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Princípios do Direito Contratual

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Princípio da autonomia privada:
Conceitua-se a “autonomia privada” com a configuração do ordenamento jurídico pátrio e a experiência histórica local. 
Como se sabe o contrato está situado nos direitos pessoais, não podendo ser ignorado a grande importância da vontade sobre o instituto, já que se trata de negócio jurídico por excelência.
Para Carvalho de Mendonça os romanos deixaram uma herança em relação aos contratos, que é “respeito à palavra dada”, no qual é uma expressão da ideia central de contrato como fonte obrigacional. 
No mundo negocial possui a plena liberdade para a celebração dos pactos e avenças com determinadas pessoas, sendo o direito à contratação inerente à própria concepção da pessoa humana, um direito existencial da personalidade advindo do princípio da liberdade, tendo então a liberdade de contratar. Já a autonomia da pessoa pode estar relacionada com o conteúdo do negócio jurídico, ponto em que residem limitação ainda maiores em relação a liberdade da pessoa humana, tratando da liberdade contratual. 
A autonomia privada, que constitui a liberdade que a pessoa tem para regular os próprios interesses. Essa autonomia não é absoluta, encontrando limitação em normas de ordem pública e nos princípios sociais.
Francisco Amaral observa que: “A autonomia privada é o poder que os particulares têm de regular, pelo exercício de sua própria vontade, as relações que participam, estabelecendo-lhe o conteúdo e a respectiva disciplina jurídica. Sinônimo de autonomia da vontade para grande parte da doutrina contemporânea, com ela, porém não se confunde, existindo entre ambas sensíveis diferenças. A expressão ‘autonomia da vontade’ tem uma conotação subjetiva, psicológica, enquanto a autonomia privada marca o poder da vontade no direito de um modo objetivo, concreto e real”.
O principal campo de atuação da autonomia privada é o patrimônio, onde se situam os contratos como ponto central do Direito Privado. Esse princípio traz limitações, principalmente relacionadas com a formação e reconhecimento da validade dos negócios jurídicos. A eficácia social pode ser apontada como uma dessas limitações, havendo clara relação entre o preceito aqui estudado e o princípio da função social dos contratos.
“A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio, quando presentes interesses meta individuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana”.
Por fim, autonomia privada pode admitir a interpretação extensiva ou a analogia, visando proteger a parte vulnerável da relação negocial, caso do trabalhador, do consumidor e do aderente. Para reforçar essa constatação, é importante lembrar da proteção constitucional dos vulneráveis, mais especificamente dos trabalhadores (art. 7.º) e dos consumidores (art. 5.º, XXXII).
Princípio da função social dos contratos:
É princípio de ordem pública, previsto no art. 2.035, parágrafo único, do Código Civil, pelo qual o contrato deve ser, necessariamente, interpretado e visualizado de acordo com o contexto da sociedade.
A palavra função social deve ser visualizada com o sentido de finalidade coletiva, sendo efeito do princípio em questão a mitigação ou relativização da força obrigatória das convenções (pacta sunt servanda).
Não se deve mais interpretar os contratos somente de acordo com aquilo que foi assinado pelas partes, mas sim levando-se em conta a realidade social que os circunda. O artigo 421 do Código civil diz: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”. Sendo assim, possui dupla eficácia, isso porque tem prevalecido entre os doutrinadores a ideia de que a função social do contrato tem tanto eficácia interna, quanto eficácia externa.
A eficácia interna da função social dos contratos – reconhecida pelo Enunciado n. 360 do CJF/STJ, aprovado na IV Jornada de Direito Civil, por proposição deste autor. A eficácia interna da função social dos contratos tem cinco aspectos principais: proteção dos vulneráveis contratuais, vedação da onerosidade excessiva ou desequilíbrio contratual (efeito gangorra), proteção da dignidade humana e dos direitos da personalidade no contrato, nulidade de cláusulas antissociais, tidas como abusivas e tendência de conservação contratual, sendo a extinção do contrato, a última medida a ser tomada, a ultima ratio.
A eficácia externa da função social do contrato – reconhecida pelo Enunciado n. 21 do CJF/STJ, da I Jornada de Direito Civil. Há dois aspectos principais a proteção dos direitos difusos e coletivos e Tutela externa do crédito. 
Registra-se que o comando legal do art. 2.035 do CC é primaz por três aspectos primordiais:
I) A norma enuncia que o princípio da função social dos contratos é preceito de ordem pública. Como consequência, cabe sempre intervenção do Ministério Público e conhecimento de ofício pelo juiz. Por tal constatação merece críticas a Súmula 381 do STJ que veda ao juiz conhecer de ofício da abusividade em contratos bancários. A súmula em questão viola claramente o princípio da função social dos contratos e a regra em comento; além de representar um atentado ao Código de Defesa do Consumidor.
II) O dispositivo coloca a função social dos contratos ao lado da função social da propriedade, dando fundamento constitucional à primeira. Em suma, pode-se dizer que a função social dos contratos está baseada na função social da propriedade, constante do art. 5.º, XXII e XXIII, da CF/1988, como queria Miguel Reale. Em reforço, afirma-se com convicção que a função social do contrato está estribada nos princípios constitucionais de proteção da dignidade humana (art. 1.º, III) e da solidariedade social (art. 3.º, I).
III) Sem qualquer inconstitucionalidade, o diploma em comento possibilita que a função social dos contratos seja aplicada a um contrato celebrado na vigência do CC/1916, mas que esteja gerando efeitos na vigência do CC/2002, o que se denomina retroatividade motivada ou justificada. A premissa está baseada na antiga lição segundo a qual as normas de ordem pública podem retroagir. Nessa linha de pensamento, professa Mário Luiz Delgado que “se, por um lado, exige a vida social que a fé na segurança jurídica e estabilidade das relações não seja ameaçada pelo receio de que uma lei posterior venha a perturbar aquelas que validamente já se formaram, de outro também é de se exigir a submissão do ordenamento jurídico aos interesses maiores da coletividade, de modo a se atingir o ideal de justiça e de utilidade, representação do bem comum”.
Por fim, é forçoso concluir que, na verdade, o art. 2.035, parágrafo único, do CC/2002, é o dispositivo mais importante para a função social dos contratos na atual legislação brasileira pelos três aspectos destacados.
Princípio da força obrigatória dos contratos (pacta subnt servanda):
Esse princípio importa em autêntica restrição da liberdade, que se tornou limitada para aqueles que contrataram a partir do momento em que vieram a formar o contrato consensualmente e dotados de vontade autônoma. Nesse sentido, alguns doutrinadores falam em princípio do consensualismo. 
Este princípio não há previsão expressa no Código Civil, porém, os arts. 389, 390 e 391 da atual codificação material, que tratam do cumprimento obrigacional e das consequências advindas do inadimplemento, afastam qualquer dúvida quanto à manutenção da obrigatoriedade das convenções como princípio do ordenamento jurídico privado brasileiro.
O princípio da força obrigatória continua previsto em nosso ordenamento jurídico, mas não mais como regra geral, como antes era concebido. A força obrigatória constitui exceção à regra geral da socialidade, secundária à função social do contrato, princípio que impera dentro da nova realidade do direito privado contemporâneo. Certo é, portanto, que o princípio da força obrigatória não tem mais encontrado a predominância e a prevalência que exercia no passado. O princípio em questão está, portanto,mitigado ou relativizado, sobretudo pelos princípios sociais da função social do contrato e da boa-fé objetiva.
Princípio da boa-fé objetiva: 
No Direito Alemão duas expressões são utilizadas para apontar as modalidades de boa-fé ora expostas. O termo Guten Glauben – que quer dizer, literalmente, bom pensamento – denota a boa-fé subjetiva; enquanto que Treu und Glauben – fidelidade e pensamento – denota a boa-fé objetiva.
Nosso atual Código Civil, ao seguir essa tendência, adota a dimensão concreta da boa-fé, como já fazia o Código de Defesa do Consumidor em seu art. 4.º, III, entre outros comandos, segundo o qual “a Política Nacional de Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: 
“III – harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170 da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores” (destacado). Quanto a essa confrontação necessária entre o Código Civil de 2002 e o CDC, prevê o Enunciado n. 27 do CJF/STJ que: “Na interpretação da cláusula geral da boa-fé objetiva, deve-se levar em conta o sistema do CC e as conexões sistemáticas com outros estatutos normativos e fatores metajurídicos”. Um desses estatutos normativos é justamente a Lei 8.078/1990, ou seja, deve ser preservado o tratamento dado à boa-fé objetiva pelo CDC.”
Pois bem, como antes destacado, tornou-se comum afirmar que a boa-fé objetiva, conceituada como sendo exigência de conduta leal dos contratantes, está relacionada com os deveres anexos ou laterais de conduta, que são ínsitos a qualquer negócio jurídico, não havendo sequer a necessidade de previsão no instrumento negocial. São considerados deveres anexos, entre outros: dever de cuidado em relação à outra parte negocial, dever de respeito, dever de informar a outra parte o conteúdo do negócio, dever de agir de acordo com a confiança depositada, dever de lealdade e probidade, dever de colaboração, dever de agir com honestidade e o dever de agir com razoabilidade, a equidade, e a boa razão.
Por fim, quanto à aplicação da boa-fé objetiva na fase pós-contratual, cite-se o comum entendimento de que o credor tem o dever de retirar o nome do devedor do cadastro de inadimplentes após o pagamento da dívida. Isso, sob pena de surgimento de uma responsabilidade pós-contratual (post pactum finitum), pela quebra da boa-fé.
Princípio da relatividade dos efeitos contratuais:
O princípio da relatividade dos efeitos contratuais, consubstanciado na antiga máxima res inter alios, encontra exceções, na própria codificação privada. Em outras palavras, é possível afirmar que o contrato também gera efeitos perante terceiros. A estipulação em favor de terceiro, tratada entre os arts. 436 a 438 do CC – hipótese em que um terceiro, que não é parte do contrato, é beneficiado por seus efeitos, podendo exigir o seu adimplemento. Exemplo típico é o que ocorre no contrato de seguro de vida, em que consta terceiro como beneficiário. A promessa de fato de terceiro (arts. 439 e 440 do CC) – figura negocial pela qual determinada pessoa promete que uma determinada conduta seja praticada por outrem, sob pena de responsabilização civil. 
O art. 440 do CC/2002, entretanto, enuncia que se o terceiro pelo qual o contratante se obrigou comprometer-se pessoalmente, estará o outro exonerado de responsabilidade. No caso, a promessa pessoal substitui a promessa feita por um terceiro, havendo uma cessão da posição contratual, pois o próprio terceiro é quem terá a responsabilidade contratual. O exemplo é o de um promotor de eventos que promete um espetáculo de um cantor famoso. Caso o cantor não compareça ao show, no melhor estilo Tim Maia, responderá aquele que fez a promessa perante o outro contratante.

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