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Fichamento - vigiar e punir - focault

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FICHAMENTO 
 
FOUCAULT, Michel.Vigiar e punir: nascimento da prisão. (Título Original: Surveiller et punir. 
Traduzido por Raquel Ramalhete). 37. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009. 
 
A obra Vigiar e Punir de Michel Foucault, pensador francês contemporâneo, faz uma análise 
científica sobre a legislação penal e o sistema punitivo adotado pelos poderes jurídicos para os 
que praticam alguma modalidade de crime ao longo dos séculos. 
 
O livro é formado por quatro partes: Primeira Parte: Suplício, dividida em dois capítulos – O 
corpo dos condenados e A ostentação dos suplícios; Segunda Parte: Punição, dividida em dois 
capítulos – A punição generalizada e A mitigação das penas; Terceira Parte: Disciplina, dividida 
em três capítulos – Os corpos dóceis, Os recursos para um bom adestramento e O panoptismo; 
Quarta Parte: Prisão, dividida em três capítulos – Instituições completas e austeras, Ilegalidade 
e delinqüência e O carcerário. 
 
Na primeira parte, no primeiro capítulo, apresenta-se exemplo de suplício e utilização do 
tempo. Foucault relata o esquartejamento de Damiens que havia sido condenado por cometer 
parricídio. Com uma riqueza de detalhes, o processo é descrito, assim como a dificuldade do 
carrasco em executar seu ofício. A rotina de uma prisão também é descrita através do 
regulamento redigido por Léon Faucher para a “Casa dos jovens detentos em Paris”. Desses 
relatos, o autor estabelece a seguinte relação: “Eles não sancionam os mesmos crimes, não 
punem o mesmo gênero de delinqüentes. Mas definem bem, cada um deles, um certo estilo 
penal.”. (p. 13). 
 
É no fim do século XVIII e começo do século XIX, que se começa a ocorrer gradativamente a 
supressão do espetáculo punitivo. “Punições menos diretamente físicas, uma certa discrição 
na arte de fazer sofrer, um arranjo de sofrimentos mais sutis, mais velados e despojados de 
ostentação.” (p. 13). O corpo deixa de ser o principal alvo da repressão penal. O cerimonial da 
pena passa a ser um novo ato de procedimento ou de administração. Isso porque o espetáculo 
adquiriu um cunho negativo, pois expunha os espectadores a uma atrocidade que todos 
queriam evitar, mostrava-lhes a freqüência dos crimes, fazia o carrasco se igualar ou até 
mesmo ultrapassar o criminoso e tornava o supliciado um objeto de piedade e admiração. “a 
certeza de ser punido é o que deve desviar o homem do crime e não mais o abominável 
teatro.” (p. 14). 
 
A aplicação da pena, a partir daí, passa a ser um procedimento burocrático, procurando 
corrigir e reeducar. “O castigo passou de uma arte das sensações insuportáveis a uma 
economia dos direitos suspensos.” (p. 16). Penas mais suaves, com mais respeito, mais 
humanidade, menos sofrimento. Houve, assim, o deslocamento do objeto da ação punitiva, 
não sendo mais o corpo, mas a alma. Toma-se como objeto a perda de um bem ou de um 
direito. Porém, é certo que a privação pura e simples da liberdade nunca foi eficaz sem 
complementos punitivos referentes ao corpo. “ainda que não recorram a castigos violentos ou 
sangrentos, mesmo quando utilizam métodos ‘suaves’ de trancar ou corrigir, é sempre do 
corpo que se trata – do corpo e de suas forças, da utilidade e da docilidade delas, de sua 
repartição e de sua submissão.” (p.28). Um conjunto de julgamentos apreciativos, 
diagnósticos, normativos, concernentes à pessoa criminosa se encontrou então acolhido no 
sistema do juízo penal. 
 
No segundo capítulo, Foucault ressalta o valor atribuído às penas físicas. Define-se o que é um 
suplício “Pena corporal, dolorosa, mais ou menos atroz [dizia Jacourt]; e acrescentava: ‘é um 
fenômeno inexplicável a extensão da imaginação dos homens para a barbárie e a crueldade.” 
(p. 35). O suplício é uma arte quantitativa do sofrimento que correlaciona o tipo, a qualidade, a 
intensidade e o tempo dos ferimentos com a gravidade do crime, a pessoa do criminoso e seu 
nível social. Em relação à vítima, o suplício deve ser marcante e pelo lado da justiça, deve ser 
ostentoso. 
 
Como suplício da verdade, o interrogatório encontra seu funcionamento. A confissão é a peça 
complementar de uma informação escrita e secreta. Porém, vale destacar que o interrogatório 
não é uma maneira de arrancar a verdade a qualquer preço. É cruel, mas não selvagem. Trata-
se de uma prática regulamentada que obedece a um procedimento definido. “Sofrimento, 
confronto e verdade estão ligados uns aos outros na prática da tortura” (p. 42). O ritual que 
produz verdade caminha juntamente com aquele que impõe a punição. O corpo, assim, 
continua sendo peça essencial na cerimônia do castigo público. “O ciclo está fechado: da 
tortura à execução, o corpo produziu e reproduziu a verdade do crime.” (p. 47). 
 
O suplício tem também uma função jurídico-política, objetivando reconstituir a soberania 
lesada. Pois, em todo crime há alguma espécie de sublevação contra a lei que torna o 
criminoso um inimigo do príncipe. “A cerimônia do suplício coloca em plena luz a relação de 
força que dá poder à lei.” (p. 50). 
 
“O suplício se inseriu tão fortemente na prática judicial, porque é revelador da verdade e 
agente do poder” (p. 54). Sua prática permite que o crime seja reproduzido e voltado contra o 
corpo do criminoso. 
 
O povo é, sem dúvidas, o personagem principal das cerimônias de suplício. Atraídos pelo 
espetáculo feito para aterrorizá-los, podem até alterar o rumo do momento punitivo: 
impedindo a execução, perseguindo os executores, fazendo tumulto contra a sentença etc. 
 
O autor então expõe diversos relatos publicados em jornais, pasquins, folhetins que narravam 
essas “emoções de cadafalso”. E encerra o capítulo apresentando a literatura em que o crime 
é glorificado, porque revela a monstruosidade dos fortes e dos poderosos. Passa-se da busca 
pela confissão para o lento processo de descoberta, do confronto físico à luta intelectual. “Os 
grandes assassinatos tornaram-se o jogo silencioso dos sábios”. (p. 67). 
 
Na segunda parte, “Punição”, Foucault mostra como, na segunda metade do século XVIII, os 
protestos contra os suplícios eram facilmente encontrados. Era necessário punir de outro 
modo. O suplício tornou-se inaceitável, vergonhoso, passou a ser encarado como revelador da 
tirania, do excesso, da sede de vingança e do “cruel prazer de punir”. Surge então a campanha 
a favor de uma punição generalizada, que nomeia o primeiro capítulo dessa parte. 
 
Na punição generalizada, prega-se que é preciso que a justiça criminal puna em vez de se 
vingar. A “humanidade” deveria ser respeitada ao se punir. “O castigo deve ter a ‘humanidade’ 
como ‘medida’.” (p. 72). O autor passa então a contar a história dessa suavização das penas, 
creditando-a aos grandes reformadores - Beccaria, Servan, Dupaty, Duport, Pastoret, Target, 
Bergasse – por terem imposto esse abrandamento a um aparato judiciário. 
 
Pode-se dizer que o afrouxamento da penalidade no decorrer do século XVIII deve-se à 
considerável diminuição dos crimes de sangue, das agressões físicas. Desde o fim do século 
XVII, nota-se o prevalecimento dos delitos contra a propriedade sobre os crimes violentos. 
Houve assim uma suavização dos crimes antes da suavização das leis. Essa transformação, 
também, não pode ser separada de outros processos que lhe formaram uma base. “Como nota 
P. Chaunu, de uma modificação do jogo das pressões econômicas, de uma elevação geral do 
Janaina
Realce
nível de vida, de um forte crescimento demográfico, de uma multiplicação das riquezas e das 
propriedades e da ‘necessidade de segurança que é uma conseqüência disso’.” (p. 74). 
 
Baseando-se no fato da justiça penal ser irregular, devido às suas múltiplas instâncias 
encarregadas de realizá-la, e lacunosa, devido às diferenças de costumes e de procedimentos, 
aos conflitos internos de competência, aos interesses particulares e à intervenção do poder 
real, o objetivo da reforma não se trata de fundar um novo direito de punir baseado em 
princípios mais equitativos. 
 
Mas estabelecer uma nova ‘economia’ do poder decastigar, assegurar uma melhor 
distribuição dele, fazer com que não fique concentrado demais em alguns pontos privilegiados, 
nem partilhado demais em instâncias que se opõem; que seja repartido em circuitos 
homogêneos que possam ser exercidos em toda a parte, de maneira contínua e até o mais fino 
grão do corpo social. (p. 78). 
 
Não se pretendia punir menos, mas punir melhor. Fazendo com que o poder de punir não 
dependa de privilégios múltiplos e contraditórios da soberania. Punia-se com uma severidade 
atenuada para punir com mais universalidade. Assim, na brecha continuamente alargada pela 
ilegalidade popular, que não possuía convergência, nem oposição fundamental, ocorreram 
várias transformações e com estas a burguesia fundamentou uma parte do crescimento 
econômico. “A tolerância torna-se um estímulo” (p. 81). 
 
Porém, na segunda metade do século XVIII, o processo tende a se inverter. Isso porque o alvo 
da ilegalidade deixa de ser os direitos e passa a ser os bens, a propriedade. Disso inicia-se 
progressivamente uma crise da ilegalidade popular. “A ilegalidade dos direitos, que muitas 
vezes assegurava a sobrevivência dos mais despojados, tende, com o novo estatuto da 
propriedade, a tornar-se uma ilegalidade de bens. Será então necessário puni-la.” (p.82). 
Passou, assim, a ser mais necessário controlar e codificar as práticas ilícitas. 
 
Com o desenvolvimento da sociedade capitalista, ocorreu uma divisão que corresponde a uma 
oposição de classes. A ilegalidade dos direitos foi separada da ilegalidade dos bens. Esta mais 
acessível às classes populares e aquela à burguesia. Devido a essa pressão sobre as ilegalidades 
populares, a reforma do sistema penal pôde ir da condição de projeto à de instituição e 
conjunto prático. Um sistema penal era necessário para gerir diferencialmente as ilegalidades, 
não para todas suprimi-las. 
 
Deslocar o objetivo e mudar sua escala. Definir novas táticas para atingir um alvo que agora é 
mais tênue, mas também mais largamente difuso no corpo social. Encontrar novas técnicas às 
quais ajustas as punições e cujos efeitos adaptar. Colocar novos princípios para regularizar, 
afinar, universalizar a arte de castigar. Homogeneizar seu exercício. Diminuir seu custo 
econômico e político aumentando sua eficácia e multiplicando seus circuitos. Em resumo, 
constituir uma nova economia e uma nova tecnologia do poder de punir: tais são sem dúvida 
as razões de ser essenciais da reforma penal no século XVIII. (p. 86). 
 
O ato de punir deslocou-se da vingança do soberano à defesa da sociedade e o infrator passou 
a ser considerado o inimigo comum. Agora são os efeitos de retorno do castigo sobre a 
instância que pune e o poder que ela pretende exercer que precisam ser modelados e 
calculados. “Punir será então uma arte dos efeitos” (p.89). É preciso punir exatamente o 
suficiente para impedir que o delito se repita. 
 
O autor nos apresenta então as seis regras mais importantes que definem o poder de punir: 
 
Janaina
Realce
a) Regra da quantidade mínima: determina que para o castigo produzir os efeitos esperados, 
basta que o mal que ele cause ultrapasse o bem que o culpado ganhou com o crime. 
 
b) Regra da idealidade suficiente: determina que a essência da punição não é a sensação de 
sofrimento, mas sim a idéia de um desprazer, de um inconveniente. A representação da pena 
deve ser maximizada e não sua realidade corpórea. 
 
c) Regra dos efeitos laterais: determina que a pena deve surtir mais efeitos naqueles que não 
cometeram a falta. 
 
d) Regra da certeza perfeita: determina que a idéia de cada crime esteja precisamente 
associada à idéia de um determinado castigo. Que essas leis sejam publicadas e perfeitamente 
claras. E que nenhum crime escape ao olhar da justiça, pois nada a torna mais frágil do que a 
esperança de impunidade. 
 
e) Regra da verdade comum: determina que a verificação do crime deve obedecer aos critérios 
gerais de qualquer verdade. O senhor da justiça deixa de ser o dono da verdade. 
 
f) Regra da especificação ideal: determina que todas as infrações têm que ser qualificadas, pois 
o mesmo castigo não tem a mesma força para todo mundo. O rico não teme a multa e nem o 
já exposto teme a infâmia. 
 
Vê-se aí a necessidade de uma classificação dos crimes e castigos e a necessidade de uma 
individualização das penas, levando-se em conta as características singulares de cada 
criminoso. A individualização passa a ser o objetivo de um código bem adaptado. 
 
Porém, essa individualização é muito diferente da praticada na jurisprudência antiga. 
Antigamente, usavam-se duas variáveis para ajustar o castigo: a “circunstância” e a “intenção”. 
Já nessa, baseia-se mais ao que “se refere ao próprio infrator, à sua natureza, a seu modo de 
vida e pensar, a seu passado, à ‘qualidade’ e não mais à intenção de sua vontade” (p. 95). 
 
Pode-se também definir duas linhas de objetivação do crime e do criminoso: o criminoso 
tratado como inimigo de todos e a necessidade de medir os efeitos do poder punitivo que 
intervém sobre os criminosos atuais ou eventuais. Entretanto, a primeira objetivação do 
criminoso fora da lei não passa ainda de uma virtualidade, onde se cruzam as críticas políticas 
e as figuras do imaginário. Enquanto a segunda teve efeitos rápidos e decisivos, pois estava 
mais diretamente ligada à reorganização do poder de punir. 
 
Assim, o autor termina o capítulo destacando uma nova anatomia política em que o corpo 
novamente será o personagem principal, mas numa forma inédita. E conseguirá permitir o 
recruzamento dessas duas linhas diferentes de objetivação formadas no século XVIII: “a que 
rejeita o criminoso para ‘o outro lado’ – o lado de uma natureza contra a natureza; e a que 
procura controlar a delinqüência por uma anatomia calculada das punições” (p. 99). 
 
A arte de punir deve concentrar-se na tecnologia da representação. É preciso que se encontre 
um castigo com uma desvantagem que definitivamente sem atração a idéia de um delito. É 
apoiando a criação de sinais-obstáculos para a não realização de um crime que o autor inicia o 
segundo capítulo, “A mitigação das penas”. 
 
Entretanto, para de fato funcionarem esses sinais-obstáculos devem obedecer a várias 
condições. Sendo que entre estas seis são apresentadas pelo autor. 
 
Janaina
Realce
1) Devem ser o mínimo arbitrárias quanto possível. A punição ideal será transparente ao crime 
que pune e o poder responsável por ela se esconderá. “Que o castigo decorra do crime; que a 
lei pareça ser uma necessidade das coisas, e que o poder aja mascarando-se sob a força suave 
da natureza.” (p. 102). 
 
2) Esses sinais devem diminuir o desejo que torna o crime atraente e aumentar o interesse que 
torna o crime temível. E, assim, fazer funcionar contra ela a força que levou ao delito. 
 
3) A pena deve ser responsável por transformar, modificar, estabelecer sinais e organizar 
obstáculos. E o tempo deve ser o seu operador. 
 
4) Pelo lado do condenado, a pena deve ser uma mecânica dos sinais, dos interesses e da 
duração. É preciso que o castigo seja natural e interessante e que não haja mais aquelas penas 
ostensivas e inúteis. “O ideal seria que o condenado fosse considerado como uma espécie de 
propriedade rentável: um escravo posto a serviço de todos” (p. 105). Enquanto no sistema 
antigo o corpo dos condenados se tornava propriedade do rei, agora ele será um bem social. 
Daí têm-se, na visão dos reformadores, as obras públicas como uma das melhores penas 
possíveis. “Obra pública quer dizer duas coisas: interesse coletivo na pena do condenado e 
caráter visível, controlável do castigo. O culpado assim paga duas vezes: pelo trabalho que ele 
fornece e pelos sinais que produz.” (p. 105). 
 
5) Enquanto no suplício corporal o terror, o medo físico, o pavor coletivo eram o suporte do 
exemplo, agora é a lição, o discurso, o sinal decifrável, a encenação e a exposição da 
moralidade pública que devem dar o exemplo. Cada elemento do ritual de punição deve falar, 
dizero crime, lembrar a lei, mostrar a necessidade da punição e justificar sua medida. 
 
6) O crime deve aparecer como uma desgraça e o malfeitor como um inimigo a quem se re-
ensina a vida social, apagando assim a glória duvidosa dos criminosos. E que cada castigo seja 
um apólogo. 
 
Neste ponto do livro, o autor destaca como a idéia de prisão como forma geral de castigo 
nunca foi apresentada nos projetos de penas específicas, visíveis e eloqüentes. Ele pontua que, 
em seu todo, a prisão é incompatível com a técnica da pena-efeito, da pena-representação, da 
pena-função geral, da pena-sinal e discurso. “O cadafalso onde o corpo do supliciado era 
exposto à força ritualmente manifesta do soberano, o teatro punitivo onde a representação do 
castigo teria sido permanentemente dada ao corpo social, são substituídos por uma grande 
arquitetura fechada, complexa e hierarquizada que se integra no próprio corpo do aparelho do 
Estado.” (p. 111). O princípio formulado da Constituinte de penas específicas, ajustadas e 
eficazes, em menos de vinte anos, tornou-se a lei da detenção para toda infração que não 
merecer a morte, modulada apenas em certos casos e agravada por ferretes ou algemas. 
 
Porém, os juristas defendem que, no sistema civil, a prisão não é vista como uma pena. “A 
prisão assegura que temos alguém, não o pune. É este o princípio geral.” (p. 114). De outro 
lado, inúmeros reformadores dizem que a detenção figura um instrumento privilegiado do 
despotismo. Isso porque a prisão era também utilizada de uma forma arbitrária e 
indeterminada marcada pelos abusos de poder. 
 
Muitos também rejeitam a prisão alegando que ela seria incompatível com a boa justiça. Quer 
em nome dos princípios jurídicos clássicos, quer em nome dos efeitos da prisão que pune 
aqueles que ainda não foram condenados, indo contra o princípio da individualização da pena. 
 
Foucault então põe em debate: “Como pôde a detenção, tão visivelmente ligada a esse 
ilegalismo que é denunciado até no poder do príncipe, em tão pouco tempo tornar-se uma das 
formas mais gerais dos castigos legais?” (p. 116). 
 
A formação de grandes modelos de encarceramento punitivo durante a época clássica é a mais 
freqüente explicação. Esses modelos teriam afastado as idéias punitivas imaginadas pelos 
reformadores e imposto a realidade da detenção. O mais antigo desses modelos e que 
provavelmente inspirou os demais foi o Rasphuis de Amsterdam, aberto em 1596. Este modelo 
possuía “um horário estrito, um sistema de proibições e de obrigações, uma vigilância 
contínua, exortações, leituras espirituais, todo um jogo de meios para ‘atrair para o bem’ e 
‘desviar do mal’ enquadrava os detentos no dia-a-dia.” (p. 117). 
 
Já a cadeia de Gand se organizou em torno de imperativos econômicos, dado que foi 
constatado que a ociosidade era a causa geral da maior parte dos crimes. Assim, as casas de 
detenção passaram a realizar uma pedagogia universal do trabalho para os mais refratários. E 
com isso, quatro vantagens: diminuição do número de processos criminais, formação de uma 
quantidade de novos operários, não ser necessário adiar os impostos dos proprietários dos 
bosques arruinados pelos vagabundos e acesso aos benefícios pelos verdadeiros pobres. 
 
O trabalho era obrigado e a retribuição permitia ao detento melhorar seu destino durante e 
depois da detenção. A pena só teria sentido se objetivasse uma correção e uma utilização 
econômica dos criminosos corrigidos. Só depois, o modelo inglês acrescentou o isolamento 
como condição essencial para a correção. “Entre o crime e a volta ao direito e à virtude, a 
prisão constituirá um ‘espaço entre dois mundos’, um lugar para as transformações individuais 
que devolverão ao Estado os indivíduos que este perdera.” (p. 119). O encarceramento entra 
no sistema das leis civis para transformar a alma e o comportamento, constituindo um 
exemplo temível, um instrumento de conversão e de condição para um aprendizado. 
 
A prisão de Walnut Street aberta em 1790 desenvolveu o princípio da não-publicidade da 
pena, que determinava que, ao contrário da condenação e do que motivou o crime, a 
execução da pena deveria ser feita em segredo. O público não deveria intervir. Dever-se-ia ter 
a certeza de que atrás dos muros o detento cumpre sua pena, evitando assim a necessidade 
daqueles espetáculos de rua criados pela lei de 1796 que impunha a certos condenados a 
execução de obras públicas. 
 
Destaca-se, também a função de aparelho do saber exercida pelas prisões, que deixam de 
tomar como referência o crime cometido e se organizam de acordo com a virtualidade de 
perigos contida num indivíduo e que se manifesta no comportamento observado 
cotidianamente. 
 
Já finalizando o capítulo, o autor estabelece uma comparação entre os modelos flamengo, 
inglês, americano e os “reformatórios” e os castigos imaginados pelos reformadores. 
Apresentam-se como pontos de convergência: a preocupação com o retorno temporal da 
punição. Não se pretende apagar o crime, mas sim evitar que ele recomece. Pune-se para 
transformar o culpado. O sistema das penas deve se adequar às variáveis individuais do crime 
e do criminoso. Utilizar processos para singularizar a pena: “em sua duração, sua natureza, sua 
intensidade, a maneira como se desenrola, o castigo deve ser ajustado ao caráter individual, e 
ao que este comporta de perigo para os outros.” (p. 123). 
 
Todavia, ao se tentar definir as técnicas dessa correção individualizante, as disparidades 
aparecem. Eles se diferem no procedimento de acesso ao indivíduo, na maneira como o poder 
punitivo se apossa dele, nos instrumentos que utiliza para realizar a transformação, na relação 
que estabelece no corpo e na alma. 
 
No método dos reformadores, “a coerção individual deve então realizar o processo de 
requalificação do indivíduo como sujeito de direito, pelo reforço do sistema de sinais e das 
representações que fazem circular” (p. 124). Já no aparelho da penalidade corretiva, o ponto 
não é a representação, é o corpo, o tempo, os gestos e as atividades de todos os dias e 
também a alma, quando esta é sede de hábitos. 
 
“Castigos secretos e não codificados pela legislação, um poder de punir que se exerce na 
sombra de acordo com critérios e instrumentos que escapam ao controle.” (p. 125). Os novos 
modelos comprometem toda a estratégia da reforma. De um lado tem-se o funcionamento do 
poder real repartido em todo o meio social. E de outro, um funcionamento compacto do poder 
de punir. No projeto dos juristas reformadores, a punição requalifica os criminosos como 
sujeitos de direito. No projeto da instituição carcerária, a punição é uma técnica de coerção 
destes. 
 
O autor, enfim, expõe que no fim do século XVIII encontram-se três maneiras de organizar o 
poder de punir. A primeira e ainda vigente se apoiava no direito monárquico. E as outras se 
referem a uma concepção preventiva, utilitária, corretiva de um direito de punir que 
pertenceria à sociedade inteira, mas que ainda assim são muito diferentes entre si, ao nível 
dos dispositivos que esboçam. Fecha-se então o capítulo e a segunda parte retomando a 
indagação de como teria sido possível que a terceira maneira, a prisão, tenha se imposto sobre 
as outras duas. “Como o modelo coercitivo, corporal, solitário, secreto, do poder de punir 
substitui o modelo representativo, cênico, significante, público, coletivo?” (p. 127). 
 
Passa-se, assim, para a terceira parte intitulada “Disciplina”. O autor inicia o primeiro capítulo 
fazendo uma analogia com o modo que se vê a figura do soldado e o ponto a ser abordado. No 
início do século XVII, o soldado era reconhecido pelos seus sinais naturais de vigor, coragem, 
orgulho. Seu corpo era o brasão de sua valentia e força. Já na segunda metade do século XVIII, 
o soldado tornou-se algo que se fabrica, um corpo inapto, uma máquina feita com o que se 
precisa. 
 
Não é a primeira vez que o corpo é considerado objeto de investimentos imperiosos e 
urgentes. Porém, dessa vez há algumasnovidades que diferenciam essas novas técnicas das da 
época clássica. A escala do controle – não se trata de cuidar simplesmente do corpo em massa, 
mas de trabalhá-lo detalhadamente com uma coerção sem folga. A modalidade – trata-se de 
uma coerção ininterrupta, constante que se exerce de acordo com uma codificação que 
esquadrinha ao máximo o tempo, o espaço, os movimentos. “Esses métodos que permitem o 
controle minucioso das operações do corpo, que realizam a sujeição constante de suas forças e 
lhes impõem uma relação de docilidade-utilidade, são o que podemos chamar as ‘disciplinas’”. 
(p. 133). 
 
As disciplinas se tornaram ao longo dos séculos XVII e XVIII fórmulas gerais de dominação. 
Diferentes da escravidão, pois não se apropria dos corpos. Diferentes da domesticidade, pois 
esta, diferentemente das disciplinas, não são analíticas e ilimitadas. Diferentes da vassalidade, 
pois não é uma relação submissa e codificada. Diferentes do ascetismo e das “disciplinas” de 
tipo monástico. Forma-se uma política de coerção, uma manipulação calculada do corpo, de 
seus elementos, de seus gestos e de seus comportamentos. “O corpo humano entra numa 
maquinaria de poder que o esquadrinha, o desarticula e o recompõe” (p. 133). A disciplina 
fabrica corpos submissos e exercitados,”corpos dóceis” – termo que nomeia o primeiro 
capítulo. 
 
A disciplina é uma análise política do detalhe. Este que já era uma categoria da teologia e do 
ascetismo. Para o homem disciplinado, como para o verdadeiro crente, todo detalhe é 
importante, pois aí se encontra o poder que se quer apanhar. 
 
Uma observação minuciosa do detalhe, e ao mesmo tempo um enfoque político dessas 
pequenas coisas, para controle e utilização dos homens, sobem através da Era Clássica, 
levando consigo todo um conjunto de técnicas, todo um corpo de processo e de saber, de 
descrições, de receitas e dados. E desses esmiuçamentos, sem dúvida, nasceu o homem do 
humanismo moderno. (p. 136) 
 
O capítulo se subdivide em subcapítulos que descrevem melhor as técnicas da disciplina. 
 
A arte das distribuições: A disciplina surge com a distribuição dos indivíduos no espaço. E para 
isso utiliza algumas técnicas: 
 
1) A disciplina às vezes exige uma cerca para especificar um local heterogêneo. Como acontece 
nos colégios e quartéis. 
 
2) De acordo com o princípio da localização imediata ou do quadriculamento, deve-se evitar a 
distribuição por grupos, decompor as implantações coletivas, analisar as pluralidades confusas 
e esquivas e saber onde encontrar os indivíduos, poder a cada instante vigiar o 
comportamento de cada um. 
 
3) A regra das localizações funcionais codifica os espaços que a arquitetura deixa geralmente 
livre. Esses lugares satisfazem não só a necessidade de vigiar e romper comunicações 
perigosas, mas também a de criar um espaço útil. 
 
4) Na disciplina, cada um se define pelo lugar que ocupa na série. A unidade não é o território, 
nem o local, mas a posição na fila, na classificação. A disciplina é a arte de dispor em filas, 
individualizando os corpos por uma localização que os faz circular numa rede de relações. 
 
“As disciplinas, organizando as ‘celas’, os ‘lugares’ e as ‘fileiras’ criam espaços complexos: ao 
mesmo tempo arquiteturais, funcionais e hierárquicos” (p. 142). 
 
O controle da atividade: 
 
1) O horário: Herança das comunidades monásticas. O aumento do número de assalariados 
acarreta num quadriculamento cerrado do tempo. A exatidão e a aplicação são as virtudes 
fundamentais do tempo disciplinar. 
 
2) A elaboração temporal do ato: O ato é decomposto em seus elementos: a posição do corpo, 
dos membros, das articulações para cada movimento é determinada, assim como sua direção, 
amplitude e duração. “O tempo penetra o corpo, e com ele todos os controles minuciosos do 
poder” (p. 146). 
 
3) Donde o corpo e o gesto postos em correlação: O controle disciplinar impõe a melhor 
relação entre um gesto e uma atitude global do corpo, sua condição de eficácia e rapidez. Um 
corpo bem treinado, então, é a base de um gesto eficiente. 
 
4) A articulação corpo-objeto: A disciplina estabelece cada uma das relações entre o corpo e o 
objeto que ele manipula. 
 
5) A utilização exaustiva: A disciplina coloca o princípio de uma utilização sempre crescente no 
tempo. Preocupa-se em extrair do tempo mais instantes disponíveis e de cada instante, mais 
forças úteis. 
 
Um novo objeto vai se compondo e substituindo o corpo mecânico: o corpo natural, portador 
de forças e sede de ago durável. E, assim, os controles disciplinares vão encontrando lugar em 
todas as pesquisas teóricas ou práticas sobre a máquina natural do corpo. “O poder disciplinar 
tem por correlato uma individualidade não só analítica e ‘celular’, mas também natural e 
‘orgânica’”. (p. 150). 
 
A organização das gêneses: “Como capitalizar o tempo dos indivíduos, acumulá-lo em cada um 
deles, em seus corpos, em suas forças ou capacidades, e de uma maneira que seja susceptível 
de utilização e de controle?” (p.151-152). 
 
As disciplinas devem ser entendidas como aparelhos para adicionar e capitalizar o tempo. Isto 
por quatro processos facilmente identificados na organização militar: 
 
1°) Dividir a duração em segmentos sucessivos ou paralelos dos quais cada um deve possuir 
um termo a ser objetivado. Decompor o tempo em sequências separadas e ajustadas. 
 
2°) Organizar as sequências em um esquema analítico, combinando-os segundo uma 
complexidade crescente. 
 
3°) Finalizar os segmentos temporais e aplicar uma prova que tem a função de indicar se o 
indivíduo atingiu o nível estatuário, de garantir que a sua aprendizagem está em conformidade 
com a dos demais e diferenciar as capacidades de cada um. 
 
4°) Estabelecer séries de séries e prescrever a cada um os exercícios concernentes ao seu nível. 
 
“O poder se articula diretamente sobre o tempo; realiza o controle dele e garante sua 
utilização” (p. 154). Os procedimentos disciplinares integram um momento ao outro, 
revelando um tempo linear que se orienta para um ponto terminal e estável. “O exercício, 
transformado em elemento de uma tecnologia política do corpo e da duração, não culmina 
num mundo além; mas tende para uma sujeição que nunca terminou de se completar” (p. 
156). 
 
A composição das forças: Surge uma nova exigência a que a disciplina tem que atender. A 
disciplina deixa de ser somente uma arte de repartir os corpos, de extrair e acumular o tempo 
deles, mas de compor forças para obter um aparelho eficiente. A disciplina deve, então, 
construir uma máquina cujo efeito será elevado ao máximo pela articulação combinada de 
suas peças elementares. Essa exigência se traduz de várias maneiras: 
 
1) O corpo singular torna-se capaz de articular e mover com outros. A coragem e força não o 
definem mais. Mas sim, o lugar que ele ocupa, o intervalo que cobre, a regularidade, a boa 
ordem segundo as quais opera seus deslocamentos. O corpo tem sua funcionalidade reduzida 
e passa a constituir uma peça de uma máquina multissegmentar. 
 
2) Essa máquina também tem como peça as séries cronológicas que a disciplina combina para 
formar um tempo composto. O tempo de uns deve se ajustar ao tempo dos outros para se 
extrair o máximo de força e combiná-la em um melhor resultado. 
 
3) “Toda a atividade do indivíduo disciplinar deve ser repartida e sustentada por injunções cuja 
eficiência repousa na brevidade e na clareza” (p. 159). 
 
Pode-se dizer que a disciplina produz quatro tipos de individualidade dotadas de quatro 
características: uma celular, devido ao jogo da repartição social, uma orgânica, devido à 
codificação das atividades, uma genética, devido à acumulação do tempo e outra 
combinatória, devido à composição das forças. E para isso, utiliza quatro técnicas: constrói 
quadros, prescreve manobras, impõe exercícios e organiza “táticas”. Sendo a tática uma arte 
de construir que é sem dúvida a forma mais elevada da prática de disciplinar. 
 
Enfim, processos para a coerção individual ecoletiva dos corpos já eram elaborados por 
militares e por técnicos da disciplina, enquanto os juristas procuravam no pacto um modelo 
primitivo para construir ou reconstruir o corpo social. 
 
O sonho de uma sociedade perfeita é facilmente atribuído pelos historiadores aos filósofos e 
juristas do século XVIII; mas há também um sonho militar da sociedade; sua referência 
fundamental era não ao estado de natureza, mas às engrenagens cuidadosamente 
subordinadas de uma máquina, não ao contrato primitivo, mas às coerções permanentes, não 
aos direitos fundamentais, mas aos treinamentos indefinidamente progressivos, não à vontade 
geral, mas à docilidade automática. (p. 162). 
 
Capitulo II O poder disciplinar é um poder que em vez de somente apropriar e retirar, 
“adestra”. Adestra as multidões confusas, móveis e inúteis de corpos e forças para retirar e 
apropriar mais e melhor. No segundo capítulo, o autor discorre sobre “Os recursos para o bom 
adestramento”. “O sucesso do poder disciplinar se deve sem dúvida ao uso de instrumentos 
simples: o olhar hierárquico, a sanção normalizadora e sua combinação num procedimento 
que lhe é específico, o exame.” (p. 164). 
 
A vigilância hierárquica: O exercício da disciplina requer um dispositivo que obrigue pelo jogo 
de olhar, que os meios de coerção sejam visíveis e as técnicas que permitem ver induzam os 
efeitos de poder. Um exemplo quase ideal desses “observatórios” é o acampamento militar 
que age pelo efeito de uma visibilidade geral. 
 
A arquitetura então passa a permitir o controle interior e articulado e não apenas vigiar o 
espaço exterior ou ser admirada. Tem-se uma arquitetura que opera na transformação dos 
indivíduos. 
 
“Nessas máquinas de observar, como subdividir os olhares, como estabelecer entre eles 
escalas, comunicações? Como fazer para que, de sua multiplicidade calculada, resulte um 
poder homogêneo e contínuo?” (p. 167). Foucault se põe então diante dessa pergunta e 
propõe a ideia de um aparelho disciplinar perfeito que capacitaria um único olhar tudo ver 
permanentemente. 
 
“A vigilância torna-se um operador econômico decisivo, na medida em que é ao mesmo tempo 
uma peça interna no aparelho de produção e uma engrenagem específica do poder de 
disciplinar.” (p. 169). Com a vigilância hierarquizada, o poder de disciplinar torna-se um 
sistema integrado, ligado à economia e aos fins do dispositivo onde é exercido. 
 
A sanção normalizadora: 
 
1) Em cada sistema disciplinar funciona um mecanismo penal. As disciplinas estabelecem suas 
leis próprias e suas formas particulares de sanção, preenchendo assim o espaço deixado vago 
pelas leis. 
 
2) A disciplina traz um jeito próprio de punir que é quase um modelo reduzido do tribunal. 
Pune-se tudo aquilo que está inadequado à regra e que se afasta dela. 
 
3) O castigo disciplinar tem a função de reduzir e evitar esses desvios, sendo essencialmente 
corretivo. 
 
4) A punição na disciplina se baseia no sistema gratificação-sanção. O que permite a 
qualificação dos comportamentos entre o bem e o mal. E sancionando os atos com exatidão, a 
disciplina avalia os indivíduos com mais verdade do que a justiça penal. 
 
5) Essa divisão bem-mal tem o papel de marcar os desvios, hierarquizar as qualidades, as 
competências e as aptidões e também castigar e recompensar. 
 
Em suma, a arte de punir não visa exatamente à repressão. Ela normaliza. Pratica cinco 
operações distintas: relaciona desempenhos, diferencia os indivíduos, mede e hierarquiza as 
capacidades, faz funcionar a coação de uma conformidade a realizar e traça o limite que define 
a diferença entre todas as diferenças. Aparece, assim, o poder da Norma. “Compreende-se que 
o poder da norma funcione facilmente dentro de um sistema de igualdade formal, pois dentro 
de uma homogeneidade, que é a regra, ele introduz, como um imperativo útil e resultado de 
uma medida, toda a gradação das diferenças individuais.” (p. 177). 
 
O exame: Combinam-se as técnicas da hierarquia que vigia e da sanção que normaliza. 
Estabelece-se sobre os indivíduos uma visibilidade com que eles são diferenciados e 
sancionados. O exame é um mecanismo que liga a formação do saber com o exercício do 
poder. 
 
1) O exame inverte a economia da visibilidade no exercício do poder: o poder geralmente é o 
que se vê e se manifesta. O poder disciplinar, entretanto, torna-se invisível. E em compensação 
impõe aos que submete uma visibilidade obrigatória. Essa inversão da visibilidade no 
funcionamento das disciplinas é o que realizará o exercício do poder. “Entramos na era do 
exame interminável e da objetivação limitadora” (p. 181). 
 
2) O exame faz também a individualidade entrar num campo documentário: Além de colocar 
os indivíduos sob vigilância constante, os procedimentos do exame são acompanhados 
imediatamente por um sistema de registros e acumulação documentária. E graças a isso, 
abrem-se duas possibilidades: constituição do indivíduo como objeto descritível, analisável e a 
constituição de um sistema comparativo. 
 
3) O exame, cercado de todas as suas técnicas documentárias, faz de cada indivíduo um 
“caso”: um caso constitui ao mesmo tempo um objeto para se conhecer e um poder para ser 
tomado. O caso, diferentemente do que é na casuística ou na jurisprudência, é mais do que 
um conjunto de circunstâncias, é o próprio indivíduo tal como pode ser descrito. “Finamente, o 
exame está no centro dos processos que constituem o indivíduo como efeito e objeto de 
poder, como efeito e objeto de saber” (p. 183). 
 
Pode-se dizer que as disciplinas marcam a troca do eixo político da individualização. À medida 
que o poder se torna mais anônimo, aqueles sobre os quais se exercem se tornam mais 
individualizados. “O indivíduo é sem dúvida o átomo fictício de uma representação ‘ideológica’ 
da sociedade; mas é também uma realidade fabricada por essa tecnologia específica de poder 
que se chama a ‘disciplina’”. (p. 185). 
 
Capítulo III O autor inicia o terceiro capítulo descrevendo minuciosamente a rotina de uma 
cidade invadida pela peste no século XVII onde várias medidas foram tomadas. Um 
policiamento espacial estrito foi feito, inspeções eram constantemente feitas e todos os 
acontecimentos eram registrados. Essa situação constitui um modelo compacto do dispositivo 
disciplinar. A ordem responde à peste. “Contra a peste, que é mistura, a disciplina faz valer seu 
poder que é de análise.” (p.188). 
 
Foucault aborda então o Panóptico de Benthan que dá origem a “O Panoptismo” do título do 
capítulo. Descreve sucintamente o princípio já conhecido da construção em anel com uma 
torre no meio. No panóptico, o princípio da masmorra é invertido, das funções trancar, privar 
da luz e esconder, só resta a primeira. A visibilidade torna-se uma armadilha. 
 
Os detentos são uma fonte de informação e não de comunicação. A multidão, individualidades 
fundidas, dão lugar a uma coleção de individualidades separadas. “Daí o efeito mais 
importante do Panóptico: induzir no detento um estado consciente e permanente de 
visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder” (p. 191). Benthan inicia o 
princípio de que o poder devia ser visível e inverificável. O detento não sabe se está sendo 
vigiado, mas isso não importa, o que importa é que ele saiba que pode estar sendo vigiado. O 
Panóptico dissocia o par ver-ser visto, automatizando e desinvidualizando o poder. “Vê-se 
tudo, sem nunca ser visto.” (p. 191). 
 
Além desses efeitos, o Panóptico pode ser utilizado como máquina de experiências, 
modificando, treinando e retreinando os indivíduos e analisando as transformações obtidas 
nesse processo. Benthan o apresentou como uma utopia do encarceramento perfeito, embora 
muitas vezes o Panóptico aparecesse descrito como uma jaula cruel e sábia. Entretanto é 
indubitável que ele tenha polivalentes aplicações: emendar os prisioneiros, cuidar dos 
doentes, instruir escolares, guardar os loucos, fiscalizar os operários, fazer trabalhar os 
mendigos. Enfim, é um tipode implantação do corpo no espaço. O esquema panóptico 
assegura a economia e assegura a eficácia e funcionamento de qualquer aparelho de poder em 
que for implantado. E é válido frisar que não existe o risco de que a máquina panóptica se 
degenere em tirania, pois seu dispositivo é democraticamente controlado. 
 
A disciplina se apresenta em duas imagens: a disciplina-bloco (instituição fechada e voltada 
para funções negativas) e a disciplina-mecanismo (dispositivo funcional que melhora o 
exercício do poder. Têm-se um esquema de exceção e outro de vigilância generalizada que 
acabam culminando numa extensão dessas instituições disciplinares sobre todo corpo social. 
Essa extensão, entretanto, é somente o aspecto mais visível entre os diversos processos mais 
profundos que também ocorreram. 
 
1) A inversão funcional das disciplinas: antes as disciplinas tinham a função de neutralizar os 
perigos, fixar as populações agitadas e evitar os inconvenientes de reuniões muito numerosas. 
Agora, cabe-lhes o papel de aumentar a utilidade dos indivíduos, modelando os 
comportamentos e fazendo os corpos entrarem numa máquina e as forças numa economia. 
“As disciplinas funcionam cada vez mais como técnicas que fabricam indivíduos úteis.” (p. 
199). 
 
2) A ramificação dos mecanismos disciplinares: os estabelecimentos de disciplina se 
multiplicam, enquanto seus mecanismos tendem a se desinstitucionalizar, sair das fortalezas 
fechadas e circular em estado livre. Processos flexíveis, transferíveis e adaptáveis de controle 
dão lugar às disciplinas maciças e compactas. 
 
3) A estatização dos mecanismos de disciplina: parte do papel das disciplinas na França foi 
desencadeada pelo sistema policial. Os chefes de polícia transpunham a disciplina para uma 
máquina administrativa, unitária e rigorosa. É a polícia também que no século XVIII acrescenta 
funções disciplinares ao modelo: auxiliar a justiça na busca de criminosos e controlar 
politicamente os complôs, movimentos de oposição e revoltas. 
 
“Pode-se então falar, em suma, da formação de uma sociedade disciplinar nesse movimento 
que vai das disciplinas fechadas, espécie de ‘quarentena’ social, até o mecanismo 
indefinidamente generalizável do ‘panoptismo’”. (p. 204). 
 
A formação dessa sociedade disciplinar está ligada a amplos processos históricos, econômicos, 
jurídico-políticos etc. 
 
1) As disciplinas asseguram a ordenação das multiplicidades humanas e tentam definir em 
relação a elas uma tática de poder que responde a três critérios: tornar o exercício do poder 
menos custoso, fazer com que os efeitos desse poder seja levado ao seu máximo e ligar esse 
crescimento econômico do poder com esse maior rendimento. Enfim, fazer crescer a 
docilidade e utilidade de todos os elementos do sistema das disciplinas. Esse triplo objetivo 
apenas responde à grande explosão demográfica do século XVIII e ao crescimento do aparelho 
de produção. “As disciplinas substituem o velho princípio “retirada-violência” que regia a 
economia do poder pelo princípio “suavidade-produção-lucro”’. (p. 207). E com o crescimento 
do capitalismo, surgiu um apelo à modalidade do poder disciplinar que pode ser posto em 
funcionamento em instituições muito diversas. 
 
2) A modalidade panóptica do poder não depende de nenhuma estrutura jurídico-política da 
sociedade, porém ela não é absolutamente independente. A disciplina cria laços privados 
diferentemente da obrigação contratual. Os sistemas jurídicos qualificam os sujeitos de direito, 
segundo normas universais, já as disciplinas caracterizam, classificam, especializam. A prisão se 
faz necessária no ponto em que se troca o poder codificado de punir por um poder disciplinar 
de vigiar. “O que generaliza então o poder de punir não é a consciência universal da lei em 
cada um dos sujeitos de direito, é a extensão regular, é a trama infinitamente cerrada nos 
processos panópticos” (p. 211). 
 
3) Atravessando o limiar tecnológico, as disciplinas puderam dar origem a elementos como a 
medicina clínica, a psiquiatria, a psicologia da criança, a psicopedagogia, a racionalização do 
trabalho. Inscrevendo-se, assim, os métodos disciplinares no processo histórico de 
desenvolvimento de várias outras tecnologias. Constitui-se então um processo disciplinar que 
multiplica os efeitos do poder graças à formação e à acumulação de novos conhecimentos. 
 
O autor reconhece que o panoptismo foi pouco celebrado, reconhecido como uma utopia 
estranha, um sonho de maldade. Ele diz que se fosse preciso achar um equivalente histórico ao 
que aconteceu com o panóptico seria a técnica “inquisitorial”. O inquérito foi a peça 
fundamental para as ciências empíricas da natureza, assim como a análise disciplinar foi para a 
ciência do homem. Porém, o inquérito deu lugar às ciências da natureza e destacou-se do seu 
modelo político-jurídico, enquanto o exame continua preso à tecnologia disciplinar. 
 
Foucault encerra a terceira parte ressaltando a mudança no ponto de aplicação imposto à 
justiça penal. O objeto útil não é mais o corpo do culpado, mas o indivíduo disciplinar. O ponto 
extremo da justiça penal antiga, o retalhamento do corpo do regicida, dá lugar ao ideal de 
penalidade atual, a disciplina infinita. 
 
Acaso devemos nos admirar que a prisão celular, com suas cronologias marcadas, seu trabalho 
obrigatório, suas instâncias de vigilância e notação, com seus mestres de normalidade, que 
retomam e multiplicam as funções do juiz, se tenha tornado o instrumento moderno da 
penalidade? Devemos ainda nos admirar que a prisão se pareça com as fábricas, com as 
escolas, com os quartéis, com os hospitais, e todos se pareçam com as prisões? (p. 214). 
 
Quarta Parte Capítulo I Foucault chega à quarta parte onde começa no primeiro capítulo a 
tratar enfim da formalização da pena de detenção nas “Instituições completas e austeras”. A 
forma-prisão, entretanto preexiste à sua utilização na lei, foi criada muito antes que a lei a 
definisse como pena por excelência. “A prisão, peça essencial no conjunto das punições, marca 
certamente um momento importante na história da justiça penal: seu acesso à ‘humanidade’”. 
(p. 217). A prisão é uma detestável solução para o sistema penal de que não se pode abrir 
mão: conhecem-se todos os seus inconvenientes, mas não se vê o que pôr no lugar. 
 
“Como não seria a prisão a pena por excelência numa sociedade em que a liberdade é um bem 
que pertence a todos da mesma maneira e ao qual cada um está ligado por um sentimento 
‘universal e constante’?”. (p. 218). A prisão é um castigo igualitário. O tempo retirado do 
condenado traduz a ideia que a infração lesou, além da vítima, a sociedade inteira. “A prisão: 
um quartel um pouco estrito, uma escola sem indulgência, uma oficina sombria, mas, levando 
ao fundo, nada de qualitativamente diferente” (p. 219). A prisão aparece então como a forma 
mais imediata e civilizada de todas as penas. Engana-se quem a vê como uma instituição 
sacudida por freqüentes movimentos de reforma. A “reforma” da prisão não adveio de um 
atestado fracasso. Esta foi contemporânea da própria prisão. 
 
A prisão deve ser um aparelho “onidisciplinar” exaustivo: cuidar de todos os aspectos do 
indivíduo, seu treinamento físico, sua aptidão para o trabalho, seu comportamento cotidiano, 
sua atitude moral, suas disposições. Diferindo-se da pura privação jurídica da liberdade e das 
mecânicas representações com que sonhavam os reformadores. 
 
1) Isolamento. Em relação ao mundo exterior, ao que motivou a infração, às cumplicidades que 
a facilitaram. Têm-se dois sistemas de encarceramento que propõem duas idéias quanto ao 
isolamento. O primeiro é o modelo de Auburn que prescreve uma cela individual durante a 
noite e o trabalho e refeições em comum, sob a regra do silêncio absoluto. O segundo é o da 
Filadélfia que opta por um isolamento absoluto, prezando a relação do indivíduo com sua 
própria consciência e com a muda arquitetura. E dessa oposição nascem conflitos religiosos, 
médicos, econômicos,arquiteturais e administrativos em volta da prática individualizante 
coercitiva das prisões. 
 
2) Trabalho. Agente de transformação carcerária, gerando efeitos na mecânica humana: 
transforma um prisioneiro violento, agitado em uma peça que desempenha seu papel com 
perfeita regularidade. “A utilidade do trabalho penal? Não é um lucro; nem mesmo a formação 
de uma habilidade útil; mas a constituição de uma relação de poder, de uma forma econômica 
vazia, de um esquema da submissão individual e de seu ajustamento a um aparelho de 
produção.” (p. 230). 
 
3) Modulação da pena. A justa duração da pena deve decorrer não só do ato e das 
circunstâncias, mas também de como a própria pena se desenrola. É o julgamento, a sua 
constatação, diagnóstico, caracterização, precisão, classificação diferencial que passa a 
modular a pena, sua atenuação ou mesmo sua interrupção. 
 
Conclui-se que a prisão sempre foi útil com sua privação de liberdade, realizando 
transformações nos indivíduos. Para isso, usou três esquemas: político-moral, isolamento 
individual e hierarquia, econômico, força aplicada a um trabalho obrigatório e o técnico-
médico, cura e normalização. Chama-se de penitenciário, pois, o conjunto de todos esses 
suplementos disciplinares. 
 
O Panóptico de Bentham pôde tomar forma material na prisão. Vigilância, observação, 
segurança, saber, individualização, totalização, isolamento, transparência. A prisão também 
deve ser um local que sirva de observação dos indivíduos punidos e assim formar um saber 
clínico sobre eles. Trata-se de um sistema de documentação individualizante e permanente 
que serve de princípio regulador da prática penitenciária. 
 
Outro papel importante que o aparelho penitenciário desempenha é a substituição do infrator 
pelo delinqüente. Eles se distinguem pelo fato do delinqüente ser caracterizado mais pela sua 
vida, não sendo somente autor do ato: está ligado ao seu delito por instintos, tendências, 
impulsos. Surge a necessidade de caracterizar o ato como delito e o indivíduo enquanto 
delinqüente. E daí a possibilidade de uma criminologia. “Onde desapareceu o corpo marcado, 
recortado, queimado, aniquilado do spuliciado, apareceu o corpo do prisioneiro, 
acompanhado pela individualidade do ‘delinquente’”. (p. 241). 
 
O delinquente consegue unir as duas linhas divergentes da justiça penal promovida pelos 
reformadores no século XVIII: monstros morais e políticos e sujeitos jurídicos requalificados 
pela punição. Ao se fabricar a delinqüência, a prisão deu à justiça criminal um campo de 
objetos, autentificado por “ciências”, que lhe permitiu trabalhar num horizonte geral de 
“verdade”. 
 
Inicia-se o capítulo II: 
 
A passagem dos suplícios, com seus rituais de ostentação, com sua arte misturada à cerimônia 
do sofrimento, a penas de prisões enterradas em arquiteturas maciças e guardadas pelo 
segredo das repartições, não é passagem a uma penalidade indiferenciada, abstrata e confusa; 
é a passagem de uma arte de punir a outra, não menos científica que ela. (p. 243). 
 
A importância que a cadeia adquiriu como espetáculo talvez se deva ao fato dela juntar dois 
modos de castigo: a ida para a detenção também se desenrolava como um cerimonial de 
suplício. 
 
Porém, com seus efeitos visíveis, a prisão foi denunciada como o grande fracasso da justiça 
penal. As prisões não diminuiam a taxa de criminalidade, a taxa de criminosos permanece 
estável ou, ainda pior, aumenta. A detenção provoca a reincidência e fabrica delinqüentes. 
Favorece também a formação de grupos de delinqüentes solidários entre si prontos para 
cumplicidades futuras. As críticas eram constantemente feitas em duas direções: contra o fato 
da prisão não ser efetivamente corretora e contra o fato de que, ao querer ser corretiva, ela 
perde sua força de punição. E é assim que há um século e meio a prisão vem sendo dada como 
a única maneira de reparar seu próprio fracasso. Constituindo as sete máximas universais da 
“boa penitenciária”: 
 
1) Princípio da correção: A detenção penal tem como objetivo principal a recuperação e 
reclassificação social do condenado. 
 
2) Princípio da classificação: Os detentos devem ser isolados e repartidos de acordo com a 
gravidade da sua pena, sua idade, técnicas de correção aplicadas etc. 
 
3) Princípio da modulação das penas: As penas podem ser modificadas segundo a 
individualidade dos detentos, os resultados obtidos, os progressos ou recaídas. 
 
4) Princípio do trabalho como obrigação e como direito: O trabalho é uma das peças essenciais 
na transformação progressiva dos detentos. 
 
5) Princípio da educação penitenciária: A educação do detento é uma precaução no interesse 
da sociedade e obrigação para com o detento. 
 
6) Princípio do controle técnico da detenção: O regime da prisão deve ser controlado por 
pessoas moralmente especializadas em zelar pela boa formação dos detentos. 
 
7) Princípio das instituições anexas: O encarceramento deve ser acompanhado de medidas de 
controle e assistência até a total readaptação do antigo detento. 
 
“O sistema carcerário junta numa mesma figura discursos e arquitetos, regulamentos 
coercitivos e proposições científicas, efeitos sociais reais e utopias invencíveis, programas para 
corrigir a delinquencia e mecanismos que solidificam a delinqüência” (p. 257). 
 
A penalidade é um meio de gerir as ilegalidades, riscar limites de tolerância, dar espaço a 
alguns e pressionar outros. É ingenuidade pensar que a lei é feita para todo mundo em nome 
de todo mundo. A penalidade exclui uns e torna útil outros. A lei é feita para alguns e se aplica 
a outros, dirigindo-se principalmente às classes mais numerosas e menos esclarecidas. 
 
O autor então afirma que se deve substituir o atestado de fracasso da prisão pela hipótese de 
que ela produziu a delinquência, “tipo especificado, forma política ou economicamente menos 
perigosa – talvez até utilizável – da ilegalidade” (p. 262). O sucesso da prisão é tamanho que 
ela continua a existir produzindo os mesmos efeitos. 
 
No fundo, a existência do crime manifesta felizmente uma incompreensibilidade da natureza 
humana; deve-se ver nele, mais que uma fraqueza ou uma doença, uma energia que se ergue, 
um ‘brilhante protesto da individualidade humana’ que sem dúvida lhe dá aos olhos de todos 
seu estranho poder de fascínio. (p. 274). 
 
Capítulo III: Viu-se que, na justiça penal, o processo punitivo era transformado em técnica 
penitenciária pela prisão. O instituto carcerário vai além e transporta essa técnica para o corpo 
social inteiro. Com vários efeitos: 
 
1) O encarceramento funciona de acordo com um princípio de relativa continuidade. 
Continuidade das próprias instituições, dos critérios e mecanismos punitivos. 
 
2) O carcerário permite o recrutamento dos delinqüentes. Numa sociedade panóptica em que 
o delinqüente não está fora da lei, mas sim na própria essência da lei, no meio dos 
mecanismos que fazem passar da disciplina à lei, do desvio à infração. 
 
3) O sistema carcerário consegue tornar natural e legítimo a punição. Acha-se no contrato a 
teoria que fundamenta a aceitação do poder de punir, pois ele cria um sujeito jurídico que dá 
aos outros o poder de exercer sobre ele o poder que ele próprio detém sobre eles. 
 
4) Tem-se uma nova forma de lei, a norma: misto de legalidade e natureza, de prescrição e 
constituição. Uma nova série de efeitos: deslocamento interno do poder judiciário, dificuldade 
em julgar, vergonha em condenar. “A rede carcerária, em suas formas concentradas ou 
disseminadas, com seus sistemas de inserção, distribuição, vigilância, observação, foi o grande 
apoio, na sociedade moderna, do poder normalizador.” (p. 288). 
 
5) O carcerário realiza as captações reais do corpo e a perpétua observação. Assim, sua rede e 
armaduras de um poder-saber tornaram historicamente possíveis as ciências humanas. 
 
6) A prisão apresenta um extrema solidez. Portanto, se há algum desafio em torno dela, não é 
saber se ela será não corretiva. “O problemaatualmente está mais no grande avanço desses 
dispositivos de normalização e em toda a extensão dos efeitos de poder que eles trazem, 
através da colocação de novas objetividades” (p. 290). 
 
O autor encerra o livro com a afirmação de que na genealogia do sistema prisional 
contemporâneo, baseado no binômio “vigiar e punir”, há um ronco surdo de uma batalha a ser 
ouvido. 
 
Nessa humanidade central e centralizada, efeito e instrumento de complexas relações de 
poder, corpos e forças submetidos por múltiplos dispositivos de ‘encarceramento’, objetos 
para discursos que são eles mesmos elementos dessa estratégia, temos que ouvir o ronco 
surdo da batalha (p. 291). 
 
E assim, Foucault interrompe o livro, que, segundo ele mesmo, serve como pano de fundo 
histórico para diversos estudos sobre o poder de normalização e sobre a formação do saber na 
sociedade moderna.

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