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Resenha Crítica sobre Vigiar e Punir

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A recensão crítica de Isabel Brites relata uma breve visão a respeito da obra “Vigiar e Punir – História da Violência nas Prisões” do autor Michel Foucault, contendo quatro capítulos, o autor passa uma perspectiva geral a respeito da evolução dos castigos da Idade Média até a Idade Moderna. Apresentando um exemplo de suplício, ocorrido em 1757, podemos ter conhecimento de quão torturoso e humilhante era tal ato, entendido como um ritual político. A participação popular era crucial para sua legitimidade; pois as pessoas não eram meras espectadoras, mas sim componentes do ritual, observando e exigindo a execução do transgressor e posteriormente fixando na memória o acontecimento. Onde algumas vezes havia uma inversão de papéis, onde os poderes eram ridicularizados e os criminosos viravam heróis. Assim a principal função do suplício era instaurar a política do medo na população, impedindo a futura violação das leis, e reafirmando a consolidação do poder real. A agitação dos mais pobres, sobretudo nas execuções injustas ou nas diferenças de penas segundo as classes sociais, resultou em movimentos que se propagaram e chamaram atenção dos reformistas, o que os levaram a perceber que as execuções não preocupavam a população, então exigiram a suspensão dos suplícios. Na visão do autor, o fator de maior relevância no abandono do suplício, não foi qualquer sentimento de humanidade para com os condenados, mas sim, da parte do poder, um medo político do efeito desses rituais. Anos mais tarde, nos Estados Unidos e na Europa, foi a época de - além dos inúmeros projetos de reforma e uma nova era para a justiça penal – repensarem sobre o suplício e tudo que o abrangia. No século XIX, desapareceram os rituais de castigo físico e humilhação ao indivíduo perante a sociedade, as punições foram ficando cada vez menos físicas, não mais sendo o corpo como alvo principal, mas sim um ato administrativo ou de procedimento. A justiça não entendia mais o espetáculo de suplício como um ato de louvor ao seu poder, algo que se orgulhava, mas uma obrigação indesejada, causando vergonha no ato de punir. O castigo físico passou a ser tido como afronta á dignidade do homem, o qual foi consagrado com um manto de direitos. O objetivo agora era “uma morte igual a todos”, tirando a vida, mas evitando deixar que o condenado sinta o mal, privando de todos os direitos sem fazer sofrer, impor penas isentas de dor. A guilhotina, que antes era usada apenas nas penas dos nobres, passou a ser o instrumento ideal para penas de morte para todos, sendo uma morte rápida e discreta, um acontecimento visível, mas instantâneo. A punição não era mais dirigida ao corpo, mas sim a alma, atuando profundamente sobre o coração. A posição geral da chancelaria em 1978, a respeito dos suplícios, era “Que as penas sejam moderadas e proporcionais aos delitos, que a morte só seja imputada contra os culpados assassinos, e sejam abolidos os suplícios que revoltem a humanidade.” Nos últimos 200 anos, muitos crimes perderam tal conotação, uma vez que estavam objetivamente ligados a um exercício de autoridade religiosa ou a um tipo de vida econômica. Continuaram a ser julgados os crimes e os delitos definidos juridicamente pelo código, mas outras questões também passaram a ser julgadas, como as anomalias e os instintos por exemplo. Desde o século XIX, todos os julgamentos tinham suas questões veiculadas entre jurisprudência e medicina. Assim, a sentença que condena ou absolve não tinha participação apenas do juiz, era necessária uma prescrição técnica para uma possível normalização. Na segunda parte da sua obra, o autor fala sobre o importante papel dos reformadores do século XVIII. Primeiramente, questiona a si próprio e ao leitor sobre se o que de fato moveu os reformadores foi a sua humanidade, a sua maior sensibilidade em relação aos suplícios, o que resultou em um afrouxamento da penalidade no decorrer do século. Após várias explicações, o autor chega a conclusão que, o que estaria essencialmente em causa, para os reformadores, seria a economia dos castigos, desajustada da nova realidade social, bem como uma justiça paralisada e ineficaz, que exigia mudanças urgentes. No fim do século XVII, houve uma diminuição do que chamam de “crimes de sangue” e das agressões físicas. Por outro lado, os crimes contra a propriedade ganharam relevância, e prevaleceram sobre as outras formas de infração penal. No século XVIII, a criminalidade dos marginais mudou suas formas de atuação, o ataque aos corpos foi substituído pelo ataque direto aos bens. Na segunda metade do século XVIII houve uma elevação geral do nível de vida, um forte crescimento demográfico, multiplicação das riquezas e propriedades por parte da classe social burguesa, surgindo consequentemente uma necessidade de segurança. Sendo de classe dominante, a burguesia, já intolerante com essa situação exigiu uma repressão rigorosa. Era necessário que as infrações fossem definidas e punidas com segurança, da mesma forma que era necessário controlar e codificar todas as práticas ilícitas, como o roubo à cabeça. Como os reformadores estavam cientes de que os castigos não podiam ser como antes, concluíram que era necessário que a justiça criminal punisse, em vez de se vingar, e que punisse com humanidade. Essa mudança é uma estratégia para que o poder de punir tornasse mais regular, eficaz, constante e detalhado em seus efeitos, par que aumentasse os efeitos e diminuísse os custos econômicos e políticos. A sociedade tinha o direito de se defender, de punir o cidadão, mas de uma maneira menos feroz, mais suave, era preciso moderar e calcular os efeitos de retorno do castigo sobre a punição e seu poder que o exercia. Para que o poder de punir se tornasse de maior eficácia, impedindo que o delito se repita, os reformadores definiram algumas regras que definia o poder de punir, são elas: “Regra da quantidade mínima” (O cidadão deve ter uma percepção clara de que o grau de desvantagem no cometimento do crime é maior que o grau de vantagem que ele pode ganhar se ousar arriscar o crime.); “Regra da idealidade suficiente” (Determina a eliminação corpo como sujeito da pena, devendo ser potencializada a representação da pena.); “Regra dos efeitos colaterais” (Estabelece que a pena deve surtir mais efeitos naqueles que não cometeram a falta.); “Regra da certeza perfeita” (As leis devem ser claras e precisas para conhecimento de todos, e que esteja escrita em corpo legislativo para que funcione como um pacto social.); “Regra da verdade comum” (O crime só pode ser admitido quando for inteiramente comprovado e, até chegar o momento de análise final, o acusado deve ser considerado inocente.); e pôr fim a “Regra da especificação ideal” (É necessário um código, claro e minucioso, que defina os crimes fixando as penas.). Esta individualização das penas representou um grande passo à frente em toda a história do direito penal moderno. O ponto de partida da reforma foi, o projeto político de classificar as ilegalidades, de generalizar a função punitiva, e de delimitar, para o controle, o poder de punir. Pode-se também definir duas linhas de objetivação do crime e do criminoso: o criminoso tratado como inimigo de todos e, a necessidade de medir os efeitos do poder punitivo que intervém sobre os criminosos atuais ou eventuais. Através do pensamento dos ideológicos desenvolveu-se uma nova teoria do indivíduo e da sociedade, houve um desvio do objeto de julgar e punir. O objeto da intervenção penal não é mais o crime ou o criminoso, mas sim a criminalidade em si, essa visão mais objetiva do crime, trouxe efeitos mais rápidos e decisivos. Surpreendentemente – pois não era essa a visão dos reformadores em relação as prisões – em menos de 20 anos, o império decidiu-se pelo encarceramento como medida para comprimento das penas, programando um grande edifício com altos muros. O objeto da pena não era mais as representações, mas o corpo e a alma do indivíduo novamente. A finalidade não era reconstruir o cidadão de direito, mas o cidadão obediente,sujeito a hábitos, regras e ordens, e que contém uma autoridade exterior a si. Com alguns questionamentos sobre essa questão, o autor relata que na sua visão não estavam perante teorias do direito que derivam de escolhas morais, mas sim de modalidades do direito de punir. Na época clássica registravam- se um grande interesse pelo corpo, enquanto objeto e alvo do poder, o autor cita alguns desses exemplos através de livros. Visavam produzir “corpos dóceis”, isto é, corpos obedientes e “bonzinhos”, que não contestam e que apenas se deixam instruir. Mecanismos de adestramento do corpo e esquemas de docilidade foram assistidos em conventos, escolas, exércitos e até oficinas. Como o autor cita em seu livro, o poder disciplinar tinha como objetivo “adestrar” as “multidões confusas e inúteis de corpos”, e a partir daí fabricar indivíduos obedientes. Tal disciplina acelerou-se, criando um conjunto de técnicas, um corpo de processos e de saberes, de descrições, de receitas e de dados. Essa distribuição passou a ser de caráter de utilidade quando, na metade do século XVIII, surgiram as oficinas, manufaturas e fábricas. Surgindo assim, o princípio da economia dos espaços, que seria uma localização ideal dos indivíduos de forma organizada no campo de trabalho. O ponto principal dessa organização é, a origem a divisão do processo de produção e ao nascimento da grande indústria, que se dá através da repartição do espaço disciplinar da força do trabalho. Outro aspecto importante desse mecanismo é a imposição e a sujeição a horários, que inclusive recebeu uma grande ajuda das congregações religiosas no século XIX. O essencial não era o cumprimento dos horários estabelecidos, mas a garantia do tempo utilizado, que deveria ser um tempo completamente útil e de boa qualidade. Essa disciplina corporal, criou uma economia do tempo, impondo um tempo disciplinar nas práticas pedagógicas, nas organizações militares e nas oficinas. A vigilância hierárquica supõe um aparelho onde as técnicas que permitem ver induzam a efeitos de poder, e onde, em troca, os meios de coerção tornem claramente visíveis aqueles sobre quem se aplicam. No decorrer da época, foram construídos observatórios da multiplicidade humana. Esse poder disciplinar tornou-se um sistema integrado, ligado do interior á economia e aos fins do dispositivo onde é exercido. Organiza- se como um poder múltiplo, automático e anônimo, pois seu funcionamento é de uma rede de relações de alto a baixo, mas também de baixo para cima e lateralmente: fiscais perpetuamente fiscalizados. O que permite ao poder disciplinar ser absolutamente indiscreto, pois estava em toda parte e sempre alerta, e absolutamente discreto, pois funcionava permanentemente e em grande parte em silêncio. Foi inventado um novo funcionamento punitivo, tendo por base o poder da norma e, consequentemente, inventaram também novos mecanismos de sanção normalizadora. O exame é um controle normalizante, uma vigilância que permitia qualificar, classificar e punir, suponhando um mecanismo que liga um certo tipo de formação de saber a uma certa forma de exercício do poder. Para o autor, a mais relevante consequência do exame situa-se ao nível da individualidade do indivíduo. Essa técnica de captação no mecanismo de objetivação, situava os indivíduos numa rede de anotações escritas onde cada indivíduo passava a ser um caso, com seu próprio status e a sua própria individualidade. O capítulo panoptismo se inicia descrevendo as prescrições do século 18, quando havia declaração de peste em seu território. Uma quarentena se montava: indivíduos trancados em suas casas, intendentes e “síndicos” vigiando, produção contínua de relatórios escritos e orais. Se o modelo gerado pela lepra foi o Fechamento, o da peste é a sociedade disciplinar. Um coletiviza e agrupa, outro individualiza e recorta. Este consiste em um anel na periferia, dividido em celas que, por sua vez, possuem janelas interna e externa onde a luz entra; e uma torre no centro, para observar as “individualidades” e fazê-las acreditarem que estão sendo observadas todo tempo. Tal mecanismo visa assegurar um funcionamento automático do poder. também, uma instância de saber, se aplicando a toda a sociedade. O panóptico tem como objetivo se difundir por todo o corpo social. Para o autor a prisão não é algo recente, e não decorre do nascimento dos códigos penais, já existiam antes modelos de detenção penal nos quais, sem se usar a denominação e aquela forma. A novidade que representava o surgimento do sistema prisional era a do sentido de humanidade, de justiça social, esta instituição penal surgiu para ser a coação de uma educação total, para possuir uma disciplina onipresente a fim de transformar o indivíduo pervertido. A prisão era vista como a pena das sociedades civilizadas, uma vez operada essa reforma, o criminoso devia voltar a sociedade, se exigia à prisão que regenerasse o detido, devendo o devolver a sociedade um cidadão útil. Não interessavam mais apenas as circunstâncias do crime cometido, mas sim as suas causas, e estas deveriam ser procuradas na história da sua vida. Começou então a estabelecerem causalidades psicológicas, os discursos penais e psiquiátricos começaram a difundir. Foi assim que surgiu a criminologia – ciência que tem por objetivo o indivíduo enquanto delinquente e o delinquente enquanto indivíduo. Foi elaborada uma tipologia sintomática dos delinquentes: os que são dotados de inteligência, que se tornaram perversos por vontade própria e os que forma levados ao crime pelos seus instintos pessoais e incapacidades próprias. Por imposição as delinquências teriam que ser conhecidas inteiramente para ser considerados na reelaboração dos códigos. O autor finaliza sobre esse assunto dizendo que as prisões não diminuem a taxa de criminalidade, mas funcionavam como quarteis do crime, sendo um duplo erro econômico, pelo custo da sua organização e pelo custo da delinquência que não se reprime. No último capítulo, o autor retoma aos assuntos já tratado nos capítulos anteriores, e faz uma relação com os cinco modelos de referência. O adestramento dos corpos não é mais apenas uma observação, mas uma avaliação contínua dos comportamentos, surge um novo tipo de controle: o controle da normalidade sobre os indivíduos em geral. Essa técnica de controle das normas foi estendendo os seus suportes institucionais e específicos, a multiplicação do poder normalizador fez surgir, juízes da normalidade por toda a parte. O autor termina questionando a si próprio e ao leitor, sobre se o desafio político atual está na alternativa prisão ou em algo diferente; para o autor, a prisão, como funciona num regime panoptico e em uma sociedade como a nossa, deve ser modificada e é indispensável.
A obra de 1975 do autor francês Michel Foucault, relata a retrospectiva histórica dos métodos de punição, desde os suplícios até o sistema prisional. O autor afirma que, o contexto da condenação sempre veio de um meio de corrupção e erros, o que fez criar ainda mais marginais, banalizando cada vez mais esse meio social e criando a diferença entre as classes, a obra de Foucault relata, que o controle social, por parte da pessoa que está no poder, já vem desde as práticas religiosas, de todas as formas de convívio social, que influenciam o indivíduo a viver em uma hierarquização, que está sujeito a obedecer e a aceitar o que lhe é imposto. Muitas reflexões são feitas, através de indagações após termos a leitura da obra. Vemos que o realmente o meio nos impõe e o que ele nos cria, uma leitura crítica do sistema político e do que ele nos submete o porquê da hierarquia e, para que tal institucionalização hierárquica. O livro é muito atrativo e de extrema importância, pois Foucault deixou nesta obra, grandes conhecimentos, tornando este livro, um clássico para todo estudante de direito e para todo aquele que quer ter explicações sobre as situações que presenciamos atualmente no cenário penal.

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