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A propósito da qualidade do ensino superior no Brasil anais de dois encontros

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Prévia do material em texto

Presidente da República 
João Figueiredo 
Ministro da Educação e Cultura 
Rubem Carlos Ludwig 
Presidente do Conselho Federal 
de Educação 
Lafayette de Azevedo Pondé 
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA 
CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO 
A PROPOSITO DA QUALIDADE 
DO ENSINO SUPERIOR 
NO BRASIL 
ANAIS DE DOIS ENCONTROS 
Brasília, DF -1982 
C755p CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO 
A propósito da qualidade do ensino superior no 
Brasil: anais de dois encontros. Brasília, 1982. 
241 p. 
Ensino Superior no Brasil. 
Anais. I Título 
CDU 378(81) 
SUMARIO 
Apresentação 
1ª Parte: Coloquio sobre o Ensino Superior no Brasil........................ 1 
• Pronunciamento do Presidente do CFE na abertura do Coloquio 3 
• Comunicação do Prof. Miguel Reale.............................................. 6 
Debates........................................................................................... 15 
• Comunicação do Prof. Erwin Rosenthal......................................... 22 
Debates .......................................................................................... 32 
• Comunicação do Prof. Luiz Renato Caldas ................................... 42 
Debates .......................................................................................... 44 
• Comunicação do Prof. Arnaldo Niskier .......................................... 46 
Debates .......................................................................................... 53 
• Comunicação do Prof. José Goldenberg ....................................... 60 
Debates .......................................................................................... 64 
• Comunicação do Prof. Oscar Sala ................................................. 76 
Debates .......................................................................................... 78 
• Comunicação do Prof. Newton Sucupira ....................................... 86 
Debates .......................................................................................... 95 
• Comunicação do Prof. Cláudio de Moura Castro........................... 98 
Debates .......................................................................................... 101 
Notas Biográficas dos Conferencistas.......................................... 108 
2a Parte: Seminário sobre Indicadores da Qualidade do Ensino 
Superior ................................................................................... 113 
• Pronunciamento do Presidente do CFE......................................... 115 
• Palavras do Coordenador do Seminário ........................................ 116 
• Palestra do Prof. Luiz Fernando Macedo Costa — Qualidade 
do Ensino e Corpo Docente........................................................... 118 
• Palestra do Prof. Edênio Vale — Qualidade do Ensino e Corpo 
Discente.......................................................................................... 126 
• Revisão Bibliográfica sobre Indicadores da Qualidade do Ensino 
Superior — Contribuição do INEP.................................................. 141 
• Bibliografia sobre o Ensino Superior no Brasil de 1972 a 
1981 -Contribuição do INEP.......................................................... 153 
• Comunicações 
1. Comunicação da UFMG — Indicadores da Qualidade do Ensino: 
Uma proposta........................................................................... 160 
2. Comunicação da FI DENE — Parâmetros da Qualidade do Ensino
................................................................................................. 166 
3. Comunicação da CAPES/UCLA - Projeto de avaliação 
da graduação nas Universidades Brasileiras .......................... 169 
4. Comunicação da CAPES/UCLA - Melhorar a Qualidade 
do Ensino: Base Conceituai e situação atual .......................... 175 
5. Comunicação da SOGE — Indicadores da Qualidade do Ensino 
181 
6. Comunicação da UFPa — Qualidade do Ensino: Aspectos 
institucionais............................................................................. 183 
7. Comunicação da UFSM - A Qualidade do Ensino na Universidade 
Federal de Santa Maria............................................................ 189 
8. Comunicação da UPF — Qualidade do Ensino e Corpo Docente na 
Universidade de Passo Fundo................................................. 195 
9. Comunicação da UCMG - O Perfil do Vestibulando da Universidade 
Católica de Minas Gerais: Resultados Preliminares................ 200 
10. Comunicação da UFAL — Reflexões sobre o Curso de 
Pedagogia a Partir da Realidade da Universidade Federal de 
Alagoas .................................................................................... 211 
• Memória do Seminário — Quadro Representativo das Colocações feitas 
a propósito da Qualidade do Ensino Superior................................ 215 
• Sessão de Encerramento 
— Pronunciamento do Cons. Hélcio Ulhôa Saraiva — Diretor 
do INEP.................................................................................... 218 
— Pronunciamento do Cons. Dom Serafim Fernandes de 
Araújo — Coordenador do Seminário...................................... 223 
— Palavras finais de agradecimento do Presidente do CFE. .. 224 
Relação dos Participantes do Seminário ........................................... 225 
APRESENTAÇÃO 
Reúne este volume o resultado de dois en-
contros promovidos pelo Conselho Federal de Edu-
cação, ambos tematizados em torno da questão da 
qualidade do ensino superior. 
A idéia da publicação traduz o propósito de dar 
continuidade à reflexão, apenas iniciada, sobre 
assunto de tamanha gravidade para a educação na-
cional, neste momento de sua história. O Conselho 
agradece a colaboração do INEP, para esta publi-
cação. 
Pelo valor das contribuições apresentadas, 
acredita o Conselho estar prestando relevante serviço 
a todos aqueles que têm o dever de pensar a 
educação brasileira em função de sua melhoria. 
Brasília, janeiro de 1982. 
Lafayette de Azevedo Ponde 
Presidente do Conselho Federal de Educação 
SIGLAS 
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento do 
Pessoal de Nivel Superior FIDENE - Fundação de 
Integração. Desenvolvimento e Educação do 
Noroeste do Estado (RS) INEP - Instituto Nacional de 
Estudos Pedagógicos SOGE - Sociedade Guarulhense 
de Educação UCLA — University of California at Los 
Angeles UCMG - Universidade Católica de Minas Gerais 
UFAL - Universidade Federal de Alagoas UFMG - 
Universidade Federal de Minas Gerais UFPa — 
Universidade Federal do Pará UFSM - Universidade 
Federal de Santa Maria UPF - Universidade de Passo 
Fundo 
1ª PARTE 
COLOQUIO SOBRE 
O ENSINO SUPERIOR NO BRASIL 
NOTA: Realizado em Brasília nos dias 19 e 20 de fevereiro de 1981, o 
"Coloquio sobre o Ensino Superior no Brasil" foi convocado e coor-
denado pelo Conselho Federal de Educação. Além dos Conselheiros, 
participaram do evento os seguintes professores, especialmente con-
vidados: Miguel Reale, Erwin Rosenthal, Arnaldo Niskier, José 
Goldenberg, Oscar Sala, Newton Sucupira, Cláudio de Moura Castro 
e Luiz Renato Caldas. 
SUMARIO( *) 
• Comunicação do Prof. Miguel Reale 
Debates: Moacyr Expedito Vaz Guimarães, Eurípedes Malavolta, Newton Sucupira 
• Comunicação do Prof. Erwin Rosenthal 
Debates: Newton Sucupira, Julio Morejón. Esther Ferraz, Eurides Brito. Afrânio 
Coutinho, João Paulo Mendes, Fernando Gay da Fonseca. Macedo Costa. 
Miguel Reale 
• Comunicação do Prof. Luiz Renato Caldas 
Debates: Navarro de Britto. João Paulo Mendes. Eurípedes Malavolta 
• Comunicação do Prof. Arnaldo Niskier 
Debates: Miguel Reale. ErwinRosenthal. Navarro de Britto. Macedo Costa, Anna 
Bernardes da Silveira 
• Comunicação do Prof. José Goldenberg 
Debates: José Hamilton Gondim, Eurípedes Malavolta, Newton Sucupira, Tarcísio Delia 
Senta, Armando Mendes, Miguel Reale, Heitor Gurgulino de Souza. Arnaldo 
Niskier. Cláudio de Moura Castro 
• Comunicação do Prof. Oscar Sala 
Debates: Eurides Brito. Esther Ferraz. Heitor Gurgulino de Souza, Macedo Costa, Julio 
Morejón 
• Comunicação do Prof. Newton Sucupira 
Debates: Julio Morejón, Navarro de Butto. Arnaldo Niskier 
• Comunicação do Prof. Cláudio de Moura Castro 
Debates: Julio Morejón. Newton Sucupira. Miguel Reale, José Goldenberg 
(*) O texto apresentado na ordem do Sumário foi organizado pelos Profs. Euclides Mighari e 
Pedro Luiz Caetano, a partir de transcrição da fita magnética, revisado pelos autores. 
PRONUNCIAMENTO DO PRESIDENTE DO CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO NA ABERTURA DO COLOQUIO 
Recebe hoje o CFE a preciosa colaboração de eminentes Profes-
sores, nomes de excepcional realce da cultura nacional, consagrados por 
sua erudição e pela prolongada vivência dos problemas do ensino univer-
sitário, que se dispuseram a trazer-nos as luzes do seu pensamento para 
análise e enunciação de conceitos básicos do sistema educativo de nosso 
país: 
— Professor Miguel Reale, Erwin Rosental, Oscar Sala, José Gol- 
denberg, Luiz Renato Caldas, Newton Sucupira, Arnaldo Niskier, 
Moacyr Expedito Vaz Guimarães e membros dos Conselhos do Rio e 
São Paulo. Entre eles estaria o Professor Lourival Vilanova, nao fosse, 
para pesar de todos nós, o impedimento por motivo de saúde. Também 
foram convidados os eminentes Presidentes da CAPES e do CNPq - 
Professores Cláudio Moura Castro e Linaldo Cavalcanti, acompanhados 
daqueles outros que formam o celeiro de cada qual desses dois centros 
de apoio à docência e à pesquisa universitária, colaboradores permanen 
tes do CFE. 
O objetivo deste coloquio desdobra-se em dois ¡tens: 
a) qual deve ser a substância de cultura, ou o conteúdo, dos cursos 
de nível superior, no Brasil? — que é o que nos devem ensinar as 
instituições universitárias? Estarão compreendidos nesse ensino quaisquer 
outros estudos posteriores ao 29 grau? — ou poderia haver entre este e 
aquele tôda uma faixa de opções, por onde se acomodem os jovens que se 
proponham a ultrapassar o ensino secundário, sem as exigências que o 
ensino universitário lhes possa impor? 
Definido o que deva ser o curso superior, seguem-se duas indaga-
ções correlatas: 
— que é o que deve ser a pesquisa universitária, a que o ensino se 
associe? 
— como se deve projetar em nível de pós-graduação esse ensino? 
— qual o sentido cultural do ensino e da pesquisa, em nível de 
graduação universitária e no de pós-graduação? 
— que devem produzir, transmitir e aplicar as nossas instituições de 
ensino? — meras formas profissionais? estudos inovadores? conheci-
mentos de elevado grau científico e tecnológico? 
Depois da Idade Média, passada a Renascença, sempre se disse 
que as instituições universitárias são instituições caducas, como se se pu-
desse banhar mais de uma vez em um mesmo rio, ou se as águas não cor-
ressem em função de suas nascentes e de seu leito, ou se a comunidade 
que elas fertilizam fosse uma peça imobilizada no tempo e no espaço. 
 
O dobre a finados ressoa em todos os ares, cada vez mais dolorido, 
na medida em que a civilização avança. 
Ainda agora se repete em todas as terras: — as instituições univer-
sitárias sao organizações obsoletas, seu ensino reduzido ao só objetivo de 
fornecimento de um diploma, nem sempre expressivo de boa formação, útil 
ao aluno ou adequada aos interesses do desenvolvimento social. 
Há 50 anos, no discurso comemorativo do IV centenário da 
Universidade de Granada, dizia alarmado Ortega Y Gasset que a Univer-
sidade estava em crise: — na Espanha, uma crise da inteligência. Em crise 
também na Inglaterra e na Alemanha (na Alemanha, "uma instituição 
deplorável"). 
Entre nós, antes mesmo de ela nascer já era tida como "uma ins-
tituição caduca" (Miguel Lemos) 
E até há quem diga que, na realidade, ainda depois de implantada, 
não existe. 
Aos eminentes participantes, que hoje aqui se reúnem, pedimos que 
nos digam — que devem ser as nossas universidades, os nossos esta-
belecimentos de ensino superior? — que devem ser, para o Brasil, e nao o 
que são ou foram nos países onde primeiro nasceram. 
Devemos condicionar os conceitos às peculiaridades de nosso país, 
sem o transplante imaginário de instituições a ele alheias, para que não 
façamos como o bei de Tunis, perdido entre os luzidios instrumentos da 
charanga que ele ouvira em Paris... 
— Será necessário remodelar nossas instituições escolares, refazer 
seus currículos, para que melhor respondam às necessidades de conheci-
mento e pesquisa de hoje e de amanhã, quando cremos, em um futuro 
previsível? 
b) O outro ¡tem de nosso estudo diz com a discriminação entre a 
universidade e o estabelecimento isolado de ensino superior (Lei n9 5.540, 
art. 29). 
São figuras díspares? 
A diferenciação não é um problema puramente vocabular, de 
natureza meramente terminologica, mas o pressuposto de prerrogativas de 
ordem institucional. 
Sei que o ensino se realiza na sala de aula na relação direta e ime-
diata entre aluno e professor mas o beneficiado maior é a comunidade. Na 
relação de ensino, o beneficiário é menos o que da relação participa do que 
a comunidade. O Conselho Federal de Educação não ensina, o Ministério 
não ensina, os órgãos da administração escolar, sejam federais ou 
estaduais não ensinam. 0 ensino é dado nas universidades, na sala de 
aula. Daí o interesse do Conselho e, - para servir a comunidade pelo 
reflexo direto do ensino sobre ela, convocar homens eruditos, de pensa 
mento profundo de vivência da sala de aula da universidade. 
 
Dou por instalado este Coloquio, darei a cada um dos senhores 
convidados a palavra, abrindo depois aos expositores, aos demais mem-
bros do Conselho e convidados oportunidades para comentários e debates, 
sem votação de teses. Ninguém pretende ser dono de uma verdade tão 
complexa e tão dificil. Nós queremos apenas receber os feixes luminosos 
com que possamos divisar de perto, ou de longe o quanto pudermos, o 
caminho que todos devemos seguir. 
 
COMUNICAÇÃO DO PROF. MIGUEL REALE 
Senhor Presidente, Prof. Lafayette Pondé, ¡lustres membros do Con-
selho Federal de Educação, prezadíssimos companheiros deste sim-
pósio, desejo inicialmente agradecer a gentileza do convite que me 
foi feito para participar deste encontro e parece o mais oportuno e 
do qual se pode esperar conclusões das mais profícuas para a política 
educacional brasileira. Da reunião preliminar de que participei, ficou 
mais ou menos estabelecido que me caberia elaborar um trabalho de 
caráter mais introdutório sobre a natureza do ensino superior e da 
universidade, preferindo eu subordinar a minha comunicação a este 
enunciado geral: Pressupostos de uma Entidade Universitária. 
1. como já tive a oportunidade de submeter à consideração de meus 
ilustres colegas alguns estudos nos quais focalizo problemas gerais e par-
ticulares do ensino superior no país,1 parece me de bom alvitre dar um 
cunho mais pragmático ou operacional à presente comunicação, visando a 
possibilitar algumas conclusões de natureza concreta para a política 
educacional, sobre o tema que me foi atribuído, concernente à "nature za 
da instituição universitaria". 
Abstração do fato inconteste de que a ùltima reforma universitá ria, 
em processo de execução há cerca de 12 anos, foi inspirada, em grande 
parte, pelo modelo norte-americano, já em crise em sua pátria de origem, o 
que devemos sobretudo salientar é como tal adaptação foi possível na 
vastidão do território brasileiro, com suas gritantes diversi dadesculturais, 
geoeconômicas e demográficas. 
Na maneira de "ser influenciado" há valores que denunciam modos 
de ser próprios, tendências e inclinações, por assim dizer, conaturais ao 
meio ou inerentes às nossas peculiares circunstâncias. 
Posta a questão nesses termos, quer parecer me que algumas dire 
trizes já podem ser consideradas objeto do consenso geral, e, por mais que 
se julgue cediço, não será demais relembrar, entre as características 
essenciais a uma Universidade, as seguintes: 
a) que uma entidade de ensino superior só é digna de categorização 
universitária quando capaz de realizar, de maneira comple 
mentar, as tarefas de ensino, de pesquisa e de prestação de ser-
viços à comunidade, o que, para facilidade de exposição, passo a 
denominar "tríplice função"; 
b) que essa "tríplice função" se baseie em determinados pressu-
postos, a saber: 
b.1) exigência de um mínimo de suporte material (salas de aula, 
laboratórios, bibliotecas de obras gerais e especializadas) 
para possibilitar o atendimento de múltiplos seto 
 
res de investigação filosófica, científica, tecnológica, so-
ciológica ou artístico-literária; 
b.2) existência de um mínimo de massa crítica, isto é, de corpo 
docente em condições - quer pelo número de mestres, quer 
por seus títulos universitários, — de realizar a tríplice função 
de maneira constante e eficiente; 
b.3) disponibilidade de recursos financeiros que assegurem a 
"tríplice função" sem solução de continuidade, realizando, 
concomitantemente, o aperfeiçoamento técnico-científico 
dos professores, a formação ético-cultural dos estudantes e 
o atendimento dos objetivos da comunidade em que a 
Universidade se situa; 
b.4) um programa mínimo, de caráter progressivo, no sentido de 
haver condições, inclusive de ordem financeira, para efetiva 
dedicação exclusiva à "tríplice função", seja por parte do 
corpo docente, seja por parte do corpo discente; 
c) que as atividades, discriminadas nas letras "a" e "b" supra, de-
pendem de outras condições nao menos relevantes, a saber: 
c1) condições de integração, tanto a nível docente quanto a nível 
discente, de tal maneira que haja certa área do empenho 
comum e participação para a realização de programas que 
transcendam o âmbito das disciplinas do curso profissional; 
C.2) correlação entre a "tríplice função" e as aspirações da co-
munidade, quer no que se refere ao mercado de trabalho, 
quer no concernente às necessidades sócio-econômicas da 
área de atuação da instituição universitária, de tal modo que 
haja abertura de espaço às atividades culturais e ao 
aperfeiçoamento de seus instrumentos criadores de bens de 
vida; 
d)e, finalmente, que a entidade, por sua estrutura e meios de agir, 
esteja em condições de preservar a sua essencial missão crítica, 
no sentido de salvaguardar, projetar e aperfeiçoar os valores 
humanísticos, que legitimam sua existência, como expressão 
vanguardeira da Sociedade Civil, de tal modo que: 
d.1) a dependência econômico-financeira perante o Estado não 
implique a subordinação da atividade universitária a 
objetivos político-administrativos, a não ser quando estes, 
segundo valoração autônoma da entidade, consultem aos 
seus fins específicos e aos da cultura em geral; 
d.2) se empenhe, através da captação do apoio da Sociedade 
Civil, a diminuir sua dependência perante a Administração 
Pública; 
 
d.3) e, em qualquer hipótese, ainda quando empenhada em 
objetivos de formação profissional, ou em pesquisas de 
natureza prática, jamais se converta em uma estrutura em-
presarial, visando a obtenção de resultados financeiros 
equiparáveis a lucro. 
2. É claro que poderia continuar nessa tentativa de detectar algumas 
notas distintivas, que forneçam a colocação mais palpável ou concreta 
dos problemas, mas já perceberam os meus ilustres colegas que procuro 
partir de certas colocações prático-doutrinárias que, de certo modo, tor 
nam sem sentido conhecidas antinomias, a começar pela contraposição 
abstrata entre valores teóricos e empenhos práticos, que conduz à ingê 
nua contraposição entre "Universidade humanística"^ "Universidade 
empresarial". 
De outro lado, sobre cada um dos itens por mim assinalados seria 
possível discorrer longamente, suscitando subitens e seus corolários, mas 
prefiro me limitar a esclarecer alguns pontos que julgo capitais. 
II 
3. Note-se, de antemão, que a apreciação conjunta das notas carac 
terísticas que procurei resumir, nao correspondem a um "modelo cerra 
do" de uma possível Universidade brotada da experiência brasileira, mas 
antes a um "modelo aberto", concebido, à maneira de Claude Bernard, 
como "hipótese de trabalho". como tôda hipótese formulada com um 
mínimo de base científica, além de refletir a experiência pessoal do 
observador no campo em que lhe coube atuar, ela pressupõe outros 
problemas que ultrapassam os lindes de seu objetivo específico, tais 
como, por exemplo, seriam os sempre candentes problemas do precário 
preparo do estudante que bate às portas da Universidade, e dos procès 
sos de seleção que decorrem da já hoje irrenunciável adoção dos saluta 
res princípios do "numerus clausus" e da "freqüência obrigatória". 
Isto posto, pondero que deve ser recusada dignidade universitária 
(de cuja autonomia resulta o sempre arriscado poder de instaurar cursos e 
disciplinas, que, ao depois, geram perversos fatos consumados...) quando 
uma entidade nao cobre, nem se propõe efetivamente a cobrir, segundo um 
programa fixado em função do "perfil cultural" de sua área de operação, os 
três campos básicos em que se discriminam as tarefas universitárias, ou 
seja, a área das ciências físico-matemáticas (correspon dente, de maneira 
geral, às politécnicas) e as das ciências biológicas e das ciências humanas. 
Um balanceamento entre os cursos já mantidos por uma instituição permite 
a um pedagogo experimentado discernir entre uma Universidade in fieri e 
mero conglomerado de estabelecimen tos, cuja configuração empresária se 
evidencia quando: 
 
1 ) a preferência é dada a cursos de mais econòmica manutenção, 
com uma proporção professor/aluno superior aos índices mínimos 
que possibilitam o exercício da "tríplice função"; 
2) inexiste proporção entre as áreas de "investimento educacional", 
acentuando o desequilíbrio já existente no mercado de trabalho; 
3) não há condições objetivas para que as áreas de ensino, por sua 
localização, estrutura ou titulação docente, permitam qualquer 
forma de integração, e muito menos o exercício de uma missão 
crítica no seio da comunidade; 
4) a existência, na região, de institutos universitários que, por meios 
próprios, ou graças á oportuna subvenção financeira do 
Estado, já reúnam condições para adequado atendimento dos 
candidatos ao ensino superior. 
Permitir o surgimento de novas universidades, onde já impera a 
crise em cursos desnecessários ou não prioritários, é favorecer a concor-
rência desleal, transplantando-a para o plano educacional, no qual devem 
primar os valores éticos e não os econômicos. 
Se nem todas as universidades existentes no país, públicas ou pri-
vadas, ainda não satisfazem ao mínimo de pressupostos que sucitamente 
enumerei, seria absurdo dar guarida a novas entidades universitárias, que, 
às vezes, nem sequer realizam a contento a "tarefa profissionalizante" que 
as contingências histórico-sociais conferiram, bem ou mal, aos "institutos 
isolados". A autonomia universitária, com todas as prerrogativas que lhe 
são inerentes, antes de ser um galardão ou uma capa para vaidades ou 
aliciamentos — vaidade de pessoas ou de cidades, pouco importa — deve 
ser vista antes como um munus público, um facho de direitos assente sobre 
uma base de deveres e responsabilidades. 
4. Fixado o princípio da mais rigorosa avaliação dos pressupostos 
indispensáveis à autorização e reconhecimento denovas universidades, 
resta nos ver quais os caminhos possíveis para que às universidades exis-
tentes no Brasil seja dado realizar plenamente os seus objetivos. 
Dei ênfase aos problemas da integração, pois dele depende o sen-
tido plural e comunitário que distingue, fundamentalmente, uma Uni-
versidade de um instituto isolado. Dizer que a integração é dispensável 
equivale, no meu modo de entender, a concluir o mesmo quanto à con-
cepção da Universidade como tal. Importa, todavia, ponderar que a 
integração não é tarefa fácil, sobretudo se se pensar na sobrecarga curri-
cular e na nao menos gravosa sobrecarga-horária em vigor em certas 
áreas, com exigências de conhecimentos especializados em grau tão ex-
tenso e intensivo que o aluno mal pode dar conta de seu recado no Instituto 
em que se matriculou, atendendo à sua vocação ou, o que é pior, 
 
às contingências do vestibular. É o caso de perguntar-se até que ponto já 
nao prevalece, no Brasil, o "insulamento" dos institutos no contexto de uma 
Universidade, apenas unitária na aparência, ou seja, tão-sòmente 
formalmente unitária e integrada. Urge indagar das causas desse alarmante 
fenômeno. Dentre elas lembraria as seguintes: 
1) a já referida sobrecarga curricular e horária partindo-se do fai so 
conceito de uma especialização precoce, em um ramo já restrito 
do saber, sem se ministrar qualquer curso de alcance geral; 
2) o limitado tempo que o estudante, inclusive por motivos de ordem 
sócio-econômica, dedica, efetivamente, ao ensino e à pesquisa, 
pouco significando, na prática, a dedicação plena e exclusiva dos 
mestres: a tríplice função acaba confiada, em última análise, a 
alguns elementos do corpo docente, pois, infe lizmente, titulares 
há que não cuidam de exercer funções de pesquisas, havendo 
apenas uma minoria de estudantes em condições ou com 
capacidade de fazê-lo; 
3) a estrutura mesma do "campus" universitário com imensos 
espaços vazios entre os estabelecimentos, o que impede ou difi 
culta a comunicação, sem se falar nas pseudo universidades com 
institutos situados a dezenas ou centenas de km uns dos outros... 
A integração plena será rara, mas haverá sempre possibilidade de 
alcançar-se pelo menos uma integração setorial, fundada no, cada vez 
mais,fecundo princípio da interdisciplinaridade e na "essencialidade dos 
conhecimentos gerais". Na USP, que conheço melhor, abundam exem plos 
de pesquisas puras ou operacionais, por exemplo, fruto de espontânea 
cooperação entre físicos e médicos; físicos e comunicólogos, geó logos, 
arqueólogos e antropólogos; matemáticos e economistas, juristas 
economistas (em termos de planejamento, por exemplo) químicos, físicos e 
agrônomos ou entre classes empresariais e um ou mais setores 
universitários. 
Além disso, não falta a possibilidade de amplo espectro de pesquisas 
inter-universitárias, além dos rígidos esquemas departamentais, ou mesmo 
entre universidades oficiais e particulares, como se deu entre a USP e a 
PUC do Rio de Janeiro em problemas de computação. Ora, essas 
correlações interdisciplinares, ao invés de ocorrerem de maneira 
esporádica, poderiam ser canalizadas através de entidades associativas ou 
grupos de trabalho permanentes, com a cooperação de "Coordenadorias 
Culturais" que não se limitem a meros programas de extensão ou 
vulgarização do saber. Os caminhos da integração são múltiplos, não se 
devendo excluir o estudo de "Problemas Brasileiros", concebido, porém, 
como centro de análise e debate de questões básicas por especialis 
 
tas, superada de vez a concepção ¡luminista que, de início, concebeu tal 
ordem de conhecimentos como um 3º grau de "Moral e Civismo"... Posso 
dizer que, na USP, uma vez confiada a análise das questões básicas da 
Nação a especialistas de renome, sem qualquer prevenção ideológica, os 
estudantes passaram a ver com novos olhos aquela ordem de estudos, 
base propícia à transmissão de conhecimentos gerais, necessários a 
suprir as lacunas deixadas por especializações precoces. 
Ora, quando numa Universidade não se realiza qualquer processo 
de integração, ela falha a um dos imperativos da cultura contemporânea, 
especialmente depois que a nova Epistemologia superou o divórcio antes 
estabelecido, por um empirismo unilateral, entre ciências sociais e as 
chamadas ciências físico-matemáticas. Ninguém mais crê que as ciências, 
para serem objetivas, devam ser cegas para o mundo dos valores, e, desse 
modo, a interdisciplinaridade, pela descoberta de nexos insuspei-tados 
entre o valioso e o pretensamente avalorativo, alargou os horizontes da 
vida cultural. Dessa visão resultou uma hermenêutica científica que, sem 
perda de objetividade, ganha o calor dos empenhos humanísticos. 
Nao se trata, pois, de avaliar a Universidade segundo um enfoque 
pragmático de "investimento econômico", com a sua mobilização para 
programas prevalecentemente administrativos ou empresariais, mas sim de 
situá-la como foco irradiante e coordenador de múltiplos interesses, mesmo 
quando chamada a desempenhar tarefas de sentido comunitário. 
O problema da integração não possui, portanto, mero valor formal, 
mas se insere na medula do sistema universitário, devendo servir como um 
dos critérios decisivos de aferição, quer para criar novas entidades, quer 
para amparar, financeiramente, aquelas que, tanto na esfera pública quanto 
na particular, se revelem capazes de levara cabo a "tríplice função" de 
maneira complementar e universalizante. 
5. Desnecessário me parece acentuar que o êxito dos processos inte-
grativos depende dos elementos ou elos do processo em vigor, a começar 
pela disponibilidade de mestres dotados de preparo metodológico 
adequado e de real vocação para o magistério. 
Nesse passo, por ter já tratado do assunto da formação docente, nos 
trabalhos evocados na nota inicial desta comunicação, prefiro focalizar 
outro aspecto particular, suscetível de sugerir medidas práticas por parte do 
Conselho Nacional de Educação. 
Estou convencido de que uma das tarefas mais urgentes do Con-
selho é o da revisão das normas disciplinadoras da Pós-Graduação. Minha 
experiência, nesse domínio, me diz que a porcentagem dos pós-gra-
duandos com efetiva vocação para o ensino é bem reduzida: a grande 
maioria visa antes, ou tão-sòmente, ao aperfeiçoamento de seus conheci-
mentos, ou à obtenção de um título que projete o diplomado no campo 
profissional. Além disso, já há áreas que revelam exaustão no procès- 
 
so de aquisição de novos mestres, dadas as precárias possibilidades de 
sua absorção pelo sistema universitário. 
Assim sendo, dever-se-ia partir, corajosamente, para a reformulação 
da "Pós-Graduação", distinguindo: 
1) um "Curso de Doutoramento", tão-somente em sentido estrito, 
com mais adequada estrutura, e mais realistas exigências de 
freqüência para outorga do "título de mestre e de doutor". 
2) um "Curso de Aperfeiçoamento", mais maleável e diversificado, 
que se conclua com a expedição de "certificado", após a 
realização de provas cuja natureza e alcance seriam objeto de 
resoluções especificas; 
3) um "Curso Complementar" que poderá culminar na outorga de um 
título de alcance profissional próprio, como se dá, na USP, com a 
Faculdade de Higiene e Saúde Pública que diploma médicos ou 
engenheiros sanitaristas; 
4) e, finalmente, "Cursos de Especialização" distribuídos em 
múltiplas faixas, com diversidade de duração e objetivos, sem se 
limitarem ao simples "aperfeiçoamento" de técnicas já adquiridas 
no curso de graduação. 
Reconheço que a matéria exige mais profunda análise, para mais 
clara delimitação dos tipos de pós graduação aqui lembrados, mas não 
compareço a este Simpósio pensando fornecer receitas acabadas. Dar me-
ei por satisfeito se apresentar perguntas suscetíveis de favorecer o debate 
sobre bases concretas. 
6. Mediante os quadros ou meios de ação,propiciados pelos Cursos de 
Graduação e Pós-Graduação, será possível diversificar os programas de 
pesquisas, uns adstritos aos lindes de cada Departamento, outros de 
natureza interdisciplinar e transistemático, no sentido mais lato desses 
dois termos. 
A vinculação entre pesquisa e integração é bem mais profunda do 
que, à primeira vista, aparece, pois o exemplo das nações desenvolvidas 
demonstra estes fatos singulares: 
1) As investigações, verdadeiramente revolucionárias ou instaura 
doras de novos ramos do saber, ou de novos processos técni cos, 
implicam a co-participação de várias áreas de conhecimen to, 
operando-se tal complementação tanto no relacionamento entre 
pesquisadores, visando a atingir objetivos que extrapolam de suas 
especialidades respectivas, como graças à inovadora combinação 
de equipamentos e tecnologias. 
 
2) A rapidez, com que se processa o advento de novos modelos 
tecnológicos, tornando, de urna hora para outra, obsoletas con-
quistas relativamente recentes, é de tal ordem que se impõe um 
contínuo processo de intercomunicação, ou de realimentação de 
informações, convertendo cada especialista, antes e depois da 
Universidade, em um estudante vitalício, para empregarmos 
palavras de Steven Müller, da Universidade John Hopkins. 
Daí a importância dos cursos de reciclagem que nos países subde-
senvolvidos cabem às instituições universitárias, podendo-se contar nos 
dedos as empresas nacionais em condições de treinamento atualizado de 
seu pessoal técnico. Saliente-se que convênios com o setor empresarial 
para atualização de seus servidores poderia constituir fonte adicional de 
recursos, destinados pela Universidade aos domínios da pesquisa. 
Fato análogo ocorre no plano das investigações puras ou opera-
cionais. onde as universidades, sob pena de grave prejuízo à comunidade, 
nao podem deixar de assumir a responsabilidade de realizá-las. Essa 
tarefa, nos domínios da tecnologia de longo alcance, acaba dando origem 
a institutos anexos ou parauniversitários, dos quais o ITA, de São José dos 
Campos, e o IPT, de São Paulo, são exemplos marcantes. 
Nesse sentido, aliás, impõe-se maior flexibilidade nos processos 
administrativos universitários, criando-se até mesmo órgãos autônomos 
destinados a atuar, com autonomia científico-financeira, na economia 
interna dos quadros da Universidade. Lembro, a esta altura, a solução por 
mim aventada, quando Reitor da USP, de se criar uma "Fundação Para o 
Desenvolvimento Tecnológico", em conexão com a Escola Politécnica, 
destinada a aplicar, sem entraves burocráticos, suas invenções ou 
aperfeiçoamentos tecnológicos em colaboração com entes públicos ou 
privados, como o fez com a nossa Marinha de Guerra e empresas 
interessadas em fabricar no Brasil computadores com base em tecnologia 
nacional, o que se conseguiu com êxito, logrando-se três resultados 
relevantes: economia de divisas para o País, e nova fonte de recursos para 
a Universidade, com tecnologia brasileira. 
Ante tais exemplos, seria o caso de perguntar-se se não se impõe, 
com urgência, a "desburocratização das estruturas universitárias", máxime 
quando constatamos a discrepante decisão da USP de subordinar aos 
estamentos rotineiros da burocracia comum o seu "Fundo de Construções 
Universitárias", cujo sucesso era fruto de sua autonomia técnico-
administrativa e contábil... 
7. É essencial, todavia, que não se tenha a idéia de uma Universida-de-
padrão, como aconteceu quando se cuidou de converter a "Universidade do 
Brasil", sediada no antigo Distrito Federal, em modelo para todos os 
quadrantes da Nação. Esse ideal, sabem-no todos, foi transladado para o 
tão promovido modelo de Brasília, no fundo, mais um après- 
 
sado transplante com abandono da experiência brasileira, nao redutível por 
inteiro a Departamentos. 
Tais tentativas uniformizantes, que ainda se aninham no âmago da 
legislação vigente, por apego a um abstrato "princípio de simetria", é o que 
há de mais conflitante com a Nação brasileira que, consoante tenho dito e 
repetido, é plural na raiz de sua natureza e de sua história: se uma 
Universidade deve espelhar os valores da Sociedade Civil, cada região 
brasileira exigirá o modelo que melhor corresponde à imagem autêntica de 
suas circunstâncias peculiares. A "tríplice função" só terá validade e eficácia 
na diversidade dos modelos inspirados em experiências sociais concretas, 
muito embora deva haver exigências comuns, 
ou um currículo mínimo obrigatório, legitimado pelo fato da outorga de 
diplomas que conferem título profissional para a totalidade do território 
brasileiro. 
Ao fixar-se esse currículo mínimo, aliás, poder-se-ia cogitar de 
alternativas para que a formação universitária atenda também a determi-
nadas disciplinas de caráter geral, a fim de superar a unilateralidade de um 
preparo rigidamente especializado. 
8. A esta altura, poderá alguém perguntar como se poderia conciliar a 
ênfase dada aos valores da integração comunitária e da complementa-
ridade das pesquisas, com a existência de "institutos Isolados", os quais, 
pela incapacidade de realizar aquelas tarefas, ficariam relegados ao os 
tracismo, penando no purgatório de uma cultura fragmentada, fragmentária 
e de restrito alcance. Por iguais razões, poderia surgir uma indaga ção 
sobre o destino reservado a certas universidades, já reconhecidas, "data 
venia", não obstante a precariedade de seus meios, máxime se ve rificada 
a impossibilidade de aperfeiçoá-las ainda que mediante o apoio financeiro 
da Fazenda Pública? 
Começando por essa segunda pergunta, deveras inquietante, have-
ria necessidade de uma análise em profundidade, não se podendo excluir a 
priori a hipótese não só de revisão do reconhecimento outorgado, mas de 
se optar pela fusão de entidades para que surja uma Universidade efe 
tivamente revestida daquele mínimo de pressupostos que, a meu ver, é 
irrenunciável. Ou isto, ou o conformismo perante o "status quo", para 
vaidade de enaltecermos o grande número de universidades "conquista 
das". 
No concernente, ao problema dos Institutos Isolados, friso sua 
importância e urgência, pois não devemos esquecer que, do ponto de vista 
numérico, os institutos isolados são fonte prevalecente do ensino superior, 
de caráter profissionalizante, o que marca a responsabilidade que cabe ao 
Ministério da Educação e ao Conselho Federal de Educa ção. Creio, no 
entanto, que não se poderá, de antemão, excluir a possi bilidade de se 
completar o curso profissionalizante estrito, exigindo-se a criação neles de 
cursos destinados à obtenção de conhecimentos gerais, adequados a cada 
tipo de estabelecimento, sempre sem perda de sua 
 
possível integração no sistema de serviços devidos à comunidade. 0 pro-
blema se deslocaria, em tal caso, para a elaboração de um currículo 
mínimo essencial, completado com outros requisitos formulados pelo CNE, 
em cada hipótese ocorrente, sem o que não subsistiria o reconhecimento 
concedido. O que não é admissível é conformarmo-nos com uma triste 
dicotomia, confiando às Universidades a "tríplice função", e aos Institutos 
Isolados apenas a missão residual de outorgar diplomas de cunho 
estritamente profissional... 
Poder-se-ia, em suma, traçar um programa de adaptação progres-
siva dos atuais Institutos Isolados às normas de integração, sendo provável 
que essa diretriz venha a ter a virtude de operar, nessa área, como 
instrumento seletivo, determinando convênios entre Institutos Isolados de 
natureza complementar, primeiro passo para futuras "Federações", até hoje 
um enigma no corpo da legislação em vigor. 
Eis aí, prezados colegas, algumas diretrizes que espero sejam úteis 
a uma troca de idéias e, se viável, à adoção de algumas conclusões 
suscetíveis de uma revisão que nao exige, de início, necessariamente, 
nenhuma alteração da ordem legislativa, bastando o podernormativo do 
Conselho Federal de Educação, cuja experiência e saber sao garantias na 
escolha do melhor caminho. 
1. - Cf. "Universidade Democrática", in Da Revolução à Democracia, MIGUEL REALE, Sà"o Paulo. 1977. 
Ed. Convívio, págs. 153 usque 169; "Humanismo e Ciência na Universidade", in O Homem e seus 
Horizontes, MIGUEL REALE, Ed. Convívio, São Paulo, 1980, pp. 161 usque 176; e "Universidade e 
Pluralismo Cultural", Op. ult. cit, pp. 179/186 e os artigos "A Crise do Ensino" e "A Crise Universitária", 
publicados na FOLHA DE S. PAULO, de 16 e 21 de dezembro de 1980. 
DEBATES 
Moacyr Expedito Vaz Guimarães — O Prof. Reale deu muita ênfase no 
seu trabalho de conter a razão daquilo que ele designou a "tríplice função". 
E de passagem aludiu a umas dificuldades enfrentadas pelo Ensino 
Superior qual seja o despreparo do alunado do 29 grau, que bate às portas 
da Universidade e dos Institutos Isolados. É uma realidade sem dúvida. 
Entretanto, quando se diz que uma das causas do baixo nível de ensino 
superior estaria na condição desse alunado do 29 grau, imediatamente 
quase que numa só reconvenção, dizem os responsáveis pelo ensino de 29 
grau, que a causa está no fato de que a Universidade prepara mal os 
professores para o ensino de 29 grau, e, portanto, o que é causa, passa a 
ser efeito. Alunos preparados por professores despreparados, certamente 
serão maus alunos, no Ensino Superior. Então, sob este aspecto, teríamos 
de equacionar o problema de forma integrada para que nao ficássemos no 
círculo vicioso de acusações recíprocas a que nada levariam. Além desse 
aspecto, quando o Prof. Reale falou em "tri- 
 
plice função", lembrou-me de um outro aspecto que merece reflexão 
profunda: se a Universidade deve cuidar do Ensino, da Pesquisa e da 
prestação de serviços à comunidade, se tais aspectos devem ser conside-
rados de forma integrada como disse o Prof. Reale, conseguindo assim uma 
tríplice função, é preciso que uma autocrítica à Universidade Brasileira volte 
os olhos para a deterioração do ensino na fase de graduação. Está se 
tornando infelizmente quase regra que os professores mais titulados, ou a 
partir de determinada titulação, nao mais se interessem pelo ensino de 
graduação. E com ele os da pós-graduação quanto os da pesquisa, pois os 
alunos do curso de graduação estão entregues a professores assistentes, a 
auxiliares de ensino, e até mesmo a monitores. Então, se cuidamos desse 
aspecto, é preciso também termos em mente que seria preciso haver um 
esforço para devolver a dignidade e a eficiência do curso de graduação. 
como parte integrante dessas tríplices funções não pode ele ser colocado 
em grau de inferioridade, nao pode ser desprezado e abandonado em 
benefício da pós-graduação e da pesquisa. Segundo entendi da exposição 
do Prof. Reale, haveria um equilíbrio das três partes da tríplice função e não 
é o que está ocorrendo hoje. É preciso termos a coragem de afrontar este 
mal, que é uma realidade, para que o curso de graduação readquira a 
dignidade e eficiência que tinha anteriormente e que deve continuar a ter, 
tratado, pela Universidade, em pé de igualdade com a pesquisa e com o 
serviço de tal utilidade. 
Eurípedes Malavolta — Eu teria dois ou três comentários a fazer e também 
faria algumas indagações ao Prof. Reale e, embora eu nao peça a ele 
receitas, eu pediria algumas diretrizes de ordem geral. Em pouco tempo, no 
início da manifestação do Prof. Reale, uma afirmação que ele fez e que eu 
acredito nao passou despercebida a ninguém: a afirmação segundo a qual 
a reforma universitária feita no Brasil, foi largamente baseada no modelo 
norte-americano, decadente, ou ultrapassado ou em vias de obsolescência. 
Então eu perguntaria ao Prof. Reale se na opinião dele já não estaria na 
hora de se tentar fazer uma avaliação dos resultados desta reforma e 
eventualmente fazer-se uma reforma da reforma. Eu considero essa 
questão fundamental para os estudos na Universidade brasileira e 
fundamental para que ela atinja a tríplice função que está tão bem explicada 
pelo Prof. Reale e que consta especificamente do estatuto da USP. 0 Prof. 
Reale colocou muita ênfase na ausência de distinção que deve haver. 
Estou de pleno acordo com ele entre aquilo que se convencionou ser 
chamado pesquisa pura e pesquisa aplicada. Que tipo de pesquisa a 
universidade deve fazer? Não há, no meu entender, nenhuma distinção real 
entre pesquisa pura e pesquisa aplicada. 0 que há é pesquisa boa e 
pesquisa que não é boa. Há um problema que eu considero fundamental e 
esse problema excede a esfera de competência do CFE e dos CEE: os 
estatutos das universidades, etc. O problema é muito mais fundamental e 
diz respeito à falta de diretrizes no País, em caráter nacional, em caráter 
regional e em caráter setorial para as pes- 
 
quisas que devam realmente ser conduzidas, no interesse do desenvolvi-
mento da nação, como um todo. Todo mundo conhece os planos básicos 
do desenvolvimento científico e tecnológico, mas estes planos podem ter 
tudo, menos prioridades esclarecidas com clareza. Houve uma tentativa 
recente em Sao Paulo e eu nao sei por que é que a tentativa recente 
chamou muito menos atenção, talvez por ser séria, do que os "happenings" 
que se tornaram as reuniões dessa DCC. Foi uma tentativa produzida pela 
Sec. de Ciências e Patologia, para se fixar prioridades em todos os setores 
que interessam ao Estado e eventualmente ao País. Esse é um problema 
que eu considero fundamental, e como disse, excede os limites dos 
Conselhos de outros órgãos que eu mencionei. Outro pedido de 
esclarecimento que eu gostaria de fazer ao Prof. Reale, quando falou na 
especialização precoce dos cursos de graduação, eu não entendi bem o 
que quis ele dizer porque não elaborou muito sobre este aspecto, 
finalmente eu teria algumas considerações a fazer com respeito à pós-
graduação. Eu concordo com aquela subdivisão das atividades da pós-
graduação que o Prof. Reale comentou, mas há um outro aspecto que me 
preocupa bastante há muito tempo e que diz respeito aos aspectos 
puramente quantitativos à pós-graduação. 
A pós-graduação, no Brasil, foi instituída por uma série de razões, inclusive 
por uma premissa de que nós deveríamos ter tantos alunos matriculados 
no ensino superior, para que esses alunos pudessem receber essa 
graduação. Alunos dados para certo número de mestres. E esse número de 
mestres é um número mágico, que eu não sei direito de onde saiu, mas 
estes aspectos quantitativos na pós-graduação, no meu entender, deveriam 
ser considerados principalmente num contexto mais geral quanto ao 
número crescente de matrículas que se observa no ensino superior. 
Haveria necessidade realmente desse número crescente de matrículas? 
Newton Sucupira — Pretendo fazer algumas considerações sobre o belo 
trabalho do professor Reale, porque várias de suas observações em certo 
sentido se referem a atividades que desenvolvi não só como um dos au-
tores da reforma universitária como, nesse Conselho, o autor da regula-
mentação da pós-graduação. O professor Reale começa por estabelecer 
pressupostos com os quais estou de pleno acordo, mesmo porque tais 
pressupostos são, em linhas gerais, os estabelecidos pelo sistema ameri-
cano que ele considera obsoletos e em crise. Foi James Perkins, então 
Presidente da Universidade de Cornell que fixou muito bem em seu livro 
"University in Transition" as três missões que hoje se consideram como 
inerentes à universidade, na verdade acrescentou-se ao ensino e à 
pesquisa a função de aplicação do saber, de prestação de serviço. Não 
nego que a reforma realmente inspirou-se no modelo americano, mas 
recuso-me a aceitar que tenha sido uma simples cópia, basta uma simples 
análise da reforma. Estou de acordo que se deva promover uma avaliação 
completa, o que não foi feito até hoje e mesmo, sob certos 
 
aspectos, uma reformada reforma. Já se passaram doze anos, vivemos 
momentos diversos da ocasião em que se elaborou a reforma e a univer-
sidade, no mundo onde o ritmo das mudanças é tão intenso, certamente 
nao poderia permanecer presa a uma reforma exatamente como foi feita 
naquele tempo. Mas se deveríamos pensar na reforma da reforma, cabe 
perguntar em que medida a reforma foi efetivamente aplicada. Em que 
medida os poderes públicos deram às universidades os meios necessários 
para implementá-la. Citaríamos como exemplo o caso da autarquia em 
regime especial concebida exatamente para permitir maior autonomia 
administrativa e financeira. Esse regime nunca foi definido e o projeto de 
defini-lo recentemente não foi avante. Nao creio que o sistema americano 
seja obsoleto e insuficiente. Ocorre, hoje, que na Europa, muitas 
universidades estão aplicando, com outros nomes certas soluções de ins-
piração norte-americana. Se o Prêmio Nobel é indicador de produtividade 
científica e de sua alta qualidade, até a guerra, a Alemanha detinha o maior 
número de Prêmios Nobel em ciências exatas e naturais. Hoje este record 
está com os Estados Unidos. No caso da pós-graduação estou de acordo, 
em princípio, com certas afirmações do professor Reale, mas diria o 
seguinte: as normas dizem que as universidades exigem a seleção que 
entenderem. Portanto se está havendo, como parece que está, absorção de 
elementos incapazes isto se deve à instituição universitária. O parecer 
977/65 acentua que a seleção para a pós-graduação deve ser a mais 
rigorosa possível. Não cabe ao Conselho regulamentar esta seleção. Então 
o problema é das universidades. Quanto à distinção dos níveis, encontra-se 
já nas próprias normas. Distinguimos pós-graduação sensu stricto e sensu 
lato e dentro desta distinção cabem as nuances que admito perfeitamente, 
emprestando caráter especial à pós-graduação em medicina, que, em tôda 
parte adquire status especial. 
Miguel Reale — Em grande parte o assunto, que foi objeto de considera-
ções por parte dos ¡lustres Conselheiros que pediram a palavra, envolve 
matéria já estudada por mim nos escritos a que faço referência. O trabalho 
ora lido é, digamos assim, conclusivo, baseado nos estudos enviados a 
este Conselho, focalizando uma série de problemas. Mas vou procurar ser 
breve, sintetizando os meus pontos básicos. Quando digo que o estudante 
bate à porta de universidade sem o devido preparo, levo em conta dois 
pontos fundamentais: em 19 lugar, nos cursos normais, entendo que há um 
excesso de exigência curricular, de tal maneira que a formação de caráter 
geral, que propiciava uma amplitude cultural maior, está muito 
comprometida. Entendo que o curso colegial desce a pormenores e 
preciosismos. Eu me lembro bem de um grande mestre de matemática da 
Itália, o prof. Fantappié, que, quando leu o programa de matemática do 39 
ano colegial, me fez esta pergunta: "E dopo, che cosa studiano?" — "E 
depois que é que estudam?" Há, pois, uma sobrecarga nos currículos 
normais, o que impede ao estudante a autonomia de formação 
 
que é indispensável. Haveria necessidade, então, de uma espécie de revi-
são dos currículos, nao para aumentá-los mas para decantá-los na medida 
em que eles estão excessivamente densos de matéria, como se a cultura 
fosse feita pela quantidade dos conhecimentos e nao pela formação 
metódica da inteligência e do espírito. 
0 29 ponto, a meu ver fundamental, é que no Brasil, hoje, ao lado 
das estruturas normais, estão em plena função as estruturas acessórias ou 
supletivas. Os cursos supletivos não operam apenas no 19 grau, mas 
também no 29 grau, com grande deficiência e os maiores prejuízos para a 
cultura brasileira. Tenho a experiência de um pai, não pertencente à clase 
média, mas abastado, e que me confidenciou: "Meu filho primeiro vai 
trabalhar comigo na empresa, depois ele fará o supletivo". Desse modo, 
estamos correndo o risco de substituir as estruturas normais pelas formas 
subsidiárias ou supletivas, e isto tem afetado muito o ensino superior. 
Trata-se de matéria que foi aqui objeto de oportuno comentário por parte do 
Prof. Martins Vaz Guimarães. 
com referência à pós-graduação, estou de pleno acordo no sentido 
de que inegavelmente ela apresenta vícios internos vinculados à própria 
Universidade que ministra os seus cursos. Nesse ponto há coincidência 
entre o meu ponto de vista e a ponderação feita pelo Prof. Sucupira. A 
Universidade, porém, não tem amplitude de ação porque, de certa maneira, 
tem que seguir as normas do Conselho, e tais normas, a meu ver, precisam 
ser aperfeiçoadas. Observo, e com isso respondo de certa maneira a todos, 
que meu trabalho não tem por finalidade introduzir inovações desde a raiz 
do que está vigente, mas apenas avaliar a reforma indicando algumas 
medidas imediatas que, a meu ver, poderiam ser tomadas, sem 
necessidade de reformas legislativas. Realizaríamos, assim, uma reforma 
dentro da reforma. 
Acho fundamental que, desde logo, possamos tomar providências, 
através do Conselho, para depois passarmos à reforma mais profunda, 
mais ampla que seria de ordem legislativa. Julgo que, com essa pon-
deração, estou respondendo também ao Prof. Malavolta, esclarecendo qual 
a minha posição quanto ao processo a ser obedecido na reforma almejada, 
que, de início, poderia dispensar a revogação das leis em vigor. 
No que se refere à reforma universitária, que agora estamos anali-
sando, confesso que não a recebi com entusiasmo; mas, com a responsa-
bilidade de Reitor da USP, procurei realizá-la com entusiasmo e fideli-de. 
Os professores da Universidade de São Paulo, aqui presentes, sabem com 
que afinco procurei executar a lei dentro da USP, suprindo lacunas e 
superando determinadas situações extremamente delicadas. Saliento que 
não concordei com certas conotações da reforma feitas para o Brasil, de 
maneira genérica, sem levar em conta situações específicas, e, sobretudo a 
autonomia dos sistemas estaduais de ensino assegurada pela Constituição. 
A USP, como se sabe, recusou-se a criar o "curso básico" unificado, tal 
como era entendido por alguns intérpretes da nova lei. 
 
É fácil compreender que, numa universidade que então recebia 
6.400 alunos por ano, o pretendido "curso básico" viria corresponder à 
criação de uma Universidade dentro da Universidade, quando não havia o 
"problema da reciclagem" apresentado como um de seus objetivos básicos. 
Daí a decisão de aplicar a lei de maneira criadora, em função das 
circunstâncias regionais, realizando a integração, que se tinha em vista, 
graças a processos diversificados ou verticais, com dispensa de um 
massificante curso básico comum. Dentro desse espírito, foi criado, por 
exemplo, um curso básico para toda a área biomédica. 
Repito que não recebi a reforma com grande entusiasmo, porquanto 
estava prevendo aquilo que infelizmente aconteceu, que é a deterioração 
de muitos departamentos, apresentados como instrumentos aptos a 
substituir as cátedras. Trata-se de assunto relevante já tratado por mim em 
outros trabalhos, aos quais peço licença para me reportar. Isto não me 
impede, porém, de frisar que a revisão da estrutura departamental, bem 
como de sua colocação no todo universitário, me parece uma das tarefas 
mais urgentes a serem empreendidas. 
Também estou de acordo que nao há distinção radical entre pes-
quisa pura e pesquisa aplicada e outra coisa não disse em minha comuni-
cação. Por mais que se queira, porém, dizer que na pesquisa pura há 
sempre abertura para a aplicação prática, e, por mais que se afirme que na 
pesquisa operacional há sempre necessidade de pressupostos teoréticos, é 
inegável que há certo campo de pesquisa que nós podemos chamar "pura" 
porque desvinculada, desacompanhada de qualquer objetivo de utilização 
imediata. Diria que há pesquisa com objetivo prático ¡mediato e há outras 
conduzidas sem qualquer finalidadeutilitária. A comunidade pode exigir do 
Brasil pesquisas de caráter imediato, mas as pesquisas verdadeiramente 
revolucionárias têm sido aquelas nas quais o pesquisador não sabia de 
antemão quais poderiam ser suas conseqüências. E a esse tipo de 
investigações que eu chamo propriamente de "pesquisas puras". São, em 
suma, aquelas pesquisas cuja aplicação é imprevisível no momento que 
elas se realizam, nem se cuida de sua potencialidade operacional. 
Devo acrescentar ainda que, quando falo em especialização pre-
coce, a minha observação tem sentido bem delimitado. O que quero dizer é 
que em certas unidades de ensino não se pretende formar apenas um 
médico, mas sim, desde logo, um especialista em cardiologia, pediatria ou 
psiquiatria, e isto tem causado grandes danos, não só para os médicos 
como também para a comunidade nacional, sobretudo pelo 
desaparecimento do chamado clínico geral. O que digo da Medicina, 
poderia repetir no setor da Engenharia, de cujas escolas saem especialis-
tas neste ou naquele campo, sem nenhuma capacidade para utilizar os 
seus conhecimentos com essa plasticidade metódica e criadora que é nota 
característica essencial ao mundo da ciência e da própria tecnologia. É 
nesse sentido particular que me refiro a "especializações precoces". 
 
Quanto às observações feitas pelo prof. Sucupira, devo ponderar, 
preliminarmente, que a crise da universidade Americana nao é de hoje e 
vem sendo debatida há muitos anos. Ainda agora está sendo discutido o 
famoso manifesto em que os professores de Harward analisam o problema 
universitário norte-americano, mostrando como a crise de seus valores vem 
desde a segunda guerra mundial, ou seja, de período anterior ao da nossa 
reforma. Nao disse de maneira alguma que tenha havido mera cópia do 
modelo americano. A minha frase foi muito clara: "nossa reforma foi 
inspirada em grande parte pelo modelo americano". Ora, essa inspiração 
nao desdoura a ninguém, porquanto devíamos buscar inspiração nas fontes 
melhores, e a fonte melhor era, sem muitos pontos, a dos Estados Unidos 
da América. Nao estou, pois, criticando a influência americana, mas sim 
procurando saber como é que a comunidade brasileira se comportou ante o 
transplante do modelo seguido. É à luz dos dados relativos a essa 
"recepção", ou, por outras palavras, pelo estudo de como nos deixamos 
influir, segundo fins ligados às nossas circunstâncias, que devemos partir 
para a reforma da reforma, primeiro "interna corporis" e, depois, do plano 
legislativo. Que há pontos negativos na reforma quem poderá negá-los? 
Houve até mesmo incompreensíveis exageros, bastando lembrar que uma 
estreita idéia de Departamento serviu de pretexto para eliminar a 
possibilidade de Faculdades. Pensou-se até em extinguir a Faculdade de 
Direito do Recife ou a Faculdade de Medicina da Bahia, vinculadas a 
valores históricos da gente brasileira, e tudo pela obsessão de adotarmos 
uma terminologia que não se compadece com a nossa própria tradição. De 
maneira que houve erros e acertos nessa transposição. Devemos fazer a 
nossa autocrítica se é que queremos fazer a crítica da reforma. 
Newton Sucupira — Jamais a Reforma determinou que se eliminasse 
qualquer Faculdade. Há vários modelos possíveis, o que permite que 
regiões diversas se utilizem de tais modelos. A Reforma em nenhum 
momento determinou que se acabasse com a Faculdade de Direito do 
Recife, Faculdade de Medicina da Bahia ou a Politécnica de São Paulo. 
Miguel Reale — Infelizmente, Prof. Sucupira, o entendimento de V.Exa. 
que coincidia com o meu, não foi geralmente seguido no País e as con-
seqüências foram desastrosas, É por isso que digo que o Brasil é plural no 
âmago de suas circunstâncias, razão pela qual a reforma teve reflexos 
diferentes no País inteiro. Assim sendo, devemos avaliá-la levando em 
conta a multiplicidade contrastante de suas aplicações. 
Não desejo acrescentar mais nada. Pediria apenas a atenção dos 
nobres colegas para o último fascículo da Revista "Diálogo", distribuída 
pela Embaixada Americana (Vol. 13, 1980, n9 1), que é exclusivamente 
dedicada às várias crises da Universidade yankee, com as discussões 
suscitadas pela Universidade de Harward. São crises naturais. Não 
 
penso que vamos resolver o problema de nossa Universidade. Vamos 
passar por outras crises, porque a crise é essencial à vida universitária. 
Nenhuma solução será completa. Nós damos grandes passos com a re-
forma e, em outras oportunidades enalteci alguns deles, como, por 
exemplo, a opção pela limitação das matrículas, o "numerus clausus" com a 
freqüência obrigatória ou a extinção das cátedras. Neste ponto já surgem 
dúvidas sobre o modo como se deu a extinção. Há necessidade de se rever 
a competência conferida aos departamentos, para impedir conhecidos 
abusos. Proponho, portanto, alguns aperfeiçoamentos, mas isto significa 
apenas que sou partidário de uma "reforma da reforma", e não de uma 
revolução. As revoluções nunca dão certo no plano educacional. 
COMUNICAÇÃO DO PROF. ERWIN ROSENTHAL I - 
A CRITICA DA UNIVERSIDADE E A UNIVERSIDADE CRITICA 
Estamos aqui numa reunião, convocada para a discussão de temas 
centrais, que respeitam à Universidade Brasileira, sua realidade e suas 
perspectivas, inserida que se encontra em um universo político e social em 
rápida transformação. Foi esse Relator incumbido de enunciar algumas 
idéias em torno da pesquisa universitária no setor das ciências humanas, 
mas julga que a realização desse desiderato requer, antes de mais nada, 
que situe a sua concepção da Universidade. Assim seja enfocado 
rapidamente aquilo que dela se espera e a atitude crítica da própria 
Instituição, hoje vista em estado de crise, por estar exposta, mais que outra 
qualquer, a censuras que a atingem de fora de seus muros e a reparos nem 
sempre construtivos, expressos por elementos que a ela pertencem. 
Acresce que as condições materiais, necessárias à conservação e melhora 
do nível atingido, assim como à retribuição financeira condigna de seus 
docentes, têm sofrido severas restrições, levando muitos a diminuir a sua 
dedicação ao respectivo Instituto de Ensino Superior que, entretanto, não 
pode prescindir, sem graves danos, do esforço de todos em prol da 
docência e pesquisa universitária brasileira. 
Seja permitido evocar um exemplo da Antigüidade. Quando 
Tucídides descreve a peste, a assolar os atenienses em pleno estado de 
guerra, diz: "o pior veio a ser o estado de desânimo generalizado, ao qual 
se abandonavam aqueles que se viam atingidos pela terrível doença. 
Imediatamente abandonavam todas as esperanças, de tudo se descuidan-
do e não se preocupando sequer em resistir à enfermidade". Coragem é, 
assim, para Tucídides o elemento primordial e manifesta-se graças a um 
juízo apropriado da situação que, certamente, mantém acesas as espe-
ranças. Neste momento em que vemos colegas, de permeio à crise ima-
ginária ou real, — e não apenas trazida de fora - abandonar a esperança 
 
num porvir melhor, desinteressando-se por aquilo que deveria ser a sua 
tarefa precípua e o resultado de um esforço comum, a Universidade, 
devemos, pelo contrário, armar-nos decididamente para resistir à enfer-
midade que ameaça ampliar o vulto. A arma desta resistência só pode ser 
o argumento, o método a empregar no seu uso a discussão e o estilo o 
raciocínio, É preciso provar portanto que será possível chegar por esse 
caminho ao consenso e, graças a ele, à disposição da comunidade acadê-
mica de garantir o progresso da Universidade Brasileira e a sua autonomia, 
apesar dos imensos problemas a enfrentar, entre os quais avulta o da 
massificação. 
Já em 1953 Robert M. Hutchins designou a Instituição que imaginou 
surgir, da University of Utopia, à qual caberia desempenhar papel de 
primeira grandeza na orientação da vida espiritual da nação. Já foi 
mencionada a evidente inserçãoda Universidade de nossos dias no Estado 
e na Sociedade, sendo apenas nesse contexto que a condição de sua 
autonomia, o que vale dizer de sua liberdade, pode ser definida. Por outro 
lado é evidente, pela sua própria organização, que a Universidade é reflexo 
do Estado e da Sociedade em que se situa o que, por sua vez, leva ao 
paradoxo de caber a ela expressar aquilo que dela se espera. Poderíamos 
formular de maneira inversa: as exigências e expectativas, parcialmente 
justificadas, com que a Universidade se defronta no julgamento da 
Sociedade em torno, seja por opiniões expressas em Assembléias, 
Associações ou Sociedades, seja através de pronunciamentos através de 
rádio, televisão ou imprensa, refletem a conscientização de problemas e 
dúvidas surgidas dentro da própria Instituição Universitária. Assim podemos 
formular dois princípios que nos parecem axiomáticos em se tratando de 
firmar a posição da Universidade de hoje. 
19 — A opinião pública e o Estado podem esperar da Universidade 
que ela desperte a consciência social no sentido de justificar 
a sua própria existência; 
29 — A Universidade precisa responsabilizar-se pela formação 
sólida de um número representativo de cidadãos que, em 
número e em qualidade, venham a corresponder às necessi-
dades da Sociedade em que está inserida, assim como ao 
progresso científico. As pesquisas realizadas na Universidade 
têm de alcançar nível e intensidade tais que possam con-
correr com as pesquisas e realizações de povos de respeitá-
vel tradição científica. 
Nossa Universidade fundamentou-se, desde os seus inícios, no 
velho princípio humboldtiano da integração Ensino e Pesquisa, convencida 
de que aos mais qualificados docentes universitários cabe exercer a função 
dupla de pesquisadores e professores, procurando para tanto encontrar 
métodos racionais e econômicos. A preferência absoluta pela formação 
profissional é, nesse sentido, descabida, pois corresponderia a 
 
uma negação do próprio espírito universitário. Já se disse que "para isso 
bastariam escolas profissionais bem equipadas e com bons professores, 
limitadas a produzir os técnicos que a nação requer, sem uma preocupação 
realmente formadora, sem cuidar da articulação do todo do saber. Em uma 
palavra, a Universidade forma também profissionais; não se destina 
fundamentalmente a formá-los" [in Roque Spencer Maciel de Barros, 
Ensaios sobre Educação, pag. 203). Não é concebível, por outro lado, 
que a pesquisa seja tratada como atividade meramente subsidiária, como 
se fosse um 'hobby' dos docentes, e não a sua mais sagrada função, pois é 
inegável que as Universidades devem sempre ocupar a posi-ção-chave, o 
'centro' do progresso científico da Nação, se quiserem sobreviver como 
instituições destinadas à busca das verdades sempre renovadas, das 
realidades que emergem de um presente em contínua transformação. 
Permitimo-nos citar aqui trecho de comunicações divulgado após 
uma das Conferências dos Reitores da Alemanha Federal, esta realizada 
em 1976, pois reflete bem a filosofia que preside à pesquisa nas Escolas 
Superiores daquele país. 
"A pesquisa é o fundamento da docência científica. A docência nas 
Universidades deve ser uma docência embasada nos conheci-
mentos mais atualizados. Só assim as Escolas Superiores poderão 
cumprir a sua missão de formar a nova geração de cientistas, ne-
cessários à sobrevivência da própria Sociedade. Só podem opinar a 
respeito de quais sejam os conhecimentos mais atualizados, aqueles 
que pessoalmente realizam pesquisa de vanguarda. Por isso, 
somente aquele que estiver diretamente envolvido na pesquisa 
poderá ser responsável pela transmissão escrita e falada dos co-
nhecimentos aos estudantes." 
O espírito científico, sem o qual a Universidade não pode existir, é 
exatamente conseqüência da integração dessa docência e pesquisa, que 
terá de tornar-se realidade absoluta nas universidades brasileiras, se real-
mente pretendermos dar projeção às suas realizações e que respeitados os 
diversos campos, são muitas vezes surpreendentes em segmentos indi-
viduais, mas carecem em geral da continuidade, do "espírito de equipe" e 
daquilo que antigamente se denominava de "escola". É claro que entre nós, 
com uma Universidade relativamente nova e uma ainda incipiente tradição 
de pesquisa, não se pode pretender abarcar todas as linhas de pesquisa de 
importância e nem alcançar nível de excelência em todos os campos do 
saber. O atraso tecnológico e científico em determinados setores existe e 
continuará existindo; algumas realizações de escol não escondem essa 
realidade! Nem as disponibilidades orçamentárias para as Universidade, e 
nem os nossos cientistas chegarão a curto prazo a levar a pesquisa 
brasileira à vanguarda nos principais campos das ciências exatas, 
aplicadas e humanas, mas critérios de preferência terão de ser esta-
belecidos e seguidos em âmbito nacional, e a criação de uma teoria cien- 
 
tífica do planejamento de pesquisas poderia vir a ser uma das mais úteis 
medidas a ser empreendida no campo da política científica a guiar o nosso 
futuro científico-técnico. As linhas de pesquisa teriam de ser 
cuidadosamente planejadas num consenso geral dos responsáveis e em 
clima de absoluta liberdade acadêmica, sem o que toda a pesquisa se 
desfigura, tornando-se dirigida, discricionária e autoritária. Afinal, a 
Universidade é uma Instituição racional, capaz de refletir autocriticamente 
sobre suas responsabilidades perante a Sociedade e deve, por isso 
mesmo, ser capaz de despertar esse raciocínio autocrítico entre seus 
estudantes. Eis uma incumbência ao mesmo tempo científica e política. As 
Ciências não podem senão ter as suas preferências políticas sempre e 
somente inclinadas para o lado em que são defendidas as suas liberdades 
fundamentais. E, baseadas nas liberdades políticas básicas, precisam res-
peitá-las como tais. Têm de desenvolver formas da vida universitária, da 
gestão acadêmica e do ensino superior, que obriguem os docentes e os 
discentes a utilizá-las com respeito mútuo, pois só elas garantem a força 
moral da Universidade no seio do Estado e da Sociedade. Não há dúvida 
nenhuma de que o mais importante critério desta verdade é o da dignidade 
humana. Ações destinadas a ferir essa dignidade, ou a provocar outros a 
feri-la, subvertem os pressupostos políticos e morais da razão. uma 
Universidade que batalha em prol de uma razão livre: eis a tarefa da 
Universidade que todos temos de almejar, uma Universidade que, neste 
sentido, pode ser chamada de crítica. 
II - FORMULANDO O CONHECIMENTO A SER ENSINADO 
Mencionamos atrás linhas de pesquisa, que teriam de ser estabele-
cidas para que também no campo das ciências humanas - ao qual se cir-
cunscrevem essas breves considerações —, se registre efetivo progresso 
não de certos problemas peculiares mas de todo um complexo científico de 
interesse atual. Voltamos ao assunto porque se nos afigura como o mais 
importante talvez, na atual fase dos trabalhos de pesquisa acadêmica. 
Em 1968, Anísio Teixeira exclama: "A grande transformação 
moderna, que é a escola de pós-graduação, a escola de pesquisas (grifos 
nossos), a escola que irá formular o conhecimento humano para ser en-
sinado, não chegou a existir no Brasil. Nosso problema hoje, em 1968, era 
o problema de Humboldt na Alemanha em 1809, e era o problema da 
América, em 1875, quando sob a influência do ensino germânico, lançou as 
bases da universidade totalmente devotada à escola de pós-graduação e, 
unindo Harward e ainda Wisconsin e Minnesota a John Hopkins criou o 
ensino pós-graduado da América, que data de 1875. Se formos felizes, 
dataremos da próxima década de 1970 a nossa fase de pós graduação. Na 
reestruturação, que agora se anuncia, esboça-se esse novo espírito." (uma 
perspectiva da educação superior no Brasil pag. 47). E no mesmo 
depoimento, aliás prestadoà CPI da Câmara dos De- 
 
putados sobre o ensino superior do País, havia dito (pag. 29): "A introdução 
da ciência na universidade deu-se, em todo o mundo, na segunda metade 
do século XIX. Pode-se dizer que só na Alemanha se iniciou no princípio do 
século XIX, quando aquele país lançou a idéia de que universidade era 
pesquisa. Essa pesquisa era realizada tanto no campo de humanidades, 
como no campo das ciências físicas e naturais. Vejam bem o detalhe: antes 
desse período, antes de Humboldt, toda a universidade estava a aprender 
um conhecimento já existente e já formulado pelos livros antigos. com 
Humboldt, surge para a universidade a função de se elaborar a cultura que 
vai ser ensinada. Esse ponto parece-me extremamente importante. Assim 
como a universidade da Idade Média elaborou a cultura da Idade Média, a 
universidade da Idade Moderna teve de elaborar a cultura moderna para 
ensiná-la. Então, não se trata de dizer apenas que a universidade precisa 
dedicar-se à pesquisa. Ela tem de formular o conhecimento que vai ensinar, 
o qual não existe ainda." 
com estas palavras, Anísio Teixeira não só previu a "década da pós-
graduação", cujos frutos talvez tenha superestimado, porque fatores 
adversos contribuíram para o enfraquecimento do qual ainda trataremos, 
mas expressou a idéia importantíssima de que a universidade moderna 
será verdadeiramente de pesquisa, "quando formular a cultura que vai 
ensinar". Entretanto, existe de fato tal Universidade em nosso meio? 
A nossa universidade, no sentido mais corrente, é ainda aquela que, 
sob administração comum, reúne alguns conhecimentos de ensino superior, 
que podem ter recebido ou não novas denominações, mas que nada mais 
sao senão as extensões das antigas Faculdades as quais, no seu conjunto, 
constituíam a Universidade anterior à Reforma e onde, individualmente, se 
ligavam ensino e pesquisa com a finalidade de formar um profissional 
específico, médico, engenheiro ou advogado. Foi a Faculdade de Filosofia, 
Ciências e Letras esboçada para dar um novo caráter a esses institutos que 
vivem lado a lado, mas não chegam a constituir uma comunidade que "crie 
ou formule cultura", ou ainda "articule o saber num todo coerente", como o 
exigiria a função precípua da Universidade. Por outro lado existem 
Universidades mais modernas no Brasil constituídas da reunião de Institutos 
chamados de "centrais" ou "básicos", a que se ligam instituições concebidas 
dentro do esquema tradicional. Aqui, o problema é abordado de outra 
forma, sendo as disciplinas básicas para determinados cursos agrupadas, 
de tal forma que alunos realmente destinados a Institutos de diferentes 
designações ali se agrupam, em um esforço de concentração de recursos e 
material sendo assim reunidos também docentes que, pelo sistema anterior, 
estariam dispersos por várias Faculdades. Nao ousamos sugerir qual dos 
dois tipos mais satisfaz ao ensino superior de nossos dias, mesmo porque a 
Universidade ideal seria uma Instituição diferente, formada por núcleos 
centrais, nos quais seriam absorvidos currículos variados, todos eles 
voltados para aquelas parcelas do saber que, reunidas, formariam a síntese 
da cultura 
 
de nossos dias. Esse desiderato seja talvez utópico, mas nao teria neces-
sitado de sê-lo no sistema de pós-graduação, introduzindo nos primeiros 
anos da década de setenta na Universidade brasileira, mas infelizmente 
sem produzir até agora aquela "formulação cultural" que a firmaria como a 
força magna do país, a serviço da verdade e da liberdade. Isto nao significa, 
de modo nenhum, que pesquisas não sejam realizadas; o que aqui 
desejamos ilustrar com alguns poucos dados da Universidade de São 
Paulo, a que pertencemos, e — em caráter mais específico — a uma área 
de ação, a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, onde entre 
inícios de 1973 e fins de outubro de 1980 foram apresentadas 704 
pesquisas, das quais 476 sao dissertações de mestrado e 198 teses de 
doutoramento, e as restantes teses de livre-docência. Sao pesquisas 
realizadas em dezoito áreas diversas do campo do nosso enfoque, pre-
dominando a Sociologia com 64 mestrados e 35 doutoramentos, mas 
destacando-se também as áreas de História Social, de Lingüística, de 
Geografia Humana, Teoria Literária, História Econômica e as Letras em 
geral. Apenas em 1980 foram realizados 65 doutoramentos (32 em 1979) e 
116 mestrados (101 em 1979, demonstrando — sob esse ponto de vista — 
a pujança de um único Instituto. Os dados, referentes a tôda a 
Universidade, foram publicados até 1976, mas conseguimos obter, graças à 
gentileza da Coordenadoria de Assuntos Culturais da USP, informações 
precisas para o biênio de 1977/1978, estando em fase de reunião os dados 
referentes a 1979 e 1980, no que se refere às pesquisas em andamento. 
Apresentando aqui uma visão genérica, temos na Universidade de São 
Paulo, no biênio referido, uma indicação de 900 pesquisas em fase de 
realização no campo das Ciências Humanas, distribuídas da seguinte forma 
pelas Faculdades, Institutos e Museus: 
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas — 431; Faculdade de 
Direito — 137; Faculdade de Economia e Administração - 123; Faculdade 
de Educação — 71; Escola de Comunicações e Artes — 65; Faculdade de 
Arquitetura e Urbanismo — 27; Museu Paulista — 25; Instituto de Estudos 
Brasileiros — 12; Museu de Arqueologia e Etnologia — 11; Instituto de Pré-
História - 3. E já que estamos no campo dos dados, vejamos informações 
de outro tipo. A natureza das pesquisas foi, na grande maioria dos casos, 
indicada como teórica ou teórico-aplicada; poucos são os pesquisadores na 
nossa área que, em resposta ao questionário específico, afirmam ser a 
natureza do seu trabalho aplicada, e os objetivos assinalados seguem tal 
informação. Os campos específicos, mais freqüentemente indicados em 
cada Unidade, podem assim ser resumidos: 
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas: Estética, Filosofia da 
Arte, Filosofia Política e Epistemologia; Antropologia Social, Ciência 
Política, Sociologia da Educação, Sociologia Econômica, Sociologia Urbana 
e Sociologia Agrária; 
 
Língua, Literatura Brasileira, Literaturas Modernas Estrangeiras, Teoria 
da Literatura; 
História Social e História Econômica; 
Geografia Humana e Geografia Física. 
Faculdade de Direito: 
Direito Econômico, Direito Internacional Público, Direito Internacional 
Privado, Direito do Comércio Internacional, Direito Civil,Direito Admi-
nistrativo, Filosofia do Direito, Direito Processual Civil e Ação Penal. 
Faculdade de Economia e Administração: 
Mercado de Trabalho, Economia Espacial, História Econômica Brasileira, 
Economia Urbana, Processamento de Dados, Agricultura, Recursos 
Humanos, Computação - Sistemas de Informação; Economia Brasileira, 
Economia Monetária, Economia Agrícola, Administração de Empresas, 
Marketing e Economia de Empresas. 
Faculdade de Educação: 
História da Educação, Psicologia Educacional, Psicologia Social, Filosofia 
da Educação, Orientação Educacional, Aprendizagem, Administração 
Escolar. 
Escola de Comunicações e Artes: 
História das Artes, Artes Plásticas, Teatro Brasileiro, Biblioteconomia, 
Filosofia da Comunicação, Comunicação e Educação, Comunicação e 
História, Jornalismo, Música e Ensino, Música Contemporânea, Cinema 
Brasileiro, Documentação. 
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo: 
História da Arquitetura, Estética de Projetos, Tecnologia da Arquitetura. 
Museu Paulista: 
Arqueologia Brasileira, Etnologia, e Geografia Humana. 
Institutos de Estudos Brasileiros: 
Literatura Brasileira, História de São Paulo e Artes Plásticas. 
Museu de Arquelogia e Etnologia: 
Etno-História. 
Instituto de Pré-História: 
Antropologia Pré-Histórica e Etnologia. 
Por outro lado podem as principais entidades subvencionadoras de 
projetos individuais ou coletivos ser agrupadas:

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