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Artigo Os fundamentos utilizados pelo TJRS para o reconhecimento da filiação socioafetiva

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OS FUNDAMENTOS UTILIZADOS NAS DECISÕES DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL PARA O RECONHECIMENTO DA FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA
Thomas Araujo Lacerda[2: Acadêmico do curso de Direito. URCAMP – Campus São Gabriel. E-mail: Thomas_araujo@live.com]
Civana Silveira Ribeiro[3: Mestre em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC, Área de Concentração em Direitos Sociais e Políticas Públicas. Professora do Curso de Graduação em Direito na Universidade da Região da Campanha. Advogada. Email: civana@rosulonline.com.br]
Resumo
Este trabalho trata dos elementos necessários para o reconhecimento da filiação socioafetiva. Colaciona a evolução do direito de família desde seus primeiros conceitos e formas até os dias atuais, elucidando os motivos determinantes para que essas mudanças acontecessem e também as mudanças nas legislações que tratam do direito de família. Trata da Filiação Socioafetiva e como ela foi ganhando força no nosso ordenamento jurídico, fazendo uma referência quanto às consequências de seu eventual reconhecimento. Por fim, faz uma análise nas jurisprudências do TJRS, para identificar os fundamentos utilizados nos votos dos julgadores para reconhecer a filiação sociafetiva, e verificando-se que o TJRS considera que os aspectos imprescindíveis para sua configuração são o afeto, a posse do estado de filho e o animus de reconhecimento de paternidade. A pesquisa é bibliográfica, realizada a partir de referenciais teóricos com livros, artigos e revistas e o método de abordagem, o dedutivo, ou seja, parte-se da análise de elementos mais amplos para gradativamente especificar o estudo, respondendo o problema de pesquisa: Quais os critérios e fundamentos constitucionais utilizados pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio grande do Sul que permitem o reconhecimento da Filiação Socioafetiva?
Palavras-chave: Filiação Socioafetiva.TJRS.Afeto.
Abstract
This paper deals with the elements necessary for the recognition of the socio-affective affiliation. Gives the evolution of family law from its earliest concepts and forms to the present day, elucidating the decisive reasons for these changes happen and also the changes in the laws that deal with family law.It's socioaffective membership as it was gaining momentum in our legal system, making a reference as to consequences its eventual recognition. Finally an analysis of the case law Id to identify the grounds used by the judges to recognize socioaffective membership. And it notes that TJRS considers that the essential aspects of the socioaffective affiliation to be recognized are affection, possession of child status and paternity recognition animus. The research is literature held from theoretical references to books, articles and journals and the approach method, the deductive, ie part is the analysis of larger elements to gradually specify the study, answering the research problem: what criteria and constitutional grounds used by the Court of the Rio Grande do Sul state to be recognized as socioafetiva Membership?
Keywords: Socioaffective affiliation. TJRS. Affection.
INTRODUÇÃO
Desde a Constituição Federal de 1988, a definição de família e filiação vem sofrendo consideráveis mudanças, alterando antigas concepções, entre elas, a primazia da verdade biológica para fins de constatação de estado de filiação. Atualmente a figura de pai e mãe vem sendo determinada cada vez mais pela convivência afetiva e não mais por genética ou presunção legal.
O novo cenário oportuniza muitas controvérsias e inúmeros debates, eis que o assunto, não se trata apenas da questão do reconhecimento da filiação como fim exclusivo de constituição de família, mas também do possível interesse deste reconhecimento em certos casos. 
Desta forma, este trabalho tem como objetivo geral estudar algumas decisões do TJRS a fim de analisar os fundamentos utilizados pelos desembargadores, em seus votos para fins de reconhecimento ou não da filiação socioafetiva. 
A pesquisa é bibliográfica, realizada a partir de referenciais teóricos com livros, artigos e revistas e o método de abordagem, o dedutivo, ou seja, parte-se da análise de elementos mais amplos para gradativamente especificar o estudo e seu problema de pesquisa é: Quais os critérios e fundamentos constitucionais utilizados pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio grande do Sul que permitem o reconhecimento da Filiação Socioafetiva?
O estudo é dividido em três partes distintas. Na primeira abordada-se alguns aspectos relativos à evolução do direito de família. Após, faz-se uma descrição da paternidade socioafetiva, seus principais aspectos e efeitos. E, por fim, analisa-se algumas jurisprudências do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul para analisar os fundamento utilizados nas decisões e que servem de parâmetro para o reconhecimento da filiação socioafetiva.
1 A EVOLUÇÃO DO DIREITO DE FAMÍLIA
Ao ser concebido, o ser humano passa a possuir, querendo ou não, um laço que seguirá com ele e de alguma maneira, através dele, continuará através do tempo e espaço, qual seja, a sua família, a primeira célula de organização social.
A definição de Família vem se tornando cada vez mais complexa com o passar do tempo, pois se alterna gradativamente conforme a cultura. É natural a vida em conjunto e faz parte do instinto do ser humano a união a um par, entretanto esta é um agrupamento informal e espontâneo que se regula através do direito e, como o fato procura congelar a realidade e vem sempre antes da lei, tem um viés conservador. Mas a realidade se modifica, o que necessariamente acaba se refletindo na lei. Por isso a família juridicamente regulada nunca consegue corresponder à família natural, que preexiste ao Estado e está acima do direito.[4: DIAS, Maria Berenice, Manual de Direito das Famílias. 10.ed. São Paulo: Revista Dos Tribunais, 2015, p. 29.]
Preliminarmente, ao analisar o conceito de família no Direito Romano, percebe-se que esta girava em torno de uma figura central masculina que era denominada pater, sua função era a perpetuação do grupo familiar, não havendo vínculo afetivo entre seus componentes, possuindo uma desigualdade entre seus membros, pois a mulher e os filhos não possuíam direitos.
O direito romano estruturou a família, através de princípios normativos, já que, até então, esta era formada por meio dos costumes, não havendo regramentos jurídicos. Sendo assim o matrimônio se tornava essencial para o seu reconhecimento, pois se não houvesse matrimônio não haveria família. Entendiam os romanos a necessidade da affectio não só no momento de sua celebração, mas enquanto perdurasse.[5: GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 6.ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 33.]
Devido ao frequente desaparecimento de uma ordem estável que perdurou durante séculos, o poder de Roma foi deslocado para o chefe da Igreja Católica Romana, desenvolvendo o Direito Canônico estruturado no conjunto normativo dualista (laico e religioso) que se manteve até meados do século XX. Para os canonistas, era impossível a dissolução do casamento, pois entendiam que o ser humano não poderia desfazer a união realizada por Deus, tornando-se assim um sacramento.[6: NOGUEIRA, Mariana Brasil. A Família: Conceito e Evolução Histórica e sua importância. 2007, p.4. Disponível em: http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/files/anexos/18496-18497-1-PB.pdf Acesso em: 09 maio 2016.]
O direito canônico apoiava a introdução das causas impeditivas do casamento, sendo incluídas as causas de impedimento de um dos nubentes, como a infertilidade, idade, diferença de religião, casamento anterior, assim como as causas baseadas na falta de consentimento ou provenientes de alguma relação anterior.[7: WALD,Arnoldo.O novo direito de família.15.ed.rev.atual.e ampl. Pelo autor, de acordo com a jurisprudência e com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-1-2002), com a colaboração da Prof. Priscila M. P. Corrêa da Fonseca. São Paulo: Saraiva, 2004, p.14.]
Importante mencionar que na legislaçãoBrasileira, o Código Civil de 1916 teve a responsabilidade de tratar das questões familiares da época. Havia apenas um tipo de família aceito nesta legislação, denominada de legítima, que era constituída e reconhecida pelo matrimônio, não sendo possível este ser vedado. Deste modo, as relações mantidas fora do casamento eram consideradas adulterinas, sendo filhos concebidos fora da relação matrimonial denominados de “ilegítimos”, podendo somente serem reconhecidos se o pai assim desejasse e o fizesse dentro do prazo legal. Assim,
no que diz respeito à presunção pater is est, no inicio, predominou a exegese estrita do código Civil de 1916. Desse modo, somente a contestação de paternidade realizada pelo marido seria apta a desfazer a presunção de paternidade de filho adulterino a matre, desde que nas hipóteses e no prazo legal.[8: FACHIN, Luiz Edson. Direito de família: elementos críticos à luz do novo código civil brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p.12.]
	Mais adiante, a Lei nº 4121/62, também conhecida como Estatuto da Mulher Casada, às concedeu poderes especiais, que consistiam em: administrar os bens comuns e os seus particulares, salvo os reservados; representar legalmente a família e escolher seu domicílio. Vale lembrar que antes dessa lei, o marido estava incumbido de sustentar a família, não podendo determinar qualquer participação da mulher, salvo se o regime de bens fosse o da separação total.[9: FAUTH, Paula Alves. A possibilidade de união entre pessoas do mesmo sexo e a adoção por casais homossexuais. Direito &Justiça,v. 35. 2009, p.37-51. Disponível em: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ ojs/index.php/fadir/article/viewFile/8210/5897 Acesso em: 24 Abr. 2016.]
	Posteriormente, a emenda nº 9 da Constituição de 1967, possibilitou a dissolução do vínculo matrimonial, evidenciando uma grande evolução no direito de família. Com o intuito de regulamentar a alteração apresentada no texto constitucional, foi criada a Lei do Divórcio (Lei Ordinária Federal 6.715/77). A possibilidade de dissolução conjugal extinguiu a ideia da família ser uma instituição sacralizada.
Contudo, foi a Carta Magna de 1988 que transformou as bases do Código Civil de 1916, expandindo o conceito de Família, instituindo o conceito da união estável e trazendo o reconhecimento à igualdade de família. Assim, adotou um estatuto unitário de filiação, podendo os filhos ter origem matrimonial ou não, sem que isso influencie em seus direitos, representando, sem dúvida
[...] o grande divisor de águas do direito privado, especialmente, mas não exclusivamente, nas normas de direito de família. O reconhecimento da união estável como entidade familiar (art. 226, § 7º) representou um grande passo jurídico e sociológico em nosso meio. É nesse diploma que se encontram princípios expressos acerca do respeito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III). Nesse campo, situam-se os institutos do direito de família, o mais humano dos direitos, como a proteção à pessoa dos filhos, direitos e deveres entre cônjuges, igualdade de tratamento entre estes. Foi essa Carta Magna que também alçou o princípio constitucional da igualdade jurídica dos cônjuges e dos companheiros (art. 226, § 5º) e igualdade absoluta dos filhos, não importando sua origem ou a modalidade do vínculo (art. 227, § 6º).[10: VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 11. ed. São Paulo: Atlas S.A, 2011, p.7.]
A conquista dos direitos fundamentais de proteção à pessoa humana é fato recente. É possível constatar que a transformação da família patriarcal, juridicamente assegurada, para as relações que se baseiam no afeto e na convivência foi consagrada pela Constituição Federal de 1988, que abarcou a positivação dos Direitos Fundamentais e aboliu a desigualdade de gêneros, o que acabou com qualquer forma de hierarquia da família.
O princípio Constitucional da dignidade da pessoa humana e da igualdade afastou de vez do nosso ordenamento jurídico a desigualdade no tratamento dos filhos independente do seu parentesco, seja ele natural, civil ou socioafetivo. Com o fim da desigualdade da família, todos os filhos ganharam a proteção da lei, não importando se oriundos de uma relação matrimonial ou não, apenas importando o seu nascimento.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.068/90) trouxe inovações no reconhecimento dos filhos, ampliando o texto constitucional.[11: O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu Art. 26, estabelece que o reconhecimento de filiação dos filhos havidos fora do casamento poderá ser feito, a qualquer tempo, no próprio termo de nascimento, por testamento, mediante escritura ou outro documento público, qualquer que seja a origem da filiação. No Art. 27 do referido texto legal, está estabelecido que o reconhecimento do estado de filiação é um direito personalíssimo, indisponível e imprescritível. Além destas inovações, também se destaca a Seção que trata dobre a “Família Substituta”.]
A Lei 8.560/92 regulou a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento e dispôs que a prescrição na certidão de nascimento acerca da natureza da filiação não seria mais permitida, assim como o casamento dos pais e, ainda, não podendo mais apresentar informações sobre a origem da filiação, impossibilitando expressar se esta foi decorrente de relação matrimonial ou extraconjugal dos genitores.
O código Civil de 2002 entrou em vigor apenas 27 anos após a sua redação original, o que ocasionou várias modificações em seu texto até que fosse aprovado no Senado, para que pudesse atender as necessidades da população brasileira. Em decorrência desse lapso temporal até a vigência da referida norma, esta não trouxe as inovações esperadas, já que a Constituição Federal de 1988 já havia abarcado os direitos que se diziam novos na sociedade da época. 
Com o passar dos anos e as constantes mudanças no conceito de família se torna cada vez mais difícil descrever esta, diferentemente do passado, onde era conceituada como uma instituição padrão um modelo clássico, com o pai e a mãe em um casamento indissolúvel cuidando de seus filhos. Assim, para alguns doutrinadores a família atual não esta baseada em tabus e formas como antigamente, mas em afetividade, pois pode ser considerada como família qualquer relação de afeto.[12: DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 8. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 43.]
Ou ainda, pode ser ter um sentido mais complexo, pois
importa considerar a família em conceito amplo, como parentesco, ou seja, o conjunto de pessoas unidas por vinculo jurídico de natureza familiar: nesse sentido, compreendem os ancestrais, descendentes e colaterais do cônjuge, que se denominam parentes por afinidade ou afins. Nessa compreensão, inclui-se o cônjuge que não é considerado parente. Em sentido restrito, família compreende somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sobre o pátrio poder ou poder familiar.[13: VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 9. ed. São Paulo: Atlas S.A, 2009, p.2.]
Já para outros, a família é um grupo de pessoas que tem origem de um tronco ancestral comum, sendo ainda acrescentados neste plano geral os cônjuges, os filhos do cônjuge (enteados), os cônjuges dos filhos (genros e noras), os cônjuges dos irmãos e os irmãos do cônjuge (cunhados).[14: PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituição de direito civil. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.19.]
Com a efetivação do princípio da Dignidade da Pessoa Humana concretizado pela Constituição Federal de 1988, um princípio que não está expresso em palavra ganha força, sendo ele o da afetividade, tornando-se assim, um direito fundamental do ser humano. Neste aspecto,
ao ser reconhecida como família a união estável, ou seja, a união entre duas pessoas constituídas pelo laço da afetividade, houve o alargamento conceitual do que é família. Deixou de ser casamento, sexo e reprodução para ser identificada como o fruto de um elo de afetividade.[15: DIAS, MariaBerenice. A evolução da família e seus direitos. Portal Jurídico Investidura, Florianópolis/SC, 12 Jan. 2009, pg.6. Disponível em: <http://investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/direito-civil/2460>Acesso em: 27 de abril de 2016]
Portanto, é possível observar que a família evoluiu com o passar dos anos, sendo o conceito de que seria somente aquela que decorria da relação do casamento constituída por um casal legítimo e seus filhos, não mais existente, já que atualmente, os laços que prevalecem para a sua constituição são aqueles que provêm da relação de afeto, razão pela qual se faz imperioso fazer uma análise dos principais aspectos da Filiação Socioafetiva.
2 A FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA E AS CONSEQUÊNCIAS DE SEU RECONHECIMENTO
O atual Código Civil prevê em seu Art. 1.593 as relações de parentesco, não fazendo alusão a respeito desta matéria, tratando somente da questão da filiação Biológica, não expressando em seu rol a questão da afetividade nas relações familiares, questão esta que une pais e filhos cada vez com mais intensidade e tornou-se o princípio norteador do Direito de Família.
Contudo, é possível identificar que o princípio da afetividade, tem sua previsão legal na Carta Magna em seus arts. 226, §4 e 227, §6. Portanto, a predição de proteção integral à entidade familiar tutela não apenas a família formada pelo casamento, mas também todas aquelas que se formam pela comunhão do afeto, principalmente as relações estabelecidas entre pessoas que se unem numa verdadeira relação de pai e filho, independentemente da existência ou não de vínculo biológico. Deste modo[16: SENA, Renata Martins. Paternidade Socioafetiva x Paternidade Biológica. Revista Eletrônica de Direito do Centro Universitário Newton Paiva. 13. ed. Disponível em: <http://blog.newtonpaiva.br/direito/wp-content/uploads/2012/08/PDF-D13-07.pdf> . Acesso em: 31 de maio de 2016.]
a família, tendo desaparecido suas funções tradicionais no mundo do ter liberal burguês, reencontrou-se no fundamento da afetividade, na comunhão de afeto, pouco importando o modelo que adote, inclusive o que se constitui entre um pai ou uma mãe e seus filhos.[17: LÔBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao Estado de Filiação e Direito à Orgiem Genética: uma distinção necessária. R. CEJ. Brasília n.27. 2004, pg. 47. Disponível em: https://www2.cjf.jus.br/ojs2/index.php/ revcej/article/viewFile/633/813Acesso em 01 de junho de 2016.]
A paternidade socioafetiva é demonstrada através do vínculo afetivo “pai do coração”, onde o verdadeiro pai é aquele que ama não importando a consanguinidade, é o ser que cria o filho por simples opção, tomando para si os deveres da educação, proteção, guarda e cuidado.[18: COSTA, Juraci. Paternidade Socioafetiva. Revista Jurídica – CCJ/FURB, v. 13, nº 26. 2009, pg.100. Disponível em: file:///C:/Users/rm%20info/Documents/1889-6330-2-PB.pdfAcesso em: 31 de maio de 2016.]
Muitos autores têm abordado a Filiação Socioafetiva, tema este que se encontra cada vez mais corriqueiro com a modernização da família e as várias mudanças que vêm ocorrendo em seu conceito, já que
o novo posicionamento acerca da verdadeira paternidade não despreza o liame biológico da relação paterno-filial, mas dá notícia do incremento da paternidade socioafetiva, da qual surge um novo personagem a desempenhar o importante papel de pai: o pai social, que é o pai de afeto, aquele que constrói uma relação com o filho, seja biológica ou não, moldada pelo amor, dedicação e carinho constantes.[19: ALMEIDA, Maria Cristina de. Investigação de Paternidade e DNA: Aspectos Polêmicos. 2001, p.159-160]
É de conhecimento geral, que muitas vezes os laços de afetividade que unem pai e filho, são mais fortes que os vínculos consanguíneos que, porventura, possam existir. Do ponto de vista psicológico o amor entre uma criança e seu pai advém da convivência, do afeto e da certeza de proteção que aquela pessoa lhe proporciona e não em razão de vínculo de sangue.
Dentro desta esfera, a sociedade atual faz o questionamento se, realmente, o simples vínculo biológico é capaz de traduzir, em toda sua dimensão, a relação paterno-filial. Seria a paternidade, diante das novas tendências sociais e dos princípios consagrados na Constituição da República, uma mera vinculação biológica entre duas pessoas?.[20: SENA, Renata Martins. Paternidade Socioafetiva x Paternidade Biológica. Revista Eletrônica de Direito do Centro Universitário Newton Paiva. 13. ed. Disponível em: http://blog.newtonpaiva.br/direito/wp-content/uploads/2012/08/PDF-D13-07.pdf . Acesso em: 31 de maio de 2016.]
Neste aspecto, é notável a prevalência da verdade afetiva em relação à biológica,
sobressai a importância da engenharia genética no auxilio das investigações de paternidade; sem embargo dessa importante contribuição, é preciso equilibrar a verdade socioafetiva com a verdade de sangue. O filho é mais que um descendente genético e se revela numa relação construída no afeto cotidiano. Em determinados casos, a verdade biológica cede especo a “verdade do coração”. Na construção da nova família deve se procurar equilibrar essas duas vertentes, a relação biológica e a relação socioafetiva.[21: FACHIN, Rosana. Da Filiação. Artigo publicado em Direito de Família e o novo Código Civil. Vários autores, com coordenação de Maria Berenice Dias e Rodrigo Cunha Pereira. Belo Horizonte: Del Rey e IBDFAM, 2001, p. 120.]
Com esta importância do afeto, passou-se a cuidar mais o interesse do filho na hora de esclarecer quem é o seu verdadeiro pai, ou seja, aquele que o ama como seu filho e é amado da mesma maneira.[22: DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 439-440.]
A questão afetiva torna-se cada vez mais importante nas relações familiares, tornando-se o principal aspecto para constituição desta, se concretizando como principal critério para determinar quem ficará com a guarda do filho em uma eventual separação dos nubentes e, principalmente, utilizado para o reconhecimento de filiação. Em razão disto a figura do pai não mais se constitui com a verdade biológica e a relação de consanguinidade, mas sim com a relação de afeto, carinho e amor.
Deste modo se torna fundamental entender a devida distinção entre pai e genitor, visto que o segundo seria o doador do sêmen, aquele que gera, podendo ser obrigado, no máximo, a prestar assistência material, de caráter obrigacional, ao ser que gerou. Enquanto pai, na acepção da palavra, é aquele que cria, dá amor e é responsável por ensinar os valores que a pessoa passará a ter. Impõe-se a distinção entre origem biológica e paternidade/maternidade,[23: LOPES, Paula Ferla. A Paternidade Socioafetiva no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2004, pg.15. Disponível em: http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/ graduacao/tcc/tcc2/ trabalhos 2014_1/ paula_lopes.pdfAcesso em: 31 de maio de 2016.]
em outros termos, a filiação não é um determinismo biológico, ainda que seja da natureza humana o impulso à procriação. Na maioria dos 5 casos, a filiação deriva da relação biológica; todavia, ela emerge da construção cultural e afetiva permanente, que se faz na convivência e na responsabilidade.[24: LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio Jurídico da Afetividade na Filiação. Anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família, Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 252.]
Em consequência desta diferenciação, outro princípio ganha importância na filiação socioafetiva, sendo este o princípio da aparência, pois esta faz com que todos acreditem existir situação não verdadeira, fato que não pode ser desprezado pelo direito. Assim, a tutela da aparência acaba emprestando juridicidade a manifestações exteriores de uma realidade que não existe.[25: DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 405.]
O vínculo afetivo, tipificado como aspecto sociocultural, supera a questão biológica quando se trata de determinação de paternidade já que
o reconhecimentode situações fáticas representadas por núcleos familiares recompostos vem trazer novos elementos sobre a concepção da paternidade, compreendendo, a partir deles, o papel social do pai e da mãe, desapegando-se do fator meramente biológico e ampliando-se o conceito de pai, realçando sua função psicossocial. A vinculação socioafetiva prescinde da paternidade biológica. No sentido da paternidade de afeto, o pai é muito mais importante como função do que, propriamente, como genitor.[26: ALMEIDA, Maria Cristina de. Investigação de paternidade e DNA: aspectos polêmicos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 142.]
	Contudo, para o propósito de investigação de paternidade, após a publicação do Código Civil de 2002, a verdade real teve seu papel relativizado. Neste viés, mesmo não havendo vínculo biológico, pode o suposto pai assim ser considerado, em razão de que acima da verdade real deve ser considerada a posse do estado de filho e a possível existência de uma filiação socioafetiva.[27: LOPES, Paula Ferla. A Paternidade Socioafetiva no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2004, p.15. Disponível em: http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2014_1/ paula_lopes.pdfAcesso em: 1 de junho de 2016.]
Portanto, não basta a presença do afeto na relação, tem de haver o reconhecimento e o entendimento de ambas as partes de que aquela pessoa é seu pai/filho. Importante destacar que este reconhecimento não se trata da declaração expressa na certidão de nascimento, mas sim aquele presente no convívio social, a percepção pública de uma relação de parentesco. Desta forma,
a posse do estado de filho é mais do que uma simples manifestação escrita feita pelo de cujus, porque o seu reconhecimento não está ligado a um único ato, mas a uma ampla gama de acontecimentos que se prolongam no tempo e que perfeitamente servem de sustentáculo para o deferimento da adoção.[28: DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 493.]
Ao reconhecer a existência da posse de estado de filho, a doutrina faz a observação da necessidade de três elementos pertinentes a tal relação, são eles os chamados: nome (nominativo), tratamento (tractatus) e fama (reputatio). O primeiro elemento, nominatio, analisa se o nome da família é utilizado pelo filho. O segundo, tractatus, diz respeito ao tratamento que a família dá a este, se o tratam como membro e o consideram membro desta, por sua vez, reputatio, que se caracteriza pelo entendimento da sociedade de que determinada relação é realmente de como se pai e filho fossem.[29: LOPES, Paula Ferla. A Paternidade Socioafetiva no Ordenamento Jurídico Brasileiro. p. 15, 2004. Disponível em: http://www3.pucrs.br/pucrs/ files/uni/poa/direito/graduacao/ tcc/tcc2/trabalhos2014_1/ paula_lopes.pdfAcesso em: 31 de maio de 2016.]
Estes elementos, também podem ser denominado de verdade sociológica, pois
entende-se por verdade sociológica, a constatação de que ser pai ou mãe, não se pauta apenas no vínculo genético com a criança, mas naquela pessoa que cria, educa, dá amor, carinho, dignidade e condição de vida, realmente exercendo a função de pai ou de mãe levando em consideração o melhor interesse da criança.[30: BARROS, Juliana Brito Mendes de. Filiação Socioafetiva. 2005, p.10. Disponível em: http://intertemas.unitoledo.br/revista/ index.php/Juridica/article/viewFile/334/329> Acesso em: 1 de junho de 2016.]
O reconhecimento da filiação sócio afetiva trás vários efeitos, não só para o mundo jurídico, mas também para o mundo dos fatos. O reconhecimento produz efeitos de natureza patrimonial e de cunho moral. O principal deles é estabelecer a relação jurídica de parentesco entre pai e filho, em razão de que
embora se produzam a partir do momento de sua realização, são, porém, retroativo ou retro-operante (extunc), gerando as suas consequências, não da data do ato, mas retroagindo até o dia do nascimento do filho, ou mesmo de sua concepção, se isto condisser com seus interesses.[31: PEREIRA, Caio Mario. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p.31.]
Ou seja, o reconhecimento tem o poder de trazer para o mundo jurídico o que já era de conhecimento no mundo dos fatos. Tendo o filho o direito de ter em seu registro de nascimento o nome de quem realmente considera seu pai “repousando sobre a filiação biológica, a filiação jurídica, mesmo que declarada muito tempo depois do nascimento, preenche todo o espaço decorrido em que não existiu o reconhecimento.”[32: GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 6.ed.São Paulo. Saraiva, 2012, p. 368.]
Estabelecido o vínculo, gera o parentesco para todos os fins de direito, inclusive o dever de prestar alimentos. 
Quanto aos demais efeitos jurídicos, encontra-se o direito Sucessório, na medida em que,
o reconhecimento quer voluntário, quer judicial, só faz constar o que já existe, por isso, tem um efeito declaratório apenas, não atributivo; logo retrotrai, até a data presumível da concepção, dá direito de concorrer às sucessões abertas anteriormente à sentença e depois da época em que é de presumir ter sido gerado o filho. Pouco importa que a distribuição do acervo esteja terminada e definitivamente julgada; basta não se achar prescrito o direito de pedir a herança. A sentença leva a rescindir, pelos meios regulares, doações e partilhas anteriores à mesma, desde que sejam posteriores à época legal da concepção. O Veredictum retroage, tanto em favor do filho, como do próprio pai; porque entre os dois o direito sucessório e o de receber alimentos são recíprocos.[33: MAXIMILIANO, Carlos. Direito das sucessões. 2. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1937, p. 315-316. v. I,]
Após reconhecida essa filiação, esta se torna irrevogável, conforme disposição expressa na Constituição Federal em seus arts. 226, §§4 e 7, e 227, 6, ou ainda infraconstitucionalmente onde encontra fundamento nos princípios de melhor interesse da criança e do adolescente, conforme os arts. 1, 6, 15 e 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Tal irrevogabilidade se dá pelo fato de ter sido comprovada a posse do estado de filho, “que constitui, todavia, prova adminicular, que apenas completa ou reforça outros meios probantes. Se não existem esses meios, não pode o juiz recorrer à prova isolada da posse de estado”.[34: GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 8.ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 368.]
Desta forma, torna-se essencial analisar algumas jurisprudências do TJRS com a finalidade de identificar os principais fundamentos que vem sido utilizados para o reconhecimento da filiação socioafetiva.
3 POSICIONAMENTO DO TJRS ACERCA DO RECONHECIMENTO DA FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA
	
Conforme visto anteriormente, o afeto vem se tornando elemento cada vez mais primordial nas relações familiares, seja no âmbito meramente familiar quanto no âmbito jurídico. Ainda, a questão da filiação socioafetiva é matéria suscitada frequentemente nos tribunais.
Como exemplo do narrado acima, cabe colacionar a seguinte jurisprudência.
APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. IMPROCEDÊNCIA. Não raro, é difícil discernir entre o afeto existente entre uma criança e o companheiro da sua mãe (relação afetuosa entre padrasto e enteado) e uma verdadeira relação de afetividade, similar à relação de pai e filho. E tendo em vista a análise da psicóloga, recentemente realizada, a partir de conversa pessoal com o apelante, é de se concluir que eventual vínculo de afetividade, constatado na sentença, não chega a ter a profundidade da vinculação afetiva entre pai e filho. Caso em que o pedido de reconhecimento de filiação socioafetiva, requerido pelo pretenso pai, deve ser julgado improcedente. DERAM PROVIMENTO. (Apelação Cível Nº 70061719597, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 31/03/2016)
	
O TJRS reconhece o afeto como um dos principais fundamentos a ser utilizado em se tratando da matéria do reconhecimentoda filiação socioafetiva. Em análise das jurisprudências oriundas deste digníssimo órgão, se nota que este elemento se encontra presente na grande maioria dos seus julgados.
Neste acórdão, verifica-se que apesar do relator ter identificado a presença do afeto na relação, esta não se configurou como se fossem “pai e filho”, e sim “enteado e padrasto”, o que inviabilizou reconhecimento da filiação socioafetiva.
O relator esclarece no referido acórdão que em um primeiro momento pensou em apenas ratificar a sentença recorrida, pois aparentemente, o vínculo afetivo de paternidade entre o autor e o réu era sólido, notadamente reforçado pela circunstância de que o casal havia tido outras duas filhas.
Diante da dificuldade em constatar se a relação era como se pai e filho fossem, foi necessária a realização de uma psicológica com o padrasto, identificando-se a não configuração de filiação.
Tal é a importância da relação da afetividade que ela é considerada um direito fundamental, e pode ser inclusive, considerada como a realização da dignidade humana, princípio este, responsável pela coerência e conjunto desses direito e merece proteção no ordenamento jurídico.
Para reforçar ainda mais o entendimento do TJRS quanto este assunto, é imperioso analisar o julgado a seguir:
EMBARGOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA. A inexistência de filiação biológica entre o autor e o menor/réu, demonstrada na ação negatória de paternidade, esbarra na filiação socioafetiva entre os litigantes, evidenciada nos autos, onde a criança tem no pai registral seu verdadeiro pai, estruturando sua personalidade na crença desta paternidade, assim demonstrado no processo, ensejando a improcedência da ação. EMBARGOS INFRINGENTES ACOLHIDOS, POR MAIORIA. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (TJ-RS - EI: 70041008814 RS, Relator: André Luiz PlanellaVillarinho, Data de Julgamento: 10/06/2011, Quarto Grupo de Câmaras Cíveis, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 12/09/2011)
	
No presente caso houve erro substancial no ato do registro do filho, pois como o mesmo nasceu na constância da união estável a presunção pater ist est. Entretanto foi comprovado em uma ação negatória de paternidade, através de exame de DNA, que o pai constante no registro de nascimento, não era realmente o pai biológico.[35: Trata-se da presunção de paternidade quanto aos filhos havidos na constância do casamento, prevista no Art. 1.597 do Código Civil Brasileiro (Lei 10.406/02).]
Porém, prevaleceu a relação do afeto, da verdade sociológica em detrimento da verdade biológica, já que a relação que se configurou desde o nascimento da criança, era de pai e filho. Em seu voto, o Relator, Des. André Luiz Planella Villarinho, identificou tal relação, fazendo constar em seu voto que
sobejamente demonstrado, portanto, o vínculo afetivo de filiação estabelecido entre as partes, ainda que o relacionamento e o convívio entre pai e filho tenha se rompido após o resultado do exame de DNA, por iniciativa única e exclusiva, quiçá mesquinha do autor que confunde seus sentimentos feridos em relação à mulher com os sentimentos mais sublimes que pudesse ter com o filho, não pode aquela restar desconstituída, com a devida vênia ao entendimento externado pela douta maioria no acórdão embargado. 
Em outro trecho de seu pronunciamento, o mesmo esclarece que as relações parentais de filiação formadas com base no afeto têm de se sobrepor à filiação biológica ou registral, pois ninguém passa ser pai/mãe na verdadeira acepção da palavra, meramente porque descobriu ser pai/mãe biológico, da mesma forma que ninguém deixa de ser pai/mãe afetivo, apenas por apurar não ser pai/mãe biológico.
Partindo para a análise de outras jurisprudências, identifica-se a imprescindível presença da posse do estado de filho para reconhecimento da filiação socioafetiva.
APELAÇÃO CÍVEL.AÇÃO DECLARATÓRIA DE RECONHECIMENTO DE MATERNIDADE SOCIOAFETIVA. IMPROCEDÊNCIA. A relação jurídica de filiação decorre ou do vínculo biológico, ou do liame socioafetivo, resultando este da posse do estado de filho. O reconhecimento da maternidade/paternidade socioafetiva deve vir acompanhada do elemento anímico. Não havendo liame biológico, não se pode imputar paternidade a quem assim não deseja. A mera convivência e afeto nutrida pela falecida ao autor, por ser filho do seu companheiro, não caracteriza posse de estado de filho, mormente havendo controvérsia na prova acerca da natureza desta relação. APELAÇÃO DESPROVIDA. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível Nº 70041057712, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz PlanellaVillarinho, Julgado em 13/07/2011)
No presente caso, observa-se uma tentativa de reconhecimento de maternidade socioafetiva post mortem para fins de direitos na herança. Foi configurado haver uma relação de afeto da falecida para com o apelante, devido este ser filho de seu companheiro. No seu voto, o Des. Relator afirma que o reconhecimento da maternidade/paternidade socioafetiva sempre deve estar acompanhada do elemento anímico, pois se não houver vínculo biológico não é possível imputar maternidade a quem assim não deseja.
Entretanto, a presença de um outro elemento se faz imperioso para que seja reconhecida pelo TJRS a filiação, sendo este a “posse do estado de filho”. Esta não foi identificada no caso concreto, em razão de nunca ter havido o desejo de ambas as partes em estabelecer uma relação de “mãe e filho”. Nota-se, ainda, no relatório, que as testemunhas alegaram que havia reconhecimento da sociedade quanto a uma eventual paternidade, entretanto, ambos não tinham um ao outro como se mãe e filho fossem, fazendo-se ausentes os elementos que configuram a posse do estado de filho.
A situação do acórdão acima é semelhante a este outro, onde não fora configurada a presença dos três elementos imprescindíveis para ser reconhecida a posse do estado de filiação.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA. POSSE DE ESTADO DE FILHO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. A alegação da existência de paternidade e maternidade socioafetivareclama prova cabal da posse do estado de filho. Ausência de demonstração da presença dos respectivos elementos caracterizadores, quais sejam, nome, trato e fama. O simples fato de a autora ter sido criada pelos falecidos não implica reconhecimento de vínculo socioafetivo, sobretudo quando não evidenciada ter sido essa a vontade deles. APELAÇÃO DESPROVIDA (Apelação Cível Nº 70068110311, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 14/04/2016).
No fato acima exposto, a autora teria sido criada pelos falecidos, entretanto, no espaço temporal em que se encontravam vivos os pretendidos pais da apelante, nunca houve a vontade mutua do reconhecimento de uma filiação, já que não estava presente na relação a posse do estado de filho.
No voto do Des. Relator há um trecho onde este sintetiza que a simples relação, carinhos, cuidados e proteção podem não ter como motivo a paternidade, mas serem inspirados pela solidariedade humana, piedade cristã ou sentimento de amizade e afirma que, após examinar os elementos probatórios, se convenceu da inexistência da posse do estado de filho, mesmo esta tendo sido criada pelos falecidos.
Ao analisar os referentes acórdãos, há notadamente uma má fé advinda das partes que buscam o reconhecimento da filiação, buscando única e exclusivamente os direitos na herança, externando um sentimento de ingratidão para com as pessoas que com a mais nobre intenção, os ajudaram e lhes deram amizade, carinho e atenção, sem que fossem impulsionados pela intenção de assumir a condição de pais.
Importante salientar que na fundamentação de seu voto, o relator utiliza como um de seus fundamentos a premissa de que a vida é mais rica do que a norma, onde se subentende que se fosse a vontade de ambas as partes o reconhecimento da filiação, teria esta sido pretendida enquanto perdurasse a vidados pretendidos pais da apelante.
Deste modo, percebe-se a frequência em que estas situações acabam se tornando assunto do poder judiciário, tamanha a sua importância e conforme visto nas jurisprudências que foram destacadas acima o aspecto da afetividade, a posse do estado de filho e a intenção do reconhecimento de paternidade se fazem imprescindíveis para que se torne real no mundo jurídico o que já era real no mundo dos fatos.
Portanto, após a análise destes acórdãos do TJRS, foi possível identificar que os fundamentos utilizados pelos desembargadores para o reconhecimento da filiação socioafetiva são o afeto, a posse do estado de filho e a vontade de ser reconhecida uma relação de filiação, não só no aspecto jurídico, mas sim dentro da sociedade em que vivem.
CONCLUSÃO
Com as constantes evoluções do conceito de família, as relações consanguíneas foram perdendo importância, fazendo com que o afeto ganhasse força e se tornasse a principal característica para a configuração deste instituto. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, os Princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Igualdade, concomitantemente com as novas formas de família que a Carta Magna estabeleceu, ocasionaram essa crescente importância da afetividade.
Neste aspecto, surgiu uma nova forma de paternidade, sendo esta a socioafetiva. Esta forma de filiação independe de sua origem, decorre da relação de afeto presente na criação de uma criança, onde a questão biológica se torna menos importante que a sociológica. Leva em consideração o melhor interesse da criança, consiste em reconhecer como pai “legítimo” aquele que o criou como tal e lhe deu carinho, afeto, amor e atenção necessários para o crescimento saudável do ser humano.
Na tentativa de ser reconhecida essa forma de filiação, passaram a ser levados ao Poder Judiciário alguns fatos que eram de conhecimento da sociedade. Neste contexto, alguns elementos desta relação acabaram ganhando maior atenção para fins de provimento do pedido de reconhecimento, entre eles o afeto presente na relação e a posse do estado de filho, que tem como base três elementos, o nome, o tratamento e a fama, além do animus de reconhecimento, ou seja, a vontade dos interessados em reconhecer um ao outro como pai/filho.
Estes elementos são a base da fundamentação das jurisprudências do Tribunal de Justiça do RS, são elementares para que seja reconhecida a filiação socioafetiva. Assim, conclui-se que para a configuração da filiação socioafetiva, é imprescindível estarem presentes o afeto, a necessidade da criança ser chamada como filha, o tratamento de ambas as partes no aspecto familiar, a exteriorização desta relação e por fim a intenção de se tornar pai/filho.
Finalmente, é de suma importância destacar que nesta relação afetiva, mesmo não havendo obrigação nenhuma das partes integrantes deste relacionamento, mas principalmente por parte do pai, em manter vínculo ou até mesmo de cuidar de um filho que não seja biologicamente seu, estes acabam tornando-se mais apegados e adotam um ao outro para fazer parte de sua família, não no papel, mas sim no sentimento. Talvez seja por não haver esta obrigação que este se torne mais forte, que esta relação se estabeleça com mais facilidade e com mais sinceridade, pois todos sabemos que quando não se é obrigado a fazer alguma coisa esta é feita por simples prazer.
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