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Transtorno_personalidade_02

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AN02FREV001/REV 4.0 
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PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIA 
Portal Educação 
 
 
 
 
 
 
CURSO DE 
TRANSTORNOS DA 
PERSONALIDADE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Aluno: 
 
EaD - Educação a Distância Portal Educação 
 
 
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CURSO DE 
TRANSTORNOS DA 
PERSONALIDADE 
 
 
 
 
 
MÓDULO II 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Atenção: O material deste módulo está disponível apenas como parâmetro de estudos para este 
Programa de Educação Continuada. É proibida qualquer forma de comercialização ou distribuição 
do mesmo sem a autorização expressa do Portal Educação. Os créditos do conteúdo aqui contido 
são dados aos seus respectivos autores descritos nas Referências Bibliográficas. 
 
 
 
 
 
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MÓDULO II 
 
 
3 TRANSTORNO DA PERSONALIDADE BORDERLINE 
 
 
3.1 CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS E ASPECTOS CLÍNICOS 
 
 
Critérios Diagnósticos do DSM IV para Transtorno da Personalidade Borderline 
Um padrão global de instabilidade dos relacionamentos interpessoais, da 
autoimagem e dos afetos e acentuada impulsividade, que se manifesta no início da 
idade adulta e está presente em uma variedade de contextos, indicado por, no 
mínimo, cinco dos seguintes critérios: 
(1) Esforços frenéticos no sentido de evitar um abandono real ou 
imaginário. Nota: não incluir comportamento suicida ou automutilante, coberto no 
critério 5; 
(2) Um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos, 
caracterizado pela alternância de extremos de idealização e desvalorização; 
(3) Perturbação da identidade: instabilidade acentuada e resistente da 
autoimagem ou do sentimento de self; 
(4) Impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente prejudiciais à 
própria pessoa (p. ex., gastos financeiros, sexo, abuso de substâncias, direção 
imprudente, comer compulsivo). Nota: não incluir comportamento suicida ou 
automutilante, coberto no critério 5; 
(5) Recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de 
comportamento automutilante; 
(6) Instabilidade afetiva devido a uma acentuada reatividade de humor 
(por exemplo, episódios de intensa disforia, irritabilidade ou ansiedade geralmente 
durando algumas horas e raramente mais de alguns dias); 
 
 
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(7) Sentimentos crônicos de vazio; 
(8) Raiva inadequada e intensa ou dificuldade de controlar a raiva (por 
exemplo, demonstrações frequentes de irritação, raiva constante, lutas corporais 
recorrentes); 
(9) Ideação paranoide transitória e relacionada ao estresse ou graves 
sintomas dissociativos. 
FONTE: DSM IV 
 
 
O transtorno da personalidade Borderline é caracterizado por um severo 
descontrole do humor e dos impulsos. O padrão de comportamento visto neste tipo 
de transtorno foi identificado no mundo inteiro, em diversos contextos culturais. 
Antes da adolescência, dificuldades de aprendizagem, problemas de concentração e 
afastamento social estão frequentemente presentes. 
Essas dificuldades evoluem gradualmente para os sintomas clássicos do 
transtorno durante a adolescência e início da idade adulta. É diagnosticado 
predominantemente em mulheres (aproximadamente 75%). 
 
 
FIGURA 3 
 
FONTE: Banco de Imagens Portal Educação. 
 
 
 
 
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Os pacientes com transtorno de personalidade Borderline apresentam 
comportamentos excessivamente irregulares. Seus relacionamentos tendem a ser 
instáveis, intensos e tempestuosos. Soma-se a esta instabilidade e perturbação, 
mudanças súbitas e drásticas de opinião sobre os outros. Estas podem alternar-se 
entre extremos de idealização e desvalorização – enxergar os outros como apoios 
benéficos e a seguir como cruéis. Da mesma forma que o paciente pode valorizar o 
trabalho terapêutico, pode após algum episódio desvalorizá-lo totalmente. 
Estes sujeitos precisam ter outros a sua volta, mesmo que não gostem e 
nem se relacionem com eles. Os esforços para evitar a solidão e o abandono podem 
ser extremos, tomando a forma de atividades impulsivas, como raiva inadequada, 
comportamentos autodestrutivos e ameaças de suicídio. Podem também ser 
benignos, envolvendo o uso de um objeto transicional, por exemplo, um objeto 
inanimado ou um animal de estimação, que pode atenuar os sentimentos de solidão 
e insegurança. 
Muitas vezes apresentam um padrão de boicote a si mesmo. Destruir um 
relacionamento justamente quando está claro que poderia vir a ser duradouro, 
abandonar um curso próximo ao seu término, por exemplo. Frequentemente, a 
ausência de um relacionamento ou de uma estrutura externa, que se tornam 
experiências estressantes, pode provocar uma variedade de distorções cognitivas e 
perceptivas transitórias, do tipo psicótico, tais como um sentimento de não existir, 
experiências dissociativas e acusações irreais de maus-tratos. 
O paciente Borderline apresenta um distúrbio de identidade que envolve 
mudanças súbitas e drásticas da autoimagem. Ele pode em um momento ser uma 
pessoa carente por ajuda e a seguir um justiceiro vingador por maus-tratos. Às 
vezes pode sentir que absolutamente não existe, geralmente quando está sozinho e 
acredita que não tem relacionamentos. 
O humor dos pacientes com transtorno da personalidade Borderline é 
geralmente uma mistura de raiva, solidão e vazio crônico. Mudanças de humor 
ocorrem em resposta a alterações no ambiente interpessoal. A raiva crônica pode 
ser expressa não apenas por meio de acessos de fúria, mas também de extrema 
amargura, sarcasmo e atitudes depreciativas ou manipuladoras. A raiva é parte 
constante das experiências dos pacientes; eles desejam de alguma forma tornar 
 
 
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claro estes sentimentos ou justificá-los como sendo proveniente de uma provocação 
externa. 
 
FIGURA 4 
 
FONTE: Disponível em: Banco de Imagens Portal Educação. 
 
 
3.2 COMPREENSÃO PSICODINÂMICA 
 
 
Dentre algumas visões psicodinâmicas, vamos priorizar uma que coloca o 
paciente com transtorno da personalidade Borderline como alguém que se fixou na 
fase de separação/individuação. Antes de continuar, vamos nos ater ao esquema 
evolutivo de Margaret Mahler (1982). Ela identificou três amplas fases no 
desenvolvimento da criança. Nos dois primeiros meses de vida ocorre a fase autista, 
na qual o bebê está voltado para si mesmo e mais preocupado com a sobrevivência 
do que com os relacionamentos. 
O período entre dois e seis meses é denominado como simbiose, inicia-se 
com a resposta sorridente do bebê e com a capacidade visual de acompanhar a face 
materna. Para ele a experiência primária da díade mãe-bebê é de uma unidade dual, 
em vez de dois indivíduos separados. 
A terceira fase separação/individuação é caracterizada por quatro subfases. 
A subfase de diferenciação, que se encontra entre os seis e 10 meses, a criança 
 
 
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torna-se consciente de que a mãe é uma pessoa separada. Prática é a próxima 
subfase; ocorre entre os 10 e 16 meses. Com as habilidades motoras recentemente 
descobertas desta idade, os bebês adoram explorar o mundo por si próprios, 
embora na maioria das vezes retornem para suas mães a fim de se 
“reabastecerem”. 
A terceira subfase, reaproximação, é caracterizada por uma consciência 
mais aguçada da mãe como alguém separado, ocorrendo entre os 16 e 24 meses de 
idade. Esta consciência traz consigo um senso mais frágil, uma ansiedade
nos 
momentos de separação da mãe. A criança está frequentemente a checar o 
paradeiro da mãe durante as brincadeiras. 
A quarta e última subfase, que corresponde aproximadamente ao terceiro 
ano de vida, é marcada pela consolidação da individualidade e pelo início da 
constância objetal. É a integração de visões dissociadas da mãe em um objeto 
completo, único, que pode ser internalizado como uma presença interna 
emocionalmente tranquilizadora, que sustenta a criança durante a ausência 
materna. 
Assim, os pacientes Borderline atravessaram com sucesso a fase simbiótica, 
mas se fixaram na fase de separação/individuação. Na subfase de reaproximação, 
como vimos, a criança fica alarmada quanto à possibilidade de sua mãe 
desaparecer e por vezes fica muito preocupada sobre onde ela está. Sob este ponto 
de vista evolutivo, os pacientes Borderline podem ser vistos como vivendo 
repetidamente uma antiga crise infantil na qual eles temem que as tentativas de se 
separarem de suas mães resultem no seu desaparecimento e abandono. 
Na forma adulta desta crise infantil, os sujeitos são incapazes de tolerar 
períodos de solidão e temem o abandono por parte das outras pessoas 
significativas. Ao longo do período de separação e individuação, as crianças são 
incapazes de integrar os aspectos bons e maus de si próprios e de suas mães. 
Estas imagens contraditórias são mantidas separadamente pela dissociação, de 
forma que a mãe é vista como alternando entre ser totalmente boa ou totalmente 
má. 
Por volta dos três anos de idade a grande parte das crianças já mantém uma 
constância objetal suficientemente estabelecida. Por terem internalizado uma 
imagem inteira de suas mães, as crianças conseguem sustentar melhor os períodos 
 
 
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de sua ausência física. Como os sujeitos Borderline não possuem esta imagem 
interna, eles têm pouca ou nenhuma constância objetal, o que contribui para sua 
intolerância à separação e solidão. 
A passagem pela fase edípica, em função desta agressão inata, fica 
impedida. Logo, os conflitos edípicos dos pacientes Borderline, com frequência 
aparecem de forma mais crua e primitiva, comparados aos dos pacientes neuróticos. 
 
 
3.2.1 Abordagens Terapêuticas 
 
 
A psicoterapia individual de longo prazo pode ser útil para pacientes com 
transtorno de personalidade Borderline, mas a maioria das psicoterapias é 
interrompida de maneira tempestuosa e impulsiva. Os objetivos otimistas na 
psicoterapia individual dos pacientes incluem o fortalecimento do ego, de forma que 
o paciente possa suportar melhor a ansiedade e ter maior controle sobre os 
impulsos; integração das representações dissociadas do objeto, de forma que as 
separações de figuras significativas possam ser toleradas. 
Estes pacientes são propensos a abandonar a psicoterapia, atuar de forma 
destrutiva, fazer exigências excessivas de um tratamento diferenciado por parte do 
terapeuta; provocá-los a ultrapassar os limites profissionais imprudentemente. A 
psicoterapia de grupo pode ser associada à psicoterapia individual. Ela pode 
oferecer ao paciente uma oportunidade de compreender as defesas Borderline de 
dissociação, visto que elas aparecem com certa frequência nos grupos. 
Apesar das vantagens de trabalhar num contexto grupal, os terapeutas irão 
encontrar alguma dificuldade na psicoterapia de grupo. Os pacientes Borderline 
podem facilmente se tornar bodes expiatórios em função da sua psicopatologia mais 
primitiva e sua grande tendência de expressar os afetos de forma direta. O terapeuta 
pode ser solicitado a apoiar o paciente quando o bode expiatório surge como tema 
do grupo. Além disso, os pacientes também podem vivenciar um aumento em seus 
sentimentos de privação devido à competição com o grupo pelo conforto oferecido 
pelo terapeuta. 
 
 
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Contatos intermitentes com os pais dos pacientes que moram com a família, 
especialmente se os pais estão financiando a terapia, são úteis para consolidar o 
apoio ao tratamento. A partir de diversas abordagens técnicas listamos oito 
princípios básicos que são valorizados na psicoterapia de pacientes Borderline: 
- Definir uma estrutura de tratamento estável – a estabilidade para o 
paciente Borderline deve ser imposta a partir de fontes externas. O psicoterapeuta 
pode introduzir alguma estabilidade na vida do paciente, determinando horários 
fixos, terminando as sessões no horário, mesmo que o paciente insista em ficar mais 
tempo, estabelecendo expectativas claras a respeito do pagamento dos honorários e 
desenvolvendo uma norma explícita sobre as consequências das faltas. 
- Evitar uma posição terapêutica passiva – a posição silenciosa e reflexiva 
do trabalho do psicanalista geralmente não é adequada à psicoterapia com paciente 
Borderline. Estes pacientes frequentemente irão interpretar de forma errada o 
silêncio, como falta de interesse, ou mesmo como uma maldosa privação de apoio. 
A aliança terapêutica é facilitada por maiores verbalizações do terapeuta, mesmo 
fazendo afirmações simples como “Eu entendo” ou perguntas abertas como “Você 
pensa alguma outra coisa a respeito disto?” Quando o paciente fica em silêncio, é 
melhor o terapeuta questionar o motivo do silêncio, em vez de deixar continuar por 
um período prolongado. 
- Conter a raiva do paciente – Os clínicos que escrevem sobre o tratamento 
de pacientes Borderline admitem o desafio que é manter uma postura terapêutica 
frente aos constantes ataques verbais de desprezo e raiva. O terapeuta 
frequentemente se sentirá provocado a se defender ou retaliar com interpretações 
hostis ou sarcásticas. 
O terapeuta pode também recuar consciente ou inconscientemente de um 
investimento emocional no paciente, desejando que ele deixe a terapia e encontre 
outra pessoa para atormentar. A abordagem ótima para a contenção das partes do 
paciente, cheias de ódio projetadas, já foram discutidas na psicoterapia do paciente 
paranoide. Questionamentos suportivos e compreensões empáticas são muito úteis 
nestas situações. 
 
 
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- Confrontar comportamentos autodestrutivos – Os pacientes Borderline 
geralmente apresentam pensamento mágico a respeito de seu comportamento 
autodestrutivo. Eles podem esquecer completamente as consequências reais de 
suas atitudes por fantasiarem que seu comportamento irá ter resultados diferentes. 
O terapeuta deve fazer com que o paciente veja as consequências reais. Por 
exemplo, um paciente homossexual do sexo masculino disse a seu terapeuta que 
sentia uma forte necessidade de encontros homossexuais, pois o fato de engolir 
sêmen de um homem viril e masculino o fazia sentir mais masculino. Seu terapeuta 
assinalou que apesar desta fantasia, a consequência real de engolir sêmen de outro 
homem era o risco de contrair AIDS. 
- Estabelecer a conexão entre sentimentos e ações - A ação é, na maioria 
das vezes, a linguagem dos pacientes Borderline. Estes pacientes se sentem tão 
controlados por afetos poderosos que a ação pode parecer a única forma de 
encontrar alívio. Entretanto, muito desse padrão está em sintonia com o ego, de 
forma que os pacientes com frequência não estão cientes de que suas ações são 
motivadas por sentimentos. Sua ideia consciente é de que simplesmente estes 
impulsos apareçam “inesperadamente”. Os terapeutas devem, portanto, procurar 
sempre pontuar os sentimentos que levaram à ação. Uma paciente saiu e comprou 
oito barras de chocolate, comendo todas em um intervalo de dez minutos depois que 
um homem lhe telefonou para marcar um encontro. Embora esta paciente não visse 
ligação entre estes dois eventos, o terapeuta a ajudou a compreender
que a 
perspectiva de ir a um encontro, a deixou ansiosa, sensação que ela tentou aliviar 
comendo excessivamente. 
- Estabelecer limites – geralmente no início da terapia o profissional pode 
querer estabelecer uma série de “regras fundamentais”, incluindo não telefonar entre 
as sessões, a verbalização de sentimentos suicidas para o terapeuta antes de fazer 
as tentativas, etc. Muitos dos pacientes Borderline vivenciam os limites profissionais 
como privações cruéis e punitivas por parte do terapeuta. Eles podem exigir 
demonstrações mais concretas de carinho, como abraços, sessões prolongadas, 
redução de honorários e disponibilidade 24 horas por dia. Alguns terapeutas que 
vivenciam sentimentos de culpa em relação ao estabelecimento de limites podem 
começar a ultrapassar os limites profissionais, em nome da flexibilidade ou da 
 
 
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prevenção do suicídio. Um terapeuta do sexo masculino, por exemplo, começou a 
atender uma paciente em psicoterapia duas vezes por semana, mas dentro de um 
ano, estava atendendo-a sete vezes na semana. Nos domingos ele ia especialmente 
ao consultório para atendê-la. Muitos casos de sexo entre paciente e terapeuta 
envolvem pacientes Borderline. 
O suicídio é um risco sempre presente nos pacientes Borderline e os 
terapeutas devem estar sempre prontos para hospitalizar seus pacientes quando 
estes se tornam demasiadamente fortes. 
- Manter o foco das intervenções no aqui e agora – na psicoterapia dos 
pacientes Borderline a ação está na transferência. A visão que o paciente tem do 
terapeuta se modifica de dia para dia, ou mesmo em uma única sessão. Se o 
terapeuta é percebido em algum momento, como pouco compreensivo, esta 
preocupação pode passar em um piscar de olhos para uma percepção do terapeuta 
como uma pessoa malévola, com intenções sádicas. Estas mudanças devem ser 
abordadas assim que elas ocorrem, em vez de permitir ao paciente que fuja da 
transferência. 
- Monitorar os sentimentos contratransferenciais – a importância da 
observação da contratransferência é central na discussão sobre psicoterapia. A 
atenção contínua aos próprios sentimentos impede a atuação contratransferencial 
do terapeuta. Cada terapeuta tem limites pessoais de quanto de raiva e ódio eles 
suportam. Por exemplo, um terapeuta deve utilizar os sentimentos 
contratransferenciais de forma terapêutica dizendo ao paciente: “Tenho a impressão 
de que você está tentando me deixar com raiva de você, em vez de me deixar ajudá-
lo. Vamos ver se nós podemos compreender o que está ocorrendo aqui”. 
Os terapeutas devem ser reais e genuínos com os pacientes Borderline, ou 
irão apenas aumentar a inveja que os pacientes têm deles como figuras santas, que 
são basicamente não humanas. A evolução da psicoterapia com estes pacientes é 
incerta. A taxa de abandono chega a aproximadamente um terço. Para finalizar, 
temos um caso-exemplo, retirado do Manual de Psiquiatria Psicodinâmica (Gabbard, 
1998, p. 315): 
 
 
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A Sra. GG era uma mulher de 24 anos que veio para a psicoterapia depois 
de repetidas falhas com outros terapeutas. Ela era incapaz de viver fora da 
casa de seus pais, apesar do fato de ser inteligente e pessoalmente 
envolvente. Ela havia tido incontáveis empregos, nenhum por mais de três 
meses. Na entrevista inicial ela conseguia impressionar os empregadores o 
suficiente para convencê-los a empregá-la, mas logo que começava a ter 
sucesso ficava extraordinariamente ansiosa e agia de forma a ser 
despedida. 
Assim que veio a terapia, a Sra. GG desenvolveu um desejo imediato de 
que o terapeuta cuidasse dela. Ela queria ser sua única paciente e ser 
atendida cinco vezes na semana em vez de duas. Ela disse ao terapeuta 
que ele era “simpático e maravilhoso”; que era diferente do outro terapeuta 
que ela havia consultado. Ela achava que poderia melhorar muito se 
pudesse estar na sua presença todos os dias da semana. 
Esta transferência idealizada rapidamente passou para uma desvalorizada, 
quando o terapeuta deu sua opinião de que duas vezes seria preferível, 
considerando-se que uma das dificuldades da Sr. GG era lidar com a 
frustração. Neste ponto a Sr. GG explodiu; ela acusou o terapeuta de ser 
cruel e não empático por estar simplesmente baseando o tratamento no que 
ele pensava ser melhor em vez de responder às suas necessidades. 
Ela saiu enfurecida de seu consultório dizendo que não voltaria mais. Dez 
minutos mais tarde telefonou para seu terapeuta de um telefone público, 
disse que ele era um “filho da puta” e desligou. Dez minutos depois ela ligou 
novamente, desta vez para desculpar-se e dizer que retornaria para a 
próxima sessão. O terapeuta simplesmente respondeu que estaria bom 
para ele. 
Na próxima sessão de psicoterapia a Sr. GG não se referiu ao que havia 
ocorrido na sessão anterior. Ela conversou amigavelmente com o terapeuta 
como se nada houvesse acontecido. O terapeuta ofereceu uma 
interpretação empática. “Parece que você precisa manter os sentimentos de 
ódio da sessão passada fora da sessão hoje para que eles não destruam os 
sentimentos positivos que você está tendo”. Esta intervenção permitiu à 
paciente falar sobre como era frustrante quando outras pessoas não 
respondiam às suas necessidades de dependência como ela gostaria. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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4 TRANSTORNO DA PERSONALIDADE NARCISISTA 
 
 
4.1 CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS E ASPECTOS CLÍNICOS 
 
Critérios Diagnósticos do DSM IV para transtorno da personalidade narcisista 
Um padrão global de grandiosidade (em fantasia ou comportamento), 
necessidade de admiração e falta de empatia, que se manifesta no início da idade 
adulta e está presente em uma variedade de contextos, indicado por, no mínimo, 
cinco dos seguintes critérios: 
(1) Sentimento grandioso acerca da própria importância (p. ex. exagera 
realizações e talentos, espera ser reconhecido como superior sem realizações à 
altura); 
(2) Preocupação com fantasias de ilimitado sucesso, poder, inteligência, 
beleza ou amor ideal; 
(3) Crença de ser “especial” e único e de que somente pode ser 
compreendido ou deve associar-se a outras pessoas (ou instituições) especiais ou 
de condição elevada; 
(4) Exigência de admiração excessiva; 
(5) Presunção, ou seja, possui expectativas irracionais de receber um 
tratamento especialmente favorável ou obediência automática às suas expectativas; 
(6) É explorador em relacionamentos interpessoais, isto é, tira vantagem 
de outros para atingir seus próprios objetivos; 
(7) Ausência de empatia: reluta em reconhecer ou identificar-se com os 
sentimentos e necessidades alheias; 
(8) Frequentemente sente inveja de outras pessoas ou acredita ser alvo da 
inveja alheia; 
(9) Comportamentos ou atitudes arrogantes e insolentes. 
FONTE: DSM IV 
 
 
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FIGURA 5 
 
FONTE: Banco de Imagens Portal Educação. 
 
 
As pessoas com o transtorno da personalidade narcisista têm um sentimento 
grandioso de vaidade. Elas habitualmente superestimam suas capacidades e 
exageram suas realizações. Frequentemente esperam ser reconhecidas como 
superiores, especiais ou únicas. Elas podem buscar e atribuir indevidamente 
qualidades únicas, perfeitas ou talentosas àqueles que as ajudam. 
Podem mostrar-se orgulhosas e pretensiosas, mas com igual assiduidade 
supõem que os outros atribuem o mesmo valor que elas aos seus esforços, ficando 
dolorosamente magoadas se a admiração esperada não chega. Os pacientes estão 
repetidamente preocupados com fantasias que confirmem sua grandiosidade ou o 
sentimento de serem superiores, especiais ou únicos. Tais
fantasias na maioria das 
vezes envolvem admiração e privilégios especiais que eles acreditam merecer. 
Narcisismo saudável x patológico – na prática psiquiátrica 
contemporânea, a distinção entre graus de narcisismo saudável e patológico é 
bastante difícil. Certa medida de amor próprio não apenas é normal como também 
desejável. Assim, não é fácil identificar o ponto em que o narcisismo saudável vira 
narcisismo patológico. 
Outro fator de confusão é que muitos comportamentos podem ser 
patologicamente narcisistas em um sujeito, enquanto uma manifestação de 
autoestima saudável em outro. Um menino de 15 anos, por exemplo, que fica de pé 
em frente ao espelho secando o cabelo com secador por 45 minutos para ter todos 
os fios de cabelo no lugar. A maioria de nós entenderia a vaidade deste tipo como 
 
 
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normal para um jovem adolescente. Agora vamos mudar para um homem de 30 
anos, que passa o mesmo período de tempo em frente ao espelho com um secador. 
Este quadro já é um pouco diferente pelo fato que esta excessiva 
autoabsorção está longe da norma para um homem desta idade. Se nós agora 
imaginarmos um homem de 45 anos envolvido na mesma atividade, novamente 
ficamos mais tolerantes em nossa atitude porque, como foi o caso com o menino 
adolescente, nós compreendemos este comportamento como parte de uma fase do 
desenvolvimento no ciclo vital, à qual com frequência nos referimos como a crise da 
meia-idade. 
Entretanto, antes de determinar definitivamente sobre a relativa saúde ou 
patologia destes sujeitos, nós deveríamos saber mais a respeito das suas outras 
atividades. Os exemplos acima ilustram como o narcisismo é julgado de forma 
diferente dependendo da fase do ciclo de vida pela qual a pessoa está passando. 
Para dificultar ainda mais as coisas, vivemos em uma cultura narcisista. Vemos o 
consumo de bens materiais como o caminho para a felicidade. Somos impregnados 
por uma mídia eletrônica que prospera em imagens superficiais e ignora a essência 
e a profundidade. 
Somos consumidos pelo glamour da celebridade. Nosso medo de 
envelhecer e da morte mantém os cirurgiões plásticos ocupados. Livros com títulos 
como “Buscando ser o número 1” fazem parte da lista dos mais vendidos. Técnicos 
de atletismo permanecem impunes pelo tratamento abusivo dado aos seus atletas, 
conquanto eles levem títulos e troféus para casa. A vitória perdoa tudo. 
Levando-se em conta este ambiente cultural, é muitas vezes problemático 
determinar que traços indicam um transtorno de personalidade narcisista e quais são 
simplesmente traços culturais adaptativos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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FIGURA 6 
 
FONTE: Banco de Imagens Portal Educação. 
 
 
Soma-se a isso a dificuldade de diferenciar uma autoestima saudável de 
uma autoestima artificialmente inflada. Um profissional de saúde mental, por 
exemplo, apresentando um material científico para uma plateia de colegas. O 
apresentador percebe que metade do público está dormindo durante a apresentação 
e que outros estão se levantando e saindo. No final o palestrante é criticado por seu 
“pensamento confuso” e pelo fato de “não apresentar nada de novo”. Ele responde a 
estas críticas dizendo a si mesmo: “Independente do que eles pensam, eu de 
qualquer forma sei que sou competente”. Como avaliamos esta resposta: 
1) esta pessoa tem uma autoestima saudável que não sucumbe a uma 
experiência desfavorável, ou 2) a resposta do apresentador reflete o narcisismo 
patológico no sentido de ser uma reação defensiva para compensar um dano à sua 
autoestima. 
Que critérios, então, a partir destas variedades de usos, diferenças 
evolutivas e influências culturais, podemos utilizar para a diferenciação do 
narcisismo saudável do patológico? A história de vida do sujeito pode ajudar um 
pouco nesta diferenciação. Sujeitos narcisistas altamente perturbados podem 
encontrar sucesso em certas profissões, como grandes negócios, artes, política, 
indústria da diversão. 
 
 
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Entretanto, em certos casos também a patologia narcisista pode ser refletida 
na qualidade superficial dos interesses profissionais da pessoa, como se a 
realização e o aplauso fossem mais importantes que o domínio da área. O 
funcionamento profissional é, algumas vezes, baixo, refletindo a relutância em 
assumir riscos em situações nas quais a frustração é possível. 
As formas patológicas do narcisismo também podem ser identificadas pela 
qualidade dos relacionamentos do sujeito. Estas pessoas são acometidas pela sua 
incapacidade de amar. Relacionamentos saudáveis são caracterizados por 
qualidades como empatia e preocupação com o sentimento dos outros. As pessoas, 
algumas vezes, podem fazer uso dos outros para gratificar suas necessidades, mas 
este não é um estilo único e privilegiado de lidar com as outras pessoas. 
Por outro lado, a pessoa com um transtorno narcisista de personalidade 
aproxima-se das pessoas como objetos a serem utilizados e descartados de acordo 
com suas necessidades, sem consideração por seus sentimentos. O sujeito com 
frequência termina um relacionamento depois de um curto espaço de tempo, 
geralmente quando a outra pessoa começa a fazer exigências de acordo com suas 
necessidades. Esta falta de empatia reflete uma ausência de interesse ou uma 
incapacidade de reconhecer os desejos, experiências subjetivas e sentimentos dos 
outros. 
Se o paciente é do sexo masculino, ele pode ter a síndrome de “Don Juan” 
na qual ele seduz as mulheres e as descarta quando a idealização se transforma em 
desvalorização. Considerando as mulheres apenas como conquistas, ele não tem a 
capacidade de empatizar com a experiência interna das mesmas. Embora estes 
pacientes sejam com mais frequência do sexo masculino, as mulheres podem 
apresentar patologia narcisista semelhante. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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FIGURA 7 
 
FONTE: Banco de Imagens Portal Educação. 
 
 
Visto que o diagnóstico de transtorno da personalidade narcisista baseia-se 
fortemente em uma grandiosidade que pode não ser declarada, ele pode facilmente 
passar despercebido por profissionais que não estejam atentos à experiência 
subjetiva, fantasias interiores e comportamentos velados. Além disso, a 
grandiosidade pode ser encontrada em outros diagnósticos, tais como a mania e o 
transtorno delirante. 
Por estas razões, a despeito da importância da grandiosidade nas 
descrições do transtorno e do seu surgimento como aspecto mais característico do 
diagnóstico, ela por si só não é suficiente para o diagnóstico. 
 
 
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FIGURA 8 
 
FONTE: Banco de Imagens Portal Educação. 
 
 
4.2 COMPREENSÃO PSICODINÂMICA 
 
 
Para falarmos da dinâmica do transtorno da personalidade narcisista 
usaremos a teoria da psicologia do self de Kohut (1985). A psicologia salienta a 
importância dos relacionamentos externos para manter a autoestima e a coesão do 
self. Esta abordagem teórica entende o paciente como tendo uma necessidade 
desesperada de certas respostas das outras pessoas, a fim de manter um senso de 
bem-estar. 
Kohut (1985) acreditava que os sujeitos com perturbações narcisistas estão 
presos a um estágio de desenvolvimento em que necessitam de respostas 
específicas das pessoas do ambiente para manter um self coeso. Quando estas 
respostas não ocorrem, estes sujeitos apresentam tendência à fragmentação. Kohut 
entendeu isto como o resultado da falta de empatia por parte dos pais. Esses não 
respondiam de forma adequada, validando e admirando o exibicionismo compatível
com a fase em que a criança se encontrava. 
Estas respostas aprovatórias são essenciais para o desenvolvimento normal, 
visto que proporcionam à criança um senso de autovalia. Esta ausência de empatia 
 
 
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se manifesta na tendência do paciente de desenvolver uma transferência especular. 
Nesta, o paciente espera do analista uma resposta confirmatória e validante, que 
Kohut associou como o “brilho no olhar materno” em resposta às demonstrações de 
exibicionismo da criança. O paciente espera aprovação e admiração por parte do 
terapeuta. 
Podemos usar a metáfora de um casulo para descrever a sensação que um 
sujeito narcisista tem, da ausência de relação com o ambiente. Este casulo é como 
uma ilusão de autossuficiência onipotente, reforçada por fantasias grandiosas que 
podem ser iniciadas por uma mãe que tenha uma visão grandiosa exagerada do 
filho. A tarefa do terapeuta é criar um ambiente propício para que o desenvolvimento 
do paciente prossiga. 
 
 
4.2.1 Abordagens Terapêuticas 
 
 
A terapia individual e, mais especificamente a psicanálise, é o tratamento 
básico para os pacientes com o transtorno da personalidade narcisista. Para Kohut, 
a empatia é a pedra fundamental da técnica. Os terapeutas devem ser empáticos 
com a tentativa do paciente de reativar uma relação parental fracassada, levando o 
terapeuta a preencher suas necessidades de afirmação, de idealização ou de ser 
igual ao terapeuta. 
É importante procurar o lado positivo das experiências do paciente e evitar 
comentários que possam ser duramente críticos. A terapia de grupo é geralmente 
um complemento à terapia individual. Nos grupos é possível encontrar um equilíbrio 
entre o desejo de ficar em um relacionamento especial fantasioso ou idealizado com 
o terapeuta e o desejo de evitar confrontações com pessoas iguais. 
Nenhuma evidência indica que a terapia do comportamento ou medicações 
desempenha um papel significativo no tratamento do transtorno. A seguir, traremos 
um caso-exemplo retirado do Tratado de Psiquiatria (KAPLAN e SADOCK, 1999, p. 
1574) que ilustra bem o transtorno da personalidade narcisista: 
 
 
 
 
 AN02FREV001/REV 4.0 
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Uma mulher de 43 anos procurou tratamento junto a um renomado analista 
de um famoso instituto para seus problemas “singularmente difíceis”. Ela 
dizia que sua vida era complicada e que apenas alguém tão bem preparado 
como ele seria capaz de ajudá-la; de fato, a paciente foi, provavelmente, 
seu caso mais complexo e desafiador. A paciente dizia que estava tendo 
problemas com seus colegas de trabalho, os quais ela descrevia como 
“incompetentes” e invejosos de suas habilidades especiais como corretora 
imobiliária. Embora suas vendas estivessem na média para a agência, ela 
estava certa de que seus colegas e seus chefes admiravam suas 
“habilidades superiores para lidar com o público” e que ela em breve seria 
reconhecida como a melhor corretora. O problema era que ela não estava 
disposta a fazer alguns trabalhos de contabilidade exigidos de todos os 
corretores porque ela tinha curso superior e considerava aquele trabalho 
indigno dela. Quando seus colegas a chamaram de “presunçosa”, ela ficou 
enraivecida e extremamente humilhada e estava pensando em deixar seu 
emprego. Ela dizia que as outras pessoas estavam lhe causando problemas 
semelhantes. Seu namorado tinha recentemente cancelado um encontro 
para ir ao enterro da sua avó, o que a aborrecera enormemente. E quando 
sua irmã não concordou em ir a uma estação de repouso que a paciente 
preferia, ela raivosamente cancelou a viagem, dizendo que nem mesmo o 
melhor agente de viagens do mundo poderia encontrar um lugar melhor. 
 
 
 
 
 
 
FIM DO MÓDULO II

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