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Ação Rescisória – uma análise à luz do CPC2015

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Ação Rescisória – uma análise à luz do CPC/2015
Rescissory action - an analysis in the light of CPC / 2015
Leopoldo Baffi de Favari
Pós-graduando em Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas – PUC Campinas. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifica Universidade Católica de Campinas – PUC Campinas. Advogado.
Resumo: O objetivo deste artigo é analisar as particularidades da ação rescisória de acordo com as mudanças propostas pelo CPC/2015 em comparação aos códigos anteriores; abordando os pontos principais desta ação que se destina a garantir a segurança jurídica, se propondo a reparar qualquer eventual injustiça praticada em decisão de mérito transitada em julgado.
Palavras chave: Ação Rescisória – Coisa Julgada – Decisão de mérito transitada em julgado - Judicium rescindens – Judicium rescissorium.
Abstract: The purpose of this article is to analyze the particularities of the rescission action according to the changes proposed by the CPC / 2015 in comparison to the previous codes; addressing the main points of this action, which is intended to guarantee legal certainty, proposing to repair any possible injustice committed in a final decision.
Keywords: Rescissory action - Judgment - Final decision on the merits – Judicium rescindens – Judicium rescissorium.
Sumário: 1. Introdução; 2. Conceito e Casos de Admissibilidade; 3. Manifesta violação à lei fundada em divergência jurisprudencial; 4. Legitimidade e Competência; 5. Prazos; 6. Considerações Finais; 7. Referências bibliográficas.
Introdução
Ação rescisória não é propriamente uma novidade no ordenamento jurídico brasileiro, entretanto, o CPC/2015 trouxe mudanças que merecem ser analisadas e compreendidas para o melhor aproveitamento desta ferramenta processual.
No presente trabalho nos propomos a analisar as diferenças práticas oriundas das mudanças trazidas pelo novo ordenamento, comparando as determinações atuais com a posição adotada pelo legislador em outras oportunidades. 
Para tanto nos dispomos a abordar os principais artigos da legislação vigente, bem como demonstrar os desdobramentos por ela produzidos no sistema jurídico com um todo.
O artigo se propõe prioritariamente a uma análise técnica das mudanças advindas da atualização da lei, aprofundando-se principalmente nos pontos controversos pela doutrina e/ou jurisprudência.
Conceito e Casos de Admissibilidade
Via de regra, um processo se dá por encerrado com o trânsito em julgado da sentença e/ou acordão, com ou sem resolução de mérito, quando não há mais recursos a serem ofertados ou quando se deixa de oferta-los no prazo cabível, fazendo assim coisa julgada; que tem por objetivo garantir a estabilidade da decisão tomada após o curso do processo, tornando a referida decisão indiscutível dentro do processo em que foi proferida, promovendo assim a segurança jurídica do bem tutelado.
A ação rescisória é um instrumento processual, que passa a ser cabível justamente no momento pós transito em julgado da decisão, quando não é mais permitido as partes debater sobre o que foi decidido naquele processo.
Ante o nome desta ferramenta, não é difícil entender que se trata de uma ação autônoma e não de mais um recurso no âmbito processual.
 Entretanto, é essencial destacar que a ação rescisória se difere dos recursos pelo objeto, ou seja, apesar de ambos atacarem decisões judiciais eles o fazem de maneiras e em momentos distintos.
Humberto Theodoro Junior nos aponta com brilhantismo a distinção entre os recursos e a ação rescisória, “Trata-se de ação rescisória, que não se confunde com o recurso justamente por atacar uma decisão já sob o efeito da res iudicata. Estamos diante de uma ação contra sentença, diante de um remédio “com que se instaura outra relação jurídica processual”, como destaca Pontes de Miranda. ”[1: THEODORO JR. Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Execução forçada processos nos tribunais, recursos e direito intertemporal – vol. III/ Humberto Theodoro Junior. 49. Ed. Ver., atual., e ampl. – Rio de Janeiro: Forense,2016. P. 836.]
Em outras palavras, o legislador, entendendo que uma decisão transitada em julgado, portanto, válida e eficaz, pode conter vícios e injustiças, previu um meio de sanar tais problemas, pondo fim a injustiça produzida através do devido processo legal.
A ação rescisória, está presente no ordenamento como meio de cindir a decisão, e se for o caso, rejulgar, a demanda que se encontrava viciada e injusta quando fora proferida e fez coisa julgada.
Portanto, podemos definir a ação rescisória como a ferramenta utilizada para desconstituir decisão transitada em julgado, podendo rejulgar a matéria que foi objeto da decisão.
Pressupostos da ação
Para a propositura da ação rescisória, além dos requisitos que devem estar presentes em qualquer outra ação, há dois elementos essenciais:
I - Uma decisão de mérito transitada em julgado, cujo rol taxativo se encontra no art. 487 do CPC/2015:
Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz:
I - Acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção;
II - Decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição;
III - Homologar:
a) o reconhecimento da procedência do pedido formulado na ação ou na reconvenção;
b) a transação;
c) a renúncia à pretensão formulada na ação ou na reconvenção.
A primeira grande mudança efetuada pela legislação atual parece muito simples, uma pequena substituição de palavras, mas que certamente ampliou a aplicabilidade da ação rescisória.
Anteriormente, no art. 485 do CPC/1973, a expressão utilizada era “sentença de mérito”, que foi substituída por “decisão de mérito”. 
Ao promover esta alteração, o legislador ampliou o cabimento da ação rescisória para além das sentenças de mérito, incluído agora os acórdãos; as decisões monocráticas do relator, quando este julga o mérito da questão; as decisões incidentais e as decisões interlocutórias, que põe fim a parte do processo.[2: FPPC, Enunciado 336: Cabe ação rescisória contra decisão interlocutória de mérito.]
Há ainda a possibilidade de propositura de ação rescisória contra decisões que não versam sobre o mérito, mas que ainda assim fazem coisa julgada, como novamente inovou o CPC/2015 no parágrafo 2º do art. 966, pondo fim a um debate doutrinário e jurisprudencial que havia ainda sobre a égide do código anterior:
§ 2º Nas hipóteses previstas nos incisos do caput, será rescindível a decisão transitada em julgado que, embora não seja de mérito, impeça:
I - Nova propositura da demanda; ou
II - Admissibilidade do recurso correspondente.
	Neste paragrafo o legislador se preocupou em possibilitar o uso da ferramenta rescisória também aos casos em que mesmo sem avaliar o mérito as decisões podem trazer injustiças.
No inciso I, o foco são as decisões de inadmissibilidade do art. 485, incisos I, IV, V, VI e VII do CPC/2015, onde caso o vício não possa ser sanado para a repropositura da demanda a ação rescisória poderá ser utilizada.
No mesmo sentido, acaba vetando a utilização da ação rescisória para as decisões terminativas, os demais incisos do art. 485 do CPC/2015, uma vez que para estas basta que seja sanado o vício e que a demanda seja proposta novamente.
Já no inciso II, o legislador se debruça sobre os casos em que recursos são inadmitidos pelo relator, principalmente quando de maneira contraria a lei, não permitindo o seguimento do recurso apresentado pela parte. 
Neste caso a decisão a ser rescindida seria a decisão do relator que negou segmento ao recurso, sem prejuízo de que cumulativamente seja apresentado um pedido para “a desconstituição da decisão do relator com o subsequente conhecimento e julgamento do recurso ou, na hipótese de não lograr êxito, a desconstituição da sentença”.[3: Didier Jr., Fredie. Curso de direito processual civil: o processo civil nos tribunais, recursos, ações de competência originaria de tribunal e querela nullitatis, incidentes de competência originariade tribunal /Fredie Didier Jr., Leonardo Carneiro da Cunha – 14. Ed. Reform. – Salvador: ed. JusPodvim, 2017.]
Merece destaque, a também inovação do novo código, a possibilidade de que a rescisória seja proposta contra um capitulo especifico da sentença, como dispõe o §3º, do art. 966:
§ 3º A ação rescisória pode ter por objeto apenas um capítulo da decisão.
	Contudo, chamamos a atenção ao detalhe de que a possibilidade trazida pelo parágrafo acima mencionado, em nada se confunde com a fundamentação do ataque ao mérito na ação rescisória, que deve ser completa, em outras palavras, no caso do mérito ser sustentado por mais de um fundamento, todos eles devem ser atacados, sob pena de que um destes não sendo atacado a decisão seria mantida.[4: (STF - AR: 799 RJ, Relator: Min. RODRIGUES ALCKMIN, Data de Julgamento: 19/05/1977, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: RTJ VOL-00083-03 PP-00674)]
	Conforme mencionado anteriormente, segundo o §3º do art. 487 do CPC/2015, uma das possibilidades de resolução de mérito é a decisão que homologa a transação, pedido/renuncia na ação ou reconvenção, portanto fazem coisa julgada e são passiveis de ação rescisória. 
	Porem no §4º do art. 966 do CPC/2015, o legislador aborda a ação anulatória, que diferente da rescisória, visa atacar os atos praticados pelas partes e não a decisão de mérito transitada em julgado.
	Portanto, a ação anulatória se destina aos casos em que não há matéria a ser julgada, a função do magistrado é apenas de verificar as formalidades do ato. “Valendo não por si mesmas, mas pelo ato jurídico que certificam, tais sentenças não geram a coisa julgada em sentido formal e material, não sendo, por isso, rescindíveis. ”[5: MARTINS. Pedro Batista. Recursos e processos de competência originaria dos tribunais. Rio de Janeiro: Forense, 1957, n. 73, p.108.]
	No mesmo sentido, podemos observar o enunciado 138 do Fórum Permanente dos Processualista Civis:
FPPC, Enunciado 138: A partilha amigável extrajudicial e a partilha amigável judicial homologada por decisão ainda não transitada em julgado são impugnáveis por ação anulatória.
	De volta aos pressupostos essenciais para a propositura de ação rescisória, temos o segundo elemento:	
 II - O enquadramento em algum dos motivos previstos no rol taxativo dos incisos do art. 966 do CPC/2015:
Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
I - Se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;
II - For proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;
III - Resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;[6: TST, Súmula 403: I – Não caracteriza dolo processual, previsto no art. 485, III, do CPC [de 1973, correspondente ao art. 966, III, do CPC/2015], o simples fato de a parte vencedora haver silenciado a respeito de fatos contrários a ela, porque o procedimento, por si só, não constitui ardil do qual resulte cerceamento de defesa e, em consequência, desvie o juiz de uma sentença não condizente com a verdade. II – Se a decisão rescindenda é homologatória de acordo, não há parte vencedora ou vencida, razão pela qual não é possível a sua desconstituição calcada no inc. III do art. 485 do CPC [de 1973, correspondente ao art. 966, III, do CPC/2015] (dolo da parte vencedora em detrimento da vencida), pois constitui fundamento de rescindibilidade que supõe solução jurisdicional para a lide.]
IV - Ofender a coisa julgada;[7: FPPC, Enunciado 554: Na ação rescisória fundada em violação ao efeito positivo da coisa julgada, haverá o rejulgamento da causa após a desconstituição da decisão rescindenda.]
V - Violar manifestamente norma jurídica;[8: STF, Súmula 343: Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.]
VI - For fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória;
VII - Obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;[9: FPPC, Enunciado 602: A prova nova apta a embasar ação rescisória pode ser produzida ou documentada por meio do procedimento de produção antecipada de provas.]
VIII - For fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.
Nos requisitos do art. 966 do CPC/2015 o rol se manteve o mesmo de antes da atualização da legislação, ao passo em que consideramos desnecessária uma análise mais aprofundada dos motivos autorizadores da ação por rescisória por não representarem novidade ante a atualização da lei.
 Manifesta violação à lei fundada em divergência jurisprudencial
Dentre as inovações trazidas pela atualização da legislação, tem dois parágrafos que foram acrescidos ao art. 966 do CPC/2015 por força da Lei 13.256/2016.
§ 5º Cabe ação rescisória, com fundamento no inciso V do caput deste artigo, contra decisão baseada em enunciado de súmula ou acórdão proferido em julgamento de casos repetitivos que não tenha considerado a existência de distinção entre a questão discutida no processo e o padrão decisório que lhe deu fundamento.
§ 6º Quando a ação rescisória fundar-se na hipótese do § 5º deste artigo, caberá ao autor, sob pena de inépcia, demonstrar, fundamentadamente, tratar-se de situação particularizada por hipótese fática distinta ou de questão jurídica não examinada, a impor outra solução jurídica.
	Estes parágrafos abordam um tema bastante controverso no CPC/1973, uma vez que o inciso V do artigo 966 do CPC/2015 fala em “violar manifestamente norma jurídica”, já ampliando o sentido com relação a redação anterior, pois agora, “ viola-se a lei não apenas quando se afirma que a mesma não está em vigor, mas também quando se decide em sentido diametralmente oposto ao que nela está posto, não só quando há afronta direta ao preceito mas também, quando ocorre a exegese induvidosamente errônea.” [10: No CPC/1973, o artigo 485, inciso V utilizava o termo “violar literal disposição de lei”.][11: THEODORO JR. Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Execução forçada processos nos tribunais, recursos e direito intertemporal – vol. III/ Humberto Theodoro Junior. 49. Ed. Ver., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense,2016. P.855.]
Contudo, o referido inciso não é explicito quanto aos casos de divergência de jurisprudência, súmulas ou precedentes.
Visando, portanto, sanar tais duvidas os parágrafos acima mencionados foram incluídos ao art. 966 do CPC/2015, com a função de delimitar tal relação de embasamento. 
No parágrafo 5º, fica expresso que caso a decisão transitada em julgado tenha sido fundamentada em súmula ou precedente de caso que não condiz com o enquadramento do argumento utilizado, será cabível ação rescisória.
	Ainda no mesmo sentido, o parágrafo 6º, disciplina que fica a cargo do autor a demonstração de que o caso concreto é diverso do caso que foi utilizado para a criação do precedente ou súmula a ele aplicado, penalizando-o caso não o faça.
Legitimidade e Competência
Os legitimados para a propositura da ação rescisória estão descritos no art. 967 do CPC/2015:
Art. 967. Têm legitimidade para propor a ação rescisória:
I - Quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular;
II - O terceiro juridicamente interessado;
III - O Ministério Público:
a) se não foi ouvido no processo em que lhe era obrigatória a intervenção;
b) quando a decisão rescindenda é o efeito de simulação ou de colusão das partes, a fim de fraudar a lei;
c) em outros casos em que se imponha sua atuação;
IV - Aquele que não foi ouvido no processo em que lhe era obrigatória a intervenção.
Parágrafo único. Nas hipóteses do art. 178, o Ministério Público será intimado para intervir como fiscal da ordem jurídica quandonão for parte.[12: FPPC, Enunciado 339: O CADE e a CVM, caso não tenham sido intimados, quando obrigatório, para participar do processo (art. 118, Lei n. 12.529/2011; art. 31, Lei n. 6.385/1976), têm legitimidade para propor ação rescisória contra a decisão ali proferida, nos termos do inciso IV do art. 967.]
	
	Este artigo guarda muitas semelhanças com seu equivalente no código anterior, de modo em que a ele foram apenas acrescidos a alínea “c” do inciso III e o inciso IV. O parágrafo único acaba apenas por reiterar o disposto no inciso III, no que se refere a atuação do Ministério Público como custos legis.
	Os novos dispositivos têm, respectivamente, por função tornar expresso o entendimento já pacificado pela Justiça do Trabalho ainda no ordenamento anterior, onde o rol do inciso III do art. 487(CPC/2015 – art. 967) seria apenas exemplificativo e conferir legitimidade aqueles que não são partes e nem Ministério Público, mas que tinha intervenção obrigatória no processo original. Nas palavras de Fredie Didier Jr, “ o inciso traz caso em que ente que poderia ter sido amicus curiae tem legitimidade para propor ação rescisória. ”[13: Didier Jr., Fredie. Curso de direito processual civil: o processo civil nos tribunais, recursos, ações de competência originaria de tribunal e querela nullitatis, incidentes de competência originaria de tribunal /Fredie Didier Jr., Leonardo Carneiro da Cunha – 14. Ed. Reform. – Salvador: ed. JusPodvim, 2017. P. 515.]
	No que tange a competência, a ação rescisória ganhou novos contornos através do CPC/2015, o art. 968, produto da unificação dos artigos 488 e 490 do CPC/1973, foi reformulado, incluído limitação ao deposito/multa do inciso II, no parágrafo 2º, bem como ampliando a aplicação da ação rescisória aos casos do art. 332 do CPC/2015, no parágrafo 4º, sem prejuízo de que estas mesmas hipóteses já estejam abarcadas no rol do art. 966.
	As grandes diferenças a serem destacadas estão nos parágrafos 5º e 6º do art. 968, que possibilitam ao autor da ação rescisória emendar a inicial a fim de suprir os vícios que possam vir a existir, podendo ainda complementar os fundamentos da defesa antes dos autos serem remetidos ao tribunal competente, complementando a regra geral do art. 64 do CPC/2015.
Tal característica é marcante no CPC/2015, que tem entre suas normas fundamentais a cooperação entre as partes e exalta cada vez mais a importância da celeridade processual para o bom andamento da Justiça, como por exemplo o art. 4º do CPC/2015.
	Como regra, a ação rescisória é de competência originaria dos tribunais, ou seja, a ação rescisória contra decisão de um juiz federal será processada e julgada pelo T.R.F. ao qual ele está vinculado, no mesmo sentido para a justiça estadual.[14: “Compete ao Supremo Tribunal Federal processar e julga as ações rescisórias de seus próprios julgados (CF/88, art. 102, I, j). Ao Superior Tribunal de Justiça cabe processar e julgar as ações rescisórias de seus julgados (CF/88, art. 105, I, e). Já os Tribunais Regionais Federais processam e julgam, originariamente, as ações rescisórias de seus próprios julgados (CF/88, art. 108, I, b). Quanto aos tribunais de justiça, também detém tal competência originaria para processar e julgar as ações rescisória de seus próprios julgados, estando, normalmente, tal competência definida em cada Constituição Estadual (CF/88, art. 125, I, §1º). ” Didier Jr., Fredie. Curso de direito processual civil: o processo civil nos tribunais, recursos, ações de competência originaria de tribunal e querela nullitatis, incidentes de competência originaria de tribunal /Fredie Didier Jr., Leonardo Carneiro da Cunha – 14. Ed. Reform. – Salvador: ed. JusPodvim, 2017. P. 517.][15: Tribunal Regional Federal.]
	Existem, porém, algumas exceções geradas pelas novas possibilidades que o novo código trouxe ao tema. Por exemplo, com a possibilidade de propositura da ação rescisória em face de decisão interlocutória de mérito, abre-se a possibilidade de cada ação seja proposta em um momento diferente do processo, ou ainda no caso do manejo da ação contra capítulos específicos da decisão, onde os caminhos percorridos dentro do processo podem ser diferentes, de modo a fazer com que cada rescisória tenha um juízo competente diferente e até mesmo que caso um dos capítulos seja principal aos demais, que estes o sigam para o seu juízo competente.
Fredie Didier Jr, traz ainda o caso de decisão de juiz federal sobre matéria internacional, para a qual a rescisória é cabível ao STJ e não ao TRF de vinculo do juiz de primeira instancia.[16: Didier Jr., Fredie. Curso de direito processual civil: o processo civil nos tribunais, recursos, ações de competência originaria de tribunal e querela nullitatis, incidentes de competência originaria de tribunal /Fredie Didier Jr., Leonardo Carneiro da Cunha – 14. Ed. Reform. – Salvador: ed. JusPodvim, 2017. P 519.]
Prazos
Inicialmente havemos de falar sobre a natureza do prazo. Nas palavras de Fredie Didier Jr, “ a ação rescisória é espécie de ação desconstitutiva ou constitutiva negativa. Significa, então, que seu ajuizamento decorre do exercício, pela parte autora, de um direito potestativo à desconstituição da coisa julgada. O prazo de seu ajuizamento é, portanto, decadencial. Após o prazo, caduca o direito a rescisão (art. 975, caput, CPC). ”[17: Idem. P 523.]
Contudo, não podemos deixar de observar que o parágrafo 1º permite a prorrogação do prazo final para o dia útil subsequente. Neste sentido, trazemos o entendimento de José Miguel Garcia Medina, “O direito à rescisão é processual, não obstante sujeite-se a prazo decadencial. Por tratar-se de prazo processual, quando expirar durante férias forenses, recesso, feriados ou em dia em que não houver expediente forense, o prazo se prorrogará até o primeiro dia útil imediatamente subsequente (cf. § 1.º do art. 975 do CPC/2015). Isso não retira a natureza decadencial do prazo. Ora, embora, como regra, prazos decadenciais não se impedem ou suspendem (CC/2002, art. 207), tal regra comporta exceções, e disso dá conta a própria lei civil. ”[18: MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado: com remissões e nota comparativas ao CPC/1973. José Miguel Garcia Medina – 3 Ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017. ]
	Portanto, o prazo para propositura da ação rescisória continuaria sendo decadencial, apesar da previsão de sua dilação ao primeiro dia útil subsequente.
O CPC/2015 disciplina a contagem do prazo para a propositura da ação rescisória no art. 675, que traz tanto a regra geral, 2 anos contados da última decisão proferida no processo, quanto a exceção para os casos específicos dos §§ 2º e 3º:
Art. 975. O direito à rescisão se extingue em 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.
§ 1º Prorroga-se até o primeiro dia útil imediatamente subsequente o prazo a que se refere o caput, quando expirar durante férias forenses, recesso, feriados ou em dia em que não houver expediente forense.
§ 2º Se fundada a ação no inciso VII do art. 966, o termo inicial do prazo será a data de descoberta da prova nova, observado o prazo máximo de 5 (cinco) anos, contado do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.
§ 3º Nas hipóteses de simulação ou de colusão das partes, o prazo começa a contar, para o terceiro prejudicado e para o Ministério Público, que não interveio no processo, a partir do momento em que têm ciência da simulação ou da colusão.
Já ultrapassada a discussão sobre a formação de coisa julgada por decisão interlocutória de mérito, não podemos deixar de mencionar que a redação do caput do referido artigo trouxe uma grande divergência no que tange ao início do prazo para propositura da ação rescisória. Haveria um prazo para cada coisa julgada ou este prazo é de fato contado sobre a última decisão do processo, seguindo a literalidade da letra da lei?
Segundo Didier, a interpretação literal do artigo, seguiria o disposto na antiga súmula401 do STJ, de modo que o prazo para rescisão contra decisão parcial seria indefinido, permitindo a propositura de ação rescisória contra qualquer coisa julgada parcial que tenha se formado	durante a litispendência, atentando claramente contra a segurança jurídica.[19: STJ, Súmula 401: O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial.]
Em contrapartida, interpretar que caput do art. 675 diz respeito a última decisão sobre a questão que se tornou indiscutível pela coisa julgada, estaria “em consonância com todo o sistema do código. Não apenas com as regras sobre coisa julgada parcial, que são várias, mas também com o sistema recursal, tendo em vista que o que dispõe o art. 1008 do CPC. Além disso, essa interpretação está em consonância com os princípios da segurança jurídica e da boa-fé processual. ”[20: Art. 1.008. O julgamento proferido pelo tribunal substituirá a decisão impugnada no que tiver sido objeto de recurso.][21: Didier Jr., Fredie. Curso de direito processual civil: o processo civil nos tribunais, recursos, ações de competência originaria de tribunal e querela nullitatis, incidentes de competência originaria de tribunal /Fredie Didier Jr., Leonardo Carneiro da Cunha – 14. Ed. Reform. – Salvador: ed. JusPodvim, 2017. P 529.]
No mesmo sentido, temos o entendimento de Jose Miguel Garcia Medina, “O termo final do prazo é o mesmo, em se tratando de decisões rescindíveis proferidas no curso do processo. Assim, por exemplo, tendo havido julgamento antecipado parcial do mérito (art. 356 do CPC/2015) e não havendo recurso, a decisão transita em julgado, mas o prazo para ajuizamento de ação rescisória contra essa decisão só começa a correr, de acordo com o art. 975, caput, in fine do CPC/2015, “do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo”. Esse é o marco inicial para a contagem do prazo e a fixação do termo final, portanto. Não se impede, contudo, o ajuizamento de ação rescisória contra a decisão proferida autonomamente, ao longo do processo, e que tenha transitado em julgado, embora o prazo ainda não tenha iniciado. Incide, também aqui, a regra geral prevista no § 4.º do art. 218 do CPC/2015 (“Será considerado tempestivo o ato praticado antes do termo inicial do prazo”). A Súmula 401 do STJ não se aplica nesse caso (os precedentes que motivaram a criação de tal Súmula não levaram em consideração questões como a oriunda da incidência do art. 356 do CPC/2015 ou do art. 273, § 6.º do CPC/1973, cf. comentário precedente). ”[22: MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado: com remissões e nota comparativas ao CPC/1973. José Miguel Garcia Medina – 3 Ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017.]
Há ainda casos de exceção à regra geral, como os dispostos nos §§ 2º e 3º do art. 675. No parágrafo 2º, o legislador visando oportunizar a parte que em caso de descoberta de prova nova após o transito em julgado da sentença tenha um prazo de 2 ano para a propositura da ação rescisória, entretanto no mesmo dispositivo ele limita que a descoberta de prova nova ocorra em até 5 anos do transito em julgado da decisão rescindenda.
O parágrafo 3º do referido artigo deve ser interpretado da mesma maneira que o seu antecessor, no sentido de limitar ao mesmo período de 5 anos para caso se tome conhecimento ciência da simulação, que em 2 anos tanto o Ministério Público como o terceiro prejudicado, que não interveio no processo no momento oportuno, para propor ação rescisória.
No mesmo sentido, Medina, opina quanto a aplicação das mesmas condições especiais também para o caso ação rescisória fundada em prova falsa, prevaricação, concussão ou corrupção do magistrado, “entendemos que o mesmo princípio deve informar também a contagem do prazo, em se tratando de ação rescisória fundada em falsidade de prova apurada em processo criminal ou em prevaricação, concussão ou corrupção do juiz. Não fosse assim, nas hipóteses referidas só seria possível ajuizar-se a ação rescisória se o autor, por sorte, obtiver ou tomar conhecimento da sentença proferida em processo criminal dentro do prazo de dois anos, o que nem sempre é possível. O mesmo sucede em relação ao prazo máximo, de cinco anos, para que a parte descubra a prova nova, estabelecido na 2.ª parte do § 2.º do art. 975 do CPC/2015. Tais circunstâncias são alheias à vontade das partes. O mesmo princípio que autoriza a prática do ato processual após decorrido o prazo se a parte demonstrar que não o fez por justa causa (cf. art. 223 do CPC/2015) autorizará o ajuizamento da ação rescisória, caso ultrapassado o prazo de dois anos da coisa julgada se descubra, por exemplo, que a sentença foi proferida por força de corrupção do juiz. Exigir-se a observância do prazo de dois anos em hipóteses como esta significará impor à parte prejudicada requisito de impossível realização, o que viola o princípio consagrado no art. 5.º, XXXV, da CF/1988 (afinal, se é certo que a lei pode estabelecer requisitos para o exercício de um direito, tais requisitos não podem ser imoderados ou impraticáveis). Por tais razões, pensamos que, também nos casos de falsidade de prova apurada em processo criminal e de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz deverá ser contado o prazo a partir da ciência de tal evento, à semelhança do que preveem os §§ 2.º e 3.º do art. 975, em relação à prova nova e à simulação ou colusão entre as partes. ”[23: Idem.]
Outro caso de exceção à regra geral, é, por exemplo, o disposto no art. 8-C da Lei 6.739/1979 (Matrícula e registro de imóveis rurais):
Art. 8-C: É de oito anos, contados do trânsito em julgado da decisão, o prazo para ajuizamento de ação rescisória relativa a processos que digam respeito a transferência de terras públicas rurais. [24: Lei 13.256/2016.]
	Segundo Didier, este aumento exacerbado no prazo para a propositura da ação se deve a complicada relação que o pais tem com a questão da grilagem de terras. De modo que tal prazo seria aceitável, haja vista que é exclusivo para um caso em especifico, portanto, sem atrapalhar o bom andamento da Justiça para as demais hipóteses.
	Observamos também o §15 do art. 525 e o §8º do art. 535, ambos do CPC/2015, que também dispõe regra especifica para prazo de propositura de ação rescisória. Nestes casos há a necessidade de que a divergência com relação a decisão do Supremo ocorra já após o transito em julgado da decisão de mérito, onde o próprio STF irá modular os efeitos de sua decisão como meio de garantir a não retroatividade ilimitada dos efeitos da decisão, garantindo assim a segurança jurídica.
Considerações Finais
Após uma análise detalhada dos mais variados aspectos da ação rescisória, podemos concluir que se trata de uma ferramenta de extrema importância para promoção de decisões mais justas pelo sistema judiciário brasileiro.
Muitos, ainda, são os pontos controvertidos, tal como ocorre em várias outras situações no tocante as mudanças trazidas pelo CPC/2015.
Entendemos que, até o momento, vigência do novo código tem sido de adaptação tanto por parte do sistema judiciário quanto dos operadores do direito, de modo que a discussão acerca de como proceder em determinadas situações é frequente, tanto quanto os embates sobre as reais melhorias que o novo código propiciou para alguns temas e ainda, para alguns setores mais movimentados, a necessidade de mais mudanças na lei, seja para retroagir em alguns casos, como para avançar mais, em outros.
Com a ação rescisória não é diferente, de todos os pontos apresentados neste artigo, a maioria é objeto de debate por parte da doutrina e da jurisprudência, como nos esforçamos em demonstrar, ao mesmo tempo que há vários outros que foram incluídos no novo código, já de acordo com os entendimentos que vinham sendo praticados ou que eram pacíficos sob a égide do condigo anterior.
Certamente, no decorrer dos próximos anos, novas mudanças serão feitas, tanto no texto da lei quanto no entendimento que se extrai de sua interpretaçãoe aplicação prática, buscando sempre que direito e sociedade caminhem juntos, com a máxima sintonia.
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