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1 Farmacologia da Neurotransmissão GABAérgica e Glutamatérgica Por José Álvaro Leone Silva Principais neurotransmissores de aminoácidos do SNC: Ácido γ-aminobutírico (GABA) principal aminoácido inibitório do SNC. Glutamato principal aminoácido excitatório do SNC. Neurotransmissores de aminoácidos inibitórios e excitatórios provocam hiperpolarização ou despolarização, respectivamente, da membrana do neurônio pós-sináptico ao modificar a condutância de íons dos canais seletivos catiônicos ou aniônicos. Hiperpolarização entrada de Cl- ou saída de K+ através da membrana. Despolarização entrada de Na+ ou impedimento da saída de K+ através da membrana. Fisiologia da Neurotransmissão GABAérgica: Os fármacos que modulam os receptores de GABA afetam: Reatividade e atenção Memória Ansiedade Sono Tônus muscular Metabolismo do GABA: É formado a partir da descarboxilação do glutamato pela enzima GAD (descarboxilase do ácido glutâmico) MAIS IMPORTANTE DE SABER! A GAD necessita de vitamina B6 (Fosfato de piridoxal) como cofator. O GABA é acondicionado nas vesículas sinápticas pelo transportador VGAT. Os neurônios e a glia captam o GABA através de transportadores de GABA (GAT). No interior das células o GABA é catalizado pela GABA-transaminase em semi-aldeído succínico (SSA), que é oxidado pela SSA- desidrogenase, transformando-se em ácido succínico e entrando no ciclo de Krebs, onde é transformado em α-cetoglutarato. A GABA-T regenera o glutamato a partir de α-cetoglutarato. 2 Receptores de GABA: Ionotrópicos GABAA e GABAC (canais iônicos de cloreto) Metabotrópicos GABAB (acoplado a proteína G) Os agentes farmacológicos que atuam sobre a neurotransmissão GABAérgica afetam o metabolismo do GABA ou a atividade de seu receptor. Os agentes farmacológicos atuam em sua maioria sobre o receptor ionotrópico GABAA. São utilizados para sedação, ansiólise, hipnose, neuroproteção após AVE ou traumatismo cranioencefálico e controle da epilepsia. Inibidores do metabolismo do GABA: 1. Tiagabina inibidor competitivo dos transpores de GABA nos neurônios e na glia, onde pode atuar seletivamente sobre GAT-1. a. Principal indicação clínica: tratamento da epilepsia. b. Modo de ação: ao inibir a recaptação de GABA, a tiagabina aumenta as concentrações de GABA tanto sinápticas quanto extra-sinápticas. O resultado consiste em agonismo inespecífico dos receptores ionotrópicos e metabotrópicos do GABA, sendo os principais efeitos observados nos receptores GABAA. 2. γ-vinil GABA (vigabatrin) inibidor suicida da GABA transaminase (GABA-T). a. Principais indicações clínicas: tratamento da epilepsia, está sendo investigado para o tratamento da adicção de drogas, transtorno do pânico e transtorno obsessivo-compulsivo. b. Modo de ação: bloqueia a conversão do GABA em semi-aldeído succínico, resultando em concentrações intracelulares elevadas de GABA e aumento da liberação sináptica de GABA. O resultado consiste em agonismo inespecífico dos receptores ionotrópicos e metabotrópicos do GABA, assim como a tiagabina. Agonistas dos receptores GABAA: 1. Muscimol ativa o receptor GABAA através de ligação direta ao sítio ativo de ligação GABA. Derivado de cogumelos alucinogênicos da espécie Amania muscaria. Utilizado primariamente como instrumento de pesquisa. 2. Gaboxadol em altas concentrações é um agonista parcial dos receptores GABAA sinápticos; em baixas concentrações, ativa seletivamente os receptores extra-sinápticos que contêm as subunidades α4, 3 e . Inicialmente aprovado para o tratamento da epilepsia e ansiedade, porém sua administração em doses terapêuticas foi associada a ataxia e sedação. Existem estudos clínicos em seres humanos em andamento para o tratamento da insônia. 3 Antagonistas dos receptores GABAA: 1. Bicuculina antagonista competitivo 2. Gabazina antagonista competitivo 3. Picrotoxina inibidor não competitivo Todos eles produzem convulsões epilépticas e são utilizados exclusivamente para pesquisa. Moduladores dos receptores GABAA: Atuam nos sítios de ligação alostéricos aumentando a neurotransmissão GABAérgica. São os benzodiazepínicos e os barbitúricos. Benzodiazepínicos: Modo de ação: atuam como moduladores alostéricos positivos, potencializando a regulação dos canais na presença de GABA. Aumentam a frequência da abertura dos canais na presença de baixas concentrações de GABA. O consequente influxo de Cl- provoca hiperpolarização da membrana e diminui a excitabilidade neuronal. Aplicações clínicas: são utilizados como ansiolíticos, sedativos, antiepilépticos e relaxantes musculares, bem como para o tratamento dos sintomas de abstinência do etanol. Facilitam o início do sono e também aumentam a duração global do sono. O efeito ansiolítico ocorre através da inibição das sinapses no sistema límbico, uma região do SNC que controla o comportamento emocional e que se caracteriza por uma elevada densidade de receptores GABAA. 1. Midazolam pré-anestésico, anestésico geral IV. 2. Clorazepato transtornos de ansiedade, convulsões. 3. Alprazolam transtornos de ansiedade, fobias. 4. Lorazepam transtornos de ansiedade, estado de mal epiléptico, anestésico geral IV. 5. Clordiazepóxido transtornos de ansiedade, abstinência de álcool. 6. Clonazepam convulções. 7. Diazepam transtornos de ansiedade, estado de mal epiléptico, relaxamento muscular, anestésico geral IV, abstinência de álcool. 8. Triazolam, estazolam, temazepam, flurazepam, quazepam, zolpidem insônia. Farmacocinética: administrados VO, transmucosa, EV ou IM. Metabolismo: no fígado pelas enzimas do citocromo P450 (especificamente a CYP3A4) e a seguir excretados na urina. Fármacos que inibem a atividade da CYP3A4 (ex. cetoconazol) podem intensificar os efeitos dos benzodiazepínicos, 4 enquanto fármacos que induzem a CYP3A4 (rifampicina, omeprazol e nifedipina) podem reduzir sua eficácia. Pacientes com comprometimento da função hepática podem apresentar efeitos prolongados. Barbitúricos: Utilizados para o controle da epilepsia, como agentes indutores de anestesia geral e para o controle da hipertensão intracraniana. Modo de ação: consiste em intensificar a ação do GABA ao aumentar o tempo de abertura dos canais de Cl-, permitindo, assim, um influxo muito maior de íons Cl- para cada canal ativado. Isso leva a um maior grau de hiperpolarização e a uma diminuição da excitabilidade da célula-alvo. Sua ação potencializadora para o GABA é maior que a dos benzodiazepínicos (a overdose de um barbitúrico é mais perigosa que a de um benzodiazepínico). Afetam não apenas os receptores GABAA, mas também aqueles envolvidos na neurotransmissão excitatória (diminuem a ativação do receptor AMPA pelo glutamato, reduzindo a despolarização da membrana). Aplicações clínicas: antigamente usados para tratamento da insônia e ansiedade. Ainda são utilizados para indução de anestesia geral, como agentes antiepilépticos e para neuroproteção (traumatismos e AVE). CUIDADO! Em associação com etanol, depressores do SNC, analgésicos opióides ou antidepressivos tricíclicos, sua margem de segurança diminui e podem provocar uma potenciação sinérgica da sedação e da depressão respiratória Pacientes com doença pulmonar ou cardiovascular podem apresentar depressão respiratória ou cardiovascular significativa, devido à depressão medular causada por doses normalmente terapêuticas desses fármacos. A overdose de benzodiazepínicos pode ser revertida por um antagonistados benzodiazepínicos, como o Flumazenil (competição pelo receptor GABAA). O uso crônico induz o desenvolvimento de tolerância e dependência. A súbita interrupção do seu uso crônico pode resultar em uma síndrome de abstinência, caracterizada por confusão, ansiedade, agitação e insônia. Por que os benzodiazepínicos, em grande parte, substituíram os barbitúricos na maioria das situações clínicas? São mais seguros, provocam menos tolerância, apresentam menos sintomas de abstinência e induzem efeitos menos profundos nas enzimas envolvidas no metabolismo de fármacos. 5 1. Tiopental indução da anestesia e manutenção a curto prazo, tratamento de emergência das convulsões. 2. Metoexital indução da anestesia e manutenção a curto prazo. 3. Pentobarbital, Secobarbital e Amobarbital insônia, sedação pré- operatória, tratamento de emergência das convulsões. 4. Fenobarbital tratamento das convulsões, estado de mal epiléptico. Farmacocinética: administrado VO, transmucosa ou EV. Metabolismo: sofrem extenso metabolismo hepático antes de sua excreção renal. As enzimas do citocromo P450 que metabolizam os barbitúricos são a CYP3A4, a CYP3A5 e a CYP3A7. Seu uso crônico supra-regula a expressão dessas enzimas, acelerando dessa maneira, o metabolismo dos barbitúricos (contribuindo para o desenvolvimento de tolerância) e de outros substratos dessas enzimas. Pacientes com comprometimento da função hepática apresentam uma redução da depuração desses fármacos, de modo que doses normais podem provocar efeitos maiores sobre o SNC. A administração de bicarbonato de sódio por via intravenosa aumenta a depuração, pois compostos ácidos são excretados mais rapidamente na urina alcalina. Etomidato, Propofol e Alfaxalona: São fármacos utilizados para indução de anestesia geral. A exemplo dos barbitúricos, esses anestésicos intravenosos atuam primariamente sobre os receptores GABAA, aumentando a atuação do GABA e, em altas concentrações podem atuar como agonistas. Agonistas e antagonistas dos receptores GABAB: Baclofen único composto de uso clínico atual. É um agonista seletivo dos receptores GABAB. CUIDADO! Ao contrário dos benzodiazepínicos, os barbitúricos em altas doses podem causar depressão fatal do SNC. Além disso, a administração concomitante com outros depressores do SNC, frequentemente o etanol, resulta em depressão do SNC mais grave do que aquela causada por barbitúricos isoladamente. Seu uso abusivo repetido e extenso induz o desenvolvimento de tolerância e dependência fisiológica. Aumenta a atividade das enzimas P450 e aumenta seu metabolismo, bem como o de outros sedativos/hipnóticos e etanol. 6 Modo de ação: ao ativar os receptores metabotrópicos de GABA na medula espinal, estimula os segundos mensageiros distais, que atuam sobre os canais de Ca2+ e K+. Uso clínico: usado primariamente no tratamento da espasticidade associada a doenças dos neurônios motores (p.ex., esclerose múltipla) ou lesão da medula espinal. Farmacocinética: pode ser administrado por via oral ou intratecal. Sofre absorção lenta e não atravessa facilmente a barreira hematoencefálica. Metabolismo: depuração principalmente renal e em menor parte no fígado, pela bile. Efeitos adversos: sedação, sonolência e ataxia. Tolerância e dependência: aparentemente não há desenvolvimento de tolerância. A interrupção abrupta pode precipitar hiperespasticidade aguda, rabdomiólise, prurido, delírio e febre. Fisiologia e neurotransmissão glutamatérgica: Metabolismo do Glutamato: Síntese por duas vias: transaminação do α-cetoglutarato (ciclo de Krebs) em glutamato nas terminações nervosas do SNC; ou alternativamente a glutamina produzida e secretada pelas células da glia é transportada nas terminações nervosas e convertida em glutamato pela glutaminase. Removido da fenda sináptica por transportadores de recaptação do glutamato, localizados nas terminações nervosas pré-sinápticas e nas membranas plasmáticas das células gliais. Nas células gliais glutamina sintetase converte glutamato em glutamina, que é reciclada em terminações nervosas adjacentes para nova conversão em glutamato. Receptores do Glutamato: Podem ser ionotrópicos ou metabotrópicos. Receptores ionotrópicos: medeiam as respostas excitatórias rápidas. São canais seletivos de cátions que, ao serem ativados, permitem o fluxo de Na+, K+ e Ca2+ através das membranas plasmáticas. Os subtipos principais são: Receptores de AMPA encontrados em todo o SNC, em particular no hipocampo e no córtex cerebral. Receptores de cainato expressos em todo o SNC, em particular no hipocampo e no cerebelo. Receptores NMDA expressos primariamente no hipocampo, no córtex cerebral e na medula espinal. Exige ligação de glutamato e glicina para ativação do canal. 7 Receptores metabotrópicos: acoplados a proteína G, regulam os fluxos iônicos de outros canais. Podem ser de três grupos: Grupo I provoca excitação neuronal através da ativação da PLC (fosfolipase C) e liberação de IP3 intracelular mediada por Ca2+, ou através de ativação da adenilil ciclase e geração de AMPc. Grupo II e Grupo III inibem a adenilil ciclase e diminuem a produção de AMPc. Fisiopatologia e farmacologia da neurotransmissão glutamatérgica: Normalmente, o término da ativação de receptores de glutamato ocorre através da recaptação do transmissor por transportadores pré-sinápticos e gliais, difusão do transmissor para fora da fenda sináptica ou dessensibilização do receptor. Entretanto, o aumento da liberação ou a diminuição da recaptação do glutamato em estados patológicos podem resultar em um ciclo de retroalimentação positiva envolvendo níveis intracelulares aumentados de Ca2+, lesão celular e maior liberação de glutamato. Em seu conjunto, esses processos podem levar à ocorrência de excitotoxicidade, definida como a ocorrência de morte neuronal causada por excitação celular excessiva. Devido ao papel potencial da neurotransmissão excitatória em diversos processos patológicos, como doenças neurodegenerativas, acidente vascular cerebral, traumatismo, hiperalgesia e epilepsia, os receptores de glutamato tornaram-se alvos importantes para o desenvolvimento de fármacos. A diversidade dos receptores de glutamato e das subunidades desses receptores representa uma vantagem potencial para o desenvolvimento de antagonistas dos receptores de glutamato seletivos para determinado subtipo de receptor. No futuro, antagonistas altamente específicos dos subtipos de receptores de glutamato poderão proteger potencialmente o SNC no acidente vascular cerebral, impedir a ocorrência de hiperalgesia após traumatismo tecidual e tratar as crises epilépticas. Bons Estudos!
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