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Fisiopatologia da hipertensao arterial

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CAPÍTULO 10: FISIOPATOLOGIA DA HIPERTENSÃO ARTERIAL
Joel Cláudio Heimann, José Eduardo Krieger e Roberto Zatz
I. INTRODUÇÃO:
A função do sistema cardiovascular pode ser quantificada por meio de grandezas físicas. Uma destas é a pressão que o sangue exerce sobre a parede das grandes artérias, denominada pressão arterial. Alguns indivíduos desenvolvem, a partir de um determinado momento da vida, uma pressão arterial acima de certos valores aceitos como normais. A fisiopatologia desta elevação crônica da pressão arterial é uma temática muito complexa, até mesmo por não haver, ainda hoje, uma definição precisa de hipertensão arterial. Neste capítulo será discutida uma parte do que é conhecido a respeito dos principais mecanismos responsáveis pela geração e manutenção da hipertensão arterial.
II. CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS E EPIDEMIOLÓGICAS DA HIPERTENSÃO ARTERIAL:
	A pressão arterial é uma variável cuja distribuição na população é gaussiana: os valores de pressão arterial distribuem-se de modo contínuo e simétrico entre um valor mínimo e um valor máximo (Fig. 10-1), o que torna difícil estabelecer um ponto de corte acima do qual o indivíduo passa a ser considerado hipertenso. Na verdade, a definição de hipertensão arterial tem de certo modo uma natureza estatística: trata-se de um desvio da normalidade, no qual os níveis pressóricos dos indivíduos acometidos situam-se cronicamente acima de um determinado limite, estabelecido por convenção. O limite atualmente adotado é o de 135 mmHg para a pressão sistólica e de 85 mmHg para a pressão diastólica. É comum o uso exclusivo do nível de pressão diastólica como critério diagnóstico, embora o efeito deletério da hipertensão sistólica esteja bem estabelecido.
A dificuldade em se diagnosticar a hipertensão arterial é ainda agravada pela variabilidade da pressão arterial em cada indivíduo. A pressão arterial varia de acordo com a hora do dia, com o grau de atividade física e com o estado emocional, podendo ser influenciada até mesmo pela presença do médico (“hipertensão do jaleco branco”).. Essas características tornam imperativa a adoção de procedimentos padronizados para a medida da pressão arterial e para o diagnóstico da hipertensão arterial. Por exemplo, a determinação da pressão arterial deve sempre ser feita por pessoal devidamente treinado, com o paciente na mesma posição (deitado ou sentado), em ambiente tranqüilo e sempre no mesmo horário, devendo-se medir a pressão arterial mais de uma vez em uma mesma consulta. Para se estabelecer o diagnóstico de hipertensão arterial é ainda necessário que a pressão arterial esteja alta em três consultas sucessivas, para evitar que uma elevação acidental e temporária seja erroneamente interpretada (e tratada) como se fosse uma condição permanenete.
Uma vez cumpridos adequadamente esses procedimentos diagnósticos, é possível observar que a hipertensão arterial é um distúrbio extremamente freqüente. Se por exemplo estabelecermos como ponto de corte uma pressão diastólica de 85 mmHg, a prevalência da hipertensão (ou seja, a porcentagem de hipertensos em um determinado momento), chega a superar os 25% da população geral. Se considerarmos a subpopulação de adultos do sexo masculino com idade superior a 40 anos, essa prevalência pode ultrapassar 50%. Fica fácil assim entender o impacto social da hipertensão arterial, já que a agressão mecânica imposta ao sistema cardiovascular e renal por um aumento crônico da pressão arterial reflete-se no alto risco que apresentam os pacientes hipertensos de desenvolver vasculopatias graves. Dentre estas, as mais conhecidas pela população, por seu caráter dramático e por sua enorme divulgação pelos meios de comunicação, são as coronariopatias e os acidentes vasculares cerebrais. Mais insidiosa, mas igualmente deletéria, é a hipertrofia cardíaca, conseqüência da maior quantidade de trabalho mecânico realizado pelo coração quando a pressão arterial (pós-carga) está elevada. Essa hipertrofia acaba comprometendo a oxigenação do miocárdio e o próprio desempenho cardíaco, levando à insuficiência cardíaca. Outra complicação silenciosa mas potencialmente letal da hipertensão é a insuficiência renal crônica . Através de mecanismos ainda não totalmente esclarecidos, a exposição do tecido renal durante muitos anos a altas pressões de perfusão leva uma parte dos pacientes a desenvolver uma fibrose crônica do parênquima renal, que termina causando a perda irreversível da função desse órgão. Finalmente, uma pequena parcela dos hipertensos desenvolve hipertensão maligna, na qual a pressão arterial eleva-se muito rapidamente, levando à progressão acelerada de todas as complicações descritas acima.
Apesar de sua alta prevalência, da gravidade de suas complicações e do fato de ser conhecida há mais de 1 século, a hipertensão ainda representa em grande parte um enigma quando se consideram suas causas. Na verdade, apenas em cerca de 10% dos pacientes hipertensos é possível identificar uma causa definida para a elevação da pressão arterial, como por exemplo uma produção anômala de aldosterona (hiperaldosteronismo primário) ou um estreitamento arterial renal (hipertensão renovascular). Nesses casos, a hipertensão é conhecida como hipertensão secundária, em contraposição ao conceito de hipertensão primária, ou hipertensão essencial. Nesta, que representa cerca de 90 % de todas as hipertensões, não se consegue encontrar uma causa definida para o distúrbio. Isso não significa que a hipertensão arterial seja uma condição incompreensível para a Medicina. Na verdade, um número crescente de evidências clínicas e experimentais indica com clareza cada vez maior que a hipertensão não pode ser considerada como o resultado de um único agente ou fator etiológico. De acordo com os conceitos mais modernos, a hipertensão primária resulta da interação entre fatores genéticos (ou seja a disfunção de um ou mais genes) e fatores ambientais (consumo excessivo de sal, obesidade, fumo, entre outros).
	Embora nosso conhecimento sobre a etiologia da hipertensão arterial seja ainda fragmentário, sabemos muito hoje em dia sobre os mecanismos fisiopatológicos envolvidos nesse processo. O conhecimento desses mecanismos é essencial para se compreender não apenas o funcionamento do sistema cardiovascular sob pressão arterial elevada, como também os princípios básicos da terapêutica da hipertensão arterial.. Nas seções seguintes, esses mecanismos serão considerados em detalhe, a começar pela hemodinâmicas normal do sistema circulatório.
III. DETERMINANTES HEMODINÂMICOS DA PRESSÃO ARTERIAL:
Estudando sistemas hidráulicos, Poiseuille estabeleceu a seguinte relação:
F=(Pi-Pf)/R,
onde F é o fluxo de fluido em uma tubulação rígida, Pi e Pf são, respectivamente, as pressões no início e no fim da tubulação e R é a resistência oferecida ao fluxo. Esta relação entre F, Pi, Pf e R, conhecida como equação de Pouiseille, pode ser transposta, com pequenas modificações, ao sistema circulatório. Desta forma, teremos
DC=(PA-PV)/R
onde DC representa o débito cardíaco (portanto o fluxo hidraúlico), PA a pressão arterial média, PV a pressão venosa e R a resistência hidráulica do sistema, que no sistema cisculatório é denominada resistência periférica. Comparada à PA, a PV tem uma magnitude muito pequena, sendo possível retirá-la da fórmula sem incorrer em um erro muito grande. Fica-se então com
DC= PA/R 	(1), 
Essa equação é mais freqüentemente expressa como 
			PA = DCR (2)
O conceito contido na equação 2 pode ser melhor visualizado com o auxílio da Figura 10-2, que mostra um esquema simplificado da circulação.
Pode-se demonstrar que a resistência periférica total é inversamente proporcional à quarta potência do raio da tubulação:
R= k/r4 	 (3)
Substituindo-se o valor de R na equação (1) pela equação (3) tem-se:
DC=kPA/r4 (4)
A pressão arterial é, portanto, diretamente proporcional ao débito cardíaco e inversamente proporcional à quarta potência do raio dos condutos que formamo sistema circulatório, ou seja, os vasos sangüíneos. A maior parte desse efeito é representada pelas arteríolas, que constituem a porção do sistema circulatório que mais influi na resistência periférica. É principalmente nas arteríolas que agem os compostos vasoativos que ajudam a regular momento a momento a pressão arterial. É também principalmente através das arteríolas que os tecidos regulam o fluxo sangüíneo que os perfunde, num processo conhecido como autorregulação e que tem grando importância na gênese da hipertensão, como veremos adiante.
	Apesar da simplicidade da equação 2, são extremamente complexos os mecanismos que regulam a pressão arterial e que deixam de funcionar adequadamente no indivíduo hipertenso. Sejam quais forem esses mecanismos, no entanto, seus efeitos sobre a pressão arterial envolvem necessariamente uma alteração do débito cardíaco, da resistência periférica, ou de ambos.
IV. MECANISMOS DE REGULAÇÃO DA PRESSÃO ARTERIAL
A pressão arterial é regulada por um sistema de controle de natureza extremamente complexa. De modo geral, um sistema regulador consiste em um dispositivo cibernético constituído de um sensor, de um sistema de transmissão, de um centro de integração, onde o sinal captado é processado e comparado a alguma referência interna e de um efetor, capaz de influir sobre a variável regulada de modo a mantê-la próxima a um valor previamente ajustado. É assim que funciona, por exemplo um termostato de refrigerador ou de aquecedor. É assim que funciona também o nosso termostato interno: sensores cutâneos e centrais levam a um centro integrador hipotalâmico as informações sobre as respectivas variações de temperatura, gerando respostas efetoras tais como a vasodilatação ou vasoconstrição cutâneas, sudorese e tremores musculares, corrigindo, através desse sistema de realimentação negativa, quaisquer desvios da temperatura corpórea de seu ponto de ajuste. Sistemas semelhantes atuam na regulação do nível sérico de cálcio (ver Capítulo 13) e da pressão osmótica do organismo (ver Capítulo 11).. Já a regulação da pressão arterial é um processo bem mais complexo. Temos aqui a interação de vários mecanismos atuando em paralelo, cada um com sua própria dinâmica e com seus próprios efetores. Há mecanismos de ação rápida, como os baroreceptores, os quimioceptores arteriais e a resposta isquêmica do sistema nervoso central, capazes de responder em questão de segundos a variações bruscas da hemodinâmica circulatória, como a mudança da posição supina (horizontal) para a ereta. Esses sistemas são também muito úteis em situações de emergência, como em uma hemorragia, por exemplo. A médio prazo (horas ou dias), adquire maior destaque a ação das propriedades mecânicas das paredes vasculares, capazes de acomodar seu diâmetro a situações de estiramento prolongado, e a reabsorção de fluido do interstício para o interior dos capilares, em situações de hipotensão prolongada.
A longo prazo, isto é, após um intervalo de alguns dias, entra em ação a capacidade dos rins de controlar a excreção de sal e água. Essa capacidade baseia-se no fato de que a pressão de perfusão renal exerce uma profunda influência sobre a excreção de sódio e água. Esse fenômeno, denominado natriurese pressórica, transforma o rim num poderoso agente efetor na regulação da pressão arterial. Quando a pressão arterial se eleva, a excreção renal de água e sódio aumenta, reduzindo o volume sangüíneo. Com isso, cai o débito cardíaco, baixando a pressão arterial (Equação 2 e Fig. 10-2) e trazendo de volta ao nível anterior a taxa de excreção renal de sódio (ver adiante).
Adquirem aqui especial importância os hormônios e autacóides vasoativos e/ou aqueles que influenciam a excreção renal de sódio, tais como a angiotensina II, a vasopressina e as catecolaminas (vasoconstritores) e a insulina, a prostaciclina, a bradicinina, o fator natriurético atrial e o óxido nítrico (vasodilatadores), além da aldosterona, um retentor de sódio por excelência (ver Capítulo 2). É fácil perceber, tendo em vista o esquema mostrado na Fig. 10-2, que esses compostos podem alterar a pressão arterial influenciando a resistência periférica (vasodilatadores e vasoconstritores) ou o débito cardíaco, regulando a excreção renal de sódio (natriuréticos e antinatriuréticos). De modo geral, os vasoconstritores, como as catecolaminas e a angiotensina II, funcionam também como retentores de sódio (antinatriuréticos), enquanto os vasodilatadores, como o fator natriurético atrial e o óxido nítrico, atuam como espoliadores de sódio (natriuréticos). Por essa razão, é praticamente impossível obter um efeito puramente antinatriurético ou vasoconstritor mediante a administração exógena de compostos vasoativos ou da estimulação de sistemas que liberam esses compostos, como o sistema nervoso simpático e o sistema renina-angiotensina-aldosterona.
V. FISIOPATOLOGIA DA HIPERTENSÃO ARTERIAL: AS DUAS PRINCIPAIS TEORIAS
Sendo assim complexo o sistema de regulação da pressão arterial, e não havendo consenso quanto à importância relativa de cada um, não chega a surpreender que também quanto aos mecanismos que levam à hipertensão essencial haja uma grande dose de controvérsia. Basicamente, a polêmica opõe duas grandes correntes: de um lado, os que propõem a existência, em hipertensos essenciais, de uma alteração do sistema nervoso central, de modo a que o ponto de ajuste da pressão arterial, presumivelmente determinado pelo próprio SNC, está elevado em relação ao normal. De outro lado, temos os que defendem um papel preponderante, na gênese da hipertensão, de uma retenção de sal e água pelos rins. Vamos analisar separadamente cada uma dessas duas grandes hipóteses.
1) Teoria neurogênica:
	Os proponentes da hipótese de que a hipertensão essencial é uma doença do sistema nervoso central invocam série de evidências em apoio a sua tese. Salientam a importância do achado de que, em pacientes jovens com hipertensão limítrofe, a anomalia hemodinâmica encontrada é basicamente uma elevação do débito cardíaco e não, de início, um aumento da resistência periférica. Mais do que isso, apresentam evidências de que esse estado de hipercinese circulatória é decorrência de uma atividade do sistema nervoso autônomo, já que a administração de um beta-bloqueador e de um parassimpatolítico abolem a anomalia. Aliás, a administração de beta-bloqueadores é um dos procedimentos mais comuns no tratamento da hipertensão essencial, em consistência com essa hipótese. Na mesma linha, o grupo de Allyn Mark demonstrou que, em indivíduos com hipertensão limítrofe, o influxo simpático à circulação periférica, estimado através do registro direto da atividade nervosa, está aumentado. Além disso, a atividade parassimpática está reduzida nesses pacientes.. Os indivíduos com hipertensão limítrofe são ainda, de acordo com algumas evidências, exageradamente responsivos ao estresse, desenvolvendo uma atividade simpática excessiva e hipertensão. Stevo Julius, um dos mais destacados defensores da hipótese da origem nervosa da hipertensão, argumenta em favor desse ponto de vista que as manobras que elevam a pressão arterial o fazem mesmo em face de profundas modificações hemodinâmicas induzidas farmacologicamente. Quando por exemplo se produz hipertensão por compressão do quarto traseiro de cães anestesiados, a base hemodinâmica da hipertensão é um aumento da resistência periférica. Quando este é prevenido pela administração de um alfa-bloqueador, a pressão arterial continua a se elevar, agora à custa de um aumento no débito cardíaco. Baseado nesse tipo de evidência, Stevo Julius propõe que o sistema nervoso central seja na verdade o grande controlador da pressão arterial, mantendo-a constantemente ao redor de um valor previamente ajustado. Desarranjos desse mecanismo central, de acordo com essa teoria, forçam a pressão arterial a elevar-se. Se se tentar impedir essa elevação bloqueando por exemplo a vasoconstrição periférica, o sistema ainda assim conseguirá trazer a pressão arteriala seu novo valor, aumentando o débito cardíaco. O inverso ocorrerá se o parâmetro bloqueado for o débito cardíaco: o que aumenta nesse caso é a resistência periférica.. Portanto, o sistema nervoso central funciona, de acordo com essa hipótese, como um regulador a longo prazo da pressão arterial. Nos hipertensos, o ponto de ajuste está alterado, de modo análogo ao que ocorre com o centro termorregulador em estados febris.
	O sistema nervoso central exerce, sem sombra de dúvida, uma enorme influência sobre a pressão arterial. O centro vasomotor, situado na substância reticular do bulbo e na porção inferior da ponte, mantém através das fibras simpáticas um tônus contrátil na musculatura lisa vascular, aumentando-o ou diminuindo-o conforme as necessidades imediatas do sistema circulatório, utilizando-se também do sistema parassimpático quando necessário. É crucial para o seu funcionamento a atuação de um sistema sensor, capaz de perceber variações da pressão arterial. Esse sistema é constituído pelos baroceptores situados no arco aórtico e no seio carotídeo. Através dos nervos vago, de Hering e glossofaríngeos (vias aferentes), esses baroceptores emitem continuamente sinais nervosos para o centro vasomotor, inibindo-o parcialmente e portanto modulando o efluxo simpático que dele emana. Quando a pressão arterial se eleva, o fluxo inibitório originado nos baroceptores aumenta, fazendo-a retornar a seu valor inicial. É por essa razão que a ligadura simultânea de ambas as carótidas, manobra que estimula ao máximo os baroceptores situados no seio carotídeo, provoca uma elevação acentuada da pressão arterial, servindo mesmo como um modelo de hipertensão arterial aguda.
	Seria então a disfunção dos baroceptores uma causa de hipertensão arterial? Essa possibilidade parece hoje um tanto remota. O sinal proveniente dos baroceptores é de curta duração, esgotando-se após algumas horas se a alteração da pressão arterial persistir. Em outras palavras, os baroceptores adaptam-se ao novo nível pressórico, passando a adotá-lo como nova referência. Esta característica torna difícil imaginar como uma alteração do componente sensor desse sistema de controle poderia originar uma hipertensão persistente. Essa limitação fica evidente quando observamos o que ocorre quando os baroceptores são desconectados do sistema nervoso central (deaferentados), por denervação dos receptores carotídeos e aórticos. Nos animais assim tratados, ocorre um grande aumento da instabilidade hemodinâmica, com ampla flutuação da pressão arterial, em contraste com os estreitos limites de variação observados em animais intactos. Isso ocorre porque perturbações corriqueiras da circulação (mudança de posição, atividade física, sustos, sonolência, etc.), fortemente atenuadas pelo sistema nervoso central em animais intactos, deixam de sê-lo nos animais intactos. No entanto, a pressão arterial mantém-se, na média diária, em níveis semelhantes aos observados antes da denervação, ou seja, os animais com baroceptores deaferentados não se tornam hipertensos. Como não se conhecem outras formas através das quais o sistema nervoso central poderia perceber variações da pressão arterial sistêmica, fica difícil entender como poderia funcionar o sistema de realimentação negativa proposto por Stevo Julius. Existe no entanto a possibilidade de que uma disfunção do sistema nervoso central eleve cronicamente a pressão arterial através de sua íntima relação com o funcionamento renal, conforme veremos mais adiante.
2) Teoria renal:
A teoria de que a hipertensão essencial é basicamente uma disfunção renal tem em Arthur Guyton o seu defrensor mais destacado. De acordo com essa teoria, o rim, único órgão a regular de modo significativo a excreção de sódio pelo organismo, é por essa mesma razão o responsável último pelos níveis de pressão arterial sistêmica a longo prazo. Ainda de acordo com essa teoria, além de constituir a única via de excreção de sódio de que dispõe o organismo, os rins são também o único sistema capaz de responder diretamente a alterações da pressão arterial com uma variação da excreção desse íon. Isso ocorre devido ao fenômeno, mencionado acima, da natriurese pressórica, através do qual variações da pressão de perfusão renal, em geral idêntica à pressão arterial sistêmica, deflagram rapidamente no interior do parênquima renal uma série de fenômenos ainda não muito bem compreendidos. Alguns desses processos são de natureza puramente física, como por exemplo as alterações das pressões hidráulica e oncótica (forças de Starling) junto ao túbulo proximal e o aumento do fluxo sanguíneo ao longo dos vasos retos medulares. Essas alterações tendem a alterar a excreção renal de sódio no mesmo sentido do distúrbio inicial da pressão arterial, ao longo da linha de natriurese pressórica (Fig. 10-3a). A intersecção dessa linha com a linha de ingestão de sódio é denominada ponto de equilíbrio. É esse ponto de equilíbrio o que determina a longo prazo o valor da pressão arterial. Se por exemplo a pressão arterial se elevar, a excreção de sódio aumentará ao longo da linha de natriurese pressórica. (Fig. 10-3b). Como a ingestão de sódio permanece constante, passa a ocorrer um desequilíbrio entre ingestão e excreção, resultando num balanço positivo de sódio (e conseqüentemente de água). Havendo tempo suficiente, essa perda de sódio e água resultará em uma lenta redução do volume plasmático, e portanto em um progressivo retorno da pressão arterial a seu valor original. Uma queda na pressão arterial tem um efeito exatamente inverso, novamente resultando em uma normalização da pressão arterial. Essa normalização é sempre completa, já que o efeito da pressão arterial sobre o rim é obrigatório, e não cessará enquanto a pressão arterial não houver retornado a seu valor original. Dessa maneira, a pressão arterial será determinada, de um lado, pela taxa diária de ingestão de sódio e de outro pela inclinação da linha de natriurese pressórica, que reflete em última análise a sensibilidade do rim a variações de sua pressão de perfusão e, portanto, sua capacidade de excretar sódio. Como essa linha é, em indivíduos normais, quase vertical, a pressão arterial altera-se em geral muito pouco com a ingestão de sódio, mesmo que esta varie amplamente.
Ë fácil depreender do exame da Figura 10-3 que é impossível alterar permanentemente a pressão arterial sem que seja modificada a relação entre ingestão e excreção renal de sódio. Uma maneira de se obter esse efeito poderia ser um aumento substancial da ingestão de sódio. No entanto, um exame simples da linha azul na Fig. 10-3 indica que seria necessário aumentar extraordinariamente a ingestão de sódio para que ocorresse uma elevação de uns poucos mmHg na pressão arterial média. Portanto, a única maneira de se instalar uma hipertensão duradoura é promover uma alteração nas características da natriurese pressórica. A Figura 10-4 ilustra duas alterações possíveis: na Fig. 10-4a, a inclinação da linha azul diminuiu, ou seja, a linha de natriurese pressórica deslocou-se para a direita, indicando uma menor capacidade renal de excretar sódio: são agora necessárias pressões arteriais mais elevadas para que ocorra a excreção de uma mesma quantidade de sódio. Não ocorrendo variação da ingestão de sódio, a pressão arterial eleva-se até que a excreção e a ingestão de sódio se igualem. estabilizando-se nesse novo valor, necessariamente elevado em relação ao normal. Esse efeito pode ser obtido em animais de laboratório através da administração de uma droga retentora de sódio, como a aldosterona ou a angiotensina II, ou pode ocorrer espontaneamente em um paciente com hipertensão essencial. Note-se que, em um indivíduo com esse tipo de anomalia, a pressão arterial cai sensivelmente quando se reduz a ingestão de sal – o ponto de equilíbrio desloca-se para a esquerda e para baixo, sendo possível até mesmo normalizar a pressão arterial. Essas hipertensões são portanto sal-sensíveis. Uma outra maneira de se interferir com a natriurese pressórica,baixando a pressão arterial, é a administração de um diurético, como por exemplo um tiazídico (ver Capítulo 6). Nesse caso, a linha azul inclina-se para a esquerda e a pressão arterial cai até que ingestão e excreção de sódio novamente se igualem. Poderíamos obter um resultado semelhante administrando uma droga vasodilatadora, como por exemplo um supressor do sistema renina-angiotensina,. Em ambos os casos, estaremos aumentando a capacidade renal de excretar sódio. Essa constitui na verdade a base racional para o tratamento da hipertensão. Na Fig. 10-4b está esquematizada uma outra maneira de se provocar uma hipertensão persistente alterando as características da natriurese pressórica. Neste caso, a reta está deslocada para a direita, mantendo-se no entanto paralela àquela observada em indivíduos normais. Aqui também será necessária uma pressão arterial mais elevada para uma mesma excreção de sódio, levando assim a um deslocamento para a direita do ponto de equilíbrio. No entanto, a pressão arterial neste caso seria pouco afetada retirando-se o sal da dieta, uma vez que a inclinação da linha não se alterou em relação ao normal. Temos aqui portanto um exemplo de hipertensão sal-insensível ou sal-resistente. Nesse caso, a restrição salina teria pouco efeito, sendo necessário administrar drogas que tendam a trazer a natriurese pressórica a suas características normais. É provável que uma parcela considerável dos hipertensos reúna características comuns a esses dois modelos de disfunção. Por essa razão, a restrição ainda que parcial à ingestão de sal e o uso de diuréticos integram de modo proeminente o arsenal terapêutico utilizado no combate à hipertensão.
	É importante ressaltar que o modelo de Guyton e associados, mesmo assumindo que o hipertenso sempre apresenta uma relativa incapacidade de excretar sódio, não requer necessariamente um aumento do volume plasmático. A razão para isso é que um aumento do volume plasmático termina sempre levando a um aumento do débito cardíaco, e portanto a um aumento do fluxo sangüíneo aos tecidos periféricos. Estes no entanto possuem a capacidade de regular sua própria perfusão modificando a resistência das arteríolas que os alimentam. Essa propriedade, conhecida como autorregulação, decorre de uma variação da concentração local de catabólitos, como o O2, o CO2 e os íons H+, à medida que varia o fluxo sangüíneo. Quando este é baixo, acumulam-se catabólitos dilatadores, como o CO2. Quando o fluxo é excessivamente alto, cai a pressão parcial de CO2, enquanto a de O2 se eleva: o resultado é um aumento da resistência vascular. Quando diminui a capacidade renal de excretar sódio e o indivíduo passa a reter o íon, esse processo ocorre de modo generalizado no organismo, promovendo um aumento progressivo da resistência periférica. Essa anomalia tende a elevar ainda mais a pressão arterial. No entanto, essa elevação é autolimitada, porque promove um aumento da excreção de sódio, o que aos poucos reduz o volume plasmático a níveis quase normais. Em conseqüência, a hipertensão que se desenvolve, inicialmente dependente de uma aumento no volume plasmático e no débito cardíaco (Fig. 10-2), muda de perfil, tornando-se dependente de um aumento da resistência periférica. Quando finalmente o indivíduo chega à situação estacionária (ou seja, quando a pressão arterial se estabiliza no novo valor), o volume plasmático está normal ou minimamente elevado, a resistência periférica está elevada e o balanço de sódio é igual a zero (ou seja, como seria de se esperar, a ingestão e a excreção de sal são exatamente iguais na situação estacionária). Portanto, mesmo que a hipertensão resulte de uma limitação à excreção renal de sódio, como propõe o modelo de Guyton, não se observa um balanço positivo de sódio. O indivíduo só retém uma pequena quantidade de sódio durante um curto período, imediatamente anterior à instalação da hipertensão e que obviamente nunca é detectado. Quando se apresenta ao clínico, o paciente hipertenso sem complicações está invariavelmente em balanço zero de sódio.
A teoria defendida por Guyton e outros encontra apoio em uma série de evidências experimentais produzidas por esse grupo. Em cães que tiveram 70% de sua massa renal removida, esses investigadores demonstraram que, mesmo nessas condições, o tecido renal era ainda capaz de manter uma pressão arterial relativamente normal, provavelmente por adaptação dos néfrons remanescentes (ver Capítulo 15). No entanto, quando esses animais bebiam salina a 0,9% ao invés de água, desenvolviam hipertensão acentuada, a qual era revertida quando voltavam a receber água pura. Esses resultados sugeriam que o que provocava a hipertensão arterial era a incapacidade do tecido renal remanescente de dar conta de uma sobrecarga de sódio. Essa intolerância ao sódio também se desenvolve quando os rins, mesmo sem sofrer redução de sua massa, têm diminuída sua capacidade intrínseca de excretar sódio, como no hiperaldosteronismo primário e nos modelos experimentais de administração crônica de vasoconstritores como a angiotensina II. Nesse caso, os rins exigem uma elevação persistente da pressão arterial a fim de chegar a uma taxa de excreção de sódio idêntica à de ingestão, ou seja, para chegar a um balanço zero de sódio. Segundo a teoria de Guyton, um mecanismo semelhante a esse atua na maior parte dos indivíduos com hipertensão essencial - o defeito básico é sempre um comprometimento da capacidade renal de excretar sódio , com desvio para a esquerda da linha de natriurese pressórica, com ou sem redução de sua declividade, 
Uma série de evidências clínicas e experimentais obtidas por diversos outros grupos dão respaldo à teoria da origem renal da hipertensão essencial. Talvez as evidências mais convincentes sejam aquelas obtidas através de transplantes experimentais e em humanos. Em experimentos realizados com várias cepas de ratos com hipertensão de origem genética, observou-se de modo bastante consistente que a hipertensão "segue o rim". Isso fica claro quando se transplanta, para um animal normotenso previamente nefrectomizado, um rim de um doador hipertenso. Nesse caso, o receptor torna-se hipertenso. Isso ocorre mesmo quando o doador é previamente mantido normotenso por meios farmacológicos, indicando que a anomalia que leva à hipertensão é intrínseca àquele rim . O experimento inverso mostra resultados análogos: quando se transplanta um rim de um doador normotenso para um receptor hipertenso, a hipertensão arterial é prevenida se o receptor for jovem e ainda normotenso e atenuada se o receptor já for adulto e hipertenso. Observações semelhantes foram realizadas em transplantes humanos: receptores provenientes de famílias normotensas e que recebem rins de doadores de famílias hipertensas necessitam de mais medicação anti-hipertensiva do que nos casos em que a família do doador é normotensa. Em outro estudo, pacientes com nefropatia hipertensiva terminal tiveram sua pressão arterial normalizada ao receberem enxertos de doadores normotensos, mantendo-se assim durante pelo menos 4 anos e meio.
Outras evidências menos diretas dão também respaldo à teoria da origem renal da hipertensão essencial. As hipertensões adquiridas ou induzidas em animais previamente normotensos envolvem de modo consistente um comprometimento da capacidade renal de excretar sódio. É o caso do hiperaldosteronismo primário, mencionado acima, da coartação de aorta, da redução cirúrgica da massa renal e talvez até mesmo de modelos classicamente atribuídos à hiperatividade do sistema renina-angiotensina, como a hipertensão de Goldblatt com dois rins (com um clip em uma das artérias). Algumas formas hereditárias de hipertensão experimental dependem nitidamente da retenção renal de sódio, como é caso do rato Dahl sensível, que se torna hipertenso quando submetido a um regime de alta ingestão de sal. Outra linha de evidência em apoio à hipótese da retenção de sal é representada por estudos populacionais em que se observou o efeito da ingestão de sal sobre a pressãoarterial. Esses estudos, dos quais um dos mais conhecidos é o INTERSALT, mostraram que, em populações onde o consumo de sal é baixo, o aumento da pressão com a idade é modesto ou inexistente, ao passo que os níveis pressóricos aumentam acentuadamente com a idade em populações afeitas dietas ricas em sal. Finalmente, deve-se lembrar que uma grande parte das hipertensões essenciais responde satisfatoriamente a uma diminuição da ingestão de sal e ao uso de diuréticos, mostrando que a capacidade renal de excretar sódio influencia fortemente os níveis pressóricos.
3) Interação entre mecanismos nervosos e renais na regulação da pressão arterial
	O papel dominante desempenhado pelos rins na regulação a longo prazo da pressão arterial e o caráter transitório da atuação dos baroceptores não exclui a participação do sistema nervoso na gênese e manutenção da hipertensão arterial. Conforme observado anteriormente, sabemos identificar os mecanismos fisiopatológicos associados à hipertensão, mas desconhecemos a etiologia da maioria dos casos. Sabemos existirem fatores genéticos capazes de causar hipertensão, mas ignoramos quais são os produtos gênicos envolvidos. Dada a íntima conexão entre os rins e o sistema nervoso, é possível que um desajuste deste provoque o desenvolvimento de hipertensão através de uma ação sobre os rins. Os vasos renais e o processo de transporte tubular de sódio respondem a uma série de estímulos de origem nervosa, seja através da inervação direta do parênquima renal, seja através da ação renal de compostos vasoativos circulantes originados no sistema nervoso. Embora plausível, essa concepção carece ainda de evidências sólidas em seu favor.
VI.1. Fatores humorais: a importâncai do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA):
	Os rins respondem a uma série de compostos vasoativos que fazem parte de sistemas complexos , como o das prostaglandinas, o sistema L-arginina/óxido nítrico, o sistema calicreina-cinina, entre outros (ver Capítulo 2). Dentre todos esses, o sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA), cuja descrição inicial remonta a mais de 60 anos, é ainda hoje considerado por muitos como o mais importante, devido a três razões principais: 1) trata-se de um dos mais potentes sistemas vasoativos conhecidos. 2) oespectro de sua atuação é enorme, compreendendo desde a ação vasoconstritora da angiotensina II até a retenção de sódio e espoliação de potássio promovidas pela aldosterona, passando por uma série de efeitos celulares que podem influenciar decisivamente o desenvolvimento de processos inflamatórios renais e até mesmo extrarrenais. Por essa razão, o SRAA é considerado em detalhe neste capítulo (ver também o Capítulo 2).
Sabe-se desde os clássicos experimentos de Goldblatt, em 1934, que a constricção de uma artéria renal produz hipertensão arterial em animais. A contrapartida clínica desse modelo é a hipertensão renovascular. A hipertensão arterial nestas situações é o exemplo maior da relação entre hiperatividade do SRAA e a elevação pressórica. A constricção da artéria renal ativa a produção e liberação de um hormônio produzido pelas células justaglomerulares denominado renina. A renina, por sua vez, age sobre um substrato sintetizado no fígado, o angiotensinogênio. O produto dessa interação é a angiotensina I, um decapeptídeo que, sob ação de uma enzima hidrolítica (enzima conversora da angiotensina I), é transformado em angiotensina II (A II), um octapeptídeo. A A II é um potente vasoconstrictor, elevando agudamente a pressão arterial através deste e outros efeitos. Além da ação sobre os vasos, a angiotensina II também promove a liberação de aldosterona na córtex das supra-renais. A aldosterona é um hormônio esteróide cuja ação nos túbulos distais finais e coletores corticais promove reabsorção de sódio e água (ver Capítulo 5). Esse efeito retentor de sódio contribui para a elevação da pressão arterial. A secreção aumentada de aldosterona ocorre de forma autônoma quando da existência de um tumor da supra-renal, produtor deste hormônio. Como vimos anteriormente, esta anomalia é denominada hiperaldosteronismo primário.
O sistema renina angiotensina é estruturado como um sistema endócrino típico. Neste modelo, o substrato (angiotensinogênio hepático) sofre modificações por duas enzimas (renina renal e enzima conversora de angiotensina I, presente principalmente no endotélio pulmonar) resultando na produção da substância ativa do sistema, a A II, que age nos vários órgãos através da circulação. Este modelo é útil e consistente com o que se observa em diversas situações fisiológicas e patológicas. A avaliação da atividade do SRAA baseia-se primariamente na aferição dos níveis circulantes de angiotensinogênio, renina, ECA, Ang I e A II na circulação. Com bases nestes dados tornou-se claro que o fator limitante para a formação de A II no plasma é a atividade da renina. Sabemos hoje que a produção/liberação de renina na circulação é controlada por três estímulos principais: 1) a diminuição da pressão de perfusão renal (por exemplo, em uma hemorragia). 2) a diminuição da concentração de cloreto de sódio que alcança a mácula densa (por exemplo, na administração de uma dieta pobre em cloreto de sódio). 3) aumento da atividade simpática (por exemplo, em uma hipovolemia). É ainda pouco conhecida a importância relativa desses estímulos, ou seja, a hierarquização dos mesmos nas diferentes situações fisiológicas e patológicas. O desenvolvimento de agentes farmacológicos que interferem com o sistema, principalmente aqueles que o inibem, foi muito importante no tratamento de doenças cardiovasculares e como ferramentas farmacológicas para compreender melhor o SRAA. A utilização mais freqüente dessas drogas, principalmente a dos inibidores da ECA, a partir dos anos 70 tornou-se um marco importante na medicina, pois veio revolucionar o tratamento de várias afecções cardiovasculares como a própria hipertensão arterial, o diabetes melito, o infarto do miocárdio e a insuficiência cardíaca congestiva. Por outro lado, diversas evidências experimentais e clínicas colocaram em dúvida o modelo tradicional endócrino. Por exemplo, o sucesso dos “inibidores” do sistema não se correlacionava em todos os pacientes com a atividade da renina, como sugeria o modelo. Na mesma época a popularização das técnicas de biologia molecular fazia com que esta abordagem de alto poder analítico começasse a ser amplamente utilizada. Isto propiciou a constatação de que os componentes do SRAA estavam presentes de forma mais ampla do que a imaginada, principalmente nas células e tecidos que compreendem o sistema cardiovascular (vasos, coração, rins, adrenais e sistema nervoso). Esses achados forçaram a uma revisão do paradigma anterior. Considera-se hoje a existência, além do sistema SRAA endócrino, de sistemas SRAA locais (ou seja, é possível a vários órgãos e tecidos produzir sua própria A II sem depender de componentes circulantes), que poderiam desempenhar ações parácrinas (sobre células de tecidos vizinhos) e autócrinas (sobre células do mesmo tecido). Este novo paradigma permite explicar, portanto, a ausência de correlação entre a eficácia do tratamento com inibidores do SRAA e os níveis circulantes dos componentes do sistema. A existência de uma produção local de A II sugere também que esse peptídeo, que exerce diversos efeitos celulares além da constricção do músculo liso, participa de processos não hemodinâmicos como a proliferação celular, a formação de matriz extracelular e as inflamações crônicas. Esses achados sugerem ainda que a AII pode participar da seqüência de eventos que conduzem à perda progressiva da função renal (ver Capítulo 15) e ajudam a explicar a eficácia dos supressores do SRAA na prevenção desses processos. 
EXERCÍCIOS
Abra o programa HIPERTENSÃO ARTERIAL”. Há nesta tela duas áreas para a entrada de parâmetros, denominadas 0-45 dias e 45-90 dias. Os parâmetros que constam de cada área podem ser variados de modo inteiramente independente.
Aumentea ingestão de sódio no dia zero para 200 mEq/dia (a ingestão aos 45 dias acompanha essa variação). Observe que: a) a pressão arterial e o débito cardíaco praticamente não variam. b) a excreção urinária de sódio aumenta gradativamentede modo a igualar a quantidade ingerida. c) as linhas azuis que representam a natriurese pressórica nos gráficos situados nos cantos inferiores direito (0-45 dias) e esquerdo (45-90 dias) da tela tornam-se um pouco mais verticais, indicando um aumento da capacidade renal de excretar sódio. Observe que, neste exercício, esses dois gráficos são idênticos. Observe ainda a movimentação do ponto de equilíbrio (representado nos dois gráficos pelo pequeno círculo vermelho).
Mantendo a ingestão inicial de sódio em 200 mEq/dia, reduza a 100 mEq/dia o valor correspondente ao período 45-90 dias. Verifique o retorno dos parâmetros aos valores basais
Pressione novamente “PADRÃO”. Imagine agora uma situação em que o sistema nervoso autônomo conseguisse a façanha de aumentar a resistência periférica sem alterar a resistência renal e, portanto, a capacidade renal de excretar sódio (isso na verdade não ocorre na prática). Para isso, aumente a resistência periférica de 20 para 25 mmHg/ml/min. Observe que a pressão arterial eleva-se a princípio, retornando porém rapidamente ao valor basal à custa de uma queda no débito cardíaco, motivada por uma perda urinária de sódio (forçada pela própria elevação da pressão arterial – natriurese pressórica).
Reduza agora a declividade da reta de natriurese pressórica movendo a barra deslizante correspondente (“capacidade renal de excreção de sódio”). Observe que: a) as reta azuis nos gráficos inferiores esquerdo (0-45 dias) e direito (45-90 dias) deslocam-se para a direita e para baixo, indicando uma redução de sua declividade e, portanto, de sua capacidade renal de excretar sódio. b) desta vez a pressão arterial eleva-se progressivamente, estabilizando-se em um valor permanentemente elevado em relação ao basal. c) ocorre de início uma redução na excreção urinária de sódio, refletindo a dificuldade dos rins em excretar sódio na vigência de uma pressão arterial normal. Com o passar do tempo, a excreção urinária de sódio retorna ao valor basal, refletindo a elevação da pressão arterial (natriurese pressórica). O preço dessa adaptação é no entanto a hipertensão arterial. e) o débito cardíaco aumenta gradativamente, explicando neste caso a elevação da pressão arterial. Refaça o exercício observando atentamente a movimentação do ponto de equilíbrio.
Mantendo os demais parâmetros em valores idênticos aos do exercício anterior, ative a autorregulação tecidual (no gráfico débito cardíaco vs. tempo). Observe que agora o aumento do débito cardíaco, verificado no exercício anterior, não se mantém: ocorre uma progressiva normalização do débito cardíaco, enquanto a resistência periférica se eleva. Esse quadro, de aumento da resistência periférica, e não aquele observado no exercício 4, de aumento de débito cardíaco, é o que na realidade se encontra nos pacientes hipertensos. A explicação para esse fenômeno é a de que o débito cardíaco é progressivamente forçado a reduzir-se (e a resistência periférica a elevar-se) devido à autorregulação tecidual, que limita os fluxos sangüíneos locais.
Vamos tentar agora tratar a hipertensão desse paciente. Reduza para 20 mEq/dia, na seção 45-90 dias, a ingestão de sódio. Observe que há uma queda dos níveis pressóricos e da resistência periférica. Portanto, quando a declividade da reta de natriurese pressórica está diminuída, a hipertensão é extremamente sensível à ingestão de sal. Observe agora o efeito da administração de um diurético (assinalando o círculo correspondente) sobre a declividade da reta de natriurese pressórica no gráfico à direita (correspondente ao período 45-90 dias). Observe novamente o deslocamento do ponto de equilíbrio. Observe o que acontece ao débito cardíaco. Por que ocorre isso?
Retorne a capacidade renal de excretar sódio ao normal, mantendo ativada a autorregulação. Aumente para 110 o intercepto da reta de natriurese pressórica em relação ao eixo das abscissas. Observe a reta deslocar-se para a direita, sem alterar sua declividade (mantendo-se portanto paralela à reta normal). Observe o deslocamento do ponto de equilíbrio. Verifique que a pressão arterial, a excreção urinária de sódio e o balanço de sódio comportam-se de modo semelhante ao observado no ítem 6. Reduza agora a ingestão de sódio da segunda fase (45-90 dias) para 20 como no ítem 7. Observe que o efeito hipotensor dessa manobra é agora bem mais modesto. Observe também o efeito da administração de um diurético nessa fase. Portanto, quando a reta da natriurese pressórica é paralela à normal, a hipertensão é pouco sensível à ingestão de sal. O efeito da administração de diuréticos é também relativamente modesto. Isso não significa que a restrição salina e o uso de diuréticos sejam inúteis a esses pacientes, uma vez que alguma redução pressórica sempre ocorre. No entanto, esses pacientes quase sempre necessitam de outros medicamentos anti-hipertensivos.
Combine agora as duas anomalias renais, reduzindo a declividade e aumentando o intercepto para 100 (essa é provavelmente a situação mais freqüente). Verifique que a sensibilidade a sal é intermediária. Isso quer dizer que, de modo geral, vale a pena tentar controlar a hipertensão restringindo a ingestão de sal e administrando diuréticos, nem que seja como um tratamento coadjuvante.
Finalmente, mantendo a autorregulação ativada, observe o efeito hipotético de uma ativação do sistema nervoso central sobre a excreção renal de sódio e a pressão arterial. De acordo com o conceito aqui representado, um excesso de atividade do sistema nervoso central pode em tese levar, através do sistema nervoso autônomo, a uma vasoconstrição renal e a uma diminuição da capacidade de excreção de sódio, com as conseqüências observadas no exercício no. 5.
Fig. 10-1 – Representação esquemática da freqüência de distribuição da pressão arterial diastólica na população. A área hachurada corresponde à porcentagem de hipertensos que será observada caso o critério para a definição de hipertensão seja o de pressão diastólica > 85 mmHg (linha pontilhada vertical)
Fig. 10-2 – Representação esquemática e simplificada da circulação. A pressão arterial (PA) sempre pode ser expressa como o produto do débito cardíaco (DC) e da resistência periférica (RP)
Fig. 10-3 – Natriurese pressórica. Variações da pressão arterial promovem um aumento da taxa de excreção urinária de sódio ao longo da linha azul. O círculo vermelho, que marca a intersecção dessa linha com a linha vermelha, representatrva da taxa de ingestão de sódio, é denominado ponto de equilíbrio.A) - Em condições normais, esse ponto corresponde a uma pressão arterial média entre 90 e 95 mmHg . B) - Se a pressão arterial média se elevar a cerca de 100 mmHg, a taxa de excreção de sódio dobrará, levando a um desequilíbrio entre ingestão e excreção de sódio.
A
B
A
B
Fig. 10-4 – Duas maneiras de se alterar a natriurese pressórica e provocar hipertensão arterial (deslocamento do ponto de equilíbrio). A) diminuindo a declividade da linha de natriurese pressórica. Neste caso temos uma hipertensão sal-sensível. B) deslocando a linha de natriurese pressórica para a direita, mantendo inalterada sua declividade. As linhas pontilhadas indicam a natriurese pressórica normal.

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