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Análise de representações sociais Em primeiro lugar, o conceito de representação social é solidário da ideia de que as palavras não representam essências imutáveis. Assim, o que eu quero dizer com o termo “família” não é necessariamente o mesmo que você. Em segundo lugar, o conceito de representação social também implica que as pessoas utilizam as palavras sem ter tão claramente assim uma boa ideia do que as palavras querem dizer. Uma concepção ingênua de linguagem pressupõe que cada palavra corresponde a uma coisa no mundo. Assim, o significado da palavra “cachorro” corresponde àquele animal de quatro patas que tantas pessoas levam para passear; o significado da palavra “árvore” corresponde àquilo que vemos em algumas rua de cidades e abundantemente em florestas; o significado da palavra “mulher” corresponde aos seres humanos do sexo feminino e por aí em diante. Uma concepção menos ingênua de linguagem admite que a palavras mudam de sentido conforme o lugar que ocupam em uma frase ou contexto em que é enunciada. Neste sentido, cachorro, árvore e mulher não são marcas que colamos em coisas que existem no mundo. A linguagem é uma forma de vida, é uma prática social viva e em permanente transformação. E os significados das palavras varia conforme as mais diferentes influências que atuam no campo social a cada momento. Daí que muitas vezes preferimos falar em “sentido” e não em significado. Qual o sentido disso que está sendo feito ou dito, podemos nos perguntar diante de alguma coisa, exatamente porque antes de sabe-lo será necessário entender o contexto em que essa coisa se manifesta. Assim, o que uma pessoa quer dizer com o termo “família” pode ser estudado em diversas dimensões, sem que uma possa ser considerada mais fundamental que a outra. Cada nível de análise pode ser estudado com igual legitimidade. Em um extremo, poderíamos situar, por exemplo, os arquétipos tão trabalhados pelo psicólogo suíço Carl Gustav Jung. Para ele, nosso comportamento individual é influenciado por significações universais, que encontramos nas diversas mitologias das mais diversas e antigas culturas. Para Jung existe um inconsciente coletivo e existem significações que sempre, em todo mundo, influenciam as pessoas. No outro extremo, não há porque recusarmos o fato de que pessoas, apesar de seres humanos, nascidos em uma mesma época e em um mesmo lugar e em uma mesma família, como acontece com irmãos, nem por isso são iguais no modo como veem o mundo. Então podemos considerar os diferentes planos em que se desdobram as forças que constituem as significações para cada pessoa e para cada grupo. Há o nível singular, social, cultural, universal. Não penso que deva ser interditada a análise em qualquer desses planos. No que diz respeito às representações sociais, conforme a própria expressão indica, interessa o plano de análise não é o individual, nem o universal. Trata- se então de investigar o que parece estar sendo representado quando determinada população fala em “família”, “mulher”, “menor”, etc. Um tal estudo traz possibilidades muito interessantes. Por exemplo, retomando o primeiro parágrafo desta seção quando disse que as pessoas não sabem bem o que estão dizendo ao utilizarem as palavras, o que quero destacar é que as pessoas muitas vezes naturalizam e reificam significações. O que isso quer dizer? Naturalizar significa neste sentido supor que o que se diz corresponde a alguma coisa que existe na natureza. Reificar, de modo semelhante, significa “transformar em coisa”, “coisificar”. Então, digo que “lugar de mulher é na cozinha” e suponho que estou descrevendo um estado de coisas natural, algo que não pode ser de outra maneira já que não é alguma coisa que está apenas na minha cabeça, mas sim que existe de modo independente de mim, no mundo. Então posso “saber” exatamente o que os termos negro, pobre, perdedor, judeu, mulher, bicha, menor e outros querem dizer, pois afinal de contas correspondem a coisas no mundo e não há discussão sobre isso a não ser para os ignorantes. Quando se investiga termos como esses descobre-se que palavras são como valises e escondem uma multidão de significações e, principalmente, uma história. Na próxima aula estaremos penetrando mais profundamente no tópico da análise de representações sociais, importante para análise de dados qualitativos em ciências sociais. Veremos também o uso das ferramentas apresentadas nesta aula em associação a metodologias importantes para as ciências sócias como: pesquisa ação e participante, método biográfico e estudo de caso.
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