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2 - INTRODUÇÃO À ESCATOLOGIA

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INTRODUÇÃO 
À 
ESCATOLOGIA 
I 
 
 
 
 
FACULDADE TEOLÓGICA NACIONAL 
 
APRESENTAÇÃO DO 
MATERIAL 
O material aqui presente tem como objetivo introduzir a aprendizagem dos discentes, 
anexando conteúdos livres no material, para enriquecimento dos mesmos. 
O conteúdo aqui apresentado possui dados legais, não dispondo, assim, de autor ou 
autores próprios. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FACULDADE TEOLÓGICA NACIONAL 
 
INTRODUÇÃO 
Um estudo preliminar das doutrinas centrais referentes às temáticas da escatologia e o 
Apocalipse, procurando uma aproximação maior com a base bíblica na elaboração de 
conceitos em resposta ao contexto evangélico e os tratamentos sistemáticos existentes no 
mercado evangélico brasileiro. Por questão da influência de interpretações populares do 
Apocalipse de João na definição de conceitos escatológicos, um breve comentário ao livro 
está incluído neste estudo. Escatologia é o termo oficial para o estudo destes e 
relacionados assuntos. O termo vem de duas palavras gregas, eschaton 
(escaton)significando “último” e logos (logo") significando “palavra”. A combinação dos 
termos se refere ao estudo das últimas coisas—a morte e os seus assuntos relacionados. 
A escatologia compreende dois aspectos principais: a escatologia cósmica e a escatologia 
individual. Pretende-se em primeira instância tratar algumas das questões de referência 
comunal e cósmica. Por outro lado, pretende-se dar mais ênfase aos aspectos individuais 
da temática. Neste estudo são os aspectos individuais que serão enfocados, pois são nestes 
elementos da temática que o indivíduo se vê em necessidade pessoal de estar relacionado 
devidamente com Deus. A escatologia reúne um apanhado de conceitos que sofreu muita 
transformação ao longo do trajeto revelacional do povo de Israel. As expectativas 
escatológicas foram em muito modificadas através do tempo, incluindo o caso de muitas 
correntes que nem mantinham conceitos propriamente escatológicos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Sumário 
O PROBLEMAS DA ESCOTALOGIA ......................................................................................................... 4 
COSMOLOGIA ANTIGA .......................................................................................................................... 7 
ESCATOLOGIA: CONCEITOS ................................................................................................................. 12 
ESCATOLOGIA: TEXTOS BÍBLICOS IMPORTANTES ............................................................................... 19 
REFERÊNCIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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CAPÍTULO 1 
O PROBLEMAS DA ESCOTALOGIA 
 
Distância Pessoal: Um dos primeiros problemas a serem evitados no estudo de 
Escatologia, é de manter o assunto muito distante do indivíduo. Pode-se muito facilmente 
falar da segunda vinda de Cristo usando expressões no sentido de que Jesus pode voltar 
amanhã, porém não se ouve a necessidade de estar preparado. Em geral pensa-se: “Pode 
ser que Jesus venha amanhã, mas não é muito provável. Não é preciso dar muita 
importância ao assunto.” Neste contexto, o estudo da escatologia vem a ser um estudo 
bem confortável, pois trata-se de algo polêmico, intrigante, ambíguo e muito distante. Por 
outro lado, a Bíblia parece sempre abrir o assunto assinalando a necessidade de cada um 
estar preparado. É necessário lembrar que estas “últimas coisas” incluem aspectos que 
são refletidos no cotidiano. Cristo pode vir dentro do âmbito das nossas vidas, mas as 
nossas vidas terminarão em menos de oitenta anos mais. Estaremos prontos? 
Princípios de Interpretação: Outro problema a ser considerado ao estudar 
assuntos de escatologia (como também qualquer outro tema bíblico) concerne à 
necessidade de respeitar os princípios de interpretação bíblica. Além de sempre ler os 
versículos e as passagens dentro de seus respectivos contextos, é necessário lembrar que 
as passagens de ensino claro sempre tomam precedência no tratamento de um tema. Por 
exemplo, 1ª João é muito mais claro ao tratar do anticristo do que o livro de Apocalipse. 
Outro ponto a observar é o tipo de literatura que se está estudando ao tratar um texto. O 
estilo literário do Apocalipse não é igual a 1ª João e o tratamento dos livros deve respeitar 
essa diferença. 
Respeitando Propósito/Intenção: Mais um problema a negociar é a necessidade 
de ler as passagens bíblicas em relação aos seus propósitos, não em sentido de responder 
curiosidades pessoais. A Bíblia foi escrita para tratar da necessidade do homem perante 
Deus, não para ensinar ciência, história, nem futurismo. No final de um estudo, nem todas 
as perguntas, dúvidas e questionamentos serão respondidos, pois a Bíblia não segue o 
propósito de responder às curiosidades humanas. Jesus mesmo disse, “Não vos compete 
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saber os sinais e os tempos”. Deus exige do homem uma dependência e confiança sem se 
propor necessariamente a aplacar todas as dúvidas e preocupações humanas. 
História: Outro problema a ser evitado está relacionado à história. Berstén e 
outros fazem distinção entre profecias que se cumpriram e outras que ainda não se 
cumpriram. O problema que deve ser tratado nesse contexto é o de compreender o que já 
sucedeu na história para então poder fazer uma melhor declaração entre aquilo que tem e 
não tem acontecido. Salienta-se aqui a passagem de Mateus 24.1-28 e o contexto da 
destruição de Jerusalém no ano 70 depois de Cristo. 
Cosmologia: É necessário compreender como o povo, especialmente os autores 
bíblicos entendiam o mundo em que viviam. Sua cosmologia implicava na sua 
terminologia aplicada a conceitos espaciais e geográficos, como também a certas 
referências escatológicas. Não é lícito forçar o texto bíblico a refletir um conceito 
cosmológico do século vinte, quando os autores não compartilhavam esse conceito. 
Vocabulário Especializado: Por outro lado, é indispensável que se trate o 
vocabulário bíblico conforme o uso dos próprios autores. Certas palavras ou frases eram 
usadas diferenciadamente da ‘forma atual. O judeu dividia o tempo em duas partes: antes 
do Messias e depois do Messias. Por “últimos tempos” ou “tempos postreros”, a Bíblia 
designa a segunda etapa do tempo. Os últimos tempos, então, começaram com Jesus e 
referenciam o tempo desde aquela época até o final do tempo. 
Supremacia Bíblica: É sumamente necessário que respeitemos que a palavra 
final referente a qualquer assunto teológico é a palavra bíblica. Não é lícito dar mais 
confiança a sonhos, palavras de profecia e visões do que ao próprio texto bíblico. Toda 
outra fonte deve ser submetida às indicações e às limitações apresentados no tratamento 
bíblico dos assuntos correspondentes. A Bíblia é a Palavra de Deus e Deus não se 
contradiz, ainda que a Bíblia exibe um desenvolvimento teológico no processo 
revelacional. Quando houver conflito entre a mensagem bíblica e a palavra ou evento 
profético, a dúvida recairá sobre a fonte extra bíblica. 
Profecia: Biblicamente, a profecia não é um exercício de contra o futuro. Em vez 
disso, é a proclamação da mensagem de Deus ao povo do dia do profeta. Quando um 
intérprete procura fazer que textos como Apocalipse falem em predizer eventos do futuro, 
a tendência é prognosticar eventos do tempo do intérprete. Tal faz que textos como 
Apocalipse percam todo sentido a seus ouvintes originais10. Ao contrário, a profecia tem 
quever com a proclamação da mensagem de Deus ao povo de Deus. É essencialmente 
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proclamação, não prognosticação. A palavra profética conforme assim era relevante no 
seu dia e segue sendo relevante hoje também, pois expressa a mensagem atemporal de 
Deus à humanidade, uma mensagem a ser aplicada às circunstâncias do tempo de cada 
ouvinte. 
Respeitar Limitações: Também é necessário lembrar que existem limitações ao 
que pode ser conhecido em certas áreas. Atos 1.7 indica que não compete ao ser humano 
saber e entender a maioria das questões referentes a eventos futuros. Precisa-se aceitar 
que Deus simplesmente não revela detalhes a respeito de toda curiosidade humana. É 
necessário ler o texto bíblico reconhecendo o propósito do próprio texto, não jogando por 
cima do texto um propósito pessoal especulativo sobre o fim do mundo. O que realmente 
importa saber está exposto de forma clara: “Vigiai, pois não sabeis em que dia vem o 
vosso Senhor!”. 
Em consideração às limitações do intérprete bíblico referente a formas 
divergentes de compreender o mundo (ou seja, divergências entre as formas da 
antiguidade e as atuais), apresenta-se certas reflexões sobre a forma na qual os autores 
bíblicos refletiram sobre o mundo. Os textos bíblicos apresentam muito ensino com o uso 
de expressões que referenciam ou retratam os conceitos cosmológicos do povo e de seus 
vizinhos. Espera-se que este tratamento possa ajudar a compreender melhor as 
implicações dos termos usados na Bíblia. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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CAPÍTULO 2 
COSMOLOGIA ANTIGA 
 
Em vários casos, será de ajuda na compreensão de um texto saber algo sobre o 
conceito cosmológico do povo hebreu na época bíblica. Este conceito, embora 
diferenciado, está relacionado aos conceitos cosmológicos dos povos ao seu redor. É 
importante conhecê-los especialmente ao lidar com narrativas concernentes à criação, ao 
dilúvio e tópicos escatológicos que retratam realidades celestiais em terminologias da 
realidade física conhecida. Evidências deste conceito cosmológico serão encontradas em 
outras narrativas e textos ao descrever algo do mundo além-túmulo ou aspectos do 
universo criado por Deus. 
O conceito hebraico do formato do universo deve ser considerado ao tratar de 
assuntos tais como a criação. Os hebreus tinham a mesma percepção “científica” do 
mundo dos outros povos de sua época, porém faziam suas distinções. Em matéria do 
formato físico-estrutural do universo, tinham muito em comum com os outros povos. O 
texto bíblico usa termos como “abismo”13, “expansão” (em algumas traduções 
“firmamento”)14, “janelas dos céus”15 e outros termos que de certo, soam um tanto 
estranhos no século presente. Estes termos demonstram a forma antiga de se refletir sobre 
o mundo a sua perspectiva do universo criado por Deus. Pode-se ver que certos assuntos 
atuais, como a preocupação de encontrar vida em outros planetas, não tem cabimento no 
texto bíblico pelo simples fato de que estas perguntas baseiam-se em outra cosmologia, 
muito distinta daquela dos hebreus. 
O gráfico apresentado ajuda na compreensão da perspectiva “científica” dos 
hebreus referente ao formato do universo, refletido especialmente em passagens como 
Gênesis 1-11 e de Jó 38-41, na qual Deus faz perguntas a respeito da criação do universo 
que Jó não consegue responder. Os elementos comuns entre os hebreus e os outros povos 
são diferenciados em seus termos representativos e especialmente na sua explicação 
religiosa. É importante lembrar que mesmo quando o conceito hebraico reflete certas 
noções tidas em comum com os outros povos, a ênfase das narrativas hebraicas é a de 
oferecer uma crítica nos pontos em que divergem deles pela revelação de Deus. 
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Este gráfico do conceito hebraico da estrutura do universo limita-se a uma fração 
mínima da cosmologia científica atual. Pode-se ver como a Bíblia utiliza certa 
terminologia que se refere ao conceito cosmológico de seus autores17. Pode-se ver no 
gráfico o título de “firmamento” (ou “expansão”) para o círculo dos céus que separa as 
águas acima do firmamento da zona que se denomina hoje por atmosfera. Estes termos 
ajudavam o povo a falar do mundo ao seu redor, mesmo que o seu conceito específico 
tenha sérios problemas em face da ciência atual. Entender a cosmologia hebraica é de 
ajuda para compreender as implicações das narrativas que utilizam a terminologia do 
mesmo conceito. Quando o autor bíblico refere-se às janelas do céu, é bom saber que faz 
referência ao seu conceito de como a água acima do firmamento chega até a terra em 
forma de chuva. 
A cosmologia é uma área da ciência que influi muito em vários aspectos da 
comunicação humana, pois muitos dos seus conceitos alteram a forma de conceber o que 
acontece em volta do indivíduo e a sua sociedade. A cosmologia hebraica aparece até no 
livro de Apocalipse, onde o “‘abismo sem fundo’ está vinculado a ideias concernentes à 
forma do mundo. A terra era concebida como um disco plano que flutuava em cima da 
água. O abismo refere-se às profundezas imensuráveis debaixo da terra, para os quais 
pensava-se existir uma fenda capaz de ser selada”18. Até o Novo Testamento, portanto, 
sente a influência desta cosmologia. 
O conceito egípcio era estruturalmente bem parecido com o hebreu, mas 
representado nas pessoas de seus deuses19. Estes representavam para os egípcios as várias 
partes do cosmos. Enquanto trata-se na atualidade do mundo fenomenológico como 
objeto impessoal, “os antigos reagiam a ele como a uma ‘pessoa’”20. Assim, entre os 
egípcios, a mitologia e apresentação cosmológica defendiam que o panteão de deuses era 
parte do cosmos em termos físicos e representativos. Assim, o universo é tanto criação de 
seus deuses, como também os seus deuses compõem as partes do universo. 
Não parece que houve muita diferenciação entre a obra resultante e o originador 
da mesma. No antigo conceito cosmológico egípcio, o deus-céu é o céu, o deus-terra é a 
terra, o deus-Nilo é o Nilo e o deus-ar é o ar. (Portanto, no relato das pragas do Egito21, 
Deus se revela como maior que os deuses do Egito, não apenas por dominar suas esferas 
de influência, mas, segundo a forma egípcia de ver as coisas, por dominar os seus próprios 
deuses!) Essa forma segue alguns aspectos da mitologia babilônica retratadas no seu 
épico, Enuma Elish, porém é diferenciada em suas próprias expressões. Os relatos 
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mitológicos dos egípcios referentes a este conceito cosmológico divergiam em muito das 
narrativas que se encontram no livro de Gênesis. Os primeiros relatam lutas e intrigas 
entre deuses que atuam tais como ou até piores do que os seres humanos. Esses deuses 
têm muito em comum com os deuses dos gregos, romanos, e babilônicos, porém pouco 
ou nada com YHWH (hwhy), Senhor de Israel. 
O conceito babilônico (ou seja, mesopotâmico) do universo é parecido com os 
conceitos hebraico e egípcio em seus termos estruturais, mesmo que apresentando outro 
formato que centraliza a montanha no centro da terra23. Esta montanha era muito 
importante para os babilônicos, refletindo a ideia de que no seu ápice era a morada de 
seus deuses. O épico Enuma Elish24 amplia a perspectiva narrativa e histórica do conceito 
babilônico em termos de como o mundo chegou a ser formado. Este épico enfatiza mais 
o relacionamento com a perspectiva do panteão de deuses egípcios, pois ele relata o 
assassinato de alguns deuses e a construção das partes do cosmo com a utilização de seus 
corpos. 
O mesmo relatodiverge do egípcio em que os deuses usados para essa 
“construção” já não existem, pois usou-se seus cadáveres na estrutura física do mundo. 
Bultmann, estudioso do Novo Testamento, referiu-se à cosmovisão expressa no Novo 
Testamento em termos parecidos com a descrição anterior. 
A estrutura física resultante desta cosmologia, porém, apresenta-se bem 
semelhantemente à hebraica. 
Tem-se também uma reflexão da perspectiva cosmológica do Apóstolo Paulo, 
ao mencionar um homem que foi levado até “o terceiro céu”26. Esta citação reflete sua 
visão estrutural do universo. O quadro acima ilustra a cosmologia babilônica27. Nota-se 
que a perspectiva é a da terra ser uma espécie de ilha, com água na volta por todos os 
lados. Tal era o conceito geral dos hebreus e seus povos vizinhos28. Um detalhe faltando 
no quadro é o túnel por debaixo da superfície da terra pelo qual o sol passava cada noite 
para chegar de novo a seu lugar de nascer. 
Nota-se nos relatos babilônicos uma série de conflitos, lutas e intrigas. Estas 
sucedem tanto entre os seus próprios deuses, como também entre os deuses e o caos do 
universo quando da criação do mundo habitado pelos homens. Desde a perspectiva 
babilônica, “a criação é realmente nada mais que a vitória sobre os poderes caóticos que 
ameaçam a vida dos deuses e das pessoas”. 
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Os deuses até conseguem vitória sobre o caos do universo, mas não há uma 
certeza de vitória entre si, já que existe entre eles uma disposição a intrigas. Também as 
suas narrativas referentes ao dilúvio revelam este mesmo caráter de incerteza, 
desconfiança, capricho e intriga. 
Na cosmologia babilônica pensava-se que a criação do mundo era o resultado da 
junção dos oceanos de água salgada e de água fresca na pessoa dos deuses, Tiamat e Apsu. 
Estes nomes servem de igual modo para designar os oceanos referentes31. Foi na junção 
ou união destes deuses que a terra seca se formou. 
O formato do mundo, portanto, era concebido de modo essencialmente igual, 
trocando o estilo e especificidade da atuação e identificação dos personagens divinos 
associados à criação. Assim, as mitologias narradas por estes outros povos divergem 
muito das narrativas hebraicas do Gênesis. No texto bíblico encontra-se conflito, mas este 
conflito é procedente do homem, não dos céus entre um panteão de deuses. Em Gênesis, 
Deus cria a partir de uma decisão de sua livre e soberana vontade e até domina o “caos” 
ao começar sua obra criativa. A descrição do restante deste primeiro relato da criação 
mostra como Deus operou para impor ordem ao caos que já lhe obedecia e lhe serviu de 
base para o restante de sua criação. O narrador continua mostrando ainda a soberania 
divina sobre o caos na descrição do dilúvio, apresentando o conceito de YHWH ser muito 
acima do conceito dos outros povos referentes a seus deuses. 
O conceito estrutural da forma do universo, então, era mantido basicamente em 
comum com os outros povos ao seu redor, porém as considerações teológicas que os 
hebreus mantiveram referente a essas estruturas físicas é algo completamente diferente. 
Como participavam dos conceitos cosmológicos dos seus vizinhos, a sua ciência geofísica 
e geográfica era muito diferente daquela aceita no século vinte. Estas diferenças devem 
ser levadas em consideração para uma melhor compreensão de textos tão antigos. 
Mesmo com as diferenças enormes entre conceitos da estrutura do universo de 
hoje e dos povos do mundo antigo, as considerações teológicas destes que apresentam 
conceitos divergentes são aplicáveis aos dias de hoje, sem qualquer necessidade de 
alteração. O texto bem pode falar com um linguajar geográfico ao considerar a vida além 
do túmulo, sem alterar o significado do ensino teológico da expressão. 
Hoje ainda se fala com o mesmo tipo de linguagem sobre o viver com Deus “nos 
céus”, mesmo que se saiba que Deus não mora num lugar fixo acima das núvens. Ainda 
se faz referência a um inferno que se localizaria abaixo da crosta da terra, mesmo que não 
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mais se pense no inferno como uma habitação debaixo da superfície da terra. Estas formas 
de expressão remontam a cosmologias bem diferentes da atual. O problema maior para o 
intérprete é descobrir a intenção teológica do texto, não considerar a validade científica 
do pensamento do povo e do autor. 
Não se deve cometer o mesmo tipo de erro que a igreja enfrentou na época de 
Galileu Galilei, opondo-se a novos posicionamentos científicos para “proteger” os 
vínculos que se haviam construído entre questões de fé e conceitos científicos. Aceitando 
o propósito bíblico básico como sendo teológico, recorre-se à Bíblia para embasamento 
de questões de fé e prática, não de conceituações intelectuais referentes ao mundo criado 
por Deus. A Bíblia interessa-se mesmo em explicar Quem” criou, não o método, nem o 
formato da criação. As narrativas bíblicas pretendem demonstrar a identidade de YHWH 
em relação e contraste com o homem, não pretendem ensinar ciência. O importante das 
narrativas, então, não é uma veracidade detalhada de suas considerações científicas e 
descritivas do universo, mas o seu ensino referente a YHWH e Seus desígnios para a 
humanidade. 
É interessante lembrar que as narrativas não contam toda a história da interação 
de YHWH com o Seu povo. Como o autor do Evangelho de João coloca, há muitas coisas 
que poderiam ter sido escritas referente aos acontecimentos históricos entre Deus e o seu 
povo, mas estas foram escritas com propósito específico. Assim como o Evangelho de 
João foi escrito para suscitar a fé real, também é este o propósito das narrativas bíblicas 
em geral—“para que, crendo, tenhais vida em seu nome”. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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CAPÍTULO 3 
ESCATOLOGIA: CONCEITOS 
 
Antes de tratar com o ensino bíblico mais abrangente nos tópicos a seguir, se 
tomará uma breve olhada a alguns parâmetros básicos para o estudo dos seguintes termos. 
Mais será discutido nestes assuntos ao tratar passagens essenciais nos tópicos respectivos. 
“Reinar de Deus”: 
No estudo da eclesiologia foi revisto algo da importância do conceito do Reino 
de Deus. Como o conceito é também de muita importância na escatologia, será tratado 
aqui de forma mais dirigida às temáticas escatológicas. 
Para a escatologia, a categoria principal na Bíblia é o Reino de Deus, seu 
“governo em ação”41. Em razão disto, usaremos a frase o “reinar de Deus”42 em lugar 
do costumeiro “Reino de Deus”. Jesus declarou que esse reinar já se fazia real dentro dos 
parâmetros da historia43. Mesmo que muitos tratem o reinar de Deus com uma 
característica futura, o reinar não somente se acerca no ministério de Jesus. Vem a uma 
expressão mais plena numa data futura”44. Esta data pode ser entendida como o evento 
de pentecostes, entre outras opções. Nos evangelhos sinópticos, Jesus é apresentado não 
somente a iminência, mas a própria chegada do reinar de Deus. Logo, não deve ser 
concebido apenas em termos da vida após a morte, pois reflete o reinar de Deus na vida 
do cristão no “aqui e agora”. 
O Reinar de Deus é uma temática especial dos evangelhos sinópticos, 
principalmente em Mateus. Aqui se encontra a terceira parte das referências neo 
testamentárias ao Reinar de Deus (ou Reino dos Céus)46. Na reflexão de Mateus 
encontramos um sentido de urgência ao aproximar o reinar de Deus, o arrependimento 
sendo a categoria mais ressaltada para a preparação do indivíduo. Muitas vezes a palavra 
de Jesus refere-se à crise centralizada no ingresso ao reinar de Deus48, como nos capítulos 
13 a 16 de Lucas. No ensino deJesus, nada tem valor ao ser comparado com o reinar de 
Deus. Jesus convocava à renúncia de todo laço que impediria o indivíduo de seguir o seu 
exemplo de submissão total a Deus, o que o levou à cruz. 
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É comum certa confusão referente ao Reinar de Deus, especialmente em termos 
de seu tempo. Como já tem sido visto, Jesus trata o reinar de Deus em tempo presente. 
Simultaneamente, Jesus trata o reinar em tempo futuro. A ênfase é na realidade presente, 
mesmo que seja mais comum tratar a temática em expectativa futura. Mateus 12.28 e 
Lucas 11.20 indicam que o reino pregado por Jesus fez mais que acercar-se. Já tinha 
chegado. Mesmo que não tenha sido completamente realizado, estava presente e ativo em 
meio do ministério de Jesus e na vida da igreja51. Enquanto Brooks ainda trata do reinar 
de Deus como algo que chegava, Jesus falou com de seus discípulos como vivenciando o 
reinar de Deus em meio das suas vidas terrestres. Entre tanto ao reino de Deus era uma 
realidade presente na pregação de Jesus. Não havia razão para esperar algum evento 
futuro. 
O tratamento bíblico do reinar de Deus após o ministério de Jesus visa menos 
futuridade do que recebe durante o seu ministério sobre a terra. Ao mesmo tempo, 
permanece a expectativa de um complemento à realidade do reino já inaugurada nas vidas 
dos crentes. Tal expectativa, porém, encontra a sua expressão na base do que Jesus já tem 
realizado. 
“A confissão cristã não é apenas que Cristo virá ao final da história, mas que 
Cristo já veio; não apenas que a salvação espera o crente no futuro escatológico, mas que 
a salvação já é experimentada, numa forma antecipatória, porém real, no aqui e agora, no 
meio de problemas e não apenas ao seu fim…. Molda-se o presente não apenas pelo 
passado, mas também pelo futuro de Deus”. 
O Novo Testamento geralmente caracteriza o reinar de Deus como a ação divina 
em reinar naqueles que se colocam debaixo da autoridade de Deus en Cristo Jesus53. O 
ingresso ao reino é agora, não num porvir. No momento em que se abre a vida para 
depender de Deus completamente, há ingresso no seu reinar. Em termos políticos, esse 
reinar “não é deste mundo”, porém não há necessidade de pensar que seja apenas um 
conceito futurístico. 
Céu: 
Ao tratar com o reinar de Deus, deve-se salientar alguns aspectos da temática do 
céu, por questão de ser complemento do ensino referente ao reinar de Deus—o reinar de 
Deus após a morte física. 
Os termos bíblicos para céu, mymc (hebreo: che-ma-yim) e ouranovs (grego: u-
ra-nos) são usados na Bíblia com três sentidos básicos: referindo-se 1—à estrutura física 
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do universo (o firmamento na cosmologia hebrea), 2—à morada de Deus, e 3—a Deus 
como um sinónimo55. Olhando para Lucas 15.18, pode-se ver claramente que esta 
referência é feita especificamente a Deus56, não àquela expansão estrutural acima das 
nuvens, pois o filho havia pecado contra Deus, não contra uma localidade. Pode-se ver 
que o reino do qual Jesus ensina em Mateus 5.3 e em Lucas 6.20 é o mesmo. Logo, o 
chamado “reino de Deus” e o “reino dos céus”, são expressamente a mesma coisa. 
Entre o uso do termo como morada de Deus e sinônimo de Deus, existe um 
relacionamento que nos interessa em referência à temática do reinar de Deus. Há um 
vínculo entre o estar sob o reinar de Deus e estar na Sua presença. Essa presença com 
Deus é elemento essencial da temática de “céu”, como também do reinar de Deus. Tanto 
no céu e no reinado de Deus, é a imediacidade da presença divina a sua característica que 
dá sentido à experiência. 
A Bíblia, especialmente o Antigo Testamento, também usa o termo “descanso” 
para tratar considerações referentes à vida no céu, mesmo que tenha conotações presentes. 
Neste sentido, o descanso não é uma pausa do esforço laboral. É mais o receber e desfrutar 
algo de grande importancia58. Quando falamos em descanso em sentido celestial é 
necessário lembrar deste aspecto do emprego deste termo. 
Segunda Vinda/Parúsia: 
Muitas vezes falamos da Segunda Vinda de Jesus ou seu retorno, mas essas não 
são as formas pelas quais Jesus se referia ao conceito. O termo bíblico para a chamada 
segunda vinda é a palavra grega parousia (parousia), com o sentido de aparecimento. É 
designação de Jesus ser revelado em glória. Inerente a este conceito existe um 
reconhecimento claro, global da identidade e do retorno de Jesus. Alguns tem 
compreendido a Jesus ter falado de sua morte como trazendo o reino escatológico de 
Deus60. Tal expectação é que neste aparecimento, todos entrarão no reinado de Deus—a 
esperança messiânica tão esperada afinal cumprida. 
Deve-se notar que as expectativas messiânicas originais englobavam duas 
realidades como uma. A chegada do Messias e a inauguração do reinado messiânico eram 
vistas como um só evento. No ministério de Jesus, elas parecem tornar-se em duas 
realidades diferentes. Jesus também introduz uma terceira realidade na mistura, conforme 
falamos de uma realidade futura desse reinado de Deus ainda antecipada. Quer seja além 
da tumba, o na terra, essa realidade de uma concretização mais plena do reinado final de 
Deus chegou a ser um terceiro elemento da esperança messiânica. Os judeus entendiam 
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esta realidade como a realidade básica do reino messiânico. Os escritores do Novo 
Testamento parecem reformular esta realidade como uma concretização celestial 
esperando a realidade vivida além da tumba. 
Fim do Mundo/Últimos Dias: 
É valioso lembrar que o uso de frases como “o fim do mundo” e “os últimos 
dias” nem sempre referem-se à destruição do mundo físico. Os judeus dividiam o tempo 
em duas partes—antes e depois do messias. Logo, com o dia de Pentecostes em Atos 2, 
já se pode falar destes últimos tempos, conforme Paulo, em 1a Coríntios 10.11. Em 
conjunto com estas frases, encontra-se em certas passagens a frase “última hora”. Esta 
refere-se de forma parecida, se não igual, ao conceito últimos dias. Pode ao mesmo tempo 
espelhar uma compreensão de ser um tempo imediatamente antes da vinda de Jesus em 
glória, porém tal compreensão deve ser vista no contexto dos quase dois mil anos após 
estes textos terem sido escritos, sem que Jesus tenha vindo em sua glória. Autores bíblicos 
de textos como Apocalipse e 1a João esperavam que Jesus voltasse a qualquer minuto, 
porém estavam errados nos seus cálculos. Tal fato deve servir de alerta àquele que busca 
definir o quando da parousia e o fim do mundo—ninguém sabe. 
Ressurreição e Juízo: 
Os conceitos de ressurreição e juízo estão ligados de pelo menos duas formas: a 
ligação de sequência temporal dos conceitos e o seu tratamento bíblico por via de duas 
perspectivas distintas. A ligação temporal é produto de uma das perspectivas que trata a 
ressurreição como o evento que introduz o julgamento. As duas perspectivas bíblicas 
divergentes sobre os conceitos visam a duas ênfases primárias das temáticas, o individual 
e o universal. 
Desde a perspectiva individual, os autores bíblicos tratam de enfatizar que cada 
indivíduo passa pela ressurreição e o julgamento na hora de sua morte. Essa perspectiva 
realça tanto a experiência individual como a instantaneidade da experiência. A 
perspectiva universal normalmente trata o evento de ressurreição ou julgamento como um 
evento compartilhado de forma simultânea entre todos da raça humana de todos os 
tempos. Poder-se-ia designar as perspectivas como pontilhar sequencial (olhando a 
história como uma série de pontos individuais) e aorista sumária (olhando desde o futuro 
para trás sem diferenciar questões temporais), descrevendo os mesmosacontecimentos 
de perspectivas diferentes. Por outro lado, pode-se interpretar o aspecto pontilhar 
 16 
 
 
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sequencial como sendo a experiência normativa, passando para o aorista sumário num 
final cósmico cataclismático. 
Assim, Hebreus 9.27 trata da perspectiva pontilhar sequencial: cada um morre e 
segue para o seu julgamento. Mateus 25 trata de forma aorista sumária: virá o dia de 
prestar contas, e todos os servos aparecerão perante o Senhor para serem julgados. Paulo 
parece vincular as duas perspectivas em Tessalonicenses: não chegaremos antes dos que 
dormiram primeiro, mas os encontraremos na região celestial. Não há necessidade de 
cogitar um estado intermediário como alguns têm feito. Lucas 16 parece ensinar que o 
juízo é imediato na hora da morte64, enquanto João 5 denota o juízo como tendo ocorrido 
mesmo antes da morte do indivíduo. 
Inferno: 
Como o conceito “céu” tem vínculo estreito com o estar presente com Deus, o 
conceito inferno vincula-se diretamente ao oposto. Várias figuras são usadas para 
descrever essa realidade, mas o essencial é de estar completamente desvinculado de Deus 
para sempre. Há passagens que tratam o inferno como ardendo em fogo, enquanto outras 
passagens descrevem com o ranger de dentes, refletindo um frio interminável. Lembra-
se que são figuras para descrever uma realidade que não se reduz à linguagem humana. 
Outras formas descritivas também são usadas, como de ser deixado do lado de fora da 
festa nupcial ou banquete. Qualquer que seja o detalhe, é um estado consciente de 
separação de Deus. 
Os comentários de Paulo em Romanos 10.6-7 claramente demostram que ele 
entende céu e inferno como lugares físicos. Ele indica que o céu é um lugar físico acima 
da terra, o inferno como a habitação física dos mortos abaixo da superfície da terra. A 
descrição física, entretanto, não é tão importante como o seu carácter de estar separado 
de Deus. 
Um lembrete deve ser feito que o conceito de inferno foi revelado num processo 
de várias etapas. Eclesiastes desconhece qualquer vida após a morte. 1ª Samuel 28.13-14 
descreve a Samuel subindo desde o mundo subterrâneo. Este texto reflete uma 
compreensão que ambos os justos e injustos existem num estado nebuloso após a morte 
no mundo subterrâneo do Seol. Isaías 26.19 já fala de uma ressurreição dos fiéis. 
“Vida da Era”: 
Nossas traduções usam a frase “vida eterna” para a frase grega zwhn aiwnion 
(zo-ín ei-o-ni-on). Enquanto “vida eterna” é uma tradução válida, não é necessariamente 
 17 
 
 
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a mais correta. A frase é literalmente “vida da era”. Refere-se àquela vida que pertence à 
era por vir—a eternidade. 
Mateus, Marcos e Lucas utilizam a frase em lábios dos judeus, mas somente en 
duas instancias como pronunciada por Jesus. Em geral, Jesus fala da vida no reinado de 
Deus, em vez desta “vida da era do porvir”. Enfrentando perguntas sobre entrar à “vida 
da era”, Jesus responde referente ao entrar ao reinado de Deus. Viver baixo o reinado de 
Deus é a característica essencial a essa vida. Sua duração não é tão importante, nem é a 
preocupação sobre o reinado messiânico futuro. O reinar de Deus é uma realidade 
presente. A submissão à vontade de Deus é seu enfoque primário, senão completo. 
O Evangelho de João está repleto da frase “vida da era”. João abre com 
referência a Jesus como o Criador da vida quem vem a dar vida com Deus a todos que a 
recebam. A vezes João simplesmente usa o termo “vida” em referência a esta vida 
especial da era porvir. João é cauteloso, entretanto, para classificar esta vida como uma 
realidade presente, em vez de uma experiência que devemos aguardar. João 3 a 7 usa a 
frase “vida da era” no mesmo sentido que os outros evangelistas usam a frase “o reinar 
de Deus”. Em João 17:2-3 Jesus define a qualidade desta vida como conhecer ao único 
Deus refletido no envio de Jesus Cristo. 
Ao todo, a discussão do evangelho não pretende enfatizar a duração desta vida, 
nem os seus aspectos futuros. É uma qualidade presente de vida que pode durar por toda 
a eternidade. “Ira de Deus”: 
Muitos gostam de falar da ira de Deus como uma categoria essencial ao carácter 
divino. Muito se tem pregado sobre a necessidade de escapar da ira e a vingança divina, 
mas a Bíblia não está tão repleta dessa categoria como alguns querem dizer. 
Encontramos um retrato em Mateus 3.7-10 e Lucas 3.7-9 da necessidade de 
escapar da ira e do julgamento de Deus. Este tema já foi tratado em Jonas, como em outros 
textos do Antigo Testamento. À vez, tratam mais da necessidade de uma mudança no ser 
humano que um aspecto irado do carácter de Deus. Conforme Romanos 1.16-32, a ira de 
Deus consiste mais do que nada em deixar que alguém trilhe o caminho que escolhe. 
Aquele que não quer nada com Deus, Deus o deixa seguir a sua vida aparte de Deus. 
Gênesis 3-4 pinta um quadro de Deus atuando em misericórdia e provisão pela 
humanidade que cai nas tramas do pecado. Deus tece roupas para a humanidade y 
providencia para Caim uma marca da sua proteção frente à vingança alheia. Miquéias 6-
 18 
 
 
FACULDADE TEOLÓGICA NACIONAL 
 
7 pinta um quadro demostrando que ao mesmo tempo Deus que age em juízo está pronto 
para tratar com misericórdia. Como em 2ª Crônicas 7, 
Deus prefere misericórdia e perdão, usando o julgamento como um recurso para 
chamar a humanidade para uma reconciliação. O seu desejo central não é o castigo, mas 
o perdão, a misericórdia e a reconciliação. 
João 3 indica que o amor de Deus é o ser atributo central, não um desejo irado 
para vingança e retribuição. 1ª Timóteo 2.4, 2ª Timóteo 1.18, 4.8 e Tito 2.11-14 falam 
também do desejo divino para reconciliar a todos. Ao tratar com a ideia da ira divina, 
deve-se temperar o conceito com a misericórdia, amor e o perdão de Deus, temas que a 
Bíblia trata com uma atenção muito mais ardente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 19 
 
 
FACULDADE TEOLÓGICA NACIONAL 
 
CAPÍTULO 4 
ESCATOLOGIA: TEXTOS BÍBLICOS 
IMPORTANTES 
 
Passa-se agora a tratar alguns textos chaves para a compreensão das temáticas 
da escatologia. As passagens a seguir não são todas as passagens relevantes, mas são as 
mais centrais para tratar essas temáticas. 
1ª Coríntios 3.10-4.5: 
“Aquele que constrói banalmente a igreja de Deus sofrerá a perda de 
recompensas especiais que Deus tem preparado para serviço bem prestado. Sua salvação 
não está envolvida. Ela é um presente da graça de Deus, recebido pela fé. No entanto, tal 
salvação teria sido de muito mais agrado se houvesse resultado em boas obras, em 
materiais dignos, contribuindo para a construção da igreja de Deus”. 
Por contrastar ouro, prata e mármore com madeira, palha e joio, Paulo fala de 
“um palácio por um lado, e uma barraca de lodo por outro”68, segundo os materiais em 
uso comum na época. Os materiais dignos para a construção sobrevivem ao fogo 
mencionado. Se Cristo for o alicerce, a estrutura erguida por cima deveria ser digna da 
qualidade do seu fundamento. Não se deve construir de qualquer maneira, mas com 
qualidade69. Em algum ponto o material utilizado na construção será visto e provado. 
Não há como escapar desta prestação de contas a Deus71, pois nesta menção do 
fogo é feita em conjunto a menção do “Dia” —uma referência escatológica—essa junção 
refletindo o dia de juízo escatológico. Nestes termos, a igreja primitiva ouvia uma 
mensagem de boas novas pelo interesse e a autoridade de Deus exercida sobre o que se 
passava entre o seu povo ou sua igreja72. O interesse de Deus está presente na sua igreja 
e no labor desse seu campo.Esse interesse virá a ser revelado de forma mais efetiva no 
juízo ao qual Paulo aqui se refere. No entanto, muitos trabalham no campo, mas haverá 
um prestar de contas. Esta prestação aqui referida não está necessariamente vinculada 
com a salvação, mas com a recompensa do justo fiel. 
Ao contrário de outras passagens bíblicas, esta figura do juízo aqui não é a 
questão da separação entre os fiéis e os infiéis. Em vez disso, é um retrato de uma vida 
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FACULDADE TEOLÓGICA NACIONAL 
 
desperdiçada. Os aqui julgados têm sido infrutíferos, entregando resultados tão míngues 
sobre o alicerce de Jesus Cristo que os resultados das suas vidas parecem desaparecer 
numa fumaça. Não existe nada de valor para mostrar por seus esforços, seja almas 
acercadas ao evangelho de Cristo, enriquecidos no carácter dos evangelhos ou 
crescimento na graça de Deus73. A preocupação básica aqui é que para Deus a qualidade 
do investimento que cada qual faz no desenvolvimento do reinar de Deus importa, e Deus 
tem exigências sobre os nossos esforços e investimentos no engrandecer do reinado de 
Cristo. 
Quando Paulo trata a questão do corpo do cristão como templo, ele emprega o 
termo não;" (naós), que designa mais precisamente o próprio santuário, do que o templo 
como um todo. O uso aqui pode designar a parte interna do templo, o santuário, onde se 
visualizava a mera presença de Deus. Um santuário era visto como uma manifestação 
visível da presença do deus ali cultuado76, neste caso, YHWH (hwhy). Era visto como 
uma representação terrestre da sala do trono celestial. Como tal, era designado como um 
lugar apropriado para invocar a presença de Deus. 
É neste contexto que Paulo retrata a vivência interna do “Sopro de Deus” no 
cristão, como parte desse templo. Vale ressaltar que o termo pneu`ma (pneuma) é usado 
nos parâmetros do termo hebraico jwr (ruach), o qual designa não apenas o conceito de 
espírito, mas o próprio fôlego. A intimidade da vivência interna do pneu`ma tou` qeou` 
(sopro de Deus) assemelha-se ao respirar do homem no seu viver diário. Paulo assim 
ressalta a importância e a proximidade do corpo como sendo a “nave” do templo de 
YHWH, onde Deus vive e reina. 
O conceito de “o dia” é especificamente uma referência judicial80. Nesse dia, o 
juiz seria Deus, não algum ser humano que usaria de parcialidade no seu juízo. Este juiz 
julgaria conforme os reais méritos, não por alguma perspectiva falha ou parcial81. Este 
julgamento, portanto, é motivo de alegria para Paulo, pois o seu julgamento e o seu futuro 
está nas mãos de Deus, não dos homens. 
Deve-se lembrar que Paulo termina num ponto positivo, mostrando que o prestar 
contas ao Senhor deveria ser um motivo de alegria para o cristão. 
Esta passagem de 1a Coríntios, revela que o julgamento vindouro é mais do que 
uma simples separação entre os fiéis e os infiéis. Remonta também a alguma 
diferenciação entre a qualidade do investimento de cada cristão na construção da igreja, 
ou seja, no reino de Deus. Nesta diferenciação, não existe motivo de se gloriar por haver 
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em qualquer caso “merecido” a salvação, mas parece ser um ensino coerente com a 
passagem de Mateus 25.14-30, onde aos servos fiéis são dados novas responsabilidades, 
ou seja, oportunidades de continuar o seu serviço a Deus. O reinar de Deus continua, e o 
cristão ainda permanece como servo ou mordomo do Senhor do reino. 
Lucas 14.1-16.31: 
A parábola de Lázaro e o homem rico é uma das passagens mais marcantes 
referente ao estado do ser humano após a morte. Aqui se evoca imagens bem ilustrativas 
de recompensa e juízo. É interessante notar que Jesus referiu esta parábola aos fariseus e 
não aos saduceus. Os saduceus não pensavam existir uma vida além-túmulo no sentido 
de céu e inferno, apoiando-se aos conceitos mais tradicionais do judaísmo do Seol como 
o lugar de todos os mortos, sem diferenciação. Esta parábola, como todo o texto maior 
desde o capítulo quatorze, parece estar bem dirigida aos fariseus, os quais tinham 
expectativas messiânicas e escatológicas bem desenvolvidas. Este ensino, portanto, tem 
uma audiência específica. Parece que o tratamento do reino dado por Jesus para os 
saduceus haveria tomado uma ótica e ênfase diferente. Tem sido comentado que Jesus 
parece colocar mais ênfase no ensino referente ao inferno do que propriamente no ensino 
referente ao céu. Deve-se lembrar, porém, que o inferno não é o contraponto ou oposto 
do céu, mas do reino. Nestes termos, o ensino de Jesus é bem dirigido à inclusão dos 
saduceus. O reino já chegou e começa no aqui e agora. Esta vida no reino é a “vida das 
eternidades”, o qual começa aqui e continua para sempre. Como a vida do reino é deixar 
que Deus reine no indivíduo e no corpo, o céu é a continuação do reinar de Deus, mesmo 
após a morte. 
A morte não interfere no reino, apenas modifica a esfera de sua atuação. O ser 
humano continua após a morte no seu relacionamento com Deus, seja como for o 
mesmo—na intimidade do reinar de Deus ou na eterna separação de Deus, o inferno. 
O termo “Hades” (adh") é a expressão grega utilizada na Septuaginta83 para 
traduzir o termo hebraico, lwav (Seol), este designando o lugar de continuidade nebulosa 
dos mortos84. No Antigo Testamento, o termo mais significativo para referir-se ao mundo 
dos mortos é esse termo, “Seol, uma palavra de origem incerta, porém usada 65 vezes no 
Antigo Testamento”85. 
O conceito do Seol sofreu muitas modificações ao longo do processo revelatório 
de Deus com o povo de Israel. Eclesiastes nem compreende qualquer vida além do 
túmulo, enquanto por outro lado vários textos começam a sugerir imagens dessa 
 22 
 
 
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existência ou continuidade. Quando inicialmente surge o conceito de uma vida além-
túmulo, concebe-se em geral um lugar de silêncio86. O termo essencial é Seol, porém 
outros termos são empregados para expressar esse conceito. Abadon (@wdba) por si 
significa destruição, mas é usado no Antigo Testamento também em referência ao Seol, 
o reino dos mortos88. Mesmo assim, o significado é impreciso por causa de termos que 
são muitas vezes vinculados ao seu contexto, gerando a ideia de lugar daqueles que 
dormem, conforme as sombras dos mortos que se acordam um pouco para receber o rei 
da Babilônia89. Em Jó 26.6 e 28.22, o Abadon é a personificação do lugar de destruição, 
ou seja, dos mortos90. O tehom (μwht— profundezas, ou abismo) e o deserto são também 
símbolos, para os hebreus, referentes ao lugar dos mortos. 
Moody coloca a passagem de Isaías 14.9-15 como sendo a descrição mais vívida 
do conceito do Seol. Ao ler a seguinte passagem, deve-se lembrar o gráfico do conceito 
hebraico do universo: 
“O Seol desde o profundo se turbou por ti, para sair ao teu encontro na tua vinda; 
ele despertou por ti os mortos, todos os que eram príncipes da terra, e fez levantar dos 
seus tronos todos os que eram reis das nações. Estes todos responderão, e te dirão: Tu 
também estás fraco como nós, e te tornaste semelhante a nós. Está derrubada até o Seol a 
tua pompa, o som dos teus alaúdes; os bichinhos debaixo de ti se estendem e os bichos te 
cobrem. 
Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filha da alva! Como foste lançado por 
terra tu que prostravas as nações! 
E tu dizias no teu coração: Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei 
o meu trono; e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do norte; subirei 
acima das alturas das nuvens, e serei semelhante ao Altíssimo. Contudo levado serás ao 
Seol, ao mais profundo abismo.” 
“O contraste temor e o desespero do Seol é um contraste marcado com a 
esperança jubilosa da ressurreição.Tal é o contraste presentado Apocalipse de Isaías (24-
27). Isaías 26.14 diz com respeito aos ímpios: ‘Os falecidos não tornarão a viver; os 
mortos não ressuscitarão; por isso os visitaste e destruíste, e fizeste perecer toda a sua 
memória’. No mesmo capítulo aparece a primeira referência clara à ressurreição da vida. 
Dos justos declara-se (v. 19): ‘Os teus mortos viverão, os seus corpos ressuscitarão; 
despertai e exultai, vós que habitais no pó; porque o teu orvalho é orvalho de luz, e sobre 
a terra das sombras fá-lo-ás cair’. A ressurreição dos mortos depende do poder e da 
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FACULDADE TEOLÓGICA NACIONAL 
 
realidade de Deus e o relacionamento correto do homem para com Deus”95. Em 
Apocalipse 20.14-15, a morte e o Hades são jogados em conjunto no lago de fogo. Seu 
poder sobre o ser humano é aniquilado, mostrando em concordância com outras 
passagens que até “o Seol fica sob o domínio de Deus”. 
Ao retratar o nosso conceito de inferno com o emprego de termos como Seol e 
Hades, deve-se lembrar as limitações do conceito expresso com esses termos por suas 
conotações geofísicas. Lembrando o conceito hebraico do formato físico do mundo, o 
Seol era o mundo subterrâneo ou parte dele. Com o complemento do ensino de Jesus e o 
emprego de outras metáforas para o inferno, vale lembrar que a verdade do ensino não 
está ligada ao espaço físico, mas à sua realidade relacional. “O inferno não é tanto um 
lugar de tormento físico, como é a horrível solidão de uma separação total e completa do 
Senhor”. 
Para tratar bem a parábola de Lázaro e o homem rico, é necessário ver alguns 
assuntos do contexto maior desde o início de Lucas 14. Em geral, uma parábola é dirigida 
a alguém para evocar uma resposta. Assim, é necessário compreender do contexto a quem 
a parábola estava sendo dirigida e com que motivo foi empregada por Jesus. Também 
algumas questões clarificativas devem ser colocadas de antemão. 
Esta parábola vem ao final de uma série de críticas que Jesus dirige às práticas 
farisaicas do dia, as quais são tratadas como um todo em Lucas 16:19-31. Aqui encontra-
se as críticas de negligenciar aos pobres, reclamar direitos próprios, fazer bem aos que 
podem reembolsar, falta de praticar abnegação e infidelidade às exigências da Lei em 
relação ao próximo. Todo o ensino de Jesus nos últimos 3 capítulos está resumido nesta 
parábola. 
O contexto maior começa fazendo uma diferenciação entre a ótica ou prática dos 
fariseus e a forma de vida do reino que Jesus pregava. Desde pelo menos o capítulo 14, 
Jesus vem lançando uma série de críticas aos religiosos do seu dia. Com esta crítica, Jesus 
vem enfatizando o tipo de vida do reinar de Deus—a “vida das eternidades” —pelo seu 
caráter ou sua qualidade. No gráfico a seguir, pode-se ver algo da crítica colocada por 
Jesus em oposição aos líderes religiosos dos judeus do seu tempo. 
Como tem sido comentado em outra parte, a crítica de Jesus tem como alvo 
aqueles confiados demais do seu lugar à mesa no banquete escatológico. Em vez destes, 
aqueles que realmente chegam são os cegos, pobres e coxos. Aqueles presumidos pela 
sociedade estar presentes estão ausentes, dado as suas preocupações com outros assuntos. 
 24 
 
 
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João 3.16-21; 5.5-25: 
João lança que o homem “já está julgado”, mas Jesus veio para o livrar da 
condenação. “E o julgamento é este, que os homens amaram mais as trevas do que a luz, 
pois a suas obras eram más”. O julgamento e a condenação já estavam realizados e 
atuantes na humanidade, como também são até hoje. Não havia de se esperar a chegada 
de um dia de juízo, mas apenas a efetivação da sentença. No período antes da morte do 
indivíduo, porém, existe a possibilidade de ser inocentado por Cristo. Em outras 
passagens trata-se de um juízo vindouro, mas aqui de outra perspectiva, a qual trata o 
julgamento como fato já no passado. Esta temática será repetida em 5.24-25. 
Em João 5.5-14, Jesus vincula a cura do paralítico com questões de fé e pecado. 
Jesus não curou a todos, mas curou a este. Logo, a cura deste paralítico vincula-se com o 
ensino de Jesus referente ao morto ambulante. Já há condenação e juízo, o homem apenas 
está aguardando cumprir a sentença, mas existe a possibilidade de ser inocentado, mesmo 
que já tenha sido julgado culpado. 
Essa não é a única perspectiva bíblica sobre o julgamento, mas deve ser vista 
como corretiva a um conceito dogmático demais referente ao procedimento específico 
além-túmulo da realidade. A implicação desta passagem é que a figura popular do juízo 
é precisamente uma figura. Não é tanto um evento de acordo com a teologia popular. 
Enquanto prestar contas a Deus é uma realidade, a nossa definição de uma cena de corte 
é uma figura que simplesmente aponta à realidade do juízo divino. Mais propriamente, o 
que se espera é a sentença de Deus, pois o juízo já é realidade. 
Mateus 23.29-24.44: 
O capítulo 23 de Mateus fornece a base segundo a qual se pode compreender as 
palavras de Jesus no capítulo 24. Pela pergunta dos discípulos em Mateus 24.3, é óbvio 
que eles pensavam que as três coisas (destruição de Jerusalém, parousia de Jesus e fim do 
mundo) aconteceriam juntas. 
Guerras, fomes e terremotos citados por Jesus em Mateus 24 eram sinais 
comumente associados com a aproximação do “fim” na literatura apocalíptica judaica da 
época. Jesus diz que estas coisas não são sinais de nada! Diz que acontecerão, mas os 
discípulos não devem preocupar-se até verem a abominação desoladora predita por Joel. 
Muitos interpretam esta passagem como uma coletânea de ensinos dados por 
Jesus, não sendo necessariamente tão homogênea. Há, no entanto, uma lógica de 
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argumentação que indicaria um discurso direto e coerente, mantendo em vista as 
expectativas apocalípticas do dia e as três perguntas a serem respondidas por Jesus. 
Mateus 24.29-31 reflete a linguagem apocalíptica de Isaías 13.10, 34.4; e Ageu 
2.6109, como também de Joel 2.10, e da expressão de um comentário livre sobre Daniel 
7.8-27, 8.9-26, 9.24-27, e 11.21-12.13110. “O termo eleitos em Mateus 24 deve ser 
compreendido de acordo com o seu uso em outras partes das Escrituras, em que significa 
‘crentes’”. 
Mounce coloca em questão a referência do capítulo 24.3-31 à destruição de 
Jerusalém, considerando que a linguagem de vários versículos trata da parousia de Cristo. 
Mesmo assim, todos os sinais a serem vistos são enganosos, pois não remontam ao fim, 
a não ser o fim de Jerusalém. Os versículos 29-31 tratam da parousia de Jesus. Ao mesmo 
tempo, esse tratamento é dado a fim de esclarecer a questão de que os falsos cristos são 
exatamente isso—falsos. O enfoque da passagem não chega a tratar a parousia, mas faz 
referência em sentido de um excursus. Assim Mateus 24.23-28 trata a questão dos falsos 
cristos, mesmo que o versículo 27 especificamente menciona a parousia de 
Jesus. O tema é que os falsos cristos estavam para surgir. Para classificá-los 
como falsos, Mateus 24.27 explica que a parousia será um evento universalmente visível 
e reconhecível. 
Propõe-se a seguinte divisão temática para a passagem: 
23.1-39 Censura aos escribas e fariseus 
23.37-24.2 Jesus fala sobre a destruição de Jerusalém e do templo 
24.3 Perguntas dos discípulos 
24.4-28 Resposta: Destruição de Jerusalém e do templo Os judeus haviam 
parado de oferecer sacrifícios a YHWH (hwhy) em favor do Imperador, assim rompendo 
o trato que tinham com Roma. Esse trato foi a forma encontrada para apaziguar as 
relações deles com Roma: os judeus sacrificavam em prol do império, o que os preservava 
da necessidade de sacrificar aos deuses romanos e à imagem do imperador.Buscando a 
resolução do impasse dos judeus nos anos finais da década de 60, no ano 70 Tito entrou 
em Jerusalém para fazer o sacrifício mandatório, em resposta ao rompimento do acerto 
com Roma. O templo foi queimado por completo em reação por parte dos judeus ao 
procedimento Romano em oferecer sacrifício a César sobre o altar do Templo. Em 
consequência da revolta, toda Jerusalém foi destruída. A destruição deu-se tão 
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completamente que entre os anos 302 e 312, o governador Romano da Palestina nem 
havia ouvido falar de Jerusalém. 
Conforme Josefo descreve o caso, não era intenção de Roma destruir Jerusalém, 
mas tornou-se realidade em consequência da reação judaica em oposição ao sacrifício 
feito sobre o altar. “[Os romanos] tiveram durante todo o tempo da guerra grande 
misericórdia do pobre povo, ao qual era proibido fazer o que quisesse por aqueles [judeus] 
tumultuadores e sediciosos… por não [querer] destruir a cidade [de Jerusalém], somente 
para que os que eram autores de tal grande guerra tivessem tempo para se arrependerem”. 
O império enfrentava guerras e dificuldades de todos os lados por volta da época 
da destruição de Jerusalém. A introdução descritiva histórica de Tácito é bem ilustrativa: 
“Começo a obra de escrever sobre uma época que é rica em tragédias, sangrenta por causa 
de batalhas, dilacerada por revoltas”. 
Houve terremotos na Ásia nos anos 60. A morte de Nero em 68 foi seguida por 
um período de muita instabilidade, mais guerras e até três imperadores num período de 
dois anos. Josefo declarou que “o universo estava cheio de discórdias depois da morte de 
Nero; havia muitos que, por ocasião dos tempos e de tão grandes revoltas, pretendiam 
agarrar para si o império; e os exércitos todos, pela esperança de maior lucro desejavam 
tumultuar tudo”. 
Nas palavras de Jesus, não existe sinal nenhum referente ao fim do mundo nem 
da parousia. Jesus mesmo diz aqui o que Paulo repete em 1ª Tessalonicenses, e João em 
Apocalipse 16.15, que ele virá como o ladrão inesperado durante a noite. Jesus diz 
propriamente que nem ele sabe quando será essa vinda. Como, então, poderia ele dar um 
sinal da vinda cujo tempo desconhecia? 
O mais perto que Jesus chega a declarar um sinal do fim na sua declaração é que 
o evangelho será pregado em todo o mundo. Muito se tem feito da frase aqui relatada, 
bem como em Marcos. Alguns comentários estão em ordem, entretanto, para manter as 
palavras de Jesus no contexto dentro do qual os seus discípulos as compreenderam. 
“…Durante os séculos que precederam ao advento de Jesus, houve um número 
cada vez maior de judeus que viviam fora da Palestina”126, o que se chama de Diáspora 
ou Dispersão. “…Já no século primeiro as colônias judaicas em Roma e em Alexandria 
eram numerosíssimas. Em quase todas as cidades do Mediterrâneo oriental havia pelo 
menos uma sinagoga”. Logo, em Atos 2, é apresentado que o evangelho foi pregado a 
todas as nações (etnias—e[qnh) no dia de Pentecostes, entendendo que estes judeus 
 27 
 
 
FACULDADE TEOLÓGICA NACIONAL 
 
espalhados levaram o evangelho de volta para as suas cidades, dispersos por todo o mundo 
conhecido. 
Mateus 25.14-46: 
A apresentação aqui do juízo não deve ser vista como uma figura completa de 
todo aspecto da salvação, pois tem como objetivo ressaltar a evidência de que o ser 
humano será julgado. Não se deve pensar aqui em dinheiro, mas em potencial a ser 
aplicado sob o reinar de Deus. Alguns interpretam a passagem para dizer que a salvação 
é merecida pelas obras, mas deve-se lembrar a implicação aqui de que todos somos servos 
de Deus. Nesse contexto, Jesus descreve a realidade da diferença de atitudes entre fiéis e 
infiéis. Graça é tão importante em Mateus, como em qualquer outro texto neo 
testamentário. Mesmo assim, deve-se lembrar que todos são vistos aqui como servos de 
Deus—uns são fiéis, outros são infiéis. Tal como na parábola dos lavradores maus, todos 
eram servos, mesmo aqueles que foram depostos dos seus cargos. Não vem ao caso tratar 
a forma de alcançar a salvação, muito menos salvação mediante obras, mas, como Jesus 
já designara no final de capítulo 24, o infiel mostra-se infiel por suas ações, enquanto o 
fiel pratica fidelidade. As ações revelam o caráter da pessoa e a qualidade do seu 
relacionamento com Deus. 
A segunda parábola aqui reflete outra vez conceitos de Mateus 16.27, onde cada 
qual recebe juízo ou recompensa de acordo com a sua atuação no reino. O ministério das 
ovelhas obviamente não é uma ação com fins de alcançar mérito, pois não se percebe o 
mérito de suas ações. É simplesmente uma forma natural de viver o evangelho de Cristo. 
Interessante no tratamento da parábola dos talentos, é que o talento era uma 
medida de peso, equivalente a uns vinte quilos. Provavelmente refere-se a prata ou ouro, 
mas a designação não é específica nesse sentido. Se fosse um talento de ouro, o preço de 
mercado atual colocaria o talento no valor de mais ou menos 3.100 salários mínimos 
mensais. 
Ao que fora fiel com os cinco talentos, no entanto, é designado como tendo sido 
fiel em pouco (15.500 salários, o que seria em 2002 uns R$3,1 milhões, dobrado em R$6,2 
milhões)—agora este será colocado sobre muito! Aqueles dez talentos não são de muito 
valor, mas o Senhor colocará este servo fiel sobre muito mais—o suficiente para que ele 
veja a insignificância do primeiro encargo. Uma implicação desta parábola é de que o céu 
não é uma “aposentadoria legal”, como no conceito de muitos. É a oportunidade de 
continuar a servir ao Senhor de forma ainda mais significativa. Em nenhuma instância 
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essa vivência é para aqueles que não querem servir—é para aqueles que querem ser úteis 
no reino de Deus e que tem mostrado tal por meio de serviço prestado. 
1ª João 2.18-4.6: 
“É a última hora”. Para João, não existe nenhum intervalo antes dessa última 
hora chegar. Ela já estava presente para ele no primeiro século. 
O judeu dividia o tempo em duas etapas—antes e depois do Messias. Logo, após 
a ressurreição de Jesus os cristãos já presenciavam os últimos tempos ou a última hora—
essa segunda etapa do tempo. 
Jesus modificou a expectativa judaica, pois não estabeleceu um reino político, 
mas já começara o seu reinar nos cristãos do primeiro século. Agora o cristão anela uma 
terceira etapa de tempo, marcado pela vinda em glória (parousia) de Jesus. 
O Anti-Cristo já está presente—na época de João! Realmente, o texto trata de 
“anti-cristos”, ou seja, muitos que atuam em luta contra Cristo. Não se trata aqui de um 
anti-cristo singular, mas de muitos anti-cristos, já na época do próprio João. 
Conseqüentemente, a sua descrição do tempo em termos de ser a última hora já entrou 
em vigor há quase dois mil anos atrás. Já é a última hora, como vem sendo desde o 
primeiro século. Quer dizer, já vivemos na época após a vinda do Cristo, esperando a sua 
vinda em glória. 
Ao tratar o seu concepto do anticristo, João cria um elo em toda a passagem entre 
o ser inimigo de Deus, praticar o pecado e faltar em amar ao próximo. Para João, os 
gnósticos eram anticristos por não amarem o próximo de acordo com o mandamento de 
Jesus. Aqui não existe nenhuma definição de um personagem em particular, mas uma 
atitude de viver em conta dos princípios do amor de Jesus Cristo e o evangelho de Deus. 
Contrariar os princípios do evangelho é viver em conta de Cristo, colocando-se nessa 
categoria de anticristo. João afirma que não há mistério escondido para os fiéis, pois o 
evangelho já fora pregado a eles. 
Essa declaração contradiz diretamente os ensinos gnósticos prevalentes já no 
primeiro século.Tal grupo ensinava a necessidade de aceitar uma doutrina escondida e 
especial, e que a salvação era através de um correto conhecimento da doutrina escondida. 
João responde que não há novidade, mas apenas a mensagem gloriosa do evangelho 
eterno de Jesus Cristo. Não há segredos a serem descobertos, mas uma mensagem aberta 
para todos que quiserem assumir o compromisso com Cristo. Logo, em termos 
escatológicos, também não há ensinos secretos a serem decifrados. A mensagem do 
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evangelho é clara—ninguém sabe quando Jesus virá em glória, mas é verdade que virá. 
Ninguém pode discernir os tempos, predizendo os eventos futuros escatológicos, mas 
pode-se saber do próprio evangelho as verdades referentes àqueles eventos. Não compete 
ao cristão conhecer os detalhes, mas compete a ele conhecer o Salvador e obedecê-lo em 
fidelidade. 
1ª Tessalonicenses 4.13-5.11; 2ª Tessalonicenses 2.1-3.5: 
O termo “dormir” é comumente usado como um eufemismo para morte, sendo 
este o uso aqui135. Deve-se tomar cuidado para respeitar esse uso do termo. 1ª Reis 2.10 
diz que Davi dormiu com os seus pais e foi sepultado, 1ª Reis 11.43 diz que Salomão 
dormiu com os seus pais e foi sepultado. 
De 1ª Reis a 2ª Crônicas, existem 36 ocorrências deste uso do termo dormir. Atos 
7.60 diz que Estevão adormeceu, mas 8.1 diz que Saulo consentia na sua morte! É também 
neste emprego do termo que Jesus o usa em João 11.11-14, mesmo que os próprios 
discípulos não tivessem compreendido de início. 
Aqui em 1a Tessalonicenses 4.13-14, Paulo contrapõe a esperança do cristão em 
contraste à falta de esperança no mundo pagão. Para o cristão e o judeu havia esperança 
de ressurreição, mas então não havia entre os pagãos136. Aqueles que estavam "em 
Cristo" antes de suas mortes, continuam "em Cristo" após a mesma. 
Deve-se lembrar que a expectativa da ressurreição na Bíblia era muitas vezes 
uma ressurreição física. 
Muitos pensavam num retorno a esta terra ou, como indica Apocalipsis 21, uma 
nova terra de alguma forma semelhante a esta. Ao encontrar-se com Cristo nas nuvens, 
Paulo aparentemente esperava baixar com Cristo de forma semelhante a Atos 1:11. As 
especulações cristãs referentes à vida no céu tem sofrido um choque em decorrência da 
nossa apreciação científica de que não haver nenhum lugar físico acima das nuvens onde 
Deus mora. Não temos uma boa apreciação da nova metafísica necessária para 
compreender a realidade celestial. Somente sabemos dizer que Deus nos espera e 
viveremos com Cristo eternamente ao outro lado da morte, sem que preocupações 
metafísicas ou geográficas interfiram na discussão. 
Paulo faz referência ao “homem de perdição” aqui, a única vez na Bíblia que se 
usa a frase. É semelhante ao uso do termo “anticristo” nas epístolas de João e Apocalipse. 
Paulo escreve antes da destruição de Jerusalém, e a maior parte dos comentários aqui 
parece referir ao evento da desolação do templo. Nesse sentido, um poderia identificar 
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esse “homem de perdição” com Cesar, trabalhando por meio de Tito y outros para 
introduzir a sua imagem ao templo de Iavé. 
A intenção de Paulo era lembrar aos crentes da esperança do evangelho. Esta 
esperança era para eles mesmos, assim como para oferecê-los consolo referente àqueles 
quem morreram como crentes. 
Fomos resgatados da ira para viver como agentes do reinado de Deus na terra. 
Agora antecipamos a realidade futura do reinado de Deus ao outro lado da morte, assim 
como alguma expressão mais plena quando da parousia de Jesus. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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REFERÊNCIAS 
Christopher B. Harbin

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