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CAP. I ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA E O ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO 1 CAPÍTULO I – ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA E O ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO Estrutura Atômica 1 – Aspectos Gerais O núcleo de qualquer átomo possui duas espécies de partículas: os prótons e os nêutrons. Estas partículas têm aproximadamente a mesma massa. O próton tem carga elétrica +e e o nêutron possui carga elétrica nula. O número de prótons é o número atômico (Z) do átomo, que é igual ao número de elétrons. O número de nêutrons é representado por (N). Logo o número total de nucleons (prótons e nêutrons) é o número de massa (A) do núcleo, ou sejá A = N + Z. 1.1 Estabilidade nuclear Nos núcleos leves, a maior estabilidade nuclear é atingida quando o número de prótons é aproximadamente igual ao número de nêutrons, isto é N ~ Z. Nos núcleos mais pesados, a repulsão eletrostática faz com que a estabilidade seja maior quando os nêutrons são mais numerosos que os prótons. A figura 1 mostra o gráfico de N contra Z para os núcleos estáveis. A reta N=Z é obedecida quando os valores de N e Z são pequenos. Podemos entender melhor esta tendência pela consideração da energia total de X partículas numa caixa unidimensional. A figura 2 mostra os níveis de energia no caso de 8 nêutrons, e no caso de 4 nêutrons e 4 prótons. Em virtude do princípio de exclusão, somente duas partículas idênticas (com spins opostos) podem ocupar um mesmo estado de energia (b). Assim, a energia total no caso de 4 nêutrons e 4 prótons é menor que no caso de 8 nêutrons (ou de 8 prótons) (a). Entretanto, quando se leva em conta a energia de repulsão coulombiana, o resultado se altera, já que essa energia é proporcional a Z2. Neste caso, quando A for grande (e, portanto Z também for grande) a energia total do núcleo cresce menos pela adição de 2 nêutrons do que pela adição de 1 nêutron e 1 próton, em virtude da repulsão eletrostática. 1.2 - Massa e energia de ligação Segundo a teoria relativista a massa de um núcleo não é igual à soma das massas dos nucleons individuais constituintes do núcleo. Quando dois ou mais nucleons se fundem para formar um núcleo, a massa em repouso total diminui e há liberação de energia. Inversamente, para quebrar um núcleo é necessário injetar energia no sistema a fim de aumentar a massa em repouso. A energia envolvida é igual ao produto da variação da massa por c2 (sendo c = velocidade da luz no vácuo). A energia de ligação de um núcleo é exatamente a diferença entre a soma das massas dos nucleons em repouso de um núcleo e a massa deste núcleo em repouso. As massas atômicas e nucleares podem ser expressas em unidades de massa unificada (u), que é definida como 1/12 da massa CAP. I ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA E O ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO 2 do 12C. Como energia em repouso de 1 uma é igual a 931,5 MeV a energia de ligação de um núcleo pode facilmente ser calculada. Consideremos por exemplo o átomo de 4He (2p e 2n): 1p ~ 1,0073 u 1n ~ 1,0087 u 1e ~ 0.00055 u 4He ~ 4,002603 u logo: massa do núcleo do 4He = 4,001503 u ( 4,002603 u - 0.0011* u= 4,001503 u ) massa dos nucleons = 4,032 u ( 2 x 1,0073 + 2 x 1,0087 = 4,032 u ) diferença = 0.030497 u energia de ligação = 0.030497 x 931,5 MeV = 28,40 MeV A figura 3 mostra que acima de um determinado valor de A, há um número fixo de ligações por nucleon, como se cada núcleo fosse atraído pelos seus vizinhos próximos (porção inicial da curva). A lenta diminuição para valores elevados de A, se deve à repulsão coulombiana entre os prótons. Para valores de A maiores que aproximadamente 260 a repulsão é tão grande que o núcleo se torna instável e sofre fissão espontânea. 2 - Partículas elementares Durante certo tempo pensou- se que só existissem três partículas elementares: o próton, o elétron e o nêutron. Entretanto, com a construção de grandes aceleradores de partículas, com energias cada vez maiores, foram descobertas novas partículas que, numa época ou outra foram consideradas elementares. Nos dias de hoje, conhecem-se várias centenas de partículas (quadro 3). Além das propriedades usuais das partículas, como massa, carga e spin, descobriram-se novas propriedades como estranheza, charme e cor. Sendo assim classificadas: hádrons, léptons e bósons. 2.1 - Hádrons São partículas compostas por quarqs, que compõe o avanço teórico mais importante no entendimento das partículas elementares. De acordo com este modelo os prótons e nêutrons seriam constituídos pelas combinações de três partículas realmente elementares, os quarqs. No modelo original, os quarqs possuem três tipos denominados sabores identificados como u, d, e s (up, down e strange, respectivamente). Desta forma, o modelo propõe que os prótons seriam constituídos de três quarqs (2u e 1d), enquanto que, os nêutrons seriam constituídos por 2d e 1u. 2.2 – Léptons São os elétrons, neutrinos e partículas mais pesadas como o muon e o tâu (os quais decaem rapidamente para léptons mais leves). Até o momento os léptons parecem ser partículas realmente elementares, pois não se dividem em entidades menores e parecem não ter tamanho mensurável nem estrutura para tal. 2.3 – Bósons São partículas transportadoras de força. O que nós pensamos CAP. I ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA E O ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO 3 normalmente como "forças" são, na verdade, os efeitos das partículas transportadoras de força sobre as partículas da matéria. Uma coisa importante sobre as transportadoras de força, é que uma partícula transportadora, de um tipo particular de força, só pode ser absorvida ou produzida por partículas da matéria que são afetadas por essa força. Por exemplo, elétrons e prótons têm carga elétrica; portanto, eles podem produzir e absorver as transportadoras de forças eletromagnéticas, ou seja, o fóton. Os bósons até agora identificados são: gluons, fótons, bósons vetoriais (W-, W+ e Z0). A quadro 3 mostra a participação de cada um em relação as forças que eles “comunicam”. 3 - As quatro forças As várias partículas que compõe o universo interagem entre si de quatro maneiras diferentes. Cada uma delas é uma forma particular de interação (ou usando um termo mais comum: força). Toda partícula existente no universo é fonte de uma ou mais destas forças. O volume de espaço que esta força pode atuar é chamado de campo de força. As quatro forças conhecidas no universo estão relacionadas no quadro 1 em ordem decrescente de intensidade (sendo tomada como parâmetro a força eletromagnética). Qualquer partícula capaz de servir como fonte de um campo de força responderá a um campo semelhante. Desta forma, o quadro 2 apresenta as principais partículas do átomo e as forças por elas exercidas. Além das diferentes intensidades, as quatro forças também atuam em distâncias diferentes. Por exemplo, apesar de ser muito mais intensa que as outras forças a força nuclear forte só atua em distâncias incrivelmente pequenas, da ordem de 10-13 cm ou menos. Esta distância representa praticamente a largura do núcleo atômico. Cada tipo de força é mediado pela troca de bósons, como já mencionado. CAP. I ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA E O ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO 4 Espectro eletromagnético As ondas eletromagnéticas incluem ondas como a luz, as ondas de rádio, os raios X e outras radiações. Os diversos tipos de ondas diferem apenas no comprimento da onda e na freqüência que estão relacionadas pela fórmula abaixo:f = c/ A onda eletromagnética é produzida quando cargas elétricas são aceleradas, sendo representada como uma dupla vibração que compreende um campo magnético H e um campo elétrico E. Estas duas vibrações estão em fase, possuem direções perpendiculares e se propagam no vácuo com velocidade da luz (Fig. 4). A freqüência de oscilação da onda eletromagnética corresponde à freqüência de oscilação da carga, logo o comprimento da onda é determinado pela freqüência de oscilação das cargas. A quantidade de energia transportada em cada fóton pode ser facilmente calculada a partir de seu comprimento de onda por meio da fórmula abaixo: E = 1240/, onde 1240 corresponde ao produto da constante de Planck pela velocidade da luz no vácuo. A quadro 4 mostra o espectro eletromagnético e os nomes que estão habitualmente associados aos diversos intervalos de comprimento de onda e freqüência. Estes intervalos não são, muitas vezes, bem definidos e em alguns casos podem se sobrepor. Por exemplo, ondas de comprimentos próximos a 0,1 nm são usualmente denominados raios X, entretanto, se forem originados no núcleo atômico são denominados raios gama. O olho humano é sensível a comprimentos de onda entre 400 e 700 nm, o da luz visível. Os comprimentos mais curtos do espectro do visível correspondem à luz violeta, e os mais longos à luz vermelha. Todas as cores do arco-íris têm comprimentos de onda entre estes extremos. Ondas com comprimentos inferiores e superiores a luz visível correspondem à radiação ultravioleta e radiação infravermelha, respectivamente. A radiação térmica emitida pelos corpos nas temperaturas ordinárias está na região infravermelha do espectro eletromagnético. Não há limites para os comprimentos de onda da radiação eletromagnética; ou seja, teoricamente todos os comprimentos de onda são possíveis. As diferenças entre os diversos comprimentos de onda são muito importantes. O comportamento das ondas depende muito das dimensões relativas dos comprimentos de onda e dos corpos físicos que as ondas encontram. Os raios X, por exemplo, que possuem comprimentos muito curtos e freqüências muito altas, penetram com facilidade em muitos materiais que são opacos à luz, que tem freqüências menores e são absorvidas pelos materiais. As microondas têm comprimentos de onda da ordem de alguns centímetros e freqüências próximas as freqüências de ressonância natural das moléculas de água nos sólidos e nos líquidos. Por isso, as microondas são facilmente absorvidas pelas moléculas de água dos alimentos. CAP. I ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA E O ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO 5 Quadro 1 - Intensidade relativa as quatro forças Quadro 2 - Partículas e forças Quadro 3 – Partículas e suas famílias ÁTOMO LÉPTONS (Partículas que viajam sozinhas) elétron elétron-neutrino muon muon-neutrino tau tau-neutrino QUARKS (partículas presas no interior de partículas) UP DOWN CHARM STRANGE TOP BOTTOM BÓSONS (Partículas mensageiras que transmitem as quatro forças da natureza) fóton força eletromagnética gluon força nuclear forte (adesiva entre os quarks) bósons vetoriais (W-, W+, Z0) força nuclear fraca (aparecem na desintegração radioativa) gráviton força gravitacional (ainda não descoberto) Força Intensidade Nuclear forte 103 Eletromagnética 1 Nuclear fraca 10-11 Gravitacional 10-39 Forças Prótons Nêutrons Elétrons Nuclear forte sim sim Não Nuclear fraca sim sim sim Eletromagnética sim não sim Gravitacional sim sim sim CAP. I ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA E O ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO 6 Figura 1 – Curva de estabilidade Figura 2 – Caixa unidimencional representando os diferentes N x Z dos níveis de energia no núcleo Figura 3 – Energia de ligação por núcleon em função do número de massa A Figura 4 – representação esquemática de uma onda eletromagnética . 4 3 2 1 16E 1 9E 1 4E 1 E1 n E 4 3 2 1 16E 1 9E 1 4E 1 E1 n E CAP. I ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA E O ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO 7 EXERCÍCIOS 1 – O átomo: Quais seus principais constituintes? 2 – Forças intranucleares: a – O que são? b – Como atuam na manutenção da estrutura nuclear? c – Quais as principais partículas envolvidas? 3 – Defeito de massa a – O que é? b – Como pode ser calculado? c – Calcule a energia de ligação do 6Li, sabendo que sua massa nuclear é de 6,01537 uma? 4 – O espectro eletromagnético a – O que é? b – Identifique as faixas que podem ser encontradas CAP. II DESINTEGRAÇÃO RADIOATIVA 1 CAPÍTULO II – DESINTEGRAÇÃO RADIOATIVA 1 - O núcleo e suas radiações Os núcleos que não são estáveis são radioativos, isto é, transformam-se espontaneamente em outros núcleos, emitindo radiação. Uma das primeiras descobertas após a identificação dos elétrons foi a dos Raios X, por Roentgen, em 1895. Em 1896 H. Becquerel investigou o relacionamento entre os raios X e o escurecimento de filmes fotográficos, através de materiais compostos de urânio. Ele sugeriu que o urânio emitia energia, que após penetrar a camada de papel, ainda era capaz de escurecer os filmes. Ele então se referiu a essa energia como radiação ativa. Em 1898 o casal Curie descobriu dois novos elementos que exibiam este comportamento, o rádio e o polônio, e lançaram o termo radioatividade. Esses experimentos indicaram que átomos radioativos possuem algumas propriedades interessantes: escurecem filmes, ionizam gazes, produzem cintilação em certos materiais, penetram na matéria, matam tecido vivo, liberam grande quantidade de energia com pequena perda de massa e não são afetados por alterações químicas ou físicas do material emissor. A experiência que revelou mais completamente a natureza da radioatividade esta descrita na figura 1, onde radiações emitidas por elementos radioativos são dirigidas através de um campo eletromagnético produzido por duas placas paralelas. O resultado desta experiência indica que um único feixe de radiação é desdobrado em três pelo campo magnético. Um é defletido em direção à placa negativa (portanto é um feixe carregado positivamente), um é defletido em direção a placa positiva (portanto é um feixe carregado negativamente), e o terceiro não sofre deflexão (portanto é um feixe sem carga elétrica). Como a natureza destes feixes ainda não era conhecida eles foram denominados como raios alfa, raios beta e raios gama, respectivamente. 1.1 - Desintegração alfa () Experimentos realizados em 1908 confirmaram a identidade da partícula alfa com o núcleo do átomo de hélio 2He 4 . Esta partícula é constituída de dois prótons e dois nêutrons fortemente ligados entre si (alta energia de ligação). Seu processo de decaimento pode ser escrito como: Z X A Z-2Y A-4 + 2He 4 O descendente de um núcleo radioativo é, muitas vezes, também radiativo é desintegra-se por emissão dealfa ou de beta, ou ambas as formas. 1.2 - Desintegração beta () A emissão de radiação beta é um processo mais comum em núcleos leves ou de massa intermediária, que possuem um excesso de nêutrons ou de prótons em relação à estrutura estável correspondente. Radiação beta é o termo usado para descrever elétrons de origem nuclear carregados negativamente (e - ) ou positivamente (e + ). Existem três formas de emissão beta: - , + e captura K. 1.2.1 - Beta negativa ( - ) Esta emissão ocorre em núcleos instáveis porque possuem excesso de nêutrons. Este núcleo tenderá a se estabilizar aumentando sua carga nuclear, ou seja, emitindo elétrons negativos (négatons). Assim, em uma análise rápida, o decaimento - se traduz CAP. II DESINTEGRAÇÃO RADIOATIVA 2 na transformação de um nêutron em um próton, como no exemplo abaixo: 1H 3 2He 3 + -1e 0 1.2.2 - Beta positiva ( + ) Esta emissão ocorre em núcleos instáveis porque possuem excesso de prótons. Este núcleo tenderá a se estabilizar diminuindo sua carga nuclear, ou seja, emitindo elétrons positivos (pösitrons). Assim, em uma análise rápida, o decaimento + se traduz na transformação de um próton em um nêutron, como no exemplo abaixo: 6C 11 5B 11 + +1e 0 O pósitron é a antipartícula do elétron; apesar de estável, sua existência está limitada devido à interação elétron- pósitron, que aniquila ambas as partículas, resultando na emissão de dois fótons de 0,511 MeV em direções opostas. 1.2.3 – Captura K A terceira forma de decaimento beta envolve a aniquilação da carga de um próton, que é transformado em um nêutron, pela captura de um elétron orbital, como no exemplo abaixo: -1e 0 + 4Be 7 3Li 7 Quando um elétron é removido do orbital por sua captura pelo núcleo atômico, o lugar vazio é imediatamente preenchido por algum elétron que esteja num orbital de energia mais alta. Durante este processo não há emissão de partícula, e sua existência só é caracterizada porque, ao saltar de um orbital de energia mais alta para um de energia mais baixa, ocorre a emissão de energia característica, que é o raio X. Entretanto, algumas vezes a captura de elétrons orbitais pode vir acompanhada da emissão de elétrons atômicos, denominados de elétrons Auger. Isto ocorre quando os raios X emitidos colidem com um dos elétrons orbitais. Nessa colisão, os raios X cedem energia ao elétron, que é então deslocado do orbital para fora do átomo. A forma de distribuição das energias das partículas beta, que recebe o nome de espectro de energia, apresenta características totalmente diferentes do espectro de energia das partículas alfa. Essa diferença, somada ao fato que uma lei física estava aparentemente sendo violada (no caso a de conservação do momento angular), ficou durante muito tempo sendo conhecida como o enigma das emissões beta. Este fato levou Pauli, em 1930, a formular a hipótese da existência do neutrino e do antineutrino, como sendo a terceira partícula que acompanharia a desintegração beta. Em 1957 a existência do neutrino foi confirmada experimentalmente. Desta forma as equações gerais dos decaimentos beta podem ser descritas como: Z X A Z+1 Y A + -1e 0 + ( - ) Z X A Z-1 W A + +1e 0 + ( + ) +1e 0 + Z X A Z-1 W A + (K) 1.3 - Desintegração gama () Neste tipo de desintegração o núcleo excitado decai para um estado de energia mais baixo, emitindo um fóton. Neste caso o núcleo mantém sua identidade. A emissão de fótons de raios gama é observada por suceder a emissão de alfa ou de beta. Por exemplo, se um núcleo desintegra-se por emissão beta e decai para um estado excitado do núcleo descendente, este núcleo descendente decai para o seu estado fundamental por emissão de raios gama. CAP. II DESINTEGRAÇÃO RADIOATIVA 3 Seu processo de decaimento pode ser escrito como: ZX A ZX A + A vida média dos emissores de raios gama é freqüentemente muito curta, como, por exemplo, cerca de 10 - 11 s. Entretanto, alguns emissores gama têm vidas muito longas, da ordem de horas. Os estados de energia dos núcleos que têm estes tempos de vida longos são denominados de estados metaestáveis. 2 – Estudo Quantitativo da Desintegração Radioativa A função exponencial é uma das mais importantes e intensamente empregadas em Física e Biologia. Em Biologia, por exemplo, ela pode descrever o crescimento de diversas populações, o decréscimo do número de bactérias em resposta a um processo de esterilização, o crescimento de um tumor, a absorção de uma droga, etc. Em Física, a função descreve a emissão de luz por átomos, a variação de temperatura com o tempo quando um objeto entra em equilíbrio com sua vizinhança, entre outros eventos, o decaimento radioativo de um radionuclídeo e a absorção de radiações eletromagnéticas, quando estas atravessam um meio material. O decaimento de um átomo particular é um evento puramente aleatório (ou randômico). É possível prever, por exemplo, que um certo núcleo irá emitir uma partícula alfa, mas não se pode dizer quando. Tudo o que se pode fazer é associar a um átomo instável uma probabilidade de vir a decair num certo intervalo de tempo. Se ele não decair neste intervalo, ele tem a mesma probabilidade de vir a decair no próximo intervalo de tempo idêntico, e assim sucessivamente. Portanto, o decaimento de uma amostra radioativa é de natureza estatística, e é impossível prever quando um átomo particular irá desintegrar. O que se pode afirmar é que o número de átomos que se desintegram num certo intervalo de tempo é proporcional ao número de átomos radioativos presentes na amostra, ou seja: dN/dT = - N, Onde é a constante de desintegração radioativa. A constante representa a probabilidade de desintegração dos átomos de uma amostra radioativa em um intervalo de tempo. Integrando-se a equação temos: Nt = No . e -t Esta é a lei exponencial de decaimento radioativo, onde: Nt = número final de átomos na amostra (t=0) No = número de átomos na amostra no tempo t t = tempo transcorrido = constante de desintegração radioativa (unidade de tempo) -1 Além da constante de desintegração, outro parâmetro que caracteriza um radionuclídeo é a sua MEIA VIDA (T). Esta pode ser definida como o tempo transcorrido até que a metade dos átomos (N) de uma amostra tenha se desintegrado. Portanto, Nt = No/2 Logo, quando t = T, temos: e -t = 1/2 CAP. II DESINTEGRAÇÃO RADIOATIVA 4 Aplicando logaritmo: = ln 2/T T = 0,693/ A ATIVIDADE de uma amostra de um determinado radionuclídeo é o número de desintegrações na unidade de tempo. Este é proporcional ao número de átomos instáveis nela contidos, portanto também varia exponencialmente, ou seja: At = Ao . e -t Esta é a lei exponencial de decaimento radioativo, onde: At = atividade final da amostra (t=0) Ao = atividade da amostra no tempo t t = tempo transcorrido = constante de desintegração radioativa(unidade de tempo) -1 Até recentemente, a unidade padrão de radioatividade foi o Curie (Ci), definido como 3,7 x 10 10 desintegrações por segundo (dps). Atualmente a unidade adotada internacionalmente é o Bequerel (Bq), definido como uma desintegração por segundo: 1 Bq = 1dps 1 Bq = 2,7 x 10 -11 Ci CAP. II DESINTEGRAÇÃO RADIOATIVA 5 Figura 1 – Experimento que revelou a natureza da radioatividade EXERCÍCIOS 1 – Calcule a meia-vida de um nuclídeo radioativo cuja atividade decresceu de um fator de 16 em 8 dias. Determine a constante de desintegração radioativa da amostra. 2 – Às oito horas da manhã de ontem recebi uma solução de 99m TcNa contendo uma atividade de 500 mCi/ml. Às oito horas da manhã de hoje necessito de uma solução que contenha 100 mCi/ml para realizar um experimento. Poderei utilizar esta solução recebida ontem, sabendo que a méia-vida do Tc é de 6h? 3 – Como podemos saber se um elemento decaiu por captura K? CAP. III A INTERAÇÃO DAS RADIAÇÕES COM A MATÉRIA 1 CAPÍTULO III - A INTERAÇÃO DAS RADIAÇÕES COM A MATÉRIA 1 – As Radiações Nucleares Desde que as radiações nucleares não podem ser percebidas pelos sentidos humanos, sua detecção envolve o uso de um meio capaz de absorver parte de sua energia, e converte-la em um sinal mensurável. Entretanto, para entender os vários processos de detecção, deve-se entender a forma como qualquer meio, absorve energia, e como qualquer evento subsequente surge. Portanto, a seguir, estão descritas as maneiras como as diferentes radiações ionizantes interagem com a matéria. 1.1 - partículas alfa A determinação das velocidades e energias das partículas alfa emitidas por um núcleo, mostra de maneira contundente, que o núcleo é constituído de níveis de energia. Mostra também que um mesmo núcleo pode emitir partículas alfa de diferentes valores. As partículas alfa perdem energia por ionização, ou seja, arrancando elétrons do meio com consequente geração de pares iônicos. Para diversos emissores alfa, a forma da curva de ionização X distância percorrida é sempre a mesma, embora as ionizações e o alcance variem consideravelmente. A curva característica é apresentada na figura 1. Esta curva pode ser dividida em três regiões: 1 - inicialmente com grande velocidade, a partícula alfa interage por pouco tempo com os elétrons envoltórios dos átomos do meio, logo a ionização é baixa. 2 - à medida em que a velocidade vai diminuindo ela passa a interagir mais fortemente com os elétrons, desta forma o poder de ionização vai aumentando até atingir um máximo, quando então ocorre a captura do primeiro elétron passando de íon +2 para +1. 3 - com a passagem de íon +2 para +1 ocorre uma drástica diminuição no poder de ionização até chegar a zero, quando o íon captura um elétron do meio e se torna um átomo de hélio. As partículas alfa emitidas pelos radionuclídeos possuem energias bem definidas, são duplamente carregadas, se movem com velocidade de aproximada 0,1c e possuem ionização específica muito alta (o que torna o seu poder de penetração bastante limitado). 1.2 - Partículas beta As partículas beta interagem com a matéria em virtude de sua massa e da sua carga elétrica. Em virtude de sua pequena massa, elas sofrem frequentes espalhamentos com pouca perda de energia, e consequentemente sua trajetória na matéria é bastante sinuosa. As partículas beta podem interagir com núcleos ou com elétrons dos átomos do meio. Uma das interações que ocorrem com núcleos atômicos é conhecida como efeito bremsstrahlung. Este efeito ocorre quando, ao passar na proximidade do núcleo, a partícula beta sofre desvio na sua trajetória, em função da atração eletroestática, e perde energia cinética. Esta energia é perdida na forma de fótons. A energia transportada pelos fótons é igual àquela perdida pela partícula (radiação de frenagem). Este efeito não é comum e ocorre apenas em 1% dos casos, entretanto, a interação com átomos de elevado número atômico aumenta as chances de que ele ocorra. Durante seu percurso pela matéria, as partículas beta podem interagir com os elétrons promovendo a formação de pares iônicos ou a excitação CAP. III A INTERAÇÃO DAS RADIAÇÕES COM A MATÉRIA 2 dos átomos do meio. O deslocamento dos elétrons das camadas K, L e M é acompanhado pela produção de raios X característicos, formados pelo preenchimento dos elétrons mais periféricos. 1.3 - Radiações X e gama Ao atravessar a matéria, as radiações X e gama interagem com os átomos. Esta interação depende da estrutura molecular e do estado de agregação em que se encontra o meio. A energia contida no fóton interage com matéria por diferentes mecanismos, sendo três deles mais importantes: 1.3.1 - Efeito fotoelétrico Ocorre quando um fóton interage com um elétron orbital transferindo toda a sua energia para esse elétron (fig. 2). Para que esse fenômeno ocorra é necessário que o fóton incidente tenha energia suficiente para ejetar o elétron e ainda lhe oferecer energia suficiente para afasta-lo do núcleo. O elétron expelido do átomo é chamado de fotoelétron e poderá perder a energia recebida do fóton produzindo ionização em outros átomos. O efeito fotoelétrico é predominante em baixas energias e para elementos de elevado número atômico. 1.3.2 - Efeito Compton Ocorre quando o fóton incidente é espalhado por elétron periférico, que recebe apenas parcialmente a energia do fóton incidente. A energia não transferida deixa o átomo como fóton emergente, que terá energia menor e direção diferente que a do fóton incidente (fig. 3). A quantidade perdida para deslocar o elétron periférico é pequena quando comparada ao feito fotoelétrico, já que esses elétrons estão mais fracamente ligados ao núcleo. 1.3.3 - Formação de par Ocorre somente com fótons de alta energia (acima de 1,02 MeV). Neste caso, ao se aproximar de um núcleo atômico pesado, a radiação interage com o núcleo e é transformada em um par elétron-pósitron. Essas partículas se afastam um da outra com grande velocidade, sendo, portanto, impedidas de se recombinar. O pósitron após transmitir, por colisões, sua energia cinética ao meio ambiente volta a se combinar com um elétron dando origem a dois fótons de 0,51 MeV. O elétron irá transmitir sua energia cinética da mesma maneira descrita no ítem 3.2. 2 – Estudo Quantitativo da Interação das Radiações Ionizantes com a Matéria Assim como o decaimento de uma amostra radioativa, a atenuação de um feixe de fótons por um determinado meio absorvedor também é um fenômeno de natureza estatística. Ou seja, é impossível prever quando um fóton irá interagir com o meio, o que se pode afirmar é que existe uma probabilidade de que, ao atravessar uma determinada espessura desse meio, um certo número de fótons seja atenuado. Portanto, a esse fenômeno aplica- se a lei exponencial simples: Nd = No . e -d onde: No = número final de fótons no feixe (d=0) Nd = número de fótons no feixe após a interação d = distância percorrida no meio = constante de desintegração radioativa (unidade de tempo) -1 O coeficiente de atenuação linear representa a probabilidade de um fóton CAP. III A INTERAÇÃODAS RADIAÇÕES COM A MATÉRIA 3 sofrer atenuação durante sua trajetória no meio absorvedor. Ao atravessar o meio absorvedor, os fótons podem sofrer REFEXÃO, DIFUSÃO, ABSORÇÃO, e TRANSMISSÃO. Evidentemente, a importância relativa destes quatro fenômenos dependerá da natureza da radiação e do meio absorvedor. Em qualquer circunstância, o número de fótons incidentes é maior que o de fótons emergentes. Assim, o fenômeno de atenuação do feixe não deve ser confundido apenas com absorção. Quando um feixe de radiação é reduzido pela metade ao atravessar um meio absorvedor podemos denominar esta de CAMADA SEMI-REDUTORA (CSR). Podemos então escrever: d = CSR N = No/2 e d = 1/2 logo: CRS = ln 2/ = 0,693/CRS Caso o parâmetro utilizado para avaliação fosse, em vez do número de fótons N, a intensidade I dos feixes incidente e emergente, teríamos: Id = Io . e -d CAP. III A INTERAÇÃO DAS RADIAÇÕES COM A MATÉRIA 4 Figura 1 – Gráfico da interação das partículas alfa com a matéria (Ionização X Alcance) f1 e- e- f2 f2 ' e- e+ f3 Figura 2 – 3 – 4 – Formas de interação das radiações ionizantes com a matéria. No alto – efeito fotoelétrico; No centro – efeito Compton; Em baixo – formação de par. EXERCÍCIOS 1 – Em uma câmara de Wilson podemos visualizar a trajetória de partículas radioativas. Como você acha que seria visualizada a trajetória das partículas alfa e beta negativa? 2 – Descreva o processo de aniquilação do pósitron. 3 – Como podemos saber se um fóton de radiação gama interagiu por efeito fotoelétrico ou Compton? Alcance (cm) Ionização específica CAP. IV DETECTORES DE RADIAÇÃO 1 CAPÍTULO IV – DETECTORES DE RADIAÇÃO 1 – Aspectos Gerais Os sistemas desenvolvidos para detecção das radiações procuram utilizar a interação destas com a matéria. Assim sendo, intercalam um meio com propriedades na qual processos de excitação ou ionização produzem um sinal detectável. Este poderá ser contado, acumulado ou classificado para fornecer as informações desejáveis sobre a radiação de interesse. Os sistemas físicos mais comuns são classificados de três modos: (1) pelo meio onde a interação ocorre, isto é, líquido, sólido ou gasoso; (2) pela natureza do fenômeno, isto é, excitação ou ionização; (3) pelo tipo de pulso gerado, isto é, a amplitude do pulso será proporcional a energia liberada. Os princípios básicos dos sistemas de detecção mais utilizados serão descritos a seguir: 1.1 – Detectores gasosos Esta classe representa a classe de detectores mais utilizada, sendo sua base à coleta de íons formados no volume sensível de um gás do detector pela passagem da radiação ionizante. Sua ampla utilização esta na simplicidade de construção, facilidade na operação, pouco equipamento adicional e utilização de uma grande quantidade de gases, até mesmo o ar. Os três tipos mais comuns são: câmaras de ionização, contadores proporcionais e tubos Geiger- Muller. 1.1.1 – Câmara de ionização É o mais simples dos detectores, sendo sua operação baseada na coleta de todas as cargas criadas pela ionização direta através da aplicação de um campo elétrico. A ionização de um gás resulta na produção de pares de íons. Uma voltagem moderada aplicada entre duas placas (eletrodos) próximas faz os íons negativos serem atraídos para o ânodo e os íons positivos para o cátodo. Este fluxo constitui uma corrente elétrica, que é a medida da intensidade da radiação no volume do gás. A corrente é extremamente baixa (aproximadamente 10 -12 A) sendo necessária a presença de um amplificador para sua medida. As câmaras de ionização são utilizadas como dosímetros pessoais, monitores de laboratórios e calibração de doses. Sob determinadas condições, a determinação da carga de ionização dá uma medida precisa da exposição, e uma medida da corrente de ionização indicará a taxa de exposição. 1.1.2 – Contador proporcional A operação deste tipo de detector é baseada no fenômeno de multiplicação gasosa para amplificar a carga representada pelos pares iônicos. Se em um sistema a voltagem aplicada cresce além de um determinado ponto, o efeito conhecido como amplificação gasosa ocorre. Isto ocorre porque os elétrons gerados pela ionização primária serão acelerados pela voltagem aplicada até alcançar uma energia suficientemente alta para eles próprios causarem uma ionização adicional. Esse elétron liberado é conhecido como ionização secundária que também será acelerado pelo campo elétrico. Este processo de cascata é conhecido como avalanche Towsend. Quando todos os elétrons são coletados, a avalanche termina. Dessa forma, uma simples partícula ionizante ou um fóton CAP. IV DETECTORES DE RADIAÇÃO 2 podem produzir um pulso de corrente que é grande o bastante para ser detectado. Dentro de um determinado intervalo de alcance de voltagem o tamanho do pulso será proporcional à quantidade de energia depositada pela radiação original, logo estes detectores apresentam um sinal maior que a câmara de ionização, pois a carga é multiplicada por um fator que pode ser de mil ou mais. 1.1.3 – Contator Geiger-Muller (G- M) Em comum com os contadores proporcionais, os tubos G-M também multiplicam os pares iônicos formados para aumentar a carga final. Entretanto, o fazem de maneira diferente. Ele é constituído por um tubo cilíndrico dotado de uma janela que esta ocluída por uma membrana de plástico Mylar muito fino ou mica. O volume interno é preenchido por uma mistura gasosa composta de argônio, hélio ou neônio (90%), à qual se adiciona um gás halógeno (Cl2 ou Br2) ou um gás orgânico, como o metano, álcool etílico ou butano (10%). O tubo é conectado a uma fonte elétrica de alta voltagem, com um filamento central conectado ao terminal positivo e o tubo de metal ao negativo. A voltagem entre os dois eletrodos é da ordem de 1000 volts (ligeiramente abaixo da quantidade necessária para causar uma centelha). Quando as radiações penetram no interior do tubo, através da janela, são produzidos muitos pares iônicos que são atraídos para os eletrodos de acordo com suas polaridades. Isto faz com que ocorra redução da diferença de potencial entre os eletrodos. Essa variação pode, então, ser detectada e contada por um circuito eletrônico ligado ao tubo. Um método de gravar o pulso é amplificá-lo e mandá-lo para um alto falante, que emitirá um click. Um sistema mais sofisticado pode substituir o click por um dispositivo que conta os pulsos de corrente, e, portanto, o número de partículas que entram no detector (Fig. 1). 1.2 – Detectores sólidos Um detector sólido opera de maneira similar a uma câmara de ionização. Devido a sua estrutura cristalina, os elétrons estão distribuídos em bandas de energia definidas, separadas por bandas proibidas. Como os núcleos estão muito próximos os elétrons se misturam e os níveis de energia nos quais se encontram se agrupam em bandas permitidas. Entre estas bandas existem intervalos de energia os quais os elétrons não podem ocupar e desta forma são chamadas de bandas proibidas. A banda mais alta de energia que os elétrons podem ocupar, no seu estado fundamental, é chamada de banda de valência. A transferência deenergia de um fóton ou partícula para um elétron de valência pode fazer com que ele salte a banda proibida e atinja uma nova banda permitida que poderá ser uma banda de condução ou de excitação. A lacuna deixada pelo elétron é denominada de buraco, e é similar a um íon positivo num sistema gasoso. 1.2.1 – Detectores de condutividade Quando a passagem se dá para a banda de condução o processo é conhecido como ionização, e o par elétron-buraco formado se move independentemente, sendo atraídos para pólos opostos quando submetidos a um potencial elétrico. Como nos sistema gasosos, os detectores no estado sólido CAP. IV DETECTORES DE RADIAÇÃO 3 operam num modo de pulso, sendo este proporcional a energia depositada no cristal. 1.2.2 – Detectores de cintilação Quando a passagem do elétron se dá para a banda de excitação o processo é conhecido como excitação. Neste caso, o elétron ainda fica ligado ao buraco por forças elétricas, não podendo contribuir para a condução. Dependendo do material e da temperatura o retorno dos elétrons da banda de excitação para a banda de valência pode ser muito rápido, e a diferença de energia é emitida como radiação fluorescente, no caso luz visível. Um dos cristais mais usados é o de iodeto de sódio, que é feito misturando-se uma pequena quantidade de tálio, que funciona como impureza. O tálio se mistura à rede cristalina, substituindo o sódio e produzindo pequenas deformações na estrutura da rede. Estas regiões são denominadas de centros de ativação ou armadilhas e os cristais são representados então como NaI(Tl). Os centros de ativação respondem mais facilmente do que os átomos da matriz cristalina, já que aí a região proibida entre as bandas de valência e de excitação é menor do que nas outras regiões do cristal. Dessa forma, quase todas as transferências de energia feitas no cristal acabam nos centros de ativação (Fig. 2 e 3). 1.2.3 - Detectores termo- luminescentes Utilizam o processo de captura do elétron nas armadilhas ou imperfeições do cristal. Neste caso o material é selecionado de forma que os elétrons capturados fiquem estáveis à temperatura normal. Entretanto, se após a exposição, o material é aquecido à temperatura adequada (usualmente 200 o C) os elétrons então atingem a banda de excitação do cristal e retornam a sua banda de valência, emitindo a diferença de energia na forma de luz visível. 1.3 – Detectores líquidos Assim como nos cintiladores sólidos a cintilação também pode ser produzida por líquidos. Neste caso, utilizam-se soluções cintiladoras que são constituídas por um solvente orgânico, uma substância cintiladora e quenchers (apagadores). A amostra radioativa é misturada é colocada em papeis de filtro ou diretamente no líquido de cintilação, contido em pequenos frascos, que são colocados em frente a duas fotomultiplicadoras diametralmente opostas. Por conta disso e pelo fato de não haver nenhum meio interposto entre a radiação e a substância fotoemissora, esse tipo de contador apresenta elevada eficiência e é muito utilizado para estudar emissões fracas, tipo 3 H, 14 C e 32 S. Quando uma radiação interage com o líquido de cintilação ela ioniza e excita as moléculas do solvente. Estas transferem o excesso de energia para moléculas vizinhas que, em sua maioria, também são moléculas do solvente. Entretanto, a probabilidade de interação com outras moléculas aumenta. Se a transferência se dá para uma molécula apagadora, a energia é dissipada na forma de calor. Sua importância reside no fato de absorverem as radiações provenientes de moléculas de solvente excitadas, evitando assim o efeito cascata. Se a transferência se dá para uma molécula cintiladora, ocorrerá a emissão de luz. Este fóton de luz visível CAP. IV DETECTORES DE RADIAÇÃO 4 poderá então ser detectado por uma válvula fotomultiplicadora (Fig. 4). 2 - Válvulas fotomultiplicadoras A utilização destas válvulas permite que pulsos luminosos muito fracos possam ser detectados e, consequentemente, medidos. A figura mostra o esquema de uma válvula fotomultiplicadora que é composta basicamente de uma caixa metálica contendo uma janela, um fotocátodo, um focalizador de elétrons e vários dinodos. Quando um fóton de luz visível atinge o fotocátodo, interage com ele arrancando elétrons, que passam a ser chamados de fotoelétrons. Devido ao forte potencial negativo ligado ao fotocátodo, esses fotoelétrons são então liberados em direção ao primeiro dinodo (que possui polaridade positiva). Esses fotoelétrons ao atingirem o dinodo arrancam mais elétrons, que serão atraídos pelo segundo dinodo e assim por diante. Em cada etapa esse processo vai se intensificando (já que a polaridade dos dinodos é crescente) e continua até ser alcançado o ânodo, já com carga elétrica negativa suficiente para reduzir transitoriamente o seu potencial. Essa variação do potencial é detectada por circuitos eletrônicos especiais, os analisadores (Fig. 5). CAP. IV DETECTORES DE RADIAÇÃO 5 Figura 1 – Esquema representativo de um Geiger-Miller Níveis de energia Fluorescência Figura 2 e 3 – Representação esquemática dos detectores de cintilação líquida CAP. IV DETECTORES DE RADIAÇÃO 6 Figura 4 – Esquema representativo da cintilação líquida Figura 5 – Esquema geral de detecção por cintilação CAP. IV DETECTORES DE RADIAÇÃO 7 Exercícios: Comente a importância: 1 - Das “armadilhas” nos cristais cintiladores 2 - Das substâncias “apagadoras” nos cintiladores líquidos 3 - Da válvula fotomultiplicadora CAP. V PRINCÍPIO DO USO DE TRAÇADORES RADIOATIVOS EM BIOLOGIA 1 CAPÍTULO V - PRINCÍPIO DO USO DE TRAÇADORES RADIOATIVOS EM BIOLOGIA 1 – Aspectos Gerais Todas as vezes que a possibilidade do uso de radioisótopo para a execução de um experimento entrar em discussão, uma pergunta deve ser conscientemente respondida: “O uso de radioisótopos é imprescindível para o experimentoplanejado ou existe alguma outra técnica experimental acessível que possa conduzir ao mesmo resultado?” Somente quando o uso de um radioisótopo for absolutamente essencial ou quando sua utilização resultar em melhoria significativa da técnica seu uso será justificado. Isto corresponde à aplicação do Princípio ALARA a uma prática laboratorial segura. Este princípio, que é internacionalmente aplicado a todas as atividades que possam envolver o uso de radioisótopos, recomenda que estes sejam utilizados tão pouco quanto possível (As Low As Reasonably Achievable) para que o objetivo de seu uso seja atingido. 2 - A escolha de um radioisótopo A grande maioria dos experimentos biológicos envolve o uso de um dos seguintes radioisótopos 3 H, 14 C, 35 S, 32 P, 131 I, 125 I, 99m Tc (em alguns casos, a escolha poderá ser restrita pelo tipo de licenciamento para uso de materiais radioativos do laboratório). Nas tabelas 1 e 2 encontram-se alguns dados sobre propriedades desses radionuclídeos que devem ser consideradas no momento da seleção. 3 - Planejamento de um experimento Antes de executar um experimento pela primeira vez, faça um exercício teórico para estimar a quantidade de radionuclídeo suficiente para sua finalidade e para procurar antecipar momentos de maior dificuldade técnica, que talvez necessitem de mais treinamento ou de auxilio durante sua realização. Se indicado, faça um experimento ‘frio’, ou seja, um ensaio sem o uso do material radioativo. Estas etapas são fundamentais para reduzir ao mínimo a exposição à radiação, o risco de acidentes ou mesmo de contaminações interna e/ou externa. 4 - Marcações in vivo Técnicas de marcação radioisotópica são atualmente utilizadas para as mais diversas aplicações em organismos vivos, especialmente no acompanhamento de processos dinâmicos como as medidas de fluxo, transporte ou reações químicas. Com o desenvolvimento das técnicas de detecção externas como a Tomografia por Emissão de Pósitrons (PET), técnicas radioisotópicas de marcação tornaram-se parte integrante de novos métodos de medidas de processos fisiológicos e bioquímicos no homem. As técnicas que utilizam a introdução de traçadores radioativos em sistemas biológicos requerem sua criteriosa seleção (características físicas e/ou químicas, dependendo de sua aplicação), assim como sua utilização em CAP. V PRINCÍPIO DO USO DE TRAÇADORES RADIOATIVOS EM BIOLOGIA 2 quantidades pequenas o bastante para não alterar o processo a ser estudado, embora suficientes para o serem quantificadas. Outros fatores essenciais a serem considerados para o emprego adequado de um radiotraçador são: a eficiência com que ele é incorporado pelo(s) tecido(s) alvo; se esse(s) tecido(s) é(são) afetado(s) pelo radiotraçador ; outros fatores que possam afetar sua incorporação (aumentar ou diminuir sua captação). 4.1 - Rotas de administração de precursores radioativos 4.1.1- Em animais O traçador pode ser administrado de várias formas, dependendo do tipo de animal usado no experimento e do estado físico do traçador, que pode ser um gás, pode ser líquido ou sólido. Algumas das vias de administração mais utilizadas para ensaios biológicos em animais são as seguintes: 4.1.2 - Culturas ou meios nutrientes Qualquer organismo vivo pode ingerir ou absorver um radiotraçador. Bactérias, organismos unicelulares, pequenos organismos multicelulares podem ser marcados quando crescem em meios de nutrientes contendo um traçador radioativo. Uma vez que os organismos são continuamente expostos à presença do traçador durante sua multiplicação, essas técnicas envolvem o uso de quantidades muito pequenas de compostos radioativos. 4.1.3 - Administração oral ou intra-gástrica Em animais superiores essas vias de administração são indicadas para estudos de mecanismos de absorção do trato gastrointestinal. Se o objetivo da administraçdo traçador for estudar sua distribuição em todo o organismo do animal essa via não será muitas vezes a indicada, pois alterações da molécula do traçador, que podem ocorrer no interior do intestino, na parede intestinal ou no fígado, nem sempre podem ser previstas com precisão. Portanto, essa via é recomendada apenas quando a absorção do traçador é garantida, como por exemplo, a absorção de água tritiada (água marcada com trítio). 4.1.4 - Injeção subcutânea ou intramuscular Para assegurar sua distribuição uniforme, no corpo de um animal, um traçador radioativo deve necessariamente ser introduzido em sua corrente sanguínea. Isto pode ser feito injetando-se a solução do traçador em uma veia, artéria ou ventrículo cardíaco. Injeções subcutâneas ou intramusculares são muitas vezes utilizadas como vias alternativas, uma vez que podemos assumir que estas também representam uma bioviabilidade de 100% do traçador. Nestes casos, o traçador deve ser diluído em pequeno volume (~1 ml) de meio isotônico (usualmente salina isotônica) e injetado em uma região bem perfundida. Na maioria dos animais a pele do dorso ou do pescoço ou o músculo da coxa são as regiões mais indicadas. CAP. V PRINCÍPIO DO USO DE TRAÇADORES RADIOATIVOS EM BIOLOGIA 3 4.1.5 - Injeção intraperitoneal Essa via de administração requer a difusão do radiotraçador através da vascularização intraperitoneal. Em animais de pequeno porte essa via tem sido bastante utilizada. Dependendo do traçador, a absorção pode ser tão rápida e completa quanto na injeção intravascular ou não. 4.2 - Em plantas A enumeração das possíveis utilizações de traçadores radioativos em espécies vegetais origina uma extensa lista. Como um pequeno exemplo pode-se citar: Através do uso de precursores marcados, vias bioquímicas podem ser investigadas monitorando-se o aparecimento de produtos radioativos que podem ser facilmente identificados. Uma técnica frequentemente empregada é a determinação da atividade de uma dada enzima, fornecendo-se ao vegetal um substrato marcado e determinando-se a taxa de aparecimento radioatividade em um produto dessa reação. a localização na planta dos sítios onde vários processos ocorrem também pode ser determinada. Por exemplo, o fornecimento de timina marcada tornará possível a determinação e quantificações diferenciadas da síntese de DNA nuclear e de organelas celulares. o acompanhamento do transporte de certos inseticidas, fungicidas e herbicidas até o sítio de ação no interior de vegetais pode ser feito quando moléculas marcadas desses produtos são fornecidas à planta. a expressão de um dado gene que ocorra somente numa folha ou em uma semente em desenvolvimento, ou então em apenas um dos estágios do desenvolvimento do vegetal, pode ser detectada quando a síntese protéica é apropriadamente monitorada. a síntese de carboidratos, assim como seu transporte através dos tecidos vegetais, podem ser acompanhadas quando 14 CO2 é fornecido à planta. Quando o objetivo é a marcação da planta intacta a administração do composto marcado pode ser feita através de suas raízes ou, quando o traçador for um gás, através de suas folhas. Sementes podem ser marcadas pelo suprimento de traçadores durante o estágio de germinação. Se o experimento visar a marcação de folhas isoladas, estas podem ser cortadas e seu pedículo imerso em um pequeno volume de solução contendo o material radioativo. Vários protocolos demarcação de espécies vegetais são atualmente disponíveis. 5 - Marcações in vitro Moléculas também podem ser marcadas para estudos in vitro. Ácidos nucléicos podem ser marcados para monitorar reações, para sua análise estrutural ou sequenciamento, ou para geração de sondas de hibridização (utilizadas para detectar sequências complementares de ácidos nucléicos). A marcação de proteínas, peptídeos e glicoproteínas é útil em estudos bioquímicos, farmacológicos e em várias outras áreas da biologia e medicina. CAP. V PRINCÍPIO DO USO DE TRAÇADORES RADIOATIVOS EM BIOLOGIA 4 Tabela 1- Algumas das informações a serem consideradas na seleção de radionuclídeos para experimentos biológicos. Propriedades / Proteção Radiológica 3 H 14 C 35 S 32 P 125 I 131 I 99m Tc T1/2 Física 12.3 anos 5730 anos 87.4 dias 14.3 dias 60.0 dias 8.04 dias 6.0 horas Emissões C Energias (MeV) 0.019 0.156 0.167 1.709 0.035 0.364 0.806 0.140 Monitoração Cintilômetro (liq.) cint. líquida Geiger Geiger Geiger cintilômetro Geiger cintilômetro Órgão Crítico para Contaminação Interna corpo inteiro inteiinininteiro gordura e corpo inteiro inteiro testículos e corpo inteiro corpo inteiro ossos tireóide tireóide corpo inteiro inteiro Alcance Máximo no Ar 6 mm 24 cm 30 cm 7.2 m 10 m 10 m 10 m Tabela 2 - Algumas das vantagens e desvantagens do emprego dos principais radioisótopos utilizados em biologia. Isótopo Vantagens Desvantagens 3 H Segurança Moléculas orgânicas podem ser marcadas em diferentes posições Baixa eficiência de detecção Necessita de ambiente extremamente limpo para evitar contaminação interna Pode ser incorporado ao meio ambiente 14 C Segurança Moléculas orgânicas podem ser marcadas em diferentes posições Meia-vida longa Pode ser incorporado ao meio ambiente 35 S Fácil detecção Meia-vida biológica relativamente longa 32 P Fácil detecção Meia-vida curta facilita o descarte Possibilidade de exposição externa Meia-vida curta afeta o custo e o planejamento dos experimentos Recomenda-se o uso de dosímetros de dedo 131 I 125 I Fácil administração Baixo custo Acumula-se facilmente na tireoide O iodo é volátil, é necessário trabalhar em capela Muitos compostos iodados penetram através de luvas de borracha; recomenda-se o uso de duas luvas 99m Tc Baixo custo Meia-vida curta facilita o descarte Obtido através de gerador Mo-Tc Grande número de moléculas e células podem ser marcadas com esse radioisótopo Possibilidade de exposição externa Meia-vida curta afeta o planejamento dos experimentos Texto traduzido e adaptado de : Radioisotopes in Biology : A practical approach, edited by R.J. Slater, Oxiford University Press, NY, 1993 CAP. V PRINCÍPIO DO USO DE TRAÇADORES RADIOATIVOS EM BIOLOGIA 5 Exercícios: 1 - Destaque os principais pontos que um bom radiofármaco deve ter 2 – O que são: a) traçadores b) radionuclídeos CAP.VI FUNDAMENTOS DA RADIOBIOLOGIA 1 CAPÍTULO VI - FUNDAMENTOS DA RADIOBIOLOGIA 1 - Fases da evolução das radiolesões O aparecimento de uma radiolesão ou fotolesão é um processo complexo no qual várias etapas se sucedem, algumas muito rápidas, como frações de segundos, outras bastante demoradas durando meses ou anos (diagrama 1). 1.1 – Estágio físico No qual ocorrem interações entre a radiação e a matéria viva, acarretando o aparecimento de átomos e moléculas ativados e ionizados, e com duração muito curta (frações de segundos). Os produtos nele formados são altamente reativos; 1.2 – Estágio químico Onde ocorrem reações e (ou) alterações químicas nos produtos formados durante o estágio anterior, ou reações desses produtos com moléculas vizinhas, o que conduz à formação de produtos secundários, sendo a duração desse variável de frações de segundos a várias horas; 1.3 – Estágio Biológico No qual as reações químicas, resultantes das fases anteriores, podem afetar processos vitais para os sistemas biológicos, modificando certas funções e (ou) bloqueando outras. É nesse período, cuja duração varia de algumas horas até anos, que ocorre a morte celular, o aparecimento de mutações, cancerizações, etc. 2 – Efeitos diretos e indiretos das radiações ionizantes A energia de uma radiação pode ser transferida para uma macromolécula nobre da célula, como o DNA, modificando sua estrutura, o que caracteriza o efeito direto. Essa energia também pode ser transferida para uma molécula intermediária como a água (que representa cerca de 70% da massa celular), cuja radiólise acarreta a formação de produtos altamente reativos, os radicais livres, capazes de lesar o DNA, caracterizando o efeito indireto das radiações Assim, o efeito global é a soma dos efeitos diretos e indiretos, cujas importâncias relativas variam em função de diversos fatores, tais como temperatura, teor de água, ou a presença de outras moléculas que possam capturar os produtos da radiólise da água (figura 1). 3 – Radicais livres Um radical livre é um átomo ou molécula que possui um ou mais elétrons não emparelhados, o que lhe confere enorme reatividade química. Este conceito inclui o átomo de hidrogênio (que só possui um elétron) e a molécula de oxigênio. Um radical livre pode ser confundido com os íons CAP.VI FUNDAMENTOS DA RADIOBIOLOGIA 2 provenientes da dissociação eletrolítica. O evento primário para a formação de radicais livres da água é a ejeção de um elétron pela radiação ionizante. O elétron arrancado, não possuindo grande energia cinética, pode ser capturado por outra molécula de água, que fica com carga negativa. Os dois íons que podem ser assim formados (H2O - e H2O +) interagem com outras moléculas da vizinhança, gerando radicais livres H• e OH• (figura 2a). Os produtos de radiólise podem interagir entre si, como dois radicais OH• (radical hidroxil) gerando uma molécula de H2O2 (peróxido de hidrogênio). 4 – Produção de espécies ativas de oxigênio (EAO) Em meios oxigenados, o elétron ejetado pode ser capturado pelo oxigênio, acarretando a formação de O2• - (radical superóxido) que interagindo com uma molécula de água, conduz à formação de HO2 • (radical peroxil). Este radical interagindo com uma molécula de DNA pode peroxidar sua extremidade livre, conseqüentemente, impedindo sua posterior regeneração. Processos desta natureza costumam justificar o aumento da inativação quando a irradiação é feita em meio oxigenado. Este é o chamado efeito oxigênio. Os organismos aeróbicos utilizam oxigênio para produzir energia, mediante a transformação da glicose, segundo a reação: C6H12O 6 + 6 O2 6 H2O + 6 CO2 As reações bioquímicas, especialmenteaquelas catalisadas pela citocromo C oxidase, responsável por grande parte das oxidações intracelulares, levam à redução de quase 95% das moléculas de oxigênio, mediante a captura de quatro elétrons e interação com átomos de hidrogênio, dando origem a moléculas de água. Mas existe nos organismos aeróbicos uma outra via de redução, que consiste na transferência progressiva de elétrons (monoeletrônica), gerando, sucessivamente, radical superóxido, peróxido de hidrogênio e radical hidroxila (figura 3a). O radical superóxido reúne as características de um íon e de um radical livre e, por esta razão, costuma ser representado como O2• -; ele é formado em quase todas as células em aerobiose. Este radical pode receber mais um elétron e dois prótons gerando H2O2. A transformação de O2• -- em H2O2 constitui uma dismutação e pode ser realizada, enzimaticamente, pela superóxido dismutase (SOD), como mostrado na figura 3b. Nesse diagrama também estão representados os papéis da catalase e das peroxidades enzimas responsáveis pela destruição dos peróxidos formados no meio intracelular. No interior das células o peróxido de hidrogênio pode reagir com íons metálicos (como o íon Fe), gerando o íon OH- e o radical OH• , através da reação de Fenton: CAP.VI FUNDAMENTOS DA RADIOBIOLOGIA 3 H2O2 + Fe ++ Fe+++ + OH- + OH• 5 – Lesões radioinduzidas em macromoléculas 5.1 – Radioprodutos do DNA Os efeitos das radiações ionizantes em moléculas de DNA são bastante diversificados, a importância relativa de cada radioproduto dependendo de diversos fatores, tais como o tipo de radiação, as condições de irradiação (pH, temperatura, teor de oxigênio, presença de aceptores de radicais livres, etc.), as características do DNA (estrutura em hélice simples ou dupla De forma esquemática, os efeitos das radiações ionizantes no DNA, resumidos na figura 4 , incluem: ·alterações estruturais das bases e das desoxirriboses; ·Sítios apurínicos ou apirimidínicos (eliminação de bases); ·Rompimento das pontes de hidrogênio entre duas hélices de DNA; ·Rupturas simples e duplas das hélices; ·Ligações cruzadas entre moléculas de DNA ou DNA e proteínas. Alguns destes efeitos decorrem da interação entre a radiação e o DNA (efeito direto), mas, em sua maior parte, eles são devidos ao ataque da macromolécula pelos radicais livres formados (efeito indireto). 5.1.1 - Radiólise de bases purínicas e pirimidínicas Grande parte dos efeitos das radiações no DNA é conseqüência de lesões provocadas nas bases nitrogenadas. Lesões observáveis na cadeia polinucleotídica, como a sua ruptura ou o rompimento de pontes de hidrogênio, podem ser provocadas por modificações ocorridas nas bases. A irradiação de purinas pode levar à abertura do anel imidazólico pelo ataque de radicais livres (especialmente OH•) à ligação entre o carbono 8 e o nitrogênio 9 (figura 5). As bases pirimidínicas possuem uma dupla ligação entre os carbonos 5 e 6, o que constitui um sítio particularmente favorável à adição de radicais livres (H•, OH• ou HO2 •). A irradiação do DNA pode acarretar a eliminação de bases nitrogenadas, gerando sítios apurínicos ou apirimidínicos (sítios AP) (figura 4). Estes sítios podem se originar do ataque da desoxirribose pelos radicais livres ou da interação destes com a própria base nitrogenada. Os sítios AP não acarretam, diretamente, o rompimento da cadeia fosfodiéster, mas produzem fragilidade da cadeia nas regiões onde são formados. 5.1.2 - Quebras de pontes de hidrogênio. O rompimento de algumas pontes de hidrogênio pode ocorrer em regiões nas quais a cadeia polinucleotídica tenha sofrido CAP.VI FUNDAMENTOS DA RADIOBIOLOGIA 4 rupturas ou onde tenha havido ligações cruzadas (figura 4). As alterações produzidas pelas radiações no DNA, no RNA ou nas proteínas podem se expressar por: · modificações de suas estruturas primárias (lesões nos nucleotídeos ou nos aminoácidos); · alterações nas estruturas secundária, terciária ou quaternária (como rompimento de pontes de hidrogênio no DNA ou de ligações de dissulfeto nas proteínas); · quebra ou radiólise, gerando dois ou mais fragmentos moleculares; · aparecimento de sítios extremamente reativos, capazes de conduzir à associação de duas ou mais macromoléculas ou de regiões distintas da mesma molécula. 5.1.3 - Ruptura de hélices A radiação pode produzir a quebra de uma das cadeias do DNA (ruptura simples), ou das duas em pontos diametralmente opostos (ruptura dupla) (figura 6). É importante lembrar que uma molécula com uma ruptura simples mantém sua estrutura em dupla hélice, graças à preservação das pontes de hidrogênio. Já a ruptura dupla em pontos diametralmente opostos leva à fragmentação da molécula em dois pedaços. É claro que a freqüência de ocorrência das rupturas duplas deve depender da natureza da radiação utilizada. Assim, radiações de elevada Transferência Linear de Energia (TLE), tais como as partículas a, produzindo interações mais próximas, têm maior probabilidade de promover quebras nas duas hélices do DNA que radiações X ou gama. 5.1.4 - Ligações cruzadas As radiações são capazes de conduzir à associação de duas ou mais moléculas de DNA ou de DNA e proteína (ligações intermoleculares) ou de regiões distintas da mesma molécula (ligações intramoleculares). 6 - Defesa contra os radicais livres e EAO Os radicais livres podem interagir com diferentes tipos de moléculas, por isto, a amplitude dos efeitos indiretos é reduzida pela adição, antes da irradiação, de uma ou mais substâncias capazes de funcionar como aceptores de radicais livres. Alguns são aceptores inespecíficos, isto é, interagem com os diversos tipos de radicais livres, competindo com as macromoléculas ou células irradiadas, protegendo-as. Uma concentração elevada destes agentes assegura a existência de numerosos sítios para interação com os radicais livres, reduzindo a inativação produzida pelos efeitos indiretos. A vitamina E, por exemplo, constitui uma barreira protetora contra as EAO, introduzindo-se entre os lipídeos da camada mais externa da epiderme, protegendo principalmente as membranas celulares. Sua ação reforça o tecido conjuntivo, favorece a vascularização e propicia a regeneração cutânea, prevenindo a CAP.VI FUNDAMENTOS DA RADIOBIOLOGIA 5 formação de rugas emanchas senis. Muitos são aceptores específicos, interagindo somente com determinadas espécies de radicais livres. O radical peróxido, por exemplo, pode reagir diretamente com a vitamina A, assim como pode ter sua ação bloqueada por enzimas como a catalase ou peroxidases. O radical superóxido pode ser neutralizado pela vitamina C e pode ser destruído pela enzima superóxido dismutase. Poucas substâncias possuem especificidade para a captura de radicais H•, mas o próprio oxigênio pode participar de sua remoção do meio irradiado, dando origem a um radical peroxil. Os radicais hidroxil (OH•), provavelmente os mais importantes na inativação devida aos efeitos indiretos, podem ser capturados por diversos compostos, tais como o benzoato de sódio, o manitol, osalcoóis (como o glicerol), os aminotióis (como a cisteína e a cisteamina) e a tiouréia. É provável que não exista um mecanismo único para a interação destes compostos com os radicais OH•. 7 - Efeitos Biológicos Atribuídos aos Radicais Livres e (ou) EAO Nos últimos anos, grande atenção tem sido dada ao papel biológico das Espécies Ativas de Oxigênio (EAO), uma vez que elas são também formadas durante o metabolismo celular, desempenhando ações importantes em fenômenos como: • resposta imunitária; • reação inflamatória; • peroxidação de lipídeos; • produção de quebras ou alterações estruturais em cromossomos; • mutagênese; • envelhecimento; • cancerização. Os efeitos letais e mutagênicos das radiações ionizantes podem ser bloqueados por enzimas que inativam certas EAO, confirmando o papel das espécies ativadas de oxigênio na gênese das radiolesões. Analogamente, as EAO parecem também estar implicadas em alguns dos efeitos biológicos provocados pelo UV longo e por diversos compostos químicos, como a bleomicina e o benzo(a)pireno. Dadas as analogias entre as lesões produzidas por tais produtos e as provocadas pelas radiações ionizantes, eles costumam ser denominados radiomiméticos, tendo sido rotineiramente empregados na terapêutica de câncer. Abaixo estão relacionados alguns exemplos de patologias atribuídas aos radicais livres e (ou) às EAO, assim como algumas de suas utilizações. 7.1 - Inativação de bactérias invasoras As células fagocitárias, ao encontrarem bactérias invasoras no CAP.VI FUNDAMENTOS DA RADIOBIOLOGIA 6 organismo, sofrem um estímulo na membrana, gerando EAO, que inativam as bactérias, tornando possível que elas sejam englobadas, por fagocitose, e digeridas; 7.2 - Granulomatose crônica Em certas doenças, como a granulomatose crônica, as células fagocitárias não produzem EAO, o que agrava os processos inflamatórios. 7.3 - Artrite Nas artrites, as células fagocitárias, por produzirem grande quantidade de EAO, causam a inativação celular no sítio da inflamação, do que resulta a liberação de certas enzimas capazes de, em conjunto com os radicais livres de oxigênio, atacar e lesar cartilagens e ossos; 7.4 - Catarata Como resultado de reações induzidas pela luz, há formação de EAO no globo ocular que atacam as proteínas do cristalino, tornando-o opaco; 7.5· Doença de Parkinson A retirada de um grupamento amina das catecolaminas, por via oxidativa, produz EAO que vão aos poucos destruindo os neurônios. O fenômeno pode ser acelerado por acúmulo anormal de catecolaminas em neurônios do cérebro; 7.6 – Enfisema Na formação do enfisema pulmonar indu-zido pelo tabagismo, a fumaça do cigarro provoca a proliferação das células fagocitárias, que produzem EAO. A reação destas com o monóxido de nitrogênio (NO) proveniente do fumo leva à produção do radical OH•, que lesa as células pulmonares; 7.7 - Isquemia Na lesão isquêmica, a ausência de O2 conduz ao acúmulo de substâncias redutoras, principalmente hipoxantina. O restabelecimento da irrigação provoca oxidação intensa da hipoxantina,com grande produção de EAO levando à necrose tissular; 7.8 - Radioterapia O efeito indireto das radiações, mediado por EAO, desempenha papel extremamente importante na destruição dos tumores; 7.9 - Quimioterapia Diversas drogas como a bleomicina e adriamicina formam complexos com o DNA e com íons Fe++, formando EAO em presença de O2, as quais atacam o DNA. Como as células tumorais têm reprodução mais rápida, são mais sensíveis a este efeito que as dos tecidos normais; CAP.VII EFEITOS SOMÁTICOS E GENÉTICOS DAS RADIAÇÕES IONIZANTES 1 CAPÍTULO VII - EFEITOS SOMÁTICOS E GENÉTICOS DAS RADIAÇÕES IONIZANTES 1 – Aspectos Gerais No final do século passado, logo após as descobertas dos raios X e da radioatividade, surgiram os primeiros relatos de lesões radioinduzidas, observadas principalmente entre pesquisadores, técnicos e fabricantes de aparelhos. Poucos meses após a verificação experimental da produção de raios X, uma radiodermite foi observada nas mãos de um técnico. O primeiro caso de câncer radioinduzido foi observado em 1902, na pele de um fabricante de tubos de raios X, que costumava testar o funcionamento dos aparelhos expondo sua própria mão. Nos anos seguintes muitas descrições semelhantes apareceram na literatura médica, de tal forma que, em 1922, cerca de 100 radiologistas eram considerados como tendo falecido em conseqüência de exposições a elevadas doses de radiação. Diversos grupos humanos foram expostos a doses relativamente elevadas de radiação e, por esta razão, têm sido exaustivamente estudados. Entre tais grupos podem ser apontados: · sobreviventes das explosões nucleares de Hiroshima e Nagasaki; · habitantes das ilhas Marshall e pescadores japoneses atingidos pela precipitação de radionuclídeos gerados em uma explosão experimental de bomba de fusão, realizada em 1954, no atol de Bikini, no sul do oceano pacífico; · pacientes expostos a elevadas doses de radiação para fins terapêuticos ou diagnósticos; · sobreviventes de acidentes ocorridos em reatores nucleares, em instalações de processamento de material radioativo ou nas quais eram empregadas potentes fontes de radiação; · pessoal técnico-científico exposto profissional-mente, como radiologistas, radioterapeutas, especialistas em Medicina Nuclear, engenheiros e físicos nucleares, técnicos de raios X, etc.; · mineiros e profissionais ligados à extração e à purificação de minerais radioativos; · habitantes de zonas de altos níveis de radioatividade natural, como Guarapari, Araxá e Poços de Caldas no Brasil, ou nas regiões de Kerala e Madras, na Índia. 2 – Radiosensibilidade de células de mamíferos De forma simplificada admite- se como válida a lei de Bergonié e Tribondeau, cujo enunciado é "são mais radiossensíveis as células que exibem maior atividade mitótica e (ou) menor grau de diferenciação", embora exceções a esta regra possam ser observadas. Esquematicamente, é possível considerar a existência, em qualquer tecido, de células parenquimatosas, responsáveis pelas funções nele envolvidas, de células do tecido conjuntivo, encarregadas de dar suporte às primeiras, e de vasos sangüíneos, aos quais cabem a alimentação e a oxigenação tissular. Existem diferenças de radiossensibilidade entre os diversos CAP.VII EFEITOS SOMÁTICOS E GENÉTICOS DAS RADIAÇÕES IONIZANTES 2 tipos de células parenquimatosas no organismo, que podem
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