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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA INSTITUTO SUPERIOR TÉCNICO A GEOTECNIA NA CONCEPÇÃO, PROJECTO E EXECUÇÃO DE TÚNEIS EM MACIÇOS ROCHOSOS Mário José Nascimento Bastos (Licenciado) Dissertação para obtenção do grau de Mestre em Georrecursos – Área de Geotecnia Orientador: Carlos A. J. V. Dinis da Gama (Professor Catedrático, IST, UTL) Co-Orientador: José J. R. Delgado Muralha (Doutor, Investigador Auxiliar do LNEC) JÚRI Carlos A. J. V. Dinis da Gama (Professor Catedrático, IST, UTL) António Diogo Pinto (Professor Associado com Agregação, IST, UTL) José E. T. Quintanilha de Menezes (Professor Auxiliar, FE, UP) José J. R. Delgado Muralha (Doutor, Investigador Auxiliar do LNEC) JUNHO DE 1998 aos meus pais . . . “A Ciência permanecerá sempre a satisfação do desejo mais alto da nossa natureza, a curiosidade; fornecerá sempre ao Homem o único meio que ele possui de melhorar a própria sorte”. Renan, O Futuro da Ciência. I A GEOTECNIA NA CONCEPÇÃO, PROJECTO E EXECUÇÃO DE TÚNEIS EM MACIÇOS ROCHOSOS RESUMO O presente trabalho aborda a diversidade de contribuições da geotecnia para a engenharia de obras subterrâneas, com especial destaque para a sua concepção, projecto e execução. São focados os principais aspectos da prospecção geotécnica, no que se refere às técnicas e aplicações. São abordados, igualmente, os aspectos geotécnicos relacionados com o Projecto de uma obra subterrânea, bem como os diferentes critérios de escavabilidade de maciços rochosos e métodos de escavação. Referem-se as opções e critérios de dimensionamento dos suportes. É dado especial realce às técnicas e equipamentos de observação e instrumentação de túneis, e a sua importância no controlo de uma escavação subterrânea, bem como aspectos relacionados com a segurança e salubridade, de forma a atingir a pretendida qualidade da obra. Uma vez tratados estes conceitos, é feita a descrição do acompanhamento geotécnico da abertura de túneis de um interceptor localizado nos arredores de Lisboa, acompanhamento esse que permitiu validar e aperfeiçoar as soluções de projecto, com a intervenção da geotecnia a nível da escavabilidade, da monitorização da estabilidade, do suporte primário e do revestimento definitivo. II GEOTECHNICS IN THE CONCEPTION, DESIGN AND CONSTRUCTION OF TUNNELS IN ROCK MASSES ABSTRACT The work deals with the diversity of geotechnical contributions to the Engineering of Underground Workings, with special reference to their conception, design and execution. The most relevant aspects of geotechnical prospecting activities, involving techniques and applications, are described. Further geotechnical contributions to the design phase are emphasised, covering not only excavation methods and excavability of rock masses, but also support assessment criteria. Particular importance is ascribed to the utilisation of geotechnical monitoring systems for the control of tunnel stability, as well as to contributions for health and safety of human labour, in order to reach the desired quality of these workings. A description of the geotechnical assistance to a long tunnel recently built in the vicinity of Lisbon is provided, which has validated and improved design solutions, in the domains of excavability, stability monitoring, primary support and permanent lining. III PALAVRAS CHAVE Túneis Geotecnia Geomecânica Concepção Projecto Execução Constrangimentos KEY WORDS Tunnels Geotechnics Geomechanics Conception Design Construction Constraints IV AGRADECIMENTOS Quando se realiza um trabalho desta índole, apercebemo-nos da importância concreta de quem nos apoia, a todos os níveis. À JNICT - Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, pela bolsa conferida nestes dois anos de mestrado. À Administração da SANEST S.A., que me permitiu o estudo e acompanhamento da construção dos túneis do Interceptor Jamor-Laje (2ª Fase). À Administração e técnicos da HIDROPROJECTO S.A. e da HIDROMINEIRA, Lda, pela disponibilização de meios humanos e materiais, bem como pela importante colaboração prestada, nomeadamente ao Prof. C. Dinis da Gama (HIDROMINEIRA) e ao Engº Garrido Baptista (HIDROPROJECTO), bem como ao Engº José Emílio da Silva (CONSULMAR) e a toda a equipa da Assessoria Técnica à SANEST S.A.. Aos técnicos envolvidos na obra em estudo, nomeadamente o Sr. José Paiva (FBO), Dra. Filomena Gonçalves (CÊGÊ) e Engº Paulo Cerqueira (EPOS), pela disponibilização de dados e pelas informações específicas relativas às suas actividades. Aos docentes e funcionários do Departamento de Engenharia de Minas do Instituto Superior Técnico, nomeadamente a Profª Matilde Costa e Silva e o Prof. Rui Couto, pelo seu apoio e encorajamento. Aos meus colegas e amigos, Engª Patrícia Falé e Costa, Engº Pedro Bernardo e Engº Humberto Guerreiro pelos constantes incitamentos e valiosos auxílios, e pela amizade que me demonstraram no decorrer deste projecto. À minha colega e amiga Engª Alexandra Borges, a quem muito fico a dever, pelo apoio e amizade e pela inestimável ajuda e pareceres técnicos. Ao meu co-orientador, Engº José Muralha (LNEC), pelo precioso auxílio e orientação, tanto nos seus pareceres e conselhos como na gentil cedência dos seus elementos técnicos. Ao meu orientador, Prof. Carlos Dinis da Gama, cuja colaboração, apoio técnico e humano, orientação e empenho foram inexcedíveis. A ter valor, este trabalho deve-o fundamentalmente a ele. Aos meus amigos e à minha família, principalmente aos meus pais, que suportaram incansavelmente esta minha fase de alheamento, auxiliando-me e apoiando-me em tudo o que necessitei. Os agradecimentos nominais têm o inconveniente de não incluírem todos os que colaboram, sob o risco de tornarem este elemento numa longa e fastidiosa lista. Se estes agradecimentos omitiram alguém, trata-se apenas um lapso no papel, o autor tem bem presente o apoio e as valiosas contribuições de todos vós. ÍNDICE GERAL V ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO .............................................................................................................................1 1.1. PREÂMBULO .......................................................................................................................1 1.2. CONTEÚDO DO TRABALHO.............................................................................................2 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA...........................................................4 2.1. PLANEAMENTO E MÉTODOS DE PROSPECÇÃO .........................................................4 2.1.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS .............................................................................................4 2.1.2. RECONHECIMENTO PRELIMINAR ..................................................................................6 2.1.3. PROSPECÇÃO DE CAMPO...............................................................................................8 2.1.4. CARACTERIZAÇÃO COMPLEMENTAR..........................................................................12 2.2. RELATÓRIO GEOTÉCNICO.............................................................................................15 2.2.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS ...........................................................................................15 2.2.2. CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA DO TERRENO ..........................................................15 2.2.3. AVALIAÇÃO DOS CONDICIONALISMOSGEOTÉCNICOS ...............................................20 2.3. CARACTERIZAÇÃO SISTEMÁTICA “IN SITU”............................................................21 3. CONSIDERAÇÕES AO PROJECTO DE ENGENHARIA EM TÚNEIS..................................25 3.1. FASES DE PROJECTO.......................................................................................................25 3.1.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS ...........................................................................................25 3.1.2. ESTUDO PRÉVIO .........................................................................................................28 3.1.3. PROJECTO BASE .........................................................................................................29 3.1.4. PROJECTO DE EXECUÇÃO...........................................................................................30 3.2. CONSTRANGIMENTOS AO PROJECTO ........................................................................32 3.3. CONSTRANGIMENTOS NA EXECUÇÃO ......................................................................33 4. ESCAVAÇÃO EM MACIÇOS ROCHOSOS.............................................................................35 4.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS .............................................................................................35 4.2. CRITÉRIOS DE ESCAVABILIDADE ...............................................................................36 4.2.1. DESCRIÇÃO DOS PRINCIPAIS CRITÉRIOS DE ESCAVABILIDADE...................................36 4.2.1.1. Introdução ........................................................................................................36 4.2.1.2. Método de Franklin et al..................................................................................38 4.2.1.3. Método de Kirsten ...........................................................................................39 4.3. MÉTODOS DE ESCAVAÇÃO...........................................................................................40 4.3.1. CONDICIONALISMOS NA SELECÇÃO DO MÉTODO DE ESCAVAÇÃO .............................40 4.3.2. ESCAVAÇÃO COM EXPLOSIVOS..................................................................................43 4.3.2.1. Condicionantes Gerais .....................................................................................43 4.3.2.2. Utilização de Explosivos .................................................................................44 4.3.2.3. Danos Causados ao Maciço .............................................................................47 4.3.2.4. Segurança e Manuseamento de Explosivos .....................................................49 4.3.3. ESCAVAÇÃO MECÂNICA ............................................................................................52 5. SUPORTE DE MACIÇOS ROCHOSOS ....................................................................................55 5.1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................55 5.2. MÉTODOS DE SUPORTE PRIMÁRIO .............................................................................59 5.2.1. DIMENSIONAMENTO DE SUPORTES .............................................................................59 5.2.1.1. Considerações Gerais.......................................................................................59 5.2.1.2. Classificações Geomecânicas ..........................................................................60 5.2.1.3. Curvas de Resposta do Terreno .......................................................................68 5.2.1.4. Métodos Computacionais ................................................................................72 5.2.2. CONSIDERAÇÕES SOBRE OS TIPOS DE SUPORTE PRIMÁRIO.........................................73 5.3. CONSIDERAÇÕES SOBRE O SUPORTE SECUNDÁRIO..............................................76 ÍNDICE GERAL VI 5.4. ASPECTOS CONSTRUTIVOS – O NOVO MÉTODO AUSTRÍACO .............................78 6. OBSERVAÇÃO E QUALIDADE DA OBRA............................................................................81 6.1. PLANEAMENTO E ORGANIZAÇÃO ..............................................................................81 6.2. INSTRUMENTAÇÃO DOS TRABALHOS .......................................................................82 6.2.1. OBJECTIVOS DA INSTRUMENTAÇÃO...........................................................................82 6.2.2. MEDIÇÕES E EQUIPAMENTOS DE AUSCULTAÇÃO .......................................................85 6.2.3. PRINCIPAIS ACTIVIDADES DE OBSERVAÇÃO GEOTÉCNICA.........................................87 6.2.3.1. Cartografia Geotécnica ....................................................................................87 6.2.3.2. Medição de Convergências..............................................................................88 6.2.3.3. Amostragem e Monitorização dos Elementos de Suporte ...............................90 6.3. CONTROLO DE IMPACTES .............................................................................................90 6.3.1. VIBRAÇÕES RESULTANTES DE DETONAÇÕES .............................................................90 6.3.2. RUÍDO RESULTANTE DE DETONAÇÕES .......................................................................93 6.3.3. ASSENTAMENTOS SUPERFICIAIS.................................................................................95 6.3.4. OUTROS IMPACTES .....................................................................................................96 6.4. SEGURANÇA E SALUBRIDADE.....................................................................................97 6.5. ASSESSORIA GEOTÉCNICA ...........................................................................................99 6.6. CONTROLO DE QUALIDADE DA OBRA.....................................................................100 6.6.1. ASPECTOS TÉCNICOS DO CONTROLO DE QUALIDADE...............................................100 6.6.2. CONDICIONALISMOS NA QUALIDADE DA OBRA........................................................101 6.7. RELATÓRIO DE EXECUÇÃO DE TÚNEIS...................................................................103 7. ESTUDO DOS TÚNEIS DO INTERCEPTOR JAMOR-LAJE (2º FASE) ..............................105 7.1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................105 7.2. DESCRIÇÃO DOS TRABALHOS DE PROSPECÇÃO ..................................................109 7.3. DESCRIÇÃO DO PROJECTO..........................................................................................116 7.4. FISCALIZAÇÃO DA OBRA ............................................................................................119 7.5. ASSESSORIA TÉCNICA AO DONO DE OBRA ............................................................120 7.6. ESCAVAÇÃO DOS MACIÇOS .......................................................................................121 7.6.1. MÉTODOS DE ESCAVAÇÃO .......................................................................................121 7.6.2. CARREGAMENTO, TRANSPORTE E DEPOSIÇÃO DE ESCOMBROS ...............................127 7.6.3. OPERAÇÕES ACESSÓRIAS .........................................................................................129 7.7. SUPORTE DOS TÚNEIS ..................................................................................................130 7.7.1. SUPORTE PRIMÁRIO DOS TÚNEIS E DAS FRENTES .....................................................130 7.7.2. REDIMENSIONAMENTO DO REVESTIMENTO FINAL...................................................133 7.8. DESEMPENHO E QUALIDADE FINAL DA OBRA......................................................134 7.8.1. MONITORIZAÇÃO E ACOMPANHAMENTODA OBRA..................................................134 7.8.1.1. Descrição Geral..............................................................................................134 7.8.1.2. Controlo da Influência sobre o Meio .............................................................135 7.8.2. SEGURANÇA E SALUBRIDADE...................................................................................140 7.9. CONCLUSÕES..................................................................................................................141 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................................142 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................................143 ÍNDICE DE FIGURAS VII ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 - Fases de caracterização geotécnica de uma obra subterrânea (adaptado de Galera Fernández[58], 1997). ...........................................................................................5 Figura 2 - Fluxograma das actividades de prospecção, projecto e execução. .................................19 Figura 3 - Túnel piloto na escavação de uma obra subterrânea (adaptado de AFTES[1], 1996)............................................................................................................24 Figura 4 - Fluxograma das etapas de projecto em obras públicas (baseado em Porto Editora[142], 1995). ........................................................................................................27 Figura 5 - Classificação da escavabilidade de maciços rochosos, segundo Franklin et al. (adaptado de Franklin et al, 1971, in López Jimeno e Díaz Méndez [98], 1997).............................................................................................................................38 Figura 6 - Vários métodos de desmonte em secções parciais (baseado em Juncà Ubierta[87], 1997 e Pereira[135], 1996). ...........................................................................42 Figura 7 - Jumbo hidráulico de três braços para perfuração em subterrâneo (adaptado de Ferrocemento[55], s.d.). .............................................................................................44 Figura 8 - Zonas de um diagrama de fogo tipo num desmonte subterrâneo. ..................................45 Figura 9 - Diagramas de fogo tipo para desmonte subterrâneo. A – Caldeira em leque (ou italiana); B - Caldeira em V; C – Caldeira cilíndrica (adaptado de Langefors et al[92], 1976). .............................................................................................46 Figura 10 - Zona de rocha fracturada numa detonação. ....................................................................47 Figura 11 - Condições para obter uma espessura uniforme do dano na rocha da periferia de um túnel (adaptado de Holmberg[83], 1982)...............................................49 Figura 12 - Magnitude na zona fracturada para diferentes tipos de explosivos (adaptado de Finnrock Ab[56], s.d.). ..............................................................................49 Figura 13 - A - Tuneladora sem escudo (adaptado de Fernandéz Gonzaléz[53], 1997); B - Tuneladora com escudo (adaptado de Gallerie[59], 1996). ......................................53 Figura 14 - A – Roçadora de braço (adaptado de Ferrocemento[55], s.d.).; B - Roçadora de braço Noell – NTM 160H (adaptado de López Jimeno e García Bermúdez[99], 1997). .....................................................................................................53 Figura 15 - Variação entre os vãos de cavidades sem suporte e os tempos de auto- sustentação para as várias classes de maciço (adaptado de Bieniawski, 1973 in Dinis da Gama[35], 1976)..................................................................................63 Figura 16 – Escolha do tipo de sustimento em função da classificação Q (adaptado de Barton[9], 1995). ............................................................................................................67 Figura 17 - Deslocamentos nas imediações da frente de escavação de um túnel (adaptado de Hoek[82], 1995). .......................................................................................69 Figura 18 - Modelação da curva de resposta do terreno de uma escavação (Hoek[82], 1995). ............................................................................................................................69 Figura 19 - Modelação das curvas de resposta do terreno e do suporte para uma escavação (Hoek[82], 1995). ..........................................................................................71 Figura 20 - Curvas características de alguns tipos de sustimento (Hoek, 1980, in Celada Tamames[21], 1997). ..........................................................................................71 ÍNDICE DE FIGURAS VIII Figura 21 - Ilustração de tipos de ancoragens na aplicação a túneis (adaptado de DSI in Ingeopress[84], 1996). ................................................................................................74 Figura 22 - Cambotas metálicas e rede electrosoldada (malhasol) no suporte de um túnel. .............................................................................................................................75 Figura 23 - Enfilagens (piquetes) para suporte em avanço de um túnel (adaptado de Word Tunnelling[166], 1996)..........................................................................................76 Figura 24 - Revestimento de um túnel com chapas onduladas de alumínio (adaptado de Hacar Rodríguez[60],1997). ...........................................................................................77 Figura 25 - Secção principal de observação instrumentada (adaptado de Cunha[31], 1994) e equipamentos de superfície. ............................................................................87 Figura 26 - Secções possíveis de medição de convergências (adaptado de Cunha[31], 1994 e de Scholey e Ingle[154], 1989). ...........................................................................89 Figura 27 - Evolução da zona de movimento do terreno com a profundidade da escavação (adaptado de D.E.M.G.[85], 1997). ...............................................................95 Figura 28 - Esboço da localização do sistema de saneamento da Costa do Estoril (adaptado de MARN[107], 1994)..................................................................................106 Figura 29 - Implantação dos túneis da 2ª fase do Interceptor do sistema de saneamento da Costa do Estoril (adaptado de CÊGÊ/FBO[20], 1997). ...........................................108 Figura 30 - Extracto da Carta Geológica de Portugal (Esc. 1/50000), folha 34-C – Cascais, com a implantação dos túneis da 2ª fase do IGSSCE...................................111 Figura 31 - Jumbo de dois braços utilizado na perfuração das frentes, nos túneis do IGSSCE – 2ª fase (cortesia de Sr. José Paiva). ...........................................................121 Figura 32 - Furação do diagrama de fogo tipo dos túneis do IGSSCE – 2ª fase.............................122 Figura 33 - Martelo hidráulico JVC, na esvavação do túnel 4, frente de jusante (cortesia de Sr. José Paiva). ........................................................................................124 Figura 34 - Esboço em planta da influência e campo de utilização do Martelo de Schmidt (A) e da Prensa de Carga Pontual (B), numa frente de escavação. ..............125 Figura 35 - Escavação de um nicho (esquerda) no túnel 4, frente de jusante. ................................128 Figura 36 - Operação de projecção de betão no hasteal de um túnel do IGSSCE - 2ª fase..............................................................................................................................131Figura 37 - Frente de desmonte com microestacas instaladas, para pré-suporte.............................132 Figura 38 – Instalação do revestimento final através de cofragem deslizante. ...............................133 Figura 39 - Medição dos extensómetros instalados nos cimbres, pela equipa do LNEC................135 Figura 40 - Exemplo de um diagrama de fogo executado nos túneis do IGSSCE..........................136 Figura 41 - Registo de vibrações do diagrama de fogo...................................................................137 Figura 42 - Fenómeno de sobreescavação nos túneis do IGSSCE – 2ª fase. ..................................138 Figura 43 - Secção tipo de medição de convergências nos túneis do IGSSCE – 2ª fase (adaptado de CÊGÊ/FBO[19], 1997)............................................................................139 Figura 44 - Registo de medição de deslocamentos (convergências) de uma secção de um túnel do IGSSCE - 2ª fase (adaptado de CÊGÊ/FBO[19], 1997). ..........................140 ÍNDICE DE TABELAS IX ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 - Ensaios geotécnicos in situ (adaptado de Galera Fernández[58], 1997). ...................... 11 Tabela 2 - Ensaios de rochas em laboratório e parâmetros resultantes. ....................................... 13 Tabela 3 - Ocorrências e métodos de prospecção associados. ..................................................... 14 Tabela 4 - Documentos, fases e conteúdo dos relatórios geotécnicos (Dinis da Gama[41], 1997)........................................................................................................................... 15 Tabela 5 - Principais critérios de escavabilidade e parâmetros mecânicos associados. ............... 37 Tabela 6 - Tipos de rotura que ocorrem em diferentes maciços rochosos sob diferentes níveis de tensão in situ (adaptado de Hoek et al[82], 1995) ......................................... 57 Tabela 7 – Problemas, parâmetros, métodos de análise e critérios de aceitabilidade em escavações subterrâneas (adaptado de Hoek[81], 1991). .............................................. 58 Tabela 8 - Classificação de maciços rochosos de Bieniawski (adaptada de Dinis da Gama[35], 1976 e Brady e Brown[12], 1985)................................................................. 61 Tabela 9 - Classes de maciços rochosos para túneis e tipos de revestimento mais adequados (adaptada de Bieniawski, 1973 in Dinis da Gama[35], 1976). ..................................... 62 Tabela 10 - Parâmetros do sistema Q da Classificação de Barton (adaptado de Barton et al[7], 1982)........................................................................................................................... 64 Tabela 11 - Valores limites de velocidade de vibração de pico [mm/s] (adaptado de Moura Esteves[111], 1993). ...................................................................................................... 91 Tabela 12 - Valores de a, b e c para diversos tipos de maciço. ..................................................... 92 Tabela 13 - Responsabilidades na segurança em obra (baseado em Barata[6], 1997). ................... 98 Tabela 14 - Características do Emissário Submarino da Guia (baseado em MARN[107], 1994)........................................................................................................................... 106 Tabela 15 - Trabalhos desenvolvidos e materiais empregues na 1ª Fase do Empreendimento de Saneamento da Costa do Estoril (baseado em MARN[107], 1994).......................... 107 Tabela 16 - Trabalhos e materiais empregues na ETAR da Guia (baseado em MARN[107], 1994)........................................................................................................................... 108 Tabela 17 - Horizontes sísmicos e materiais correspondentes (baseado em Teixeira Duarte[160], 1991). ....................................................................................................... 112 Tabela 18 - Resumo das propriedades geológico-geomecânicas dos terrenos atravessados pelos túneis do IGSSCE – 2ª fase (baseado em Teixeira Duarte[160], 1991, DRENA[47], 1995 e Hidroprojecto/Consulmar[66], 1997). ........................................... 114 Tabela 19 - Tipos de suporte em ZG3 (baseado DRENA[47], 1995). ............................................. 117 ÍNDICE DE TABELAS X Tabela 20 - Zonas geotécnicas em cada túnel, e respectivos tipos de suporte primário a aplicar e prazos de instalação (baseado em DRENA[47], 1995). ................................. 118 Tabela 21 - Ciclos médios de trabalho praticados em cada zona geotécnica (Hidroprojecto/Consulmar[67], 1997). ......................................................................... 123 Tabela 22 - Diferentes materiais de zonas geotécnicas ZG3 e respectivos valores de resistência à carga pontual (baseado em LNEC[95], 1997). ......................................... 123 Tabela 23 - Comprimentos e percentagens previstas e reais de Zonas Geotécnicas (Dinis da Gama[43], 1998). .......................................................................................................... 126 1. INTRODUÇÃO 1 1. INTRODUÇÃO 1.1. PREÂMBULO Os túneis e as obras subterrâneas têm adquirido uma importância crescente no planeamento e gestão do espaço, tanto em áreas urbanas como no atravessamento de zonas montanhosas. As inúmeras vantagens da utilização do espaço subterrâneo são apenas ensombradas pelos seus custos associados, dado tratarem-se de estruturas complexas executadas por técnicos e empresas altamente especializados. A concepção, projecto e execução de um túnel recorrem, desde o início, a Ciências ou ramos destas, nomeadamente a Geotecnia e a Geomecânica, que conjugadas com a Economia, constituem o que se denomina como Engenharia de Túneis. A Engenharia de Túneis recebeu parte do seu legado da Engenharia de Minas, área com vasta experiência do ambiente subterrâneo e que contribuiu decisivamente para o lançamento e evolução desta técnica sendo, ainda hoje, vários os métodos construtivos utilizados em túneis que tiveram o seu início em minas subterrâneas. Nos últimos anos este ramo da Engenharia teve um desenvolvimento considerável, seguindo um rumo próprio e fomentando a evolução de técnicas específicas. Assim, actualmente, a complexidade dos ramos e especializações da Engenharia de Túneis, envolvem a concepção, prospecção, projecto, execução, fiscalização e assessoria técnica, bem como actividades acessórias particulares, como os sistemas de ventilação, drenagem e 1. INTRODUÇÃO 2 impermeabilização, iluminação, sistemas de distribuição de energia eléctrica, ar comprimido, água, planeamento de segurança e saúde em obra, etc. Recentemente, novas áreas de actividade têm sido desenvolvidas, em especial no que se refere ao estudo dos impactes ambientais causados pelos túneis, seja na fase de construção seja na de serviço, em que se destacam a deposição de escombros da escavação, o controlo de ruídos e de vibrações, entre outros. Os túneis subterrâneos possuem diversas finalidades tais como: vias de comunicação (estradas, caminhos de ferro, passagens pedonais); vias de condução hidráulica (adutores de água, de saneamento, de gás, aproveitamentos hidroeléctricos); galerias mineiras; acessos a instalações subterrâneas militares; depósitos de carburantes; armazenamento de resíduos; etc. É, assim, bastante vasto o campo de aplicação destas obras geotécnicas, possuindo particularidades específicas que se prendem com o fim a que se destinam e com as condições naturais existentes no local de construção. Pelo que foi dito, é fácil de entender que a construção de um túnel ou de uma obra subterrânea envolve equipas multidisciplinares especializadas, ondea Geotecnia tem uma intervenção preponderante em praticamente todas as etapas. 1.2. CONTEÚDO DO TRABALHO A presente dessertação enquadra-se no Mestrado de Georrecursos, área de Geotecnia, do Instituto Superior Técnico e pretende abordar os temas geotécnicos mais importantes da engenharia de túneis, em particular, dos túneis em maciços rochosos, não se focando os métodos de construção de túneis em solo, a execução de túneis a céu aberto (cut-and- cover) e os túneis submersos. Este trabalho pretende resumir o estado da arte da construção de túneis, com especial enfoque para os métodos e técnicas praticados em Portugal. Devido à vastidão do tema, alguns assuntos serão tratados superficialmente, tendo-se optado unicamente pela sua descrição, devido ao facto de constituírem matérias importantes e de estarem relacionados com todas as fases de projecto e de execução deste tipo de obras. 1. INTRODUÇÃO 3 Deste modo, após uma breve introdução, o trabalho inicia-se com uma abordagem dos métodos de prospecção existentes, passíveis de serem utilizados neste tipo de obras, seus campos de aplicação e vantagens do seu faseamento, seguindo-se breves considerações sobre as diferentes fases do projecto de uma obra subterrânea. São abordados, igualmente, os aspectos geotécnicos relacionados com os diferentes critérios de escavabilidade e métodos de escavação, bem como as opções e critérios de dimensionamento do suporte primário e secundário, com uma breve descrição do Novo Método Austríaco (NATM). É dada especial ênfase aos dispositivos de monitorização geotécnica existentes, na sua aplicação ao controlo da estabilidade e funcionalidade de uma escavação subterrânea, e à segurança e salubridade, como garantia de qualidade da obra, durante e após a construção. Neste contexto foi estudado um túnel hidráulico de saneamento, tendo-se direccionado este trabalho para obras de reduzida secção, onde se enquadram os túneis de saneamento, de transporte de águas de abastecimento, de barragens, etc. Este trabalho pretende abordar a vertente geotécnica da construção de túneis, evidenciando as particularidades e condicionalismos próprios que ocorrem nas várias fases do empreendimento, desde a prospecção até à execução da obra, passando pelo projecto. Assim, o objectivo principal deste estudo, é alertar para as consequências dos problemas mais comuns neste tipo de empreendimentos e enumerar as soluções possíveis, sempre numa perspectiva geotécnica. 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 4 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 2.1. PLANEAMENTO E MÉTODOS DE PROSPECÇÃO 2.1.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS A prospecção e caracterização geotécnica são fundamentais na concepção de um túnel, influenciando todas as fases subsequentes, tanto as de projecto como as de execução destas obras. Baseados na caracterização geológico-geotécnica dos terrenos, os técnicos envolvidos terão de conceber e optar pelos métodos apropriados de construção, bem como prever soluções adequadas para as opções escolhidas. A utilização dos métodos apropriados de caracterização, aliados à sua competente execução, são factores primordiais na qualidade do reconhecimento geotécnico, permitindo aos diferentes especialistas a adopção de alternativas e critérios de cálculo menos conservativos. Para que estes métodos cumpram os seus desígnios, é fundamental que sejam executados por geólogos, engenheiros, geofísicos e técnicos, competentes e experientes, que garantam qualidade ao reconhecimento efectuado. Segundo Oliveira[126] (1994), a escolha dos métodos e sua localização deve contemplar, entre outras, todas as situações que poderão ocorrer ao longo da escavação do túnel, procurando-se atingir várias finalidades com cada método. A Figura 1 representa um fluxograma das várias fases de caracterização geotécnica que podem ser associadas às etapas de um projecto de uma obra subterrânea. 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 5 Reconhecimento Preliminar Prospecção de Campo Caracterização Complementar Figura 1 - Fases de caracterização geotécnica de uma obra subterrânea (adaptado de Galera Fernández[58], 1997). Estudo Hidrogeológico Cartografia Geológico-geotécnica Classificação Geomecânica Estudo da Fracturação Prospecção Geofísica Prospecção Mecânica Ensaios in situ Ensaios em Laboratório FASE 1 FASE 2 FASE 3 Propriedades das Formações e das Descontinuidades Propriedades Mecânicas do Maciço Rochoso R E L A T Ó R I O G E O T É C N I C O ( P E R F I S ) 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 6 O reconhecimento de um determinado maciço rochoso, tendo como objectivo a construção de um túnel, inclui a sua modelação geológica e geomecânica, de onde resulta a concepção de um perfil geológico-geotécnico que incorpora as informações recolhidas durante as várias fases de caracterização, sendo refinado com o evoluir destas. As técnicas de caracterização, apresentadas na figura anterior, que ocorrem em períodos de tempo diferentes consoante a fase em apreço, devem permitir a elaboração de um perfil geotécnico no final de cada uma. Este consiste de um corte ao longo do eixo do túnel, incorporando a informação adquirida. Assim, os perfis geotécnicos resultantes das duas primeiras fases possuirão um carácter provisório, porquanto vão sendo refinados com o decorrer das etapas subsequentes, mais precisas nas técnicas utilizadas, até resultar o perfil geotécnico final. Este último, que antecede e serve de base ao Projecto de Execução (ou em alguns casos ao Anteprojecto detalhado), deverá ser actualizado em fase de construção, perante o acesso directo ao maciço. Em Portugal, apenas em casos esporádicos se estabelecem as fases de Estudo Prévio, Projecto Base e Projecto de Execução e, muitas vezes, os planos de prospecção possuem menos fases que as anteriormente referidas. Sem prejuízo das campanhas e métodos a utilizar, os técnicos envolvidos na caracterização geológico-geotécnica devem fasear as operações de prospecção. Este faseamento permite o estudo de campanhas anteriores, possibilitando uma concentração de meios, uma vez que, com esta sequência, reforça-se o investimento técnico e económico no estudo das zonas críticas, os quais seriam de aplicação economicamente inviável em toda a extensão do túnel. A execução de túneis é uma área peculiar da Geotecnia, dependendo em grande medida da prospecção e conhecimento adquiridos durante a fase construtiva. A caracterização do maciço rochoso envolvido na construção de um túnel, não termina na fase de projecto, devendo decorrer sistematicamente durante a construção, com o rigor conferido pela acessibilidade ao local de escavação, de forma a permitir afinar métodos, redimensionar estruturas e adoptar soluções para ultrapassar eventuais acidentes geológicos. 2.1.2. RECONHECIMENTO PRELIMINAR No âmbito da caracterização geotécnica para construção de túneis, o reconhecimento preliminar, representado na Fase 1 da Figura 1, é por excelência o elemento de prospecção da fase de Estudo Prévio. De facto, as técnicas de prospecção utilizadas e o respectivo grau 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 7 de incerteza associado, conferem a este elemento um cariz de caracterização global não detalhada, reconhecidamente insuficiente para as futuras opções de escavação ou cálculos estruturais, mas apropriado ao estudo regional e à caracterização da geologia, tectónica e hidrogeologia, entre outros. Segundo Galera Fernández[58] (1997) e Oliveira[124] (1986), os trabalhos realizados nesta fase têm ainda o objectivo de permitir o planeamentodas fases subsequentes de prospecção, bem como elaborar uma primeira estimativa dos custos associados às restantes actividades de caracterização. Os métodos de investigação utilizados na fase de reconhecimento preliminar podem incluir a consulta de elementos existentes, a caracterização geológica à escala regional, a interpretação fotogeológica, a cartografia geológica de superfície, o estudo hidrogeológico, as classificações geomecânicas e o estudo da fracturação. Para uma correcta caracterização e interpretação das ocorrências geológicas, é necessária uma equipa multidisciplinar, sendo preponderante a experiência dos técnicos envolvidos. De facto, os métodos utilizados nesta fase são fundamentalmente interpretativos, requerendo um elevado grau de especialização dos técnicos e equipamentos a utilizar (Wahlstrom[165], 1973). Com os métodos de prospecção referidos, é já muitas vezes possível obter uma aproximação ou estimar alguns parâmetros quantificáveis, como o grau de alteração, a posição aproximada do nível freático, a densidade e orientação das diaclases, os índices RMR (de Bieniawski) e Q (de Barton), etc. Ainda de acordo com Galera Fernández[58] (1997), esta fase preliminar permite a obtenção de valiosa informação para a caracterização, onde se destacam a morfologia e litologia do maciço rochoso, a estratigrafia, o número e posição dos aquíferos e a localização de possíveis acidentes geológicos. Como consequência destes estudos iniciais de caracterização, resulta a elaboração do perfil geotécnico preliminar, devendo este permitir a identificação dos constrangimentos e pontos críticos do projecto geotécnico, com especial relevo para os emboquilhamentos do túnel, atravessamento de acidentes geológicos, aquíferos e grutas. É também nesta fase do projecto, sempre que as características da obra o permitam, que se devem avaliar as alternativas ao traçado, de forma a escolher as zonas mais favoráveis para a execução da obra, ou mesmo avaliar a viabilidade global do projecto (Dinis da Gama[41], 1997). Com 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 8 base no perfil geotécnico preliminar, planeiam-se então as actividades de prospecção subsequentes, definindo os métodos e os locais apropriados para os desenvolver. A presença de edifícios, aglomerados, estradas ou outras estruturas à superfície podem igualmente condicionar os trabalhos de prospecção, limitando os locais de aplicação. Por outro lado, a pesquisa junto das populações, relativa aos acontecimentos naturais que ocorreram ou ocorrem na região, reveste-se de enorme importância, uma vez que os habitantes da região em estudo, podem ser uma fonte de informação sobre o regime de precipitação, recentes escorregamentos de taludes, etc. Esta abordagem obriga a repetidas deslocações ao local, por parte do projectista, que deve participar e acompanhar, parcial ou totalmente, a cartografia geológica de superfície e as restantes fases de prospecção. 2.1.3. PROSPECÇÃO DE CAMPO A fase de prospecção de campo, também denominada de prospecção in situ é, em termos de técnicas, de planificação e de localização, a consequência dos estudos e análises da fase anterior, constituindo um elemento de trabalho para o Projecto Base. Um factor importante a ter em conta é a preparação e recolha dos materiais a ensaiar no estudo laboratorial posterior, existindo assim uma clara interligação entre esta e as fases anterior e subsequente. Sendo o objectivo global da caracterização, a obtenção de um modelo geológico-geotécnico que traduza as características do maciço envolvido, as actividades a desenvolver nesta fase deverão ser consequência dos estudos antecedentes. Assim, estes trabalhos deverão destinar-se a completar o reconhecimento anterior com recurso a métodos convenientes e precisos, aplicados criteriosamente nas zonas sobre as quais existam dúvidas. Os métodos habituais que se utilizam nesta etapa da prospecção (Fase 2 da Figura 1), incluem a geofísica, a prospecção mecânica e os ensaios in situ. A prospecção geofísica utiliza técnicas indirectas e interpretativas na detecção das anomalias verificadas nos maciços, existindo diversos métodos utilizados em geotecnia, com destaque para os métodos sísmicos, eléctricos e electromagnéticos e, esporadicamente, a gravimetria e a magnetometria (para detectar cavidades). Consoante o problema a investigar, assim se aplicam os métodos mais adequados, existindo a necessidade de avaliar as vantagens e as limitações de cada técnica e, assim, planear o seu correcto emprego em cada zona (Wahlstrom[165], 1973). 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 9 O método sísmico mais utilizado em geotecnia é a sísmica de refracção, aplicável na detecção de espessuras alteração e de solos de cobertura e, em maciços brandos, para detectar a posição do nível freático. Este método possui a vantagem do baixo custo associado, mas geralmente não se obtêm bons resultados para profundidades superiores a 20 m ou quando camadas menos densas se encontrem a maiores profundidades. Este método é utilizado, preferencialmente, na caracterização da camada de alteração das zonas de emboquilhamento dos túneis, uma vez que se tratam de pontos críticos para a execução (Galera Fernández[58], 1997). Os métodos geofísicos eléctricos compreendem um vasto conjunto de técnicas, destacando-se, como principais na aplicação a túneis, as que avaliam a resistividade aparente dos terrenos. Segundo Wahlstrom[165] (1973) e Galera Fernández[58] (1997), estes métodos de resistividade possuem um alcance médio de cerca de 100 m, sendo especialmente adequados na detecção de aspectos importantes na caracterização do maciço rochoso, como sejam as falhas e a posição dos níveis freáticos ao longo do traçado do túnel. Os métodos electromagnéticos, têm o mesmo campo de aplicação dos métodos eléctricos, podendo utilizar georradares para a obtenção de perfis de reflexão de ondas electromagnéticas, possuindo um alcance que varia entre 35 e 100 m. Os métodos sísmicos, eléctricos e electromagnéticos, podem ainda ser realizados no interior de furos de sondagem, tanto no interior do furo, como entre dois furos (cross- hole). Na aplicação sísmica do cross-hole é possível detectar a continuidade litológica, cavidades, zonas de falha, grau de fracturação e o módulo de elasticidade, sendo contudo necessário que os furos de sondagem estejam próximos, de forma a permitir boas leituras (McCann[101], 1992). Relativamente à prospecção mecânica, esta pode incluir poços e/ou galerias, mas é a execução de sondagens de prospecção o método mais utilizado e importante no reconhecimento geotécnico. Esta técnica possui grandes vantagens, uma vez que contacta directamente com o local de execução da obra, possibilitando ainda a realização de ensaios no local e a recolha de amostras para ensaios posteriores. As desvantagens que lhe estão associadas, prendem-se com o seu elevado custo e com o facto de se tratar de uma amostragem pontual, carecendo de interpretação cuidada na elaboração dos perfis geológico-geotécnicos. 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 10 Os critérios que regem o número e localização das sondagens, devem basear-se em todo o conhecimento adquirido das fases de reconhecimento anteriores, procurando-se amostrar as zonas de características mais adversas ou sobre as quais existam maiores incertezas. O frequente procedimento de distribuir as sondagens de forma equidistante é, no mínimo, pobre como critério de localização deste importante e dispendioso método de amostragem, salvo nos raros casos de maciços inteiramente homogéneos. Assim, com a informação recolhida anteriormente, deve-se procurar atingir as zonas de falha, de cavalgamentos, de carsificação, etc., de forma a recolher o máximo de informação destas estruturas complexase determinantes para o projecto de túneis, optimizando-se o número de sondagens através da sua localização e orientação. De acordo com Galera Fernández[58] (1997), o número de sondagens a realizar na prospecção de um túnel, é função das características e dificuldade da obra, sendo importante a localização de uma sondagem em cada emboquilhamento e poço (caso exista). Este autor indica, para um túnel de dificuldade média, um valor aproximado para o comprimento acumulado de furação por sondagens de pelo menos metade do comprimento total do túnel. Com o evoluir dos meios e da tecnologia, os ensaios in situ têm vindo a adquirir uma grande preponderância sobre os ensaios laboratoriais. Este facto prende-se com a dificuldade de obtenção de amostras inalteradas e com o efeito de escala evidenciado pelos maciços rochosos, onde se torna pouco exequível a recolha de amostras com dimensão suficiente para serem representativas da compartimentação e heterogeneidade do maciço rochoso (Silvério[155], 1975, McCann[101], 1992). Segundo Silvério[155] (1975) e Galera Fernández[58] (1997), existem dois grandes grupos de ensaios que se aplicam na caracterização de túneis: ensaios realizados sobre os testemunhos de sondagem e ensaios no interior dos furos de sondagem, realizando-se em casos esporádicos ensaios no interior de poços e galerias de prospecção. Os principais ensaios no campo, sobre testemunhos de sondagem, incluem o ensaio de carga pontual, deslizamento de diaclases (tilt-test) e esclerómetro, procurando-se a obtenção de parâmetros correlacionáveis com a resistência à compressão simples, resistência ao corte e resistência ao deslizamento de diaclases (Tabela 1). Relativamente aos ensaios nos furos de sondagem, estes visam apurar fundamentalmente as características do maciço no que respeita à permeabilidade, deformabilidade e 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 11 resistência (ver Tabela 1). Para a obtenção dos parâmetros pretendidos, existe uma vasta gama de equipamentos disponíveis que deverão sofrer uma selecção adequada, consoante o maciço em causa, as condições existentes e a finalidade pretendida (Oliveira[121], 1975). Assim, os ensaios para determinação da permeabilidade de maciços rochosos, são geralmente efectuados com recurso a injecção e/ou extracção (bombagem) de água. Os ensaios de injecção de água mais utilizados, são os ensaios sob pressão ou ensaios Lugeon, utilizados em maciços rochosos, e que, devido à sua grande divulgação, possuem actualmente bastante experiência acumulada (Pereira[131], 1985). Existem outros ensaios que podem ser realizados para determinar a permeabilidade dos materiais, como os ensaios Lefranc (para solos) ou ensaios de bombagem, entre outros. Os ensaios de deformabilidade correntes, consoante se tratem de maciços terrosos ou rochosos, compreendem os ensaios pressiométricos e dilatométricos. Os primeiros aplicam-se a maciços terrosos ou rochosos muito brandos, podendo ainda nestes maciços ser utilizados os ensaios SPT (penetração dinâmica) e os ensaios de corte rotativo ou de molinete (vane-test), correlacionáveis com as características mecânicas de resistência das formações. Relativamente aos ensaios dilatométricos, aplicados em maciços rochosos, está disponível uma vasta gama destes equipamentos, existindo inclusivamente alguns desenvolvidos em Portugal pelo LNEC (Oliveira[121], 1975). Tabela 1 - Ensaios geotécnicos in situ (adaptado de Galera Fernández[58], 1997). ENSAIO REALIZAÇÃO PARÂMETRO OBTIDO Carga Pontual Testemunho de sondagem Índice de carga pontual Esclerómetro Testemunho de sondagem Índice esclerométrico Deslizamento de diaclases (Tilt-test) Amostra em bloco ou sobre o testemunho de sondagem Ângulo de atrito Molinete (Vane-test) Interior do furo (solos) Resistência ao corte Penetrómetro Interior do furo (solos) Resistência ao corte Lugeon Interior do furo Coeficiente de Permeabilidade Pressiométrico Interior do furo (solos) Módulo de deformabilidade Dilatométrico Interior do furo Módulo de deformabilidade 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 12 Após os trabalhos acabados de descrever e perante uma cuidada análise dos valores resultantes, procede-se à elaboração de um perfil geotécnico condicionado, mais preciso que o perfil geotécnico preliminar, o qual deverá ter respondido à maioria das questões relativas à identificação das estruturas presentes no maciço rochoso. A interpretação dos resultados e a parametrização do maciço rochoso, são aspectos muito importantes, que devem ser realizados por técnicos que tenham participado na campanha de prospecção e que possuam a necessária experiência de trabalhos anteriores. 2.1.4. CARACTERIZAÇÃO COMPLEMENTAR A caracterização geotécnica complementar inclui a execução de ensaios laboratoriais (ver Tabela 2), para além da integração de todos os dados obtidos nas fases anteriores, de forma a ser obtido o perfil geotécnico final, fundamentado nas propriedades das formações geológicas e propriedades mecânicas do maciço (Fase 3 da Figura 1). Trata-se assim do elemento que serve de base ao Projecto de Execução, ou ao Anteprojecto detalhado, constituindo o principal elemento a integrar no Relatório Geotécnico. Os ensaios laboratoriais mais comuns compreendem ensaios de identificação, a nível de petrologia, mineralogia, densidade e humidade natural, e ensaios mecânicos como a compressão uniaxial, tracção, compressão triaxial, ensaios de corte em rocha e ensaios de deslizamento de descontinuidades (Galera Fernández[58], 1997). Os ensaios mecânicos referidos, nomeadamente os ensaios de compressão uniaxial, triaxial e ensaios de corte em rocha, destinam-se a estabelecer parâmetros de qualidade relativos à deformabilidade e à resistência das rochas que compõem o maciço rochoso. Estes valores não podem ser directamente utilizados na caracterização do maciço, sem uma adaptação à escala devida, uma vez que se realizam sobre reduzidas amostras de rocha, sem representatividade das condições globais do maciço (Lamas[91], 1993). Relativamente aos resultados dos ensaios de deslizamento de diaclases realizados em testemunhos de sondagem, estes são geralmente conservativos, uma vez que testam a rugosidade das descontinuidades mas não incluem o efeito da ondulação destas. Segundo Dinis da Gama[41] (1997), a descrição quantitativa relativa ao estudo das descontinuidades e às características mecânicas, entre outras, devem seguir, sempre que possível, os métodos sugeridos pela Sociedade Internacional de Mecânica das Rochas (ISRM). 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 13 A Tabela 2 pretende resumir os parâmetros obtidos nos principais ensaios de rochas em laboratório. Em laboratório podem ainda ser realizados ensaios de porosidade, densidade, permeabilidade, expansibilidade e desgaste (slake durability) e, em certos casos, ensaios de avaliação da dureza pelo martelo de Schmidt (ou esclerómetro), velocidade de propagação das ondas elásticas e ensaio de carga pontual (Lamas[91], 1993). Tabela 2 - Ensaios de rochas em laboratório e parâmetros resultantes. ENSAIO PARÂMETROS Compressão Simples Módulo de elasticidade, coeficiente de Poisson, resistência à rotura, fluência Compressão Triaxial Deformabilidade em meio confinado lateralmente, resistência ao corte Corte directo Resistência ao corte Deslizamento de Diaclases Resistência ao deslizamento Compressão diametral Resistência à tracção Os principais alvos da prospecção geotécnica e os métodos aplicados na sua detecção, estão representados na Tabela 3, sendo possível observar a constante presença das sondagens e ensaios associados, revelando-se como o método mais interveniente na prospecção geotécnica. Com os ensaios realizados, tanto in situ como em laboratório,deverá ser possível determinar um ou vários modelos de comportamento do maciço que reflictam as características das formações e as propriedades mecânicas dos maciços rochosos. Um dos aspectos mais importantes a ser considerado na fase de prospecção, determinando muitas vezes a localização e o traçado do túnel, é a posição dos emboquilhamentos. A dependência directa que este factor possui no desenvolvimento do túnel, pressupõe que se iniciem os trabalhos na caracterização destes locais. Mesmo nas obras em que a concepção e os constrangimentos técnicos não permitem a alteração do posicionamento dos 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 14 emboquilhamentos, a sua adequada caracterização reveste-se de bastante importância, porquanto os emboquilhamentos constituem pontos críticos na acessibilidade ao túnel. Nos emboquilhamentos, os métodos mais utilizados para o seu reconhecimento, incluem a sísmica de refracção e as sondagens horizontais. Os taludes envolvidos nestas zonas devem igualmente ser alvo de reconhecimento, constituindo matéria determinante no projecto e execução da obra. Tabela 3 - Ocorrências e métodos de prospecção associados. OCORRÊNCIAS DE INTERESSE PARA O PROJECTO DE UM TÚNEL POSSÍVEIS MÉTODOS DE PROSPECÇÃO PARA A DETECÇÃO FASE DE PROSPECÇÃO Cartografia de superfície 1 LITOLOGIA Geofísica – Resistividade 2 Sondagens 2 Cartografia de superfície 1 FALHAS GEOLÓGICAS Geofísica – Resistividade 2 Sondagens 2 GRUTAS Geofísica – Resistividade 2 Sondagens 2 Cartografia de superfície 1 NÍVEL FREÁTICO Geofísica – Resistividade 2 Sondagens – Ensaios in situ 2 Geofísica – Resistividade 2 FRACTURAÇÃO Sondagens 2 Ensaios em laboratório 3 PROPRIEDADES MECÂNICAS Sondagens – Ensaios in situ 2 DO MACIÇO Ensaios em laboratório 3 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 15 2.2. RELATÓRIO GEOTÉCNICO 2.2.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS A metodologia e as fases de um Relatório Geotécnico, no âmbito da filosofia de faseamento das campanhas de prospecção e de projecto, incluem um conjunto de documentos, de índole geotécnica, com conteúdos e objectivos específicos. Na Tabela 4, apresentam-se as três fases do relatório geotécnico e os principais aspectos do seu conteúdo a serem desenvolvidos no subcapítulo seguinte. Segundo Dinis da Gama[41] (1997), a experiência adquirida internacionalmente e os critérios adoptados por vários especialistas, justificam a elaboração de relatórios geotécnicos em três fases sucessivas com conteúdos e âmbitos distintos. Esta metodologia é seguida e regulamentada em bastantes países europeus e nos EUA, através de normas específicas. Tabela 4 - Documentos, fases e conteúdo dos relatórios geotécnicos (Dinis da Gama[41], 1997). FASES DO RELATÓRIO GEOTÉCNICO ASPECTOS DO CONTEÚDO Relatório de Dados Geotécnicos (RDG) Dados dos estudos de prospecção: reconhecimento preliminar; prospecção de campo e caracterização complementar. Relatório Geotécnico Interpretativo (RGI) Avaliação da qualidade e fiabilidade dos dados; principais estruturas (geológicas e outras); cenários e métodos de cálculo; análise da experiência anterior. Relatório Geotécnico de Base (RGB) Caracterização e perfis geotécnicos; propriedades dos maciços; cenários de escavação, suporte, tratamento e controlo de águas; cenários de impactes ambientais. 2.2.2. CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA DO TERRENO A caracterização geotécnica dos terrenos interessados pela construção de um túnel, resulta dos estudos de prospecção anteriormente referidos, originando um conjunto de documentos técnicos importantes. Como foi referido, estes documentos possuem informações e interpretações diversas, de acordo com a fase e pormenor que lhes estão associados. 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 16 O Relatório de Dados Geotécnicos (RDG), inclui a informação das campanhas de prospecção, nomeadamente os resultados das sondagens, da prospecção geofísica, dos ensaios in situ e dos ensaios em laboratório. A elaboração deste relatório, que compila todos os resultados da prospecção e caracterização geológico-geotécnica, está a cargo da empresa de prospecção (Prospector), sob a supervisão do consultor geotécnico. Este relatório é incluído pelo Dono de Obra na documentação do concurso para o Projecto e para a Execução, destinando-se a permitir, aos intervenientes, um maior conhecimento da região, de forma a serem adoptadas as técnicas e métodos apropriados para a concepção e execução da obra. O Relatório Geotécnico Interpretativo (RGI), baseado nos resultados da prospecção geotécnica constantes no RDG é, como o nome indica, um documento de avaliação e interpretação, destinado a quantificar os parâmetros de projecto e analisar os métodos e cenários de dimensionamento. Este estudo é essencialmente elaborado pelo Projectista com a participação do Consultor Geotécnico, devendo abordar os seguintes aspectos (Dinis da Gama[41], 1997): • Feições naturais (geológicas) e artificiais (humanas) relevantes para a construção; • Qualidade e fiabilidade da informação contida no RDG; • Descrição e avaliação geotécnica das propriedades dos terrenos, da presença de água e das descontinuidades, sua respectiva influência no processo de escavação e no suporte inicial previsto; • Selecção dos critérios a adoptar para análise e projecto dos suportes (primários e secundários); • Incorporação da experiência anterior em circunstâncias similares. A terceira etapa refere-se à elaboração do Relatório Geotécnico de Base (RGB), igualmente da responsabilidade do Projectista com a colaboração do Consultor Geotécnico, incluindo a informação dos dois relatórios anteriores (RDG e RGI). Este documento destina-se a formar o programa de concurso para a execução da obra (selecção de Empreiteiro e Fiscalização), servindo de base à escolha de equipamentos e métodos construtivos, bem como à avaliação de prazos e custos de execução da obra. O âmbito deste relatório permite igualmente definir a partilha de riscos entre o Empreiteiro e o Dono 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 17 de Obra, incluindo ainda a informação para as entidades subcontratadas, nomeadamente os financiadores, seguradores e consultores (Dinis da Gama[41], 1997). Pertencem a este documento um conjunto de factores, incluindo: • Descrição sumária do Projecto; • Caracterização dos terrenos ao longo do alinhamento do túnel, incluindo os perfis geotécnicos; • Resumo das propriedades geotécnicas dos maciços interessados pela construção do túnel; • Métodos antecipados de escavação, suporte, tratamento dos terrenos, controlo de afluência de água e os cenários dos seus resultados; • Comportamento expectável do maciço afectado pela obra; • Estimativas de quantidades de material a incluir na construção, face aos tratamentos de índole geotécnica (suportes, injecções, etc.); • Previsão dos efeitos da obra no ambiente circundante. De forma a não existirem assuntos simultaneamente abordados neste e nos outros relatórios e documentos do Projecto, não se deverá incluir no RGB os seguintes elementos: • Discussões relativas a métodos construtivos, equipamentos e períodos de realização dos trabalhos; • Repetições de dados, tabelas e gráficos existentes nos anteriores relatórios geotécnicos; • Descrições sobre requisitos contratuais existentes na legislação; • Critérios opcionais de dimensionamento dos suportes (iniciais, temporários e definitivos), assim como outros tópicos do Projecto. As funções do Consultor Geotécnico assumem aqui uma importância significativa, porquanto este elemento é um especialista da obra em causa, ao serviço directo do Dono de Obra, desempenhando um papel interveniente na selecção dasrestantes entidades que 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 18 participam no empreendimento. A participação deste consultor inicia-se antes de qualquer decisão técnica específica, colaborando nas opções de índole geotécnica nas fases que antecedem a construção, bem como durante a execução da obra, através da assessoria técnica e acompanhamento, e estendem-se para lá do final da construção, participando na aferição da qualidade final e na elaboração do as-built. Em termos de legislação de obras públicas, esta figura de Consultor Geotécnico pode ser equiparada ou englobada na de Delegado do Dono da Obra (Porto Editora[142], 1995). A Figura 2 representa a sequência desejável, a nível de prospecção, projecto e execução, do processo que medeia a necessidade inicial de elaboração de um túnel, por parte do Dono da Obra, e a fase construtiva da obra. As entidades referidas na Figura 2, e as tarefas associadas, serão abordadas nos capítulos seguintes. 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 19 Figura 2 - Fluxograma das actividades de prospecção, projecto e execução. DONO DE OBRA CONSULTOR GEOTÉCNICO PROJECTISTA PROSPECTOR CONCURSO PARA O PROJECTO PROSPECÇÃO ADICIONAL CONCURSO PARA A PROSPECÇÃO PROSPECÇÃO DE CAMPO RECONHECIMENTO PRELIMINAR CARACTERIZAÇÃO COMPLEMENTAR ESTUDO PRÉVIO PROJECTO BASE PROJECTO DE EXECUÇÃO EMPREITEIRO EXECUÇÃO R D G CONCURSO PARA A FISCALIZAÇÃO FISCAL CONCURSO PARA A EMPREITADA R G I R G B ALTERAÇÕES AO PROJECTO PROSPECÇÃO EM AVANÇO ASSISTÊNCIA TÉCNICA (PROJECTISTA) ASSESSORI A TÉCNICA (CONSULT.) FINAL DA OBRA 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 20 2.2.3. AVALIAÇÃO DOS CONDICIONALISMOS GEOTÉCNICOS As fases de prospecção anteriormente referidas e os documentos a elas associados, devem identificar e alertar para os possíveis problemas do foro geotécnico que poderão ocorrer, permitindo accionar os meios para os alterar ou mitigar. A importância desta avaliação e as inerentes consequências técnicas e ambientais, justificam a elaboração deste subcapítulo, que não será de forma alguma exaustivo, mas pretende constituir uma referência para os aspectos mais importantes da interferência e relação da construção de um túnel com a geotecnia, o ambiente e a economia. O levantamento das restrições geotécnicas de uma obra subterrânea, no contexto da prospecção, prende-se com a caracterização dos elementos geológicos e estruturais de risco, condicionantes de possíveis anomalias, bem como com a fiabilidade das possíveis soluções a implementar. Estão incluídas nestas estruturas, os acidentes geológicos importantes, os atravessamentos de aquíferos significativos, as passagens por baixo de rios ou ribeiras, as zonas dos emboquilhamentos, a existência de risco sísmico, os constrangimentos ligados a possíveis tratamentos dos terrenos, a escavação em zonas anteriormente alvo de trabalhos (aterros), a existência de gases armazenados nas rochas, etc. Cabe ao Projectista (com acompanhamento do Consultor Geotécnico), promover as metodologias apropriadas para a identificação destas peculiaridades, na fase de prospecção, carecendo esta de um acompanhamento permanente dos trabalhos. As anomalias citadas, fortemente condicionantes do Projecto e métodos de execução, devem ser referidas no RGB e no Projecto de Execução, em capítulo próprio, constituindo um importante alerta para as entidades envolvidas, em termos de segurança da obra. Tratando-se da fase de identificação por excelência, a prospecção e caracterização do meio envolvente permite o reconhecimento das situações ambientais problemáticas e das restrições ambientais, definindo os equilíbrios mais frágeis que podem ser afectados pela execução da obra em causa. Englobadas nas condicionantes ambientais mais importantes, encontram-se aspectos como a contaminação de aquíferos, danos causados a estruturas superficiais e subterrâneas, prejuízos causados a pessoas, etc.. Muitos destes aspectos encontram-se, usualmente, referidos nos Estudos de Impacte Ambiental (EIA), contudo, 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 21 existem facetas que não são identificadas, uma vez que resultam do método construtivo do túnel, muitas vezes desconhecido à data da realização do EIA. Em termos das restrições económicas associadas à prospecção, e apesar de não ser objecto de um estudo a incorporar em qualquer relatório geotécnico, deve ser dado especial ênfase à percentagem do custo global atribuído à prospecção. A tendência verificada nos últimos tempos em Portugal, relativa à avaliação dos projectos por parte dos Donos de Obra, denota a crescente importância dada aos baixos custos associados à prospecção e projecto, em detrimento da qualidade destes trabalhos. De facto, não é raro que propostas de menor qualidade sejam aprovadas, devido ao facto de implicarem menores custos de prospecção e projecto. Este procedimento tem-se revelado bastante oneroso a longo prazo, uma vez que motiva elevados custos na fase de construção, acarretando igualmente atrasos significativos nos prazos de execução. Segundo Rodrigues-Carvalho et al[151] (1986), para um exemplo de um túnel no Algarve, os estudos geológico-geotécnicos realizados para a revisão do projecto, levou a que se despendesse 1,2% do custo total da obra, permitindo reduzir em 5,6% aquele mesmo custo. A análise da relação custo/benefício é assim uma metodologia apropriada, ou possível, para a determinação do conteúdo e magnitude dos estudos de prospecção, levando sempre em conta o facto de existirem alguns factores intangíveis que devem, de qualquer forma, ser incorporados neste balanço, como sejam os aspectos relacionados com a segurança em obra. 2.3. CARACTERIZAÇÃO SISTEMÁTICA “IN SITU” Um dos condicionalismos que se verificam no decorrer de qualquer obra geotécnica subterrânea, em particular na construção de um túnel, é a necessidade de uma contínua prospecção das frentes de escavação e os subsequentes custos por ela motivados. As soluções técnicas disponíveis actualmente, apontam para uma racionalização dos meios a utilizar na prospecção, dependente do grau de conhecimento do maciço rochoso, da sensibilidade da obra e dos custos inerentes a cada opção tomada. Como é sabido, existem vários métodos de prospecção e caracterização, tecnologicamente evoluídos, que se destinam principalmente a obras de grande magnitude. A aplicação destes métodos em obras de pequena dimensão é sistematicamente inviável devido aos custos que acarretam e à sua dificuldade de manobra em espaços reduzidos. 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 22 Assim, apresentam-se alguns métodos que, pela sua simplicidade, implicam baixos custos, facilidade de manuseamento, pouca interferência com as actividades construtivas e pequeno período de operação: • Observação da Frente do Túnel: A observação da frente a desmontar por parte de técnicos especializados, pode conferir uma primeira aproximação das características geomecânicas do tipo de material, permitindo assim uma directa correlação com as restantes informações. Englobado neste método salienta-se, pela sua importância, o levantamento dos graus de fracturação, de alteração, caudais de água, etc. • Perfurabilidade do Maciço: Os parâmetros de furação (velocidade, força, etc.) do troço imediatamente anterior ao que se está a estudar, no caso de desmonte com explosivos, bem como a perfurabilidade do troço a desmontar, podem dar uma ordem de grandeza sobre as características do material, existindo actualmente equipamentos de perfuração apetrechados com sistemas computacionais de análise directa do maciço. Analogamente, no desmonte por meios mecânicos, a facilidadeou dificuldade de escavação pode igualmente ser utilizada na caracterização. • Sondagem em Avanço: A realização de uma sondagem na frente de desmonte, com recuperação do testemunho, permite a obtenção de diversos parâmetros importantes, como o grau de fracturação e a resistência da rocha, podendo ainda identificar antecipadamente qualquer mudança nas propriedades do maciço e, assim, preparar as técnicas de desmonte e suporte convenientes. A aplicação deste método carece de um adequado planeamento, de forma a não interferir com os trabalhos de construção do túnel. • Martelo de Schmidt: A aplicação deste aparelho na frente de desmonte pode revelar-se de extrema utilidade na caracterização expedita do maciço em causa, principalmente quando acompanhado de uma retroanálise eficaz em outras zonas e integrada com as restantes informações disponíveis. • Técnicas Geofísicas expeditas: A utilização de equipamentos geofísicos de dimensão reduzida operáveis no interior do túnel, nomeadamente técnicas sísmicas, podem ajudar a identificar as condições da frente de desmonte. • Permanência de equipamentos laboratoriais simples em obra: Em analogia ao que ocorre em grandes obras geotécnicas, onde a fiscalização está munida de laboratórios no local, os empreendimentos de pequeno porte podem possuir equipamentos de fácil manuseamento e baixo custo, que necessitem de pequenos espaços e possuam 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 23 facilidade de recolha e análise de amostras. Exemplos de equipamentos deste tipo são a prensa de carga pontual e de corte directo portátil, podendo ser operadas com amostras não preparadas e em tempo reduzido, possibilitando, a primeira, uma boa correlação com a resistência à compressão simples, auxiliando na selecção do método de escavação. A utilização dos métodos acima expostos tem, necessariamente, de ser encarada como um complemento aos trabalhos de prospecção da fase de projecto, destinando-se a conferir maior detalhe ao reconhecimento, motivado pelo directo e contínuo acesso ao maciço rochoso. A integração das técnicas de prospecção para o projecto com os métodos expeditos contínuos, pode alterar significativamente os critérios de desmonte e de sustimento, entre outros. Geralmente, na metodologia do projectista, os coeficientes de segurança reflectem o desconhecimento do maciço rochoso, utilizando-se valores mais elevados quando se reconhece que a prospecção foi insuficiente ou que se trata de uma obra difícil, tanto devido ao maciço como à finalidade da obra. Por esta razão, ao induzirem um conhecimento mais profundo do maciço, os sistemas referidos têm, geralmente, um efeito directo de redução dos custos de execução, através da adopção de métodos de escavação menos onerosos e suportes mais aligeirados. Por outro lado, nos casos em que foi adoptada uma atitude mais optimista por parte do projectista, contrariada pelos resultados da prospecção contínua, poderá verificar-se um aumento dos custos de forma a serem atingidos os coeficientes de segurança desejados. A esta caracterização contínua, devem ser associados estudos de retroanálise, revestindo-se da maior importância em obras geotécnicas, devido aos conhecidos imponderáveis resultantes dos caprichos geológicos. De facto, a análise à posteriori dos factos ocorridos pode permitir tomar decisões fundamentadas no caso de se repetirem as condições anteriormente estudadas na obra em causa, bem como ser útil em obras futuras. Para obras de grande dimensão, e cuja dificuldade se afigure significativa, podem ser executados túneis piloto, que incorporam bastantes vantagens para a execução (Figura 3). A realização de um túnel piloto permite o contacto e estudo do maciço rochoso, constituindo um dos melhores métodos de prospecção em avanço. Estes túneis podem ainda ser utilizados para testar in situ métodos de escavação e tipos de suportes, para permitirem o tratamento do maciço a escavar (jet grouting, ancoragens, drenagem, etc.), 2. PROSPECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA 24 além de facilitarem o desmonte da frente, uma vez que facultam o acesso de equipamentos, criam mais uma face livre e possibilitam a descompressão da rocha para o seu interior. Figura 3 - Túnel piloto na escavação de uma obra subterrânea (adaptado de AFTES[1], 1996). A caracterização sistemática da frente do túnel, e o seu consequente tratamento e incorporação de novos dados, revela-se assim como um factor de extrema importância, útil a todos os intervenientes na obra. Assim, esta metodologia permite aos diversos participantes as seguintes actividades: • Projectista: redimensionamento das estruturas, aferição da segurança e fiabilidade do projecto, previsão de prazos e custos; • Empreiteiro: antecipação dos métodos de escavação e sustimento, alocação e/ou dispensa de equipamentos e pessoal, previsão de prazos e custos, aumento do rendimento e maior velocidade de execução; • Fiscalização: planeamento das actividades de controlo, previsão de situações de risco, aferição da segurança; • Dono de Obra: controlo de custos e prazos, menor prazo de execução. 3. CONSIDERAÇÕES AO PROJECTO DE ENGENHARIA EM TÚNEIS 25 3. CONSIDERAÇÕES AO PROJECTO DE ENGENHARIA EM TÚNEIS 3.1. FASES DE PROJECTO 3.1.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS O projecto de um túnel, ou de uma obra subterrânea, conhece inúmeras variantes, essencialmente relacionadas com o objectivo da obra, a sua sensibilidade ambiental, local de implantação e ocorrências geológicas. A abordagem de todos estes assuntos seria uma tarefa exaustiva e, porventura, pouco interessante para o âmbito deste trabalho. Deste modo, serão abordados os principais aspectos a ter em conta no projecto, destacando-se fundamentalmente os que estão relacionados directamente com a Geotecnia. Como já foi referido, os diversos fins a que se destinam os túneis implicam diferentes tipos de concepção e riscos associados. As vias de comunicação, vias de condução hidráulica, túneis mineiros, instalações militares, depósitos de carburantes ou de resíduos, etc., merecem tratamentos distintos a nível de projecto e execução, cabendo ao projectista a adopção dos critérios apropriados, de acordo com a especificidade de cada obra. De uma forma geral, e a par do objectivo final da obra, o projecto de um túnel tem de integrar e gerir diversos aspectos complementares, nomeadamente os impactes ambientais associados ao túnel, tanto os permanentes, motivados pela implantação deste, como os de carácter temporário resultantes do processo construtivo em si. 3. CONSIDERAÇÕES AO PROJECTO DE ENGENHARIA EM TÚNEIS 26 É na fase de projecto que os meios técnicos têm de ser utilizados ou concebidos de forma a que a Engenharia cumpra os seus desígnios, isto é, que promova e planeie todos os mecanismos de forma a: 1) Atingir os objectivos da obra (funcionalidade e estabilidade); 2) Garantir a segurança da obra na fase de construção e de serviço; 3) Executar a obra com o menor custo possível; 4) Garantir a observação das condicionantes estéticas e ambientais. Estes princípios, comuns à maioria dos ramos da Engenharia, dependem da incorporação das informações disponíveis passo a passo, pelo que se revela fundamental a sequência seguida com as sucessivas fases de projecto. As obras geotécnicas contêm um elevado grau de incerteza, relativamente a outros empreendimentos, razão que leva a que as três fases usuais de projecto (Estudo Prévio, Projecto Base e Projecto de Execução) possuam uma importância acrescida na tomada de decisões técnicas, de viabilidade e na estimativa de custos e prazos. Em termos de legislação relativa a obras públicas (Portaria Nº 53 do Diário da República de 5 de Março de 1986, in Porto Editora[142], 1995, e Decreto-Lei nº 405/93[34]), estão consagradas
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