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1 Universidade Federal de Viçosa Centro de Ciências Agrárias Departamento de Solos FERTILIDADE DO SOLO: CONCEITOS E APLICAÇÕES Editores Edson Marcio Mattiello Samuel Vasconcelos Viçosa/MG Março – 2018 2 APRESENTAÇÃO Este livro aborda o conteúdo da disciplina Fertilidade do Solo oferecida pelo Departamento de Solos da Universidade Federal de Viçosa. O livro foi organizado em quatro módulos, conforme o conteúdo da disciplina. No módulo 1 são apresentados conceitos e fundamentos da fertilidade do solo, com destaque para os fatores que controlam a disponibilidade de nutrientes para as plantas e o uso da análise química do solo e de planta para avaliação da fertilidade do solo. O módulo 2 traz uma abordagem sobre reação do solo, com menção as causas da acidez do solo, sua consequência para o crescimento vegetal e sua correção. Também neste módulo são destacadas as principais informações sobre matéria orgânica do solo: seus componentes, importância e manejo de resíduos orgânicos. No módulo 3 são apresentados os nutrientes e a dinâmica destes no sistema solo-planta. Neste módulo são descritas as reações no solo e os fatores relacionados com a disponibilidade e perdas de nutrientes no sistema solo. O módulo 4 refere-se à avaliação da fertilidade do solo e recomendação de fertilizantes, destacando fontes de nutrientes e suas características e fundamentos para a recomendação de fertilizantes e corretivos. Ainda, em anexo são apresentadas tabelas de interpretação da disponibilidade de nutrientes conforme os principais manuais do Brasil e de recomendação de adubação para as culturas exemplos da disciplina. Também são apresentados modelos de relatórios de recomendação de calagem e adubação discutidos em sala de aula. “Somos o que repetidamente fazemos. A excelência, portanto, não é um feito, mas um hábito.” Aristóteles 3 Sumário (organizar) Introdução ........................................................................................................................ 1 Módulo 1 ........................................................................................................................... 4 Abordagem introdutória à fertilidade do solo ............................................................... 5 Conceitos e fundamentos da fertilidade do solo ........................................................... 6 Exigências nutricionais das plantas ............................................................................... 6 Continuum solo-solução-planta .................................................................................... 6 Módulo 2 ........................................................................................................................... 4 Reação do solo e sua correção ...................................................................................... 5 Matéria orgânica do solo ............................................................................................... 6 Módulo 3 ........................................................................................................................... 4 Nitrogênio ..................................................................................................................... 5 Fósforo .......................................................................................................................... 5 Potássio ......................................................................................................................... 5 Enxofre .......................................................................................................................... 5 Micronutrientes .............................................................................................................. 5 Módulo 4 ........................................................................................................................... 4 Fertilizantes simples e formulados NPK ....................................................................... 5 Amostragem do solo ..................................................................................................... 5 Avaliação da fertilidade do solo ................................................................................... 5 Interpretação da análise do solo e recomedação de adubação ...................................... 5 Introdução A agricultura constitui um marco na história da humanidade. Ao se tornar sedentário e produzir alimentos, o homem alterou o rumo da sociedade que a milhares de anos constituía-se de caçadores-coletores. A agricultura inicialmente se deu em solos de boa fertilidade, normalmente próximos aos rios. Logo percebeu-se que o cultivo sucessivo levava a redução da produtividade das culturas e a exaustão dos nutrientes do solo. Surge então o pousio das áreas de cultivo. Mais tarde, a adição de estercos de animais, restos de vegetais ou cinzas e fertilizantes minerais ao solo foi a maneira encontrada pelo homem para a recuperação e manutenção da fertilidade do solo-surge então a adubação, que alterou os patamares de produtividades das culturas e permitiu o aumento da produção de alimentos e o crescimento da população mundial. O manejo nutricional é um dos principais fatores de produção podendo afetar grandemente a produtividade das culturas. A avaliação da fertilidade e o uso eficiente de corretivos e fertilizantes, sobretudo em solos pobres, são fundamentais para obtenção de maiores produtividades e melhor qualidade dos alimentos, para a segurança alimentar. Portanto, o conhecimento e a pesquisa em fertilidade do solo devem ser plenamente usados no manejo dos solos e orientação das correções das limitações nutricionais. MÓDULO 1- CONCEITOS E FUNDAMENTOS DA FERTILIDADE DO SOLO Edson Marcio Mattiello Leonardus Vergutz Victor Hugo Alvarez V. Abordagem introdutória à Fertilidade do Solo Propriedades físico-químicas do solo Fases do Solo Um solo mineral, próximo à superfície, com condições físicas ótimas para o crescimento de plantas, apresenta, aproximadamente, a seguinte composição volumétrica: 50 % de espaço poroso, ocupados por partes iguais de ar e de água, 45–48 % de sólidos minerais e 2 a 5 % de matéria orgânica (MO). Têm-se, em média, então, 50 % constituídos pela fase sólida, 25 % pela fase líquida e 25 % pela fase gasosa (Figura 1). A fase sólida é constituída de agregados que se apresentam, até certo ponto, individualizados. Os agregados são formados de partículas unitárias, cimentadas entre si por matéria orgânica, óxidos e hidróxidos de Fe e Al, sílica, etc. As partículas individuais são obtidas após a dispersão dos agregados. Limites de tamanho definem as partículas como pertencentes a diferentes frações (Figura 2). Argila Silte Areia muito fina Areia fina Areia média Areia grossa Areia Muito grossa Cascalho 0 0,002 0,02 0,05 0,2 0,5 1 2 Tamanho (mm) Figura 2. Limites dos tamanhos das partículas dos solos Sistema Coloidal O solo pode ser considerado como um sistema disperso, uma vez que é constituído de mais de uma fase, estando a fase sólida em estado de acentuada subdivisão. Há, portanto, um sistema coloidal1 no solo, constituídode partículas diminutas, de tamanho coloidal, minerais ou orgânicas, ou organominerais, como fase dispersa na solução (ou no ar) do solo, como meio de dispersão. Nesse sistema, ocorrem reações químicas, físico-químicas e microbianas de maior importância no estudo dos solos. Nessa fase dispersa, é que se encontram as argilas. As partículas do sistema coloidal do solo apresentam as seguintes propriedades: a) Superfície específica – refere-se à área por unidade de massa do material e é, usualmente, expressa em m2/g, porem em desacordo com o sistema internacional de unidades (SI), em que dever-se-ia expressar em m2/kg, A redução do tamanho da partícula aumenta sua área superficial em relação a sua massa e, consequentemente, ocorre aumento de sua superfície específica. Em virtude do menor tamanho da fração argila do solo em relação às outras frações, ela contribui em maior proporção com o valor da superfície específica do solo. Deve-se, portanto, esperar grandes variações entre solos quanto às suas superfícies específicas. Dentre os fatores responsáveis por essas variações, encontram-se a textura, os tipos de minerais de argila e o teor de matéria orgânica. Quanto ao tipo de mineral de argila, sabe-se, por exemplo, que a caulinita apresenta superfície específica de 10 a 30 m2/g (1 a 3 hm2/g), os óxidos de Fe de 100 a 400 m2/g, e a montmorilonita, no outro extremo, de 700 a 800 m2/g. É de se esperar, portanto, que solos tropicais, que têm nos óxidos e na caulinita os maiores constituintes da fração argila, tenham menor superfície específica, em geral, que solos de regiões temperadas, onde há predominância de montmorilonita e 1 Nos sistemas coloidais, componentes da fase dispersa (a fase constituída pelas partículas) apresentam, pelo menos, uma de suas dimensões entre 1 μm e 1 nm (1 nm = 10-9 m), e encontram-se em uma segunda fase, o meio de dispersão (neste caso água ou ar). de outras argilas silicatadas mais ativas. A matéria orgânica, embora apresente teores relativamente baixos na maioria dos solos, contribui significativamente para o valor da superfície específica destes, graças ao seu alto grau de subdivisão. Assim, um solo com maior teor de matéria orgânica deverá ter maior superfície específica que outro com menor teor, se outras características, como tipo e quantidade de argila, forem mantidas constantes. b) Cargas Elétricas- Propriedade muito importante de uma dispersão coloidal é a presença de cargas elétricas. As partículas coloidais do solo, as argilas de modo geral, são eletronegativas. Porém, em solos muito intemperizados pode-se encontrar maior número de cargas positivas do que negativas, principalmente em subsuperfície. Essas cargas elétricas proporcionam a adsorção de íons de cargas opostas, retendo-os no solo. c) Cinética- As partículas dispersas em meios líquidos apresentam movimentos. O movimento browniano é caracterizado pelo movimento brusco e irregular de partículas individuais no meio de dispersão. Esse movimento deve-se à energia cinética das partículas. Origem das Cargas Elétricas do Solo Cargas Negativas Em geral, as cargas negativas são predominantes nos solos. Essa predominância é expressiva em solos de regiões temperadas, graças à presença de argilas silicatadas mais ativas, por conseguinte mais eletronegativas. Por outro lado, nos solos mais intemperizados de regiões tropicais, o predomínio de cargas negativas tende a diminuir e, em alguns casos, até mesmo inverter com predomínio de cargas positivas. As cargas eletronegativas do solo podem ter diferentes origens: a) Dissociação de Grupos OH nas Arestas das Argilas Silicatadas O grupo OH nas terminações tetraedrais ou octaedrais, em faces quebradas das unidades cristalográficas das argilas silicadas, pode-se dissociar, gerando uma carga negativa. Verifica-se que com elevação do pH do meio (solo) o equilíbrio é deslocado para a direita em razão da neutralização dos íons H+ liberados na dissociação do grupo OH. Este tipo de cargas dependentes do pH é o tipo predominante em argilas 1:1, como a caulinita. b) Substituição Isomórfica Durante a gênese de argilas do tipo 2:1, alguns átomos de Si dos tetraedros podem ter sido substituídos por Al, bem como o Al dos octaedros pode ser substituído por Mg ou por outros cátions de valência menor que a do Al3+ (Figura 2). A substituição do Si4+, que se encontrava, inicialmente, neutralizando quatro cargas negativas por Al3+, irá condicionar sobra de uma carga negativa. De maneira semelhante, uma carga negativa será gerada pela substituição de um Al3+ de um octaedro por um cátion divalente, como o Mg2+. Deve-se ressaltar que o número de cargas geradas por este processo não é variável com alterações do pH do meio. Figura 2. Modelo ilustrativo da substituição isomórfica em argilominerais. c) Matéria Orgânica Na matéria orgânica do solo, as cargas negativas originam-se, principalmente, da dissociação de grupos carboxilícos e fenólicos (Figura 3). Quanto maior o pH do solo, mais cargas negativas serão disponibilizadas. Figura 3. Grupamentos fenol e carboxil da matéria orgânica do solo. Cargas Positivas As cargas eletropositivas do solo têm sua origem nos óxidos e hidróxidos (óxidos hidratados) de Fe e Al, principalmente. Tal situação se dá de maneira mais significativa em condições mais ácidas de solo. O esquema abaixo mostra que o hidróxido de Al (gibsita) pode dar origem a cargas eletropositivas, eletronegativas ou permanecer com carga neutra na superfície, dependendo do pH do solo (Figura 4). Figura 4. Modelo de geração de cargas em gibsita (Al(OH3)) De modo geral, o ponto em que o balanço de carga dos óxidos é nula corresponde a um valor de pH na faixa alcalina. O PCZ (ponto de carga zero) é o pH em que o solo apresenta carga líquida nula. Seu valor é variável de acordo com a natureza dos materiais trocadores de íons constituintes do solo. Assim sendo, os óxidos de Fe e Al apresentam cargas positivas em solos ácidos. Adsorção e troca iônica As propriedades de adsorção iônica do solo são devidas, quase que totalmente, aos minerais de argila e à matéria orgânica do solo, materiais de elevada superfície específica. Essas partículas coloidais do solo são anfóteras, pois apresentam cargas elétricas negativas e positivas, podendo adsorver ou “reter”, por diferença de carga, tanto cátions como ânions. As cargas negativas são neutralizadas por íons eletropositivos, ou seja, pelos cátions, o que se denomina adsorção catiônica. Na neutralização de cargas positivas pelos ânions tem-se a adsorção aniônica. Os íons envolvidos nesse processo de adsorção ligam-se por eletrovalência ou por covalência às partículas coloidais do solo. Os cátions mais envolvidos quantitativamente nesse processo são: Ca2+, Mg2+, Al3+, H+, K+, Na+ e NH4 +, sendo o Ca2+, comumente, o mais abundante em alguns solos, enquanto, em outros, é o Al3+. Alguns micronutrientes estão, também, sujeitos ao mesmo processo, embora em quantidades muito pequenas se comparadas aos cátions referidos anteriormente. Os íons adsorvidos às partículas coloidais podem ser deslocados e substituídos, estequiometricamente, por outros íons de mesmo tipo de carga, dando-se uma troca iônica. Como as cargas da fase sólida se manifestam na superfície das partículas coloidais do solo, há estreita relação entre o fenômeno de troca e a área superficial dessas partículas. Essa área é a superfície específica do solo, expressa em m2/g, conforme mostrado acima. Assim, o fenômeno de troca iônica do solo, que é basicamente a expressão de suas propriedadesfísico-químicas, depende preferencialmente de sua superfície específica e, em menor proporção, da densidade de cargas elétricas que se manifestam nesta superfície. Na solução do solo, que envolve as partículas coloidais, os íons estão se deslocando constantemente. Os íons em movimento representam os elementos em estado trocável ou disponível. Esquematicamente, o fenômeno de adsorção e troca iônica pode ser representado pela figura 5. Figura 5. Adsorção e troca iônica em superfície eletronegativa e eletropositiva. Capacidade de Troca Catiônica (CTC) A CTC representa a quantidade de cargas negativas presentes em determinado solo e, portanto, a capacidade deste em adsorver cátions. Assume-se que os cátions adsorvidos na CTC do solo encontram-se em uma forma tal que possam ser rapidamente trocados por outros cátions introduzidos na solução do solo, que essa reação de troca ocorra rapidamente, de forma estequiométrica e que seja reversível. Na determinação da CTC do solo é importante considerar o pH em que a troca catiônica se verifica. Isto porque, além das cargas negativas permanentes (substituição isomórficas) os solos apresentam cargas dependentes de pH (H ligado covalentemente). Portanto, quanto maior o pH da solução de medida da CTC, maior será a quantidade de cargas negativas encontradas. À CTC medida no pH natural do solo damos o nome de CTC efetiva (t), ou seja, aquela que realmente está sendo expressa naquele pH. Adicionalmente, também determinados a CTC potencial, ou CTC a pH 7 (T), que é determinada utilizando-se uma solução tamponada a pH 7. Essa CTC potencial é uma referência e nos mostra qual a quantidade de cargas que serão disponibilizadas por ocasião da realização da calagem e eventual elevação do pH do solo. Dentre os cátions que neutralizam as cargas negativas da CTC efetiva do solo, incluem-se, principalmente, os de caráter básico (Ca2+, Mg2+, K+, Na+ e NH4 +), os de caráter ácido (Al3+, principalmente) e, também, cátions H+ ligados a cargas negativas da CTC de caráter eletrovalente. O conjunto dos cátions que estão ocupando a CTC do solo, saturando-a, juntamente com as cargas negativas dos colóides é denominado complexo sortivo (ou de troca) do solo. Quando se usa uma solução salina não tamponada, como KCl 1 mol/L ou CaCl2 0,5 mol/L , para a determinação da CTC do solo, o valor obtido corresponderá à CTC efetiva. Por outro lado, se a solução salina for tamponada a um definido pH, o valor obtido corresponderá à CTC potencial do solo naquele pH, englobando a CTC permanente e a CTC dependente do pH. Para determinar a CTC a pH 7,0, utiliza-se uma solução tamponada de acetato de cálcio 0,5 mol/L , ou de acetato de amônio 1 mol/L , a pH 7,0. Dessa maneira, conforme citado acima, os princípios que caracterizam a CTC são: a) O fenômeno de troca é reversível. Os cátions adsorvidos podem ser deslocados por outros, e, assim, sucessivamente. b) O fenômeno de troca é uma reação estequiométrica, isto é, obedece à lei dos equivalentes químicos: um molc de um cátion é trocado (substituído) por um molc de outro cátion. c) É um processo rápido (minutos) Muitas condições do solo têm influência sobre a CTC, dentre as quais: pH, características dos cátions trocáveis, como valência e raio iônico hidratado, concentração da solução e natureza da fase sólida. A natureza dos cátions trocáveis afeta a preferencialidade de troca no solo, de acordo com a densidade de carga dos cátions, isto é, Z/r (Z = carga do íon e r = raio do íon hidratado). Os cátions que têm maior densidade de carga são mais retidos nas cargas negativas do solo. Por isso, os cátions polivalentes são geralmente mais fortemente retidos no solo. A sequência de preferencialidade de troca de cátions para uma mesma concentração foi estabelecida por Hofmeister, sendo conhecida como sequência de Hofmeister (Mengel & Kirkby, 1982), ou série liotrópica (Russel & Russel,1973). Esta sequência é a seguinte: Li+ <Na+ <K+ <Rb+ <Cs+ <Mg2+ <Ca2+ <Sr2+ <Ba2+ A diferença na preferencialidade de troca entre cátions da mesma carga se deve à diferença entre os raios iônicos hidratados (espessura da camada de hidratação do íon). O Al3+, sendo trivalente, é mais fortemente retido que os divalentes. O H+, em razão de suas propriedades específicas, com ligações preferenciais covalentes, não se comporta como monovalente quanto à preferencialidade de troca. Seu papel depende, também, da natureza do material trocador. A concentração dos cátions na solução do solo afeta a preferencialidade de troca, interagindo com a carga dos cátions envolvidos. Assim, à medida que se dilui a solução mantendo-se constantes as proporções entre os cátions presentes, verifica-se um aumento na preferência de troca dos cátions de menor pelos de maior valência. Em razão disso, em solos de regiões úmidas, as bases vão sendo lixiviadas e o cátion que acaba predominando no complexo é o Al3+. Por outro lado, em solos de regiões áridas e semi-áridas, a tendência é de acúmulo de cátions monovalentes, principalmente o Na+. A natureza do material trocador influi, principalmente, na densidade de cargas negativas responsáveis pela CTC do solo, que se expressa em cmolc/kg. Em solos de regiões tropicais, como na maior parte do território brasileiro, a matéria orgânica apresenta, geralmente, maior participação no valor da CTC total. Uma ideia da amplitude de variação destas características relacionadas com a CTC do solo, bem como a sua divisão em classes, de acordo com a magnitude das mesmas, é dada no quadro abaixo (Quadro 1). Deve-se salientar que esta classificação é válida para solos de regiões tropicais. Quadro 1. Amplitude e classificação das características relacionadas à CTC dos solos tropicais a) CTC efetiva (t) e Potencial a pH 7,0 (T) No pH da solução extratora correspondente ao do solo, tem-se a CTC efetiva (t), que é a CTC permanente mais parte da CTC dependente de pH que se manifesta até o pH do solo. No pH 7 tamponado (T), além de medir a CTC efetiva adiciona-se a esta as cargas dependentes de pH que encontram-se bloqueadas por H covalentemente ligados aos grupamentos funcionais dos argilominerais e da matéria orgânica do solo. Portanto, essas cargas bloqueadas são aquelas que encontram-se entre o pH do solo e o pH da suspensão, no equilíbrio do poder tampão a pH 7. A matéria orgânica do solo é um material que apresenta CTC tipicamente dependente de pH. b) Soma de bases (SB) A soma de bases (SB) é calculada somando-se os teores de Ca2+, Mg2+, K+ e, quando disponíveis, os teores de Na+ e NH4 + trocáveis. Porém, nos solos ácidos de regiões tropicais, como a maioria dos solos brasileiros, os teores dos cátions trocáveis Na+ e NH4 + geralmente têm magnitude desprezível. c) Saturação por bases (V) A participação das bases no complexo sortivo do solo a pH 7, expressa-se em percentagem e é conhecida como saturação por bases (V). Indica a quantidade relativa de bases com relação à CTC potencial. Ela é calculada pela expressão abaixo. d) Acidez trocável (Al3+) A acidez trocável é constituída pelo Al3+, o Mn2+ e em menor quantidade por Fe2+, mais os íons de H+ que fazem parte da CTC efetiva. Como, em geral, a participação do Mn2+, Fe2+ e do H+ é pequena em relação à acidez trocável, este valor é representado pelo Al trocável (Al3+). Cátions de caráter ácido, como o Al3+ e o Mn2+, são considerados como acidez trocável porque, em solução, pela hidrólise da água, geram acidez, de acordo com a equação abaixo: e) Acidez potencial A determinação da acidez potencial (a pH 7,0) é feita utilizando-se como extrator uma solução tamponadade acetato de cálcio 0,5 mol/L , pH 7,0. Esta acidez inclui tanto o H (H+ trocável e H de ligações covalentes que é dissociado com a elevação do pH) quanto o Al3+. Por esse motivo é chamada de H + Al. O H covalentemente ligado representa as cargas negativas dependentes do pH. Esta fração é chamada acidez dependente do pH. f) Saturação pela acidez trocável (m) A saturação pela acidez trocável (Al3+) representa a quantidade relativa (em termos percentuais) da CTC efetiva (t) que está ocupada por Al3+. Ela é calculada pela seguinte expressão: Informações sobre os valores de T, SB e V de um solo podem indicar o tipo de mineral presente na fração argila e possíveis problemas na sua utilização, bem como sobre o procedimento adequado a ser tomado para otimizar sua utilização. O solo A (Quadro 6), com valor baixo de T, provavelmente tem sua fração argila constituída por caulinita e óxidos de Fe e Al e, ou, o teor de argila do solo é baixo (solo arenoso). Outro aspecto provável é a existência de baixo teor de matéria orgânica neste solo. A adição de matéria orgânica a este solo para aumentar, pelo menos temporariamente, seu valor T, poderia ser recomendada. O valor de V é médio e a percentagem de saturação por Al3+ (m) é baixa, em razão dos baixos valores de Al3+. O solo B (Quadro 6), muito ácido, tem baixo V. Logo, alta participação da acidez potencial (H + Al) no complexo de troca, podendo apresentar alta percentagem de saturação por Al (m). Para uso agrícola, deverá ter o seu pH elevado por meio de calagem, o que irá causar aumento dos valores de SB e V, aumentando, consequentemente, o seu pH e diminuindo o valor de Al3+ e de m. Os valores de T e SB indicam que o material constituinte da fração coloidal é mais ativo, provavelmente com teor de matéria orgânica mais elevado neste solo, embora apresente poucas bases no seu complexo de troca. O solo C (Quadro 2) apresenta-se em boas condições quanto ao seu complexo de troca e características a ele relacionadas. Quadro 2. Valores de pH, Al3+, SB, t, (H + Al), T, V e m de amostras de três solos. Capacidade de Troca Aniônica A capacidade de troca aniônica é definida como o poder do solo de reter ânions na fase sólida, numa forma trocável com outros ânions da solução. Entretanto, a manifestação desta propriedade não é tão característica quanto a troca catiônica, isto é, não são atendidas as condições de rapidez, reversibilidade e estequiometria. Por esta razão, a troca aniônica é mais frequente e convenientemente denominada adsorção aniônica e é específica para cada ânion, sugerindo um processo mais complexo do que a simples troca. Um aspecto particular do comportamento de certos ânions no solo é a adsorção específica. Por este processo os ânions são retidos pela fase sólida, por meio de ligações fortes (covalentes), passando a fazer parte da estrutura dos minerais, em sua superfície. Este tipo de adsorção é de baixa reversibilidade e é bem conhecido para o P, sendo o principal responsável pela fixação de P no solo, principalmente nos solos ricos em óxidos e hidróxidos de Fe e Al. Uma reação desta natureza é apresentada de forma simplificada na figura 6.: Figura 6. Esquema ilutrativo da adsorção específica (covalente) do ion fosfato em óxido de Fe. Os ânions que podem deslocar o P (H2PO4 -) da fase sólida do solo com maior eficiência são flúor (F-) e o silicato (H3SiO4 -), seguido de sulfato (SO4 2-). O nitrato (NO3 -) e o cloreto (Cl-) não têm, praticamente, poder de substituir o fosfato. Pode-se dizer que a retenção de nitrato e cloreto no solo se dá por adsorção não-específica, que tem caráter reversível. Da mesma forma que a CTC, a capacidade de adsorção de ânions dos solos também pode ser determinada em laboratório. Para tanto utilizam-se, usualmente, curvas de adsorção conhecidas como “isotermas de adsorção”. Uma das mais utilizadas para ânions do solo, de interesse na nutrição das plantas, é a isoterma de Langmuir, a qual permite determinar a capacidade máxima de adsorção do ânion em estudo, como por exemplo a capacidade máxima de adsorção de P (CMAP) e de sulfato (CMAS). A capacidade máxima de adsorção de ânions varia com as características do solo, notadamente seu teor e tipo de argila, podendo atingir valores bastantes elevados para solos muito intemperizados com altos teores de argila. Por exemplo, valores de CMAP variando de 220 a 1 260 mg/kg de P para Latossolos do Planalto Central do Brasil correspondem a uma retenção de, aproximadamente, 1 000 a 5 800 kg ha-1 de P2O5 na camada arável (20 cm de profundidade). De maneira geral, solos com menor teor de argila apresentam valores de CMAP e CMAS menores em relação aos mais argilosos. Porém, o tipo de argila também tem grande influência. As cargas positivas do solo, responsáveis pela adsorção aniônica, são, normalmente, dependentes do pH do meio. Diminuindo o pH, aumentam as cargas positivas do solo e a adsorção aniônica aumenta. CONCEITOS E FUNDAMENTOS DA FERTILIDADE DO SOLO A fertilidade do solo refere-se à capacidade do solo em suprir elementos essenciais às plantas. A boa fertilidade do solo implica em suprir quantidades e proporções adequadas de nutrientes para o crescimento e produtividade das plantas. Solo produtivo é um solo fértil, ou seja, que contém os nutrientes essenciais em quantidades adequadas e balanceadas para o normal crescimento e desenvolvimento das plantas cultivadas e que apresenta ainda boas características físicas e biológicas, está livre de elementos tóxicos e encontra- se em local com fatores climáticos favoráveis. Assim, um solo pode ser fértil sem necessariamente ser produtivo. Um solo pode apresentar boa fertilidade natural ou, por meio de correções e do manejo adequado de nutrientes, podemos construir fertilidade em solos pobres. No Brasil é comum a ocorrência de solos com baixa fertilidade natural, principalmente os Latossolos e Argissolos. Destacam-se pela longa gênese do solo e o alto grau de intemperismo como principais fatores causadores da baixa fertilidade, particularmente em grande parte das regiões tropicais e subtropicais, onde a remoção de nutrientes do solo é mais acelerada, em razão das condições de altas temperaturas e precipitações pluviais. Da mesma forma, o manejo inadequado do solo pode levar a perda da fertilidade ao longo do tempo. Destacam-se a erosão, a redução dos teores de MO, a acidez ou salinidade e a exaustão de nutrientes do solo provocada pelas retiradas pelas culturas, maiores que pelas adições via adubação, como as principais causas da perda da fertilidade do solo. A baixa fertilidade de um solo pode ser expressa pela elevada acidez, toxidez por Al, baixa reserva de nutrientes como K, Ca e Mg, elevada adsorção de P e baixos teores de matéria orgânica do solo. Fatores Intensidade, Quantidade e Capacidade Tampão As plantas absorvem os nutrientes, na forma de íons, da solução do solo. Por sua vez, na fase sólida é que está a reserva desses íons. Estes são repostos para a solução quando sua concentração é diminuída, decorrente da absorção pelas plantas ou de algum outro tipo de perda. É importante, portanto, conhecer o teor de nutrientes em solução, a reserva desse teor na fase sólida e o poder de reposição dessa reserva para a solução do solo. Estas três grandezas, inter- relacionadas, determinam a disponibilidade dos nutrientes no solo e são denominadas: - Fator quantidade (Q): é a reserva do íon disponível na fase sólida do solo, trocável como o Ca2+, Mg2+, K+ ou lábil como para P, mas em equilíbrio com sua concentração na solução, durante o ciclo de vida das plantas. - Fator Intensidade(I): é a concentração, ou, mais precisamente, a atividade do íon na solução do solo. - Fator capacidade ou capacidade tampão (FC ou CT): é a relação entre os fatores quantidade e intensidade, em dada faixa de concentração (atividade) considerada (∆Q/∆I). O esquema abaixo demonstra essa inter-relação entre os fatores Q, I e Q/I: Da mesma maneira, a figura 7 exemplifica bem essa relação entre os fatores quantidade (Q), intensidade (I) e capacidade tampão (CT) de um nutriente no solo, comparando dois solos (A e B) hipotéticos. Figura 7. Relação entre os fatores intensidade (I) e quantidade (Q) para dois solos hipotéticos, demonstrando a diferença de capacidade tampão para um dado nutriente. Observa-se que o solo A tem maior CT (mais tamponado) que o solo B (∆Q/∆I do solo A > ∆Q/∆I do solo B – Figura 7). Na prática, pode-se dizer que, para a mesma dose de P aplicada nos dois solos, o aumento da concentração de P em solução (I) será maior no solo B do que no A. Uma possibilidade para justificar isto seria o solo A ser mais argiloso que o solo B, mantendo-se a mesma qualidade (atividade) de argila para ambos os solos. Outra maneira de representar a inter-relação entre os fatores I, Q e CT é por meio de um sistema de vasos comunicantes (Figura 8). Figura 8. Esquema de vasos comunicantes representando os fatores intensidade (I), quantidade (Q), o inverso do fator capacidade (∆I/∆Q) e também formas do nutriente em estudo que não encontra-se em equilíbrio com I, também conhecido como não-lábil (Ñ-Q). Verifica-se, nessa representação, que a quantidade trocável ou lábil (adsorvido ou Q), do elemento E (um elemento qualquer) está em equilíbrio com a quantidade em solução (I) deste elemento. A tubulação que liga esses dois compartimentos representa (∆I/∆Q, ou o inverso da CT; logo, quanto maior o diâmetro da tubulação, menor a CT para o elemento (caso do solo arenoso) em relação a um menor diâmetro (solo argiloso, como comparação). A quantidade total de nutriente no solo disponível à planta é igual a Q+I. Como o valor de I é muito menor que o de Q, nas determinações de Ca trocável ou de P-lábil de um solo, que representam medidas de Q, a contribuição de I pelo seu valor muito pequeno, não altera para fins práticos o valor de Q. A quantidade máxima que pode atingir Q, em dado solo, é dada pela CTC desse solo, para elementos trocáveis com ligação eletrostática como Ca2+, Mg2+, K+, Na+ e pela capacidade máxima de adsorção do elemento (CMAE) por esse solo, para elementos com ligações covalentes (adsorção específica), como o P e Zn, dentre outros. O equilíbrio entre Q e I indica que, quando o solo tiver seu valor máximo de Q de um elemento, ele terá também seu valor máximo de I; logo quando Q tende para zero, I também tende a zero. O diâmetro da tubulação da figura acima será muito maior para elementos adsorvidos por troca iônica que para aqueles adsorvidos por covalência. O “transporte” indica que, para uma planta absorver um nutriente, não basta que o solo seja capaz de cedê-lo; é necessário que o nutriente seja transportado desde a solução, próximo às partículas sólidas do solo, até à solução junto à raiz. Resposta à adubação As plantas respondem ao aumento da concentração de nutrientes disponíveis no solo e tal aumento é consequência das doses aplicadas de fertilizantes. A resposta à adubação pode ser representada nos gráficos A, B ou C da Figura 9. Existe ainda situações em que podemos observar a ausência de resposta ou resposta nula à adubação (D). (A) Pr od u ç ã o (k g/ ha ) 0 200 400 600 800 (B) (C) Dose do nutriente (kg/ha) 0 50 100 150 200 250 300 Pr od u ç ã o (k g/ ha ) 0 200 400 600 800 (D) Dose do nutriente (kg/ha) 0 50 100 150 200 250 300 Figura 9. Resposta das culturas à adubação. A: resposta linear; B: resposta curvilinear platô; C:resposta quadrática e D: resposta nula A análise, interpretação e compreensão da resposta à adubação, baseiam-se nos seguintes princípios: Restituição “para manter a fertilidade do solo, deve-se restituir os nutrientes absorvidos pelas plantas e exportados com as colheitas mais os perdidos no solo, ou seja, aqueles que não foram reciclados” Restrição: eficiente e adequada desde que o solo tenha uma boa fertilidade Lei do mínimo (Liebig 1862) “cada campo pode conter a disponibilidade mínima de um mínimo de um ou mais nutrientes. Com esse mínimo, seja calcário, K, N, ácido fosfórico, magnésio ou qualquer outro nutriente, as produtividades apresentam uma relação direta com o suprimento deste nutriente em menor disponibilidade. Este é o fator que governa e controla ... produtividades. Se o mínimo for calcário a produtividade será a mesma e não maior mesmo se as quantidades de K, sílica, ácido fosfórico, etc ... sejam aumentados em cem vezes”. Os rendimentos das colheitas são proporcionais à disponibilidade do nutriente que se encontra em menor quantidade no solo, conforme as necessidades das plantas (Voisin, 1963). Conforme a Lei do mínimo a resposta é linear até um ponto onde se alcança um "plateau" devido à insuficiência de outro nutriente que, então, se torna o limitante (visão quantitativa) representada na figura 10. Figura 10. Modelo ilustrativo da lei do mínimo Restrições da Lei do mínimo • Em condições de campo são vários os nutrientes ou fatores que limitam a produção, além da ação de suas interações • Nem sempre é suficiente para explicar as respostas a adubação Incrementos decrescentes (Mitscherlich, 1930) “Os aumentos de produção de uma cultura, obtidos pela adição de quantidades crescentes de um nutriente, são decrescentes”, conforme ilustra a figura 11 e o quadro 3. Dose do nutriente (kg/ha) 0 50 100 150 200 250 300 Pr od uç ão (k g/ h a ) 100 200 300 400 500 600 700 800 dx1 dx2 dx3 dx4 dx5 dx6 dy1 dy2 dy3 dy4 Produtividade de máxima eficiência econômica dy1 > dy2 > dy3 > dy4 Figura 11. Produção em função da dose aplicada do nutriente. Na medida em que se aumenta a dose de fertilizante os incrementos de produtividade são cada vez menores. Quadro 3. Produção de algodão em função da adubação nitrogenada. Resultados médios de 15 experimentos em Latossolo Vermelho Incremento da dose de N Produção de algodão Aumento Incremento da dose de N (kg/ha) Pr o d uç ão d e al go d ã o (k g/ h a ) 1700 1800 1900 2000 2100 2200 2300 0 10 10 10 10 10 10 ----------------kg/ha---------------- 0 1790 - +10 1934 144 +10 2032 98 +10 2099 67 +10 2146 47 +10 2177 31 +10 2199 22 • Interação/equilíbrio “Cada nutriente é mais eficaz quando os outros estão em quantidades mais próximas do ótimo”. Ganhos em produtividades poderão ocorrer quando os nutrientes estão em quantidades equilibradas no solo (Figura 12). Dose de N (kg/ha) 0 10 20 30 40 50 60 Pr od uç ão ( k g/ ha ) 1700 1800 1900 2000 2100 2200 2300 Efeito do N sem P 100 k g/ha P Interaç ão NxP Figura 12. Modelo ilustrativo da interação N e P e ganho de produtividade. Lei do máximo “O excesso de um nutriente no solo reduz a eficácia dos outros e, por conseguinte, pode diminuir a produção”, conforme demostrado na figura 13. Destaca-se uma região de aumento linear (a); de estabilização (b) e de decréscimo da produção (c). Figura 13. Modelo quadrático de resposta à adubação indicandoredução de produtividade nas maiores doses do nutriente. EXIGÊNCIAS NUTRICIONAIS DAS PLANTAS Os nutrientes são elementos químicos de específica e essencial função fisiológica no metabolismo de plantas (Epstein, 1965; Marschner, 1995). Dezessete elementos são considerados essenciais para o crescimento e desenvolvimento das plantas: carbono (C), hidrogênio (H), oxigênio (O); nitrogênio (N), fósforo (P), potássio (K), cálcio (Ca), magnésio (Mg), enxofre (S), boro (B), cloro (Cl), cobre (Cu), ferro (Fe), manganês (Mn), molibdênio (Mo), níquel (Ni) e zinco (Zn). Outros elementos são classificados como benéficos para algumas plantas, como o sódio (Na), silício (Si), selênio (Se) e cobalto (Co). Carbono, H e O (3) são estudados nas suas múltiplas funções na fisiologia vegetal. Sob o ponto de vista da nutrição mineral, os elementos essenciais são classificados em macro e micronutrientes, de acordo com as quantidades exigidas pelas plantas. Os macronutrientes (N, P, K, Ca, Mg e S) (6) são exigidos em maiores quantidades (da ordem de g/kg de matéria seca da planta). Já os micronutrientes (B, Cl, Cu, Fe, Mn, Mo, Ni e Zn) (8) são absorvidos pelas plantas em pequenas quantidades (da ordem de mg/kg de matéria seca da planta). Na figura 14 são destacados os elementos químicos essenciais às plantas. Figura 14. Tabela periódica dos elementos químicos essenciais às plantas: macronutrientes; micronutrientes Critérios de essencialidade Nutrientes são elementos essenciais às plantas. Para que um elemento seja classificado como essencial, deve satisfazer alguns critérios (Arnon & Stout, 1939): Critério 1: Um elemento é essencial se sua deficiência impede que a planta complete o seu ciclo vital; Critério 2: Para ser essencial, o elemento não pode ser substituído por outro elemento com propriedades similares; Critério 3: O elemento deve participar diretamente no metabolismo da planta. “A presença de elementos químicos nas cinzas de uma planta não é indicador da essencialidade dos diferentes elementos para esta planta” Resumindo, nutriente é um elemento considerado essencial quando ele faz parte de uma molécula essencial ao metabolismo da planta. É o caso do Mg, como constituinte da clorofila, ou do N, como constituinte de proteínas. Assim, mesmo que um elemento possibilite melhorar o crescimento ou um processo fundamental de uma planta, não é considerado como essencial se não atender aos três critérios da essencialidade. Todos os 17 elementos apresentados (Quadro 4) cumprem estas exigências e devem ser fornecidos às plantas para que estas germinem, cresçam, floresçam e produzam sementes. Quadro 4. Relação dos elementos essenciais às plantas superiores, com as concentrações médias na matéria seca da parte aérea e os respectivos autores que demonstraram a essencialidade e o ano em que ocorreu a descoberta As plantas absorvem íons da solução do solo conforme descritos no quadro 5. Quadro 5. Nutrientes e as formas químicas como são absorvidas pelas plantas Macronutrientes Forma absorvida Micronutriente Forma absorvida N NO3 - ou NH4 + Cu Cu2+ P H2PO4 - ou HPO4 2- Mn Mn2+ K K+ Zn Zn2+ Ca Ca2+ Fe Fe2+, Fe3+, Fe-quelato Mg Mg2+ B H3BO3; H2BO3 - Mo MoO4 - S SO4 2- Ni Ni2+ Cl Cl- Para bom desenvolvimento e crescimento vegetal é necessário que haja disponibilidade e absorção dos nutrientes em proporções adequadas. Desequilíbrios em suas proporções podem causar deficiência ou excesso de nutrientes, causando limitações ao crescimento das plantas ou mesmo sua morte. Diagnose visual de sintomas de deficiência nutricional Os sintomas de deficiência de nutrientes em diferentes espécies podem ser utilizados para diagnosticar o estado nutricional das plantas. A essa técnica de diagnóstico dá-se o nome de diagnose visual. A observação de sintomas é uma forma rápida e pouco dispendiosa de diagnóstico do estado nutricional, porém sua principal limitação refere-se ao fato de que, quando há manifestação visível de sintomas de carência ou de excesso, expressiva parte da produção das plantas já está comprometida. “o aparecimento do sintoma representa o estádio tardio de um processo no qual o crescimento e a produção podem sofrer perdas irreversíveis”. A diagnose visual requer uma análise criteriosa dos fatores bióticos e, ou, abióticos que possam alterar o estado nutricional da planta ou induzir padrões de danos similares à deficiência ou toxidez de nutrientes. Neste sentido, destacam-se a deficiência ou excesso do suprimento de água, variações bruscas de temperatura, textura e compactação do solo, reações entre misturas de produtos fitossanitários, toxidez causada por herbicidas, senescência natural de folhas, ataque de pragas e doenças, práticas de cultivo inadequadas, dentre outros fatores. Na avaliação das desordens nutricionais devem ser observados ao menos três critérios: Evolução no tempo: relaciona-se ao período em que as reservas dos vacúolos estão sendo utilizadas Evolução no espaço: relaciona-se à mobilidade diferencial dos nutrientes na planta (no floema) havendo um gradiente de intensidade das folhas velhas para as jovens em caso de nutrientes móveis no floema e, o contrário, para os imóveis. Simetria: tecidos de mesma idade fisiológica devem mostrar o mesmo sintoma, em condições de deficiência nutricional Esses critérios devem ser utilizados, em conjunto, para melhor discernir se o sintoma é devido primariamente à deficiência nutricional ou se deve a outras causas, de natureza não nutricional primariamente. A seguir, serão descritos os sintomas de deficiência mais comuns relacionados com a carência de macro e micronutrientes. Nitrogênio Sua falta se traduz em plantas pequenas e de crescimento lento. O sintoma típico da falta de N é a clorose (amarelecimento) generalizada (uniforme) de folhas. Como é um elemento que se move no floema, o sintoma aparece primeiro nas folhas mais velhas, progredindo, com o tempo, para as mais novas. Fósforo Plantas deficientes apresentam crescimento mais lento e, frequentemente, coloração verde escura nas folhas mais velhas. Em muitos casos, o progresso da deficiência leva ao surgimento de coloração avermelhada em caules e folhas velhas. Os sintomas progridem das folhas mais velhas para as mais novas, porque, assim como o N, o P é um elemento bastante móvel no floema. A cor avermelhada é causada pela concentração de antocianina. Potássio A deficiência de K retarda o crescimento e aumenta a susceptibilidade ao ataque de patógenos, havendo retranslocação de K de folhas velhas e caules para as regiões de cresci- mento ativo. Os sintomas de carência caracterizam-se por clorose e necrose de bordos foliares. Murcha e quebra dos caules também caracterizam a deficiência de K. Cálcio Seu movimento de ascensão acompanha o fluxo transpiratório pelo xilema. Por ter funções estruturais, não é remobilizado no floema para atender à demanda em locais de crescimento ativo da parte aérea ou da raiz. O sintoma típico de deficiência de Ca é a má formação das paredes celulares e o colapso dos tecidos jovens. Magnésio Sua deficiência caracteriza-se, tipicamente, por uma clorose internerval das folhas totalmente expandidas - mais velhas. Enxofre Sua carência manifesta-se por clorose generalizada, muito semelhante à que ocorre com deficiência de N, porém, iniciando-se em folhas mais jovens. Ferro Os sintomas de deficiência se manifestam como clorose e, às vezes, assemelha-se à deficiência de Mg, com a diferença de que, para o Fe, os sintomasde carência se manifestam sempre nas folhas mais novas. De modo geral, as folhas jovens mostram nervuras verdes sobre um fundo amarelado. O sintoma evolui para o completo branqueamento das folhas jovens, seguindo-se necrose. Manganês Para dicotiledôneas, a deficiência assemelha-se à de Fe, caracterizando-se por clorose internerval de folhas jovens, que se inicia por surgimento de pontuações amareladas. Já nas monocotiledôneas, manifesta-se como faixas verdes cinzentas na parte basal das folhas. Pode ocorrer em altas concentrações em solos minerais ácidos causando toxidez, que se caracteriza por enrugamento de folhas jovens, clorose e pontuações necróticas na lâmina de folhas velhas. Os pontos necróticos correspondem a locais de acúmulo do elemento. Boro Sua deficiência caracteriza-se por crescimento lento e anormal das regiões meristemáticas. Em fase avançada, ocorre morte de meristemas apicais, superbrotamento e folhas jovens grossas e deformadas, bem como podridão, cavidades e rachaduras em raízes, como beterraba e cenoura. Formação de cortiça pode ocorrer em caules de tomate e couve-flor. A formação de flores e frutos é restrita ou totalmente inibida, havendo também perda da qualidade. As brássicas são particularmente sensíveis à carência de B. Para o B, o limite entre a carência e a toxidez é estreito, e os sintomas de toxidez caracterizam-se por amarelecimento das pontas e margens das folhas mais velhas, seguido de necrose e queda. Cobre Os sintomas de deficiência variam bastante entre espécies. As folhas jovens podem apresentar-se cloróticas ou verde-azuladas. Devido seu papel na lignificação, em condições de deficiência, as cascas das árvores podem apresentar rachaduras com exsudação de goma nesses pontos. O florescimento e a frutificação são também diminuídos. Os efeitos tóxicos do Cu, por sua vez, parecem relacionar-se com sua capacidade de deslocar outros cátions metálicos, especialmente Fe, de sítios fisiologicamente importantes. Assim sendo, clorose que lembra deficiência de Fe pode ser sintoma de toxidez de Cu. Molibdênio A deficiência caracteriza-se por clorose internerval de folhas jovens, semelhante à deficiência de Mn. As margens das folhas tendem a enrolar-se ou curvar- se para cima ou para baixo. Nas brássicas, a lâmina foliar constitui uma faixa estreita em torno da nervura principal, conhecida como “ponta de chicote”. Zinco A carência do elemento leva a reduções na produção de auxina, responsável pela elongação de ramos, sendo as folhas pequenas e a formação de rosetas sintomas típicos da carência desse elemento. O florescimento e a frutificação podem ser muito reduzidos em condições de deficiência severa de Zn. A toxidez caracteriza-se por redução do crescimento de raízes e da expansão foliar, ao que se segue clorose. Cloro A deficiência de Cl caracteriza-se por murcha, bronzeamento, clorose e necrose, porém não tem importância econômica, pois nunca foi observada em campo. Por outro lado, a toxidez de Cl pode representar sério problema caracterizado por bronzeamento e necrose de pontas e margens de folhas velhas, seguidos de amarelecimento e abscisão prematura. Niquel O Ni é constituinte da uréase e sua deficiência inibe a ação da enzima, levando ao acúmulo de ureia, o que causa manchas necróticas nas folhas. Os sintomas de deficiência de Ni incluem clorose internerval das folhas jovens, podendo evoluir para necrose do ápice das folhas. CONTINUUM SOLO-SOLUÇÃO-PLANTA Os nutrientes na solução do solo estão em equilíbrio com os colóides do solo, minerais e orgânicos, que podem retê-los de forma trocável (CTC e CTA), formas não trocáveis ou não lábeis (K fixado em argilas silicatadas 2:1; P fixado em formas não-lábeis, etc.) ou formar complexos estáveis com a matéria orgânica do solo. Os nutrientes em concentrações elevadas, que ultrapassam o produto de solubilização, podem ser precipitados, a partir de suas formas iônicas da solução do solo. Com relação às perdas dos nutrientes da solução do solo elas podem ocorrer por meio de erosão, lixiviação e perdas gasosas (desnitrificação e volatilização de NH3, por exemplo). Essas interfaces da solução do solo (fase líquida) com a fase sólida (mineral e orgânica) e com a planta, e ganhos e perdas de seus componentes estão representados na figura 15. Os nutrientes na solução do solo poderão ter suas concentrações diminuídas pela absorção pelas plantas. Para manter o equilíbrio, ocorre a reposição pela fase sólida. Além disso, a solução do solo pode ter ganhos de nutrientes por meio da aplicação de fontes de nutrientes, minerais (fertilizantes) ou orgânicos (adubos), fixação livre ou simbiótica do N2 atmosférico, e pelas chuvas. Figura 15. Modelo do sistema solo-solução-planta Mecanismos de transporte de nutrientes na solução do solo A absorção de nutrientes pelas plantas exige seu transporte até a superfície radicular (Figura 16), com destaque para os mecanismos de fluxo de massa (transporte convectivo) e difusão (transporte difusivo) (Fried & Shapiro, 1961). A intercepção radicular, sugerido por Barber (1962), não é considerado um mecanismo transporte de nutrientes, pois, atualmente, não é aceita a possibilidade de trocas diretas entre as partículas do solo e as raízes das plantas, havendo necessidade do meio líquido para que a absorção pelas raízes ocorra. Figura 16. Ilustração do transporte de nutrientes no solo. O fluxo de massa está associado ao gradiente de potencial total que regula o movimento da água no sistema solo-planta-atmosfera (Figura 17). Assim, a concentração do íon na solução do solo e a taxa de transpiração do vegetal determinam a quantidade de íons transportada por meio desse mecanismo (Barber, 1974). Elementos que se encontram em maiores concentrações na solução do solo, como Ca, N e mesmo o S são transportados preferencialmente pelo fluxo de massa. Matematicamente, o transporte de nutrientes por fluxo de massa (FM, kg/dm-2/s) é dado pela equação: qCFM (1) em que q: fluxo de massa, dm3 dm-2 s-1; e C: concentração média do soluto, kg dm-3 Figura 17. Esquema ilustrativo do transporte de nutrientes por fluxo de massa A difusão, por sua vez, se deve ao movimento dos íons em meio líquido em função do gradiente de concentração (Figura 18). Esse movimento da maior para a menor concentração deve- se à formação de uma zona de depleção do nutriente nas regiões de absorção da raiz. Quando o fluxo de massa não é capaz de satisfazer a demanda das plantas por determinado nutriente, o transporte por difusão entra em ação e completa seu requerimento. Isso ocorre para os nutrientes que encontram-se em baixas concentrações na solução do solo, como P, K e Zn. A adaptação das leis de Fick para solos permitiu quantificar o transporte difusivo. A primeira lei de Fick pode ser escrita na forma: CDF em que F: fluxo do nutriente, kg dm-2 s-1; D: coeficiente de difusão, dm2 s-1; e C : gradiente de concentração, kg dm-3 dm-1. D=coeficiente de difusão (dm2 s-1) D1=coeficiente de difusão do elemento em agua pura (dm2 s-1) = conteúdo volumentrico de agua no solo (dm3 dm-3) f=fator de impedancia (adimensional) I/Q=inverso do fator capacidade (2) Figura 18. Esquema ilustrativo do transporte de nutrientes por difusão. Na prática, dada as dificuldades de quantificar as variáveis envolvidas no fluxo difusivo de nutrientes no solo, a quantidade do nutriente transportada por difusão é obtida pela diferença entre a quantidade acumulada do nutriente na planta (conteúdo– biomassa total da planta multiplicado pelo teor do nutriente nessa biomassa) e quantidade transportada por fluxo de massa (volume de água transpirado pela cultura durante o seu ciclo multiplicado pela concentração do nutriente na solução do solo). A disponibilidade de água no solo afeta grandemente o transporte de nutrientes, seja por fluxo de massa ou difusão. A falta de água no solo afeta a aquisição de nutrientes pelas raízes e por essa razão os sintomas de deficiência nutricional são mais comuns nos períodos secos do ano, diminuindo em intensidade ou desaparecendo durante os períodos chuvosos. A figura 19 ilustra o caminho a ser percorrido pelo nutriente conforme o preenchimento de água nos poros do solo (mais ou menos água disponível). Comente: a) O caminho pontilhado e contínuo do nutriente e as implicações na nutrição da planta. Figura 19. Modelo ilustrativo do transporte de nutriente por diferentes poros do solo O fósforo é um nutriente transportado principalmente por difusão e esse processo é afetado por diversos fatores. A difusão de P em solos mais intemperizados parece ser praticamente interrompida em condições de umidade ainda, aparentemente, elevadas. A elevada capacidade de adsorção de P neste tipo de solo, caracterizada por baixo valor de I/Q, parece ser a razão, conforme ilustrado pela figura 20. Figura 20. Influência do conteúdo de água sobre a difusão dos nutrientes no solo. As menores respostas à adubação observadas em nossos solos, com os anos de cultivo, seriam, em boa parte, resultantes da degradação das propriedades físicas desses solos, levando ao aumento de suas densidades e, como consequência, à retenção com maior energia pelo solo de nutrientes com menores coeficientes de difusão. Com a compactação, aumenta a participação de microporos; com o aumento da energia de retenção da água no solo, aumenta sua viscosidade e a interação desses íons com os colóides ao longo de sua trajetória de difusão, fazendo com que o íon tenha de se difundir cada vez mais próximo de superfícies adsorventes, que os retêm. Para que o íon continue chegando até às raízes, doses cada vez maiores terão de ser aplicadas, com vistas em aumentar a saturação nessas superfícies adsorventes pelo elemento e em manter o fluxo difusivo em níveis pelo menos razoáveis, em termos de demanda da planta. A figura 21 ilustra o efeito da compactação no transporte e disponibilidade de P e no crescimento da planta. Figura 21. Efeito da compactação sobre a difusão e disponibilidade de P no solo. D=densidade do solo de 0,9 a 1,3 kg dm-3 e mesma dose de P aplicada (450 mg dm-3). Nutrientes com menores coeficientes de difusão (P e Zn, por exemplo) são, de modo geral, mais críticos na fase inicial de crescimento da planta, dado o pequeno volume de solo explorado pelas raízes, bem como o não-estabelecimento da micorrização. Contrariamente, a demanda de nutrientes de maior mobilidade, como NO3 - e K+, é crítica mais tarde, coincidente com estádios de crescimento de maior demanda. Outro aspecto importante relacionado com a mobilidade dos nutrientes no solo diz respeito a competição das raízes por nutrientes. Observa-se que, à medida que aumenta a densidade de plantio ou população de plantas, a competição pelo nutriente mais móvel aumenta grandemente, o que não acontece para o nutriente “imóvel” (Figura 22). A competição pelo “imóvel” somente vai existir em pequena ou mínima intensidade, uma vez que sua distância de transporte é algo não mais que 1 mm de distância da raiz. Assim, apenas naqueles locais onde raízes de duas plantas se tocam haverá competição entre elas pelo H2PO4 -. Como o volume de solo explorado pelas raízes de uma planta é, em média, 1 %, o contato de raízes entre plantas vizinhas é bastante pequeno. Disso, pode-se dizer que a quantidade de P a ser utilizada em um plantio de milho com 40 000 plantas/ha será, basicamente, a mesma a ser utilizada se essa população for aumentada para 60 000 plantas/ha, para produtividades semelhantes nas duas condições. Para N, esse aumento na densidade de plantio de milho requererá um aumento expressivo na sua dose, comparativamente à recomendada para a menor densidade. Figura 22. Competição entre plantas por nutrientes móveis e imóveis no solo. Amostragem de solo e planta para fins de avaliação da fertilidade do solo O procedimento de amostragem se faz necessário quando da impossibilidade ou impraticidade de se medir toda a população. Neste caso, as amostras são tomadas com objetivo de representar a população. Se a população em estudo for constituída de indivíduos idênticos (totalmente homogênea), bastaria a avaliação de um deles para caracterizá-la. Como existem variações entre indivíduos da população, a amostragem deve medir um número suficiente de indivíduos de modo a representar sua população. Dessa forma, o número de amostras (n) depende fundamentalmente da variabilidade e não do tamanho da população. O valor médio (ȳ) de uma determinada característica de uma amostra é representado pela média real ou paramétrica (), mais um erro (ε), conforme a equação: ȳ = +ε O erro na estimativa da média pode ser devido ao erro de amostragem (εam), por exemplo quando é tomado número insuficiente de indivíduos e ao erro analítico (εan), devido ao método de medição. Assim, ε = εam+ εan Em geral, o erro de amostragem é maior que o erro analítico. Isso torna o processo de amostragem muito mais influenciador na exatidão dos valores obtidos. Assim, uma amostra não representativa da população não representará satisfatoriamente, por maior que seja a acurácia do método de medição. Amostragem de solo A amostragem do solo é a primordial etapa para avaliação da fertilidade do solo e recomendação de fertilizantes. O solo é uma população naturalmente heterogênea nas suas características e as variações ocorrem intensamente e a curtas distâncias. Essas variações são classificadas como macro (> 200 cm); meso (5-200 cm) e microvariações (<5 cm). As macrovariações decorrem de processos pedogenéticos, mas podem ser acentuadas pelo manejo do solo. Tais variações dependem da topografia, vegetação, textura e mineralogia do solo e do tipo de manejo. As meso e microvariações, que também decorrem de fatores de formação do solo, são mais intensificadas pelas práticas de manejo, tais como preparo do solo, aplicação localizada de fertilizantes, plantio em linhas, etc. As microvariações são importantes para culturas de menor extensão do sistema radicular, como aquelas de ciclo curto, e devem ser pouco relevantes para culturas perenes de porte arbóreo, pela maior extensão do sistema radicular. A heterogeneidade ocorre também no sentido vertical (profundidade), pela organização do solo em horizontes, muitas vezes com transições abruptas. As práticas de manejo, como adubação e a localização do sistema radicular das plantas podem acentuar as variações entre as camadas do solo. A profundidade de amostragem deve ser definida de acordo com a cultura que está sendo ou será cultivada na gleba. Deve-se amostrar a camada de solo que será explorada pelo maior volume do sistema radicular da planta que, usualmente, é associado à profundidade de preparo do solo. Para plantio de culturas anuais ou de estabelecimento de pastagens, amostra-se a camada de 0–20 cm; para pastagens já estabelecidas, a amostragem pode ser de 0–10 cm e, para culturas perenes (café, fruteiras, essências florestais, etc.), a amostragem deve ser feita por horizontes do solo. Por falta de informações de horizontes, usualmente define-se camadas para a amostragemcomo, por exemplo: 0–20, 20–40 e 40–60 cm, constituindo uma amostra composta horizonte ou por camada por gleba. A variabilidade não é uniforme entre as características do solo. O pH do solo, o teor de argila e MOS são características que apresentam menor variabilidade (menor coeficiente de variação-CV), comparados aos teores de P, K e Ca, como demostrado no quadro 6. Quadro 6. Coeficiente de variação (CV) de características química do solo em três regiões distintas Local P K Al3+ Ca + Mg MO pH -------------------------------------- %--------------------------------------- Viçosa-MG 142 5 P > K > Ca+Mg > Al > MO > pH Cascavel-PR1 100 7 P > Ca > Mg > Al > K > MO > pH Ponta Grossa-PR1 40 7 P > Mg > K > Ca > Al > MO > pH 1Fonte: Alvarez V. & Carraro (1974) Como princípio, a amostragem visa obter a média da fertilidade do solo de uma determinada área ou prover informações da estimativa da variabilidade dos nutrientes. Nesse sentido, o esquema de amostragem pode ser dividido em duas categorias: ao acaso e sistematizada. Amostragem ao acaso (sistema convencional) 1º passo: dividir a área em unidades de amostragem-UA(glebas ou talhões) Neste método de amostragem considera-se que os teores dos nutrientes no solo apresentam variações aleatórias. Uma etapa importante nesse processo de amostragem é a definição de áreas mais homogêneas (glebas) quanto a topografia, cobertura vegetal natural ou uso agrícola, textura, cor, condições de drenagem do solo e histórico de manejo. Dentro da gleba, a variabilidade é menor e permite a estimativa da fertilidade média do solo com um menor número de amostras. A figura 23 demonstra a definição de glebas, de acordo com relevo e a alocação dos pontos de forma aleatória, num caminhamento em zig-zag. Isso somente é possível em áreas menores, normalmente inferior a 10 ha. Em maiores extensões de terra, quando as glebas são também maiores, o uso de ferramentas de geoprocessamento é imprescindível. A figura 24 demostra o uso de imagem georreferenciada para definição de glebas conforme cobertura vegetal e histórico de uso da área e alocação de pontos de coleta para localização com auxílio de GPS. Figura 23. Exemplo de separação de glebas e caminhamento em zigue-zague para coleta das amostras simples. Figura 24. Exemplo de separação de glebas com imagem georreferenciada e alocação de pontos de coleta para localização com auxílio de GPS. Por mais uniforme que seja a gleba, haverá, sempre, a variabilidade intrínseca ao solo – meso e microvariações. As características químicas, em especial, têm intensa variabilidade a curtas distâncias no solo. Para isso são retiradas várias amostras denominadas “amostras simples”, cuja mistura homogênea irá formar a “amostra composta” a ser enviada ao laboratório. São condições fundamentais que cada amostra simples tenha o mesmo volume de solo e a mistura seja o mais homogênea possível. As amostras simples devem ser colocadas em recipientes plásticos, para evitar a contaminação com metais, muito bem homogeneizadas, obtendo-se então a “amostra composta”. Uma porção de aproximadamente 0,5 dm3 de solo deve ser colocada em sacos plásticos ou caixa de papel, identificada e enviada para o laboratório para análise. Caso seja necessário o preparo da amostra antes do envio para o laboratório, esta deve ser seca a sombra sobre papel e passada sua totalizada por uma peneira com malha de 2 mm para obtenção da terra fina seca ao ar (TFSA). O número de amostras simples é definido a priori de acordo com as características de maior variabilidade. Alguns trabalhos mostram que são necessárias no mínimo 20 a 40 amostras simples por gleba para representar a média das características do solo. Esse número deve aumentar à medida que as condições naturais ou o manejo imprimam maior variabilidade nas características do solo, tais como plantio direto (pelo não revolvimento do solo), aplicação localizada de corretivos e fertilizantes e da decomposição localizada de resíduos orgânicos. O número de amostras para representar a média de uma característica com variância conhecida (CV) pode ser calculado pela seguinte equação: n=(t/2 CV/f) 2 em que: n=número de amostras simples t/2=valor tabelado da distribuição t de students CV=coeficiente de variação (%) f= variação tolerada em torno da média (%) Exemplo: utilizando os CV para P (100 %) e pH (7 %) no solo da região de Cascavel-PR (Quadro 6), e admitindo uma variação de 25 % em torno da média e um valor de t tabelado igual 2, tem-se: P n = (2x 100/25)2 = 64 amostras pH n = (2x 7/25)2 = 1 amostra Observa-se que um grande número de amostras (64) deveria ser coletado para caracterizar o teor de P do solo (maior variabilidade) e, bastaria uma amostra para caracterizar o seu pH (menor variabilidade), para um mesmo limite de variação em torno da média. Sabe-se que o erro amostral diminui na medida que se aumenta o número de amostra, conforme demostrado na figura 25. Número de amostras simples/compostas 20 40 60 80 100 120 va r ia çã o do s er ro s (% ) 0 10 20 30 40 50 Figura 25. Variação do erro amostral em função do número de amostras Uma diferenciação importante no método de amostragem ao acaso tem sido verificada em sistemas de plantio direto, onde são observadas maiores variabilidades das características do solo pela aplicação localizada de fertilizantes e ao não-revolvimento do solo por meio da aração e gradagem. Neste caso, tem sido recomendada a coleta não de um único ponto, mas de uma faixa ou vários pontos localizados transversalmente à linha de plantio, de modo a representar a média da fertilidade entre a linha de plantio (influência direta da adubação anterior) e a metade da entrelinha (pouco influenciada pela adubação anterior), conforme ilustra a figura 28. A adubação de culturas perenes também implicará num procedimento de amostragem apropriado. As amostras simples devem ser coletadas na área sob a projeção da copa (figura 29), onde, usualmente, são feitas as adubações, há maior crescimento de raízes e maior influência da queda de resíduos. Figura 28. Amostragem em sistema de plantio direto mostrando a coleta transversal na linha de adubação. Figura 28. Amostragem de solo em áreas de culturas perenes e arbóreas. Amostragem sistematizada (Agricultura de Precisão) Neste método de amostragem considera-se que os teores dos nutrientes no solo apresentam variações espaciais, com gradientes de concentração, e, portanto, busca-se conhecer e corrigir diferenciadamente a área de plantio. Para a coleta das amostras de forma sistemática são definidos grids (quadrados ou retangulares) em um mapa ou imagem georreferenciada, conforme ilustra a figura 29. Os pontos de amostragem dentro de cada grid (malha) podem ser definidos previamente ou coletados aleatoriamente. O GPS tem sido ferramenta fundamental na identificação dos pontos a serem coletados no campo. Com os resultados de análise de solo de cada amostra, são confeccionados mapas da fertilidade do solo (Figura 30) e a aplicação de corretivos e fertilizantes passa a ser em dose variável. O espaçamento dos grids para amostragens de solo é variável. Normalmente são usadas espaçamentos de 60 x 60 m a 150 m x 150 m, dependendo da exatidão desejada e dos custos. A definição de grids, normalmente grandes, e a coleta de apenas um ponto central (Figura 29 a), ou poucos pontos próximos a este (Figura 29 b), são insuficientes para conhecer de forma confiávela média da fertilidade da área considerada. Assim, poderá existir uma imprecisão na estimativa da fertilidade média a qual o grid representa. Por outro lado, a definição de grids com menor tamanho e a coleta de um número maior de amostra dentro de cada um deles aumenta a exatidão do resultado da análise de solo, com boa representatividade (Figura 29 c), da mesma forma que aumenta os custos com a coleta e análise de solo. Figura 29. Amostragem sistematizada de solo em sistema de “agricultura de precisão”. Procedimento de amostragem dentro de cada grade a) baixa representatividade; b) não satisfatório; c) boa representatividade. Figura 30. Mapa ilustrativo da fertilidade de P do solo. Os teores de P apresentam variações espaciais e não aleatório na área. Ferramentas para coleta de amostras de solo Considerando que se busca estimar a fertilidade média e que esta será obtida de uma amostra composta, todas as amostras simples devem ter o mesmo volume de solo e coletadas na mesma profundidade. Isto é conseguido pelo uso de trados ou sondas específicas para amostragem de solo (Figura 31), devendo se evitar enxadão ou pá para este fim. Figura 31. Exemplos de ferramentas utilizadas para amostragem de solo. Tipos de trados da esquerda para direita: tipo rosca, calador, holandês, caneco, sonda. No centro: furadeira adaptada para coleta de solo e a direita: Quadriciclo adaptado para coleta de solo. A interdependência entre resultados analíticos, nível crítico, doses, formas de aplicação e amostragem é o ponto chave na avaliação da fertilidade do solo. A forma e a dose aplicada poderão alterar o procedimento de amostragem, que irá interferir no resultado e no nível crítico do nutriente no solo, que por sua vez se relacionam com as doses recomendadas. Assim sendo, a avaliação adequada da fertilidade do solo e, por conseguinte, das recomendações de corretivos e fertilizantes advindas do diagnóstico da fertilidade, depende essencialmente de criteriosa amostragem. Isto quer dizer que, a partir de uma amostra não- representativa de um solo, nunca se terá uma adequada estimativa da fertilidade média, por mais exato que seja o método de análise e laboratório. Amostragem de tecido vegetal (folhas) A amostragem de tecido vegetal para diagnose nutricional, normalmente folhas, baseia-se na premissa de que existe uma relação entre os teores de nutrientes disponíveis no solo e os teores de nutrientes na planta, e que, os aumentos ou decréscimos nas concentrações na folha, correspondem aos aumentos ou decréscimos nas produtividades da planta, respectivamente. Essa premissa, com frequência não é observada em plantios comercias. A boa nutrição é condição necessária, mas não suficiente à obtenção de altas produtividades. A amostragem de folhas para diagnóstico nutricional deve ser feita em talhões, áreas com maior homogeneidade dos plantios, em épocas definidas, coletando-se folhas em posições específicas. A diagnose nutricional é feita pela comparação dos teores de nutrientes da lavoura em diagnóstico com valores de referência, normas (Figura 32). É fundamental que as condições de amostragem (época, parte colhida) sejam as mesmas usadas na elaboração das normas. No quadro 7 são apresentadas sugestões para coleta de folhas para algumas culturas. Figura 32. Distribuição da produtividade de lavouras em função da concentração de nutrientes na folha. Discutir a figura 32. “A boa nutrição é condição necessária, mas não suficiente à obtenção de altas produtividades” Quadro 7. Recomendação da amostragem para diagnose foliar Cultura Tipo de folha Época de amostragem Quantidade/talhão homogêneo Cana de açúcar Folha + 3, sendo a folha +1 a primeira com bainha visível. Coletar os 20 cm centrais sem a nervura 4 – 5 meses de idade 20 – 30 folhas Milho Folha oposta e abaixo da espiga Aparecimento da inflorescência (cabelo) 30 folhas Soja 3ª folha a partir do ápice na haste principal, com pecíolo Florescimento 30 folhas Feijão Folhas do terço mediano Florescimento 30 folhas Café 3º e 4º pares de folhas, a partir do ápice de ramos produtivos, em altura mediana na planta Estádio de chumbinho 100 folhas, 4/planta Mamão Folha F, com a primeira flor completamente expandida Florescimento 18 folhas Tomate Pecíolo da folha oposta ao 3º cacho. Limbo foliar da folha oposta ao 3º cacho Florescimento do 3º cacho 40 folhas Eucalipto Folhas recém-maduras de ramos primários Verão - outono 18 folhas Pastagem Folhas recém-maduras ou retiradas de todas as posições na parte aérea Primavera - verão 30 folhas Fonte:5ªaproximação MG,páginas X ANÁLISE QUÍMICA DE SOLO A determinação da quantidade de nutrientes que se encontram no solo em formas disponíveis para as plantas é um dos principais objetivos dos estudos de avaliação da fertilidade do solo. Mas, o que é o disponível? No conceito realístico: É a quantidade do nutriente no solo que pode ser absorvido pela planta durante o seu ciclo de vida. EX: 50 kg/ha de K 400 kg/ha de Ca 2 kg/ha de Zn No conceito operacional: É teor do nutriente recuperado (extraído) por um método de extração que se correlaciona estreitamente com a quantidade do nutriente absorvido pela planta. EX: 70 mg dm-3 de K 2 cmolc dm-3 de Ca2+ 1 mg dm-3 de Zn A análise química do solo baseia-se no uso de extratores (químicos ou resinas de troca) para determinação da quantidade de nutrientes que se encontram no solo em formas disponíveis para as plantas. O que é um extrator químico para análise de solo? Solução composta de água e certa concentração de substâncias químicas (ácidos, bases ou sais) que extraem quantidades de nutrientes (NH4 +, NO3-, K +, H2PO4 -, SO4 2-, Ca2+, Mg2+, Zn2+, Cu2+, Fe2+, H3BO3) da amostra e que apresentem correlação com a quantidade de nutriente absorvida e acumulada (conteúdo) pelas plantas. Os extratores também são usados para determinar os teores de elementos potencialmente tóxicos para as plantas, como o Al3+ e os metais pesados. A figura 33 mostra a correlação (r) entre o teor de P no solo e sua absorção pela planta (conteúdo) para dois métodos (extratores). O método A indica baixa correlação (r=0,31) entre a quantidade extraída pelo extrator e a quantidade do nutriente acumulada na planta (método ruim). Ao contrário, o método B indica alta correlação (0,98) e é eficiente para predizer a disponibilidade do nutriente (P) no solo. Dessa forma, vários métodos foram selecionados e são usados nas análises de solo para fins de fertilidade. Teor de P no solo (mg dm -3 ) 0 10 20 30 40 50 60 Co n te údo de P (m g /p l an ta) 0 20 40 60 80 100 método A r=0,31 Teor de P no solo (mg dm -3 ) 0 10 20 30 40 50 60 0 20 40 60 80 100 r=0,98** método B Figura 33. Correlação entre o teor de P no solo e o conteúdo do nutriente na planta para dois métodos de análises. A (extrator ruim) e B (bom extrator) A correlação assegura que o extrator estime o nutriente disponível, mas não estabelece critérios para o diagnóstico da disponibilidade. Para isso, são realizados ensaios de calibração do método (extrator) para estabelecer critérios de interpretação e definir doses do nutriente. Nos ensaios de calibração são definidas curvas de resposta da planta ao aumento da disponibilidade do
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