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Direito de Sucessão dos Herdeiros Necessários

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Direito de Sucessão dos Herdeiros Necessários
Introdução
Este trabalho visa apresentar um panorama geral acerca do Direito Sucessório daqueles qualificados como herdeiros necessários no ordenamento jurídico atual.
Trata-se de pesquisa científica com objetivo de abordar o Direito Sucessório Brasileiro, no que concerne aos herdeiros necessários, levando em consideração os direitos a eles assegurados, e, portanto, as disposições legais que deverão ser obedecidas nessa espécie de sucessão.
Para tanto, o trabalho usou como base as disposições disciplinadas pela legislação vigente, em especial o Código Civil Brasileiro de 2002, bem como as doutrinas especializadas elaboradas por renomados juristas.
Inicia-se o trabalho com a conceituação da sucessão, uma vez que há no nosso sistema jurídico duas principais espécies, a inter vivos, e a causa mortis, sendo a última o objeto deste estudo, passando por uma breve explicação da controversa evolução do Direito Sucessório no Brasil.
Adentra-se então à apresentação das espécies de sucessão causa mortisadmitidas na legislação atual, quais sejam, a sucessão legítima, ou seja, decorrente das disposições legais, bem como a sucessão testamentária, que advém do testamento – disposição de última vontade – deixado pelo falecido.
Apresenta-se, então, os chamados herdeiros necessários, caráter legal conferido a certos participantes da sucessão causa mortis, ainda que de maneira breve, porém, explicativa no seu importante e determinante papel no direito sucessório.
A fim de enriquecer o presente trabalho, e trazer os pontos controvertidos deste relevante tema do Direito Civil, os dois últimos capítulos trazem de forma sucinta temas contraditórios do direito de sucessão dos herdeiros necessários.
O direito de sucessão do herdeiro que fora concebido através de inseminação artificial homóloga após a morte do autor da herança, e o direito de sucessão do companheiro que viveu em união estável com o falecido, uma vez que tais temas ainda causam discussão na doutrina e jurisprudência.
O presente estudo encerra-se com as considerações finais contidas na conclusão, pelo qual se verifica que muito há ainda a ser questionado e modificado na legislação sucessória atual, a fim de que esta acompanhe a evolução da sociedade, inclusive dos novos modelos familiares apontados e protegidos na Constituição Federal.
Por fim, temos que o presente trabalho pretende de forma simples e objetiva apresentar o direito sucessório e pequenas questões pontuais a seu respeito.
2. Sucessão
Ainda que a vida não seja eterna – pelo menos no que tange a existência corpórea –, pode se dizer que há uma continuidade dos bens necessários à existência e ao desenvolvimento do indivíduo.
Essa continuidade “(...) ininterrupta que une as gerações constitui o nexo sucessório civil.” [1]
Acredita-se que o direito sucessório surgiu com o reconhecimento da propriedade privada, principalmente nas sociedades capitalistas, sendo que a manutenção dos bens no seio familiar tornou-se um meio de preservar a propriedade privada, sendo este o ensinamento de Sílvio de Salvo Venosa:
Outra noção central no direito das sucessões é a que decorre da ideia de propriedade. Só se transferem bens e direitos pertencentes a alguém. A ideia central da sucessão deriva, portanto, da conceituação da propriedade e, como tal, sendo dela um reflexo, depende do tratamento legislativo da propriedade. Assim, tanto mais amplo será o direito sucessório quanto maior for o âmbito da propriedade privada no sistema legislativo. E vice-versa, tanto mais restrita será a transmissão sucessória quanto mais restrito for o tratamento da propriedade privada na lei.
Daí porque só se pode falar em direito das sucessões quando a sociedade passa a conhecer a propriedade privada. Enquanto, no curso da civilização, a propriedade for coletiva, pertencente a um grupo social, não haverá sucessão individual. [2] (grifos meus).
O direito das sucessões está previsto no Livro V, artigo 1.784 a 2.027 do Código Civil, e é composto do conjunto de normas que disciplinam a transferência do patrimônio de alguém, depois de sua morte, ao herdeiro, em virtude de lei ou testamento. [3]
Para Maria Berenice Dias, conceitua-se o direito sucessório como:
Trata da transmissão de bens, direitos e obrigações, em razão da morte de uma pessoa, aos seus herdeiros, que, de um modo geral, são seus familiares. O elemento familiar é definido pelo parentesco e o elemento individual caracterizado pela liberdade de testar. São estes os dois fulcros em que se baseiam as normas da sucessão. [4]
Da mesma opinião compartilha o doutrinador Silvio de Salvo Venosa:
Quando se fala, na ciência jurídica, em direito das sucessões, está-se tratando de um campo específico do direito civil: a transmissão de bens, direitos e obrigações em razão da morte. É o direito hereditário, que se distingue do sentido lato da palavra sucessão, que se aplica também à sucessão entre vivos. [5]
Já Maria Helena Diniz, divide o conceito de sucessão em duas partes, sendo:
(...) a) um sentindo amplo, aplicando-se a todos os modos derivados de aquisição de domínio, de maneira que indicaria o ato pelo qual alguém sucedo a outrem, investindo-se, no todo ou em parte, nos direitos que lhe pertenciam. Trata-se da sucessão inter vivos, pois o comprador sucede ao vendedor, o donatário ao doador, tomando uns o lugar dos outros em relação ao bem vendido ou doado; b) um sentido restrito, designando a transferência, total ou parcial, de herança, por morte de alguém, a um ou mais herdeiros. É a sucessão mortis causa que, no conceito subjetivo, vem a ser o direito em virtude do qual a herança é devolvida a alguém, ou, por outras palavras, é o direito por força do qual alguém recolhe os bens da herança, e, no conceito objetivo, indica a universalidade dos bens do de cujus que ficaram, com seus encargos e direitos. [6]
Ademais, o direito sucessório está expressamente previsto na Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso XXX, consagrado entre os direitos fundamentais, sendo que:
Ainda que a transmissão da herança se trate de direito individual, o que fundamenta o direito sucessório nos dias atuais é o afeto. (...) Como tem por finalidade garantir a segurança familiar, o direito sucessório tem dimensão social. Assim, não só no âmbito da família, mas também quando se fala em direito sucessório, é impositivo invocar o princípio fundamental da dignidade humana. Conforme Guilherme Calmon Nogueira da Gama, qualquer norma jurídica no direito das sucessões exige, com muito mais rigor do que em qualquer época anterior, a presença de fundamento de validade constitucional. O campo sucessório é terreno fecundo para o reconhecimento de garantias e direitos fundamentais. [7] (grifos meus).
Temos então que a sucessão nada mais é do que a transferência patrimonial dos bens de uma pessoa à outra em decorrência da morte daquela.
2.1 Evolução do Direito Sucessório no Brasil
O Código Civil de 1916, tendo como base o modelo de sociedade do século anterior a ele, reconhecia como família apenas o modelo constituído através do casamento indissolúvel.
Considerava a família uma sociedade tão fechada, que os filhos havidos fora do casamento não podiam sequer ser reconhecidos, conferindo a estes a qualidade de filhos ilegítimos, de forma que a própria lei autorizava o tratamento desigual entre os filhos, sendo tal colocação discriminatória somente banida com a mudança constitucional introduzida no artigo 227, § 6ºda Constituição Federal de 1988, proibindo qualquer tratamento discriminatório relativo à filiação, que passou a dispor o seguinte teor:
Art. 227, CF: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldadee opressão.
Parágrafo 6º: Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. (grifos meus)
Entretanto, pasmem, a consagração do princípio da igualdade na filiação, gerou diversas controvérsias, como por exemplo, nos casos de adoção de maiores de idades, onde a princípio só herdaria o filho adotivo, quando o adotante não tivesse filhos biológicos. E como se não bastasse isso, se adviessem filhos biológicos, o quinhão do filho adotivo seria fixado à apenas a metade do quinhão do até então “herdeiro legítimo”.
Com a consagração do referido princípio, aberta a sucessão, passou a ser garantido tratamento igual a todos os filhos, nascido antes ou depois da adoção.
É este o entendimento pacífico do E. Supremo Tribunal de Justiça, senão vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. INCLUSÃO. PÓLO PASSIVO. POSTERIOR. CITAÇÃO. POSSIBILIDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7-STJ. CIVIL. PARTILHA. NULIDADE. HERDEIRO PRETERIDO. PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA. ADOÇÃO. CÓDIGO CIVIL. ÉPOCA ANTERIOR. ATUAL CONSTITUIÇÃO. MORTE. DE CUJUS. SUCESSÃO. ABERTURA. ÉPOCA POSTERIOR (1989). ADOTADO. FILHOS DO CASAMENTO. DISCRIMINAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1 - Não viola os arts. 264 e 294, ambos do CPC a inclusão no pólo passivo da demanda de maridos e esposas dos primitivos réus, posteriormente à citação destes, porquanto não efetivada nenhuma alteração na causa de pedir ou no pedido, restando incólume a estabilidade da causa. 2 - Segundo iterativos precedentes das Turmas especializadas em direito privado desta Corte a prescrição para anular partilha, onde preterido herdeiro necessário, é a vintenária. 3 - Aferir se há ilegitimidade passiva ad causam demanda revolvimento de aspectos fático-probatórios, vedados pela súmula 7-STJ. Precedentes do STJ. 4 - Ocorrida a morte da autora da herança em 1989, quando já em vigor o art. 227, § 6º, da Constituição Federal, vedando qualquer tipo de discriminação entre os filhos havidos ou não do casamento, ou os adotivos, a recorrida, ainda que adotada em 1980, tem direito de concorrer aos bens deixados pela falecida, em igualdade de condições com os outros filhos, prevalecendo, nesse caso, os arts. 1572 e 1577, ambos do Código Civil de 1916. 5 - Recurso especial não conhecido (STJ - REsp: 260079 SP 2000/0050145-0, Relator: Ministro FERNANDO GONÇALVES, Data de Julgamento: 17/05/2005, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ 20.06.2005 p. 288LEXSTJ vol. 191 p. 72). (grifos meus).
O Código de Beviláqua se mostrava tão protetivo ao matrimônio que vedava qualquer direito ao integrante das relações extramatrimoniais.
Ademais, não reconhecia também o direito sucessório dos que viviam em concubinato, ainda que solteiros ou separados de fato fossem. Nenhum direito era assegurado ao parceiro sobrevivente.
A jurisprudência, sempre a frente do seu tempo, é que começou a mudar esta visão, passando a conceder à mulher indenização por serviços domésticos, equiparando o concubinato a uma relação de trabalho. Foi então que surgiu a antiga sociedade de fato, que possibilitava a divisão do patrimônio construído durante a vida em comum, desde que os “sócios” pudessem provar sua participação na constituição do patrimônio da referida sociedade.
Novamente, só com o advento da Constituição Federal de 1988 é que foi reconhecida a união estável como entidade familiar: “Art. 226. CF: A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”, sendo que o direito sucessório dos companheiros só foi expressamente garantido com a criação da Lei 8.971/94.
Sabemos que a sociedade caminha sempre a um passo à frente da lei, e que a lei é quem deve acompanhar a sociedade, nunca o caminho inverso. Entretanto, em pouco inovou o novo Código Civil de 2002 no campo da sucessão, uma vez que basicamente copiou o diploma anterior.
Suas inovações limitaram-se a redução da vocação hereditária, uma vez que no antigo Código a sucessão aos colaterais estendia-se até o sexto grau.
A falta de inovação da lei é ainda mais explícita no campo da indignidade e da deserdação. As causas que permitem a expulsão do herdeiro permaneceram as mesmas, sendo que a única inovação ocorreu no campo da deserdação, onde houve a exclusão da desonestidade da filha que vive na casa paterna.
Nas palavras de Maria Berenice Dias:
É desastroso – para dizer o mínimo – limitar as causas de exclusão que autorizam excluir o herdeiro, o que não permite penalizar ações outras com a exclusão da herança. Um exemplo basta para flagrar esta incongruência. A injuria grave autoriza a deserdação, mas o estupro não. Ora, se cabe ao juiz declarar a indignidade e a deserdação, mister que fosse assegurado a ele o encargo de identificar os motivos que justificam penalizar o herdeiro indigno. [8]
E a falta de mudanças necessárias não parou por aí! O Novo Código Civilinsistiu na distinção de direitos sucessórios entre cônjuges e companheiros, não garantindo a ambos o tratamento igualitário devido.
Tal é que no artigo que regula o direito sucessório do companheiro, a saber, o artigo 1.790 do Código Civil, ao companheiro foi conferido o último lugar na linha sucessória, tendo que concorrer até com os herdeiros colaterais, quando ao cônjuge supérstite é conferida a qualidade de herdeiro necessário do autor da herança.
Estes tratamentos diferenciados a cônjuges e companheiros são claramente inconstitucionais.
Ademais, a qualificação do cônjuge como herdeiro necessário e a contemplação do direito de concorrência evidenciam que o Estado ao criar tais dispositivos avança na autonomia da vontade das pessoas, que por muitas vezes escolheram para suas relações pessoais direitos patrimoniais totalmente distintos. “A escolha levada a efeito em vida precisa ser respeitada mesmo após a morte.” [9]
Percebe-se que ainda há muitas mudanças necessárias na legislação sucessória, como por exemplo, o reconhecimento do direito à herança nas relações homoafetivas, ou ainda a inclusão da sucessão do companheiro no livro das sucessões do Código Civil, uma vez que estas e outras questões pertinentes ao tema vêm sido reconhecidas apenas pela jurisprudência atual.
3. Espécies de Sucessão
A sucessão pode ser classificada de diversas maneiras.
Quanto ao modo, poderá ser por direito próprio, por representação ou por transmissão.
Já quanto à fonte de derivação será legítima ou testamentária, conforme veremos a seguir.
Por fim, em relação aos efeitos a sucessão poderá ser entre inter vivos ou causa mortis, sendo esta última o objeto deste estudo.
3.1 Sucessão Legítima
Em simples palavras, a sucessão legítima é aquela que resulta da lei. Também é chamada de ab intestato, em uma referência à falta de testamento.
Nesta modalidade não há disposição de última vontade do de cujus, sendo que seus bens serão destinados àqueles a quem a lei confere a qualidade de herdeiros.
Maria Berenice Dias e outros doutrinadores, apresentam a ideia de que a sucessão legítima poderia ser conceituada também como um testamento tácito, uma vez que “ao deixar o de cujus de dispor sobre seus bens, isso significa que concorda que o seu patrimônio passe às pessoas enumeradas pela lei.” [10]
Entretanto, para a I. Doutrinadora supracitada a expressão legítima não se faz de todo correta, isso porque:
A expressão “legítima” é alvo de críticas, até porque não existe sucessão ilegítima. Claro que a referência tem a ver com a discriminação que sofriam os filhos havidos fora do casamento. Eram chamados filhos ilegítimos. Não podiam ser reconhecidos e, de consequência, não podiam herdar.
Também as uniões extramatrimoniais não mereciam reconhecimento. Com o nome de concubinato, não eram consideradas famílias, não sendo incluídas no direito sucessório. Assim, quando do falecimento de um dos concubinatos, ainda que não existissem herdeiros necessários, o sobrevivente não podia herdar. Constava da lei como excluída da sucessão “a concubina do testador casado”.
O reconhecimento da união estável comoentidade familiar, bem como a proibição de tratamento discriminatório com relação aos filhos, ocorreu com a Constituição Federal, e isso no ano de 1988. Assim, não mais se justifica continuar falando em sucessão legítima. [11] (grifo meu).
Destarte, a sucessão legítima é que dirá como será dividido o patrimônio deixado pelo de cujus quando este não deixou disposição de última vontade - testamento -, ou nos casos em que seu testamento dispõe sobre apenas parte dos bens deixados, ou ainda se o testamento deixado caducou, tornou-se ineficaz, nulo ou até mesmo descobriu-se a existência de herdeiros necessários, devendo a disposição testamentária ser diminuída para resguardar a cota reservatória.
A sucessão legítima também ocorrerá nas hipóteses de nulidade, anulabilidade ou caducidade de testamento, como dispõem os artigos 1.786 e 1.788 do Código Civil:
Art. 1.786, CC. A sucessão dá-se por lei ou por disposição de última vontade.
Art. 1.788, CC. Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar, ou for julgado nulo. (grifo meu).
Atualmente, está em tramitação na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei n. 699/2011 que visa alterar a redação do referido artigo 1.788 do Código Civil, sendo o seu novo teor: “Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar, romper-se, ou for inválido.”.
Isto porque, o artigo vigente engloba a anulabilidade e a nulidade do testamento em um único termo, e deixa de prever a hipótese de rompimento do testamento.
Destarte, a sucessão legítima passará o patrimônio do de cujus às pessoas indicadas pela lei, devendo ser observada a ordem de vocação hereditária, disposta no artigo 1.829 do Código Civil:
Art. 1.829, CC. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais. (grifos meus).
Interessante o ensinamento apontado por Sílvio de Salvo Venosa que:
Advirta-se, de plano, que a referencia ao art. 1640, parágrafo único constante do inciso I do art. 1.829 está incorreta. A menção correta é a do art. 1.641, que descreve as hipóteses de casamento sob regime de separação obrigatória de bens. O projeto nº 6.960 tenta corrigir a distorção, motivada pelo açodamento de última hora na aprovação do Código. [12]
Note-se que:
A posição do cônjuge na ordem de vocação hereditária do mais recente diploma é nova, com relação ao art. 1.603 do Código anterior: “serão chamados, pela ordem, os descendentes, os ascendentes, o cônjuge sobrevivente, os colaterais até o quarto grau e, por fim, o Estado”. [13]
Sendo assim, ocorrendo a sucessão legítima convocar-se-ão os herdeiros segundo tal ordem legal, de forma que uma classe só será chamada quando faltarem herdeiros da classe precedente. [14]
A ordem de vocação hereditária é uma relação preferencial, estabelecida pela lei, das pessoas que são chamadas a suceder o finado. [15] Não restam dúvidas que há uma hierarquia entre as classes de herdeiros.
A vocação hereditária distribui os herdeiros em classes preferenciais, baseando-se nas relações de família e de sangue.
Destarte, nas palavras de Maria Helena Diniz temos:
Assim sendo, se o autor da herança apenas deixar descendentes e ascendentes, só os primeiros herdarão, pois a existência dos descendentes retira da sucessão os ascendentes. Só se convocam ascendentes se não houver descendente; o consorte supérstite, além de, em certos casos, concorrer com descendente ou ascendente, só herdará a totalidade da herança na ausência de descendentes e ascendentes; os colaterais, se não existirem descendentes, ascendentes e cônjuge sobrevivente. Logo, se houver herdeiro sucessível de uma classe considerada preferencial por razões especiais, ele será chamado à sucessão do autor da herança, deixando de fora os herdeiros de outra classe. [16]
Ademais, há que se estabelecer o conceito de legítima, qual seja, a parte reservada aos herdeiros necessários, que é intangível: não pode ser reduzida nem ser sujeita a ônus, encargos, gravames ou condições. Também não pode ser objeto de legado, usufruto, fideicomisso, pensão, habitação ou de outros direitos dessa natureza. [17]
Ou seja, a lei garante metade dos bens da herança aos herdeiros necessários, descendentes, ascendentes e cônjuges.
Sendo assim:
A lei reserva fração da herança ao cônjuge e ao companheiro, que herdam em concorrência com os herdeiros que os antecedem (descendentes e ascendentes). Sobre a fração que fazem jus, cônjuge e companheiro são eles herdeiros necessários, pois contemplados por determinação legal. O autor da herança não pode dispor em testamento sobre a legítima (CC 1.857 § 1.º). O máximo que pode fazer é identificar os bens que integram o quinhão do herdeiro (CC 2.014). No entanto, não pode estabelecer a conversão dos bens da legítima em outros de espécie diversa (CC 1.848 § 1.). [18]
Temos então que a todos os parentes apontados pela lei – em linha reta, colaterais até o quarto grau, cônjuge e companheiro –, é assegurada legitimidade para suceder, uma vez que a lei concede a estes a qualidade de herdeiros, sendo denominados como herdeiros legítimos.
Entretanto, há uns é conferida a qualidade de herdeiro necessário, uma vez que não podem ser retirados da condição de herdeiros, salvo se deserdados ou declarados indignos.
Por outro lado, aos parentes mais distantes foi conferida a qualidade de herdeiro facultativo, uma vez que podem ser excluídos da herança, sendo este o critério que caracteriza a sucessão em legítima ou facultativa.
Como já exposto, prevalece a sucessão legítima quando inexiste testamento. Também com referência aos bens não incluídos no testamento são chamados a suceder os herdeiros legítimos. [19]
3.2 Sucessão Testamentária
Há indícios de que o testamento já era conhecido desde Roma, muito antes da Lei das XII Tábuas.
Após a Lei das XII Tábuas sabe-se que o testamento se generaliza. Pelos estudos já realizados, acredita-se que em Roma o testamento se impunha sobre a ordem de vocação hereditária.
Ainda que atualmente a sucessão seja vista somente de um ponto de vista patrimonial, sua origem foi totalmente extrapatrimonial.
Sem muitos mistérios, a sucessão testamentária é a transmissão da herança por meio de testamento. [20]
Esta modalidade de sucessão ocorre quando o de cujus realiza sua última manifestação de vontade – enquanto ainda vivo – escolhendo a quem seu patrimônio será destinado após a sua morte. O testamento serve precipuamente para o autor da herança alterar a vontade do legislador. [21]
A sucessão legítima é a regra e a testamentária, a exceção.[22]
Hoje, no Brasil, a utilização da sucessão testamentária ainda é escassa, como disciplina Silvio de Salvo Venosa:
As causas da utilização restrita do testamento em nosso meio estão, sem dúvida, afetas a fatores estranhos ao direito. A questão é principalmente sociológica. Como o direito sucessório é corolário imediato da família e mediato do direito de propriedade, também a sucessão testamentária é consequência do posicionamento da família e da propriedade dentro do contexto legal, do ordenamento jurídico.
Com as modificações feitas pelo Código de 2002 na ordem de vocação hereditária, com o malévolo imbróglio criado pelo legislador, mormente no tocante à sucessão do cônjuge e do convivente, tendo também em vista o aspecto da reprodução assistida após a morte do pai ou da mãe, o testamento ganha nova força. O Código vigente, poroutro lado, de certa forma facilitou a elaboração do testamento, simplificando suas formalidades. (...)
De qualquer forma, não se pode negar que o testamento é um dos pontos mais relevantes do direito privado, pois é nele que se revela com maior amplitude a autonomia da vontade privada. [23] (grifos meus).
Ademais, embora a finalidade precípua do testamento seja dispor dos bens para após a morte, pode o ato conter disposições sem cunho patrimonial, como o reconhecimento de filiação, a nomeação de um tutor ou curador, a atribuição de um título honorífico. [24]
Nas palavras de Maria Berenice Dias lemos:
A lei não mais define o que é testamento, como fazia o Código anterior (CC/1916 1.626). Foi sensível às criticas recebidas. Agora se limita a apontar suas características (CC 1.857 e 1.858). Mas cabe trazer a definição de Pontes de Miranda: ato pelo qual a vontade de alguém é declarada para o caso de morte, com eficácia de reconhecer, transmitir ou extinguir direitos. Trata-se de ato essencialmente solene, sujeito a condição suspensiva, pois sua eficácia está condicionada a evento futuro e certo: a morte do testador. O testamento torna-se perfeito e acabado no momento da declaração de vontade e irrevogável quando da abertura da sucessão. O testamento só é eficaz com a morte do testador. Durante a vida dele, só há expectativa, só existe esperança. Como diz Zeno Veloso, o beneficiado na deixa mortuária não tem direito atual a coisa nenhuma. [25] (grifos meus).
Sendo assim, concluí-se que o testamento é um negócio jurídico e pressupõe plena capacidade do testador, embora a incapacidade superveniente não afeta a higidez do ato [26], senão vejamos:
RECURSO ESPECIAL. TESTAMENTO PARTICULAR. VALIDADE. ABRANDAMENTO DO RIGOR FORMAL. RECONHECIMENTO PELAS INSTÂNCIAS DE ORIGEM DA MANIFESTAÇÃO LIVRE DE VONTADE DO TESTADOR E DE SUA CAPACIDADE MENTAL. REAPRECIAÇÃO PROBATÓRIA. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. I - A reapreciação das provas que nortearam o acórdão hostilizado é vedada nesta Corte, à luz do enunciado 7 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça. II - Não há falar em nulidade do ato de disposição de última vontade (testamento particular), apontando-se preterição de formalidade essencial (leitura do testamento perante as três testemunhas), quando as provas dos autos confirmam, de forma inequívoca, que o documento foi firmado pelo próprio testador, por livre e espontânea vontade, e por três testemunhas idôneas, não pairando qualquer dúvida quanto à capacidade mental do de cujus, no momento do ato. O rigor formal deve ceder ante a necessidade de se atender à finalidade do ato, regularmente praticado pelo testador. Recurso especial não conhecido, com ressalva quanto à terminologia. (STJ - REsp: 828616 MG 2006/0053147-2, Relator: Ministro CASTRO FILHO, Data de Julgamento: 05/09/2006, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 23/10/2006 p. 313RB vol. 517 p. 23).
Contudo, as duas modalidades de sucessão, legítima e testamentária, podem coexistir, sendo que:
(...) pois poderá uma sucessão legítima, obedecendo ao comando legal na parte em que não houver testamento ou não prevalecer a manifestação de última vontade, e testamentária, na parte em que se obedece à vontade do finado. [27]
Sendo assim, temos que o testamento trata de um negócio jurídico, e requer para sua validade agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei. [28]
A qualquer um é assegurado o direito de testar, ou seja, dispor de maneira jurídica e eficaz acerca de seu patrimônio após sua morte. Entretanto, referida liberdade não é absoluta.
Este é o ensinamento de Maria Helena Diniz:
É preciso não esquecer, ainda, que, se o testador for casado pelo regime da comunhão universal de bens (CC, art. 1.667), a metade dos bens pertence ao outro consorte; assim, para calcular a legítima e a porção disponível deve-se considerar tão somente a meação do testador. Donde se infere que, em nosso direito, só haverá absoluta liberdade de testar, isto é, de dispor de todos os bens por testamento para depois da morte, quando o testador não tiver herdeiros necessários, caso em que poderá afastar de sua sucessão, se o desejar, os colaterais (CC, art. 1850). [29] (grifos meus).
Aqueles que têm herdeiros necessários não poderão dispor da totalidade de seu patrimônio. Como já exposto, a lei é quem especifica quem são os herdeiros necessários e a estes é assegurado metade dos bens da herança.
Sendo assim, só poderá dispor da totalidade de sua herança quem não tiver parentes em linha reta: filhos, netos ou bisnetos, e pais, avós ou bisavós; bem como aquele que for casado.
Contudo, a existência de parentes colaterais até o quarto grau, os chamados herdeiros legítimos, não proíbe a disponibilidade integral da herança pelo testador.
Neste contexto, conceitua-se:
1ª) Capacidade testamentária, isto é, conjunto de condições necessárias para que alguém possa, juridicamente, dispor de seu patrimônio por meio de testamento, ou ser por ele beneficiado. Assim, quando o testador tiver capacidade para testar, terá capacidade testamentária ativa (...). Terá capacidade testamentária passiva todo aquele que for capaz para adquirir bens por meio de testamento.(...) 2ª) Não haver deserdação, pois é inegável que é condição para receber bens do de cujus, por via da sucessão testamentária, que a pessoa beneficiada, embora não seja incapaz de adquirir por testamento, não tenha sido deserdada, já que a lei permitiria a sua exclusão da sucessão se tivesse praticado certos atos contra o auctor sucessionis; no entanto, os descendentes do deserdado sucederão ao testador como se o excluído morto fosse. 3ª) Observância de todas as formalidades legais nas disposições testamentárias.
Somente após o óbito do testador é que se pode questionar a validade de seu testamento; caso contrário, haveria pendência sobre herança de pessoa viva. [30]
Note-se que o artigo 1.860 do Código Civil indica os incapazes para testar:
Art. 1.860. Além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem pleno discernimento.
Parágrafo único. Podem testar os maiores de dezesseis anos.(grifos meus).
Temos então que, não têm capacidade testamentária ativa o menor de 16 anos, bem como aqueles que não estejam no gozo das faculdades mentais, ainda que representados, ante o caráter personalíssimo desse ato, incompatível com a participação de representante. [31]
Portanto, o herdeiro necessário, legitimário ou reservatório, a quem o testador deixar legado ou sua parte disponível, não perderá o direito à legítima. [32]
Entretanto, os herdeiros exclusivamente testamentários só receberão aquilo que o testador lhes deixou, isso se houverem bens após pagas as dívidas deixadas e separada a legítima aos herdeiros necessários.
O herdeiro é sucessor universal, quer provenha da ordem legal, quer provenha da vontade do testador. O legatário é sucessor singular, e só virá a existir por meio do testamento. [33]
4. Herdeiros Necessários
A grande missão do direito sucessório é identificar quem são os herdeiros, para só então proceder à divisão dos direitos e obrigações deixados pelo autor da herança.
Contudo, a identificação dos herdeiros não é tarefa simples, devendo ser observados diversos fatores para tanto.
Há algumas premissas. Uma delas: todos os parentes são herdeiros.Como todos têm “legitimidade” para herdar, todos são herdeiros legítimos.Não só os parentes, também o cônjuge e o companheiro são herdeiros legítimos. No entanto, nem todos fazem jus à herança. São herdeiros em potencial. O legislador presume que laços afetivos geram dever de mútua assistência e tenta adivinhar quem a pessoa, ao morrer, gostaria de contemplar com o seu patrimônio. E, atento à proximidade com o de cujus, estabelece uma ordem de prioridade entre os herdeiros. É o que se chama de ordem de vocação hereditária. [34]
No sistema atual a vocação hereditária é estabelecida por classes, baseadas nas relações de família e de sangue. [35]. Para Venosa são os descendentes, ascendentes, cônjuges colateraise Estado. Já Maria Berenice Dias não considera o Estado uma das classes de herdeiro. Para ela há ainda um segundo critério a ser observado quando da convocação dos herdeiros à herança: “[...] (a) primeiro os parentes mais próximos; (b) a preferência é sempre dos descendentes.”. [36]
Referidas classes encontram-se elencadas no artigo 1.829 do Código Civil, senão vejamos:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais.
(grifos meus).
Portanto, cada inciso do art. 1.829 refere-se a uma classe de herdeiros. Note que no corrente diploma foi estabelecida a herança concorrente do cônjuge com descendentes e ascendentes. [37]
Entretanto, o fato de alguém integrar a ordem de vocação hereditária não assegura, por si só, direito a herança. Nem o fato de pertencer à mesma classe sucessória garante participação na herança. A chamada dos herdeiros é sucessiva e excludente, isto é, só serão chamados os ascendentes na ausência de descendentes, só será chamado o cônjuge sobrevivente isoladamente, na ausência de ascendentes e assim por diante. [38]
Há uma regra geral, existindo herdeiros de uma classe, os herdeiros das demais classes ficam excluídos da sucessão, por assim dizer. Na hipótese de uma classe estiver vazia é que a próxima classe será chamada. Um único herdeiro de uma classe afastará todas as classes subsequentes a ele. Pode-se dizer então que há uma hierarquia de classes.
Importante ressaltar a lição deixada por Sílvio de Salvo Venosa acerca da sucessão no âmbito internacional, senão vejamos:
No âmbito do direito internacional privado, dispõe a vigente LICC, atual Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, Lei nº 12.376, de 30-12-2010 (art. 10): “A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que era domiciliado o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens.” O § 1º desse artigo acrescenta:
“a vocação para suceder em bens de estrangeiro situados no Brasil será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge brasileiro e dos filhos do casal, sempre que não lhes seja mais favorável a lei do domicílio”.
Procura a lei brasileira proteger a família de nacionalidade brasileira. A regra também é constitucional (art. 5º, XXXI). Note-se, ainda, que o art. 17 do Decreto Lei nº 3.200/41, com alteração do Decreto-lei nº 5.187/43, estabeleceu sucessão do cônjuge sobrevivente em usufruto se o casamento for com cônjuge estrangeiro em regime que exclua a comunhão parcial, sendo da quarta parte da herança, se houver filhos brasileiros do casal ou do outro consorte e da metade, se não houver. [39]
Sendo assim, a ordem de vocação hereditária se dará da seguinte maneira.
4.1 Descendentes
Em primeiro lugar estão os parentes em linha reta descendente: filhos, netos, bisnetos, etc. Isso porque, a lei adotou uma ordem natural e afetiva [40]. Há uma presunção da lei de que o autor da herança gostaria de deixar seus bens aos seus descendentes. A ordem é excludente. Somente se não existirem filhos, são convocados os netos. Os bisnetos só herdam se não existirem nem filhos nem netos. [41]
Importante repisar, que atualmente não há mais que se falar em distinção entre os filhos no direito sucessório, sendo essa a valiosa lição apresentada por Sílvio de Salvo Venosa:
Inicialmente, a redação original do Código Civil anterior fez a distinção na sucessão dos descendentes legítimos, de um lado, sempre com todos os direitos, e os filhos naturais e adotivos de outro. De acordo com a regra do art. 1.605, equiparavam-se os filhos legítimos, os legitimados e os adotivos de casais que não tinham filhos. Pelo sistema do Código de 1916, os filhos adulterinos e os incestuosos, não podendo ser reconhecidos (art. 358), não tinham direito sucessório algum. Os filhos naturais, portanto, os concebidos antes do casamento, tinham direito à metade do que coubesse ao filho legítimo. Como se vê, o Código anterior, apesar de surgir com a abertura do século XX, muito cedo se mostrou anacrônico, fazendo uma restrição odiosa entre as várias categorias de filhos. A discriminação absoluta com relação aos adulterinos e incestuosos colocava-os como se tivessem alguma responsabilidade por terem sido concebidos; eram indivíduos absolutamente à margem da família. Só poderiam ser beneficiados hereditariamente por testamento.
Entendeu o legislador do início do século passado que a introdução de um descendente espúrio, ou simplesmente estranho, no seio da família, ainda que concebido antes do matrimônio, no estado de solteiro do marido (hipótese para qual se dirigia a lei), traria um fator de desconforto ao casal e ao corpo familiar, um ponto de dissensões e desavenças. Daí por que o filho natural, como um ser intruso, não tinha o mesmo direito hereditário. Na origem do Código de 1916, nem havia que se pensar em algum direito sucessório ao filho adulterino ou ao incestuoso, que recebiam verdadeira pena sem delito.
À medida que a sociedade brasileira foi despindo-se dos preconceitos e atentando mais para uma realidade social e nossa inescondível origem histórica, foram surgindo, na lei, princípios tendentes a minimizar a situação de inferioridade e a distinção quanto à origem das proles. [42] (grifos meus).
Ademais, para os descendentes existe o direito de representação, disposto no artigo 1.833 do Código Civil.
Sendo assim, concorrendo descendentes da mesma classe, porém de graus diversos, ou seja, falecido, declarado indigno ou deserdado, a lei autoriza que seus sucessores recebam seu quinhão da herança, ou seja, o representem.
Neste caso, os sucessores receberão fração igual à dos demais herdeiros, por cabeça. Tal percentual será então dividido entre os representantes em partes iguais, herdando estes por estirpe.
4.2 Ascendentes
A seguir, a próxima classe chamada à sucessão é a dos ascendentes, pais, avós, bisavós, etc., que, novamente, só serão chamados na ausência de descendentes.
Aos ascendentes não é concedido o direito de representação, ou seja, o ascendente mais próximo exclui o mais remoto.
Nesta classe, a herança é dividida entre a linha materna e paterna, chamada de linha de ascendência, ou seja:
Tal acontece se os herdeiros são os pais, bem como quando são convocados os avós, ou, ainda, os bisavós. A herança é partilhada pela metade entre a linha paterna e a linha materna, e não pelo número dos ascendentes sobreviventes. Os ascendentes da linha materna dividem entre eles a metade da herança. O mesmo ocorre na ascendência paterna. Desimporta o numero de ascendentes sobreviventes. [43]
4.3 Cônjuge
Em continuação, no terceiro lugar da vocação hereditária, está o cônjuge, único herdeiro cujo direito sucessório não decorre de vínculo de parentesco. [44] Na existência de herdeiros em linha reta, o cônjuge supérstite não herdará. Entretanto, lhe é assegurado, a depender do regime de bens, uma parte do patrimônio deixado pelo de cujus, sob concorrência sucessória.
Há na doutrina, certa divergência acerca da qualidade de herdeiro necessário conferida ao cônjuge.
Sílvio Venosa manifesta-se favorável:
O cônjuge, como enfatizamos, foi colocado na posição de herdeiro necessário, juntamente com os descendentes e ascendentes (art. 1.845). Desse modo, aos herdeiros necessários pertence, de pleno direito, a metade dos bens da herança, que se denomina legítima (art. 1.846). Quando se trata de herdeiro cônjuge, nunca é demais reiterar que herança não se confunde com meação. Assim, havendo meação, além desta caberá ao sobrevivente, pelo menos, a metade da herança, dependendo da situação, que constitui a porção legítima. [45] (grifos meus).
Já Maria Berenice Dias adota posiçãocontrária:
Quando o cônjuge é chamado a suceder, assume a condição de herdeiro, independentemente do regime de bens do casamento, pois a lei nada refere ao conferir-lhe a qualidade de herdeiro necessário. Herda por figurar na ordem sucessória. Mesmo depois das decisões do STJ excluindo do cônjuge sobrevivente a condição de herdeiro necessário e o direito de concorrência hereditária, a jurisprudência ainda não está pacificada quando o regime é o da separação obrigatória ou se, via pacto antenupcial, foi adotado o regime da separação de bens. [46](grifos meus).
Inexistindo descendentes ou ascendentes, será chamado à sucessão, independentemente do regime de bens do casamento.
Note-se que, a partir do momento em que as uniões homoafetivas foram reconhecidas como uniões estáveis e lhes foi garantido o direito de casar, passaram a desfrutar de iguais direitos sucessórios. [47]
A legitimidade para suceder do cônjuge, em nada se confunde com a meação.
Sílvio Venosa conceitua meação como:
A meação do cônjuge, como já acenado, não é herança. Quando da morte de um dos consortes, desfaz-se a sociedade conjugal. Como em qualquer outra sociedade, os bens comuns, isto é, pertencentes às duas pessoas que foram casadas, devem ser divididos. A existência de meação, bem como do seu montante, dependerá do regime de bens do casamento. Na comunhão universal, todo o patrimônio é dividido ao meio. Na comunhão de aquestos, dividir-se-ão pela metade os bens adquiridos na constância do casamento. Se há pacto antenupcial, a meação será encontrada de acordo com o estabelecido nessa escritura. Os regimes de bens pertencem ao direito de família, em cujo tomo foram examinados. [48]
Sendo assim, metade dos bens comuns do casal não integram a herança e pertencem ao cônjuge sobrevivente.
Ademais, além da meação receberá também parte da herança deixada pelo de cujus, juntamente com os herdeiros anteriores a ele na ordem de vocação hereditária. Ao concorrer com descendentes, sua participação na sucessão está condicionada ao regime de bens. Entretanto, ao concorrer com os ascendentes, tal observação não se faz necessária. Herdará parte da herança.
De acordo com o inciso I do artigo 1.829, se casados sob o regime da comunhão universal de bens ou no regime da separação obrigatória, o cônjuge supérstite não concorrerá com os descendentes. Note que nesta última hipótese, a Súmula 377 do STF passou a garantir o direito sucessório no tocante aos bens adquiridos na vigência do casamento.
Entende-se que não há concorrência no regime da separação obrigatória de bens, uma vez que incabível ultrapassar o regime outrora imposto por lei. Já no tocante ao regime da comunhão universal de bens, o cônjuge ampara-se através da meação, sendo desnecessária sua concorrência na herança.
Confuso, porém, o direito sucessório aplicado aos casamentos celebrados sob o regime da comunhão parcial de bens:
Na comunhão parcial de bens, o legislador cria duas hipóteses de incidência da regra de concorrência. Primeiro (regra geral), o cônjuge sobrevivente não concorre com os demais descentes, porque já meeiro, quando o autor da herança não houver deixado bens particulares. Segunda hipótese, se o autor da herança houver deixado bens particulares, a contrário sensu, da regra geral, conclui-se que o cônjuge sobrevivente concorre com os descendentes.
Na realidade, ao excetuar os três regimes de bens (comunhão universal de bens, comunhão parcial de bens e separação obrigatória de bens) o legislador só abriu possibilidade, efetivamente, do cônjuge sobrevivente concorrer como herdeiro necessário, com os descendentes, quando o autor da herança houver deixado bens particulares, no regime da comunhão parcial de bens, pois, nos demais casos, o cônjuge será meeiro ou simplesmente tomará sua massa de bens particulares. [49]
Com o intuito de então sanar as divergências sobre qual a base de incidência do direito de concorrência do cônjuge supérstite, sobreveio o seguinte entendimento do Supremo Tribunal de Justiça:
Direto das sucessões. Recurso especial. Inventário. De cujus que, após o falecimento de sua esposa, com quem tivera uma filha, vivia, em união estável, há mais de trinta anos, com sua companheira, sem contrair matrimônio. Incidência, quanto à vocação hereditária, da regra do art. 1790 do CC/02. Alegação, pela filha, de que a regra é mais favorável para a convivente que a norma do art. 1829, I, do CC/02, que incidiria caso falecido e sua companheira tivessem se casado pelo regime da comunhão parcial. Afirmação de que a Lei não pode privilegiar a união estável em detrimento do casamento. - O art. 1790 do CC/02, que regula sucessão do 'de cujus' que vivia em comunhão parcial com sua companheira, estabelece que esta concorre com os filhos daquele na herança, calculada sobre todo o patrimônio adquirido pelo falecido durante a convivência. – A regra do art. 1829, I do CC/02, que seria aplicável caso a companheira tivesse se casado cm o 'de cujus' pelo regime da comunhão parcial de bens, tem interpretação muito controvertida na doutrina, identificando-se três correntes de pensamento sobre a matéria: (i) a primeira, baseada no Enunciado2700 das Jornadas de Direito Civil, estabelece que a sucessão do cônjuge, pela comunhão parcial, somente se dá na hipótese em que o falecido tenha deixado bens particulares, incidindo apenas sobre esses bens; (i) a segunda, capitaneada por parte da doutrina, defende que a sucessão na comunhão parcial também ocorre apenas se o 'de cujus' tiver deixado bens particulares, mas incide sobre todo o patrimônio, sem distinção; (i) a terceira, defende que a sucessão do cônjuge, na comunhão parcial, só ocorre se o falecido não tiver deixado bens particulares. - Não é possível dizer, aprioristicamente e com as vistas voltadas apenas para as regras de sucessão, que a união estável possa ser mais vantajosa em algumas hipóteses, porquanto o casamento comporta inúmeros outros benefícios cuja mensuração é difícil. – É possível encontrar, paralelamente às três linhas de interpretação do art.1.829999, I doCC/022 defendidas pela doutrina, uma quarta linha de interpretação, que toma em consideração a vontade manifestada no momento da celebração do casamento, com norte para interpretação das regras sucessórias. - Impositiva a análise do art.1829999, I doCC/022, dentro do contexto do sistema jurídico, interpretando o dispositivo em harmonia com os demais que enfeixam a temática, em atenta observância dos princípios e diretrizes teóricas que lhe dão forma, arcadamente, a dignidade da pessoa humana, que se espraia, no plano da livre manifestação da vontade humana, por meio da autonomia privada e da consequente autorresponsabilidade, bem como da confiança legítima, da qual brota a boa fé; a eticidade, por fim, vem complementar o sustentáculo principiológico que deve delinear os contornos da norma jurídica. - Até o advento da Lei n.º 6.515/77 (Lei do Divórcio), vigeu no Direito brasileiro, como regime legal de bens, o da comunhão universal, no qual o cônjuge sobrevivente não concorre à herança, por já lhe ser conferida meação sobre a totalidade do patrimônio do casal; a partir da vigência da Lei do Divórcio; contudo, regime legal de bens no casamento passou a ser o da comunhão parcial, o que foi referendado pelo art. 1640 do CC/02. - Preserva-se o regime da comunhão parcial de bens, de acordo com o postulado da autodeterminação, ao contemplar o cônjuge sobrevivente com o direito à meação, além da concorrência hereditária sobre os bens comuns, mesmo que haja bens particulares, os quais, em qualquer hipótese, são partilhados apenas entre os descendentes. Recurso especial improvido.
(STJ, REsp 1.117.563-SP, 3. ª T., Rel. Min. Nancy Andrigui, p. 06/04/2010). (grifos meus).
Imperioso também analisar se a concorrência hereditária se dá com filhos comuns ou com filhos exclusivos do autor da herança:
Se for ascendente dos herdeiros descendentes, fica-lhe assegurada sempre a quarta parte da herança. Assim, por exemplo, se concorrer com um filho, a herança serádividia ao meio; se concorre com dois filhos comuns, o cônjuge receberá um terço da herança. Se concorrer com três ou mais filhos comuns, ser-lhe-á assegurada sempre a quarta parte da herança, sendo o restante dividido pelos demais. Esse quinhão do cônjuge será sempre computado conforme o que couber por cabeça (art. 1.835). Assim, o mesmo princípio aplica-se, por exemplo, se o cônjuge concorre somente com netos, descendentes de filhos já pré-mortos. [...]
Se, porém, o cônjuge sobrevivo concorrer com descendentes do morto dos quais o sobrevivo não seja ascendente, não há a reserva da quarta parte, sendo a herança dividia em partes iguais com os que recebem por cabeça. Se, porém, concorrer com descendentes comuns e descendentes apenas do de cujus, há que se entender que se aplica a garantia mínima da quarta parte em favor do cônjuge. [50]
Nos casos em que o cônjuge supérstite concorrer com ascendentes, aplica-se o disposto no artigo 1.837 do Código Civil, ou seja, nas hipóteses em que concorrer com sogro e sogra, será ao cônjuge assegurado um terço da herança, que será, então, dividida em partes iguais.
Existindo apenas o sogro ou a sogra, ou os avós do autor da herança – não importando quantos – ao cônjuge será conferida metade da herança.
Sendo assim, apenas na ausência de total de descendentes ou ascendentes é que a totalidade da herança será destinada ao cônjuge supérstite, conforme elucida o artigo 1.838 do Código Civil.
Não obstante, o artigo 1.831 do Código Civil garante ao cônjuge supérstite o direito real de habitação, que nada mais é do que, permanecer na posse do bem destinado a residência da família, sem observância necessária do regime de bens do casamento.
Mister esclarecer que, imprescindível, que a sociedade conjugal tenha subsistido até o falecimento de um dos cônjuges, para que o outro preserve a qualidade de herdeiro, senão vejamos:
A separação de fato subtrai do viúvo a condição de herdeiro. Admitir a possibilidade de o cônjuge herdar quando o casal já estava separado de fato é perpetuar os efeitos do casamento para depois do seu fim. Não há como assegurar direito hereditário a quem nem mais cônjuge era. Tal afronta princípio ético dos mais elementares, além de gerar o enriquecimento sem causa, pois o ex-cônjuge herdaria o patrimônio amelhado depois da separação. Também fora de propósito deferir a herança ao cônjuge sobrevivente, independentemente do prazo da separação, pelo só fato de não ter sido o responsável pelo rompimento da vida em comum. Estes absurdos consagrados na lei (CC 1.830) perderam significado a partir do momento em que a jurisprudência passou a considerar rompido o casamento quando cessa a convivência. De outro lado, a EC 66/2010, ao acabar com a separação, pôs um ponto final na culpa. Não mais persistindo os deveres do casamento nem o regime de bens, tal subtrai a possibilidade de o sobrevivente ser reconhecido como herdeiro. Nem concorre com os sucessores nem preserva a qualidade de herdeiro. Recebe tão somente a meação dos bens adquiridos durante a constância do casamento, o que não é herança. Nada mais. [51]
4.4 Colaterais
Em último lugar na ordem de vocação hereditária, inciso IV do artigo 1.829, estão os colaterais, que não são qualificados como herdeiros necessários, mas somente como herdeiros legítimos.
São colaterais:
Parentes colaterais são os que a lei assim define (CC 1.592): os provenientes de um tronco comum. Como a limitação do parentesco é até o quarto grau, somente esses desfrutam da qualidade de herdeiros. A ordem de precedência atende à proximidade de graus: os mais próximos excluem os mais remotos. Os irmãos dispõem da condição de herdeiros colaterais de segundo grau. Na falta destes, herdam os de terceiro grau – sobrinhos e tios – e, por último, os de quarto grau – sobrinhos-netos, tios-avós e os chamados primos-irmãos. Ainda que existam vínculos de parentesco mais distantes, os efeitos são meramente sociais, sem relevância jurídica. Parentes não são, e nada herdam. [52]
Portanto, na existência de descendentes, ascendentes ou cônjuge, os colaterais não herdarão. Entretanto, se o autor da herança vivia em união estável, inexistindo descendentes ou ascendentes, haverá concorrência entre o companheiro e os colaterais, conforme exposto pelo artigo 1.790, III, o qual causa ampla discussão na jurisprudência.
Vejamos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. SUCESSÃO DO COMPANHEIRO. CONCORRÊNCIA COM OS COLATERAIS. Em se tratando de matéria sucessória, o legislador tratou de forma diferente os institutos do casamento e da união estável. O companheiro supérstite participa na sucessão do outro com os parentes colaterais sucessíveis, quando o inventariado não deixou descendente ou ascendente. Inteligência do art. 1.790, III, do Código Civil. Agravo de instrumento desprovido. (Agravo de Instrumento Nº 70059080705, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 28/05/2014)
(TJ-RS - AI: 70059080705 RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Data de Julgamento: 28/05/2014, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 03/06/2014). (grifos meus).
INVENTÁRIO. SUCESSÕES. DECISÃO QUE ESTIPULOU A INCIDÊNCIA DO ART. 1.790, INCISO III, DO CÓDIGO CIVIL, COM A DETERMINAÇÃO DE HABILITAÇÃO DOS PARENTES COLATERAIS DO AUTOR DA HERANÇA. EQUÍVOCO EVIDENCIADO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 1.829, INCISO III, E ART. 1.838, AMBOS DO CÓDIGO CIVIL, A FIM DE VEDAR A DISTINÇÃO ENTRE CÔNJUGE E COMPANHEIRA SOBREVIVENTES PARA FINS SUCESSÓRIOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 226, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Com a promulgação da Constituição de 1988 e a elevação da união estável à condição de entidade familiar para conferir-lhe maior proteção do Estado, pode-se falar que a família é gênero, de que são espécies o casamento e a união estável. A distinção aos direitos sucessórios dos companheiros - inciso III do art. 1.790 do Código Civil - viola o princípio constitucional da igualdade, uma vez que confere tratamento desigual àqueles que, casados ou não, mantiveram relação de afeto e companheirismo durante certo período de tempo, inclusive, contribuindo para o desenvolvimento econômico da entidade familiar. Os Tribunais pátrios têm admitido a aplicação do art. 1.829 do Código Civil não só para a cônjuge, mas, também, para a companheira, colocando-as em posição de igualdade na sucessão. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO.
(TJ-SC - AG: 20130579574 SC 2013.057957-4 (Acórdão), Relator: Gilberto Gomes de Oliveira. Data de Julgamento: 11/06/2014, Segunda Câmara de Direito Civil Julgado) (grifos meus).
EMBARGOS INFRINGENTES. UNIÃO ESTÁVEL. SUCESSÃO. COMPANHEIRA SOBREVIVENTE. DIREITO À TOTALIDADE DA HERANÇA. EXCLUSÃO DOS COLATERAIS. INAPLICABILIDADE DO ART. 1.790, INC. III, DO CÓDIGO CIVIL. Tendo a Constituição Federal, em seu art. 226, § 3º, equiparado a união estável ao casamento, o disposto no art. 1.790, III, do Código Civil vigente colide com a norma constitucional prevista, afrontando princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade, resguardados na Carta Constitucional, razão para ser negado vigência ao disposto legal. À união estável são garantidos os mesmos direitos inerentes ao casamento, efeito que se estende ao plano sucessório, mormente no caso em exame onde autora e de cujus viveram more uxório por três décadas, obtendo o reconhecimento judicial desta união como estável aos fins da C. F. Inexistindo descendentes e ascendentes, é da companheira sobrevivente o direito à totalidade da herança, excluindo-se os parentes colaterais. EMBARGOS INFRINGENTES ACOLHIDOS. SUSCITADO INCIDENTE DE RESERVA DE PLENÁRIO. (SEGREDO DE JUSTIÇA). (Embargos Infringentes Nº 70027265545, Quarto Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em 10/07/2009)
(TJ-RS - EI: 70027265545 RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho. Data de Julgamento: 10/07/2009, Quarto Grupo de Câmaras Cíveis, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 25/08/2009) (grifos meus).
Ademais, de forma evidentementeinconstitucional, permite o legislador a distinção entre os quinhões concedidos aos irmãos bilaterais (filhos do mesmo pai e da mesma mãe), caso haja irmãos unilaterais (filhos somente do genitor falecido). Sendo assim, sucedendo colaterais de segundo ou terceiro grau, necessário atentar se tratam-se de irmãos unilaterais ou bilaterais, atingindo tal distinção também os sobrinhos.
Por fim, atenta-se para o fato de o direito de representação só ser assegurado aos colaterais de até terceiro grau. “Assim, somente os sobrinhos podem herdar por representação de seus pais, e isso, se existirem outros tios sobreviventes, irmãos do falecido (CC 1.840). Concorrendo irmãos do de cujuse sobrinhos, os irmãos recebem por cabeça e os sobrinhos por estirpe, em representação dos genitores pré-mortos.”. [53]
5. Direito sucessório do filho havido por inseminação artificial homóloga post mortem
Há até pouco tempo, a paternidade era estabelecida de forma linear, natural, tinha origem em um ato sexual, seguido da concepção e posteriormente nascimento. [54]
Nossa legislação continua baseando-se nesta premissa, uma vez que continua não prevendo todas as formas de reprodução humana medicamente assistidas, determinando que a origem genética não seja mais determinante para definir a filiação.
A revolução que ocorreu no campo da biotecnologia obviamente produziu reflexos nas estruturas familiares, fazendo surgir novas formas de filiação. Tais avanços tecnológicos no campo da reprodução humana enfatizaram o campo da vontade, extinguindo, por assim dizer, o sistema adotado nas presunções de paternidade, maternidade e filiação.
Contudo, o artigo 1.597 do Código Civil insistiu na previsão de que são concebidos na constância do casamento os filhos: “III – havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido; IV – havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga; e V – havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.” (grifos meus).
Percebe-se que o legislador preferiu não ousar na presunção de filiação, limitando-a a hipótese de inseminação artificial.
Em termos gerais, “fecundação artificial”, “concepção artificial” e “inseminação artificial” são as expressões usadas em referência a todas as técnicas de reprodução assistida capazes de gerar uma nova vida, ainda que sem o ato sexual, através de métodos artificiais, científicos ou técnicos.
Na tentativa de substituir a concepção natural, quando há dificuldade ou impossibilidade, de um ou ambos envolvidos, a reprodução assistida é utilizada.
Sendo assim, quando tratar-se de inseminação artificial homóloga a autorização do marido é dispensada.
Em análise ao artigo 1597 do Código Civil temos:
Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:
I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;
II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;
III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;
IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga;
V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido. (grifo meu)
Tal disposição legal tem gerado diversos debates na doutrina e na jurisprudência. Esta autorização em nada está ligada a autorização ou estimulação da inseminação artificial post mortem.
Isso porque, ainda que o cônjuge varão tenha fornecido o sêmem, não há presunção legal quanto ao seu consentimento para a realização da inseminação artificial após a sua morte.
Apenas nos casos em que houver expressa autorização do marido para tal procedimento, é que a inseminação artificial post mortem poderá ser realizada, em consonância com o princípio da autonomia da vontade, estando a utilização do material genético condicionada à autorização expressa para tal fim.
Este é o entendimento emanado também pelo Conselho Federal de Medicina na Resolução 1.358 de 1992, vejamos:
(...) V - CRIOPRESERVAÇÃO DE GAMETAS OU PRÉ-EMBRIÕES
3 - No momento da criopreservação, os cônjuges ou companheiros devem expressar sua vontade, por escrito, quanto ao destino que será dado aos pré-embriões criopreservados, em caso de divórcio, doenças graves ou de falecimento de um deles ou de ambos, e quando desejam doá-los. (...) (grifos meus). [55]. Anexo A.
Ademais, estabelecido que na falta da autorização para tal procedimento, os embriões deverão ser apenas conservados, uma vez que não há a presunção de que o homem queira ser pai após sua morte, estando vedado à viúva a exigência de que a clínica lhe entregue o material genético armazenado para a realização da inseminação artificial.
Pois bem! No que tange então ao direito sucessório, temos que a capacidade para suceder regula-se pela lei vigente ao tempo da abertura da sucessão. Nada há o que afaste, então, o filho concebido por meio de inseminação artificial do direito à sucessão.
Plenamente legitimados aqueles que nascidos ou já concebidos no momento da abertura da sucessão, uma vez que totalmente assegurado em lei os direitos do nascituro a partir do momento da concepção.
Entretanto, o grande embate se dá na seguinte questão, o embrião, fecundado em laboratório, e ainda não implantado no ventre materno, qual seja o embrião pré-implantatório, é sujeito de direito? Tem direito de personalidade e direito à sucessão?
Uma vez que a legislação civil, no Direito de Família, assegura a reprodução assistida post mortem, e no Direito das Sucessões, exige-se o fator "já concebido" para estabelecer a capacidade sucessória, cria-se uma lacuna legislativa, onde aquele que foi concebido após a morte passar a ser preterido ao direito constitucional à herança.
Nas palavras de Maria Berenice Dias:
O tema se encontra longe de estar pacificado. Há quem sustente que a lei, ao falar em “pessoa já concebida”, não distingue o locus da concepção e não impõe que esteja implantado, exigindo apenas e tão somente a concepção. No entanto, outros afirmam que não há como deixar de reconhecer que a concepção a ser protegida é quando o embrião concebido já se encontra implantado no aparelho reprodutor da mãe. Somente a partir desse instante passam a ser resguardados seus direitos potenciais de nascituro. Nascituro significa “o que há de nascer”. Antes da implantação o embrião excedentário não tem qualquer possibilidade de nascer, não sendo razoável considerá-lo como nascituro antes da transferência para o útero materno. Isso seria verdadeira instrumentalização do ser embrionário, agravada na hipótese de eventuais vantagens patrimoniais. [56]
A autora também ressalta que a não há na legislação a proibição da inseminação artificial post mortem, bem como é assegurado na Constituição Federal o tratamento igual entre os filhos, sendo então vedada à legislação infraconstitucional qualquer disposição que restrinja direitos aos concebidos através da inseminação artificial post mortem.
Tais argumentos, somados aos princípios da liberdade e ao direito ao planejamento familiar, contemplado no artigo 226, parágrafo 7 da Constituição Federal de 1988, é que baseiam o direito sucessório daqueles concebidos através da inseminação artificial homóloga post mortem:
A possibilidade de não se reconhecerem direitos à criança concebida mediante fecundação artificial post mortem pune, em última análise, o afeto, a intenção de ter um filho com a pessoa amada, embora eventualmente afastada do convívio terreno. [57]
Sabemos que a legislação encontra-se em descompasso com a realidade, tampouco que há conflitos entre normas jurídicas. O atual código civil não escapou em nenhum desses casos, pois, além de ficar aquém das necessidades sociais em vários aspectos, possui profundas contradições entre seus institutos e ante outras normas, principalmente em relação a CartaMagna.
Há quem defenda que o problema se desfaz com a manifestação de última vontade deixada pelo marido, onde, através do testamento, o testador contempla a prole futura, entretanto, a prática testamentária além de não usual também não é obrigatória em nosso país.
Outrossim, nos casos em que houver a expressa manifestação de vontade do marido de que a inseminação artificial ocorra após sua morte, o filho terá o direito sucessório assegurado.
Ademais, na existência ou não de testamento, havendo o conhecimento de que o autor da herança tenha deixado autorização para utilização de seu material genético após seu falecimento, o inventário deverá preservar bens a favor da possível prole eventual, evitando assim ferir o direito constitucional de herança, bem como, que este herdeiro tenha que pleitear seu quinhão por petição de herança.
Por fim, o filho fruto da inseminação artificial, ainda que não concebido poderá assegurado no testamento, conforme dispõe o artigo 1.799, inciso I do Código Civil, quando seu nascimento acontecer até dois anos após a abertura da sucessão, como prevê o artigo 1.800 do referido diploma legal:
Art. 1.799. Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder:
I - os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão; (...)
Art. 1.800. No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz.
§ 1o Salvo disposição testamentária em contrário, a curatela caberá à pessoa cujo filho o testador esperava ter por herdeiro, e, sucessivamente, às pessoas indicadas no artigo 1.775.
§ 2o Os poderes, deveres e responsabilidades do curador, assim nomeado, regem-se pelas disposições concernentes à curatela dos incapazes, no que couber.
§ 3o Nascendo com vida o herdeiro esperado, ser-lhe-á deferida a sucessão, com os frutos e rendimentos relativos à deixa, a partir da morte do testador.
§ 4o Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador, caberão aos herdeiros legítimos. (grifos meus).
Resta claro que muito há ainda a ser debatido e desenvolvido em relação às questões sucessórias relacionadas acerca deste tema.
Tratam-se de matérias que cumpre ao direito enfrentar, sem dúvida, sempre sobre um prisma interdisciplinar, elencando as soluções escolhidas no campo sucessório com base em uma análise profunda sobre a matéria cientifica, sendo entretanto, indispensável a atenção ao enfoque constitucional, matizado pelos valores supremos da ordem jurídica, como os ideais de dignidade, de igualdade, de segurança e de justiça.
6. Direito Sucessório do Companheiro
Até a promulgação da Constituição de 1988, dúvidas não havia de que o companheiro ou companheira não eram herdeiros. [58]
Assim leciona Sílvio de Salvo Venosa:
A nova Carta reconheceu a união estável do homem e da mulher como entidade a ser protegida (art. 226, § 3º, “devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”). Contudo, em que pesem algumas posições doutrinarias e jurisprudenciais isoladas, tal proteção não atibuiu direito sucessório à companheira ou companheiro. Os tribunais admitiam a divisão do patrimônio adquirido pelo esforço comum dos concubinos (hoje denominados companheiros ou conviventes), a título de liquidação de uma sociedade de fato (Súmula 380 do STF). De qualquer modo, essa divisão podia interferir na partilha de bens hereditários quando, por exemplo, tivesse havido o chamado concubinato impuro ou adulterino e o autor da herança falecesse no estado de casado, com eventual separação de fato. Nessa situação, perdurante até a novel legislação, cabia ao juiz separar os bens adquiridos pelo esforço comum dos pertencentes à meação ou herança do cônjuge. Toda a matéria se resolve na prova.
Quando na se atribuía parte do patrimônio pelo esforço comum, a jurisprudência concedia indenização à concubina, a título de serviços domésticos prestados. Sob essa rotulação há evidente eufemismo, porque se pretende dizer muito mais do que a expressão encerra. Nessa hipótese, também ocorria uma diminuição do acervo hereditário, pois parte era concedida ao companheiro. [59] (grifos meus).
A sucessão do companheiro está prevista no artigo 1.790 do Código Civil, de maneira pouco elucidativa e em local estranho às demais normas sucessórias:
Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança. (grifos meus).
Tal artigo demonstra a total inadequação do tratamento legal do direito sucessório dos companheiros. Em um único artigo, situado nas disposições gerais, e fora da ordem de vocação hereditária o legislador transmite a impressão de que não ousou em qualificar a companheira ou companheiro como herdeiro, esquivando-se, portanto, de possíveis críticas sociais.
Ampla é a discussão na doutrina e jurisprudência acerca da inconstitucionalidade do referido artigo:
A grande novidade trazida pelo Código Civil foi privilegiar não só o cônjuge, mas também o companheiro da união estável com o direito de concorrer à herança, ainda que o falecido tenha herdeiros necessários (descendentes ou ascendentes). Porém de forma absolutamente desarrazoada, o mesmo direito concedido a cônjuges e companheiros tem distinta dimensão e, partindo de pressupostos diversos, chega a resultados diferentes. Este tratamento diferenciado vem sendo duramente questionado pela doutrina, que considera inconstitucional a distinção, por afrontar a igualdade assegurada às entidades familiares (CF 226 § 3.º). (...) Não há fundamento constitucional para a desigualdade de direitos entre dois casais, com famílias constituídas e filhos, pelo fato de um ter escolhido o casamento e o outro a união estável. Alguns tribunais já decidiram pela inconstitucionalidade, mas a posição não é uniforme. [60] (grifos meus).
Leciona Maria Helena Diniz:
Há desigualdade de tratamento sucessório entre cônjuge e convivente sobrevivo, pois aquele é, em certos casos, herdeiro necessário privilegiado, podendo concorrer com descendente, se preencher certas condições, ou com ascendente do falecido. O convivente, não sendo herdeiro necessário, pode ser excluído da herança do outro, se ele dispuser isso em testamento (CC, arts. 1.845, 1.846 e 1.857), pois só tem direito à sua meação quanto aos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável. A relação matrimonial na seara sucessória prevalece sobre a estabelecida pela união estável, pois o convivente sobrevivente, não sendo equiparado constitucionalmente ao cônjuge, não se beneficiará dos mesmos direitos sucessórios outorgados ao cônjuge supérstite, ficando em desvantagem. Não poderia ter tratamento privilegiado, porque a disciplina legal da união estável tem natureza tutelar, visto que a Constituição Federala considera como entidade familiar apenas para fins de proteção estatal, por ser um fato cada vez mais frequente entre nós. Dá-se uma solução humana ao ampara o convivente após o óbito do companheiro, presumindo-se sua colaboração na formação do patrimônio do autor da herança. [61] (grifos meus).
Realmente, não há qualquer justificativa para a lei outorgar tratamento desigual ao viúvo e a quem vivia em união estável com o de cujus. Desde a Constituição Federal não se justifica esta diferenciação, uma vez que a união estável foi reconhecida como entidade familiar juntamente com o casamento (cf 226 par 3). Aliás, a legislação que regulou a norma constitucional não fez taldiferenciação, o que tem levado a doutrina a reconhecer como inconstitucional a discriminação levada a efeito pelo código civil. [62]
Referido artigo, tornou-se até objeto de incidente de arguição de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal de Justiça, que ainda pende de decisão do Relator:
INCIDENTE DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 1.790, INCISOS III E IV DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. UNIÃO ESTÁVEL. SUCESSÃO DO COMPANHEIRO. CONCORRÊNCIA COM PARENTES SUCESSÍVEIS. Preenchidos os requisitos legais e regimentais, cabível o incidente de inconstitucionalidade dos incisos, III e IV, do art. 1790, Código Civil, diante do intenso debate doutrinário e jurisprudencial acercada matéria tratada.
(STJ - AI no REsp: 1135354 PB 2009/0160051-5, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 24/05/2011, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/06/2011). [63]. Anexo B.
E esta vem sendo a posição majoritária da jurisprudência, senão vejamos:
Sucessões. União estável. Companheira. Concorrência com os descendentes. Art. 1.790, I e II, do Código Civil. Sucessão quanto aos bens comuns. Concorrência do cônjuge com descendentes. Art. 1.829, I, CC. Precente do STJ. Eliminação das diferenças entre união estável e casamento sob o regime da comunhão parcial. De acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no REsp 1117563/SP, a concorrência do cônjuge sobrevivente, casado sob o regime de comunhão parcial de bens, com os descendentes do autor da herança (art. 1.829, I, do CC) deve ocorrer em relação aos bens comuns do casal e não em relação aos particulares do falecido, como se dá com o companheiro, nos termos do art. 1.790, incisos I e II, do CC. A adoção dessa linha de pensamento põe fim à argumentação quanto à inconstitucionalidade do art. 1.790, incisos I e II, do CC, pois elimina as diferenças sucessórias decorrentes da opção entre a união estável e o casamento sob o regime da comunhão parcial de bens. V. V. Direito Processual Civil. Apelação. Ilegitimidade ativa configurada. Extinção do processo. Recurso prejudicado. Quando do requerimento de alvará judicial para levantamento de saldos bancários de falecido, a apelante não possuía vínculo matrimonial ou decorrente de união estável judicialmente reconhecida, restando configurada, portanto, sua ilegitimidade ativa. (TJMG, AC 1.0024.07.587262-2/001, 4º C. Cív. Rel. Des. Ana Paula Caixeta, j. 26/02/2014). (grifos meus).
(...) O art.1.7900 doCódigo Civil de 20022, norma que inovou o regime sucessório dos conviventes em união estável, tem despertado realmente debates doutrinário e jurisprudencial de substancial envergadura. É de Francisco José Cahali, por exemplo, a assertiva de que "a nova lei força caminho na contramão da evolução doutrinária, legislativa e jurisprudencial elaborada à luz da Constituição Federal de 1988" e que "houve um reprovável retrocesso, privando os partícipes da união estável de várias conquistas alcançadas com muito esforço da sociedade" (CAHALI, Francisco José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil, volume 6: direito das sucessões. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 228). No mesmo sentido se manifestou Zeno Veloso, para quem o "art. 1.790 merece censura e crítica severa porque é deficiente e falho, em substância. Significa um retrocesso evidente, representa um verdadeiro equívoco" , concluindo ao final que "a discrepância entre a posição sucessória do cônjuge supérstite e a do companheiro sobrevivente, além de contrariar o sentimento e as aspirações sociais, fere e maltrata, na letra e no espírito, os fundamentos constitucionais", (Do direito sucessório dos companheiros. In. Direito de família e o novo Código Civil. Coordenação: Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira. 4ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2006). (STJ, AI no REsp nº 1135354-PB, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, pub. 02/06/2011). (grifos meus).
Contudo, enquanto tal questão não assume posicionamento pacificado, temos que ao companheiro é garantido o direito de concorrência apenas sobre os bens adquiridos onerosamente na duração da união estável, a fim de que este seja amparado nas situações em que o falecido tenha deixado herdeiros necessários, uma vez que haverá patrimônio a ele destinado.
Ademais, o artigo 1.725 do Código Civil permite a regulação contratual das relações patrimoniais na união estável. Não havendo referido documento, serão aplicadas, no que couber, as regras da comunhão parcial de bens.
Pois bem: havendo contrato na união estável que adote outro sistema patrimonial, é de perguntar se esse regime terá repercussão no direito sucessório. O legislador deveria ter previsto a hipótese, mas, perante sua omissão, a resposta deverá ser negativa. Não há que se levar em conta que o contrato escrito entre os conviventes tenha o mesmo valor jurídico de um pacto antenupcial, o qual obrigatoriamente segue regras estabelecidas de forma e de registro. Desse modo, consoante os termos peremptórios do caput do art. 1.790, o convivente somente poderá ser aquinhoado com patrimônio mais amplo do que aquele ali definido por meio de testamento. O contrato escrito que define eventual regime patrimonial entre os companheiros não pode substituir o testamento. [64] (grifos meus).
Portanto, em primeiro lugar, necessário é entender qual o conteúdo da sucessão na união estável. Como já exposto anteriormente, o companheiro supérstite só receberá os bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, sendo primordial, no caso concreto, que fique estabelecido quais bens serão inseridos na sucessão e quais serão dela excluídos.
Neste diapasão, leciona Venosa:
Outro ponto que deve chamar a atenção diz respeito ao desfazimento da sociedade de fato que ocorre com a morte de um dos companheiros. Aliás, a mesma situação opera-se no caso de rompimento da união estável em vida. Existe entre eles também uma meação decorrente dessa sociedade de fato. Aqui, sim, tal como no casamento, o convivente sobrevivente terá direito à metade dos bens adquiridos na constância da convivência, além da quota ou porção hereditária que é definida nos incisos do art. 1.790. De outra forma, não haveria como se entender a referencia quanto à concorrência e se romperia o sistema criado jurisprudencialmente que veio a desaguar na aplicação analógica do regime de comunhão parcial para os conviventes. Portanto, morto um dos conviventes, o sobrevivente terá direito, além da meação, também à porção hereditária. Aplicando-se, no que couber, o regime da comunhão parcial, há de se recorrer ao art. 1660 para definir quais os bens que se comunicam na união estável, embora o art. 1.790 se refira apenas à comunicação dos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável. Abre-se aqui, como se percebe, mais um ponto de discussão tendo em vista a má redação legal. [65] (grifos meus).
O caminho encontrado pela doutrina foi então a interpretação extensiva dos incisos III e IV, fazendo crer que a lei refere-se à integralidade do patrimônio deixado pelo companheiro falecido, sendo o referido patrimônio conquistado a qualquer tempo e título.
“Esta é a forma de assegurar ao companheiro um terço da herança se existirem ascendentes ou parentes colaterais até o quarto grau. O restante vai para os pais, avós, irmãos, sobrinhos, sobrinhos-netos, tios-avós ou primos.” [66]
Este é o entendimento emanado também pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, senão vejamos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - COMPANHEIRA - Sucessão que será regida pelo disposto nos artigos 1725, 1790 e 1829, IV, do Código Civil, concorrendo à companheira com os colaterais - Legislador constituinte que ainda não equiparou a união estável ao casamento, para efeitos sucessórios. - AGRAVO DESPROVIDO.
(TJ-SP - AI: 02545487420128260000 - SP - 0254548-74.2012.8.26.0000, Relator: Ramon Mateo Júnior. Data de Julgamento: 04/09/2013, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 04/09/2013). (grifos meus). [67]. Anexo C.
Note-se, contudo, que no concubinato impuro,

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