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1 MAÍRA MARCHI GOMES A CONTRIBUIÇÃO DA PSICOLOGIA POLICIAL AO GERENCIAMENTO DE SITUAÇÕES CRÍTICAS: Um diálogo entre a Psicanálise e a Polícia Monografia apresentada ao Curso de Pós- Graduação Lato-Sensu em Psicologia Jurídica, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção ao título de Especialista. Orientadora: Prof. Ms. Shirley Valera Rialto Sesarino CURITIBA 2007 2 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ MAÍRA MARCHI GOMES A CONTRIBUIÇÃO DA PSICOLOGIA POLICIAL AO GERENCIAMENTO DE SITUAÇÕES CRÍTICAS: Um diálogo entre a Psicanálise e a Polícia CURITIBA 2007 3 Às colegas de curso, pelo quê a feminilidade trouxe em momento tão ímpar de minha vida. 4 AGRADECIMENTOS Ao Coordenador-Geral de Informação e Inteligência Penitenciária do DEPEN-MJ, Angelo Oliveira Salignac, por confiar que posso mais do que acredito Ao Investigador Policial Cláudio Lopes Vianna, pelos despretensiosos e tão bem- sucedidos diálogos Ao Delegado de Polícia Cláudio Monteiro, pela esperança, coragem e amor imprescindíveis à transposição de obstáculos Ao Inspetor de Polícia Edson Volpato Dutra, pelo amor à causa Ao Investigador Policial João Luis de Souza, pela coragem de dirigir o olhar à verdade Aos Servidores do Núcleo de Interceptação e Suporte à Investigação, pelo endurecimento e ternura Ao Delegado de Polícia Renato José Hendges, pela capacidade de ensinar e aprender e pela segurança e serenidade diárias Ao Delegado de Polícia Ricardo Lemos Thomé, pelo reconhecimento e disponibilidade 5 SUMÁRIO INTRODUÇÃO.......................................................... ...................................................6 1 NOÇÕES POLICIAIS RELATIVAS AS SITUAÇÕES DE CRISE.............................8 1.1 Noção De Crise......................................................................................................8 1.2 Noções Policiais Relativas As Situações De Crise...............................................9 1.3 A Polícia E O Gerenciamento De Situações De Crise........................................12 2 A UTILIZAÇÃO DE CONCEITOS DE ORDEM PSICOLÓGICA NO GERENCIAMENTO DE SITUAÇÕES DE CRISE EM CONTEXTO POLICIAL.........15 1 “DO ATO À PALAVRA” OU “DA VIOLÊNCIA AO SÍMBOLO”...........................28 2 A VIOLÊNCIA QUE A PALAVRA PODE GUARDAR...........................................33 3 O GERENCIAMENTO DE CRISE ENQUANTO SUSTENTAÇÃO DA FUNÇÃO PATERNA................................................................... ...............................................39 4 DEFINIÇÃO PSICANALÍTICA DE CRIME............................................................45 4.1 O CRIMINOSO, A PRECARIEDADE DO SÍMBOLO E O APELO À LEI CONCRETA...............................................................................................................45 4.1.1 O Criminoso E A Ausência Do Pai Simbólico....................................................45 4.1.2 O Crime Enquanto Apelo À Interdição Concreta...............................................49 4.2 AGRESSIVIDADE, VIOLÊNCIA E/OU AMOR.....................................................52 4.2.1 Fundamentos Narcísicos Da Violência E Da Criminalidade..............................52 4.2.2 Quando O Crime É O Destino Da Agressividade..............................................54 4.2.3 Constituição Agressiva Do Humano.................................................................60 5 É-SE O QUE SE ODEIA: CONSIDERAÇÕES SOBRE INTERVENÇÕES POLICIAIS EM SITUAÇÕES CRÍTICAS...................................................................70 6 ASPECTOS SOCIAIS QUE CONVIDAM À VIOLÊNCIA POLICIAL.....................73 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................... ................................77 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................79 6 INTRODUÇÃO A inserção do cargo de Psicólogo Policial na Polícia Civil de Santa Catarina deu-se em 1986, quando ocorreu o primeiro concurso público para o referido cargo. Inicialmente, estes profissionais foram contratados para a realização de avaliação psicológica junto aos candidatos à Carteira de Habilitação. Gradativamente, alguns dos setenta psicólogos nomeados naquele concurso sugeriram propostas de intervenção em outros órgãos da Polícia Civil. Atualmente, os Psicólogos Policiais de Santa Catarina são distribuídos nos seguintes órgãos da Secretaria de Segurança Pública: Academia da Polícia Civil (Coordenadoria de Assuntos Pedagógicos e Setor de Assessoramento Psicológico), Delegacias comuns, Delegacias Regionais, Delegacia de Proteção à Criança, ao Adolescente e à Mulher, Departamento de Trânsito, Instituto Médico Legal, Penitenciária de Florianópolis. A autora é a primeira representante do cargo junto a Diretoria Estadual de Investigações Criminais. Tal Diretoria é composta por quatro Divisões: a Anti- Seqüestro, a de Repressão a Entorpecentes, a de Furtos e Roubos, a de Furtos e Roubos de Veículos e a de Defraudações. Em todas elas, mas principalmente na primeira, ainda que indiretamente, associam-se casos de homicídios. A partir da atuação da autora na Diretoria Estadual de Investigações Criminais, constatou-se que o Gerenciamento de Situações Críticas poderia ser uma área de atuação do Psicólogo juntamente à Polícia. Seria uma proposta de intervenção condizente não apenas com a prestação de serviços no local onde atua, mas também com o trajeto histórico que a Psicologia Policial tem construído na Polícia Civil, marcado por iniciativas pessoais e inovadoras. A hipótese central da presente monografia é: é possível dispor-se de alguns fundamentos psicanalíticos como contribuição ao Gerenciamento de Crise realizado pela Polícia?. Assim sendo, a pesquisa a que o presente trabalho refere-se terá por objetivo estabelecer um diálogo inicial entre os fundamentos psicanalíticos (porque é o constructo teórico-metodológico a respeito da psique humana com o qual a autora 7 melhor se identifica) e alguns conceitos encontrados na literatura policial a respeito destas Situações. Pretende-se, ao final, demarcar que o discurso policial não precisa estar, por si só, dissociado do discurso psicanalítico. Isto poderá ocorrer apenas se os agentes do Gerenciamento de Crise orientarem-se por outros parâmetros que não os técnicos; quais sejam: os dispostos na literatura policial. Em outros termos, isto poderá ocorrer, por exemplo, se os agentes dirigirem sua conduta por conflitos de ordem psíquica inconscientes. Pretende-se, também, propor modalidades de inserção do Psicólogo Policial que se utilize de dispositivos psicanalíticos no Gerenciamento de Situações Críticas. Metodologicamente, pela própria natureza da pesquisa, proceder-se-á com a análise bibliográfica. Quanto à estruturação do trabalho, será dividido em seis grandes capítulos. O primeiro, denominado “Do ato à palavra” ou “Da violência ao símbolo”, versará a respeito da compreensão policial a respeito da operação que fundamenta o Gerenciamento de Situações Críticas: cessar um ato por meio da palavra. O segundo, “A violência que a palavra pode guardar”, focar-se-á na descrição das situações em que a palavra não tem por efeito a contenção do ato, bem como na discussão da postura policial esperada em Situações Críticas desta natureza. O terceiro capítulo, intitulado “O gerenciamento de Crise enquanto sustentação da função paterna”, por sua vez, abordará as noções policiais, pertinentes ao Gerenciamento de Situações Críticas, relacionadas à noção de autoridade e que podem ser articuladas com a noção psicanalítica de função paterna. O quarto capítulo, “Definição psicanalítica de crime”, será dividido em sub-capítulos, por sua vez também divididos emalguns tópicos. O sub-capítulo “O criminoso, a precariedade do símbolo e o apelo à lei concreta” será sub-dividido em dois: “O criminoso e a ausência do pai simbólico” e “O crime enquanto apelo à interdição concreta”, que discutirão a respeito de como as instituições de direito podem funcionar terapeuticamente como pai imaginário aos sujeitos que cometem atos criminosos quando os reprimem concretamente, posto que os mesmos não possuem inscritos o Pai Simbólico, que os permitiria introjetar os limites. Quanto ao sup-capítulo “Agressividade, violência e/ou amor”, será sub- dividido nos seguintes tópicos: “Fundamentos narcísicos da criminalidade”, que 8 aproximará o crime do narcisismo e o narcisismo da agressividade; “Quando o crime é o destino da agressividade”, que discutirá as condições que levam alguns humanos a responderem à agressividade que lhes é inerente por meio de um ato criminoso; “Constituição agressiva do humano”, que aprofundará a compreensão de que a agressividade é constitucional ao humano, de forma a, inclusive, enfatizar os efeitos iatrogênicos de Policiais negarem, racionalizarem e/ou projetarem suas pulsões agressivas. Já o capítulo “É-se o que se odeia: considerações sobre intervenções policiais em situações críticas”, abordará explicitamente os efeitos inexistentes e/ou iatrogênicos de intervenções policiais cujos autores neguem, racionalizem e/ou projetem suas pulsões agressivas. Em se tratando do último capítulo, intitulado “Aspectos sociais que convidam à violência policial”, procurará apontar que a análise dos fenômenos do crime e da criminalidade não pode recair apenas no sujeito que cometeu o ato criminoso. Isto porque ele se encontra inserido em um Outro, que fala através dele. Abordando-se as características deste Outro contemporâneo, poder-se-á, igualmente, ampliar a análise das posturas dos Policias frente ao Gerenciamento de Situações Críticas, entendendo-as como submetidas a outros ditames que não os ditados por suas subjetividades. Antes de se iniciar algumas considerações sobre a pertinência de um trabalho desta natureza, o que será feito a partir de referências à ênfase que a literatura policial atribui a conceitos de ordem psicológica, apresentar-se-á a definição operacional de alguns termos que serão correntemente utilizados neste projeto de pesquisa (“Crise”, “Situação de Crise” e “Gerenciamento de Crise”), bem como justificativas da pertinência de uma pesquisa que trate destes conceitos, por si só (independentemente, portanto, da articulação com fundamentos psicanalíticos), ao contexto policial. 1 NOÇÕES POLICIAIS FUNDAMENTAIS AO GERENCIAMENTO DE CRISE 1.1 Noção De Crise “Crise” é um termo utilizado em inúmeras áreas de conhecimento; além disto, em uma mesma área, ela pode ser compreendida de diversas formas. Partindo, 9 particularmente, para o que a literatura policial diz a respeito do Gerenciamento de Crise, é que se pode definir o que no presente trabalho será entendido por crise. Segundo THOMÉ (1998, p.23), “A crise é uma mudança brusca que se produz no estado de coisas (status quo), com teor manifestamente violento, repentino e breve, traduzindo-se em um momento perigoso ou difícil de um processo do qual deve emergir uma solução”. Semelhanças podem ser encontradas nas características de Crise apontadas pela ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA (1991, p.03): 1. Imprevisibilidade; 2. Compressão de tempo (urgência); 3. Ameaça de vida; e 4. Necessidade de: a) Postura organizacional não-rotineira; b) Planejamento analítico especial e capacidade de implementação; e c) Considerações legais especiais É pertinente problematizar tais características, principalmente no sentido de que elas indicam que “de acordo com a doutrina do FBI, a ameaça de vida configura-se como componente do evento crítico, mesmo quando a vida em risco é a do próprio indivíduo da crise” (ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991, p.03) (grifo do autor). Já conforme a Academia Nacional do FBI (apud ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991, p.03), crise é “UM EVENTO OU SITUAÇÃO CRUCIAL, QUE EXIGE UMA RESPOSTA ESPECIAL DA POLÍCIA, A FIM DE ASSEGURAR UMA SOLUÇÃO ACEITÁVEL” (grifo do autor). Como se constata na passagem acima, não apenas no conteúdo da citação, mas no destaque que o autor realiza, a responsabilidade maior do Gerenciamento de Situações Críticas é da Polícia. Logo, é uma temática que deve ser significativamente discutida das mais diversas formas, nos mais diversos ambientes e pelos mais diversos agentes desta instituição. 1.2 Noções Policiais Relativas As Situações De Crise Pode-se entender, a propósito, que é precisamente o preparo do policial para lidar com Situações de Crise que o habilitará a exercer a função de policial, independentemente, então, se este exercício dá-se numa situação propriamente de 10 Gerenciamento de Crise. Isto porque as situações em que a Polícia é convocada a se apresentar são, inerentemente, Situações Críticas. É este o entendimento de alguns autores, como, por exemplo, PAIXÃO (s/d), que fala que: Na atividade policial, a aplicação deve ser a principal preocupação do instrutor. O conteúdo teórico puro tem pouco valor na maioria das situações críticas vividas constantemente pelo policial nas ruas. Isto porque o policial é exigido a empregar o seu conhecimento em condições desfavoráveis, sob stress, em tempo comprimido. Esta capacidade de julgamento, de decidir em situações críticas (quando se está com uma arma em punho, e vidas estão em jogo, toda situação é crítica), tem demonstrado ser mais importante até do que o conhecimento de técnicas e a disponibilidade de meios. Nos incidentes de uso da força por policiais, a maior parte dos erros é provocada não pela falta de habilidade do policial, mas pela seleção incorreta dos meios ou pela escolha do momento inoportuno para se agir. Olhando a grosso modo, cada ocorrência enfrentada pelo policial é uma pequena crise Deste modo, torna-se evidente que discorrer sobre as noções policiais para o Gerenciamento de Crise se impõe e se faz imprescindível para o desenvolvimento deste trabalho. Sobre as características das Situações Críticas, sabe-se que elas: possuem características bem definidas, que podem ajudar na formação da percepção e conhecimento da idéia: a) é possível imaginar o evento, mas ele acontece sem previsão, tendo sido alimentado pelo acaso, desleixo ou negligência; b) a situação é violenta, transitória e estressante: existem vidas ameaçadas, direta ou indiretamente, há dificuldade na compreensão das informações e os meios de comunicação social transformam-se em agentes fiscalizadores; c) o contexto exige uma resposta igualmente rápida e especial dos órgãos, adotando-se plano de trabalho distinto do habitual (THOMÉ, 1998, p.23-24) Na definição do GOVERNO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (s/d, p.31), “São situações cujas características de risco exigem, além de uma intervenção imediata de profissionais treinados com equipamentos adequados, uma postura organizacional não rotineira para a coordenação e o gerenciamento integrados das ações de resposta, mesmo que não caracterizem um desastre” (grifo do autor). A partir destas características, pode-se exemplificar tais situações com vários casos, como acidentes com múltiplas vítimas, evacuação de comunidades, incêndios florestais, acidentes com produtos perigosos e crises policiais com reféns (GOVERNO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, s/d); porém, os mais típicos e ilustrativos seriam a extorsão mediante seqüestro e roubo à instituição bancária por meio de tomada de refém. 11 É isto o que se encontra na seguinte passagem: “As ocorrências policiais envolvendo a extorsão mediante seqüestro ou roubo à instituição bancária com tomada de refém, são os mais puros exemplos decrise (ou do estabelecimento de uma situação crítica)” (THOMÉ, 1998, p.24). Além disso, um outro aspecto que pode ser considerado para a definição das Situações de Crise é a sua gravidade. Fala-nos THOMÉ (1998), a este respeito, que uma das funções do Gerente da Crise1 é detectar o grau de risco da situação, permitindo que se compreenda a dimensão da crise, bem como que se analise os materiais, equipamentos, recursos financeiros e humanos que serão utilizados no processo. Há diversos sistemas de classificação da gravidade da situação de crise. E, ainda THOMÉ (1998, p.35), propõe os seguintes graus: a) Altíssimo risco, incluindo as situações criminosas públicas e sem reféns (isto é, o evento ocorreu, a população está vendo, não há reféns e exige-se solução. Por exemplo, suicida que sobe no telhado de um prédio; cumprimento de uma modalidade de mandado de prisão, onde aquele que vai ser preso está armado e não quer se entregar (...), o exemplo do roubo a banco, onde o assaltante é surpreendido e não tem reféns etc). b) Ameaça extraordinária, quando a dimensão do evento supera a capacidade operacional momentânea dos órgãos policiais, que devem buscar a cooperação entre si para a solução da situação crítica. c) Ameaça à ordem, como mais abrangente às situações oriundas de conflitos sociais marcantes e presentes na sociedade brasileira e que exigem solução profissional. A resposta às situações críticas assim classificadas serão idênticas no que tange à aplicabilidade das técnicas de gerenciamento de situações críticas, diferenciando-se na utilização de recursos financeiros e materiais empregados Conforme a ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA (1991), a diagnose e a correlata classificação do grau de risco ou ameaça depende de vários fatores, que por sua vez são obtidos a partir dos “elementos essenciais de informação”: bandidos, reféns, objetivo (ou ponto crítico) e armas. Dentre tais fatores, pode-se considerar: a) Nos BANDIDOS: seu número, sua motivação (política, religiosa, pecuniária, etc.), seu estado mental, sua habilidade no manuseio de armas, sua experiência anterior em casos semelhantes, etc.; b) Nos REFÉNS: seu número, sua idade, sua condição física (inclusive se estão ou não feridos), sua localização no ponto crítico, sua proeminência ou relevância social, etc.; 1 Sobre a função de Gerente da Crise, discorrer-se-á mais detalhadamente no capítulo “O Gerenciamento de Crise enquanto Gerenciamento da Função Paterna”. 12 c) No OBJETIVO (ou PONTO CRÍTICO): sua localização, seu tamanho, sua vulnerabilidade, suas peculiaridades (se é um edifício, uma aeronave ou um navio), as condições do terreno que o circunda, as condições do tempo no local, etc.; e d) Nas ARMAS: sua quantidade, tipo, letalidade, localização no ponto crítico, etc. (grifo do autor) As fontes de informação têm, então, papel fundamental para a diagnose e classificação da crise. FRANCO e CRUZ et al. (2002) citam algumas e, ainda que não se refiram posteriormente aos dados delas provindos que dariam suporte para uma classificação da gravidade da Situação Crítica, merecem aqui serem citadas. Seriam estas, para estes autores, as principais fontes de informação: reféns liberados, negociadores, atiradores táticos, documentos (mapas, fotos, etc.), investigações, mídia, ações táticas de reconhecimento e policiais que iniciaram a ação. É pertinente considerar, como complemento à discussão a respeito da classificação da gravidade das Situações de Crise, que a cada diferente nível de ameaça, a Polícia deve responder de forma também diferenciada, sendo um norteador essencial que o nível de resposta suba gradativamente na escala hierárquica da entidade, e de forma diretamente proporcional ao crescimento do vulto da Crise. Os níveis de resposta relativos a cada grau de risco seriam: - NÍVEL UM – A crise pode ser debelada com RECURSOS LOCAIS. - NÍVEL DOIS – A solução da crise exige RECURSOS LOCAIS ESPECIALIZADOS (Emprego de “SWAT”). - NÍVEL TRÊS – A crise exige RECURSOS LOCAIS ESPECIALIZADOS e também RECURSOS DO QG. - NÍVEL QUATRO – A solução da crise requer o emprego dos RECURSOS DO NÍVEL TRÊS e também RECURSOS EXÓGENOS (grifo do autor) A situação de crise, em si, já foi, ainda que brevemente, definida. Tão importante quanto tal definição é a definição do que seja um Gerenciamento desta crise. 1.3 A Polícia E O Gerenciamento De Situações De Crise Correlata à necessidade de o contexto policial, em sua forma mais ampla possível, abordar a noção de crise, encontra-se a necessidade que o mesmo contexto discuta os manejos possíveis e de sua responsabilidade das Situações Críticas. 13 SOMZAL (s/d) diz, ao tratar dos efeitos que as ações policiais podem trazer mesmo em seu exercício ordinário, da importância do preparo policial para manejar situações desta natureza: Nas situações onde se faz necessária a intervenção da Polícia, o surgimento de uma crise é bastante provável, principalmente se ela surpreende um crime em andamento, ocorrendo situações onde pessoas são tomadas como reféns, criando um impasse e colocando vidas em risco. Neste momento estão em jogo dois interesses opostos ou entendimentos diversos, podendo dizer-se que há um evento crucial, e para que ele não tenha desdobramentos indesejáveis, deve ser negociado. Não se trata de verificar se as posições assumidas são legais ou éticas. Trata-se de encarar como um fato que não apresenta uma solução aparente ou imediata A Academia Nacional do FBI (apud ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991, p.04), ao definir Gerenciamento de Crises, parece orientar aos envolvidos sobre as ações que devem tomar para que o mesmo se efetive. Em seus termos: “GERENCIAMENTO DE CRISES É O PROCESSO DE IDENTIFICAR, OBTER E APLICAR OS RECURSOS NECESSÁRIOS À ANTECIPAÇÃO, PREVENÇÃO E RESOLUÇÃO DE UMA CRISE” (grifo do autor). Também pode-se remeter aos termos de THOMÉ (1998, p.32), que diz: O gerenciamento do evento, basicamente: a) tem a exata conotação de dirigir e regular a crise, possibilitando que sejam convergentes todos os pontos surgidos durante o processo; b) torna realidade coletiva todas as maneiras de pensar que surgem durante o episódio; c) considera os aspectos legais presentes para justificar a ação policial; d) executa planejamento com o superior objetivo e interesse de preservar a vida Como se constata, o autor define tanto o objetivo maior do Gerenciamento (a preservação da vida), como a metodologia dele decorrente. É o mesmo que faz, mais detalhadamente, na seguinte passagem: A doutrina adotada pelos argentinos, pressupõe uma filosofia calcada no princípio de que a gestão deverá ter em vista o objetivo de salvar vidas e, secundariamente, prender os causadores do evento e preservar a propriedade, tempo e dinheiro. Consideram quatro componentes para a gestão: a planificação, a organização, a direção e o controle. Na planificação, a Gestão deverá prever os problemas, incorporar os objetivos, programar sessões de capacitação e de informação, dispor de recursos para alcançar os objetivos e estabelecer procedimentos uniformes de atuação. Na organização, há de se estruturar o trabalho em tarefas logicamente agrupadas, e delegar-se competências. Na direção, primar pelas decisões de grupo, promover a livre comunicação de idéias, motivar e manter o nível de moral alto. Finalmente, no aspecto de controle, a Gestão deverá utilizar critérios previamente definidos, medir, declarar e registrar o progresso na situação crítica e corrigir construtivamente os rumos do trabalho (THOMÉ, 1998, p.36) 14 Passa-se, a partir deste momento, a discorrer a propósito dos papéis e funções exercidos no Gerenciamento de Crise2, sobre o que cabe dizer, desde o momento, que a definição precisa dos papéis e as funções exercidas no Gerenciamento de Crise são de suma importância para o bom desenlaceda situação, no sentido de preservar a vida dos envolvidos. Tão logo uma ocorrência policial é classificada como situação crítica, os Órgãos da Segurança Pública passam a se relacionar, entre si, da seguinte forma: Normalmente, na sua função de policiamento ostensivo, a polícia militar é a primeira a tomar conhecimento do evento. Neste momento é essencial que o policiamento ou a autoridade que manteve o primeiro contato compreenda quatro atitudes operacionais: a) É fundamental que a situação crítica seja contida, mantendo-se no ponto onde está e, preferencialmente e se possível, que seja reduzida em termos proporcionais; b) Paralelamente, deve ser providenciado um primeiro isolamento, evitando-se o contato dos causadores do evento com a comunidade externa à situação. Este isolamento é físico, com a utilização de homens, cordas, cavaletes, anteparos de madeira, viaturas etc; c) Suprimir o fornecimento de água, luz, telefone. Pelas informações colhidas, o aparato policial, através da chefia, verificará, com extrema rapidez, qual a estrutura que os causadores do evento têm para suportar a situação, restringindo-a o máximo possível para as circunstâncias. Nesta primeira fase, os causadores do evento não podem contar com nada que possa facilitar-lhes a posição. A energia elétrica e a água devem ser cortadas para facilitar as primeiras conversas pelo Grupo de Negociação. Nenhum alimento deve ser fornecido de imediato e o telefone será desligado, estabelecendo-se, após e pela área técnica, uma única linha de transmissão. Esta posição objetiva que os causadores do evento sejam forçados a aceitarem o diálogo e, iniciando-o, tenham o que pedir e não apenas ameaçar os reféns. Por outro lado, o Grupo de Negociação terá o que conceder de imediato, sem perder o controle sobre os acontecimentos, já que água, luz e alimentação serão naturalmente fornecidos; d) Iniciar diálogo com os causadores do evento, visando à busca de informações mínimas e à diminuição da tensão dos primeiros momentos, evitando conceder qualquer coisa (THOMÉ, 1998, p.36-37) A noção de “cenário” aborda, também, a questão dos papéis e funções inerentes ao Gerenciamento de Crise. É o que se evidencia, por exemplo, na descrição de THOMÉ (1998, p.40-41): A observação do contexto da crise permitirá que o condutor do processo determine a integração de áreas, com objetivo de controlá-las através dos Supervisores. Em princípio, são necessárias três áreas de atuação que formarão, ao final, o cenário: * área crítica – é aquela que contém o objetivo do gerenciamento, isto é, onde estão diretamente envolvidos os agentes causadores do evento. É a área definida e que envolve o ponto físico ou ponto crítico, sendo este o local onde efetivamente estão os criminosos. A esta área somente terá acesso, mediante negociação, o pessoal especializado (médicos, enfermeiros, etc) ou o pessoal de logística (fornecimento de alimentação, remédios, roupas, 2 Esta será uma apresentação sintética de tais papéis e funções. Uma apresentação restrita ao propósito deste item: o de descrever o Gerenciamento de Situações Críticas. Melhor detalhamento será feito em itens posteriores. 15 etc) e, para a solução definitiva, o Grupo Tático. A área crítica compreende toda a extensão desde o ponto físico onde estão os causadores do evento até o cerco interno. * área restrita – é aquela estabelecida para a disposição do Escritório, do Grupo de Negociação e do Grupo Tático e possui extensão fixada até o cerco externo, com acesso controlado e permitido pelas determinações do Escritório. * área externa – é aquela localizada e determinada após o isolamento físico dos policiais, com livre circulação de pessoas. Nela estará localizada a Sala de Imprensa, por exemplo, e serão atendidas todas as autoridade que não participam da solução do caso. A área externa é exclusiva responsabilidade da polícia militar, na sua missão de policiamento ostensivo, primando pelo controle absoluto das rotas de acesso e garantindo a circulação das viaturas e veículos de emergência (bombeiros, ambulâncias, serviços de luz e telefone). O Gerente estará alheio ao que acontece na área externa (autoridades querendo entrar, jornalistas exigindo entrevistas, etc) e será informado apenas dos fatos relevantes e que tenham relação específica com a crise (grifo do autor) Pode-se continuando no mesmo trabalho de descrição de papéis e funções do Gerenciamento de Crise, mas agora não apenas no intuito de tornar mais compreensível o que seja, no discurso policial, um Gerenciamento de Situação de Crise, mas também para fundamentar a possibilidade de um estudo psicanalítico deste tema. Novamente, por este trabalho orientar-se pela metodologia psicanalítica, parte-se da literatura policial, posto que é esta a metodologia escolhida para se aceder ao objeto de estudo: o discurso policial sobre Gerenciamento de Crise. Neste sentido, constata-se que a própria literatura policial alerta para a intersecção que as noções relativas a Gerenciamento de Situações de Crise pode ter com conceitos de ordem psicológica. Como se demandasse um diálogo mais próximo entre tais áreas. 2 A UTILIZAÇÃO DE CONCEITOS DE ORDEM PSICOLÓGICA NO GERENCIAMENTO DE SITUAÇÕES DE CRISE EM CONTEXTO POLICIAL É isto o que é dito quando a ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA (1991, p.04) estabelece que Gerenciamento de Crises é “uma ciência que deve lidar, sob uma tremenda compressão de tempo, com os mais complexos problemas sociais, econômicos, políticos, ideológicos e psicológicos da Humanidade, nos momentos mais perigosos de sua evolução, isto é, quando eles se manifestam em termos destrutivos” (grifo do autor). Ou quando, em relação a uma das funções mais significativas no Gerenciamento de Crise, a de Negociador, diz-se que ele deve, “Preferentemente, possuir conhecimentos específicos e formação em áreas que guardem relação com 16 as ciências sociais, psicologia, técnicas de entrevista e persuasão” (THOMÉ, 1998, p.43). Uma das citações que parecem revelar como o conhecimento teórico de noções psicológicas repercute na atuação do Negociador é a relativa à abordagem que se espera que ele tenha em relação ao problema: O procedimento normal é o de utilizar-se uma tática introdutória, que contém uma série de cuidados relativos ao primeiro contato e, em decorrência, visará à tranqüilização do ambiente, passando, paulatinamente, a envolver os criminosos no problema. Táticas de dissimulação, medo ilusão, divisão, quebra de ânimo, compressão e isolamento fazem parte de um sistema que, bem aplicado, aumentará as probabilidades de êxito no trabalho do negociador (THOMÉ, 1998, p.84) Esta abordagem, por sua vez, parece se fundamentar em considerações a propósito da dinâmica intra e inter-psíquica do causador do evento, posto que THOMÉ (1998, p.92) explica que “O negociador ao realizar o primeiro contato contará com o maior número possível de informações a respeito das características psicossociais do causador do evento, tarefa inicial que cabe ao Supervisor de Inteligência e que será fortalecida com as próprias impressões decorrentes dos diálogos e atitudes que se fizerem presentes”. A partir disto, e conforme o mesmo autor, o Negociador classifica os causadores do evento como anti-social, criminosos comuns, paranóico- esquizofrênicos e maníaco-depressivos. Sobre a ambiência do Negociador, encontra-se em SOMZAL (s/d) o seguinte comentário: “Combinando o conhecimento dos policiais com o emprego de táticas de saúde mental, uma variedade de ações sofisticadas, baseadas em teorias, técnicas, pesquisas e experiências têm sido desenvolvidas para reduzir conflitos e salvar vidas”. A partir das táticas disponíveis para se alcançar uma eficiente Negociação, também se encontra noções e objetivos inerentes a um trabalho que foque os sentimentos; logo, típicotrabalho da Psicologia. Cita-se: Pressionar o causador do evento, de todas as maneiras (sem aumentar a tensão do ambiente), exercendo um cerrado controle de suas emoções e motivação; mantê-lo e fazê-lo sentir-se completamente isolado do mundo e buscar mecanismos que proporcionem-lhe situações que repercutam cansaço físico e mental, são exemplos de táticas acessórias ou complementares, comumente utilizadas. Igualmente, o negociador deverá identificar a motivação do criminoso e, aos poucos, conduzir o processo de maneira a quebrar-lhe o ânimo. Dividir o grupo (em caso de mais de um criminoso) é providência elementar que 17 reforçará uma liderança e o diálogo com ela, além de facilitar a ação do Grupo Tático, se houver operação de resgate (se os criminosos estiverem divididos em sua liderança, oferecerão resistência física igualmente dividida). Manter o causador do evento iludido quanto às dimensões reais do problema. Afirmar que “todos estão ganhando com a conversa” ou que “a história registra que as situações semelhantes foram resolvidas por acordos efetivamente cumpridos pela polícia” ou que “todos estão satisfeitos com o desenrolar dos acontecimentos, apesar das circunstâncias” e que “vai dar tudo certo”. O negociador é um manipulador nas situações de incerteza (THOMÉ, 1998, p.89) FUSELIER e NOESNER (apud ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991) propõem quinze orientações básicas a todo Negociador. Ainda que possuam caráter empírico, fundamenta-se evidentemente em noções psicológicas. Uma delas é a de nada oferecer ao causador do evento, posto que isto destitui as figuras de autoridade, igualando-as ao agente da Situação Crítica, passando a mensagem de que estas estão dispostas a tudo para que os reféns sejam libertados. Outra é não destacar as vítimas, já que isto demarca o poder do causador do evento. Uma possibilidade seria utilizar outros termos que não “reféns”. Uma terceira seria nunca dizer “não”, já que assim se impediria de o Negociador ser visto pelo causador do evento como seu intercessor junto as autoridades. Não se deve, igualmente, fazer sugestões alternativas. Isto faria com que o negociador fosse representado, pelo agente da Situação Crítica, como impotente. Outra função de extrema importância é a de conselheiro e, a partir da descrição desta, encontra-se nova referência à importância de se considerar aspectos psicológicos no Gerenciamento de uma Situação Crítica. A seguinte passagem pode fundamentar tal interpretação: “Os Conselheiros são pessoas com formação específica em determinadas ciências, como a sociologia, psicologia, psiquiatria forense e qualquer área afim que interesse à resolução do evento. Também, podem ser Conselheiros os religiosos, assistentes sociais e pessoas que tenham conhecimento relacionados com a situação crítica (THOMÉ, 1998, p.43). O Supervisor de Inteligência, por sua vez, no cumprimento de sua atribuição de coordenar e buscar as informações, além de sistematizar aquelas que chegam ao Escritório, atém-se, dentre outros aspectos3, aos antecedentes policiais. Em se 3 Na terminologia de THOMÉ (1998), ele definirá quem são os criminosos, número de criminosos, eventuais cúmplices e/ou cooperadores, escolaridade, características do local (tamanho, plantas, 18 tratando dos antecedentes policiais, enfatiza, sobretudo, “a motivação do crime (...), o estado de ânimo e a habilidade no manuseio de armas de fogo” (THOMÉ, 1998, p.45). Como se constata, pelo menos os dois primeiros aspectos remete-nos a áreas de conhecimento típicas da Psicologia. Não bastasse, espera-se que o mesmo Supervisor considere “doenças mentais”, “problemas de comportamento” e “inteligência”, ainda na terminologia deste autor. Ele, inclusive, define o paranóico, o esquizofrênico, o maníaco- depressivo, o anti-social, os criminosos comuns, os prisioneiros amotinados, os fanáticos (religiosos ou políticos) como sendo perfis do criminoso; especificamente, nas diferenças que tais perfis apresentariam na relação com a realidade, com a afetividade, no relacionamento inter-pessoal, na representação do que seja a sociedade, na história passada, nos motivos para o desencadeamento de uma situação crítica. FRANCO e CRUZ et al. (2002) propõem uma tipologia de causadores do evento crítico, ainda que não especifiquem de qual ator do Gerenciamento da Crise seria a atribuição de classificar o autor do crime. A tipologia proposta é: criminosos em fuga, prisioneiros em revolta, emocionalmente perturbados, paranóicos esquizofrênicos, maníacos depressivos, personagens anti-sociais, personalidades desajustadas, fanáticos políticos ou religiosos, terroristas político e terroristas religiosos. Igualmente, ainda que sem especificar qual dos atores envolvidos no Gerenciamento de Crise realizaria a classificação do causador do evento entre possíveis tipos de criminosos, o Capitão BOLZ JUNIOR (apud ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991) apresenta uma outra tipologia que inclui o criminoso profissional, o emocionalmente perturbado e o terrorista por motivação política, no qual se incluiriam os terroristas por motivação religiosa. Principalmente em situações que envolvem reféns, fundamentos centrados em conceitos de ordem psicológica são indispensáveis. situação do terreno, características particulares, condições atmosféricas, propriedades vizinhas, estradas que conduzem ao local, entradas e saídas do prédio), existência e descrição de armas (quantidade, identificação, potencialidade, quantidade de munição), existência e descrição de reféns (quem são, quantos são, onde estão, idade, saúde física e mental), levantamento fotográfico, formalizar pesquisa sobre autoridades que chegam ao Escritório, sugerir quais informações podem e devem ser divulgadas, entrevistar policiais que primeiro atenderam à situação, entrevistar reféns tão logo sejam liberados. 19 Por exemplo, para se empreender a “análise da motivação” do seqüestrador, conforme se constata em SOMZAL (s/d). As motivações e as metas dos seqüestradores permitem perceber que os incidentes têm um valor instrumental e um valor expressivo para eles. O seqüestro em ambos os casos é um ato desempenhado para ganhar consentimento a certas exigências – a natureza instrumental do incidente, e também é um ato desempenhado para mostrar o poder do seqüestrador – a natureza expressiva da relação. (...) Os seqüestradores podem ser organizados em uma continuidade, que começa com aqueles que enfatizam a natureza instrumental dos incidentes com reféns. Eles iniciam a partir de uma personalidade anti-social, que quer dinheiro e transporte (com um fim funcional), até seqüestradores mentalmente perturbados, que usam o incidente para expressar sua injúria, ódio ou medo de uma situação (em um fim expressivo) (...). Entender as diferenças nessas motivações é importante para determinar as estratégias, táticas e habilidades necessárias em um incidente específico. O FBI (1992) apontou que pessoas são tomadas em situações em que ocorrem exigências substantivas e em outras em que não há nenhuma exigência substantiva. Exigências substantivas envolvem uma meta identificada (...). Quando não há nenhuma exigência, a motivação do seqüestrador é menos clara e o risco dos reféns é maior (...). Incidentes com exigências requerem negociação e barganha, enquanto incidentes sem exigências requerem mais habilidades de intervenção de crises. O FBI (1994) apontou outra distinção que ajuda a determinar que tipos de habilidades são necessárias e devem ser enfatizadas nos incidentes com reféns planejados (antecipados) ou não-planejados. Incidente com reféns planejados ou antecipados são, geralmente, aqueles de longa duração (...). Um incidente não-planejado é um crime interrompido, no qual são tomados reféns como tentativa desesperada de proteger os seqüestradores e ganhar concessõesdas autoridades. Eventos planejados irão necessitar menos tempo para serem assimilados pelo negociador e não são tão insolúveis quanto na crise inesperada. No entanto, levam um tempo considerado para negociar porque os seqüestradores têm um objetivo claro antes de tomar reféns (...). Por outro lado, seqüestros não-planejados, geralmente, representam a interrupção dos planos do seqüestrador de uma maneira não-previsível. Portanto, as situações representam mais uma crise para o sujeito do que aquelas planejadas. Irá levar mais tempo para acalmar e assimilar o seqüestrador Como se constata, algo considerado fundamental pela literatura policial a respeito de Gerenciamento de Crise (a análise da motivação do causador do evento) é pautado em conceitos de ordem psicológica, como: modalidades de expressão/comunicação inter-pessoal; relações de poder/autoridade; personalidade anti-social; perturbação mental; manejo de sentimentos de ódio, injúria e medo; persistência no propósito de alcançar um objetivo; técnicas de diminuição de ansiedade. Outro aspecto considerado no Gerenciamento de Situações de Crise envolvendo reféns que também fundamenta-se em noções psicológicas é a análise quanto à negociabilidade do incidente. Sobre tal assunto, diz SOMZAL (s/d): Na maioria dos incidentes com reféns, o seqüestrador apresenta suas exigências, embora algumas não sejam negociáveis. Parte do trabalho do negociador é testar os limites das exigências do seqüestrador para ver se elas podem ser negociáveis. Os comandantes de 20 área irão freqüentemente contar com os especialistas para ajudá-los a decidir se um incidente é negociável. Portanto, negociadores precisam saber o que faz um incidente ser negociável e o que necessita ser feito para torná-lo negociável. O FBI (1985) sugeriu 08 características necessárias para um incidente tornar-se negociável. São elas: deve haver vontade de viver por parte do seqüestrador; deve haver uma ameaça de força por parte das autoridades; deve haver exigências do seqüestrador; deve haver tempo para negociar; deve haver um canal de comunicação seguro entre o negociador e o seqüestrador; o negociador deve ser visto pelo seqüestrador como uma pessoa que pode feri-lo, mas deseja ajudá-lo; o negociador deve estar apto a negociar com o seqüestrador, tomando decisões rápidas; e tanto a localização quanto a comunicação de um incidente devem ser contidas para encorajar a negociação Detalhadamente sobre alguns destes tópicos, SOMZAL (s/d) ainda fala, utilizando ainda mais explicitamente de recursos da Psicologia: As pessoas que estão decididas a morrer (...) não se sentem ameaçadas pela morte. Preferem morrer a viver com o que chamam de dor insuportável (...). Sem a necessidade de viver, raramente há algo com o qual os negociadores podem barganhar. Há ameaça de força pela autoridade. Sem uma ameaça de credibilidade, os seqüestradores podem não ter nenhuma razão para negociar, porque têm pouca coisa a perder (...). (...) Sem exigência, não há negociações, não há nenhuma instalação de um conflito. Pessoas deprimidas, freqüentemente, exigirão só serem deixadas sozinhas. O FBI (1991) apontou que quando uma pessoa é seqüestrada e não há exigências substantivas, não há nenhum refém, entretanto, há uma vítima potencial. O seqüestrador pode ter um número de motivos para tomar uma pessoa em cativeiro sem exigências: extorsão, exploração sexual, homicídio, homicídio-suicídio ou suicídio por policial. A falta de exigências é um indicador de violência em potencial, no entanto, sem exigências, há ainda uma estratégia aberta ao negociador (...). Por exemplo, pessoas que estão deprimidas, às vezes não fazem suas exigências explícitas, mas comunicam, inconscientemente, a necessidade de alguma forma de ajuda. A escuta habilidosa e a análise dos motivos da pessoa podem ajudar na solução do incidente. (...) Ao usar o contraste de ser potencialmente mortífero ou ter um desejo genuíno em ajudar, os negociadores podem ser vistos como aliados poderosos para o seqüestrador. O contraste entre a confrontação violenta por parte da Polícia e o entendimento de que o negociador é um mediador pode fazer com que o negociador pareça bem mais maleável do que realmente é (...). As negociações demandam tempo. Sem tempo suficiente, uma relação não pode ser construída entre o negociador e o seqüestrador (...), as emoções não podem ser diminuídas e os problemas não podem ser resolvidos. Se um dos lados não está apto a deixar que o tempo passe, as negociações com sucesso são impossíveis. Um canal seguro de comunicações tem que existir entre o seqüestrador e o negociador (...). As pessoas devem falar a mesma linguagem, ter os significados das palavras similares e usar a linguagem consistentemente (...). A falta de um sentido comum para as palavras é uma das causas críticas nas negociações com tipologias emocionalmente perturbadas. Elas freqüentemente usam uma linguagem de uma forma única. O negociador deve ser sensitivo ao significado pessoal das palavras para ter um claro canal de comunicação Deste modo, pode-se concluir que um profissional de Psicologia pode contribuir em intervenções que considerem a ligação do sujeito com a vida, 21 representações que o mesmo faz das figuras de autoridade, quadros depressivos, o código lingüístico utilizado pelo sujeito com quem se pretender estabelecer um diálogo. Outro fator que pauta significativamente o Gerenciamento de Situações Críticas que envolvam reféns - a distinção entre reféns e vítimas - é fundamentalmente de ordem psicológica, posto que apenas conceitos desta ordem permitem uma compreensão efetiva e profunda do vínculo inter-pessoal que se estabeleceu entre o causador do evento e aquele que mantém preso. Sobre a importância desta distinção, cita-se THOMÉ e SALIGNAC (2001, p.14): Para as nossas necessidades, trataremos de diferenciar em duas categorias as pessoas capturadas durante um evento crítico, denominando como reféns aquelas que possuem valor real para o captor. Diferentemente das vítimas, um refém será moeda valiosa para seu captor, que dele se valerá para garantir sua incolumidade física, a possibilidade de fuga ou de obtenção de vantagens, conforme cada caso. Vítimas formam uma categoria que diz respeito àquelas pessoas capturadas e que não têm valor para os captores, sendo antes objeto de seu ódio: o captor busca a eliminação física dessa pessoa ou danos à sua integridade. Uma vítima não tem outro valor para quem a captura, exceto o da realização dos desejos de seu captor. Diferenciar entre uma e outra categoria muda radicalmente os rumos táticos e técnicos de uma Negociação Outro procedimento básico no Gerenciamento de Situações Críticas (a propósito, um dos primeiros a serem tomados de acordo com a proposta de alguns autores) é a interrupção da energia elétrica. Este procedimento tem sua fundamentação, para aqueles que o apóiam, em conceitos psicológicos, conforme a ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA (1991, p.67): “Os que defendem o corte da energia elétrica entendem que os riscos advindos dessa medida compensam os benefícios, pois além de evitar o uso de aparelhos que possam ensejar um contato dos bandidos com o mundo externo, colocam-nos (e também os reféns, é claro) numa situação de inferioridade e desconforto, que pode ser um fator decisivo para abreviar uma solução da crise”. Dentre as regras para contato com o captor citadas por FRANCO e CRUZ et al. (2002, p.70), encontra-se uma que se remete explicitamente a conceitos psicológicos: “Use o contato direto apenas depois de certificar-se do estabelecimento do “rapport” adequado com os captores” (grifo meu). Ainda que não sejam apenas os psicólogos os profissionais que utilizam do conceito de rapport, posto que ele é inerente a qualquer atuação que envolva 22 entrevistas, este conceitobaseia-se em noções psicológicas. Neste sentido, é de essência psicológica. Outro dispositivo fundamental no Gerenciamento de Situações Críticas, e que também se pauta em conceitos psicológicos, é a atenção ao desenvolvimento da Síndrome de Estocolmo4. Sobre orientações de como tal quadro afeta o Gerenciamento de Situações Críticas, e especialmente sobre os aspectos psicológicos a ele inerentes, abordam THOMÉ e SALIGNAC (2001, p.100-101): a) Informações transmitidas pelos capturados tornam-se não confiáveis: os reféns tenderão a exagerar as percepções a respeito de seus captores; b) Capturados, consciente ou inconscientemente, dão falsas informações sobre as armas ou potencial dos captores (os captores serão descritos como fortemente armados, decididos aos maiores massacres, mesmo que não tenham feito muito esforço para demonstrar periculosidade); c) Capturados terão dificuldades em descrever captores e assumem postura de “advogados” dos mesmos (características físicas marcantes serão esquecidas; altura ou porte físico serão descritos como avantajados quando não o são, os capturados defenderão vigorosamente a “boa vontade” do PEC5; d) A Síndrome pode causar interferência nos planos de resgate dos capturados, que poderão agir contrariamente aos comandos dos Policiais no momento do assalto: a identificação com os captores e os sentimentos positivos provocados pela Síndrome poderão levar os reféns a defender ardentemente os provocadores da ação dos policiais, 4 Este nome foi criado por Harvey Sclossberg, detetive policial que posteriormente tornou-se psicólogo clínico, conforme FRANCO e CRUZ et al. (2002). Decorreu de uma situação ocorrida em Estocolmo, segundo BOLZ (apud ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991, p.45-46) na qual: Um elemento armado entrou no Banco de Crédito de Estocolmo e tentou praticar um roubo. Com a chegada da polícia, o assaltante tomou três mulheres e um homem como reféns e entrou com eles na caixa-forte do Banco, exigindo da polícia que trouxesse ao local um seu antigo cúmplice, que se encontrava na prisão. Atendido nessa exigência, o assaltante e o seu companheiro mantiveram os reféns em seu poder durante seis dias, no interior da caixa-forte, tendo ao final desse tempo se entregado sem resistência. Ao saírem da caixa-forte, os quatro reféns usaram seus próprios corpos como escudos para proteger os dois bandidos de qualquer tiro da polícia, ao mesmo tempo em que pediram aos policiais para não atirarem. Mais tarde, ao ser entrevistada pela mídia, uma das jovens que estivera como refém expressou sentimentos de muita simpatia para com um dos bandidos, chegando a dizer que esperaria até o dia que ele saísse da cadeia para se casarem. (...) não ocorrera nenhum contato sexual ou relacionamento amoroso. Muito pelo contrário. Por várias vezes, durante a crise, o bandido exibira a referida moça, com uma arma sob o queixo, aos policiais. Soube-se também que, a certa altura, ao desconfiarem que a polícia pretendia jogar gás lacrimogênio no interior da caixa-forte, os bandidos amarraram os pescoços dos reféns aos puxadores das gavetas de aço dos cofres ali existentes. Com isso pretendiam eles responsabilizar a polícia por algum virtual enforcamento dos reféns, causado pelo pânico que adviria com o lançamento do gás no interior da caixa-forte. Apesar de todas essas ações violentas, a jovem desenvolveu sentimentos de profunda amizade para com um dos bandidos, fato esse que até mesmo ela considerou inexplicável. Havia, portanto, outras razões que motivaram aquele inesperado sentimento de amor e simpatia da jovem para com o seu ex-algoz. 5 Provocador do evento crítico 23 inclusive com o próprio sacrifício; o Negociador deve alertar o pessoal do GT6 a respeito dos reféns mais afetados; e) Interlocutores mal preparados podem ter seu desempenho afetado, principalmente se for identificada a necessidade de ação tática. Alguns efeitos da Síndrome podem atingir até mesmo pessoas que estão fora do alcance dos captores – e interlocutores não policiais são as maiores vítimas disso7; o Negociador deve estar sempre atento para a manifestação dos sintomas da Síndrome, nos interlocutores, afastando-os imediatamente caso ocorram; f) Fique atento à escalada do envolvimento, principalmente quando houver captores e capturados de sexos diferentes. Se forem deixados à própria sorte, sem constantes intervenções do Negociador, relacionamentos indesejados poderão ocorrer Vale ainda lembrar que Até mesmo o negociador é suscetível de ser contagiado por essa síndrome, sendo comuns os casos de negociadores que se envolveram emocionalmente com os bandidos, a tal ponto que chegaram a se tornar autênticos advogados de defesa das exigências daqueles e impedernidos adversários da opção de uso de força letal. Cabe ao comandante da cena de ação o cuidado de diagnosticar a tempo esse contágio e providenciar a imediata substituição do negociador (ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991, p.49) Tais orientações podem ser complementadas com outras, relacionadas ao grau de intensidade da Síndrome. A intensidade, por sua vez, depende dos seguintes fatores: a) O grau de risco ou ameaça (Quanto maior o risco mais rápida e intensamente se desenvolve a síndrome). b) O estado de saúde mental dos bandidos. Está comprovado que os psicopatas e os fanáticos religiosos não desenvolvem a síndrome, daí a razão da letalidade dos eventos que envolvem esse tipo de elementos. c) O condicionamento mental das pessoas. Quem adredemente se condiciona a não desenvolver a síndrome, geralmente obtém êxito nisso. d) A proximidade física entre as pessoas. Quanto mais exíguo for o ambiente, melhor se desenvolve o fenômeno (ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991, p.48) Outra orientação relativa à Síndrome de Estocolmo, e também pautada em fundamentos psicológicos, é a de que “A troca de reféns em nada contribui para a solução definitiva do evento crítico, acarretando sérios questionamentos de ordem moral, além de proporcionar um aumento da tensão no interior do ponto crítico, devido à quebra da proteção psicológica conferida pela chamada “Síndrome de Estocolmo”” (ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991, p.44)8. 6 Grupo Tático 7 Talvez porque parte-se do princípio de que eles, não sendo do meio policial, não estariam tão alertados quanto a tal processo. 8 Ainda sobre a troca de reféns e sua contra-indicação, agora não devido à dinâmica da Síndrome de Estocolmo, mas a outro aspecto psicológico envolvido, sabe-se que “Não somente os bandidos, mas 24 A substituição do Negociador também deve ser evitada ao máximo; e isto, além de outras razões, encontra fundamento na Síndrome de Estocolmo, desta vez desenvolvida pelo causador do evento em relação ao Negociador. Explicita-se tal noção na seguinte passagem: “Não deve o comandante da cena de ação nunca esquecer que, quando as negociações estão fluindo sem maiores obstáculos, isso é um bom sinal de que os causadores do evento crítico estão contraindo os efeitos da “Síndrome de Estocolmo” com relação aos negociadores, condição essa que pode ser prejudicada com uma troca abrupta de negociador” (ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991, p.50). Não só nas orientações que dizem respeito a como a Polícia deve manejar o quadro da Síndrome de Estocolmo, mas na própria definição que a literatura policial apresenta deste quadro encontra-se a referência a aspectos psicológicos. É o que se encontra, por exemplo, na seguinte passagem: os estudiosos do assunto chegaram à conclusão de que a “Síndrome de Estocolmo” era uma perturbação de ordem psicológica, paralela à chamada “transferência”, que é o termo que a Psicologia usa para se referir ao relacionamento que se desenvolve entre um paciente e o psiquiatra, e que permite que a terapia tenha sucesso. O paciente precisa acreditar que o médico pode ajudá-lo a fim de que o tratamentotenha bom êxito, e como resultado desse esforço, o paciente desenvolve o fenômeno da “transferência”. As pessoas, quando estão vivendo momentos cruciais, costumam se apegar a qualquer coisa que lhes indique a saída, e é exatamente isso que ocorre com os reféns e os bandidos. Por ocasião de um evento crítico, tanto uns como outros estão sob forte tensão emocional. Por essa razão, os reféns passam conscientemente a desejar que tudo dê certo para os bandidos; isto é, que eles consigam o dinheiro do resgate, que lhes sejam satisfeitas todas as exigências e que, afinal, possam fugir em paz, deixando os reféns com vida. Nesse processo mental, os reféns passam a considerar como totalmente indesejável toda e qualquer intervenção policial e, frequentemente, os próprios valores sedimentados ao longo da vida costumam ser questionados e até mudados por essas pessoas. Dessa ânsia desesperada pelo bom sucesso dos bandidos para a simpatia, a admiração, e até mesmo o amor ou o bem-querer, é um passo (...). Para os bandidos, os reféns são a sua tábua de salvação, o seu passaporte para a liberdade e o grande anteparo que os protege das balas da polícia. Nessas condições, é inevitável que os bandidos passem a desenvolver sentimentos de proteção, de cuidado, e até de amor e carinho, para com os reféns (ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991, p.47-48) É pertinente lembrar que uma análise histórica, que foque particularmente as características contemporâneas do Gerenciamento de Situações de Crise com reféns, revela, por si só, a importância da consideração a fatores psicológicos na também os reféns não costumam aceitar o novato com muita simpatia, pois geralmente se sentem na condição de preteridos, por não terem sido os escolhidos para serem trocados” (ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA, 1991, p.49). 25 abordagem desta temática. Vide, neste sentido, a seguinte passagem de SOMZAL (s/d): A tomada de reféns não é novidade na crônica policial. Através da história, as pessoas têm sido tomadas umas pelas outras. No Velho Testamento, tanto os Israelitas quanto os seus inimigos fizeram capturas: às vezes, como prisioneiros de guerra; às vezes, como um meio de destruir a nação conquistada na forma de seus captores; às vezes para enfraquecer os recursos da nação vencida. Essas capturas eram usadas para garantir que a nação conquistada não iria declarar guerra aos seus conquistadores. Em nações africanas, pessoas eram capturadas, tomadas como reféns e usadas como escravas. Novidade é a maneira como os reféns são usados, especialmente, nas décadas recentes, a resposta que a Polícia dá a esses incidentes e a forma com que os princípios psicológicos têm sido aplicados para a negociação de crises com reféns. Historicamente, a tomada de reféns tem envolvido o uso de pessoas como garantia de pagamento ou uma segurança contra a guerra. Durante a Idade Média, nações européias esperavam que pessoas fossem capturadas para assegurar concordância de nações que guerreavam. Comerciantes eram capturados para garantir que outros comerciantes da mesma nacionalidade pagariam seus débitos. Durante a Segunda Guerra Mundial, os alemães tomaram mais de 2 milhões de reféns franceses depois da divisão da França, em 1942, para assegurar a cooperação e concordância do povo francês. Tomada de reféns tem sido sempre uma técnica geopolítica usada por uma nação contra outra (grifo meu) SOMZAL (s/d) parece concluir, ainda que indiretamente, que o manejo de Situações de Crise antigamente colocava como primeira opção, frente ao ato do “criminoso”, o recurso do ato da Polícia. Isto porque em suas considerações à metodologia utilizada pela Polícia em tais situações permite-nos constatar claramente que se tinha como algo ordinário, e não extraordinário, atirar no causador do evento. Em seus termos: Na década de 70, as corporações policiais que se deparavam com tomada de reféns usavam um dos seguintes métodos de atuação: confiavam nas habilidades verbais dos policiais individualmente; deixavam as coisas acontecerem ou massificavam a quantidade de policiais e o poder de fogo no local, e exigiam que o captor soltasse o refém e se rendesse. Se essa concordância não fosse obtida em um período de tempo considerável, um assalto9 era iniciado 9 Terminologia policial para nominar a ação do Grupo Tático. Desde o momento, mostra-se pertinente sinalizar a semelhança entre este termo e aquele com o qual o senso-comum nomina a ação pela qual se realiza atos juridicamente tratadas por “crime”, como “furto” e “roubo”. Isto porque no capítulo “É-se o que se odeia: considerações sobre intervenções policiais em situações críticas” abordar-se-á os efeitos inexistentes e/ou iatrogênicos de intervenções policiais cujos autores neguem, racionalizem e/ou projetem suas pulsões agressivas. Logo, os efeitos negativos de os policiais entenderem a disposição do causador do evento para cometer um crime como diferencial entre os mesmos e, precisamente por isto, autorizarem-se a posicionarem-se de determinadas formas. 26 Hoje, diferentemente, acredita o autor, a primeira opção é a Negociação pela palavra. Isto porque apesar de SOMZAL (s/d) utilizar apenas o termo “Negociação”, sem adjetivos, a forma como a descreve faz-nos pensar que ele se refere à Negociação pela palavra10. Embora alguns países tenham adotado a política de que, em nível internacional, eles não negociam com terroristas, mesmo que ocorra a tomada de reféns, as organizações policiais geralmente tomam a posição de que, não havendo uma ameaça imediata à vida, são aceitáveis as negociações. Seguindo a tradição anglo-americana de polícia, a maioria das corporações policiais enfatizam a regra da lei e os direitos do indivíduo. Esses elementos levam a uma ênfase no processo de resolução, tomando como base o sistema legal, e tem sido a base na qual a maioria das forças policiais têm atuado. São o pano de fundo do desenvolvimento das negociações Fundamentando a principal hipótese deste item do presente trabalho, a de que a literatura policial que trata do Gerenciamento de Situações de Crise demanda, ainda que não explicitamente, um aprofundamento de subsídios de ordem psicológica, pode-se ainda recorrer à explicação que SOMZAL (s/d) oferece para esta modificação na modalidade de manejo de tais Situações: um manejo dirigido pela Negociação e não apenas pelo objetivo de preservar vidas. Como se a Polícia passasse a priorizar não apenas seu fim, mas também o processo envolvido, que passaria a influenciar, inclusive, determinante do fim objetivado. A explicação é a seguinte: o crescimento de serviços psicológicos na Polícia foi outro fator que favoreceu o desenvolvimento da negociação de reféns. Isso possibilitou um contato próximo, abrindo o caminho para os profissionais de saúde mental influenciarem as corporações policiais numa variedade de fatores, incluindo intervenção de crise, gerenciamento de comportamento anormal e negociação de reféns Por fim, e de forma a explicitar e especificar as possíveis contribuições da Psicologia ao Gerenciamento de Situações Críticas, cita-se PICKLER (2003, p.61), que diz: “Psicólogos, atuando como assistentes, serão úteis para assessorar o grupo de negociação com relação aos aspectos de personalidade apresentados pelos rebelados, sendo também um observador do comportamento psicológico dos negociadores”. 10 Sobre uma possível distinção entre Negociação que procura substituir o ato pela palavra, e outra que procura fundamentar, pela palavra, o cometimento de outro ato, consultar capítulo seguinte. 27 Um dos exemplos de situações que melhor revelam a importância de um parecer de um Psicólogo aos policiais envolvidos com o Gerenciamento da Crise é a do envolvimento do causador do evento com substâncias psicoativas. Neste sentido, pode-se citar THOMÉ e SALIGNAC (2001, p.113), que dizem: Drogase álcool; houve uma significativa mudança de posicionamentos em relação ao álcool. Inicialmente, acreditava-se que o fornecimento dessa droga seria sempre um fator de risco. Modernamente, acredita-se que a questão deve ser definida pela inteligência disponível: se os dados indicam que o PEC (provocador do evento crítico) se torna menos agressivo após a ingestão de pequena quantidade de alguma bebida alcoólica (especialmente no caso de dependentes crônicos que exibem os sinais de síndrome de abstinência), o risco pode ser válido. Evidentemente, os excessos podem aumentar a possibilidade de violência contra capturados. Além da inteligência, este é um caso em que assessoria deve ser buscada entre profissionais das ciências comportamentais e médicos. Ao contrário do álcool, drogas ilícitas de qualquer tipo são itens não negociáveis em todos os casos (grifo meu) Até o momento, procurou-se apontar a pertinência da contribuição de um Psicólogo ao Gerenciamento de Crise; porém, é igualmente pertinente debater, também a partir de uma articulação entre os discursos policial e psicanalítico, as razões pelas quais não é eficaz, eficiente e ético que o Psicólogo orientado pelo discurso psicanalítico ocupe o lugar de Negociador ou Gerente da Crise. Ou, em outros termos, é necessário discutir o lugar a partir do qual o Psicólogo responderá à demanda dirigida pela Polícia de fundamentação psicanalítica de suas ações. Este questionamento pode ser levantado a partir da seguinte ressalva da ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA (1991, p.35): “Psicólogos, psiquiatras e até outros expertos em ciências comportamentais podem e devem ser bem-vindos ao local da crise, mas a sua atuação se deve limitar tão-somente à prestação de assessoria ao comandante da cena de ação e aos negociadores policiais”. Porém, demanda, para ser realizado com maior fundamentação, realizar-se após a discussão psicanalítica de alguns temas específicos encontrados na literatura policial sobre Gerenciamento de Crise, o que será feito em capítulos subsequentes. 28 1 “DO ATO À PALAVRA” OU “DA VIOLÊNCIA AO SÍMBOLO” Pode-se concluir, a partir dos tópicos anteriores que abordam os objetivos e metodologias inerentes ao Gerenciamento de Situações Críticas, que uma das apostas que o Gerenciamento de Crise faz é a de que a palavra do Negociador, fundamentada e assessorada no exercício de outros papéis que também compõem o Gerenciamento policial de uma Situação Crítica e submetida ao Gerente da Crise, impeça a continuidade do ato violento. Em outros termos, que aquilo que tem sido atuado possa ser simbolizado; expresso de outra forma. O próprio percurso histórico do exercício da Negociação traçado pela ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA (1991) mostra a tentativa que a Polícia fez e ainda faz de dispor de outros recursos na abordagem de Situações de Crise que não o recurso do ato. Ou, sua tentativa de balizar o ato de autoria do causador do evento por outra coisa que não um novo ato (agora, de autoria de policiais, como por exemplo a execução não preconizada e legitimada pela lei ou a convocação inconsciente de que o causador do evento execute o refém ou se suicide, dependendo da situação). Ou, ainda, tentativa de que a Polícia intervenha pela palavra, de forma a cessar o ato já cometido. Em seus termos: os primeiros negociadores foram, historicamente, não-policiais. E essa realidade teve suas razões de ser. Eclodindo uma crise, os captores se viam diante de uma Polícia, que, devido ao seu despreparo doutrinário, pretendia solucionar o evento através da cega aplicação da lei, com a rendição incondicional dos infratores. Nessas condições, fazia-se necessária a intervenção de alguém, alheio aos quadros policiais, que pudesse servir de mediador, possibilitando assim que o evento fosse solucionado através de concessões mútuas. Essa é, com toda certeza, a conjuntura ainda hoje vivida por algumas das organizações policiais brasileiras, as quais, à míngua de uma doutrina e de um preparo adequado para enfrentar crises, socorrem-se do amadorismo e da improvisação para solucionar o problema, valendo-se de quaisquer meios ao seu alcance, inclusive de negociadores improvisados É como se a ideologia do ato como única resposta a outro ato fosse tão intensa e generalizada na Polícia que não permitisse a seus agentes assumirem a postura de alguém que aposta mais na palavra que no ato; ou seja, de Negociador. É como se a não tomada do causador do evento como sujeito, a não oferta da perspectiva do símbolo, autorizasse à Polícia tê-lo como objeto de investimento de suas pulsões; por exemplo, as destrutivas. 29 A ACADEMIA NACIONAL DE POLÍCIA (1991, p.37) parece trazer uma justificativa para a transformação que o Gerenciamento de Crise apresentou, citada na passagem anterior, ao dizer que: Não são raros, na crônica policial, os casos em que o evento crítico não apresenta, na essência, aquela dimensão e aquela gravidade que aparenta ter ao eclodir, mas que, em virtude de um mal gerenciamento, recrudeceu e até desandou para desfechos desastrosos, pelo uso desnecessário e precipitado de força policial, quando tudo poderia ter sido resolvido tão somente com uma boa negociação Também como fundamento explícito de tal hipótese, tem-se, em THOMÉ (1998, p.73), agora a respeito da intervenção do Negociador, que “o negociador fará cristalina a presença do Estado e a adoção de uma filosofia que visa à solução do problema, de preferência sem derramamento de sangue e pela via pacífica e negociada” (grifo meu). Noção semelhante é apresentada por SOMZAL (s/d), quando comenta que: A aproximação dos negociadores com os seqüestradores é exatamente oposta à aproximação que a Polícia está acostumada a usar. Em vez de manter a autoridade e o poder do distintivo de Polícia na prisão do criminoso, e usar força, se necessário, para efetuar a prisão, os negociadores se tornam aliados do criminoso e conversam com ele para que decida pela rendição pacífica. Eles fazem isso sem as armadilhas dos policiais. Não há uniformes, distintivos, algemas, bastão ou belicosidade. Só há as armas da comunicação, razão e paciência. (grifos do autor) Chega-se a denominar, aliás, que “O negociador deve ter em mente que jamais (jamais!) conversará com o causador do evento estando este a lhe apontar uma arma de fogo (THOMÉ, 1998, p.84). Para além da óbvia precaução para que o Negociador não seja ferido, pode- se relacionar tal atitude com uma postura que se espera ter do Negociador: a de, desde o princípio, estabelecer com o causador do evento uma relação não regida por atos violentos. Até porque em momento logo posterior, o mesmo autor chega a utilizar o termo “pacto de não agressão” para nominar a Tática de Tranquilização utilizada pelo Negociador: A primeira garantia do negociador é a de que a polícia não vai invadir o ponto crítico enquanto for possível conversar. A esta garantia haverá a contrapartida de que o causador do evento não vai agredir o negociador. Estabelecida esta condição, ficará mais fácil argumentar que não é interessante o criminoso atacar os reféns. Este pacto de não agressão harmoniza o ambiente e proporciona condições favoráveis de negociação. Um bom sistema para tranqüilizar o ambiente é o de fazer com que o causador do evento fale bastante, devendo o 30 negociador fazer-lhe perguntas cujas respostas demandem uma narração ou uma descrição e não simples negativa ou afirmativa. Ao raciocinar para responder, o causador do evento afasta-se mentalmente do problema em que está envolvido, fato que contribui para a normalização dos acontecimentos (...). As atitudes e desembaraço do negociador e a sua condução do processo priorizando a organização de idéias e o pensamento coerente, será uma constante numa crise bem gerenciada (THOMÉ, 1998, p.85-86) Pode-se pensar que a tática doNegociador de incentivar que o causador do evento “fale bastante” seja uma aposta de que mais que um “criminoso”, há um “causador” ou “provocador” de evento crítico. Há, neste sentido, uma aposta de que ali há um sujeito, e não apenas um indivíduo colado em seu ato (no caso, um ato jurídica e contemporaneamente tido por criminoso). É só um sujeito que pode, falando, montar um sentido para aquilo que até então é da ordem do vivido, do real. De forma complementar, a noção de que falar permitirá o afastamento do problema pode ser compreendida como o descolamento, que o encontro do símbolo permite, do real. Em outros termos, das pulsões em seu estádio mais primitivo (inominável, expressa apenas em atos). Um dos pontos, relativos ao Gerenciamento de Situações Críticas, em que esta aposta de que a palavra pode substituir o ato mais se evidencia é no manejo que a literatura policial orienta no sentido de facilitar o desenvolvimento da Síndrome de Estocolmo. Conforme THOMÉ (1998, p.74), o diálogo que o Negociador terá com o causador do evento deve iniciar o mais rápido possível porque “O estabelecimento da conversa com o negociador faz fluir a agressividade dos primeiros momentos e quanto mais tempo passar neste primeiro contato, melhor para o ambiente”11. Esta fluição pode ser interpretada como o encadeamento da pulsão, seu registro metafórico e metonímico, que permite que ela encontre outros caminhos que não a aniquilação do outro ou a repressão. Interessante, ainda, é pensar que a 11 Além do diálogo com o Negociador, a duração do tempo é diretamente proporcional à probabilidade de desenvolvimento da Síndrome de Estocolmo, bem como à sua intensidade. THOMÉ (1998, p.74) alerta, neste sentido, que “Nas situações críticas o fator tempo é o maior aliado da polícia na busca da solução negociada e pacífica. Na medida em que o tempo for passando uma série de acontecimentos atuam positivamente em apoio à atividade policial. Após alguns minutos de extenuante pressão, com a tomada de reféns, os causadores do evento começam a raciocinar e perceber a realidade que os circunda. Com isso diminui o perigo de ocorrer mais violência contra aqueles que estão no cativeiro (...). O favorecimento da instalação da Síndrome de Estocolmo é o exemplo mais clássico do que o tempo pode fazer na mente, não somente nos criminosos, mas também em suas vítimas”. Há de se questionar, entretanto, se o tempo traz tais efeitos por um mecanismo simplesmente cognitivo, ou se há também afetos aí envolvidos, que trariam uma nova lógica aos atos dele decorrentes que não a da lógica consciente. Um exemplo desta lógica outra é, justamente, vincular- se libidinalmente a alguém que ameaçou sua vida. 31 aniquilação do outro (personificado no refém) só é possível se se autoriza que o causador do evento viva, surja como sujeito e, portanto, suporte o contato com as próprias pulsões e as simbolize. Uma tática utilizada pelo Negociador é a da Dissimulação, cuja descrição atenta, dentre outros aspectos, à mudança que a palavra pode causar ao ato violento que se encontra em vias de iniciar ou de se intensificar: Quando o causador do evento fizer algum pedido cujo atendimento exija resposta negativa, o negociador atuará de maneira tal que consiga fazer com que seja feito outro pedido ou que não haja retaliação contra os reféns. Em qualquer caso, a resposta negativa nunca será dada de imediato, argumentando o negociador que precisa submeter o pedido a outras autoridades ou que precisa de tempo para poder preparar o atendimento. A resposta negativa deve vir cercada de respaldo, seja de confiança já estabelecida entre negociador e criminoso, seja de pura retórica do primeiro. A tática da dissimulação é preponderante nos acessos de raiva e cólera pelos quais passam os causadores do evento. As manifestações violentas devem ser toleradas e a mudança de assunto, nestes casos, é recomendada para diminuir-se a tensão (THOMÉ, 1998, p.88) (grifo meu) A oposição que a palavra pode apresentar em relação ao ato é, por si só, a essência da Tática do Medo, que por sua vez é outro dos recursos do Negociador. A descrição de tal Tática: A tática do medo é permanentemente utilizada durante o gerenciamento da crise e intensificada caso o negociador passe a funcionar como elemento tático. A polícia estrategicamente disposta na área crítica e a utilização de equipamentos sofisticados (helicópteros e veículos e armas especiais) e a permanente movimentação produzem uma sensação de aflição nos causadores do evento. Esta tática deve ser usada com eficiência e dela será tirado proveito em busca da solução negociada. Desde o primeiro contato, o negociador dirá que “a polícia não vai invadir”, mas o causador do evento sabe que a polícia está ali e pode invadir. O negociador, assim, estará fortalecido, pois ele é a maior garantia de que não haverá solução extrema. A habilidade do negociador é justamente demonstrar que ele é mais importante que os reféns (THOMÉ, 1998, p.89) (grifo meu) Também se evidencia a concepção de que a palavra pode ser uma alternativa substitutiva da atuação violenta na descrição do Momento de Conhecimento (segunda das três fases do processo de Gerenciamento de Crise). Nas palavras de THOMÉ (1998, p.90-91): Os causadores do evento passam a raciocinar com clareza e objetividade, dando-se conta da dimensão do problema que estão enfrentando e buscam uma solução rápida para a situação. Este momento tem uma característica muito importante e reside no fato dos criminosos adquirirem uma confiança demasiada por disporem de reféns, esquecendo-se do seu medo inicial. É a fase do puro descobrimento, onde o negociador vai dispondo de vasta informação que lhe permitirá dominar a situação. 32 Neste momento, o negociador deve ser visto como o grande trunfo que os causadores do evento têm para contornar a crise. Com habilidade, o negociador afastará o perigo da morte dos reféns, apelando para a razão e transformando-se aparentemente num verdadeiro aliado da causa dos criminosos, ao mesmo tempo em que introduz as táticas de isolamento, quebra da motivação, medo crescente e de ilusão Ainda que o autor não explicite, a estimulação para que o causador do evento pense, raciocine objetivamente, é feita a partir da mobilização de que o causador fale e da disponibilidade em escutá-lo. O terceiro Momento, o Caótico, não é diferente, permitindo a interpretação de que é um momento em que a palavra parece não só haver falhado uma vez, e por isto instaurou-se uma situação em que o mais característico é a ameaça de ato violento, mas também não haver sido inscrita em uma segunda tentativa, realizada pela Negociação. Nos termos de THOMÉ (1998, p.91): Após cerca de vinte horas do início do evento, a situação apresenta-se com um quadro completamente diferente, relacionado ao cansaço e à sensação de impotência, cuja influência do grupo enclausurado é fundamental. Neste momento, o interlocutor deve intensificar o diálogo e reiniciar táticas de tranquilização e de dissimulação. O medo deve ser uma realidade presente e o negociador deve ser visto como o grande aliado dos causadores do evento. A negociação deve dar sinais concretos de avanço e o Gerente há de considerar a solução da crise através da utilização do Grupo Tático 33 2 A VIOLÊNCIA QUE A PALAVRA PODE GUARDAR Atendo-se ao efeito ideal da Negociação, tem-se uma importante complementação a fazer à hipótese, discorrida até o momento, de que o Gerenciamento de Crise objetiva substituir o ato violento pela palavra. Complementação que visa a explicitar um dado já expresso nas citações anteriores, mas relativamente desconsiderado até o momento. A complementação é a de que a palavra pode ser, quando deturpada em sua essência de simbolizar o real da agressividade, violenta. Procura-se, neste capítulo, fundamentar
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