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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA CAMPUS PARICARANA JOSÉ VITOR GUERRA ALMEIDA ADMINISTRAÇÃO DIALÓGICA BOA VISTA – RR 2018 JOSÉ VITOR GUERRA ALMEIDA ADMINISTRAÇÃO DIALÓGICA Trabalho acadêmico apresentado como requisito para obtenção de nota da disciplina Direito Administrativo I do curso de Bacharelado em Direito pela UFRR. Prof.: André Paulo dos Santos Pereira BOA VISTA – RR 2018 INTRODUÇÃO O Direito é, dos ramos da ciência, um dos mais mutáveis, presente nas fileiras da ciência formada aos moldes da realidade social onde se aplica. A renovação, a mutação e a reformulação são integrantes dos hábitos corriqueiros no trato da disciplina. Por isso, é incabível no ordenamento jurídico corrente que a administração pública seja regida por um direito imaleável. Em sua própria natureza conceitual, o direito existe em razão dos homens, compartilhando com eles sua mutabilidade. Dessa forma, com a sua característica inata de adaptação, o direito produzido necessita manter-se eficaz dentro da esfera social em que está inserido, satisfazendo o interesse do povo, quando se trata de um regime democrático. O Direito Administrativo não pode subsistir de forma diversa nesses aspectos, sendo este um dos ramos do direito onde ocorre a maior interação com o fator humano da sociedade. A relação individual da administração com o administrado requer que ambos estejam inseridos no mesmo contexto sócio jurídico, a fim de excluir práticas não mais admissíveis devido a alterações na realidade cultural e costumeira dos administrados. À medida que transcorre o tempo e evoluem as relações humanas, as antigas práticas se veem ultrapassadas e o desuso torna as normas ineficazes, obrigando até mesmo este ramo a seguir o progresso. Mesmo em meio a tanta modernidade, a Administração Pública ainda é uma figura distante do cidadão comum, como uma sombra imperial sobre o administrado, que incessantemente busca dialogar com o administrador. Em virtude da democracia brasileira se auto afirmar participativa, o posicionamento indiferente da administração pública frente aos protestos dos administrados é inadmissível. Portanto, o antigo e ultrapassado unilateralismo no Direito Administrativo como forma de manutenção e imposição do poder público absoluto é repulsivo ao mundo jurídico. REFLEXOS HISTÓRICOS NO SURGIMENTO DA ADMINISTRAÇÃO Em busca de um aprimoramento na compreensão das pragmáticas a serem abordadas, faz-se necessária a inspeção retrospectiva das origens do Direito Administrativo. Embora historiografia seja dúbia, a porção majoritária das referências apontam para 1800, quando editada a Lei do 28 pluviose do ano VIII, que proporcionou uma regulamentação jurídica à administração. As revoluções liberais e lutas burguesas decerto foram de suma importância para moldar o Direito Administrativo, como, por exemplo, a Revolução Inglesa que cuidou de cercear o poder monárquico através do engrandecimento do parlamento, o que se tornou um legado para melhor desenvolver o Poder Legislativo. Ou, ainda, a Revolução Estadunidense com seu equilíbrio de poderes e atribuição de controle de constitucionalidade ao Judiciário. A Revolução Francesa, por sua vez, a fim de libertar a Administração do arbítrio (como fora antes), numa concepção extrema de independência dos poderes, dotou-a de “poder de império”, com autotutela e plena executoriedade dos atos administrativos, excluindo totalmente do plano de decisão o cidadão. Esse modelo excluiu a prerrogativa do Judiciário de controle de legalidade, privando-a ao Executivo. Assim como as lutas renderam melhorias na administração, que foram prontamente absorvidas pelo Direito Administrativo, os vícios delas resultantes também o foram. Paradoxalmente, a Administração Pública francesa foi embebida com institutos dos regimes monárquico-absolutistas, como o Etat gendarme (Estado de Polícia), que se tornou um sinônimo de arbítrio. Do Etat gendarme advinha dominium eminens, o poder monárquico de dispor das coisas do súdito, e potesta eminens, o direito do monarca sobre as pessoas e suas liberdades. Esse poder ilimitado do governante é uma clara distorção do ideal de que a vontade do príncipe é a vontade do povo, de forma que, se o interesse público é máximo, então o monarca é incontestável. É possível até mesmo fazer um liame contemporâneo, já que a Administração tem como escopo a Supremacia do Interesse Público, e através disso pode se mascarar a arbitrariedade dos atos administrativos. A falência dessa sistemática ultrapassada é iminente em qualquer lugar do globo onde se cultive a democracia, pois o protagonismo nesse domo é crescente, bem como a afirmação do constitucionalismo. Se a participação é um pressuposto democrático de uma nação, o cidadão deve ser consultado sobre quaisquer decisões. Então, o motivo da falência do unilateralismo é uma das bases da Administração Dialógica: o protagonismo. A ADMINISTRAÇÃO DIALÓGICA E SUA CRESCENTE APLICAÇÃO O cidadão, na visão antropocêntrica do sistema jurídico, é o elemento humano inserido na abstração jurídica chamado Estado Democrático de Direito, devendo respeitar-se o pluralismo político, os seus devidos direitos e a livre manifestação de pensamento ideológico. Para que isso se concretize, pressupõe-se que a Administração deve, através do consensualismo, possibilitar a manifestação do administrado. Essa é a Administração Dialógica, aquela marcada por diálogo entre os sujeitos, sem que o poder verta de forma unilateral. Para Rafael Maffini, o diálogo prévio deve ser uma condição absoluta para a atuação administrativa. Pode-se citar como exemplo de administração dialógica aplicada a Lei 10.257/2001 no seu seguinte artigo: “Art. 43. Para garantir a gestão democrática da cidade, deverão ser utilizados, entre outros, os seguintes instrumentos: I – órgãos colegiados de política urbana, nos níveis nacional, estadual e municipal; II – debates, audiências e consultas públicas; III – conferências sobre assuntos de interesse urbano, nos níveis nacional, estadual e municipal; IV – iniciativa popular de projeto de lei e de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;” Como bem visto nesse artigo, a interlocução é importante ferramenta para expandir a eficiência administrativa, a chamada Boa Administração Pública. O Poder Público tem obrigação de ouvir o cidadão quando interferir em seus direitos e prerrogativas, sob pena de nulidade do ato. De acordo com o que foi dito anteriormente, a Administração Dialógica também tem como base a afirmação do constitucionalismo, pois a interlocução entre administrador e administrado fomenta o cumprimento de princípios constitucionais, como direito de contraditório, respeito à cidadania, dignidade da pessoa humana e ao pluralismo político, acesso ao Poder Judiciário, concessão de habeas data e participação na gestão pública em geral. Segue-se assim, os passos retratados por Robert Dahl em seus estudos sobre Poliarquia, para democratizar-se a democracia. Quanto maior a participação do cidadão na vida pública, mas se fará jus ao Estado Democrático de Direito. Por tudo isso, a Administração Dialógica não é apenas uma melhoria a ser buscada, como ideal que se persegue. É obrigatória, como comanda a nossa Constituição Federal, e cogente é a sua implementação, para a eficaz e justa prática dos atos administrativos junto à comunidade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005. BONAVIDES, Paulo. Teoria Constitucional da Democracia Participativa. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003. LIMA, Raimundo Marcio Ribeiro. Administração Pública Dialógica. 1ª ed. São Paulo: Juruá. 2013. MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016. VALLE, João Paulo Lawall. Administração Monológica e Administração Dialógica. Ebeji, 2017.