângulo de atrito e é representado por φ. Figura 13.3 - Atrito entre Corpos Sólidos 26 2.2 - Teoria Adesiva do Atrito A lei de Coulomb resultou de observações empíricas. Terzaghi elaborou uma teoria que fornece embasamento físico para as constatações empíricas das leis de atrito. Segundo Terzaghi, em sua "Teoria Adesiva do Atrito", a superfície de contacto real entre dois corpos constitui apenas uma parcela da superfície aparente de contanto, dado que a um nível submicroscópico as superfícies dos materiais são efetivamente rugosas. O contacto se dá então apenas nas protuberâncias mais salientes, conforme se mostra na Figura13.4. Figura 13.4 - Contacto entre corpos sólidos. a) vista macroscópica; b) vista microscópica. As tensões transmitidas são significativamente altas, a ponto de provocar a plastificação do material nos pontos de contacto. Sendo Ac a área real de contacto, N a força normal atuante e σ y a tensão de fluência do material resulta: y NAc σ= A resistência do material da região plastificada é τ de forma que a máxima tensão cisalhante possível de se aplicar (T), será: AcT ⋅= τ Disso resulta que o coeficiente de atrito será: yy Ac Ac N Tf σ τ σ τ =⋅ ⋅== Das ponderações de Terzaghi pode-se concluir que a resistência por atrito efetivamente depende da força normal, pois aumentando esta, aumenta a área real de contacto e conseqüentemente a resistência. A rugosidade e a adsorção da superfície da partícula controlam as áreas de contacto; por sua vez, os contactos podem ser de natureza plástica e/ou elástica. No caso de partículas grossas a altura das protuberâncias é muito menor do que o diâmetro das partículas, de modo que cada contacto aparente engloba minúsculos contactos reais, donde se devem esperar altas tensões nesses pontos de contacto. Nas partículas finas, ainda que mais lisas, são pouco prováveis ou contactos face a face, devido às forças de superfície. Assim os contactos devem se dar, predominantemente, através das quinas das partículas, e cada contacto deve ocorrer através de uma única protuberância, resultando um esquema resistente semelhante ao que ocorre nas partículas grossas. 2.3- Esforços Normais e Resistência das Partículas de Solo As partículas minerais vêem-se envolvidas por uma película de água adsorvida, fruto de potenciais elétricos de superfície não equilibrados. As forças de superfície são maiores nas partículas finas. Estas atraem então moléculas de água e cátions, os quais por sua vez podem atrair água também. Determinados cátions, como o Na+ por exemplo, fazem com que a película de água adsorvida seja bastante espessa. 27 A água adsorvida, submetida às altíssimas tensões de adsorção que normalmente se verificam entre partículas finas, encontra-se solidificada (ou com alta viscosidade) próximo às partículas e tem grande importância na resistência que se desenvolve. A Figura 13.5 esquematiza a natureza das forças que podem se desenvolver entre duas partículas. Figura 13.5 - Forças entre Partículas. Em linhas gerais as forças normais e cisalhantes se transmitem apenas nos contactos entre minerais, contactos estes que podem ser de natureza plástica ou elástica. As outras ações, sobretudo as de atração e repulsão, têm a sua importância em determinados solos, como se mostrará adiante. A presença de água adsorvida, entretanto, sugere que possam existir situações nas quais não se desenvolvam contactos entre minerais e daí pode ocorrer que esforços normais sejam transmitidos através da película de água. Um elucidativo exemplo da transmissão de esforços através de um conjunto de partículas é fornecido por Lambe (l972) o qual se reproduz em seguida. São considerados os casos extremos de partículas lamelares colocadas face a face e de um arranjo de partículas grossas eqüidimensionais. No primeiro caso, duas placas de montmorilonita sódica úmida são solicitadas por uma força de 4,13 kgf atuante numa área de 4 cm2 (Figura 13.6). Na Figura 13.6.b aparece a relação entre a tensão normal e a separação entre as partículas, obtida experimentalmente para o material em questão. Pode-se observar que para uma tensão de 1,033 kgf/cm2 (l atm) a distância correspondente é de 115 Å, o que indica a possibilidade de transmissão de esforços sem que haja contacto direto mineral-mineral. Destaque-se ainda, que é necessário uma tensão de 5.600 kgf/cm2 para expulsar a película de água adsorvida e possibilitar o contacto direto entre as partículas para a configuração apresentada. Figura 13.6 - Transmissão de esforços entre partículas (Lambe e Whitman, 1972). 28 Na segunda situação as placas são substituídas por partículas de areia eqüidimensionais, com diâmetro aproximado de 0,06 mm, permanecendo a mesma área de contacto aparente de 4 cm2. Para essa configuração, a área real de contacto corresponde a cerca de 0,03% da área aparente de contacto. A tensão transmitida nos pontos de contacto será: 2/3440 40003,0 13,4 cmkgf x ≈=σ Essa tensão é capaz de expulsar a película de água adsorvida que envolve os grãos de areia, possibilitando contactos grão a grão. Evidentemente, tais situações constituem casos extremos. Como se sabe, os solos são uma mistura de partículas das mais variadas formas e tamanhos, o que possibilita a disposição das partículas segundo situações intermediárias entre as apresentadas. No caso das argilas, qualquer grau de floculação possibilitará contactos reais, partícula a partícula, de forma que a transmissão de esforços, de uma maneira genérica se situa intermediariamente entre os casos propostos. Há evidências de que o mecanismo de transmissão se aproxima muito mais do caso das partículas eqüidimensionais. Conforme já salientado, os contactos interpartículas dependem das protuberâncias superficiais. Mitchell postula que para um dado número de contactos por partículas, a carga em cada contacto é maior nas partículas grossas; para partículas de mesmo tamanho as cargas são menores nas partículas lamelares (mica, etc.) do que nas partículas massivas (quartzo, feldspato, etc.). Essas considerações auxiliam a entender qualitativamente as diferenças que se observam no atrito entre minerais massivos e lamelares. Consideraremos apenas o caso de um contacto interpartículas plastificado (Figura 13.7). Figura 13.7 - Contacto entre duas partículas numa massa de solo. Como as superfícies estão envolvidas pela água adsorvida, o contacto real entre partículas se dá em apenas uma parcela da área total (Ac) e a máxima tensão de cisalhamento (T) será: ( )[ ]fAcT τδδτ −+= 1 onde Tf é a resistência ao cisalhamento da película e τ a resistência da partícula mineral. No caso de um arranjo de partículas grossas, as altas tensões nos contactos implicarão um aumento das áreas reais de contacto e conseqüentemente da resistência (ângulos de atrito altos). Partículas de quartzo usualmente exibem ângulos de atrito variando entre 26o e 30o. Ressalte-se, contudo, que esta não é a única fonte de resistência num conjunto de partículas (vide item 6). Para um arranjo de partículas finas, como a carga interpartícula tende a ser. baixa, passa a ganhar relevância a película de água, adsorvida. As áreas de contacto mineral-mineral serão reduzidas ocasionando baixos ângulos de atrito,já que é razoável supor que a resistência na película de água (τf) é muito menor do que no mineral. No caso extremo de partículas colocadas face a face e na impossibilidade de um contacto direto, o cisalhamento se dará através da película adsorvida, resultando baixíssimos ângulos de atrito. Este modelo de representação não deve ser generalizado para qualquer solo de partículas finas. A constatação de ângulos de atrito relativamente altos reforça a idéia de que o mecanismo de resistência, 29 na maior parte dos solos argilosos, se aproxima muito mais do observado caracteristicamente nos solos de granulação grossa. Deve-se lembrar ainda que, no caso de partículas finas, as forças de superfície passam a desempenhar um papel importante. Assim, o arranjo de partículas finas poderá contar com uma resistência adicional gerada pelas forças de atração interpartículas, denominada de coesão. 2.4- Coesão A coesão consiste na parcela de resistência de um solo que existe independentemente de quaisquer tensões aplicadas e quese mantém, ainda que não necessariamente em longo prazo, se todas as tensões aplicadas ao solo forem removidas. Várias fontes podem originar coesão em um solo. A cimentação entre partículas proporcionada por carbonatos, sílica, óxidos de ferro, dentre outras substâncias, responde muitas vezes por altos valores de coesão. É interessante notar que os agentes cimentantes podem advir do próprio solo, após processos de intemperização. Tal ocorre, por exemplo, na silificação de arenitos, quando a sílica é dissolvida pela água percolante e depositada como cimento (Paraguassu,1972). Excetuando-se o efeito de cimentação, pode-se afirmar serem todas as outras formas de coesão o resultado de um fenômeno de atrito causado por forças normais, atuantes interpartículas. Essas tensões interpartículas, também denominadas de “internas” ou “intrínsecas”, são o resultado da ação de muitas variáveis no sistema solo-água-ar-eletrólitos, podendo-se destacar as forças de atração e.de repulsão (forças R’ e A’ Figura 13.5), originadas por fenômenos eletrostáticos e eletromagnéticos e as propriedades da água adsorvida junto às partículas. A água adsorvida contribui para transmitir e modificar as forças eletroquímicas atuantes interpartículas. As atrações de origem eletrostática decorrem da interação entre partículas de cargas opostas. Evidentemente também ocorrem forças de repulsão quando as partículas apresentam cargas de mesma natureza. As forças de atração ganham relevância quando as partículas se encontram a distâncias menores que 25 Å. Já as atrações eletromagnéticas, do tipo das forças de Van der Waals, têm chance de contribuir quando as distâncias entre as partículas são muito pequenas e quando essas partículas são menores que l µm. As formas complementares de atração interpartículas devem-se a ligações do tipo pontes de hidrogênio e de potássio. Um aspecto interessante refere-se aos tipos de ligação proporcionados pelas forças intrínsecas. Existem evidências de que além de ligações elásticas podem ocorrer funções plásticas, como no caso dos solos pré-adensados, onde se constata que a resistência é proporcional a tensão de pré- adensamento. A despeito das dificuldades de explicação física e da medida de seu valor, tem-se constatado que a coesão aumenta com: a) quantidade de argila e atividade coloidal; b) relação de pré-adensamento (overconsolidation ratio-OCR); c) diminuição da umidade. Existe um tipo de coesão, muito comum na natureza, que não tem sua origem na cimentação e nem nas forças intrínsecas de atração. Esse tipo de coesão, denominada de aparente, ocorre em solos parcialmente saturados e deve-se ao efeito de capilaridade na água intersticial. A pressão neutra negativa atrai as partículas gerando novamente um fenômeno de atrito, visto que ela origina uma tensão efetiva de igual valor. Esse tipo de coesão desaparece caso o solo seja totalmente saturado ou secado, donde o nome aparente. A sua intensidade cresce com a diminuição do tamanho das partículas. A Figura 13.8 ilustra a contribuição para a coesão das diversas fontes citadas. 30 Figura 13.8.- Contribuições dos vários mecanismos de ligação para a resistência dos solos. (Ingles, 1962 in Mitchell, 1976). 3. ESTADO PLANO DE TENSÕES. CÍRCULO DE MOHR POLO Inúmeros problemas da Mecânica dos Solos permitem soluções considerando um estado de esforços no plano. O elemento de solo da Figura 13.9 está submetido a um estado plano de tensões. Por essa razão, as tensões que têm por direção a normal ao plano considerado são nulas, isto é: 0YYZZYYXXY =σ=τ=τ=τ=τ e por razões de equilíbrio τ=τ=τ ZXXZ . Figura 13.9- Elemento de solo sujeito a um estado plano de tensões. Conhecidas as tensões atuantes nas faces do elemento é possível conhecer as tensões geradas em um plano com inclinação α em relação ao eixo x: σα e τα. Aplicando-se as equações de equilíbrio, nas direções horizontal e vertical podem-se obter as seguintes relações entre tensões: α⋅τ+ασ−σ+σ+σ=σα 2sen2cos22 xzzx ατασστα 2cos2sen2 − −= xz Elevando as duas expressões ao quadrado e somando-as obtém-se: 31 2 2 2 2 22 τσστσσσ αα + −=+ +− xzxz Esta expressão corresponde à equação de um círculo cuja representação está na Figura 13.10, conjuntamente com a convenção utilizada para designar os esforços: Note-se que o círculo tem como abscissa do centro o valor + 0; 2 zx σσ e que o raio vale 2 2 2 τσσ + −= xzR . Figura 13-10 - Círculo de Mohr. Este é o chamado círculo de Mohr de tensões, cujos pontos têm, como ordenadas, as tensões em todos os planos do solo que passam por um ponto. Um ponto notável destaca-se no círculo de Mohr: é o polo, ou origem dos planos, ponto P da Figura 13.10. Desejando conhecer as tensões num plano de inclinação conhecida, basta traçar uma paralela ao citado plano, pelo polo. A intersecção dessa paralela com o círculo fornecerá as tensões no plano, como por exemplo, o ponto M que representa as tensões num plano de inclinação α com a horizontal. Para localizar o polo P no círculo pode-se fazer a construção inversa, uma vez conhecidas as tensões num plano e a sua direção. Sejam por exemplo as tensões (σX, τ) que atuam num plano vertical: basta traçar por (σX, τ) uma vertical (paralela ao plano onde atuam as tensões) e determinar a sua intersecção com o círculo. O mesmo pode ser feito à partir de (σZ, τ), lembrando agora que estas tensões atuam num plano horizontal. Existem dois planos perpendiculares entre si, nos quais as tensões de cisalhamento são nulas. Esses planos são chamados de principais bem como as tensões normais que neles atuam: σ1 tensão principal maior e σ3 tensão principal menor. As expressões que fornecem σ1 e σ3 são: 2 2 3 1 22 τσσσσσ σ + −±+= zxzx Na Figura 13.11 tem-se representado, para o elemento de solo anexo, os planos e as tensões principais: 32 Figura 13.11 - Planos e tensões principais. 4. O CRITÉRIO DE RESISTÉNCIA DE MOHR-COULOMB A teoria de Mohr afirma que os materiais rompem quando a tensão de cisalhamento, função da tensão normal, em um determinado plano iguala ou supera a resistência ao cisalhamento do material. A equação representativa dessa teoria é da forma: ( )στ f= Ao ensaiar vários corpos de prova de um mesmo solo, sob distintas.condições de solicitação, teremos vários círculos de Mohr representativos das tensões nos corpos de prova no instante de ruptura. (Figura 13.12). Pelo menos um ponto de cada círculo representará as tensões no plano de ruptura. A curva que passa por esses pontos constituirá então o lugar geométrico dos pontos correspondentes à ruptura do solo e é denominada de envoltória de resistência dos solos. O critério de Coulomb admite que essa curva é uma reta de equação (Figura 13.12): φστ tgc ''+= σ ' τ’=s C’ φ’ Figura 13.12 - Envoltória de resistência de Mohr-Coulomb. 33 Já se alertou sobre a variação que pode ocorrer nos parâmetros de resistência para um mesmo solo. Dessa forma, torna-se a observar que os citados parâmetros não são constantes para um mesmo solo. Como características do critério de Mohr-Coulomb, deve-se ressaltar a desconsideração do efeito da tensão principal intermediária (σ2) o que faz com que a resistência dependa apenas das tensões principais maior e menor. Vale notar ainda que de acordo com a teoria de Mohr-Coulomb o ângulo entre o plano de ruptura e o plano principal maior corresponde a 2 '45 φθ +=cr , tal qual se exemplifica na Figura 13.13. As situações particulares da equação de Mohr-Coulomb c=τ e φσ=τ tg correspondemaos chamados solos puramente coesivos e solos puramente arenosos, respectivamente. Figura 13.13 - Círculos de Mohr, polos e planos de ruptura. 5. ENSAIOS PARA A DETERMINAÇÃO DA RESISTÊNCIA AO CISALHAMENTO DOS SOLOS A medida da resistência de um solo é feita em laboratório através de dois tipos principais de ensaios: o de cisalhamento direto e o de compressão triaxial. Para cada solo são ensaiados vários corpos de prova preparados sob condições idênticas. Para cada corpo de prova obtém-se uma curva tensão-deformação, a qual convenientemente interpretada- fornece tensões que permitirão,, num diagrama σ x τ , a definição da envoltória de resistência. 5.1 – Ensaio de Cisalhamento Direto A Figura 13.14 permite uma visualização geral do ensaio de cisalhamento direto. O corpo de prova é colocado num recipiente formado por dois anéis iguais e superpostos. O anel inferior é fixo na prensa e o superior é livre para mover-se e aplicar tensões cisalhantes ao solo. Transdutor de força Força cisalhante Força normalPedrasporosas Rolamentos Plano de ruptura δ δv Figura 13.14 - Ensaio de Cisalhamento Direto. 34 Sobre o corpo de prova são aplicadas tensões normais que permanecem constantes até o final do ensaio. Essas tensões variam para cada corpo de prova, com o intuito de poder definir pares de tensões diferentes. O corpo de prova pode ser rompido aplicando-se tensões controladas (medem-se as deformações provocadas) ou deformações controladas (medem-se as tensões provocadas). Três leituras são tomadas durante o ensaio:deslocamento horizontal (δ),), força cisalhante aplicada (Ft) e deformação vertical (εv) a qual fornecerá a variação de volume do corpo de prova. Os gráficos da Figura 13.15 mostram resultados típicos de ensaios de cisalhamento direto e que de uma maneira geral representam o que ocorre num solo ao ser cisalhado, independente do tipo de ensaio. Figura 13.15 - Resultados de Ensaio de Cisalhamento Direto. A curva l é característica das areias compactas: um valor bem definido da tensão cisalhante, normalmente para pequenas deformações, e um aumento de volume à medida que o solo é cisalhado. Já a curva 2 é comum das areias fofas: após atingida determinada tensão, as deformações crescem continuamente sem acréscimo de tensão. Contrário às areias compactas, ocorre agora uma redução de volume. A Figura 13.16 ajuda a explicar a origem dessas variações de volume. Figura 13.16 - Tensões Cisalhantes provocam variações de volume: a) solo compacto; b) solo fofo. No caso a, solo compacto, os grãos de solo encontram-se entrosados. Iniciadas as deformações cisalhantes os grãos deslizarão uns por sobre os outros de forma a atingir a posição 2 de menor compacidade, ocorrendo um aumento de volume. 35 Já no caso b, solo fofo, as tensões cisalhantes permitem um maior entrosamento dos grãos, com conseqüente redução de volume. Da curvas tensão-deformação dos vários corpos de prova são tomados os valores máximos das tensões tangenciais que, conjugados com as tensões normais correspondentes, permitem a definição de pontos num diagrama σ x τ (Figura 13.17). A adequação de uma reta aos pontos obtidos permite definir a envoltória de resistência do solo. Só é possível definir o círculo de Mohr no instante da ruptura, como por exemplo, o círculo que passa pelo ponto A. As tensões representadas pelas coordenadas do ponto A são as tensões que correspondem à ruptura, e como o plano de ruptura é horizontal, pode-se determinar o ponto P, que é o polo no ensaio de cisalhamento. φ s = tg σ φτ σσ1σ3ppm PPM B P σ τB B , T plano de ruptura N Figura 13.17 - Envoltória de Resistência a partir de ensaios de Cisalhamento Direto. Uma alternativa seria tomar para os solos de comportamento definidos pela curva l (Figura 13.15) o valor da tensão residual (τ res) sempre e quando as condições do problema em estudo demanda sem essa hipótese. Algumas deficiências limitam a aplicabilidade do ensaio de cisalhamento direto. A primeira delas é o fenômeno da ruptura progressiva, que se manifesta nos solos de ruptura tipo frágil (curva l - Figura 13.14). A ruptura progressiva pode ser explicada como segue, obedecendo a Figura 13.18. Figura 13.18 - Ruptura Progressiva. A deformação cisalhante ao longo da superfície de ruptura AB não é uniforme: ao iniciar o cisalhamento ocorre uma concentração de deformações próximo a A e B que tendem a decrescer em direção ao centro da amostra. Obviamente as tensões despertadas em cada local serão diferentes, de forma que quando nas regiões A e B forem atingidas a deformação e a tensão de ruptura, teremos próximo ao centro da amostra tensões inferiores à de ruptura. À medida que aumentam as deformações, a ruptura caminha em direção ao centro e uma vez que as extremidades já passaram pela ruptura, teremos agora tensões menores que a de ruptura, nessas extremidades. Dessa forma o valor de resistência que se mede no ensaio é mais conservador do que a máxima resistência que se poderia obter para o solo, porque a deformação medida durante o ensaio não consegue representar o que realmente ocorre, representando apenas uma média das deformações que se processam na superfície de ruptura. 36 Tratando-se de solos de ruptura plástica, tal não ocorre porque em todos os pontos da superfície de ruptura atuam esforços iguais, independentemente de qualquer concentração de tensões. Outro aspecto que merece ser citado refere-se ao fato de que o plano de ruptura está determinado a priori e pode não ser na realidade o mais fraco. Por sua vez os esforços que atuam em outros planos que não o de ruptura, não podem ser estimados durante a realização do ensaio senão quando no instante de ruptura. Além disso, a área do corpo de prova diminui durante o ensaio, o que não é levado em conta nos cálculos. Por último, deve-se salientar a dificuldade de controle (conhecimento) das pressões neutras antes e durante o ensaio. Embora existam pedras porosas (Figura 13.14) que permitam a dissipação de pressões neutras, não existe nenhum mecanismo que permita avaliar o desenvolvimento das pressões neutras no corpo de prova, tal qual seria possível num ensaio de compressão triaxial. O ensaio de cisalhamento direto pode em principio ser do tipo rápido, adensado-rápido e lento (ver item 5.2). 5.2 - Ensaio de Compressão Triaxial Este tipo de ensaio é o que mais opções oferecem para a determinação da resistência do solo. Basicamente ele consiste num corpo de prova cilíndrico (H=2 a 2,5 φ, sendo φ =5cm e φ =3,2cm, diâmetros usuais) envolvido por uma membrana impermeável e que é colocado dentro de uma câmara, tal qual se esquematiza na Figura 13.19. Figura 13.19 - Ensaio de Compressão Triaxial. Preenche-se a câmara com água e aplica-se uma pressão na água que atuará em todo o corpo de prova. O ensaio é realizado acrescendo a tensão vertical, o que induz tens8es de cisalhamento no solo, até que ocorra a ruptura ou deformações excessivas. Outras formas de realização dos ensaios são mostradas no item 5.4. Deve-se notar a versatilidade do ensaio. As diversas conexões da câmara com o exterior permitem medir ou dissipar pressões neutras e medir variações de volume. Existem várias maneiras de se conduzir o ensaio: - ensaio rápido ou não drenado: não se permite dissipação de pressões neutras durante a aplicação da tensão confinante (σ3) e nem durante o cisalhamento do corpo de prova; é possível medir as pressões neutras desenvolvidas. Símbolos Q ou Q (caso se determinem as pressões neutras); - ensaio adensado-rápido: permite-se a dissipação das pressões neutras originadas pelo confinamento do corpo de prova;dissipação de pressões neutras impedidas durante a fase de ruptura, porém essas pressões podem ser medidas agora. Símbolos: R ou R (leitura de pressões neutras); - ensaio lento ou drenado: permite-se a dissipação de pressões neutras em todas as fases de ensaio (no preparo: aplicação da pressão confinante e na ruptura). Tensões são efetivas em todas as fases. Símbolo: S. 37 As curvas tensão-deformação são traçadas em função da diferença de tensões principais ( )31 σ−σ ou da relação '3'1 σσ (Figura 13.20), dependendo da finalidade do ensaio. A diferença de tensões ( )31 σ−σ máx, analogamente ao que ocorre no ensaio de compressão simples, corresponde à resistência a compressão do corpo de prova no ensaio considerado. Figura 13.20 - Curvas tensão-deformação em ensaios triaxiais. Geralmente, costuma-se definir a envoltória em função dos ( )31 σ−σ max dos diversos corpos de prova, porem a segunda forma de representação também é utilizada, sobretudo em ensaios em que σ3 é variável (ensaios a volume constante, por exemplo). De qualquer forma convém ressaltar, que os valores de máximo não ocorrem para a mesma deformação, quando se observam as duas formas de representação. Isso introduz na envolt6ria uma diferença no ângulo de atrito resultando valores ligeiramente maiores quando se considera a relação '3 ' 1 σσ . Ensaiados vários corpos de prova com tensões de confinamento constantes, para cada corpo de prova define-se a envoltória com os círculos de Mohr obtidos, conforme se exemplifica na Figura 13.21. Figura 13.21 – Envoltórias obtidas a partir de ensaios triaxiais. Evidentemente, dependendo do ensaio podem-se traçar os círculos de Mohr em termos de tensões totais ou efetivas, podendo-se obter assim uma envoltória referida a tensões totais (c, φ) e outra referida a tensões efetivas (c’, φ'). Observar que o polo no ensaio de compressão triaxial coincide com o ponto representativo da tensão principal menor σ3. O aspecto que os corpos de prova mostram ao final do ensaio é bastante característico. Os solos que apresentam ruptura do tipo frágil mostram uma superfície de ruptura bem definida, podendo- se inclusive determinar a direção do plano de ruptura θcr; já os solos de comportamento plástico mostram um embarrigamento do corpo de prova sem a possibilidade de distinção dos planos de ruptura (Figura 13.22). 38 Figura 13.22- Formas características de ruptura dos corpos de prova no ensaio de compressão triaxial. 5.3 - Ensaio de Compressão Simples Este ensaio pode ser entendido como um caso especial do ensaio de compressão triaxial. A tensão confinante é a pressão atmosférica, donde σ3 = 0. O valor da tensão principal na ruptura, σ1, recebe o nome de resistência à compressão simples, Rc. 5.4 - Outros Tipos de Ensaios Em várias situações especiais conduzem-se ensaios que procurem reproduzir com mais fidelidade as condições de solicitação impostas ao solo, ou ainda ensaios que permitam medir um aspecto definido, como no caso do ensaio de cisalhamento em anel (ring-shear). Neste ensaio, empregado para medir a resistência residual ou última do solo (ver item 7.7) é possível submeter o corpo de prova a deslocamentos grandes de uma forma contínua. A Figura 13.23 ilustra referido ensaio. Figura 13.23 – Esquema do ensaio de cisalhamento em anel (ring shear) O ensaio de deformação plana tenta reproduzir situações nas quais uma das direções encontra- se confinada, sem possibilidade de deformação, como ocorre, por exemplo, na ruptura de um talude extenso ou numa sapata corrida. A Figura 13.24 esquematiza o corpo de prova de um ensaio de deformação plana. Trata-se de um ensaio empregado quase que exclusivamente em pesquisa acadêmica, não fazendo parte do elenco de ensaios tradicionais dos laboratórios de Mecânica dos Solos. Figura 13.24 – Esquema do ensaio de deformação plana. Os ensaios de compressão triaxial geralmente são adensados em condições hidrostáticas ou isotrópicas, isto é, a tensão confinante é aplicada na água da câmara e atua com igual intensidade em todas as direções. O cisalhamento é obtido por um acréscimo de tensão vertical. Existem diversas outras formas de conduzir um ensaio triaxial, das quais citaremos algumas a seguir. 39 Para retratar com mais fidelidade o processo de deposição e consolidação de um solo no campo pode-se executar um ensaio no qual o adensamento do corpo de prova se processe anisotropicamente, isto é, obedecendo a uma relação 1/ 13 ≠σσ . Um tipo especial de ensaio de compressão triaxial empregado para obter o coeficiente de empuxo em repouso (K0). Procura-se impedir qualquer deformação lateral do corpo de prova, ajustando a tensão confinante (σ3): havendo tendência a expansão da amostra, aumenta-se a pressão na câmara; caso contrário, alivia-se a pressão. A relação de tensões efetivas obtida fornece o coeficiente procurado: '1 ' 30 /K σσ= . Ao invés de cisalhar o corpo de prova por um aumento da tensão vertical, pode-se manter a tensão vertical constante e diminuir a tensão lateral (confinante). São os chamados ensaios de extensão lateral e seus resultados poderiam ser aplicados, por exemplo, a taludes de corte onde o desconfinamento do solo conduz a uma expansão do talude. Em alguns casos faz-se necessário saturar corpos de prova de baixa permeabilidade, como para estudar a resistência do maciço de uma barragem que poderá saturar-se com o tempo. A simples percolação de água não produz os efeitos desejados. Costuma-se nesses casos empregar à saturação por contra pressão. Aplica-se na água do sistema de medida de pressões neutras uma pressão que tenderá a aumentar a pressão neutra do corpo de prova. A progressiva dissolução do ar presente, bem como a entrada de água conduz à saturação do corpo de prova o que pode ser constatado aplicando-se um incremento de tensão confinante e verificando se houve um igual acréscimo de pressão neutra. Evidentemente a cada acréscimo de contra-pressão deverá ser aplicado um igual acréscimo de tensão confinante, para que permaneça inalterada a tensão efetiva no corpo de prova. Maiores detalhes sobre as várias técnicas de realização de ensaios triaxiais podem ser obtidas em Bishop e Henkel (l957). No estudo da resistência a tração dos solos, o ensaio mais realizado é o de compressão diametral ou ensaio brasileiro. A Figura 13.25 esquematiza a realização do ensaio. A resistência a tração σt é fornecida pela resistência dos materiais. Outras formas de realização de ensaios de tração podem ser vistas em Gaioto (l972). Figura 13.25 Esquema do ensaio de compressão diametral. 6- RESISTÊNCIA DAS AREIAS Nos solos de granulação grossa, dada a forma mais ou menos regular das partículas, reduzem- se os pontos de contacto dentro da massa do solo. As tensões transmitidas nesses pontos são altas fazendo com que os contactos sejam diretos, partícula a partícula. A ação da película adsorvida é desprezível e a resistência das areias resulta exclusivamente do atrito entre partículas. As condições de permeabilidade dos solos grossos fazem com que a situação drenada melhor represente a resistência das areias. A equação representativa da resistência desses solos é, por analogia com o atrito entre corpos sólidos, da forma: φστ tg'= 40 A rigor a resistência das areias é atribuída a duas fontes. Uma delas deve-se ao atrito propriamente dito que por sua vez se compõe de duas parcelas: a primeira, devida ao deslizamento e a outra a devida ao rolamento das partículas, umas por sobre as outras. A segunda fonte de contribuição refere-se a uma parcela de resistência estrutural representada pelo arranjo das partículas. A Figura l3.26esquematiza a contribuição das diversas fontes para a resistência de areias quartzosas. Figura 13.26 – Parcelas de contribuição das diversas fontes de resistência das areias em função da porosidade. Pode-se notar que para altas porosidades ocorrem rearranjos das partículas uma vez que é necessário que elas deslizem segundo planos de variadas inclinações. Já para arranjos compactos, a ruptura requer variações volumétricas que se contraponham às tensões confinantes, gerando a grande parcela de contribuição devida a dilatância. Neste caso ainda, ocorre que a resistência de pico se dá para baixos valores de deformação,, impedindo que a contribuição devida do rearranjo das partículas seja grande. O ângulo de atrito para areias ensaiadas numa mesma compacidade e com mesma orientação das partículas é tomado como constante, ainda que se reconheça a influência de tensões altas (provocam esmagamento de partículas e encurvamento da envoltória), e da tensão principal intermediária, σ2. Terzaghi (l967) assinala que tensões da ordem de 50 kgf/cm2 provocam uma redução de cerca de 10° no ângulo de atrito quando comparado a ângulos determinados com tensões de até 5 kgf/cm2. As principais características que interferem na resistência das areias são a compacidade, o tamanho, a forma e a rugosidade dos grãos e a granulometria. A influência da compacidade pode ser bem esclarecida quando se observa a Figura 13.26: areias mais compactas apresentam maior resistência que as areias fofas. Quanto ao tamanho das partículas, tem-se observado que as areias grossas apresentam maiores ângulos de atrito do que as areias finas. Nota-se também que areias compostas de grãos angulares evidenciam maiores ângulos de atrito do que areias de grãos mais regulares; partículas mais rugosas mostram também maiores ângulos de atrito do que partículas mais lisas. A seleção das partículas interfere, grosso modo, da mesma forma que a compacidade. Compreende-se que um solo bem graduado oferece melhores oportunidades de entrosamento, podendo propiciar um solo mais compacto e por extensão mais resistente que um solo mal graduado. A Tabela 13.1 a seguir mostra valores característicos do ângulo de atrito em solos granulares, podendo-se notar ainda a interferência de alguns dos fatores citados. 41 Tabela 13.1 – Ângulos de atrito característicos de solos granulares (composta à partir de Terzaghi (1967) e Leonards (1962)). Solo Compacidade Grãos Arredondados Graduação Uniforme Grãos Angulares Bem Graduado Areia média muito fofa méd. compacta muito compacta 28-30 32-34 35-38 32-34 36-40 44-46 Pedregulhos arenosos G (56%) S(35%) G (80%) S(20%) fofo med-compacta fofo compacto --- 37 34 --- 39 41 --- 45 Fragmentos de rocha 44-55 Areia siltosa * fofa compacta 27-33 30-34 Silte inorgânico * fofo compacto 27-30 30-35 * para tensões efetivas inferiores a 5 kgf/cm2 Um fator que pouco influi na resistência da areia é a água: de uma maneira geral o ângulo de atrito das areias úmidas é igual ao das areias secas, a menos de l° ou 2°, o que permite conhecer o ângulo de atrito utilizando tanto amostras secas como saturadas, estas em condições drenadas obviamente. Contrário ao que intuitivamente poderia parecer, a água não exerce efeito lubrificante, de forma que o ângulo de atrito permanece praticamente inalterado. Isso enseja a oportunidade de que diversas propriedades que dependem do atrito, como por exemplo a relação de tensões principais na ruptura ou o coeficiente de empuxo em repouso, permaneçam inalterados caso o solo esteja submerso ou seco. 6.1 - Índices de Vazios Críticos Uma situação particular de carregamento pode ocorrer com areias saturadas em condições não drenadas, sobretudo com as areias finas fofas. Frente a solicitações extremamente rápidas e na impossibilidade das pressões neutras serem dissipadas pode ocorrer a liquefação do solo. Um fenômeno desse tipo foi um das causas da espetacular ruptura da barragem de Fort Peck (EUA), construída em aterro hidráulico. Tal fenômeno pode ser explicado pelas variações de volume a que estão, sujeitos os solos. No caso das areias fofas, de permeabilidade relativamente baixa, o cisalhamento provoca redução de volume do solo (Figura 13.15). Estando o solo saturado, essa redução virá acompanhada de um aumento das pressões na água intersticial, que se não forem dissipadas a tempo, poderão reduzir a tensão efetiva a zero e conseqüentemente provocar a liquefação do solo. Em se tratando das areias compactas, ocorre o processo inverso, ou seja, aumento de volume do solo. As pressões neutras despertadas agora serão negativas o que faz aumentar as tensões efetivas a afastar a possibilidade de liquefação. A redução de volume por um lado e o aumento por outro, conduzem à idéia de um estado de compacidade intermediário, no qual não ocorressem variações de volume (Figura 13.27). Esse estado de compacidade é, definido em termos de um índice de vazios, denominado de índice de vazios crítico, que parece depender fundamentalmente das condições de solicitação. Compreende-se que uma vez conhecido o índice de vazios critico teríamos um valor de referência, quanto a compacidade, que serviria para separar a possibilidade ou não de liquefação do maciço. Conforme referido, o índice de vazios crítico depende das condições de confinamento, quanto maiores. as tensões de confinamento, menores os índices de vazios críticos (Figura 13.2 6). 42 Quanto a técnica de obtenção do 'índice de vazios crítico, vários são os processos em função das definições criadas por diversos autores. Segundo Casagrande, o ecrit. corresponde ao estado inicial de compacidade de um corpo de prova o qual, submetido a um ensaio triaxial com tensão confinante constante, não viesse a apresentar variação de volume entre o início do carregamento de cisalhamento e o instante de ruptura. (Figura 13.28). Figura 13.27 – Índice de vazios crítico. Figura 13.28 – Determinação do índice de vazios críticos empregando ensaios triaxiais com tensões confinantes ( )3σ constantes. Outra especificação, devida a Taylor, prefere determina o ecrit a partir de ensaios triaxiais a volume constante. O ecrit seria representativo do estado inicial de compacidade do corpo de prova, quando se verificasse serem iguais as tensões de confinamento tanto no início do cisalhamento como no instante da ruptura. 6.2 - Coesão nas Areias Areias úmidas usualmente exibem uma parcela de resistência independente da tensão normal. Tal resistência deve-se à capilaridade que como se sabe origina pressões neutras negativas. Ora, como a resistência das areias é função da tensão efetiva, o fato desta aumentar origina a parcela de resistência citada, conhecida como coesão aparente. A coesão é circunstancial e desaparece quando o solo é totalmente saturado, visto que isso elimina os meniscos. Os principais fatores que interferem nessa atração interpartículas são o grau de saturação e o tamanho das partículas. Existem ainda outras areias que apresentam em seus pontos de contacto algum cimentante como os óxidos de ferro ou cimentos calcários, por exemplo, o que também enseja o aparecimento da coesão em areias. Neste caso, desde que o agente cimentante não seja passível de desaparecer, a areia apresenta uma coesão verdadeira. 43 6.3 - Ângulo de Atrito em Repouso Quando se despeja uma areia sobre uma superfície horizontal, a inclinação natural que o talude toma é denominado de ângulo de repouso. Com certa freqüência costuma-se assumir que o ângulo em repouso 'e igual ao ângulo de atrito da areia. Na realidade o ângulo em repousocorresponde ao atrito que se desenvolve numa camada superficial inclinada de areia tal qual se observa quando um corpo sólido desliza ao longo de um plano inclinado, e não engloba em si as características de compacidade da massa de areia. Como já se falou, a resistência das areias é composta de uma parcela devida ao atrito por desligamento, outra devida ao atrito por rolamento e uma terceira parcela proporcionado pelo arranjo estrutural das partículas. A simples observação da Tabela 13.l, permite constatar as diferenças que a compacidade introduz no ângulo de atrito das areias: passa-se de um ângulo da ordem de 30° em uma areia muito fofa para um ângulo de 38° em uma areia muito fofa e para 38o em uma areia muito compacta de grãos arredondados e graduação uniforme. 7- RESISTÊNCIA DAS ARGILAS 7.1- Introdução Muitos fatores fazem com que o estudo da resistência dos solos argilosos seja mais complexo que o dos solos arenosos. Inicialmente, deve-se enfatizar que o fator determinante da resistência nos solos é a tensão efetiva. Qualquer ganho de resistência só pode ser justificado em função de um acréscimo de tensão efetiva, já que a água não resiste a tensões de cisalhamento. O histórico de tensões experimentado pelo solo desempenha um papel fundamental. O pré- adensamento conduz o solo a um estado mais denso do que o mesmo solo normalmente adensado. Alguns contactos entre partículas podem resultar plastificados e permanecem mesmo após o descarregamento do solo, o que gera uma parcela de resistência adicional nos solos pré-adensados. As baixas permeabilidades dos solos argilosos respondem por uma dissipação lenta das pressões neutras despertadas por um acréscimo de cargas. Torna-se necessário representar essas condições de dissipação de pressões neutras em cada caso para conhecer com mais realidade o comportamento dos solos. Para retratar esses comportamentos existem três formas clássicas de conduzir os ensaios de resistência: ensaios não drenados (rápidos); adensados rápidos e drenados (lentos). Deve-se lembrar também que o mesmo comportamento que caracteriza as areias no tocante as curvas tensão-deformação também ocorre em argilas. Uma argila pré-adensada experimenta expansões volumétricas quando cisalhadas e o seu comportamento tensão-deformação é muito semelhante ao das areias compacta drenadas. As argilas normalmente ou levemente pré-adensadas (OCR<4) assemelham-se às areias fofas e experimentam, portanto, reduções de volume quando cisalhadas. A figura 13.29 ilustra essas afirmações. A relação de pré-adensamento (overconsolidation ratio-OCR) fornece uma idéia das condições de adensamento do solo e é definida como: ' ' σ σ adOCR = Onde: 'adσ - tensão de pré-adensamento 'σ - tensão aplicada 44 Figura 13.29 - Relações tensão – deformação em argilas pré-adensadas e normalmente adensadas. Cabe destacar ainda as interferências do fator estrutura. O amolgamento das amostras, quer provocado pela amostragem quer pelo cisalhamento, interfere decisivamente nas resistências medidas, chegando a extremos como no caso das argilas extra sensíveis. Como as resistências são definidas a partir dos ensaios específicos, apresentam-se a seguir os comportamentos normalmente verificados nos diversos ensaios. 7.2- Ensaios Drenados ou Lentos Uma amostra de argila saturada submetida a um ensaio no qual tanto as pressões neutras geradas pelo confinamento do corpo de prova, como as pressões geradas pelo cisalhamento, são dissipadas, tal qual ocorre num ensaio drenado, apresenta resistências crescentes com as tensões normais aplicadas. A definição da envoltória é possível a partir do ensaio de vários corpos de prova submetidos a diferentes condições de confinamento. Uma vez determinada as curvas tensão-deformação, toma-se a resistência à compressão ( )MÁX'3'1 σ−σ , e como já se conhece '3σ é possível locar num diagrama σxτ os círculos de Mohr correspondentes, conforme se mostra na Figura 13.30. Figura 13.30 – Definição da envoltória de um solo saturado, normalmente adensado. A adequação de uma reta envolvente, dentro da faixa de tensões de interesse, fornece a envoltória de resistência do solo. O prolongamento dessa reta passa pela origem do sistema coordenado, ou intercepta o eixo τ num valor muito próximo de zero, de forma que 0c ' ≈ , o que em termos práticos permite definir a envoltória para um solo saturado normalmente adensado, em termos de tensões efetivas, como tendo uma equação característica do tipo: 45 ' dtg' φ⋅σ=τ onde 'σ é tensão normal efetiva e 'dφ é o ângulo de atrito em termos de tensões efetivas, do ensaio drenado. Já se o mesmo solo estiver pré-adensado, modificam-se as características de resistência . Seja a curva de compressão de um solo deixado consolidar desde o instante de sua deposição como representado na Figura 13.31. A amostra principia a consolidar a partir do ponto O. Uma vez atingido o ponto A, mede-se a sua resistência. O mesmo com referência ao ponto B. As resistências medidas são representadas por A’ e B’ e note que estas resistências correspondem ao intervalo normalmente adensado do solo, definindo uma envoltória cujo prolongamento passa pela origem. Figura 13.31 – Curvas de compressão (a), envoltórias de resistência (b) e variação de resistência com o índice de vazios. Atingido o ponto 1, a amostra é descarregada até 2. Posteriormente o recarregamento se inicia, e atingidos os pontos Ce D, mede-se novamente a resistência do solo. As resistências são representadas por C’e D’e agora se observa que estas amostras ensaiadas no intervalo pré- adensado do solo mostram uma resistência maior que as amostras normalmente adensadas. Este acréscimo de resistência é responsável pela introdução do parâmetro de coesão na envoltória de resistência do solo, de forma que para solos pré-adensados em condições drenadas a envoltória característica é do tipo: dd tgc ''' φστ ⋅+= Ao prosseguir o recarregamento, uma vez ultrapassando a tensão correspondente ao ponto 1 (no caso a tensão de pré-adensamento- máxima tensão que o solo já suportou...), se medirmos a resistência no ponto E, teremos um valor E’, situado sobre o prolongamento da envoltória normalmente adensada, pois que estamos novamente na curva de compressão virgem da amostra. O acréscimo de resistência pode ser explicado pela constatação experimental de que existe uma relação entre o decréscimo do índice de vazios e o aumento de resistência (Figura 13.31). Note que para a mesma tensão, a amostra pré-adensada apresenta um índice de vazios menor do que a 46 normalmente adensada, donde o ganho de resistência mostrado. Uma explicação física para tal fato já foi mostrada quando se discutiu as causas físicas da resistência dos solos. Por causa do pré- adensamento resultaram contactos plastificados que permaneceram com a retirada das cargas, gerando a parcela adicional de resistência. Por fim, destaca-se que o ensaio lento é de realização pouco freqüente na prática, devido a dificuldades tais como tempo de ensaio, vedação da câmara e permeabilidade da membrana. A envoltória em termos de tensões efetivas é mais comumente obtida em ensaios adensado rápidos com leituras de pressões neutras, conforme se descreve a seguir. 7.3- Ensaios Adensado - Rápidos Nestes ensaios a primeira etapa é realizada com total dissipação das pressões neutras geradas pela tensão confinante. Durante a fase de cisalhamento da amostra, as pressões neutras desenvolvidas são impedidas de se dissipar, ou seja, não ocorrem variações volumétricas por adensamento. A Figura 13.32 apresenta o andamento esquemático do ensaio de compressão triaxial adensado –rápido.Figura 13.32 – Etapas do ensaio adensado – rápido. Durante a realização dos ensaios são conhecidas, de imediato, as tensões totais atuantes. É possível também efetuar leituras de pressão neutra e conhecer as tensões efetivas em cada fase do ensaio. Nota-se, como no caso drenado, que as resistências são crescentes com as tensões normais aplicadas. Os círculos de Mohr em termos de tensões efetivas definem uma envoltória praticamente igual à obtida em ensaios drenados, onde é muito usual determinar a resistência drenada nos ensaios adensado-rápidos com leituras de pressões neutras )R( . A utilização das tensões totais fornece, para os solos normalmente adensados saturados, uma envoltória cujo prolongamento também intercepta a origem do diagrama τσ x , como no caso das tensões efetivas (Figura 13.33). E T ur θcr τ φ cu σ3c = σ3r σ1rσ3r' σ1r' σ, σ ' φ ' (b) Figura 13.33 – Envoltórias em termos de tensões totais e tensões efetivas para um solo saturado normalmente adensado. 47 Assim é possível obter duas envoltórias a partir dos ensaios adensado-rápidos, que para os solos saturados normalmente adensados têm as seguintes equações características: '' φστ tg⋅= (tensões efetivas) φστ tg⋅= (tensões totais) O ângulo φ é denominado de ângulo de atrito aparente, ou ângulo de atrito em termos de tensões totais. A relação entre 'φ e φ depende das pressões neutras despertadas no instante da ruptura. Encontra-se comumente na literatura que φ≅φ 2 1' , extensão dos resultados pioneiros efetuados com as argilas de Boston. Na realidade essa relação nem sempre é comprovada. Com relação à figura 13.33 é importante notar que o círculo de tensões efetivas (E) encontra- se deslocado para a esquerda do valor da pressão neutra (u), uma vez que esta é positiva nos solos normalmente adensados. Por sua vez, o raio permanece o mesmo nos dois círculos. Notar ainda que o plano de ruptura ( )CRθ é o definido a partir dos círculos e da envoltória em tensões efetivas, uma vez que se reconhece ser a tensão efetiva a determinante das características de resistência dos solos. No caso de solos pré-adensados, a tendência de variação de volume é no sentido da expansão. Isto origina um aspecto interessante, pois estando a drenagem impedida originam-se pressões neutras negativas e conseqüentemente a tensão efetiva torna-se maior que a total. Os círculos de tensões efetivas (E) situam-se agora à direita dos círculos de tensões totais (T), resultando que ,φ〉φ , como se mostra na Figura 13.34. Figura 13.34 – Envoltória no intervalo pré-adensado. Tal situação acontece em solos fortemente pré-adensados, com relações de pré-adensamento (overconsolidation ratio – OCR) da ordem de 10, o que implica a necessidade de cuidados na adoção de parâmetros para esses solos, em análises a longo prazo. As envoltórias obtidas em ensaios adensado-rápidos sobre solos saturados pré-adensados resultam: 'tg'c ' φσ+=τ (tensões efetivas) φσ+=τ tgc (tensões totais) Em termos práticos existe uma grande semelhança entre os parâmetros de resistência obtidos em termos de tensões efetivas, quer se empreguem ensaios drenados ou adensado-rápidos. Dessa forma costuma-se representar a resistência em termos de tensões efetivas como: '' φστ tg⋅= (solos normalmente adensados) 48 ''' φστ tgc ⋅+= (solos pré-adensados) Pelas razões já apontadas o ensaio mais empregado para determinação da envoltória efetiva é o adensado-rápido com leitura de pressões neutras ( )R . 7.4- Ensaios Não Drenados ou Rápidos Em todas as fases do ensaio não drenado, a pressão gerada no corpo de prova é impedida de dissipar. Em geral, conhece-se em cada instante as tensões totais aplicadas, se bem que seja possível fazer leituras de pressão neutra. Mas uma vez é fundamental conhecer o papel desempenhado pelas pressões neutras, o que será descrito a seguir, considerando o solo saturado. Suponhamos que a amostra estava inicialmente adensada sob uma tensão '0σ . Imediatamente após a amostragem, o desconfinamento do solo tenderá a provocar um aumento de volume, quando então se contrapões uma pressão neutra negativa igual à tensão ( )000 u σ−=σ . Veja os esquemas da Figura 13.35. A aplicação da tensão confinante gerará pressão neutra no corpo de prova. Estando a drenagem impedida e como o solo se encontra saturado, toda a tensão confinante será suportada pela água intersticial (lembrar da analogia mecânica do adensamento), o que implica dizer que houve um acréscimo de pressão neutra igual à tensão confinante. Tal situação significa que não houve ganho de resistência pelo confinamento do solo já que não houve acréscimo na tensão efetiva. Figura 13.35 – Diversas fases durante os ensaios não drenados ou rápidos. Finalmente, durante a fase de cisalhamento, novas pressões neutras são geradas. Ao ensaiar vários corpos de prova, nota-se, de imediato, que todos os círculos de Mohr t6em o mesmo raio e fornecem uma envoltória horizontal como a representada na Figura 13.36. Figura 13.36 – Envoltória não drenada de solos argilosos saturados. 49 A equação de resistência característica é: uu c=τ Onde cu recebe o nome de coesão não drenada e τu é a resistência não drenada. Note que para esta situação, o ângulo de atrito em termos de tensões totais ( )uφ é igual a zero, e que, qualquer que seja o círculo considerado: ( ) 2 31 R uu c σστ −== Caso se determinem as pressões neutras, constata-se o anteriormente exposto, isto é, como as tensões efetivas na ruptura independem da tensão confinante, o círculo de tensões efetivas é único, independente de qual corpo de prova se considere (Figura 13.36). Isto impossibilita então definir a envoltória de resistência em termos de tensões efetivas em solos saturados a partir do ensaio rápido. Em algumas ocasiões, pode-se ter uma idéia de envoltória efetiva se for possível conhecer o ângulo que determina o plano de ruptura ( )CRθ nos corpos de prova e o círculo de tensões efetivas. Como teoricamente )245( 'CR φ+=θ , tem-se o ponto em que a envoltória tangencia o círculo de tensões efetivas. A figura 13.37 mostra as posições relativas das várias envoltórias sobre solos saturados, onde se pode ter uma idéia comparativa dos vários resultados. Novamente, chama-se a atenção para as particularidades decorrentes de ensaios em solos fortemente pré-adensados. Figura 13.37 – Comparação entre envoltórias. 7.5- Compressão Simples Trata-se de um dos ensaios de mais freqüente realidade dada a sua simplicidade, sendo comumente empregado para conhecer a resistência não drenada de solos argilosos. A tensão confinante é a pressão atmosférica, onde 03 =σ , e o valor da tensão que provoca a ruptura do corpo de prova é denominada de resistência a compressão simples (RC). A Figura 13.38 esquematiza as fases do ensaio: 50 Figura 13.38 – Etapas no ensaio de compressão simples. Embora a rigor ocorram diferenças entre os resultados de ensaios de compressão simples e rápidos, costuma-se admitir, em termos práticos, que os resultados são iguais. Aliás, pode-se notar dos esquemas das Figuras 13.37 e 38 a grande semelhança entre os dois tipos de ensaios. A Figura 13.39 mostra o círculo de Mohr característico do ensaio de compressão simples e círculos correspondentes a ensaios rápidos sobre amostras id6nticas do mesmo solo saturado. Figura 13.39 – Círculos de Mohr- compressão simples e ensaios rápidos, solo saturado. Da observação da Figura 13.39 a resistência não drenada resulta: ( ) 22 31 máxc uu R c σστ −=== É comum encontrar-se genericamente referências ao valor da coesão não drenada ()uc como variando entre 40 e 50% da resist6encia à compressão simples. Justifica-se essa adoção quando se sabe que os ângulos de atrito não drenados, obtidos em ensaios rápidos, são relativamente baixos (zero, para solos saturados). Um procedimento muito comum para a determinação da resistência não drenada é através do ensaio de palheta (vane test) realizado no campo. Tem-se constatado que depósitos naturais de argila normalmente adensadas mostram um acréscimo de resistência com a profundidade em que eles ocorrem. Sendo ( )uc a resistência não drenada e '0σ a tensão efetiva “in situ”, nota-se que ctec '0u =σ , o que pode ser constatado inclusive teoricamente. A Figura 13.40 mostra uma relação entre '0uc σ e o índice de plasticidade obtido, a partir de ensaios com argilas marinhas, por Skempton e Bjerrum. Notar que para IP > 30% há uma boa concordância entre valores medidos e calculados teoricamente a partir de ensaios triaxiais. 51 Figura 13.40 – Relação entre '0uc σ e IP. Muitas argilas mostram uma brusca redução de resistência quando têm as suas estruturas destruídas, mantendo-se a umidade inalterada. É o caso das “quick-clays” de ocorrência freqüente na Escandinávia. Para medir a queda de resistência observada, introduziu-se o parâmetro sensibilidade (St). 'c c t R R S = RC – amostra indeformada RC’- amostra amolgada 7.6- Resistência dos Solos Parcialmente Saturados Também no caso de solos parcialmente saturados a tensão efetiva é determinante das características de resistência. Nos solos de granulação fina, as pressões neutras negativas devidas às capilaridades podem desempenhar um papel importante no aumento das tensões efetivas e, conseqüentemente, da resistência. A determinação das pressões neutras é bastante complexa devida ao caráter bifásico da fase fluída (ar + água). Fica mais difícil empregar os conceitos do princípio das tensões efetivas e tem-se optado por estudar a resistência dos solos parcialmente saturados empregando ensaios não drenados, nos quais se tenta reproduzir com a máxima fidelidade as condições “in situ” da amostra. Descreve-se a seguir o comportamento a esperar nos diversos tipos de ensaios. Em se tratando de ensaios drenados nos quais se proporciona a drenagem do ar e da água, é de se esperar resistências semelhantes às que se observam para o solo saturado. Nos ensaios não drenados, embora não possa ocorrer dissipação das pressões intersticiais, ocorre uma redução de volume quando da aplicação da tensão confinante devido à alta compressibilidade do ar. Tem-se um ganho gradual de resistência que depene do grau de saturação inicial e que continua até que todo o ar se dissolva na água intersticial. O corpo de prova tende a se saturar por efeito das tensões confinantes crescentes. A envoltória resultante em termos de tensões totais é curva, porém na prática costuma-se aproxima-la para uma reta de equação genérica (Figura 13.41). uu tgc φστ ⋅+= (tensões totais) '' φστ tgc ⋅+= (tensões efetivas) 52 Figura 13.41 –Envoltória de resistência (Q) de solos parcialmente saturados. No caso dos ensaios adensado-rápidos pode ocorrer um comportamento semelhante ao observado nos ensaios não drenados, desde que na face de cisalhamento possam ocorrer variações volumétricas devido à compressão do ar ainda presente nos vazios do solo. 7.7- Resistência Residual Duas amostras do mesmo solo, com diferentes características iniciais, quando submetidas às mesmas solicitações atingem estados finais praticamente constantes, desde que haja prazo suficiente para que se processem as variações volumétricas geradas pelas solicitações aplicadas. No caso de uma argila saturada, a umidade final será a mesma para as duas amostras e no caso de areias, as duas amostras tenderão para us mesmo índice de vazios A resistência medida nessas condições finais, isto é, após consideráveis deformações, é conhecida por resistência residual ou última (τres ou τult). A Figura 13.42 mostra as características de resistências citadas quando se trata de uma amostra de argila pré-adensada (P.A.) e outra normalmente adensada (N.A.). τ ε máx NA máx PA σ = cte τ res τ σ, + + + + + + c’ PA NA res φ’res Figura 13.42 – Resistências máxima e residual. A envoltória obtida para as resistências residuais situa-se geralmente abaixo da envoltória normalmente adensada e é do tipo: rtg '' φστ ⋅= 53 No caso das argilas normalmente adensadas a redução de resistência verificada é atribuída a uma destruição dos vínculos adesivos e a uma reorientação das partículas; para as argilas pré- adensadas, as razões apontadas são também a quebra dos vínculos de cimentação, bem como as expansões volumétricas que a longo prazo se traduzem num decréscimo de resistência. Pelo exposto, nota-se que a resistência residual nas argilas independe das condições iniciais (histórico de tensões), havendo uma relação única entre a tensão efetiva, a umidade e a resistência residual. Tem-se constatado haver uma redução de 'Rφ com o aumento de IP e também que 'Rφ é dependente do nível de tensões aplicado. Por essa razão, quando se determina 'Rφ é necessário reproduzir as condições de solicitação reais, inclusive quanto aos deslocamentos a esperar. A semelhança de comportamento tensão-deformação entre as areias compactas e as argilas pré-adensadas e entre as areias fofas e as argilas normalmente adensadas permite estender às areias fofas as considerações da Figura 13.42. Importante notar que no caso das areias fofas não se observa a redução de resistência mostrada nas argilas normalmente adensadas, pois naquelas a resistência máxima é igual à resistência residual. As primeiras determinações de Rφ empregaram o ensaio de cisalhamento direto, fazendo várias etapas de avanço-recuo com o intuito de produzir as grandes deformações desejadas. Atualmente utiliza-se o ensaio de cisalhamento em anel, do qual é possível produzir deformações contínuas em uma direção definida (vide Figura 13.23). Um interessante exemplo de utilização da resistência residual ocorreu com o solo de fundação da ombreira direita da barragem Água Vermelha. O solo encontrava-se bastante cisalhado e optou-se por não removê-lo para a construção do maciço, efetuando-se contínuas medidas de deslocamentos para prever medidas corretivas à medida que se construía o aterro. As resistências da argila de basalto da fundação utilizadas foram: 2/22'5 mtftg °+= στ (resistência de pico) 2/10' mtftg °= στ (resistência residual) 7.8- Aplicação dos Resultados de Ensaios a Casos Práticos Frente à variedade de ensaios existentes e às diferentes resistências obtidas surge a inevitável pergunta: Qual ensaio e qual resistência utilizar num determinado problema? É óbvio que cada ensaio busca reproduzir situações correntes na prática. O engenheiro deve contemplar as diversas etapas porque passará a obra e procurar definir quais dessas etapas serão mais críticas. Por exemplo, a construção rápida de um aterro sobre um depósito de argila mole de baixa permeabilidade como se representa na Figura 13.43, induzirá pressões neutras nas argilas as quais, ao término da construção, praticamente sequer terão começado a dissipar. No presente caso, então, constata-se que seria aplicável a resistência não drenada obtida em ensaios rápidos, pois imediatamente após a construção tem-se a situação mais crítica, com todas as pressões neutras atuando. À medida que passa o tempo, gradualmente vai se processando o adensamento e o esqueleto sólido passa a suportar mais tensões efetivas com ganho de resistência. 54 Figura 13.43 – Construção de um aterro sobreum depósito de argila mole. Importante ressaltar que mesmo existindo algumas situações típicas não é possível padronizar roteiros: compete ao engenheiro detectar as situações críticas em cada problema e decidir que atitudes tomar. Apresentaremos adiante outros exemplos. Existem duas formas de abordagem dos problemas de estabilidade: a análise em termos de tensões efetivas e a análise em termos de tensões totais. Se julgarmos válido o princípio das tensões efetivas então é lícito imaginar que a “verdadeira” resistência do solo é aquela determinada em termos de tensões efetivas, donde o mais correto seria empregar análises em termos de tensões efetivas. Uma vez sendo possível o conhecimento das pressões neutras e conhecendo as tensões totais atuantes, pode- se ter a tensão efetiva e com o emprego da envoltória em termos de tensão efetiva, determinar a resistência disponível. Entretanto, persistem dificuldades de ordem prática para tal procedimento, porque é necessário conhecer as pressões neutras existentes no problema em questão, o que nem sempre é fácil ou possível. Embora existam também procedimentos teóricos para calcular pressões neutras, as análises em termos de tensões efetivas nem sempre são de emprego corrente, porém, é forçoso reconhecer que a tendência é no sentido do emprego desse tipo de análise. A análise em termos de tensões totais, ainda a de aplicação mais freqüente, consiste em empregar resultados de ensaios não drenados. Como premissa básica desse tipo de análise, supõe-se que as pressões neutras existentes no caso prático em estudo são as mesmas que se desenvolvem nos corpos de prova submetidos aos ensaios representativos do caso em estudo. Muitas vezes este tipo de análise fornece resultados conservadores, pois por mais rápida que seja a obra é preciso reconhecer que poderá haver tempo para alguma dissipação de pressão neutra. Retornando à discussão sobre a aplicação dos resultados dos diversos ensaios, temos que o ensaio rápido busca representar situações em que não há tempo para a dissipação de pressões neutras geradas pelo carregamento aplicado. Trata-se então de situações em curto prazo ou de fim de período construtivo. Outros exemplos de aplicação seriam a análise da estabilidade de barragens no fim da construção e o cálculo da capacidade de carga inicial de fundações apoiadas sobre argilas (Figura 13.44) Figura 13.44 – Exemplos de aplicação dos resultados de ensaios rápidos: a) barragem, final do período construtivo; b) sapata apoiada sobre argila. 55 Os ensaios adensado-rápidos seriam aplicáveis a situações onde o maciço estivesse em equilíbrio com as tensões aplicadas e em seguida, por qualquer razão, ocorresse uma solicitação rápida, sem possibilidade de dissipação das novas pressões neutras geradas. Exemplo clássico de aplicação é na análise de estabilidade do talude de montante de uma barragem após rebaixamento rápido (Figura 13.45). O maciço, já adensado sob seu próprio peso, fica sujeito às pressões neutras em seu interior, que antes estavam equilibradas pela água do reservatório. A baixa permeabilidade impede a imediata dissipação das pressões neutras surgindo a possibilidade de uma ruptura rápida. Figura 13.45 – Exemplo de aplicação de ensaios adensado-rápidos. Quanto ao ensaio drenado, evidentemente seus resultados se aplicam a análises de estabilidade em longo prazo, quando houver possibilidade de dissipação das pressões neutras geradas, ou quando estas forem independentes das tensões totais atuantes. Exemplos seriam a estabilidade do talude de jusante de barragens, após o fluxo de água ter se transformado em permanente e a estabilidade de cortes em maciços naturais, onde a descompressão pela retirada de solo provoca reduções de resistência ao longo prazo (Figura 13.46). Figura 13.46 – Exemplos de aplicação dos resultados de ensaios drenados: a) talude de jusante submetido à percolação; b) talude corte. Como já se frisou, não é comum a realização de ensaios lentos. A envoltória de resistência drenada é determinada usualmente a partir de ensaios adensado-rápidos com leituras de pressões neutras. A Figura 13.47 mostra uma correlação entre o ângulo de atrito drenado e o índice de plasticidade em argilas normalmente adensada. Evidentemente, tal correlação, como as demais em Mecânica dos Solos, não deve ser utilizada indiscriminadamente dada a dispersão de resultados e a comportamentos diferenciados comumente observados. A despeito dessas restrições, podem-se obter dados úteis em fases iniciais de projeto e na verificação de resultados de ensaios. 56 média desvio padrão 40 30 20 10 5 0 20 40 60 80 100 IP (%) φ ( )' Figura 13.47 – Correlação entre φ’ e IP para argilas normalmente adensadas (US Navy, 1971)- adaptado. A Tabela 13.2 que se apresenta a seguir sintetiza parâmetros de resistência utilizados em vários projetos ou obtidos em pesquisa. 56- A Solo LL (%) IP (%) γd máx (gf/cm3) w ot (%) γs (gf/cm3) c (kgf/cm2) φ (o) c´ (kgf/cm2) φ´ (o) Local/Obra/Observações 1. areia média a fina (C) 2. areia fina argilosa (C) - 23 a 33 - 8 a 14 1,70 > 1,80 8,2 11 a 14 2,70 2,70-2,78 - - - - - 0,42 34,5-36,5 30 Filtros (1) e transições (2) do ma- ciço compactado da margem direita da barragem de Ilha Solteira 3. argila silto-arenosa (solo de basalto) (I) 50 a 70 - 23 a 35 - - - - - 2,95 - 0,5 1,2 19 (Q) 19,5 (Q) 0,4 0,2 26 (R sat) 24 (S) Solo de fundação, barragem Porto Colômbia γsat=1,43 e 1,87g/cm3; σ´ad=0,55 a 5,5 kgf/cm2 4. argila silto-arenosa (C) (solo de basalto) 40 a 60 - 14 a 28 - 1,60 a 1,75 23,9 a 26,7 - - 0,25 - 17 (Rsat) - 0,9 0,2 24 ( )Q 28 (R sat) Maciço compactado, margem direita, barragem Porto Colômbia σ´ad=9kgf/cm2 5. argila pouco siltosa (solo de xisto) (C) 6. areia fina a média com pedregulhos (quartzito) 40 a 60 - - - 18 a 28 - - - 1,57 a 1,65 - - 20,5 a 23,5 - - 2,75 - 2,54 - 1,5 - - - 18 (Q) - - - 0 - 0 - 33 (R e S) - 41 - Núcleo impermeável (5) e transição (6) da barragem de enrocamento de Furnas 7. argila siltosa vermelha (basalto) (C) 51 - 23 - - 20,3 - - - 1,9 1,3 11 (Q) 18 (R) 1,9 - 12 ( )Q - Maciço compactado; barragem de Bariri 8. silte argiloso micáceo (gnaisse) (I) 30 a 45 - 10 a 25 - - - - - 2,78 - 0,5 0,6 14 (Q) < 12 (Q) > 7m prof. 7m prof. 25 a 29 (S) Solo de fundação, maciço MD; barr. – Itumbiara- γsat=1,52 a 1,93g/cm3; σ´ad= 4 a 5 kgf/cm2 9. argila arenosa (coluvionar) (I) 10. argila arenosa (coluvionar) (I) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 1,22 0,92 0,75 0,3-0,7 0-0,8 16,7 (Q) 22 (R) 10 (Rsat) 13 a 20(Q) 22 (R) - 0 - - 0,4 - 29 (S) - - 26 (S) Maciço margem direita (9) e solo superficial de fundação dos maciços de terra (10) da barragem de Água Vermelha 11. silte arenoso micáceo (C) 40 - - 8 - - 1,67 - - 20,1 - - 2,79 - - 0,6 0,4 0,5 22 (Q) 24,7 (R) 19,5 (Rsat) - - 0,11 - - 28,5 (R sat) Parâmetros de moldagem: CC=96%, w=wot Barragem de terra – Catalão - GO 12. argilas normalmente adensadas (I) 127 60 60 39 38 92 33 30 18 18 - - - - - -
Compartilhar