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Veterinária em Foco - v.2, n.2, nov.2004/abr.2005 165 Veterinária em Foco Canoas v. 2 n.2 nov. 2004/abr. 2005 p.165-176 Leptospirose eqüina: aspectos clínicos, tratamento, prevenção e levantamento sorológico Equine leptospirosis: clinical aspects, treatment, prevention and serologic trial PIRES NETO, José Antônio Simões - Médico Veterinário – MSc – Laboratório de Leptospirose, Instituto de Pesquisas Veterinárias “Desidério Finamor” FEPAGRO, Eldorado do Sul, RS. HESSE, Francine – Acadêmica do curso de Medicina Veterinária, ULBRA, Canoas, RS - estágiária do laboratório de Leptospirose, Instituto de Pesquisas Veterinárias “Desidério Finamor” FEPAGRO, Eldorado do Sul, RS. OLIVEIRA, Maria Alice Mesquita de – Acadêmica do curso de Medicina Veterinária, ULBRA, Canoas, RS. Data de recebimento: 03/03/05 Data de aprovação: 17/03/05 Endereço para correspondência: José Antônio Simões Pires Neto – Estrada do Conde 6000, Eldorado do Sul/ RS – 92990-000 – e-mail: jaspn@terra.com.br RESUMO A leptospirose é uma zoonose distribuída por todo o mundo. Em eqüinos pode se apresentar como assintomática ou com sintomatologia aguda bem marcante. É considerada como uma das principais causas da uveíte recor- rente eqüina e, ao longo dos últimos anos tem sido apontada também como causa freqüente de abortos em éguas. Foi feito um levantamento sorológico envolvendo 1169 amostras de soro eqüino pelo período de 2000 a 2003. Des- tas, 871 (74,51%) foram reagentes e 298 (25,49%) não reagiram com os sorovares testados. Os sorovares mais freqüentes foram respectivamente L. bratislava (19, 92%), L. copenhageni (15,06%), L. pyrogenes (10,19%), L. hardjo (10, 13%), L. australis (9,63%), L. icterohaemorrhagiae (6,47%), L. autumnalis (6,24%), L. tarassovi (6,20%), L. pomona (5,55%), A importância desta do- ença está nas perdas decorrentes da infecção, da falta de uma vacina especí- fica para a espécie no mercado e pelo fato de se tratar de uma zoonose. Palavras-chave: Leptospirose, eqüinos, uveíte recorrente eqüina, abor- to em éguas, levantamento sorológico. 166 v.2, n.2, nov.2004/abr.2005 - Veterinária em Foco ABSTRACT Leptospirosis is a world-wide zoonosis. In equine, although symptomless can show acute characteristic symptoms. It is considered as one of the most important cause of equine recurrent uveitis and, in the last few ye- ars has been associated with abortion in mares. A serologic trial has been done using 1169 equine samples. 871 (74,51%) of this did react and 298 (25,49%) did not react. The most frequent serovars were respectively L. bratislava (19, 92%), L. copenhageni (15,06%), L. pyrogenes (10,19%), L. hardjo (10, 13%), L. australis (9,63%), L. icterohaemorrhagiae (6,47%), L. autumnalis (6,24%), L. tarassovi (6,20%), L. pomona (5,55%). This disea- se is important because of the economic losses due to infection, and there is no vaccines for use in equines and because it is a zoonosis. Key-words: Leptospirosis, equine, equine recurrent uveits, abortions in mares, serological trial. INTRODUÇÃO A leptospirose é uma zoonose de ampla distribuição geográfica, causada pela bactéria do gênero Leptospira. Tradicionalmente o gênero Leptospira era subdividido em 200 sorovares, com base nas diferenças antigênicas. Todos os sorovares patogênicos eram classificados como L. interrogans e os não patogênicos eram incluídos na espécie L. biflexa (VIGNARD- RO- SEZ & ALVES, 2004). Atualmente os microorganismos são classificados de acordo com suas características genéticas, as leptospiras patogênicas (L. interrogans sensu lato) foram divididas em 12 espécies: L. interrogans, L. borgpetersenii, L. inadai, L. kirschneri, L. alstoni, L. santarosai, L. fainei, L. alexanderi L. nogu- chii, L. weilii, L. meyeri e L. wolbachii (PASTEUR INSTITUTE, 2004). Estas compreendem aproximadamente 230 sorovares e 23 sorogrupos. O soro- var é a base taxonômica da classe Leptospira (PASTEUR INSTITUTE, 2004). Muitas espécies de mamíferos e mesmo animais de sangue frio podem ser hospedeiros naturais dos sorovares de Leptospira sp. disseminando a infecção entre outros animais e o homem. A importância econômica e epidemiológica da leptospirose em animais domésticos, incluindo a íntima relação ecológica com o homem tem sido relatada em diversos países (ROMERO et al., 1994). A infecção em eqüinos, embora normalmente assintomática, tem sido associada a uveíte recorrente eqüina, abortos e outros sinais sistêmicos. Segundo Gilger (2003) a uveíte recorrente eqüina causa grandes perdas econômicas decorrentes da interrupção no treinamento, queda de perfor- mance e desqualificação dos animais de competição pelas conseqüências geradas pela doença bem como pela medicação utilizada. Veterinária em Foco - v.2, n.2, nov.2004/abr.2005 167 O estudo da doença reprodutiva em eqüinos causada pela Leptospira sp. era antes apenas ocasionalmente citada, entretanto, ao longo dos últi- mos anos, aborto em eqüinos causados pela leptospirose tem sido mais freqüentemente relatados (TROEDSSON, 2003). Além dos danos econômicos que a leptospirose possa causar aos criado- res de eqüinos, cabe salientar que pelo fato de se tratar de uma zoonose, pode afetar muitas espécies animais e inclusive o homem. Segundo Sell- now (2004) ainda que não existam relatos de pessoas infectadas por ca- valos, conhecer os aspectos clínicos e epidemiológicos da leptospirose em eqüinos visaria minimizar a exposição humana aos fatores de risco. O diagnóstico da leptospirose pode ser feito por isolamento da bactéria e/ ou sorológico. Em ambos os casos o diagnóstico é baseado em análises fenotípicas estabelecidas em 1918 por Martin e Petit utilizando um teste de lise-aglutinação (RAL) o qual evoluiu para o teste de microaglutinação ou MAT, que se tornou teste de referência (PASTEUR INSTITUTE, 2004). A análise de DNA utilizando amplificação de genes permite um diagnóstico precoce e rápido da doença. O sorovar responsável pela doença pode ser determinado seguindo seu isolamento e subseqüente identificação da cepa. Os resultados de testes sorológicos aplicados ao diagnóstico de leptospiro- se dependem da técnica empregada, da coleção de antígenos utilizada, do ponto de corte da reação e também das variáveis relacionadas à localiza- ção de propriedades, período do ano em que as escolhas foram efetuadas e da movimentação dos animais (FAINE, 1992 citado por MERCALDI di FAVERO, 2002). A interferência destes fatores torna necessária a existên- cia de estudos epidemiológicos que possibilitem um monitoramento da distribuição espacial dos sorovares de leptospiras nas diferentes regiões de modo a racionalizar as medidas de controle com especial destaque a imunoprofilaxia. O presente estudo visa fazer uma revisão bibliográfica em relação aos sintomas clínicos da leptospirose eqüina especialmente relacionada a uveíte recorrente eqüina e aborto em éguas causados pela leptospirose além de apresentar um levantamento dos principais sorovares de Leptospira em eqüinos no período de 2000 a 2003 testados no Laboratório de Leptospiro- se do Instituto de Pesquisas Veterinárias Desidério Finamor, FEPAGRO, lo- calizado em Eldorado do Sul, RS. 1 Sintomas e epidemiologia da Leptospirose eqüina A leptospirose eqüina é, algumas vezes uma infecção subclínica e usual- mente tem um curso brando. Freqüentemente os cavalos apresentam uma reação sorológica para vários antígenos (HARTWIGK, 1990). Segundo Hartwigk (1990) as infecções agudas e subagudas apresentam um dis- 168 v.2, n.2, nov.2004/abr.2005 - Veterinária em Foco túrbio sistêmico transitório, com sinais de hipóxia, depressão, relutância em se mover e diminuição da performance. As leptospiras podem entrar no espaço vascular através das mucosas de conjuntivas, área nasal, oral e esofágica, do intestino delgado e genitais. Pele ou ferimentos podem também ser uma porta de entrada. A bactere- mia ocorre emquatro a dez dias após a infecção inicial ocorre a invasão de órgãos internos (SELLNOW, 1999). A severidade da infecção depende da cepa infectante e da resposta imune do hospedeiro. A infecção aguda se caracteriza por febre (40,5 a 41,6º C) durante dois a três dias podendo chegar a sete dias, as membranas mucosas visíveis es- tão ictéricas e podem apresentar petéquias. Pode ocorrer uma conjuntivi- te bilateral e sinais do sistema nervoso central, bem como hematúria, um aumento na velocidade de hemossedimentação, leucocitose com neutro- filia ou linfocitose, aborto e morte (HARTWIGK, 1990). Alterações de glo- merulonefrite e hemorragia pulmonar são também mencionadas em po- tros (GIRIO et al, 1999), além disto a leptospirose tem sido relacionada com abortos e uveíte recorrente eqüina que serão discutidos a seguir. Segundo Romero et al. (1994), em provas experimentais, a leptospirúria em eqüinos segue a partir da fase aguda da doença por um período supe- rior a 10 semanas na maioria dos cavalos, sugerindo que estes animais possam servir como importante reservatório para transmissão da infec- ção a outros animais ou mesmo ao homem. 1.1 Aspectos clínicos da uveíte recorrente eqüina A uveíte recorrente eqüina (URE) também conhecida como cegueira da lua, iridociclite recorrente e oftalmia periódica é a doença oftálmica de eqüinos que mais provoca cegueira nesta espécie (GILGER, 2003). Vários microorganismos tem sido associados como causa de uveíte eqüina e uma das doenças sistêmicas mais comumente associadas a uveíte é a leptospi- rose. Em alguns casos, a uveíte associada a estas infecções sistêmicas po- dem se desenvolver em uveíte imuno-mediada ou URE. A URE é caracterizada por episódios de inflamação intra-ocular que se desenvolve após semanas ou meses após o episódio inicial declinar. Se- gundo Bastos (2004) no caso da uveíte induzida por Leptospira sp., foram observados sintomas 12 a 14 meses após a infecção experimental e em um surto clínico de leptospirose em um rebanho, a uveíte foi observada 12 a 24 meses após infecção aguda. A fase aguda da uveíte envolve predominantemente uma inflamação da íris, corpo ciliar e coreóide, com envolvimento concorrente da córnea, humor aquoso, cristalino, retina e humor vítreo. Após tratamento com antinflamatórios como corticosteróides, os sinais de uveíte aguda podem Veterinária em Foco - v.2, n.2, nov.2004/abr.2005 169 diminuir e esta afecção se torna convalescente ou pode se tornar crônica (GILGER, 2003). Os ataques freqüentes de uveíte anterior (iridociclite), são a causa mais comum de cegueira nos cavalos e cada ataque torna-se progressivamente mais grave e se alastra gradualmente para envolver outros tecidos oculares. Os sinais clínicos da URE aguda são similares aos sinais de uveíte em outras espécies como fotofobia, blefaroespasmo, edema de córnea, lacri- mejamento e miosiste. Na URE crônica os sinais clínicos incluem edema de córnea, fibrose de íris e hiperpigmentação, catarata, degeneração e descoloração de cristalino e degeneração retinal peripapilar. Por fim, mes- mo com tratamento agressivo, muitos cavalos podem desenvolver dor crô- nica ocular e cegueira como resultado da catarata secundária, sinéquia (adesões intra-oculares) e glaucoma (GILGER, 2003). Existem duas teorias em relação a URE causada pela Leptospirose: uma teoria afirma que há um envolvimento imunológico levando a um surto de uveíte (SELLNOW, 1999), é possível que linfócitos sensibilizados contra os antígenos leptospirais permaneçam na úvea por muito tempo após a infecção sistêmica, iniciando uma reação de hipersensibilidade (BASTOS, 2004), isto significa dizer que depósitos de complexos anticorpo-antígeno podem permanecer na úvea. Outra teoria, segundo Sellnow (1999) afir- ma que são as próprias bactérias que provocam a uveíte. 1.2. Aborto em eqüinos causado pela leptospirose Até recentemente a leptospirose tem sido apenas ocasionalmente relata- da como causa de aborto eqüino, entretanto estudos vêm sendo realiza- dos e casos de aborto por leptospirose têm sido mais freqüentemente des- critos nos últimos anos. Segundo Williams (2004) em trabalho realizado com fetos abortados no “UK Liverstock Disease Diagnostic Center”, foi reconhecido que a leptospirose é uma importante causa de aborto em eqüinos. Segundo Sellnow (1999) a infecção fetal ocorre após a entrada da bacté- ria no útero prenhe e, dependendo da fase de gestação, esta infecção pode resultar no aborto, natimorto ou neonato fraco. Os abortos relacionados à leptospirose têm sido observados a partir dos seis meses de gestação até o final da mesma. Éguas infectadas podem demonstrar sinais sistêmicos em um período de 3 a 4 dias como depres- são, temperaturas elevadas, anorexia e icterícia leve, os abortos ocorrem após infecção aguda (TROEDSON, 2003). A avaliação macroscópica em fetos eqüinos abortados é normalmente prejudicada pela autólise (PES- CADOR et al., 2002). Entretanto, quando presentes, são caracterizadas por icterícia, hemorragias sob a forma de petéquias e equimoses no pul- mão, mucosa traqueal, coração e mucosa gastrintestinal. Rins apresen- 170 v.2, n.2, nov.2004/abr.2005 - Veterinária em Foco tam-se com coloração amarelada e o fígado friável e com coloração ama- relo-alaranjada (HODGIN et al., 1989 citado por PESCADOR et al., 2002). O diagnóstico de abortos por Leptospira sp. é baseado no isolamento do organismo, coloração por imunofluorescência e testes sorológicos. O isolamento bacteriológico é de difícil realização e o diagnóstico é normalmente baseado em testes sorológicos (teste de aglutinação mi- croscópica e ELISA). Entretanto, em um trabalho realizado em Porto Alegre, RS, por Pescador et al. (2002) foi utilizada a técnica de imuno- fluorescência direta a partir de secções de rim de feto eqüino abortado e este teste demonstrou ser bastante útil no diagnóstico definitivo da doença bem como os resultados sorológicos de soro fetal pela prova de aglutinação microscópica auxiliaram na determinação dos soro- grupos envolvidos na infecção. Éguas normalmente apresentam elevados títulos para Leptospira sp. no momento do aborto. Uma elevação nos títulos associados ao aborto é con- siderado como diagnóstico (TROEDSON, 2003). 1.3. Tratamento e profilaxia Segundo Hartwigk (1990) a leptospirose aguda pode ser tratada com êxi- to, porém os casos crônicos são mais difíceis. De acordo com Sellnow (1999) há um consenso entre clínicos e pesquisa- dores de que a antibioticoterapia é o tratamento de escolha para os casos de leptospirose, ainda que não haja, no momento um protocolo fixo a ser seguido, sendo comum adaptar tratamentos preconizados para outras espécies. Segundo o mesmo autor sugere-se uma terapia de uma semana com oxitetraciclina, estreptomicina ou penicilina. O tratamento da URE baseia-se em preservar a visão, reduzir e controlar a inflamação ocular quando ainda há tempo de limitar um dano perma- nente ao olho. Segundo Hartwigk (1990) o tratamento da oftalmia perió- dica é feito com cloranfenicol tópico ou gentamicina e dexametazona. Segundo Gilger (1999) é improvável que a antibioticoterapia nestes casos tenha sucesso, devido ao fundo auto-imune da doença. Segundo Troedsson (1997) éguas abortadas devem ser tratadas com es- treptomicina, penicilina ou oxitetraciclina pelo período de uma semana. Sellnow (1997) relata que existem trabalhos que mostram que com a pe- nicilina G potássica utilizada em éguas que se encontravam no final da gestação e que apresentavam títulos elevados para leptospirose pariram potros normais. Em relação a profilaxia, segundo Troedsson (1997) não existem vacinas disponíveis no mercado contra leptospirose para eqüinos. Segundo Sell- Veterinária em Foco - v.2, n.2, nov.2004/abr.2005 171 now (1999) na ausência de uma vacina aprovada para uso em eqüinos, a adoção de medidas sanitárias e higiênicas é muito importante.Algu- mas vacinas disponíveis no mercado que abrangem diversos animais como bovinos, suínos e cães são também indicadas para uso em eqüi- nos, mas de fato, constatou-se a ausência de uma vacina específica para esta espécie. Portanto, entre as medidas sanitárias e higiênicas se inclui evitar a expo- sição a águas paradas, a vetores em potencial (roedores, animais silves- tres e, em alguns casos também, bovinos e suínos), bem como tornar rotina a desinfecção de boxes antes alojados por animais suspeitos de serem portadores e o isolamento de animais infectados; as éguas que abor- taram devem ser isoladas e os estábulos desinfetados, como em qualquer outro aborto infeccioso (TROEDSON, 2003). 2 Freqüência dos sorovares de LEPTOSPIRA SP. em amostras eqüinas 2.1 Material e métodos O estudo foi realizado em 1169 amostras de soro eqüino enviadas ao la- boratório de Leptospirose do Instituto de Pesquisas Veterinárias Desidério Finamor, localizado em Eldorado do Sul, Rio Grande do Sul no período de janeiro de 2000 a dezembro de 2003. A maioria das amostras enviadas ao laboratório são remetidas sem dados de anamnese e histórico clínico, nem histórico de vacinação não permitindo assim, comparar os dados positivos com a enfermidade nes- tes animais, porém a avaliação dos sorovares mais freqüentes é de gran- de importância epidemiológica. Cabe salientar que a grande maioria das amostras de soro foram provenientes do estado do Rio Grande do Sul. As amostras foram submetidas ao Teste de Aglutinação Microscópica (MA) utilizando culturas da bactéria viva dos seguintes sorovares de Leptospira interrogans: L. australis, L. autumnalis, L. bratislava, L. canicola, L. copenha- geni, L. grippotyphosa, L. hardjo, L. hebdomadis, L. icterohaemorrhagiae, L. pomona, L. pyrogenes, L. tarassovi e L. wolffi. Cada soro foi submetido a uma diluição inicial de 1:100 para cada sorovar. Os soros que apresenta- ram 50% ou mais de aglutinação com um ou mais sorovares foram con- siderados positivos. 172 v.2, n.2, nov.2004/abr.2005 - Veterinária em Foco 2.2 Resultados e discussão Das 1169 amostras analisadas, 871 (74,51%) foram reagentes e 298 (25,49%) não reagiram com os sorovares testados. Os sorovares de maior prevalência no presente estudo foram respectivamente : L. bratislava (19, 92%), L. copenhageni (15,06%), L. pyrogenes (10,19%), L. hardjo (10, 13%), L. australis (9,63%), L. icterohaemorrhagiae (6,47%), L. autumnalis (6,24%), L. tarassovi (6,20%), L. pomona (5,55%), L. canicola (4,39%), L. wolffi (2,85%), L. grippotyphosa (2,20%) e L. hebdomadis (1,08%) como se ob- serva na Tabela 1. Tabela 1 - Sorovares de maior freqüência em eqüinos, ano a ano, de 2000 a 2003. PPeerrííooddoo SSoorroovvaarreess 22000000 22000011 22000022 22000033 LL.. bbrraattiissllaavvaa 3355,,0099%% 2266,,0011%% 1177,,9911%% 1177,,0044%% LL.. ccooppeennhhaaggeennii 11,,7755%% 1122,,3300%% 1177,,5522%% 1111,,8888%% LL.. ppyyrrooggeenneess 55,,2266%% 1111,,0077%% 99,,5588%% 1122,,3333%% LL.. hhaarrddjjoo 88,,7777%% 1111,,0077%% 1111,,5555%% 44,,2266%% LL.. aauussttrraalliiss 33,,5511%% 1100,,9900%% 88,,6600%% 1122,,3333%% LL.. iicctteerroohhaaeemmoorrrrhhaaggiiaaee 1100,,5533%% 33,,3344%% 55,,9911%% 1111,,8833%% A comparação dos soros reagentes aos não reagentes pode ser verificada na figura 1. Vários estudos como de Romero et al. (1994), Lillenbaun (1998) e Favero et al. (2002), apontam o sorovar L. icterohaemorrhagiae como sendo de maior freqüência em eqüinos, entretanto, no presente estudo este soro- var representa apenas 6,47% das amostras reagentes frente a 19,92% do sorovar L. bratislava e 15,06% de L. copenhageni. O sorovar L. pomona citado por Troedsson (1997) como sorovar mais co- Figura 1 - Porcentagem de amostras reagentes e não reagentes no período de 2000 a 2003. Veterinária em Foco - v.2, n.2, nov.2004/abr.2005 173 mumente observado em estudo em Kentucky EUA, por Sellnow (1999) como maior causador de aborto eqüino por leptospirose e também por Bastos (2004) como causador de uveíte recorrente eqüina por leptospiro- se, teve também uma pequena expressão quando comparado com outros sorovares, representando no presente estudo apenas 5,55% dos soros rea- gentes. Lillenbaun (1998) em estudo realizado no Rio de Janeiro detectou o soro- var L. icterohaemorrhagiae em maior freqüência, seguido por L. bratislava e L. pomona. No presente estudo o sorovar L. bratislava foi o mais fre- qüente em todos os anos. Segundo o mesmo autor, este sorovar é sugeri- do como sendo hospedeiro-adaptado ao cavalo, o que poderia explicar a alta prevalência de anticorpos usualmente observados para o mesmo. Entretanto, dados de isolamento são ainda insuficientes para comprovar este fato. Segundo Sellnow (1999) este sorovar é considerado menos peri- goso para eqüinos. O sorovar L. copenhageni tem apresentado um crescimento progressi- vo. No presente estudo no ano de 2000 representava apenas 1,75% enquanto que nos outros anos teve grande representatividade, sendo o segundo mais freqüente, logo abaixo do sorovar L. bratislava. Este so- rovar foi citado por Romero et al. (1994) entre os mais prevalentes e foi o que obteve maior titulação em estudo realizado em feto abortado em Porto Alegre, RS por Pescador et al. (2003). Segundo Girio et al. (1999), L. copenhageni tem importância como agente etiológico de lep- tospirose eqüina tanto em casos assintomáticos como sendo responsá- vel por transtornos reprodutivos em fêmeas de várias regiões nos Esta- dos Unidos. O sorovar L. copenhageni tem como seu hospedeiro natural os ratos (Rattus norvergicus), esta espécie provavelmente esteja agindo como transmissora do sorovar aos eqüinos. CONCLUSÃO A leptospirose é uma doença bastante freqüente na espécie eqüina, mui- tas vezes assintomática porém pode apresentar-se como uma doença sis- têmica que tem como conseqüência características clínicas bem marcan- tes. É considerada como uma das principais causas de uveíte recorrente crônica em eqüinos e, ao longo dos últimos anos tem sido também associ- ada a abortos nesta espécie O grande número de eqüinos soropositivos mostra a importância da lep- tospirose nesta espécie em termos econômicos, da saúde animal e repre- senta risco à saúde pública. O levantamento sorológico revelou que diferentes sorovares são mais predominantes em uma região e não necessariamente mantém o mes- 174 v.2, n.2, nov.2004/abr.2005 - Veterinária em Foco mo padrão em outra, visto que a maioria dos soros analisados neste estudo são provenientes do estado do Rio Grande do Sul e foram com- parados com estudos anteriores realizados em outros estados brasilei- ros e também fora do país. Os resultados apresentados indicam que uma grande variedade de sorológica pode ocorrer em eqüinos, entre- tanto a multiplicidade de reações com vários antígenos pode também ser atribuída a reações cruzadas quando freqüentemente observadas no soro positivo. A grande variedade de sorovares reagentes em cavalos, provavelmente seja reflexo de sorovares mantidos por outros animais domésticos na mesma região geográfica, como roedores (hospedeiros naturais de L. icte- rohaemorrhagiae e L. copenhageni). Ainda que não existam no mercado vacinas contra leptospirose específi- cas para eqüinos, alguns estudos já vem sendo realizados. A realização de levantamentos sorológicos nesta espécie é de grande importância no au- xílio a estudos futuros que efetivamente resultem na produção de uma vacina para eqüinos de acordo com a região em questão. Por fim, por se tratar de uma zoonose e mesmo que não existam rela- tos de casos de leptospirose humana transmitida por eqüinos, conhe- cer os aspectos clínicos e epidemiológicos nas diferentes espécies visa minimizar os riscos desta doença em humanos visto que a mesma tem sido considerada como uma das mais importanteszoonoses da atualidade. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem a auxiliar de laboratório Fernanda Almeida de Araújo pelo auxílio prestado ao Laboratório de Leptospirose do IPVDF. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACOSTA, H. et al. Leptospirosis. Revisión de Tema. 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