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DIREITO PENAL Didatismo e Conhecimento 1 DIREITO PENAL Prof. Carla Baggio Laperuta Fróes Mestranda em Teoria do Direito e do Estado pelo Centro Universitário Eurípides de Marília (UNIVEM). Especialista em Direito Processual pela Universidade do Sul de Santa Catarina. Docente. Advogada. 1 INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL. 1.1 CONCEITO, CARACTERES E FUNÇÃO DO DIREITO PENAL. CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DO DIREITO PENAL: - Aspecto FORMAL – “Sob o aspecto formal, direito penal é um conjunto de normas que qualifica certos comportamentos hu- manos como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções a serem-lhes aplicadas”. - Aspecto SOCIOLÓGICO – “Já sob o enfoque sociológico, o direito penal é mais um instrumento do controle social de com- portamentos desviados, visando assegurar a necessária disciplina social”. Significa que o direito penal é um dos instrumentos de que se vale o Estado. Todos os ramos do direito pensam na harmônica convivência social. A finalidade, apesar de ser a mesma, o que diferencia o direito penal dos outros ramos? A drasticidade da sua consequência jurídica. O direito penal é direcionado pelo princípio da intervenção mínima. É o único que tem como consequência a pena privativa de liberdade. Alguns doutrinadores diferenciam direito penal objetivo de direito penal subjetivo. - Direito penal OBJETIVO – “Conjunto de leis penais em vigor no país: Código Penal, leis extravagantes, etc”. - Direito penal SUBJETIVO – “Direito de punir do Estado”. Existe direito penal objetivo se não existir o direito penal subjetivo? Pode agir o direito penal subjetivo sem o objetivo? Então, eles estão umbilicalmente atrelados: “O direito penal objetivo é expressão ou emanação do poder punitivo do Estado.” Esse direito penal subjetivo (que é o direito de punir estatal – o examinador pode questionar sobre o direito subjetivo, querendo que você fale sobre o direito de punir apenas) é condicionado ou incondicionado? Limitado ou ilimitado? É um monopólio do Esta- do? O Estado transfere para o particular o direito de punir alguém? O direito penal subjetivo é monopólio do Estado e mais, o direito penal subjetivo é limitado, quando se diz isso, se diz que ele é condicionado. E o professor vai trazer três exemplos de limitação ao direito penal subjetivo: Limitação ao direito de punir (ao direito penal subjetivo) – prescrição. Se alguém perguntar o que é prescrição, basta dizer: “é uma limitação temporal ao direito de punir.” O direito de punir também tem limites no espaço: princípio da territorialidade. A lei penal só se aplica aos fatos praticados no território brasileiro. É o limite espacial ao direito de punir. E por fim, um limite modal (quanto ao modo) e dizem que é o mais importante na CF: princípio da dignidade da pessoa humana. Esse princípio traz uma limi- tação quanto ao modo de punir. Há casos em que o Estado tolera punição particular? Antes de responder, atenção: será que exemplo de punição particular tole- rada pelo Estado poderia ser a legítima defesa? O Estado quando te permite agir em legítima defesa ele está dizendo que “o mono- pólio de agir é meu, mas eu tolero uma punição particular nesse caso?” Não. Isso porque na legítima defesa você não pune, você se defende, como o nome está a dizer. Nas hipóteses de legítima defesa, desforço imediato, você está se defendendo. Outra hipótese: O Estado em alguns casos permite ao particular processar o agente. Mas na ação penal de iniciativa privada, ele não transfere a punição. Ele transfere apenas o direito de perseguir a pena. Quem pune é ele, Estado. Ele transfere apenas a titularidade da ação, o direito de agir, de perseguir a pena. Então, esses não são exemplos de exceção ao direito de punir do Estado. Onde está a exceção, então?? Caso de PUNIÇÃO POR PARTICULAR tolerada pelo Estado: Estatuto do índio – Lei nº 6.001/73: art. 57: “Será tolerada a aplicação pelos grupos tribais de acordo com as instituições próprias de sanções penais ou disciplinares contra os seus membros, desde que não revistam caráter cruel ou infamante, proibida em qualquer caso a pena de morte.” Paralelamente ao poder punitivo estatal, existe o poder punitivo da tribo. O Estado tolera isso, mas com ressalvas: há que haver respeito à dignidade da pessoa humana (vide parte grifada). CARACTERÍSTICAS DO DIREITO PENAL: Tem finalidade preventiva: antes de punir o infrator da ordem jurídico-penal, estabelece normas proibitivas e comina penas, visando evitar a prática do crime. Didatismo e Conhecimento 2 DIREITO PENAL Havendo a lesão ao bem protegido a sanção abstrata, através do processo legal transforma-se em efetiva atuando sobre o infrator. É ciência cultural normativa, valorativa e finalista - Normativo - porque o direito positivo tem como objeto a norma. - Valorativo - porque estabelece a sua própria escala de valores. Valoriza as suas próprias normas. - Finalista - porque visa a proteção dos bens jurídicos fundamentais, como garantia de sobrevivência da ordem jurídica. Eugenio Zaffaroni - O Direito Penal é predominantemente sancionador e excepcionalmente constitutivo. - Sancionador porque protege a ordem jurídica cominando sanções, penas. Sancionador no sentido que não cria bens jurídicos, mas acrescenta a tutela aos já existentes. - Constitutivo porque protege bens e interesses não regulamentados por outras áreas do Direito. FUNÇÃO DO DIREITO PENAL: O Direito Penal trata-se de um instrumento para a convivência dos homens em sociedade possuindo, deste modo, importantes funções. a) Direito Penal como proteção de bens jurídicos: Tem a função de proteger valores ou interesses reconhecidos pelo Direito e imprescindíveis à satisfação do indivíduo ou da sociedade. O legislador seleciona, em um Estado Democrático de Direito, os bens especialmente relevantes para a vida social e, por isso mesmo, merecedores da tutela penal. b) Direito Penal como instrumento de controle social: Reserva ao Direito Penal o controle social ou a preservação da paz pública, compreendida como a ordem que deve existir em determinada coletividade. c) Direito Penal como garantia: O Direito Penal tem a função de garante, de escudo aos cidadãos, uma vez que só há punição quando ocorre a violação de uma norma previamente determinada em lei como crime. Por esse motivo Von Liszt dizia: “O Código Penal é a Magna Carta do delinquente”. d) Função ético-social do Direito Penal: Também conhecida como função criadora ou configuradora dos costumes, tem origem na estreita vinculação existente tradicionalmente entre a matéria penal e os valores éticos fundamentais de uma sociedade. Desempenha uma função educativa em relação aos cidadãos, fomentando valores ético-sociais, mesmo no tocante a bens que ainda não tenham sido assumidos pela sociedade como fundamentais. e) Função simbólica do Direito Penal: Essa função é inerente a todas as leis, não se limitando somente às de cunho penal. Produz efeitos apenas na mente dos governantes e dos cidadãos, repassando para os primeiros a sensação de terem feito algo para a proteção da paz pública e aos segundos, a impressão de que o problema com a criminalidade está sob o controle das autoridades. Esse símbolo manifesta-se, comumente, no Direito Penal do Terror, que se verifica com a inflação legislativa, criando figuras penais desnecessárias e exageradas, com o aumento desproporcional e injustificado das penas (hipertrofia do Direito Penal). f) Função motivadora do Direito Penal: O Direito Penal motiva os indivíduos a não violarem suas normas, mediante a ameaça de imposição cogente de sanção na hipótese de ser lesado ou colocado em perigo determinado bem jurídico. g) Função da redução da violência estatal: O Direito Penal moderno apresenta uma nova função, qual seja reduzir ao mínimo a própria violência estatal já que a imposição de pena representa uma agressão aos cidadãos. Desta forma,busca-se a incriminação de condutas somente nos casos estritamente necessários, em homenagem ao direito de liberdade constitucionalmente reservado a todas as pessoas. h) Função promocional do Direito Penal: O Direito Penal não deve preocupar-se em manter os valores da sociedade em que se insere. Ao contrário, deve ser um instrumento de transformação social, contribuindo para a dinamização da ordem social e promo- vendo as mudanças estruturais necessárias para a evolução da comunidade. 1.2 PRINCÍPIOS BÁSICOS DO DIREITO PENAL. Princípios relacionados com o agente do fato: Princípio da RESPONSABILIDADE PESSOAL – Através deste princípio proíbe-se castigo penal pelo fato de outrem. O castigo penal é sempre individualizado. Não existe no direito penal responsabilidade coletiva. Esse é o desdobramento lógico do princípio da individualização da pena que ainda veremos. Este princípio proíbe denúncias genéricas, vagas e imprecisas (denúncia aqui, é a peça inicial da ação penal pública). A denúncia tem que descrever o comportamento e a responsabilidade de cada um principalmente nos crimes societários. Se ela é genérica e im- precisa, que coloca no polo passivo todos os diretores de uma empresa, ela fere o princípio da responsabilidade pessoal. É ressuscitar uma responsabilidade coletiva. Didatismo e Conhecimento 3 DIREITO PENAL Esse princípio também é usado para questionar a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Para muitos, a responsabilidade penal da pessoa jurídica é coletiva. Princípio da RESPONSABILIDADE SUBJETIVA – Não basta que o fato seja materialmente causado pelo agente, só poden- do ser responsabilizado se o fato foi querido, aceito ou previsível. Não há responsabilidade sem dolo ou culpa. Só tem sentido castigar fatos desejados ou previsíveis. É usado para negar a responsabilidade penal da pessoa jurídica porque pessoa jurídica não tem vontade própria. Neste princípio da responsabilidade subjetiva, a exemplo da responsabilidade pessoal, é também usado para negar a responsabilidade penal da pessoa jurídica porque ela nada quer, nada aceita ou nada controla. Princípio da CULPABILIDADE – o princípio da responsabilidade subjetiva não se confunde com o da culpabilidade e o prin- cípio da responsabilidade pessoal é diferente da responsabilidade subjetiva. - Responsabilidade pessoal significa que eu não posso ser punido por fato de outrem. - Responsabilidade subjetiva significa que eu não posso ser punido por fato não aceito, querido ou previsível. E o que vem a ser princípio da culpabilidade? Quando cai isso em concurso, 90% respondem que não há crime sem dolo ou culpa. Mas isso é responsabilidade subjetiva. Quais são os elementos da culpabilidade? A culpabilidade é formada pelo quê? Imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e inexigibilidade de conduta diversa. – isso significa dizer o seguinte: não há responsabilidade penal sem a presença de um agente capaz, com potencial consciência da ilicitude e de quem se poderia exigir conduta diversa. “Responsabilidade penal pressupõe agente capaz, com potencial consciência da ilicitude, sendo dele exigível conduta diversa.” Princípio da IGUALDADE – Todos são iguais perante a lei. A igualdade postulada aqui não é uma igualdade formal, mas sim uma igualdade material. Ou seja, tratar os iguais de maneira igual e os desiguais de maneira desigual na medida das suas desigual- dades. É possível haver distinções justificadas. Há certas pessoas que, no regime aberto, cumprem pena em casa (pela idade, pela condição física, etc). Esse postulado também está na Convenção Interamericana de Direito Humanos, art. 24: Artigo 24º - Igualdade perante a lei Todas as pessoas são iguais perante a lei. Por conseguinte, têm direito, sem discriminação, a igual proteção da lei. Há duas aplicações práticas importantes para este princípio. A lei n.º 9.099/85 tratou dos Juizados Especiais Estaduais considerou crime de menor potencial ofensivo aquele com pena máxima abstrata não superior a 1 ano. E exige ainda que tenha rito comum. Essa lei disse que se a pena máxima abstrata suplanta 1 ano ou se apesar de não suplantar um ano tem rito especial, não se considera para ser aplicada. Desacato, por exemplo, art. 331, no Código Penal, não era de menor potencial ofensivo que sua pena máxima (6 meses a 2 anos) suplantava o teto. Veio a lei 10.259/01, que regulamentou os Juizados especiais Federais. E essa lei conceituou ação de menor ofensivo aquela com pena máxima abstrata não superior a 2 anos. E aí, a pergunta: o desacato, tendo pena de 6 meses a 3 anos é de menor potencial ofensivo na Justiça Federal. Na Justiça Esta- dual é de médio potencial ofensivo. Isso é constitucional? Não, porque o fato é o mesmo. Princípio da isonomia. A gravidade do fato é exatamente a mesma. Só muda o órgão julgador. Mas o fato de mudar o órgão julgador, não justifica essa diferença. Então, nesse ponto, a lei 10.259/01 revogou a Lei nº 9.099/95. Por quê? Porque o fato é o mesmo. A gravidade do crime é exatamente a mesma. Só muda o órgão julgador. Mas não é diferença que justifique o tratamento diferenciado. Vejam que por conta disso, o desacato é de menor potencial ofensivo nas duas Justiças. Princípio da PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA – Todos devem ser presumidos inocentes até trânsito em julgado de sentença condenatória. Esse princípio tem guarida constitucional: art. 5º, LVII: LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; Mas a nossa CF traz o princípio da presunção de inocência? Mirabete há tempos já alertava que a Constituição Federal não traz o princípio da presunção de inocência, ela traz o princípio da presunção da presunção de não-culpa. Em nenhum momento a Consti- tuição diz que alguém deve ser presumido inocente. A Constituição só não permite considerá-lo culpado. Mas isso não é só um jogo de palavras? Não. Um país que adota o sistema de prisão provisória, de prisão temporária, preventiva, é mais coerente com presunção de não-culpa do que com presunção de inocência. Presumir inocente até o trânsito em julgado é raciocínio incompatível com essas formas de prisão. Presunção de inocência é compatível com abolir o sistema de prisão cautelar. Didatismo e Conhecimento 4 DIREITO PENAL A maioria coloca os dois como sinônimos. E é correto colocar os dois como sinônimos? Se lembrarmos que o art. 8º, 2, da Con- venção Interamericana de Direitos Humanos faz isso, então vamos usar os dois como sinônimos. Se a Constituição prevê o princípio da presunção de não-culpa, a Convenção prevê o princípio da presunção de inocência. Artigo 8º - Garantias judiciais: 2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: A convenção é expressa: o princípio aqui é o da presunção de inocência. O art. 594 do CPP revogado pela lei 11.719/08, dizia o seguinte: Art. 594. O réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se condenado por crime de que se livre solto. Este artigo estava cobrando “pedágio” para recorrer: o recolhimento à prisão. E isso é ferir o princípio da presunção de inocência ou de não-culpa. O STF já havia declarado esse artigo como não recepcionado pela Constituição. Veio a lei 11.719 e aboliu esse artigo porque feria o princípio da presunção de inocência ou não-culpa. Pergunta: “É possível no processo penal execução provisória?” Antes do trânsito em julgado já posso executar? Uma pessoa com condenação provisória já pode começar a cumprir a pena? Há que se diferenciar duas situações: • Condenado provisório preso – se ele recorreu, mas está preso, é possível execução provisória. Nesse sentido, Súmula 716, do STF (Também a Resolução 19, do CNJ): Súmula 716: “Admite-se aprogressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.” Note-se que permite a progressão de regime antes do trânsito em julgado sentença penal condenatória. “Já que estou preso e está demorando para julgar o meu recurso e eu já cumpri 1/6 da pena, quero progredir”. • Condenado provisório solto – não admite execução provisória porque trata-se de ofensa ao princípio da presunção de ino- cência, ao princípio da presunção de não-culpa. E se quanto a esse condenado provisório está pendente somente recurso especial ou recurso extraordinário, isto é, a matéria já foi julgada e confirmada pelos tribunais. Um condenado provisório que só tem pendente recurso especial ao STJ ou extraordinário ao STF. Se ele está aguardando apenas a solução desses recursos, já pode executar a pena ou não? Ele foi condenado em primeiro grau, o tribunal confirmou. Ele pode já pode ser preso ou tem que aguardar o julgamento do recurso especial, extraordinário que, aliás, nem analisam matéria de fato, só de direito? Ele está solto. Duas correntes: • 1ª Corrente – Com fundamento no art. 637, do CPP, admite execução provisória. Para essa corrente, tem que estar preso. Por que? Porque o RE e o REsp não têm efeito suspensivo e pode iniciar a execução. Art. 637. O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença. • 2ª Corrente (STF) – Com fundamento na LEP e na Constituição Federal, não admite execução provisória por ofensa ao princípio da presunção de inocência. O CPP é de 1941, a LEP é de 1984 e respeita a presunção de inocência. A Constituição é de 1988 e garante a presunção de inocência. O art. 637 do CPP está ultrapassado. Ele não tem aplicação para o réu solto. A primeira corrente tinha 5 votos no STF e a segunda corrente tinha 5 votos. O STF agora, tem só 4 votos para a primeira e 7 votos para a se- gunda. O Supremo levou o caso ao Pleno e por 7 votos a 4, ficou com a segunda corrente que, hoje é a posição segura. O STJ pende pra primeira corrente. Princípios relacionados com a pena: Princípio da PROIBIÇÃO DA PENA INDIGNA – A ninguém pode ser imposta pena ofensiva à dignidade da pessoa humana. Está previsto na Convenção Interamericana de Direitos Humanos, art. 5º, 1: Artigo 5º - Direito à integridade pessoal - 1. Toda pessoa tem direito de que se respeite sua integridade física, psíquica e moral. Princípio da HUMANIDADE ou da HUMANIZAÇÃO DA PENA – Nenhuma pena pode ser cruel, desumana e degradante. Também está na Convenção: 5º. 2: Didatismo e Conhecimento 5 DIREITO PENAL Artigo 5º - Direito à integridade pessoal - 2. Ninguém deve ser submetido a torturas nem a penas ou tratamentos cruéis, desu- manos ou degradantes. Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com respeito devido à dignidade inerente ao ser humano. Esses dois princípios complementares, o da proibição da pena indigna e o da humanização da pena, caíam em concurso na época que se tinha o tal regime integral fechado. Por quê? Porque regime integralmente fechado era uma pena indigna, desumana, degradante. Hoje, esse regime, além de ter sido declarado inconstitucional, foi abolido pela lei 11.464/07. Hoje, não cai mais regime integralmente fechado. O que o examinador vai perguntar hoje para explorar esses dois princípios? Regime Disciplinar Diferenciado. Esses dois princí- pios vão estar focados no RDD. Princípio da PROPORCIONALIDADE - “A pena deve ser proporcional à gravidade da infração penal”. Esse princípio não está explícito na Constituição. É um princípio constitucional implícito, desdobramento lógico do princípio da individualização da pena. Aprendemos a estudar esse princípio apenas sob o ângulo da “proibição do excesso”, isto é, evitar a hipertrofia da punição. Fo- mos ensinados a estufar esse princípio apenas quando a pena é desproporcional, quando há uma hipertrofia da punição. Mas esse princípio tem um segundo ângulo que é o da proibição da insuficiência da intervenção estatal que é justamente evitar a punição insignificante, incapaz de atender ao princípio da pena. O art. 319- A traz o mais novo crime praticado por funcionário público contra a Administração Pública: Art. 319-A. Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo: (Incluído pela Lei nº 11.466, de 2007). “Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. Quem esse artigo pune? Aquele que deixa passar o celular para os presos. Essa pena é insuficiente, insignificante para atender ao fim da pena. Ninguém fica inibido diante de um tipo como esse que acaba em cesta básica. Então, o art. 319 -A também fere o princípio da proporcionalidade, mas sob outro ângulo que é o da insuficiência da intervenção estatal. Esse ângulo do princípio da proporcionalidade não permite ao juiz não aplicar a pena. Tem juiz que não aplica a pena por ser excessiva. Mas este caso só serve de alerta para o legislador. O juiz não pode aplicar uma pena mais severa. Isso é analogia in malam partem. Isso é legislar sem ser legislador, criar pena sem lei. Este ângulo, pois, só serve de alerta para o legislador. Princípio da PESSOALIDADE DA PENA – Esse princípio tem base constitucional, no art. 5º : XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; Este princípio é absoluto ou relativo? Admite ou não admite exceções? Pode a pena passar da pessoa do condenado? • 1ª Corrente – o princípio da pessoalidade é relativo, isto é, admite exceção prevista na própria Constituição, qual seja a pena do confisco, que pode passar da pessoa do ofensor. Onde que essa primeira corrente não acerta? Ela está chamando isso de pena. Isso são “efeitos da condenação”. • 2ª Corrente – esse princípio é absoluto. Não admite exceções. Confisco não é pena. É efeito da condenação. Maioria: Mira- bete, Luiz Flávio Gomes. Está na Convenção Interamericana de Direitos Humanos. É o que diz o seu art. 5º.3, sem ressalvar qualquer exceção. Para a Convenção é um princípio absoluto: “3. A pena não pode passar da pessoa do delinquente.” Princípio da VEDAÇÃO DO BIS IN IDEM – é estudado sob três aspetos: a) Tem um significado processual – ninguém pode ser processado duas vezes pelo mesmo crime. b) Tem um significado material – ninguém pode ser condenado pela segunda vez em razão do mesmo fato. c) Tem um significado execucional – ninguém pode ser executado duas vezes por condenações relacionadas ao mesmo fato. Pergunta: A agravante da reincidência fere o princípio do ne bis in idem ou da vedação do bis in idem? O reincidente tem a pena agravada, mais severa do que a do primário. Isso fere o bis in idem? - 1ª Corrente – Para essa corrente ofende o princípio do ne bis in idem. Por que? Porque o juiz está considerando duas vezes o mesmo fato em prejuízo do réu. Você no passado foi condenado por roubo a uma pena de 6 anos. No presente, você é condenado por estupro. O juiz já considerou o roubo uma vez para condená-lo e agora está considerando o roubo por uma segunda vez para agravar a pena do estupro. Ou seja, ele considerou duas vezes o roubo em prejuízo do mesmo réu, bis in idem. Quem adota? Luiz Flávio Gomes, Paulo Queiroz e Paulo Rangel. Didatismo e Conhecimento 6 DIREITO PENAL - 2ª Corrente – Para essa corrente não ofende o princípio do ne bis in idem. Por que? Como eu consigo defender a constitu- cionalidade do agravante? Da reincidência? Através do princípio constitucionalda individualização da pena. É o STJ que diz isso. Entenderemos a segunda corrente segundo o STJ: “O fato de o reincidente ser punido mais gravemente que o primário não viola a Constituição Federal nem a garantia do ne bis in idem, pois visa tão-somente reconhecer maior reprovabilidade na conduta daquele que é contumaz violador da lei penal.” Este argumento serve para todos, menos para Defensoria. Princípio da LEGALIDADE Art. 1º, do Código Penal – Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.” Art. 5º, XXXIX, da CF: Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; A Constituição repetiu o art. 1º do Código Penal. Essa garantia traz qual princípio: legalidade ou reserva legal? O que é correto dizer? 1ª Corrente – Essa primeira corrente trabalha com as duas expressões como sinônimos. Trata a legalidade e reserva legal como sinônimos. 2ª Corrente – Princípio da legalidade não se confunde com princípio da reserva legal. Para essa segunda corrente, o princípio da legalidade toma a expressão lei em seu sentido amplo, abrangendo todas as espécies normativas do art .59, da CF. Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de: I - emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias; IV - leis delegadas; V - medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - resoluções. Já a reserva legal, toma a expressão lei no seu sentido estrito, abrangendo somente, lei ordinária e lei complementar. Portanto, de acordo com a segunda corrente, o Código Penal no seu art. 1º e a Constituição Federal no art. 5º, XXXIX, adotaram a reserva legal. 3ª Corrente – Essa corrente diz que o princípio da legalidade nada mais é do que anterioridade + reserva legal. O princípio da legalidade só existe se temos reserva legal somada à anterioridade. Para a 3ª corrente o CP adotou sim, o princípio da legalidade por- que junto com a reserva legal exige respeito à anterioridade. HOJE NA DOUTRINA PREVALECE ESSA TERCEIRA CORRENTE. Está previsto na CF, no Código Penal e na Convenção Interamericana de Direitos Humanos: Artigo 9º - Princípio da legalidade e da retroatividade - Ninguém pode ser condenado por ações ou omissões que, no momento em que forem cometidas, não sejam delituosas, de acordo com o direito aplicável. Tampouco se pode impor pena mais grave que a aplicável no momento da perpetração do delito. Se depois da perpetração do delito a lei dispuser a imposição de pena mais leve, o delinquente será por isso beneficiado. “O princípio da legalidade constitui uma real limitação ao poder estatal de interferir na esfera de liberdades individuais.” – Rogério Sanches Cunha O princípio da legalidade é garantia sua contra o arbítrio estatal. Origem do Princípio da Legalidade A doutrina é divergente: - 1ª Corrente – Entende que o princípio da legalidade vem do direito romano. - 2ª Corrente – Entende que veio da Carta de João Sem Terra (de 1215). - 3ª Corrente – É a que prevalece? O princípio da legalidade teve sua gênesis no iluminismo, sendo recepcionado pela Revolução Francesa. Fundamentos do Princípio da Legalidade - 1º Fundamento: POLÍTICO – O poder punitivo não pode ser arbitrário. Há exigência de vinculação do Poder Executivo e do Judiciário à lei formulada de forma abstrata. Estão vinculados ao que o legislador abstratamente criou. - 2º Fundamento: DEMOCRÁTICO – É desdobramento do fundamento político. Quando eu digo que o Executivo e o Judiciário estão vinculados à lei formulada pelo legislador, isso é respeito à divisão de poderes ou separação de funções. Cada Poder tem a sua função precípua. Isso significa que o parlamento, representante do povo, deve ser o responsável pela criação de crime. - 3º Fundamento: JURÍDICO – Uma lei prévia e clara produz importante efeito intimidativo. A Contravenção Penal, a Medida de Segurança e o Princípio da Legalidade Art. 1º, CP: Não há crime sem lei anterior que o defina. E a contravenção penal? Também está garantida pelo princípio da legalidade ou não? Apesar de a Lei de Contravenções Penais não trazer um artigo como esse do Código Penal, ele é aplicado subsidiariamente. Onde está escrito “crime”, colocar “infração pe- nal”, que abrange contravenção: Não há infração sem lei anterior que o defina. A pena de que trata o princípio da legalidade do art. 1º, do CP, (“não há pena sem prévia cominação legal”) abrange medida de segurança? - 1ª Corrente – Não abrange medida de segurança, pois esta não tem finalidade punitiva, mas sim curativa. A medida de segu- rança só quer curar, não está garantida pela legalidade. Pode ter medida de segurança via lei delegada, por exemplo. Ultrapassada. - 2ª Corrente – Abrange medida de segurança, pois também é espécie de sanção penal. O art. 3º, do Código Penal Militar foi recepcionado pela Constituição? Didatismo e Conhecimento 7 DIREITO PENAL Art. 3º As medidas de segurança regem-se pela lei vigente ao tempo da sentença, prevalecendo, entretanto, se diversa, a lei vigente ao tempo da execução. Esse artigo obedeceu a reserva legal? Sim, mas não respeitou a anterioridade, logo, não foi recepcionado. Ele respeita a reserva legal, mas pode ser a lei vigente ao tempo da sentença, ainda que mais danosa. Vejam que o art. 3º, do CPM respeita a reserva legal, mas ignora a anterioridade. Logo, não foi recepcionado. A Medida Provisória e o Princípio da Legalidade O princípio da legalidade é garantia. Para que o princípio da legalidade seja efetivamente uma garantia do homem contra a inge- rência arbitrária do Estado nas nossas esferas individuais, é preciso lembrar que princípio da legalidade significa: não há crime sem lei e que essa lei é lei em seu sentido estrito. Medida provisória pode criar crime? Claro que não. Medida provisória é ato do Executivo com força normativa, mas não é lei em sentido estrito. Então, não cria crime. A Medida provisória pode tratar de direito penal não incriminador? Ela não combina com direito penal incriminador. Mas e medida provisória pode versar sobre direito penal não incriminador, tratando, por exemplo, sobre causas extintivas da punibilidade? - 1ª Corrente (majoritária) – Medida provisória não pode versar sobre direito penal, não importando se incriminador ou se não incriminador. Medida provisória não combina com o direito penal. Essa corrente se fundamenta no art. 62 da CF que não diferencia sobre direito penal incriminador e direito penal não incriminador: § 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I - relativa a: (...) b) direito penal, processual penal e processual civil; - 2ª Corrente – Não é possível medida provisória incriminadora. Porém, incriminadora, admite. É possível medida provisória versando sobre direito penal não incriminador. Luiz Flávio Gomes. E as Resoluções do CNJ, do CNMP e do TSE, podem gerar crime? Esses são atos não legislativos com força normativa, logo, não podem criar crime e nem cominar pena. Não são leis em sentido estrito. Lei Delegada pode criar crime, pode cominar pena? O art. 68, § 1º, da CF, diz o que pode ou não uma lei delegada: § 1º - Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre: I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais; III - planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos. Está previsto aí o direito penal? Não. Mas não pode. Se a Constituição veda à lei delegada dispor sobre direitos individuais, não pode versar sobre direito penal. A lei em sentido estrito deve ser anterior aos fatos que busca incriminar. Quando eu exijo anterioridade, estou querendo evitar o quê? A retroatividadeda lei penal maléfica. A retroatividade benéfica é possível. Para que se tenha o princípio da legalidade como garantia não basta dizer que não há crime sem lei. Além dessa lei, deve ser ela anterior e deve ser lei em sentido estrito e escrita. Deve ser lei anterior e escrita. Quando se exige lei escrita, busca-se evitar costume incriminador. Eu não estou evitando costume. Para que se tenha o princípio da legalidade como garantia, não basta lei no seu sentido estrito, anterior e escrito. Tem que ser lei estrita. Quando se diz que essa lei anterior, escrita tem que ser estrita, o que se quer evitar é a analogia incriminadora. Não está vedando a analogia. Está vedando a maléfica. A benéfica é possível. Para que o princípio da legalidade seja realmente uma garantia é preciso ainda, além da lei em sentido estrito, anterior, escrita e estrita, que a lei seja certa. O que é lei certa? De fácil entendimento. Aqui se quer evitar ambiguidades. Uma expressão ambígua dá azo à arbitrariedade. Princípio da taxatividade ou da determinação. A lei tem que ser certa. Art. 20, da Lei 7.170/83 (Crimes Contra a Segurança Nacional): Art. 20 - Devastar, saquear, extorquir, roubar, sequestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas. Pena: reclusão, de 3 a 10 anos.” Essa é uma lei em sentido estrito? É. É anterior? Sim. É anterior? É. É escrita? É. É certa? O que é ato de terrorismo? Ato de terrorismo não é certo, não é claro, não está determinado. Isso fere o princípio da legalidade. O crime existe, mas não é taxativo, determinado. Para falar em princípio da legalidade tem que falar nisso tudo (anterior, escrita, estrita, certa) e ainda tem que falar na necessidade. Ela, além de tudo isso, tem que ser necessária. Isso para evitar a hipertrofia do direito penal. Isso é desdobramento da intervenção mínima. Didatismo e Conhecimento 8 DIREITO PENAL O princípio da legalidade é o pilar, a viga-mestra do garantismo. Quando se fala em princípio da legalidade se está falando em poder punitivo versus garantia do cidadão. Garantismo é reduzir ao máximo o poder punitivo do Estado, dando ao cidadão o máximo de garantias. É o mínimo poder puni- tivo versus máximo de garantia. O Princípio da Reserva Legal e a Lei Penal em Branco Como fica o princípio da reserva legal diante da lei penal em branco? O que é lei penal em branco? A lei penal pode ser completa e incompleta. 1. Lei penal completa – dispensa complemento normativo (dado pela norma) ou valorativo (dado pelo direito). O homicídio é um exemplo: “matar alguém”. 2. Lei penal incompleta – ela depende de complemento normativo ou valorativo. Aqui a coisa pega porque a lei penal incom- pleta se divide em: a) Norma penal em branco – depende de complemento normativo, ou seja, depende de complemento dado por outra norma. E a norma penal em branco pode ser: - Própria (ou heterogênea) – ou em sentido estrito. Quando o complemento normativo não emana do legislador. Por isso é tam- bém chamada de heterogênea. Exemplo: Lei de Drogas. Porque o que vem a ser drogas é um complemento dado pelo Executivo. - Imprópria (ou homogênea) – ou em sentido amplo. Aqui o complemento normativo emana do legislador. Por isso é também chamada de homogênea. Lei complementa lei. Subespécies da norma penal em branco em sentido amplo, homogênea: - Homóloga (ou homovitelina): complemento emana da mesma instância legislativa: Lei penal complementada pela própria lei penal. Exemplo: Conceito de funcionário público no crime funcional. - Heteróloga (ou heterovitelina): complemento emana de instância legislativa diversa. É a lei penal sendo complementada, por exemplo, pela lei civil. Exemplo: Art. 236, do Código Penal (fala em impedimento e preciso do Código Civil para saber o que é impedimento): Art. 236 - Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe impedimento que não seja casamento anterior: Pena - detenção, de seis meses a dois anos. Já vimos todas as espécies de norma penal em branco que depende de complemento normativo. Está faltando falar do comple- mento valorativo, chamada tipo aberto. b) Tipos abertos – dependem de complemento valorativo, ou seja, depende de complemento dado pelo juiz. Exemplo: crime culposo. Todo crime culposo é tipo aberto. O juiz é que vai valorar. Norma penal em branco fere o princípio da legalidade? 1ª crítica – Fere a taxatividade, porque ela não é certa. Quando a lei fala em droga e não explica o que é droga, fere a taxatividade. Quando fala em “impedimento” e não diz o que é isso, fere a legalidade. Enquanto não complementada, não tem eficácia jurídica. Enquanto não for complementada não é sequer lei para ser obedecida. 2ª crítica – Norma penal em branco em sentido estrito, isto é, complemento do Executivo, por exemplo, fere a legalidade, mais precisamente seu fundamento democrático. Quem faz essa crítica é Rogério Greco. Quem está, em última análise, dizendo o que é crime e o que não é crime é o Executivo. Como rebato essa crítica? O legislador deixa o executivo criar aspectos secundários. Na norma penal em branco (NPB) em sentido estrito o legislador já criou o tipo penal incriminador com todos seus requisitos básicos, limitando-se a autoridade administrativa a explicitar esses requisitos. O legislador já falou tudo (sujeito ativo, passivo, tipo, etc.), o Executivo só complementa. 1.3 RELAÇÕES COM OUTROS RAMOS DO DIREITO. Sabemos que o Direito é uno, indivisível, uma vez que a sua ramificação em áreas distintas constitui mera simplificação para fins didáticos. Dessa forma, há correlação nos estudos de âmbitos jurídicos diferentes, interessando constatar alguns deles: a) Direito Penal + Direito Processual Penal: O processo penal é o instrumento adequado para o exercício da jurisdição do direito penal. É o meio pelo qual as normas penais se concretizam em sua aplicação, incidindo, no caso concreto, a justiça das leis penais. Didatismo e Conhecimento 9 DIREITO PENAL b) Direito Penal + Direito Constitucional: As regras e princípios constitucionais são os parâmetros de legitimidade das leis penais e delimitam o âmbito de sua aplicação. O Direito Penal deve harmonizar com as garantias estabelecidas pela Constituição Federal, estabelecendo como criminosas aquelas condutas que violam valores constitucionalmente consagrados (teoria constitu- cionalista do delito). c) Direito Penal + Direito Administrativo: É o conjunto de princípios e normas que regulam a organização e o funcionamento da Administração Pública. O Direito Penal tutela esse valor estabelecendo os crimes contra a Administração Pública (CP, arts. 312 e 359). Também o Direito Administrativo se socorre aos conceitos de dolo e culpa do direito penal nas ocorrências de ilícitos adminis- trativos. d) Direito Penal + Direito Civil: Nítida se faz a correlação entre as doutrinas penais e civis nos casos de crimes contra o patrimônio, em que conceitos como propriedade, posse, detenção e coisa são utilizados em comum. Também os crimes contra o casamento dependem das regras de Direito de Família. Há uma diferença de grau e não de essência. A gravidade do bem jurídico ferido atuará o direito, na esfera penal ou civil, a exemplo do crime de dano (CP, art. 163), que pode ensejar sanção penal, ou, se menor a gravidade, reprimenda civil (CC, art. 186). e) Direito Penal + Direito Internacional: Fala-se, hodiernamente, no tema Direito Penal Internacional e em crimes internacio- nais, como corolário do desenvolvimento tecnológico e da globalização, fatores modernos que permitem um contato próximo e acele- rado entre pessoas que estão espacialmente distantes entre si. 1.4 DIREITO PENAL E POLÍTICACRIMINAL. A Política criminal é vista como “conjunto sistemático de princípios e regras através dos quais o Estado promove a luta de pre- venção e repressão das infrações penais.” Para Claus Roxin “a questão pertinente a como devemos proceder quando há infringência das regras básicas de convivência social, causando danos ou pondo em perigo os indivíduos ou a sociedade, conforma o objeto cri- minal”. A capacidade de o sistema sancionatório resolver os problemas que lhe são destinados depende muito das investigações empí- ricas sobre os instrumentos e a forma de utilizá-los. É a Criminologia que, fundamentalmente, fornece base para as investigações acerca da melhor forma de resguardar a sociedade contra a violência, sendo, portanto, de capital importância as suas conclusões. Como “ciência empírica do delito, [a Criminologia] traz os imprescindíveis dados acerca do fenômeno criminal e das suas diversas instâncias (delinquente, vítima, aparatos do controle social)”. Também é com base nos estudos criminológicos que se poderá concluir pela redução, ou não, dos efeitos danosos do Direito penal, ou seja, de seu quantum de violência, sem que isso implique perda de efeito integrador, com incremento da violência social, aumentando a taxa de delitos ou de fenômenos de vingança privada. A Política criminal, dentro desse contexto, depende do conhecimento empírico da criminalidade, dos seus níveis e das suas causas (JORGE DE FIGUEIREDO DIAS), objetos que são da Criminologia. É sua a tarefa de transformação das teorizações da Criminologia em opções e estratégias de controle da criminalidade a serem utilizadas pelo Estado. A moderna Política criminal (de base criminológica), “opera mediante a valoração (desde concretas perspectivas jurídico-polí- ticas) dos dados empíricos recolhidos pela Criminologia”. É com fundamento em tais valorações que se deve construir, aplicar, ela- borar e criticar o Direito penal. A Política criminal deve operar tanto no plano do direito a constituir como no do direito constituído. Tanto a Política criminal quanto o Direito penal devem ser estruturados a partir dos postulados constitucionais. É aqui que entram em cena os princípios constitucionais-penais, explícitos ou implícitos. Na segunda categoria (princípios constitucionais implícitos), incluem-se todos aqueles que decorrem (a) do regime político conformado constitucionalmente e (b) dos princípios expressamente adotados pela Constituição, bem como (C) dos tratados internacionais em que o Brasil seja parte (§ 2º, art. 5º, CF). Didatismo e Conhecimento 10 DIREITO PENAL 2 A LEI PENAL. 2.1 CARACTERÍSTICAS, FONTES, INTER- PRETAÇÃO, VIGÊNCIA E APLICAÇÃO. CARACTERÍSTICAS DA LEI PENAL: Exclusividade - A norma penal é exclusiva porque somente ela define infrações e impõe penas. Imperatividade - Em relação à imperatividade, a norma penal é autoritária por sujeitar quem descumprir o seu mandamento. Ela separa e define o lícito do ilícito penal. Quem incorrer no ilícito penal receberá as consequências jurídico-criminais conhecidas como penas. Todos devem obedecer as leis penais. Todas as leis e as normas penais são imperativas. A prática do fato típico faz surgir a relação jurídica punitiva que significa o aparecimento do direito concreto de punir do Estado e a obrigação do indivíduo de não obstar a aplicação da pena. Nos casos de normas penais permissivas como o caso da legítima defesa, acontece inversão nos polos da relação jurídica entre o sujeito e o Estado, cabendo a este último reconhecer os efeitos da excludente da antijuridicidade. Generalidade - A norma penal tem eficácia erga omnes, ou seja, para todas as pessoas. Explica Damásio que mesmo os considerados inimputáveis devem obedecer ao mandado proibitivo da norma penal incrimina- dora. Abstração e Impessoalidade - A norma penal dirige-se a fatos futuros, vez que não existe crime sem lei anterior que o defina como tal. A norma penal não é feita para indivíduos determinados FONTES DO DIREITO PENAL: Quando estudo fontes do direito penal, eu estudo a origem, o lugar de onde vem e como se exterioriza a norma jurídica. É esse o estudo das fontes do direito penal. São duas as espécies de fontes do direito penal: 1. Fonte MATERIAL – quando se fala em fonte material, a referência que se faz é à fonte de produção. Isto é, o órgão en- carregado de criar direito penal, o ente encarregado de criar o direito penal. Qual é esse ente encarregado de criar o direito penal no Brasil? É a União – art. 22 (Compete privativamente à União), I, da CF e, excepcionalmente, os Estados (art. 22, § único). Somente a União cria direito penal, mas pode por lei complementar autorizar os Estados a legislarem sobre o assunto desde que, obviamente, em questões de interesse local ou específico. 2. Fonte FORMAL – quando se fala em fontes formais, a referência que se faz é às fontes de revelação, ou seja, a forma de exteriorização do direito penal. Atenção: a fonte material seria a fábrica, a fonte formal, o veículo de revelar o que lá é fabricado. A doutrina clássica divide a fonte formal em: 2.1. Fonte Formal Imediata – Lei. 2.2. Fontes Formais Mediatas – Costumes e Princípios Gerais do Direito. O que são os costumes? “Costumes são comportamentos uniformes e constantes pela convicção de sua obrigatoriedade e neces- sidade jurídica.” É isso que estudaremos agora, os costumes dentro do direito penal. O costume pode criar um crime? Costume comina pena? Claro que não! Apensa a lei cria crime e comina pena. Não existe cos- tume incriminador. Isso é básico. Isso fere o princípio da reserva legal. Não existe no Brasil princípio incriminador. E o contrário? Costume revoga crime? Costume revoga pena? Se o princípio da legalidade (art. 1º, CP) diz que a criação de um crime e a cominação de pena estão sob o império da lei, eu quero saber se a lei também tem a exclusividade na revogação de crime e pena. O art. 1º diz: “Não há crime sem lei anterior que o defina, não há pena sem prévia cominação legal.” Então, costume não cria crime e costume não cria pena. Mas e o contrário? É possível um costume abolicionista, revogador?? COSTUME ABOLICIONISTA, REVOGADOR – É POSSÍVEL? - 1ª Corrente – “Admite-se o costume abolicionista, aplicado nos casos em que a infração penal não mais contraria o interesse social, não mais repercute negativamente na sociedade.” – a primeira corrente admite o costume abolicionista quando o fato perde seu interesse para a sociedade, deixa de incomodar o meio social. - 2ª Corrente – “Não existe costume abolicionista, mas quando o fato já não é mais indesejado pelo meio social, a lei deixa de ser aplicada.” Essa corrente não abole a lei. O costume só evita que a lei seja aplicada. Na primeira corrente, o costume aboliu a lei (o Congresso não precisa). Essa corrente diz que quem vai abolir a lei é o congresso. O costume só evita que a lei seja aplicada. Didatismo e Conhecimento 11 DIREITO PENAL - 3ª Corrente – “Não existe costume abolicionista. Enquanto não revogada por outra lei, a norma tem plena eficácia.” Prevalece a 3ª CORRENTE, que está, inclusive, de acordo com a Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. Luiz Flávio Gomes adota a segunda corrente. Um exemplo de um costume que tenha interferido na aplicação da lei penal? Quan- do se pensa em adultério, se está dizendo que adultério é um costume. O costume age quando aquele comportamento deixou de ser indesejado pelo meio social. O adultério não deixou de ser indesejado pelo meio social, não é costume e não é aceito. O adultério sumiu, não por ser um costume. Um exemplo de infração penal sem aplicação por conta do costume é o jogo do bicho. Se o costume não cria crime e não comina pena, não revoga crime e não revoga pena, para que serve o costume no direito penal? Função importantíssima do costume no direito penal: costume interpretativo. O costume é importantíssimona interpretação. Para aclarar o sentido de uma palavra, expressão ou frase. É o costume interpretativo, aclarando o significado de uma palavra, expressão ou tipo. Quem dá um exemplo que não seja “mulher honesta” porque não há mais a expressão “mulher honesta” no Código Penal? Art. 155, § 1º, do Código Penal: “aumenta-se a pena do furto se o crime é praticado durante o repouso noturno.” O que é repouso noturno? Depende do costume da localidade. Ninguém tem dúvida de que o repouso noturno na capital é diferente de uma cidade pacata do interior. Então, o costume vai interferir na majorante. Se o costume não tem interesse na criação de tipos e penas, na revogação de tipos e penas, o costume é importante na revogação. PRINCÍPÍOS GERAIS DO DIREITO É o direito que vive na consciência comum de um povo. Vamos fazer um quadro comparativo: Antes da Emenda Constitucional de 2004 – a divisão das fontes ainda era feita da seguinte forma: • Fonte Formal Imediata – Lei • Fontes Formais Mediatas – Costumes e Princípios Gerais do Direito. Com a Emenda Constitucional de 2004, pergunta-se: • E a Constituição Federal? • E os tratados de direitos humanos? • Onde estão as súmulas? Jurisprudências em geral? Por não responder a essas perguntas, devemos construir um novo esquema. Vamos dividir as fontes em Fontes formais Imediatas – Lei (com uma observação: única capaz de regular a infração e a sua pena – é exclusiva na criação de crimes e cominação de penas); Constituição; Tratados Internacionais de Direitos Humanos; Jurisprudência (e aqui há uma espécie importante: Súmula Vinculante). Fontes formais Mediatas – Antes tínhamos os costumes e os princípios gerais do direito. Para a doutrina moderna, não. Fonte formal mediata é a própria doutrina. A corrente moderna diz o seguinte: costumes, princípios gerais de direito não positivados confi- guram, na verdade, fontes informais de direito. Essa é a tendência. FONTES IME- DIATAS FONTES MEDIATAS FONTES INFOR- MAIS Antes da EC/45 • Lei • Costumes • Princípios Gerais do Direito Depois da EC/45 Doutrina Moderna • Lei • Constituição • Tratados Internacionais de Direitos Humanos • Jurisprudên- cia • Doutrina • Costu- mes • Princí- pios Gerais do Direito Tratados Internacionais de Direitos Humanos Com relação aos tratados o alerta é o seguinte: Os tratados internacionais podem entrar no nosso ordenamento com dois status diferentes. Na pirâmide de Kelsen, a Constituição está no topo e é conformada pela chamada norma fundamental (que ele não conseguiu explicar o que é). Os tratados internacionais de direitos humanos entram como no nosso ordenamento jurídicos? Depende: Didatismo e Conhecimento 12 DIREITO PENAL Se ratificados por quórum especial, entram com status constitucional. Estamos na iminência de ter o primeiro tratado internacional com status constitucional. Qual é? Tratado de Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência. O Brasil acaba de ratificar com quórum especial. Só falta o decreto presidencial. Quando isso ocorrer, será o primeiro tratado com status constitucional no Brasil. Se ratificados por quórum comum, entram com status infraconstitucional, porém, supralegal, ou seja, superior à lei. Isso significa que a lei tem que obedecer à Constituição e também aos tratados supralegais. Uma lei ordinária que não observa a Constituição se sujeita ao controle de constitucionalidade. E a lei que não observa o tratado? Controle de convencionalidade. Se a lei não obedece a Constituição, você entra com uma ADI. Se a lei desobedece a um tratado com status supralegal, o controle é de convencionalidade que não compete ao supremo. Esse controle será sempre difuso e vai começar a existir. Vão perguntar: qual a diferença do controle de constitucionalidade do controle de convencionalidade? - Controle de constitucionalidade – é a lei afrontando a Constituição. Esse controle pode ser difuso ou concentrado. - Controle de convencionalidade – é a lei afrontado os tratados de direitos humanos de caráter supralegal. Esse controle só pode ser difuso. O Supremo acabou de decidir isso. Eis o tratamento dos direitos humanos no nosso ordenamento atualizadíssimo. INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL Interpretar a lei significa explicar ou aclarar o sentido de palavra, texto ou lei. A interpretação considera três pilares: - o sujeito que interpreta, - o modo como o sujeito interpreta e - o resultado a que o sujeito que interpreta chega. Vamos aos modos de interpretação: 1. Interpretação quanto ao SUJEITO que interpreta ou quanto à ORIGEM, pode ser: 1.1. Autêntica ou Legislativa – Aqui a interpretação é dada pela própria lei. Exemplo: conceito de funcionário público para fins penais. 1.2. Doutrinária – Dada pelos estudiosos. 1.3. Jurisprudencial – Dada pela reiteração de decisões num mesmo sentido. Não há nada de colidente em colocar a jurispru- dência como interpretação e como fonte imediata. Antes se dizia que, quanto ao sujeito nenhuma interpretação vincula o aplicador. Hoje, não. Hoje se sabe que a jurisprudencial é a única capaz de vincular. Quando? Quando retratado em súmula vinculante. Hoje, tem uma espécie de interpretação quanto ao sujeito que é capaz de vincular: que é a interpretação quanto ao sujeito espelhada em súmula vinculante. Pergunta: “A exposição de motivos do Código Penal, quanto ao sujeito, é qual espécie de interpretação?” Analisando a exposi- ção de motivos, vemos que não é dada por lei. Ela é dada pelos doutos que participaram do anteprojeto. Então, a exposição de motivos do Código Penal é doutrinária. Diferente do CPC, cuja interpretação é legislativa. É dada por uma lei. • Exposição de motivos do CP: interpretação doutrinária • Exposição de motivos do CPP: interpretação legislativa ou autêntica 2. Interpretação quanto ao MODO, pode ser: 2.1. Literal ou Gramatical – Leva em conta o sentido literal das palavras. Dizem que é a interpretação mais pobre que temos 2.2. Teleológica – Considera a intenção objetivada na lei. 2.3. Histórica – Recorre à origem da lei. 2.4. Sistemática – Interpreta-se a lei com o conjunto de leis em vigor no país. 2.5. Progressiva – Interpreta-se a lei considerando o progresso da ciência, da tecnologia e da medicina. Seu livro não vai falar dessa interpretação. Pergunta: “O termo “mulher” na lei Maria da Penha se estende aos transexuais?” Sim, desde que haja “ablação de órgão” e “alteração de registro”. É a posição de de Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves. 3. Interpretação quanto ao RESULTADO, pode ser: 3.1. Declarativa – A interpretação será declarativa quando a letra da lei corresponder exatamente à intenção do legislador. É exatamente àquilo que o legislador quis dizer. 3.2. Restritiva – Será restritiva quando se reduz o alcance da palavra da lei para chegar à intenção do legislador 3.3. Extensiva – Amplia-se o alcance da palavra para poder atingir a intenção do legislador. 3.4. Analógica – Na interpretação analógica, o significado que se busca é extraído do próprio dispositivo (existe norma a ser aplicada ao caso concreto). Leva-se em conta expressões genéricas e abertas utilizadas pelo legislador (exemplos seguidos de en- cerramento genérico do tipo). Está totalmente prevista no art. 121, § 2º: “Se o homicídio é cometido mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpe.” Na parte grifada, ele deu exemplo de torpeza. Na parte em negrito, fez o encerramento ge- nérico do tipo, permitindo ao juiz encontrar outras hipóteses. É o legislador confessando que não tem como prever todas as hipóteses torpes. Outro exemplo, ainda no art. 121: “o homicídio quando é praticado com emprego de veneno, fogo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel de que possa resultar perigo comum.” É um encerramento genérico, permitindo ao juiz encontrar outras hipóteses cruéis, de insídia. É o legisladoradmitindo que não tem condições de prever todas as hipóteses cruéis. Didatismo e Conhecimento 13 DIREITO PENAL Obs.: Tem gente que coloca interpretação progressiva aqui, quanto ao resultado. Não quanto ao modo, mas quanto ao resultado. Discordamos porque a progressiva é quanto ao modo: considerando-se o avanço da ciência. Pergunta: O Brasil proíbe interpretação extensiva? Tem alguma norma proibindo essa interpretação? Não. O Brasil não proíbe. Agora: Cabe interpretação extensiva contra o réu? Sim ou não?! Analisando a interpretação progressiva, estendeu-se o termo “mu- lher” ao transexual. E quanto a interpretação extensiva contra o réu? Cabe isso? 1ª Corrente: Interpretação restritiva – Não admite interpretação extensiva contra o réu. Essa primeira corrente, quando diz isso, vai lá no campo das provas, que tem um princípio importante, o do in dubio pro reo e toma emprestado esse princípio, que nasceu para dirimir dúvida na prova e vem sendo emprestado para outros campos. É um princípio que nasce e se aplica quando o juiz está na dúvida sobre se absolve ou condena. Está na dúvida quanto à prova. É um princípio no campo das provas. Na dúvida do alcance, reduz o alcance. Não amplia. Então, essa primeira corrente não admite a interpretação extensiva contra o réu, valendo-se de modo emprestado do princípio do in dubio pro reo que é um princípio de prova. Quem concorda com isso? Para quem concorda, ler o art. 157, § 2º, I: “No roubo a pena é aumentada de 1/3 até a metade se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma” O que é arma? Faca de cozinha é arma? Sim. Você entrega o relógio se alguém coloca uma faca de cozinha contra a sua barriga? Sim. Se você entende que não há interpretação extensiva contra o réu, a interpretação “arma” merece sempre uma interpretação restritiva, abrangendo somente instrumentos com finalidade bélica. Então olha o que é importante: a expressão arma gera indisfarçada contro- vérsia. Para essa 1ª corrente, só abrange arma em seu sentido próprio, ou seja, “instrumento fabricado com finalidade bélica.” Logo, para essa primeira corrente, abrange o quê? Revólver, etc. 2ª Corrente: Interpretação extensiva – Admite interpretação extensiva contra o réu. Para essa corrente, a expressão arma tem que ser tomada no seu sentido impróprio: “instrumento com ou sem finalidade bélica capaz de servir ao ataque.” Exemplo: faca de cozinha, espeto de rodízio. Reparem que a primeira corrente faz uma interpretação restritiva. A segunda corrente faz uma interpreta- ção extensiva. Ela amplia o alcance da expressão para chegar à vontade do legislador. Prevalece arma no sentido impróprio. Então prevalece o quê no Brasil? Que é possível interpretação extensiva contra o réu no Brasil. Luiz Flávio admite a interpretação extensiva em casos excepcionalíssimos. Apesar de a 1ª corrente não admitir, prevalece a in- terpretação extensiva contra o réu. No concurso da Defensoria Pública, bater na primeira corrente! A interpretação analógica não se confunde com a extensiva: - Interpretação extensiva – diante de uma palavra, o juiz amplia o seu alcance. Exemplo: “arma” são todos os instrumentos que possam servir ao ataque. - Interpretação analógica – exemplos + encerramento genérico. O legislador deu exemplo e eu vou encontrar casos semelhantes. E nenhum dos dois se confunde com analogia: ANALOGIA – “As hipóteses de interpretação acima expostas não se confundem com analogia (regra de integração – não de interpretação). Nesse caso, ao contrário das hipóteses anteriores, partimos do pressuposto de que não existe lei a ser aplicada ao caso concreto, motivo pelo qual socorre-se daquilo que o legislador previu para outro similar.” Na interpretação extensiva há lei. Você amplia o alcance de uma palavra. Na interpretação analógica, há lei, inclusive com encerramento genérico. E na analogia? NÃO HÁ LEI PARA O CASO CONCRETO! Você em um fato “a”, sem lei. O que você faz? Você empresta a lei feita para o caso “b”, similar. É possível analogia no direito penal? SIM. Desde que não incriminadora, desde que não prejudique o réu. A expressão “cônjuge” abrange o companheiro? Depende. Se ampliar, beneficia, então abrange. Se ampliar vai prejudicar, não abrange. VIGÊNCIA: VIDE ITEM 2.2 APLICAÇÃO DA LEI PENAL: Art. 1º: Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.” PRINCÍPIO DA LEGALIDADE Esse princípio foi reconhecido pela primeira vez em 1215, na Magna Carta, por imposição dos barões ingleses ao Rei João Sem- -Terra. Seu artigo 39 previa que nenhum homem livre poderia ser submetido à pena não cominada em lei local. Previsto também na Constituição Federal em seu artigo 5.º, XXXIX, tem por finalidade servir como garantia política ao cidadão contra o arbítrio estatal (freio à pretensão punitiva estatal). A doutrina majoritária o considera sinônimo do princípio da reserva legal. Discordamos desse posicionamento, pois estendemos que o princípio da legalidade compreende dois princípios distintos: o da reserva legal e o da anterioridade. Didatismo e Conhecimento 14 DIREITO PENAL Princípio da reserva legal Não há crime sem lei que o defina, nem pena sem cominação legal. Somente a lei pode descrever crimes e cominar penas. Podemos estudar o princípio da reserva legal sob dois aspectos: a) Formal • Reserva absoluta da lei: somente a lei no sentido estrito da palavra, emanada e aprovada pelo Poder Legislativo, por meio de procedimento adequado, poderá criar tipos e impor penas. A medida provisória, embora tenha força de lei, não é lei, pois não nasce no Poder Legislativo, logo, não pode veicular matéria penal. A Constituição Federal veda a adoção de medida provisória sobre matéria relativa a Direito Penal (artigo 62, § 1.º, inciso I, alínea “b”). Lei delegada também não pode abordar matéria penal, uma vez que o artigo 68, § 1.º, inciso II, da Constituição Federal, determina que não serão objeto de delegação as matérias referentes a direitos individuais. • Taxatividade: refere-se à necessidade da lei descrever o crime em todos os seus pormenores. A descrição da conduta crimi- nosa deve ser detalhada e específica. A lei não pode conter expressões vagas e de sentido equívoco, uma vez que fórmulas excessiva- mente genéricas criam insegurança no meio social, pois dão ao juiz larga e perigosa margem de discricionariedade. Essa proibição, entretanto, não alcança os crimes culposos, pois seria impossível ao legislador pormenorizar todas as condutas humanas ensejadoras da composição típica. Por isso, os tipos culposos são denominados tipos abertos e excepcionam a regra da descrição pormenorizada (quase todos os tipos dolosos são fechados). • Vedação ao emprego da analogia: o princípio da reserva legal proíbe o emprego da analogia em matéria de norma penal incriminadora. Essa é a analogia in malam partem. Não é vedado, entretanto, o uso da analogia in bonam partem, pois favorece o direito de liberdade, seja com a exclusão da criminalidade, seja pelo tratamento mais favorável ao réu. Exemplo de analogia in bonam partem: O Código Penal, no artigo 128, inciso II, não pune o aborto praticado por médico se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido do consentimento da gestante ou de seu representante, se incapaz. b) Material O tipo penal exerce também uma função seletiva, pois é por meio dele que o legislador seleciona, entre todas as condutas huma- nas, as mais perniciosas à sociedade. Em um tipo penal não podem constar condutas positivas que não representam qualquer ameaça à sociedade. Suponhamos, por exemplo, fosse criado o seguinte tipo penal: sorrir abertamente, em momentos de felicidade – pena de seis meses a um ano de detenção. Formalmente, estariam preenchidas todas as garantias do princípio da reserva legal. Esse tipo, entretanto, é inconstitucional, pois materialmente, a conduta incriminada não apresentaqualquer ameaça à sociedade. Nesses casos, o Poder Judiciário deve exercer controle de conteúdo do tipo penal, expurgando do ordenamento jurídico leis que descrevam como crimes fatos que não sejam materialmente nocivos à sociedade. O exercício deste controle pressupõe a aplicação de três princípios: • Adequação social: de acordo com este princípio, não podem ser considerados criminosos fatos socialmente adequados, con- dutas aprovadas pela coletividade (exemplo: jogador de futebol que machuca o adversário). Existem alguns obstáculos à aplicação deste princípio: -costume não revoga lei: ainda que leve a norma penal ao desuso, não pode revogá-la (artigo 2.º, caput, da Lei de Introdução ao Código Civil); - não cabe ao Poder Judiciário avocar para si a função típica do Poder Legislativo. • Insignificância: aplica-se aos chamados “delitos de bagatela”. Assenta-se no brocardo de minimis non curat praetor e na conveniência da política criminal. O tipo penal cuida do bem jurídico e da proteção do cidadão assim, se o delito for incapaz de ofender o bem jurídico, não haverá como enquadrá-lo no tipo. O princípio da insignificância não deve ser confundido com o prin- cípio da adequação social, pois um fato pode ser insignificante, em face de sua escassa lesividade, mas ser inadequado à sociedade. Atenção: Esse princípio não deve ser adotado nos concursos de ingresso à carreira do Ministério Público, pois sendo este fiscal da lei, posiciona-se no sentido de que uma vez praticada a infração penal, mister se faz o cumprimento da lei. Observe-se, ainda, que bagatela refere-se ao pequeno valor da coisa, o que desconfigura, por conseguinte, o fato típico mediante a aplicação do princípio da insignificância. Cumpre observar, no entanto, que se a infração for de menor potencial ofensivo, deve incidir a Lei n. 9.099/95 – Lei dos Juizados Especiais Criminais. • Alteridade: não podem ser punidas condutas que não lesionem outras pessoas, ou seja, que não transcendam a figura do infrator. Exemplos: tentativa de suicídio, uso pretérito de droga (a Lei n. 6.368/76, no artigo 16, visa reprimir a detenção da droga, pelo risco social que ela representa). Princípio da anterioridade Não há crime sem lei “anterior” que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. A lei que descreve um crime deve ser an- terior ao fato incriminado. A irretroatividade da lei é uma consequência lógica da anterioridade. A lei penal só poderá alcançar fatos anteriores para beneficiar o réu. Didatismo e Conhecimento 15 DIREITO PENAL Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decidi- dos por sentença condenatória transitada em julgado. O art. 2º, caput, do Código Penal determina que “ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela (da lei posterior) a execução e os efeitos penais da sentença condenatória”. Nessa mesma linha, a Consti- tuição Federal, em seu art. 5º, XL, estabelece que a lei penal só retroagirá para beneficiar o acusado. Assim, se uma pessoa comete um delito na vigência de determinada lei e, posteriormente, surge outra lei que deixa de considerar o fato como crime, deve-se con- siderar como se essa nova lei já estivesse em vigor na data do delito (retroatividade) e, dessa forma, não poderá o agente ser punido. O dispositivo é ainda mais abrangente quando determina que, mesmo já tendo havido condenação transitada em julgado em razão do crime, cessará a execução, ficando também afastados os efeitos penais da condenação. Por isso, se no futuro o sujeito vier a cometer novo crime, não será considerado reincidente. Já o parágrafo único do art. 2º dispõe que a lei posterior, que de qualquer modo favoreça o réu, aplica-se a fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. Nessa hipótese, a lei posterior continua a considerar o fato como criminoso, mas traz alguma benesse ao acusado: pena menor, maior facilidade para obtenção de livramento condicional etc. Dessa forma, pela combinação dos arts. 1º e 2º do Código Penal, podemos chegar a duas conclusões: a) a norma penal, em regra, não pode atingir fatos passados. Não pode, portanto, retroagir; b) a norma penal mais benéfica, entretanto, retroage para atingir fatos pretéritos. Hipóteses de lei posterior: - Abolitio criminis: lei posterior deixa de considerar um fato como criminoso. - Novatio legis in mellius: é a lei posterior que de qualquer modo, traz um beneficio para o réu. - Novatio legis in pejus: lei posterior que de qualquer modo venha a agravar a situação do réu. (não pode ser aplicada) - Novatio legis incriminadora: lei posterior cria um tipo incriminador, tornando tica conduta considerada irrelevante penal. Como aplicar essas regras à norma penal em branco, quando ocorre alteração no complemento? São também duas regras: a) Quando o complemento da norma penal em branco também for lei, a sua alteração benéfica retroagirá. Ex.: no crime de con- trair matrimônio conhecendo a existência de impedimento que lhe cause nulidade absoluta (art. 237), o complemento está no art. 1.521, I a VII, do novo Código Civil. Assim, se houver alteração no Código Civil, de forma a se excluir uma das hipóteses de impe- dimento, aquele que se casou na vigência da lei anterior infringindo esse impedimento será beneficiado. b) Quando o complemento for norma infralegal, não retroagirá, salvo se alterar a própria figura abstrata do direito penal. Exs.: no crime do art. 22 da Lei n. 1.521/51 (Lei de Economia Popular), que consiste na venda de produto acima do preço constante nas tabelas oficiais, a alteração posterior dos valores destas não exclui o crime; no crime de falsificação de moeda, aquele que falsificou cruzeiros não deixa de responder pelo delito por ter o Governo Federal alterado a moeda para Real. Nos dois exemplos não houve alteração quanto ao objeto abstrato da proteção penal. No caso de norma complementar, editada em razão de situação temporária ou excepcional, caso sobrevenha novo complemento benéfico, este não retroagirá, nos termos do art. 3º do Código Penal. Já no tráfico de drogas, entretanto, caso ocorra exclusão de determinada substância do rol dos entorpecentes constantes em portaria da ANVISA (órgão federal responsável), haverá retroatividade da norma, deixando de haver tráfico de entorpecentes, pois, nesse caso, a alteração foi da própria figura abstrata do tipo penal, uma vez que a palavra entorpecente integra o tipo penal do tráfico. Combinação de leis. Discute-se qual solução deve ser tomada quando uma nova lei é em parte benéfica e em parte prejudicial ao acusado. Duas são as opiniões a respeito: a) Não se admite a combinação das leis, para se aplicar apenas as partes benéficas, pois, nesse caso, o juiz estaria criando uma terceira lei. Ele deve, portanto, escolher aquela que entenda mais favorável. b) Admite-se a combinação. Segundo Damásio E. de Jesus o juiz não está criando nova lei, mas movimentando-se dentro do campo legal em sua missão de integração legítima. Se ele pode escolher uma ou outra lei para obedecer o mandamento constitucional da aplicação da lex mitior, nada o impede de efetuar a combinação delas, com o que estaria mais profundamente seguindo o preceito da Carta Magna. Vigência da lei. A lei começa a produzir efeitos a partir da data em que entra em vigor, passando a regular os fatos futuros (e, excepcionalmente, os passados). Tal lei valerá até que outra a revogue (art. 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro). Essa revogação pode ser expressa, quando a lei posterior expressamente declara a revogação da anterior, ou tácita, quando a lei pos- terior é incompatívelcom a anterior, ou quando regula integralmente a matéria tratada nesta. Segundo a Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal, “A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime perma- nente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência”. Didatismo e Conhecimento 16 DIREITO PENAL Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência O art. 3º traz a ultratividade das leis excepcionais e temporárias. O art. 3º prevê lei temporária junto com a excepcional. - Lei temporária – é aquela que tem prefixado no seu texto o tempo de sua vigência. É aquela lei que diz: terei vigência do dia tal ao dia tal. - Lei excepcional ou lei temporária em sentido amplo – esta lei é a que atende a transitórias necessidades, tais como guerras, calamidades, epidemias, etc., enfim, a transitórias necessidades estatais. Isso vai cair na prova! Vamos imaginar que vem a seguinte lei: “O furto será qualificado enquanto perdurarem as enchentes em Santa Catarina”. Vejam que a lei excepcional não tem prazo de validade. Ela perdura enquanto perdurar o estado de necessidade, enquanto persistir o estado excepcional. O que o art. 3º diz? Todos os furtos praticados durante as enchentes, serão punidos mesmo cessadas as enchentes. É a ultrativi- dade da lei temporária e da lei excepcional. Por que é importante isso? Por que é importante torná-las ultrativas mesmo depois de sua vigência? É importante a ultratividade dessas leis para evitar a sua ineficiência. Tanto a lei temporária quanto a lei excepcional vão continuar punido os fatos praticados durante a sua vigência. Zaffaroni diz que o art. 3º não foi recepcionado pela Constituição, consoante art. 5º, XL, “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. O que Zaffaroni está dizendo? Que, se em razão de sucessão de lei ou cessada sua vigência ela beneficia, ela tem que retroagir e a Constituição não excepciona as leis temporárias e excepcionais. Se a Constituição não faz essa ressalva, o art. 3º não foi recepcionado. Beneficiou? Retroage sem exceção. O art. 3º, do Código Penal está prevendo uma hipótese da lei que perdeu a sua vigência, mas continua atingindo os fatos praticados na sua época. Isso é ultratividade maléfica. Para ele, a Constituição não recepciona. Para Defensoria Pública, essa é a tese. Mas como se pode rebater a tese de Zaffaroni? “A lei nova não revoga a anterior porque não trata exatamente da mesma matéria, do mesmo fato típico (é a anterior que deixa de ter vigência em razão de sua excepcionalidade). Não há, portanto, um conflito de leis penais no tempo (na medida em que a lei posterior não cuida do mesmo crime definido na anterior). Por isso é que não há nenhuma inconstitucionalidade no art. 3º”. No caso de Santa Catarina, o furto era qualificado se praticado durante as enchentes. Não se trata de lei nova conflitando com lei anterior. Furto durante a enchente é uma coisa. Acabou a excepcionalidade, o crime de furto, se praticado, será outro. Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado. Existem três teorias que definem o tempo do crime; a) teoria da atividade: considera-se o crime praticado no momento da conduta omissiva ou comissiva b) teoria do resultado: considera-se o crime praticado no momento da produção do resultado c) teoria da ubiguidade ou mista: considera-se o crime praticado no momento da conduta e no momento do resultado. O Código Penal adotou a teoria da atividade, segundo a qual “considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado” (art. 4º). (Não se confunde tempo do crime com momento consumativo, que, nos ter- mos do art. 14, I, desse Código ocorre quando se reúnem todos os elementos de sua definição legal.). A importância da definição do tempo do crime tem a ver, por exemplo, com a definição da norma penal a ser aplicada, no reconhe- cimento ou não da menoridade do réu etc. Assim, suponha-se que uma pessoa com idade de 17 anos, 11 meses e 29 dias efetue disparo contra alguém, que morre apenas uma semana depois. Ora, o homicídio só se consumou com a morte (quando o agente já possuía 18 anos), mas o agente não poderá ser punido criminalmente, pois, nos termos do art. 4º, considera-se praticado o delito no momento da ação (quando o agente ainda era menor de idade). No crime de homicídio doloso a pena é aumentada de 1/3, se a vítima for menor de 14 anos. Suponha-se, assim, que o agente efetue um disparo contra uma pessoa de 13 anos, 11 meses e 29 dias, mas esta vem a falecer depois de já haver completado os 14 anos mencionados pela lei. Seria aplicável o aumento, considerando-se que o homicídio só se con- sumou quando a vítima já tinha 14 anos? A resposta é afirmativa, em razão do que dispõe o art. 4º do Código Penal. Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. § 1º - Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar. § 2º - É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil Há várias teorias para fixar o âmbito de aplicação da norma penal a fatos cometidos no Brasil: Didatismo e Conhecimento 17 DIREITO PENAL a) Princípio da territorialidade. A lei penal só tem aplicação no território do Estado que a editou, pouco importando a nacionali- dade do sujeito ativo ou passivo. b) Princípio da territorialidade absoluta. Só a lei nacional é aplicável a fatos cometidos em seu território. c) Princípio da territorialidade temperada. A lei nacional se aplica aos fatos praticados em seu território, mas, excepcionalmente, permite-se a aplicação da lei estrangeira, quando assim estabelecer algum tratado ou convenção internacional. Foi este o princípio adotado pelo art. 5º do Código Penal: Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. Que se entende por território nacional? Abrange todo o espaço em que o Estado exerce sua soberania: o solo, rios, lagos, mares interiores, baías, faixa do mar exterior ao longo da costa (12 milhas) e espaço aéreo. Os § 1º e 2º do art. 5º do Código Penal esclarecem ainda que: “Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mer- cantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar” (§ 1º). “É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil” (§ 2º). Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Teorias: a) teoria da atividade: lugar do crime é o da ação ou omissão, sendo irrelevante o local da produção do resultado. b) teoria do resultado:
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