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62 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III Unidade III HISTÓRIA DO PENSAMENTO GEOGRÁFICO 5 A GEOGRAFIA NA IDADE MODERNA: A SISTEMATIZAÇÃO DA CIÊNCIA GEOGRÁFICA O conjunto dos conhecimentos gerados entre os séculos XV e XVIII contribuíram para o processo de sistematização do conhecimento geográfico. A partir do Renascimento, séculos XV e XVI, os pensadores começaram a estudar o próprio homem como um ser racional e superior às demais criaturas. A nova concepção do ser humano foi chamada de Humanismo. A crítica às rígidas concepções de mundo, baseada na ordem religiosa e sobrenatural, foi responsável pela renovação científica do Renascimento (RODRIGUES, 2008, p. 60). A moderna ciência da natureza, fundamentada na experiência, revolucionou o conhecimento científico. Segundo Moraes (1987, p. 34), a sistematização do conhecimento geográfico ocorre no início do século XIX, pois a Geografia como ciência autônoma surgiria a partir de um processo que estava vinculado às condições históricas. Esses pressupostos históricos estavam relacionados com o avanço e domínio das relações capitalistas de produção. O autor lista quatro conjuntos de pressupostos importantes para a sistematização da Geografia como ciência. São eles: • o conhecimento efetivo da extensão real do planeta, que se deu logo após as grandes navegações que culminaram no descobrimento da América; • a existência de um repositório de informações com dados referentes aos diversos lugares da superfície, armazenados em alguns grandes arquivos, possibilitando uma base empírica para a comparação; • o aprimoramento das técnicas cartográficas que possibilitou a representação dos fenômenos observados, da localização dos lugares e da delimitação dos territórios. Essa representação gráfica padronizada era essencial para os estudos geográficos; • as mudanças filosóficas e científicas, cuja finalidade geral das escolas filosóficas, nesse período, era a afirmação da possibilidade de a razão explicar a realidade; a aceitação da existência de uma ordem na manifestação de todos os fenômenos, passível de ser apreendida pelo conhecimento humano. 63 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS Com o surgimento do Iluminismo, no século XVIII, ocorreram mudanças filosóficas e científicas que privilegiaram o movimento intelectual em defesa das liberdades sociais, econômicas e políticas; da ciência e da racionalidade; e crítica aos conhecimentos aceitos pela fé e pelos dogmas da Igreja. Durante esse período, as discussões científicas e filosóficas de vários pensadores – que tratavam temas geográficos – contribuíram, direta ou indiretamente, para o processo de sistematização da Geografia. Lembrete O Iluminismo foi um movimento intelectual que surgiu durante o século XVIII na Europa, que defendia o uso da razão (luz) contra o antigo regime (trevas) e pregava maior liberdade econômica e política. Esse movimento promoveu mudanças políticas, econômicas e sociais, baseadas nos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. Immanuel Kant (1724‑1804) nasceu na Prússia, foi professor de Filosofia e ensinou Geografia na Universidade de Königsberg. Sua principal contribuição foi separar a Geografia da História, pois, para ele, a Geografia descreve a natureza no espaço, e a História, a evolução do homem ao longo do tempo; enquanto uma tem dimensão espacial, a outra tem dimensão temporal. Segundo Moraes (1987, p. 14), Kant coloca a Geografia como uma ciência sintética (que trabalha com dados de outras ciências) e descritiva (que enumera os fenômenos observados), para obter uma visão de conjunto do planeta. Em 1798, na Inglaterra, o economista e sacerdote anglicano Thomas Robert Malthus (1766‑1834) publicou uma teoria altamente antinatalista e conservadora na obra Um ensaio sobre o princípio da população. Naquele período, em virtude da Revolução Industrial, a Inglaterra vivia um momento de crescente aumento populacional. Preocupado com essa explosão demográfica e com os consequentes problemas socioeconômicos (pobreza, desemprego etc.) decorrentes, Malthus defendeu a urgência do controle populacional. Observação A teoria malthusiana é fundamentada na relação entre crescimento populacional e os meios de subsistência, apoiando‑se nos seguintes princípios: caso não seja detida por obstáculos (guerras, epidemias etc.), a população tende a crescer segundo uma progressão geométrica (1, 2, 4, 8, 16, 32), duplicando‑se a cada 25 anos; na melhor das hipóteses, os meios de subsistência (capacidade de produção de alimentos) só poderiam aumentar segundo uma progressão aritmética (1, 2, 3, 4, 5, 6). O método proposto por Malthus, para evitar o crescimento geométrico da população, foi a sujeição moral (abstinência sexual, casamentos tardios, controle do número de filhos etc.) e a não assistência governamental aos pobres (segundo ele, a miséria seria uma forma natural de controle da 64 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III superpopulação). Sua teoria é contestada pelos seguintes motivos: a população não cresceu geometricamente. Caso tivesse aumentado de forma geométrica, a população mundial seria, em 1990, de 185 bilhões de pessoas, quando, na realidade, era de 5,2 bilhões de habitantes; o desenvolvimento científico e tecnológico alcançado no campo provocou um aumento geométrico dos alimentos, sendo, hoje, pelo menos numericamente, suficiente para todos, porém mal repartido; a emancipação feminina (não prevista por Malthus) provocou redução significativa na taxa de fertilidade da mulher. Thomas Robert Malthus acreditava que as barreiras naturais que impedem o crescimento da população animal atuavam igualmente sobre as populações humanas. Assim, a miséria seria uma espécie de vingança da natureza contra os homens que teimavam em se multiplicar. Jean‑Jacques Rousseau (1712‑1778) discutiu a relação entre gestão de Estado, formas de representação e extensão do território de uma sociedade. Já Charles‑Louis de Seconder, o Barão de Montesquieu (1689‑1755), na obra O espírito das leis, dedica um capítulo à discussão sobre a influência do meio no caráter dos povos (MORAES, 1987, p. 39). Entretanto, o principal e maior registro escrito não publicado são suas cartas para cerca de 2.000 pessoas, entre figuras públicas, naturalistas e familiares. Essas cartas contêm fatos pessoais, assim como troca de informações científicas e discussões sobre diversas teorias. Inicialmente, a produção científica do conhecimento geográfico teve suas características nos princípios da concepção positivista da realidade, elaborada por Augusto Comte (1798‑1857), que predominou em toda a produção científica geral do século XIX e meados do século XX. Segundo o Positivismo, somente o conhecimento científico é válido, opondo‑se ao conhecimento metafísico, mítico e teológico. No ideal positivista não há separação entre as ciências da natureza e as ciências do homem, pois ambas se utilizam do mesmo método, ou seja, o método das ciências naturais. Ao início do século XIX, a malha dos pressupostos históricos da sistematização da Geografia já estava suficientemente tecida. A Terra estava toda conhecida. A Europa articulava um espaço de relações econômicas mundializado, o desenvolvimento do comércio punha em contato os lugares mais distantes. O colonizador europeu detinha informaçõesdos pontos mais variados da superfície terrestre. As representações do globo estavam desenvolvidas e difundidas pelo uso cada vez maior dos mapas, que se multiplicavam. A fé na razão humana, posta pela Filosofia, abria a possibilidade de uma explicação racional para qualquer fenômeno da realidade. As bases da ciência moderna já estavam assentadas. As ciências naturais haviam constituído um cabedal de conceitos e teorias, do qual a Geografia lançaria mão para formular seu método. E, principalmente, os temas geográficos estavam legitimados como questões relevantes, sobre as quais cabia dirigir indagações científicas (MORAES, 1987, p. 41). 65 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS Pode‑se afirmar que foi dentro desse contexto que surgiu a Geografia como ciência, na Alemanha. Suas bases, como conhecimento científico, foram lançadas por dois cientistas alemães, Alexander Von Humboldt (1769‑1859) e Karl Ritter (1779‑1859), considerados os “pais” da Geografia moderna. A sistematização da Geografia: Humboldt e Ritter Alexander Von Humboldt nasceu em 14 de setembro de 1769, na cidade de Berlim, na Prússia, e morreu em 1859. Foi grande estudioso das ciências naturais. Estudou Botânica, Engenharia de Minas, Geologia, Meteorologia, Física e Filosofia. Realizou inúmeras viagens, percorrendo a Europa, a América Central e países como Equador, Peru, Venezuela, Colômbia, México, Estados Unidos e Rússia, observando e estudando os grandes fenômenos físicos e biológicos. Descreveu características naturais da fauna, flora, atmosfera, formações aquáticas e terrestres e, também, as populações que habitavam esses lugares. Nessas viagens acumulou grande conhecimento, que deu origem a diversos trabalhos, destacando duas grandes obras: Quadros da natureza (1808) e Cosmos (1845‑1859). Nessas obras, Humboldt fez a descrição dos fenômenos naturais e humanos, do conjunto dos fenômenos do universo, desde as nebulosas planetárias, a Geografia física (estudos de geologia, geomorfologia, mineralogia etc.) até a Geografia das plantas e dos animais (sua distribuição, fisionomia etc.), terminando pelas etnias humanas, com análise dos fenômenos geológicos, climáticos e botânicos, na distribuição e inter‑relação na superfície terrestre. Entendia a Geografia como a parte terrestre da ciência do cosmos, uma espécie de síntese de todos os conhecimentos relativos à Terra; seria como uma ciência sintética, que se preocupava com a conexão entre os elementos e buscava, por meio dessas conexões, relação de causalidade existente na natureza. Humboldt não analisava apenas um fato isolado, e sim, procurava estabelecer relações de causa e efeito entre eles, surgindo, então, o “princípio da causalidade”; procurou, também, aplicar o chamado “princípio da Geografia geral”, que pregava que nenhum lugar da Terra poderia ser estudado sem o conhecimento do conjunto, ou seja, um fenômeno observado em uma região poderia ser generalizado para todas as outras áreas do globo, com características semelhantes, isto é, a partir da comparação, eram verificadas semelhanças e diferenças entre os fenômenos e os lugares no planeta. Karl Ritter nasceu em 7 de agosto de 1779, na Saxônia, e morreu em 1859. Foi amigo pessoal de Humboldt, estudou Filosofia, História, Matemática e Ciências Naturais. Foi professor de uma família de banqueiros e lecionou História e Geografia no ginásio de Frankfurt. Em 1820 tornou‑se o primeiro docente na recém‑criada cátedra de Geografia, da Universidade de Berlim, na qual passou grande parte da vida. Lembrete É importante destacar que Immanuel Kant foi o primeiro a lecionar a matéria, sob a forma de curso não regular, na Universidade de Köngsberg, mas Ritter foi o primeiro a lecionar num curso regular universitário. 66 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III Ao contrário de Humboldt, Ritter não foi um grande viajante, assim, baseou seus estudos em leituras de trabalhos já existentes e suas publicações têm caráter metodológico e normativo. Suas pesquisas se concentraram em vários sistemas de organização espacial, comparando povos, culturas, instituições e os fenômenos naturais. Foi o precursor do método comparativo em Geografia. (...) Em seu principal trabalho, Geografia comparada, há um intuito deliberado de propor uma Geografia, sendo, assim, um livro normativo. A formação de Ritter também é radicalmente distinta da de Humboldt, enquanto aquele era geólogo e botânico, este possui formação em Filosofia e História. Ritter define o conceito de “sistema natural”, isto é, uma área delimitada dotada de uma individualidade. A Geografia deveria estudar estes arranjos individuais e compará‑los. Cada arranjo abarcaria um conjunto de elementos, representando uma totalidade, onde o homem seria o principal elemento. Assim, a Geografia de Ritter é, principalmente, um estudo dos lugares, uma busca da individualidade destes. Toda esta proposta se assentava na arraigada perspectiva religiosa desse autor. Para ele, a ciência era uma forma de relação entre o homem e o “criador” (com uma dimensão interior de revelação), uma tentativa de aprimoramento das ações humanas, assim, uma aproximação à divindade. Neste sentido, caberia à Geografia explicar a individualidade dos sistemas naturais, pois, nesta, se expressaria o desígnio da divindade ao criar aquele lugar específico. A meta seria chegar a uma harmonia entre a ação humana e os desígnios divinos, manifestos na variável natureza dos meios (MORAES, 1987, 48‑49). A proposta de Ritter é considerada antropocêntrica, pois considera o homem como sujeito da natureza; e regional, direcionada ao estudo da individualidade, valorizando a relação homem‑natureza. Em sua obra, ele procura associar os fenômenos naturais com os humanos aplicando o princípio da Geografia geral ou analogia, em que, delimitada uma área em estudo, ela deveria ser comparada com o que se observa em outras áreas, encontrando, assim, diferenças e semelhanças. Mas, ao tentar propor leis gerais que explicam fatos humanos, ele percebeu uma grande dificuldade, pois os fatos humanos, por não serem uniformes, não podiam ser estudados com base em leis físico‑naturais. É importante ressaltar que esses autores criaram uma linha de continuidade no pensamento geográfico, mas, apesar da relevância de ambos, eles não deixaram discípulos diretos, não chegaram a formar uma “escola geográfica”. Humboldt foi um grande incentivador das chamadas sociedades de Geografia, que organizavam expedições científicas em diversas partes do mundo. Foi a partir desses dois autores, Humboldt e Ritter, que a Geografia ficou estabelecida como ciência descritiva, empírica, indutiva e de síntese, pautada na observação. As contribuições de ambos compõem a base da Geografia moderna tradicional e são de grande importância, uma vez que os trabalhos posteriores irão reportar‑se a essas formulações, tanto para aceitá‑las como para refutá‑las. 67 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS Observação A partir do Renascimento, os pensadores estudaram o homem como um ser racional e superior às demais criaturas. Essa conclusão foi chamada de Humanismo. A moderna ciência da natureza, fundamentada na experiência, revolucionou o conhecimento científico. O Determinismo na Geografia: Friedrich RatzelFriedrich Ratzel (1844‑1904) foi professor de Geografia na Universidade de Leipzig, na Saxônia (Alemanha). Seu principal livro, publicado em 1882, denomina‑se Antropogeografia: fundamentos da aplicação da Geografia à História. Em decorrência dessa obra, é considerado o fundador da Geografia humana, pois dá um grande enfoque ao homem. Vale a pena ressaltar que, para ele, o homem sofre a influência do meio natural. Realizou viagens pela Europa e América, observando a migração dos animais e dos seres humanos, a concentração da população em determinadas áreas da Terra, o que lhe possibilitou concluir sobre a influência do meio natural no homem. A influência pode, por exemplo, direcionar, impedir, favorecer, acelerar, desordenar as ações dos homens sobre o meio natural. Tal fato decorre das condições naturais diferenciadas da superfície terrestre (RODRIGUES, 2008, p. 75). Suas concepções geográficas foram influenciadas pelo Positivismo, buscando “leis” que explicariam o comportamento dos homens na Terra e pelas ideias evolucionistas de Charles Darwin. Para Ratzel, os povos que são capazes de se adaptar ao meio natural são os mais aptos a sobreviver. Dentro dessa concepção, chegou à conclusão de que os europeus são superiores, pois constituem uma civilização mais dinâmica em relação aos povos colonizados, considerados selvagens e pertencentes a civilizações estagnadas; realizou extensa revisão bibliográfica sobre o tema das influências da natureza sobre o homem e concluiu, criticando as duas posições mais recorrentes: a que nega tal influência e a que visa a estabelecê‑la de imediato. Para ele, essas influências serão mediatizadas por meio das condições econômicas e sociais. Para ele, a sociedade é um organismo que mantém relações duráveis com o solo, manifestas, por exemplo, nas necessidades de moradia e alimentação. O homem precisaria utilizar os recursos da natureza para conquistar sua liberdade, que, em suas palavras, “é um dom conquistado a duras penas”. O progresso significaria um maior uso dos recursos do meio, logo, uma relação mais íntima com a natureza. Quanto maior o vínculo com o solo, tanto maior seria para a sociedade a necessidade de manter sua posse. É por esta razão que a sociedade cria o Estado, nas palavras de Ratzel: “Quando a sociedade 68 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III se organiza para defender o território, transforma‑se em Estado”. A análise das relações, entre o Estado e o espaço, foi um dos pontos privilegiados da Antropogeografia. Para Ratzel, o território representa as condições de trabalho e existência de uma sociedade. A perda de território seria a maior prova de decadência de uma sociedade. Por outro lado, o progresso implicaria a necessidade de aumentar o território, logo, de conquistar novas áreas (MORAES, 1987, p. 56). Segundo Moraes (1987), se nota uma vinculação entre as formulações das ideias de Ratzel e o projeto imperial alemão, que se expressa na justificativa do expansionismo como fator natural. O professor elabora o conceito de “espaço vital”, que representaria o equilíbrio entre a população de uma determinada sociedade e os recursos disponíveis para suprir suas necessidades. A história humana seria a história natural da luta dos povos pelo “espaço vital”, uma luta pela adaptação, pela sobrevivência e pela defesa ou conquista de territórios. Exatamente porque não é possível conceber um Estado sem território e sem fronteiras é que vem se desenvolvendo rapidamente a Geografia política (...) uma teoria do Estado que fizesse abstração do território não poderia, jamais, contudo, ter qualquer fundamento seguro (RATZEL, 1990, p. 73). A Geografia, para ele, é uma ciência de síntese, descritiva, empírica e que busca a relação entre os fenômenos, relações de causalidade numa perspectiva indutiva, aceitando a concepção positivista, utilizando os mesmos métodos aplicados pelas ciências naturais. Os autores que seguiram suas propostas foram buscar evidências empíricas para comprovar a influência do meio natural sobre a humanidade. Ratzel e seus discípulos foram rotulados como deterministas, formadores de uma “escola determinista na Geografia”, considerando “o homem como produto do meio natural”. A seguir, apresentamos alguns de seus discípulos: • Ellen Semple (1863‑1932): foi sua aluna. No livro As influências do meio geográfico, apresenta um estudo mostrando a dependência dos povos em relação ao meio natural. Por exemplo, regiões planas, predomínio de religiões monoteístas; regiões acidentadas, predomínio de religiões politeístas. Os Estados, com territórios pequenos, apresentam sociedades mais conflituosas e com tendências expansionistas; • Ellsworth Huntington (1889‑1975): escreveu a obra Clima e sociedade, na qual se utiliza de um determinismo invertido, ou seja, as condições naturais mais hostis seriam as que possibilitariam maior desenvolvimento das sociedades, como povos que vivem os rigores do inverno seriam mais desenvolvidos do que povos que enfrentam invernos mais amenos, pois as necessidades impostas pelo clima (abrigo, estocagem de alimentos) teriam influência sobre o desenvolvimento. 69 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS Segundo Moraes (1987), as propostas de Ratzel permitiram mais dois desdobramentos, além da corrente determinista: • a geopolítica: corrente dedicada ao estudo da dominação de territórios; • o ambientalismo: corrente que propõe o estudo do homem em relação ao seu meio natural. Suas obras mais famosas, Antropogeografia e Geografia política, tiveram grande influência no desenvolvimento da ciência geográfica, com destaque para o estudo do homem sob a influência do meio natural, a importância do território e sua relação com a sociedade, o Estado e o poder. A Geografia, em Ratzel, é importante como ciência e como instrumental estratégico, político e de dominação dos povos pelos Estados imperialistas. O Possibilismo na Geografia: Vidal de La Blache Vidal de La Blache (1845‑1918) é considerado o fundador da escola regional francesa. Historiador por formação, se interessava por assuntos geográficos; fez um doutoramento em Geografia e conseguiu, para a disciplina, a independência acadêmica em relação à História. Entre suas principais obras, destaca‑se Tableau de la géographie de la France. Foi fundador da revista Annales de Géographie e da Escola Francesa de Geografia, denominada “escola possibilista”. Criticou o discurso político dentro da ciência geográfica, ressaltando a necessidade da neutralidade científica. No entanto suas teorias não deixaram de ser politizadas e serviam aos interesses da elite dominante francesa da época. La Blache criticou a visão naturalista de Ratzel (a influência do meio natural sobre o homem) e defendeu a variabilidade das decisões humanas diante das possibilidades oferecidas pelo meio natural, defendendo a capacidade criativa contida na ação humana, em sua história, mas, apesar de valorizar o elemento humano na Geografia, não rompeu totalmente com a visão naturalista, pois afirma que “a Geografia é uma ciência dos lugares, não dos homens”. A Geografia vidaliana analisa as relações entre o homem e o meio ambiente numa perspectiva ecológica e técnica. Os indivíduos tiram sua subsistência das frutas que coletam, da caça que abatem, dos peixes que pescam, dos animais que criam, das terras que eles preparam, lavram e plantam. Eles elaboram armas ou ferramentas que usam a partir dos materiais com que sabem trabalhar. Elesse protegem do vento, da chuva, do sol ou do frio ao se cobrirem com vestimentas. Eles constroem palhoças ou casas. Ao se combinarem, esses diversos elementos definem os gêneros de vida. Para analisá‑los, o geógrafo investiga através do trabalho de campo, representa o uso dos solos em cartas geográficas, anota as técnicas agrícolas e as ferramentas mobilizadas, pesquisa os caçadores, os agricultores e os criadores de gado. Ele integra à construção científica, que propõe os conhecimentos transmitidos oral e tradicionalmente pelos grupos primeiros ou pelos lavradores das sociedades históricas, a maioria dos camponeses 70 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III europeus do fim do século XIX ou do início do século XX. Ele os submete ao mesmo tempo a um exame crítico (CLAVAL, 2010, p. 113). Assim, La Blache concebe o objeto como a relação homem‑natureza, na perspectiva da paisagem. Sendo o homem um ser ativo, ele sofre a influência do meio natural, mas, também, atua sobre ele, transformando‑o. Nesse processo, o homem cria formas sobre a superfície terrestre. A natureza passa a ser vista como possibilidade para a ação humana. Com ele, o homem passou a ser um agente geográfico que influencia o meio ambiente, no entanto ele não descartou a influência do meio natural sobre o homem, mas destacou a possibilidade do homem agir sobre esse meio para transformá‑lo conforme sua necessidade. O “gênero de vida”, segundo La Blache, é o conjunto de técnicas, hábitos e costumes que o homem criou em seu relacionamento com o meio natural, que corresponde a uma relação de equilíbrio entre a população e os recursos. Já o “domínio de civilização” corresponde à área que engloba várias comunidades com um “gênero de vida” comum, e qualquer tentativa de não respeitar tal “domínio de civilização” significaria uma agressão. Uma importante proposta dele é o estudo da região, que é concebida como um espaço, uma síntese de relação homem e meio natural; esse espaço exibe uma homogeneidade que difere de outros espaços. [A região] [...] era a denominação dada a uma unidade de análise geográfica, que exprimiria a própria forma de os homens organizarem o espaço terrestre. Assim, a região não seria apenas um instrumento teórico de pesquisa, mas um dado da própria realidade. As regiões existiriam de fato, e caberia ao geógrafo delimitá‑las, descrevê‑las e explicá‑las. A região seria uma escala de análise, uma unidade espacial, dotada de uma individualidade, em relação a suas áreas limítrofes. Assim, pela observação, seria possível estabelecer a dimensão territorial de uma região, localizá‑la e traçar seus limites. Estes seriam dados pela ocorrência dos traços diferenciadores, aqueles que lhe conferem um caráter individual, singular. Dessa forma, a Geografia seria prioritariamente um trabalho de identificação das regiões no globo (MORAES, 1987, p. 75). Assim, era necessário saber, por exemplo, a combinação do relevo, o solo, a vegetação, o clima, a agricultura, a população e a indústria, para a delimitação da região. La Blache vê a região como resultante do estudo da paisagem, uma realidade objetiva que pode ser constatada e delimitada pelo observador. Com ele há um grande enfoque na Geografia regional, que é estudada atualmente, buscando um conhecimento cada vez maior de determinada área; também planejou uma obra coletiva, a Geografia universal, que estudava as áreas em todo o mundo, na qual cada autor ficaria responsável por uma porção determinada do planeta. 71 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS Segundo Rodrigues, [...] a orientação empírica é outro elemento importante em Vidal de La Blache, pois enfoca a importância dos trabalhos geográficos a serem realizados, principalmente, pela observação direta da realidade, a necessidade das excursões geográficas como trabalhos pedagógicos, ou seja, a escola ao ar livre deve guiar o espírito geográfico. A realidade existia independente do observador e era preciso achá‑la no campo, dando ênfase à observação da paisagem para delimitação e estudo da região (RODRIGUES, 2008, p. 85). Figura 24 ‑ Regionalização do Brasil Os estudos em Geografia regional são esquematizados da seguinte forma: a localização da área por meio de projeções cartográficas; o quadro físico como o relevo, o solo, a hidrografia, o clima, a vegetação etc.; a formação histórica (como se deu a ocupação humana do território); a estrutura agrária; a estrutura urbana; a estrutura industrial. Ao final, apresenta‑se uma conclusão, com um conjunto de cartas, objetivando demonstrar a relação entre os elementos humanos e naturais da região. Em seus Annales de géographie, no artigo “Dês caracteres distinctifs de la Géographie” (ed. 124, 1913), La Blache estabeleceu os princípios básicos em que a Geografia deveria se orientar, considerando a unidade dos fenômenos terrestres, a combinação variável desses fenômenos, o reconhecimento da relação do meio com o homem, a necessidade de um método científico para o estudo dos fenômenos, a importância do homem na modelagem do meio geográfico. Esses princípios levam a uma definição melhor da função da Geografia no conjunto das ciências. Segundo Moraes (1987), La Blache vinculou os estudos à Geografia humana, mas esta foi concebida como estudo da paisagem. Sua teoria fala de população, nunca de sociedade; de estabelecimentos humanos, não de relações sociais; estuda relação homem‑natureza, mas não aborda as relações entre os homens. 72 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III Na Geografia francesa surgiram alguns autores que abordaremos a seguir. • Emanuel de Martonne (1873‑1955): foi diretor do Instituto de Geografia da Universidade de Paris, em 1927, e presidente de honra da União Geográfica Internacional, em 1949. Publicou vários livros sobre morfologia referentes à erosão das geleiras e à evolução das formas dos relevos. Também deixou produção científica nos Annales de Géographie. Segundo Andrade (1987), para Martonne, a Geografia deveria estudar a distribuição dos fenômenos físicos, biológicos e humanos na superfície terrestre. • Jean Brunhes (1869‑1930): foi professor da Universidade de Friburgo e publicou La géographie humaine, em que classificou os fatos de ocupação do espaço em três grupos, de ocupação improdutiva do solo, como casas e caminhos; de conquista vegetal e animal, como lavouras e criação; de economia destrutiva, como devastações vegetais e animais. • Camille Vallaux (1870‑1945): publicou diversas obras, entre elas, Les sciences géographiques, La geographie de l’histoire e Géograpie générale des mers. Preocupou‑se em estudar assuntos relacionados à Geografia e à História, aos oceanos, à política e às fronteiras geográficas. • André Cholley (1886‑1968): elaborou a Combinação de complexo, que deveria ser objeto de estudo geográfico, pois ela expressaria a realidade geográfica na convergência dos fenômenos físicos, biológicos e humanos. Para o autor, a Geografia seria uma “ciência de complexos”; retoma os estudos de caracterização das regiões geográficas, destacando a importância do homem como organizador e produtor das regiões. Seguindo a mesma linha de La Blache, porém com uma proposta mais elaborada, temos Max Sorre (1880‑1962), que entendia a matéria como um estudo da ecologia do homem, isto é, da relação dos agrupamentoscom o meio em que está inserido, processo pelo qual o homem transforma esse meio, sendo que as condições do meio geográfico, fruto da ação do homem, não seriam as mesmas daquele meio natural original. A ideia de espaço geográfico de Sorre é a de espaços sobrepostos (o físico, o econômico, o social, o cultural) em inter‑relação. Desenvolveu o conceito de habitat considerando uma porção do planeta organizado pela comunidade que o habita. Para Andrade (1987), os principais mestres da Geografia francesa caracterizavam‑se, especialmente, por uma orientação ideográfica, apresentando uma posição política conservadora, encoberta por neutralidade científica. Foi dada grande importância à descrição, todavia sem menosprezar a explicação. Eles estavam muito ligados à universidade e à formação cultural. Élisée Reclus e Piotr Kroptkin e a Geografia Élisée Reclus (1830‑1905) foi um geógrafo intelectual e anarquista que nasceu na França, em 1830. Filho de pastor protestante e de família humilde, aos 13 anos foi para a Alemanha estudar numa escola religiosa, onde recebeu a formação básica que marcou sua ampla cultura e travou o primeiro rompimento com a religião, que o foi levando progressivamente ao ateísmo. Era simpatizante dos movimentos republicanos e apoiou os levantes populares de 1848 e da Comuna de Paris, em 1871. 73 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS Entre as obras mais importantes desse autor, destacam‑se A terra, em dois volumes, publicados em 1869; a Nova geografia universal, em 19 volumes, publicada no período de 1875 a 1892; e O homem e a terra, em seis volumes, editada no período de 1905 a 1908. Reclus aborda assuntos como a luta de classes, a educação e as ciências, as formas de propriedade, o colonialismo e a dominação dos países desenvolvidos. Nesses estudos, procurava não fazer separação entre Geografia física e humana; estudava suas inter‑relações. O estudo da natureza, para ele, deveria facilitar a compreensão da evolução humana. Os geógrafos deveriam fazer análises, considerando que a sociedade está dividida em classes sociais, decorrentes das formas de apropriação dos meios de produção. As diferenças de classes provocam as lutas entre elas: as classes dominadas, que aspiram a melhores condições de vida, com as dominantes, que não desejam perder o controle do poder e das riquezas (RODRIGUES, 2008, p. 89). Segundo Rodrigues (2008), Piotr Alexeevich Kropotkin (1842‑1921), grande amigo de Élisée Reclus, nasceu em Moscou e pertencia a uma família rica, aristocrata e tradicional. Entre 1857 e 1861, recebeu influências da nova literatura liberal revolucionária em seu país. Estudou em São Petersburgo, onde se interessou pela Geografia, cujas pesquisas e explorações lhe abriram caminho para uma destacada carreira científica. Em 1862, foi para o exército, servindo como oficial na Sibéria, onde fez levantamentos topográficos e geográficos. Sua reputação como geógrafo se deu em grande parte pelas viagens e pelos estudos que realizou naquele lugar. Segundo Vesentini (1988), Kropotkin não aceitava o estado‑nação, as fronteiras políticas e a glorificação da pátria. Para ele, a tarefa da Geografia era mostrar que a humanidade era uma só; as fronteiras são relíquias de um passado e o nacionalismo, as guerras e os preconceitos entre as nações só servem para manter ou reforçar os interesses de grupos ou classes dominantes. Entre suas obras mais importantes, destacam‑se A conquista do pão, Ajuda mútua, Memórias de um revolucionário, O anarquista e a ciência moderna, e Campos, fábricas e oficinas. Élisée Reclus e Piotr Kropotkin foram geógrafos libertários, nas palavras de Andrade (1987). Apesar de serem positivistas, receberam influência dialética de Karl Marx (1818‑1883). Por suas posições políticas, foram excluídos da vida universitária, exilados, presos e perseguidos, e seus livros não agradavam as classes dominantes. Élisée Reclus e Piotr Kropotkin foram dois grandes geógrafos que viveram no fim do século XIX e início do XX e deram uma contribuição bem diversa daquela dada pelos geógrafos anteriormente estudados. Enquanto os primeiros se colocaram de acordo com a classe dominante, ocuparam cátedras universitárias e assessoraram príncipes e presidentes, os dois se colocaram contra a estrutura de poder, negaram validade ao Estado, adotaram ideias de reformas sociais radicais e defenderam as classes 74 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III menos favorecidas. Embora positivistas e com posições que se opunham a Marx na militância política, eles adotaram algumas categorias marxistas e abriram perspectivas de uma visão libertária, tanto da sociedade como da Geografia como ciência. Tiveram origem social distinta, mas lutaram juntos pelos mesmos ideais e colaboraram tanto em obras de cunho político como científico (ANDRADE, 1987, p. 56). Observação Karl Marx (1818‑1883) nasceu em Treves, Alemanha. Estudou na Universidade de Berlim e doutorou‑se em Filosofia, em Jena. Em 1842, mudou‑se para Paris, onde conheceu Friedrich Engels, seu parceiro de textos e ideias. Foi expulso da França e morou em Bruxelas, participando da Liga dos Comunistas. Em 1848, escreveu O manifesto do partido comunista, obra de cunho mais político que científico, mas de grande importância histórica e que teria originado o chamado marxismo. Sua obra mostrou uma preocupação em lançar as bases científicas para o pensamento socialista e, politicamente, defendeu a causa operária, marca que acompanhará toda e qualquer tendência ou postura que se tenha intitulado de marxista. Malogrado o projeto de revolução social, em 1848, mudou‑se para Londres. Com isso, podemos perceber que conhecia de perto boa e importante parcela da sociedade industrial. Entre seus livros, destacam‑se A ideologia alemã, Miséria da filosofia, Para a crítica da economia política e O capital. Marx viveu numa Europa próspera e conturbada. Percebeu e estudou as contradições do desenvolvimento do capitalismo e sua obra apontava para uma possibilidade de superação dos conflitos e contradições desse modo de produção que acumulava e concentrava riqueza nas mãos de poucos; teve (e ainda tem) grande quantidade de seguidores na intelectualidade e entre políticos em todo o mundo. Alfred Hettner e Richard Hartshorne e a Geografia Outra corrente do pensamento geográfico vinculou‑se aos nomes de Alfred Hettner (1859‑1941) e Richard Hartshorne (1899‑1992). Denominada de Geografia racionalista, tinha como objetivo desenvolver uma Geografia de menor carga empirista e privilegiar o raciocínio dedutivo. Essa corrente, diferentemente da Geografia de Ratzel e La Blache, que tiveram suas raízes no positivismo de Augusto Comte, fundamentava‑se no neokantismo de Rickert e Windelband. Alfred Hettner foi um geógrafo alemão, professor da Universidade de Heidelberg, na cidade de mesmo nome, na Alemanha. Publicou obras entre 1890 e 1910. Buscou um novo caminho para a análise geográfica que não fosse o do determinismo e o do possibilismo; propôs a Geografia como a ciência que 75 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS estuda a diferenciação de áreas, isto é, a que visa a explicar “por que” e “em que” diferem as porções da superfície terrestre. As ideias de Hettner ficaram pouco conhecidas em sua época.Em Hettner, a Geografia se torna a ciência que estuda a diferenciação de áreas da superfície terrestre. Em La Blache, a Geografia se transforma numa Geografia regional (estruturada num método regional, a região vira o conteúdo temático e o método da Geografia). [...] Na perspectiva lablachiana, a conexão regional é um dado para dentro. A sequência das descrições e inscrições dos elos vai não só formando a síntese da totalidade dos fenômenos e seus componentes, como decidindo a referência do marco dos limites que vão recortar a região no todo da superfície terrestre e garantindo‑lhe seu caso único de identidade. Lacoste condenou‑a como um “poderoso conceito obstáculo” (Lacoste, 1974 e 1988). Na perspectiva hetteneriana a conexão vem do movimento de diferenciação de um dado todo em recortes (o clima terrestre em seu movimento de variação na superfície terrestre), a sequência das descrições e elos servindo para flagrar o movimento em sua diferenciação na superfície, em busca da sua diversificação paisagística [...] (MOREIRA, 2006, p. 128). Foi por meio do geógrafo americano Richard Hartshorne que suas teses seriam divulgadas. Hartshorne lecionou na Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos, procurando desenvolver reflexões sobre a natureza da Geografia como ciência, em dois livros: A natureza da geografia, publicado em 1939, que trata da evolução do pensamento geográfico; e Questões sobre a natureza da geografia, publicado em 1959, que revisa posições de vinte anos antes e apresenta o conteúdo final de sua proposta. A primeira diferença da proposta de Hartshorne residiu em este defender a ideia de que as ciências se definiriam por métodos próprios, não por objetos singulares. Assim, a Geografia teria sua individualidade e autoridade decorrentes de uma forma própria de analisar a realidade. O método especificamente geográfico viria do fato de essa disciplina trabalhar o real em sua complexidade, abordando fenômenos variados, estudados por outras ciências. Para Hartshorne, o estudo geográfico não isolaria os elementos, ao contrário, trabalharia com suas inter‑relações. A forma antissistemática seria mesmo a singularidade da análise geográfica. Desta forma, Hartshorne deixou de procurar um objeto da Geografia, entendendo‑a como um “ponto de vista”. Seria um estudo das inter‑relações entre fenômenos heterogêneos, apresentando‑as numa visão sintética. Entretanto as inter‑relações não interessariam em si, e sim, na medida que “desvendam o caráter variável das diferentes áreas da superfície da Terra”. Pois, para Hartshorne, a Geografia seria um estudo da “variação de áreas”. Os conceitos básicos formulados por Hartshorne foram os de “área” e de “integração”, ambos referidos ao método (MORAES, 1987, p. 87‑88). 76 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III A área, segundo Hartshorne, seria uma unidade da superfície terrestre delimitada pelo observador e construída subjetivamente com base nos dados escolhidos. Em La Blache, a região era vista como realidade exterior ao observador. Segundo Moraes (1987), “a singularidade de cada área seria dada pela integração de fenômenos inter‑relacionados, conforme a escolha do observador”. Com base nessas inter‑relações, ele desenvolveu duas formas de estudo em Geografia: a particular (a região), quando se faz a Geografia a qual denominou de “ideográfica”; e a geral, quando se faz a Geografia a que chamou de “nomotética” (RODRIGUES, 2008). O autor se ocupou longamente da problemática da dicotomia na ciência geográfica. Para ele, existem várias na Geografia (humana versus física; sistemática versus regional) e, ao seu ver, não cabe ao geógrafo distinguir entre fatos naturais e humanos, porque sua perspectiva seria a de realizar um estudo espacial ligado à diferenciação de áreas, e não um estudo sistemático ou histórico, que seriam duas perspectivas cognitivamente possíveis. Com Hartshorne, encerram‑se as proposições da Geografia tradicional que, segundo Moraes (1987), “deixou uma ciência elaborada, um conjunto de conhecimento sistematizado; possibilitou a formação de uma ciência autônoma; elaborou um rico acervo empírico; e, finalmente, a Geografia tradicional elaborou alguns conceitos como: território, região, habitat, paisagem, área etc., que ainda merecem ser rediscutidos”. Saiba mais Os textos a seguir podem aprofundar mais o assunto abordado nesse item; todos estão disponíveis na internet: COUTINHO, B. T. A tônica epistemo‑metodológica da(s) geografia(s) dos clássicos. Espaço em Revista, Goiás, v. 14, n. 2, p. 45‑58, jul./dez. 2012. Disponível em: <http://www.revistas.ufg.br/index.php/espaço/article/ view/19003#.UuE4FNJTvlU>. Acesso em: 18 fev. 2014. SILVEIRA, R. W. D.; VITTE, A. C. Debate e epistemologia na gênese da geografia moderna: pensamento e imaginação geográfica. In: COLÓQUIO IBÉRICO DE GEOGRAFIA, 12., 2010, Porto. Actas. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2010. Disponível em: <http://web.letras.up.pt/ xiicig/comunicacoes/202.pdf>. Acesso em: 18 fev. 2014. 6 GEOGRAFIA CONTEMPORÂNEA: A RENOVAÇÃO DA GEOGRAFIA O século XX trouxe para o mundo várias transformações políticas, econômicas, sociais, filosóficas, científicas e tecnológicas que atingiram, também, a ciência geográfica, provocando um processo de renovação e mudanças, principalmente, a partir da década de 1950, quando a Geografia tradicional entra em declínio e a ciência geográfica busca novos caminhos para seguir em frente. 77 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS Esse declínio se deu, principalmente, pelas transformações que ocorreram depois da Segunda Guerra Mundial, conforme salienta Moraes (1987): Isto defasou o instrumental de pesquisa da Geografia, implicando uma crise das técnicas tradicionais de análise (...). Criadas para explicar situações simples, quadros locais fechados, não conseguia apreender a complexidade da organização atual do espaço. O instrumental elaborado para explicar comunidades locais não conseguia apreender o espaço da economia mundializada. Estabeleceu‑se uma crise de linguagem, de metodologia de pesquisa. O movimento de renovação vai buscar novas técnicas para a análise geográfica. De um instrumental elaborado na época do levantamento de campo, vai se tentar passar, para o sensoriamento remoto, as imagens de satélite, o computador (MORAES, 1987, p. 95‑96). Geografia teórico‑quantitativa Essa corrente se desenvolveu entre as décadas de 1960 e 1970, e se caracteriza pela utilização de modelos matemático‑estatísticos. Rompendo com a Geografia moderna tradicional, se apresentou como “nova Geografia” e foi contrária ao uso de excursão e das aulas práticas de campo, por achar desnecessária a observação e a descrição da realidade empírica. Substituiu esses trabalhos por pesquisas em laboratório, onde seriam feitas as medições matemáticas, os gráficos e as tabelas sofisticadas, procurando representar os fenômenos geográficos por meio de desenhos e diagramas. Seus defensores adotaram os fundamentos do neopositivismo e se voltaram para a matemática, em especial, a estatística, para provar as hipóteses e explicar os fenômenos geográficos. Para Moraes (1987), os autores defensores da Geografia teórico‑quantitativa vão propor um estudo voltado para o planejamento, para uma Geografia instrumentalizada aplicada. O objetivo geral é buscar novas técnicas e nova linguagem que possibilitem dar conta das tarefas postas pelo planejamento do Estado e do capital. Se, anteriormente, a Geografiatradicional contribuiu para um conhecimento que levantava informações para a expansão das relações capitalistas, agora, com a Geografia teórico‑quantitativa, busca‑se um saber que direciona essa expansão, fornecendo opções e orientando estratégias de alocação do capital, no espaço geográfico. Há uma continuidade entre o pensamento geográfico teórico‑quantitativo e o tradicional, na medida em que ambos possuem uma continuidade dada por seu conteúdo de classe, ou seja, pela elaboração de instrumentos práticos e ideológicos da burguesia. Pode‑se chamar essa corrente de uma renovação conservadora da Geografia, pois também ocorre a passagem do positivismo clássico para o neopositivismo. Na teórico‑quantitativa se troca o empirismo da observação direta pelo empirismo mais abstrato dos dados filtrados pela estatística. De fato, a expressão “Geografia quantitativa”, utilizada para exprimir a existência de uma Geografia nova, introduziu certo mal estar e confusão. A expressão “Geografia matemática” ou “quantitativa” pode, na realidade, aplicar‑se a qualquer dos paradigmas da Geografia, novos ou antigos, mesmo 78 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III aos que hoje não são mais válidos para nenhuma escola. A quantificação representa apenas um instrumento ou, no máximo, o instrumento. Seria melhor chamar a atenção sobre os aspectos mais teóricos ou conceituais, quer dizer, sobre os próprios paradigmas. O que continua fundamental é a construção teórica (SANTOS, 1986, p. 52). Segundo Rodrigues (2008): Os defensores da corrente teórico‑quantitativa consideram o seguinte princípio: se a matemática é a linguagem das ciências em geral, então ela também deve ser a da Geografia, pois, por intermédio da matemática, é possível a formulação de teorias na Geografia e, também, a utilização de teorias de outras ciências. Portanto é dada grande importância à matemática, especialmente à estatística, pois esta pode garantir a exatidão e a confiabilidade dos resultados (RODRIGUES, 2008). Os principais autores dessa corrente são: J. H. Von Thünen (1783‑1850), que elaborou um modelo de ordenamento teórico para o uso do solo, o impacto da distância sobre uma dada produção; Alfred Weber (1868‑1958), sobre a questão da escolha para a localização industrial; Walter Christaller (1893‑1969), sobre “lugares centrais”. Em última análise, segundo Moraes (1987), a Geografia teórico‑quantitativa propôs uma tecnologia de intervenção da realidade e foi uma arma de dominação para os detentores do Estado, pois era constituída de um conjunto de técnicas que se transformou em ideologia. Atualmente os geógrafos que trabalham sob sua orientação metodológica têm realizado uma renovação nas abordagens e voltaram seus estudos, também, para a problemática ambiental e social, afastando‑se, assim, do tecnicismo a serviço do Estado. Geografia da percepção e do comportamento Essa corrente do pensamento geográfico surgiu no fim da década de 1960 e início da de 1970 e caracteriza‑se por realizar estudos para explicar como o indivíduo tem a percepção do lugar, pois, para cada indivíduo, o lugar é aquele em que ele se encontra ambientado, faz parte de seu mundo, seus sentimentos e suas ações. Esta buscaria entender como os homens percebem o espaço por eles vivenciado, como se dá sua consciência em relação ao meio que os encerra, como percebem e como reagem frente às condições e aos elementos da natureza ambiente, e como este processo se reflete na ação sobre o espaço. Os seguidores desta corrente tentam explicar a valorização subjetiva do território, a consciência do espaço vivenciado, o comporta mento em relação ao meio. Estes estudos fazem uso do instrumental desenvolvido pela psicologia, em particular as teorias behavioristas. As pesquisas efetuadas 79 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS abordam temas como os seguintes: o comportamento do homem urbano em relação aos espaços de lazer; a influência das formas na produtividade do trabalho; a relação das sociedades com a natureza, expressa na organização dos parques; a atitude frente a novas técnicas de plantio numa determinada comunidade rural; a concepção e as formas de representação do espaço numa sociedade indígena africana, entre outros (MORAES, 1987, p. 106). A fenomenologia, a cultura e a psicologia, segundo a Geografia da percepção e comportamento, são fundamentais para o entendimento do lugar, da relação entre o homem e o meio ambiente, visando à compreensão do homem no ambiente, experiências de vida, ações e realizações individuais ou coletivas. Podemos citar como geógrafos dessa corrente David Lowentahal, Yi‑Fu Tuan e Anne Buttiner. Atualmente as principais vertentes dessa corrente são a Geografia da percepção, a Geografia humanística e a Geografia cultural. Essas correntes valorizam a percepção, o pensamento, os símbolos, a cultura, os sentimentos e a ação do homem em seu “mundo vivido”. Muitos são os temas abordados por essas novas orientações geográficas: qualidade ambiental, paisagens valorizadas, riscos ambientais, representações do mundo, imagens de lugares distantes, história das paisagens, relações entre arte, paisagens e lugares, espaços pessoais, construção de mapas mentais, percepção ambiental e planejamento. Geografia ecológica A década de 1970 foi um marco para a história do pensamento geográfico. É a partir dessa década, juntamente com o surgimento dos movimentos ecológicos, que se intensificaram os movimentos de renovação do pensamento geográfico que, num primeiro momento, se dividiram em duas correntes distintas: a Geografia pragmática, de vasta aplicação no planejamento, ligada fortemente ao empirismo e, consequentemente, à Geografia tradicional; e a Geografia crítica, com sua preocupação voltada para as relações dos homens dentro da sociedade. É certo que questões antigas como a dicotomia entre Geografia física e Geografia humana estão longe de serem resolvidas, conforme assinalou Vesentini: O distanciamento do geógrafo físico ou ambientalista e o geógrafo humano ou estudioso do social (mesmo que se trate do espaço social construído) sempre foi sensível, e nos nossos dias tende, cada vez mais, a crescer. Há os especialistas em cartografia, geomorfologia, climatologia, Geografia urbana, Geografia política, Geografia da população, teoria e história do pensamento geográfico etc., e a pretensa unidade fica sendo apenas uma justificativa acadêmica ou meramente de rótulos. É certo que há análise ambiental, o estudo global do meio ambiente na perspectiva do impacto realizado pelo homem. É certo ainda que há expansões da análise economicista até a natureza, na questão da produção da segunda natureza pelo social (VESENTINI, 1997, p. 10). 80 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III A dicotomia entre o natural e o social se deve ao fato dessas duas vertentes terem “lógicas” diferentes. No social há dialética, contradição e lutas, vencedores e vencidos, que, trazidas para a explicação da natureza, sempre fracassaram. O mesmo acontece com o inverso, a natureza pode ser conhecida por métodos – como hipóteses, testes, aplicabilidade – que, no estudo do social, geraram o positivismo. Como já vimos, essa dicotomia se dá por estar ligada às origens da Geografia como ciência que estava intimamente ligada à legitimação dos estados‑naçõese à expansão do sistema escolar. Essa unidade só tem sentido com vistas à legitimação da Geografia no sistema escolar; no nível acadêmico, porém, não há necessidade de uma disciplina geográfica unificada: os estudos integrados, que levam em conta as ações humanas e os processos fisiográficos, podem ser feitos por equipes de especialistas (até formados por profissionais de outras áreas). A divisão entre Geografia da natureza e da sociedade é um subproduto dessa oposição homem‑natureza que a modernidade gerou ao se constituir e reproduzir. Essa tendência de separar o homem da natureza é uma característica marcante do pensamento que tem dominado o mundo ocidental, cuja matriz filosófica se encontra na Grécia e Roma clássicas; isso não quer dizer, todavia, que não existam outras formas de pensar a relação homem‑natureza, mas o que se coloca em questão no momento é o conceito de natureza que tem vigorado, e a forma como ele perpassa o sentir, o pensar e o agir de nossa sociedade. Na verdade coloca em questão o modo de ser, de produzir e de viver dessa sociedade. No Ocidente já houve época em que o modo de pensar a natureza foi diferente do que tem dominado nas épocas moderna e contemporânea. Essa fase remonta ao período dos filósofos pré‑socráticos que pensavam a natureza como um todo. Para esses filósofos, os deuses eram manifestações da natureza, não viviam numa região longínqua, separada, pois tudo, todo o mundo que circunda o homem e que se oferece ao seu pensamento, está repleto de deuses e dos efeitos de seu poder. É com Platão e Aristóteles que se começa assistir um crescente privilegiar do homem e da ideia. Entretanto foi com a influência judaico‑cristã que as oposições homem‑natureza e espírito‑matéria adquiriram maior dimensão. A ideia de que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus faz com que o homem tenha privilégios em relação aos outros seres, por ser dotado de uma alma, enquanto as demais criaturas não o são. Esse fato irá acentuar a separação entre espírito e matéria, entre o homem e a natureza. Porém apenas com Descartes essa oposição homem‑natureza, espírito‑matéria, sujeito‑objeto se tornará mais completa, constituindo‑se no centro do pensamento moderno e contemporâneo. Dois aspectos da filosofia cartesiana vão marcar a modernidade. Em primeiro lugar, o caráter pragmático que o conhecimento adquire, ou seja, o conhecimento deve ser útil à vida. Dessa forma, o conhecimento cartesiano vê a natureza como recurso, um meio para se atingir um fim. Em segundo lugar, o antropocentrismo, pelo qual o homem passa a ser visto como o centro do mundo e, instrumentalizado pelo método científico, pode penetrar nos mistérios da natureza e, assim, tornar‑se “senhor e possuidor da natureza”. O antropocentrismo e o sentido pragmático‑utilitarista do pensamento cartesiano não podem ser desvinculados do mercantilismo que se afirmava e já se tornava, com o colonialismo, senhor e possuidor de todo o mundo. 81 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS Na filosofia cartesiana, o antropocentrismo consagrará a capacidade humana de dominar a natureza que, dessacralizada, já que não mais povoada por deuses, pode ser tornada objeto e, visto que não tem alma, pode ser dividida. Com a instituição do capitalismo, essa tendência será levada às últimas consequências. O Iluminismo, no século XVIII, vai criticar a Metafísica, em nome da Física, em nome da natureza tomada aqui no sentido do concreto. O século XIX será o triunfo desse mundo pragmático onde a natureza é considerada cada vez mais um objeto a ser possuído e dominado. O positivismo de Augusto Comte, que norteia todos os trabalhos científicos de meados do século XIX até início do nosso século, também assimilou esse conceito de natureza. Segundo a concepção positivista, a natureza é vista nela e por ela mesma, externa às atividades humanas. Essa concepção é dada dualisticamente, pois se considera que a “natureza” é estudada exclusivamente pela ciência natural, enquanto a ciência social preocupa‑se com a sociedade que, por sua vez, não tem relação nenhuma com a natureza. Conforme essa concepção existem “duas naturezas” distintas entre si: a “natureza” da ciência natural, supostamente independente das atividades humanas, e a “natureza” da ciência social, criada socialmente. Ainda de acordo com a concepção positivista, o homem, como ser natural, é regido pelas mesmas leis que regulam qualquer ser vivo sobre a Terra. Mas a natureza humana exerce seu domínio sobre as “leis da natureza” no processo de apropriação. A concepção de natureza também foi um dos temas de Karl Marx em sua crítica ao modo de produção capitalista. A interpretação historicista da natureza surge na ideologia alemã, obra de Marx e Friedich Engels (1820‑1895), em que os autores fundamentam que a história pode ser examinada por dois aspectos: história da natureza e história dos homens. A história da natureza precederia a história da humanidade, mas, uma vez que esta última houvesse atingido um elevado grau de desenvolvimento tecnológico (o que ocorreu com o advento do capitalismo, da modernidade afinal) e agisse cada vez mais eficazmente no sentido de modificar a natureza, a história natural ficaria subordinada à história social, seria uma parte integrante desta. A grande preocupação dessa linha interpretativa não é, evidentemente, o estudo da natureza em si, mas a fundamentação do socialismo como continuação lógica do capitalismo, como “etapa” histórica posterior e mais avançada numa interpretação evolucionista (SOARES PONTES, 1999, p. 38). As referências à natureza, em Marx, são voltadas para a fundamentação evolucionista da sociedade, numa sequência de modos de produção que, indubitavelmente, levaria ao socialismo real. A partir da década de 1970, com o surgimento dos movimentos ecológicos, se começa a pensar sobre como a sociedade atual enxerga a natureza. Se, antes, a ideia central era a sua dominação, hoje é a destruição provocada pelo homem que acentua esse distanciamento. É comum em nossos dias nos 82 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III depararmos com a frase: “o homem está destruindo a natureza”. Não é o homem que destrói a natureza, como se não fizesse parte dela, e sim o modo de produção que predomina em nossa sociedade, nos tempos atuais, e que tem como filosofia a dominação não só da natureza, como do próprio homem, que está por destruí‑la. O modo de produção adotado pela sociedade, principalmente neste último século, é que vai determinar as relações entre homens e, por conseguinte, a relação sociedade‑natureza. No sistema de produção capitalista, as relações de trabalho respondem pela exploração da força de trabalho e a forma de propriedade dos meios de produção é privada; portanto, há, nesse caso, não só a dominação do homem retentor do capital em relação à natureza, mas em relação ao próprio homem. Dentro do modo de produção capitalista, a natureza é considerada como externa, mas feita como interna. A Geografia tem sido resistente ao conceito contraditório de “natureza”, sobretudo a partir do momento em que se interessa pelas relações homem‑natureza. A questão ambiental encontra‑se fundamentada na relação de propriedade das forças produtivas determinada pelas relações homem‑homem, pois é justamente essa relação que dá a direção geral à relação homem‑meio. À medida que o caráter de apropriação privada da natureza é desenvolvido, o acúmulo de capital torna‑se consequência, o que além de responder peloprocesso de degradação ambiental, responde pelo antagonismo de classes (CASSETI, 1991, p. 14). Daí se chega à conclusão que o desenvolvimento descontrolado das forças produtivas dentro do sistema capitalista tem agravado ainda mais os impactos e enfatizado as relações de produção, que nada mais são que relações de domínio e submissão. Na Geografia ecológica não há uma identidade ideológica entre os vários geógrafos sobre soluções a serem adotadas em relação aos impactos destrutivos sobre o meio ambiente, mas, em comum, eles defendem a preservação da natureza e buscam combater as políticas desenvolvimentistas, de interesse principalmente capitalista, que vêm financiando a exploração e a destruição do meio ambiente de forma indiscriminada (RODRIGUES, 2008, p. 117‑118). A Geografia ecológica está inserida nesse contexto e seus principais autores são Jean Tricart (1920‑2003), geógrafo francês e um dos reformuladores da geomorfologia; publicou o livro que dá visão global de uma Geografia ecológica – L’Ecogeographie; Roland Paskoff (1935‑2005), que publicou o livro Géographi de l’environnement, com observações em áreas desérticas ou em processo de desertificação; no Brasil, destaca‑se o geomorfólogo Aziz Nacib Ab’Saber (1924‑2012), que, após anos de trabalho e pesquisa, passou a militar como cientista e cidadão, publicando artigos e notas em jornais, e escrevendo ensaios sobre os problemas ecológicos. A tese de doutorado do Dr. Aziz Ab´Sáber, publicada em 1957, foi sobre A geomorfologia e o sítio urbano da cidade de São Paulo. Uma de suas teorias mais conhecidas é a dos refúgios, quando afirma: 83 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS [...] os domínios de paisagem geográfica atuais são o resultado da combinação de formas vindas das trocas de condições ambientais do passado e do presente, com assento histórico nos acontecimentos dos períodos glaciares e interglaciares do quaternário (AB´SÁBER, 1957 apud MOREIRA, 2010). A questão ambiental tem sido foco de discussões em todo o mundo e cabe à ciência – incluindo a Geografia – tentar reverter a situação da degradação do meio ambiente. Geografia crítica ou radical A Geografia crítica ou radical é outra corrente do pensamento geográfico que se inicia na década de 1970, em decorrência de diversos fatores, entre eles as manifestações nos Estados Unidos contra a guerra do Vietnã (nos anos 1960); a luta pelos direitos civis (em diversos países); a destruição do meio ambiente; os problemas da urbanização; a pobreza nos países subdesenvolvidos; o racismo; os movimentos feministas; os movimentos estudantis; a desigualdade entre classes sociais; e a desigualdade entre países ricos e pobres. Os métodos, as técnicas e os fundamentos da Geografia tradicional e da Geografia teórico‑quantitativa tornaram‑se insuficientes para apreender a complexidade do espaço. A simples descrição (Geografia tradicional) e a construção e explicação, por meio de modelos, utilizando‑se de elementos da matemática e da estatística (Geografia teórico‑quantitativa), tornaram‑se insuficientes para a explicação de muitos problemas do espaço geográfico. Era preciso realizar estudos voltados para a análise das ideologias e de novas questões políticas, econômicas e sociais. Assim, a partir dos anos 1970, sob influência das teorias marxistas, surge uma tendência crítica à Geografia tradicional e à Geografia teórico‑quantitativa, cujo centro de preocupação passa a ser as relações sociais e de produção, e as relações sociedade‑natureza na produção do espaço geográfico, considerando o objeto de estudo da Geografia o espaço social (RODRIGUES, 2008, p. 121). Essa nova corrente criticou a Geografia tradicional e a Geografia teórico‑quantitativa, pois afirmava que ambas estavam a serviço da ação do Estado e das empresas capitalistas. A proposta dessa nova corrente da Geografia seriam as denúncias e as lutas sociais, pois não bastava explicar o mundo, é preciso transformá‑lo. A Geografia crítica tem suas raízes na ala mais progressista da Geografia regional francesa. A figura de Jean Dresch aparece, no seio desse movimento, como um exemplo único de afirmação de um discurso político crítico; suas teorias foram já uma antecipação (Dresch escreve suas obras nas décadas de 1930 e 1940). Esta ala da Geografia regional vai progressivamente se inteirando do papel dos processos econômicos e sociais, no direcionamento da organização do espaço. Assim, abre uma discussão mais política na análise geográfica. Tal abertura embasou‑se na crescente importância do 84 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III elemento humano na Geografia francesa, que aparece na diferenciação entre meio e meio geográfico, na sujeição da Geografia física à humana, e na ideia da região como produto histórico (e sua valorização como objeto primordial). Assim, a Geografia regional francesa aproximou‑se da História e da Economia. É no bojo desse processo que germinam as primeiras manifestações de um pensamento geográfico crítico, ao se introduzir, na análise regional, novos elementos (MORAES, 1987, p. 117). Segundo o autor, a primeira manifestação clara da renovação crítica pode ser constatada na proposta da obra Geografia ativa (escrita por P. George, Y. Lacoste, B. Kayser e R. Guglielmo). Esta obra tinha como objetivo uma Geografia de denúncia de realidades espaciais contraditórias e buscava explicar as regiões, abordando formas e funcionalidades e, também, contradições sociais: a miséria, a subnutrição, as favelas etc. Andrade (1987) afirma que na Geografia crítica encontram‑se grandes subdivisões, como a corrente de geógrafos não marxistas, mas comprometidos com os problemas sociais; geógrafos com formação anarquista que utilizam os discursos de Élisée Reclus e Piotr Kropotkin nas críticas à sociedade burguesa; e geógrafos de formação marxista, dando ênfase às formações econômicas e aos modos de produção. Um dos principais autores dessa corrente de pensamento foi Yves Lacoste, que formulou uma crítica severa à Geografia tradicional em seu livro A geografia: isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra. Nesse livro Lacoste argumenta que há uma Geografia dos Estados‑maiores ligada à prática do poder, cuja função é conhecer o espaço para organizá‑lo, a partir e a serviço dos interesses do Estado. Ainda segundo Lacoste, existe, também, uma Geografia dos professores, que repassa aos alunos um saber inútil que descreve lugares e enumera informações sem lhes dar o significado que realmente têm. Outro importante autor dessa corrente, reconhecido internacionalmente, foi Milton Santos (1926‑2001), que foi um geógrafo comprometido com uma visão totalizadora e dinâmica das transformações da sociedade. Em seus trabalhos apresenta uma visão crítica da sociedade capitalista. A obra Por uma geografia nova contém uma proposta geral para o estudo geográfico, é um livro de conteúdo normativo. Milton Santos argumenta que é necessário discutir o espaço social e ver a produção do espaço como objeto. Este espaço social ou humano é histórico, obra do trabalho, morada do homem. É, assim, uma realidade e uma categoria de compreensão da realidade. Toda sua proposta será, então, uma tentativa de apreendê‑lo, de como estudá‑lo. Diz que se deve ver o espaço como um campo de força, cuja energia é a dinâmica social. Que ele é um fato social, um produto da ação humana, uma natureza socializada, que pode ser explicável pela produção. Afirma, entretanto, que o espaço é também umfator, pois é uma acumulação de trabalho, uma incorporação de capital na superfície terrestre, que cria formas duráveis, as quais denomina “rugosidades”. Estas criam imposições sobre a ação presente da sociedade; são uma “inércia dinâmica” – tempo incorporado na paisagem – e duram 85 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS mais que o processo que as criou. São, assim, a herança espacial, que influi no presente. Por esta razão, o espaço é também uma instância, no sentido de ser uma estrutura fixa e, como tal, uma determinação que atua no movimento da totalidade social. As formas espaciais são resultados de processos passados, mas são também condições para processos futuros. As velhas formas são continuamente revivificadas pela produção presente, que as articula em sua lógica. Caberia, antes de mais nada, entender como se dá este movimento (MORAES, 1987, p. 123‑124). Observação Consagrado cientista e geógrafo, o brasileiro Milton Santos, natural da Bahia, teve uma longa carreira docente e de pesquisas. Tornou‑se bacharel em Direito; doutor em Geografia pela Universidade de Estrasburgo, na França, sob a orientação do professor Jean Tricart; foi professor catedrático de Geografia humana na Universidade Federal da Bahia, onde fundou um laboratório de geociências; presidiu a Fundação Comissão de Planejamento Econômico do Estado da Bahia; atuou como representante da Casa Civil do Presidente Jânio Quadros. Devido à situação política do Brasil, na década de 1960, empreendeu carreira internacional – inicialmente na França – como professor convidado nas universidades de Toulouse, Bordeaux, Sorbonne, no Instituto de Estudos do Desenvolvimento Econômico e Social; dentre outras atuações no exterior. Retornando ao Brasil, atuou na Universidade Federal do Rio de Janeiro; na Universidade de São Paulo, onde foi professor titular de Geografia humana, recebendo o título de professor emérito. Seus estudos sobre o meio técnico‑científico‑informacional visaram a entender a organização do espaço atual. Podemos destacar algumas obras produzidas relacionadas com a Geografia crítica ou radical: Geografia da fome, de Josué de Castro; Geografia do subdesenvolvimento, de Yves Lacoste; Sociologia e Geografia, de P. George; Geografia e dialética, de R. Guglielmo; Geografia e ideologia, de J. Anderson; Marxismo e Geografia, de Massimo Quaine. Segundo Rodrigues (2008), a Geografia crítica é uma frente que reúne diversos grupos e orientações, mas todos assumem uma perspectiva de transformação da ordem social, uma sociedade mais justa e solidária, uma Geografia solidária, que trabalhe por justiça social, considerando a sociedade‑natureza, tendo como principal fundamentação teórico‑metodológica a dialética materialista de Karl Marx. 86 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 Unidade III Lembrete A Geografia crítica ou radical é a corrente do pensamento geográfico que se inicia em decorrência de diversos fatores, como as manifestações nos Estados Unidos contra a guerra do Vietnã (nos anos 1960); a luta pelos direitos civis (em diversos países); a destruição do meio ambiente; os problemas da urbanização; a pobreza nos países subdesenvolvidos; o racismo; os movimentos feministas; os movimentos estudantis; a desigualdade entre classes sociais; e a desigualdade entre países ricos e pobres. Saiba mais Três livros que abordam mais profundamente a questão do método e o objeto na Geografia, a História do pensamento geográfico e a Geografia crítica: MORAES, A. C. R de. Geografia: pequena história crítica. 8. ed. São Paulo: Hucitec, 1987. RODRIGUES, A. J. Geografia: introdução à ciência geográfica. São Paulo: Avercamp, 2008. SANTOS, M. Por uma geografia nova. São Paulo: Hucitec, 1986. Resumo Nesta unidade, vimos que a produção científica do conhecimento geográfico teve suas características nos princípios da concepção positivista da realidade, elaborados por Augusto Comte, que predominou em toda a produção científica geral do século XIX e meados do século XX. A Geografia moderna nasceu na Alemanha, a partir de interesses específicos de conhecimento de territórios. Sob o paradigma tradicional “a terra e o homem”, decorrente de uma necessidade ideológica, criou‑se a ideia de unidade, de “ciência de síntese”, de “ponte” entre o natural e o social. As bases da Geografia, como conhecimento científico, foram lançadas em meados do século XIX, por dois cientistas alemães, Humboldt e Ritter, 87 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14 FUNDAMENTOS DE GEOGRAFIA: ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO E CONCEITOS que se baseavam no empirismo, ou seja, se limitavam ao detalhamento das características físicas dos lugares, mensurando‑as e catalogando‑as, ao mesmo tempo em que procuravam explicações para suas dinâmicas e o estabelecimento de leis, numa tentativa de sistematizar os conhecimentos apreendidos. Datam desse período as expedições científicas na própria Europa e em outros continentes. Dando continuidade à produção científica iniciada por Humboldt e Ritter, aparece outro cientista alemão, Ratzel, que produziu uma descrição dos lugares onde o natural e o humano se apresentavam dissociados, lançando, assim, a corrente determinista, segundo a qual os lugares influenciavam o modo de ser e agir dos homens, sempre justificando a dominação cultural. O geógrafo francês Vidal de La Blache, contrapondo‑se a Ratzel, propõe a corrente possibilista. A contribuição que La Blache deu para a evolução do pensamento geográfico foi marcante, tanto por sua abordagem regional, como por acentuar a separação entre os elementos físico‑naturais e os elementos humano‑sociais das paisagens. Sua proposta de análise regional, no entanto, não conseguiu inter‑relacionar o homem com o meio natural; o meio físico nada mais era que um suporte para o desenvolvimento dos grupos humanos. Seguindo a mesma linha de La Blache, porém com uma proposta mais elaborada, temos Max Sorre, que entendia a Geografia como um estudo da ecologia do homem, isto é, da relação dos agrupamentos com o meio em que estão inseridos, processo pelo qual o homem transforma esse meio, sendo que as condições do meio geográfico, fruto da ação do homem, não seriam as mesmas daquele meio natural original. A ideia de espaço geográfico de Sorre é a de espaços sobrepostos (o físico, o econômico, o social, o cultural) em inter‑relação. Elisée Reclus aborda assuntos como a luta de classes, a educação e as ciências, as formas de propriedade, o colonialismo e a dominação dos países desenvolvidos. Nesses estudos, procurava não fazer separação entre Geografia física e humana; estudava suas inter‑relações. Outra corrente do pensamento geográfico vinculou‑se aos nomes de Hettner e Hartshorne. Essa corrente, diferentemente da Geografia de Ratzel e La Blache, que tiveram suas raízes no positivismo de Augusto Comte, fundamentava‑se no neokantismo de Rickert e Windelband. Hartshorne se ocupou longamente da problemática da dicotomia na ciência geográfica. Para ele, existem várias dicotomias na Geografia (humana versus física; sistemática versus regional) e, a seu ver, não cabe 88 Re vi sã o: C ris tin a / G io va nn a / R os e / V al ér ia - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 18 /0 3/ 20 14
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