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Kassia Motter Pinheiro A Bigamia frente ao atual contexto social brasilerio

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CENTRO DE ENSINO SÃO LUCAS 
FACULDADE SÃO LUCAS 
CURSO DE DIREITO 
 
 
 
KASSIA MOTTER PINHEIRO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A BIGAMIA FRENTE AO ATUAL CONTEXTO SOCIAL BRASILEIRO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Porto Velho – RO 
2016 
2 
 
KASSIA MOTTER PINHEIRO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A BIGAMIA FRENTE AO ATUAL CONTEXTO SOCIAL BRASILEIRO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Artigo apresentado no Curso de 
graduação em Direito do Centro de 
Ensino São Lucas 2016, como requisito 
parcial para obtenção do título de 
bacharel. 
 
 
Orientador: Prof. Me. Ângelo Luiz Santos 
de Carvalho. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Porto Velho 
2016 
3 
 
KASSIA MOTTER PINHEIRO 
 
A BIGAMIA FRENTE AO ATUAL CONTEXTO SOCIAL BRASILEIRO 
 
 
 
 
 
 
Artigo apresentado à Banca Examinadora 
da Centro de Ensino São Lucas, como 
requisito de aprovação para obtenção do 
Título de Bacharel em Direito. 
 
 
 
 
Data: ______/_______/________ 
 
Resultado: __________________ 
 
 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
 
 
 
____________________________ Nome da Instituição 
Titulação e Nome 
 
 
 
 
 
____________________________ Nome da Instituição 
Titulação e Nome 
 
 
 
 
 
 
____________________________ Nome da Instituição 
Titulação e Nome 
 
 
 
 
4 
 
O CRIME DE BIGAMIA FRENTE AO ATUAL CONTEXTO SOCIAL BRASILEIRO1 
 
 
Kássia Motter Pinheiro2 
 
 
RESUMO: O trabalho em voga apresenta uma pesquisa no que diz respeito ao crime de bigamia e a 
ausência de punibilidade para os casos de pessoas que contraem casamento em outras modalidades 
existentes na sociedade atual que não o casamento civil, como cerimônia religiosa e a união estável, 
ferindo diretamente a Constituição Federal, bem como o princípio da isonomia e da dignidade da 
pessoa humana. Busca ainda, trazer uma breve explanação quanto ao atual posicionamento da 
doutrina e da jurisprudência sobre o casamento e a família. Ainda, buscou-se a exposição do 
esvaziamento do presente tipo penal, quando confrontado com o Código Civil e a própria Constituição 
Federal vigente, principalmente se ao trazermos à baila princípios existentes na Carta Magna, tem-se 
que a utilização do Direito Penal deverá ser “ultima ratio” para a punição do delito. Por fim, conclui-se 
que para a bigamia, diante de diversas transformações sociais, culturais e jurídicas, surgiu a 
possibilidade de revogação do referido delito, assim como ocorreu no passado com o adultério. 
 
Palavras-Chave: Bigamia. Família. Casamento. Isonomia. Ultima Ratio. 
 
 
ABSTRACT: The work in vogue presents a research with regard to bigamy crime and the absence of 
criminal liability for cases of people who contract marriage in other existing arrangements in today's 
society than civil marriage as a religious ceremony and stable , wounding directly to the Federal 
Constitution, and the principle of equality and human dignity. Search also bring a brief explanation as 
to the current position of the doctrine and jurisprudence on marriage and family. Still, we sought to 
exposure emptying of this criminal offense, when faced with the Civil Code and the very current 
Federal Constitution, mainly by bringing into question existing principles in the Constitution, it follows 
that the use of criminal law should be "ultima ratio" for the punishment of crime. Finally, it is concluded 
that for bigamy in front of various social, cultural and legal changes, the possibility arose of the said 
offense revocation, as occurred in the past with adultery. 
 
Keywords: Bigamy. Family. Marriage. Equality. Ultima Ratio. 
 
 
INTRODUÇÃO 
O Estado Brasileiro, assim como outros países ocidentais, adotou o princípio 
da monogamia, isto porque, nossa sociedade pauta-se nas relações singulares, por 
entender que só poderá haver entre mútua no relacionamento neste tipo de 
relacionamento, não permitindo a existência simultânea de dois ou mais vínculos 
afetivos em concomitância. 
Segundo o direito brasileiro só restará ocorrida a bigamia quando uma 
pessoa casada sob os ditames da lei civil contrai novo casamento sob a submissão 
 
1 1 Artigo apresentado no curso de graduação em Direito da Faculdade São Lucas como requisito parcial para 
conclusão do curso, sob orientação do professor. Me. Ângelo Luiz Santos de Carvalho E-mail 
als.carvalho@hotmail.com 
2 Acadêmica do 9º período do curso de Direito, do Centro de Ensino São Lucas - TCC II – 2016.2. 
5 
 
dos trâmites do matrimônio anterior, sabendo ser o primeiro ainda válida, ou seja, só 
se considera praticado o crime de bigamia na hipótese de ambos os matrimônios 
contraídos forem válidos no mesmo lapso temporal. 
Tal compreensão faz-se necessária diante da falsa ideia de que basta o 
relacionamento em poligamia para que o indivíduo seja penalizado pela prática do 
crime de bigamia, entendimento errôneo e em contrariedade ao adotado pela 
doutrina e jurisprudência. Ademais, oportuno registrar que o casamento religioso ou 
a simples união estável não tem o poder de garantir a imputação do crime 
supracitado a um determinado indivíduo que mantem dois relacionamentos 
conjugais ao mesmo tempo. 
Analisando nosso contexto histórico, há de se apontar que o legislador de 
1940, ano da elaboração do Código Penal Brasileiro, vislumbrava a proteção jurídica 
à família, preservando a aduzida instituição, impedindo que a referida sociedade 
conjugal falisse diante de fatos alheios, contribuindo imoralmente para o 
encerramento da união familiar. 
Todavia, não obstante a pretendida proteção do legislador, há de se registrar 
que diante das intensas mudanças ocorridas no mundo moderno, atualmente 
vivenciamos um forte desuso da punição do referido crime, isto porque, para muitos, 
sua proibição tem-se tornado incompatível com uma sociedade totalmente avessa a 
todo tipo de preconceitos, dentre os quais inclui-se a possibilidade de múltiplos 
relacionamento. 
É incontroversa que a formação cultural brasileira tem como um dos 
fundamentos a monogamia, diferente de outros países do oriente. Todavia, a nova 
realidade social vem demonstrando o aumento de famílias originadas de 
comportamentos de poligâmia, mesmo diante do convívio de olhares 
preconceituosos surgidos de alguns segmentos religiosos, não podemos deixar de 
entender que se trata de um novo momento social, logo, a fim de se adaptar à nova 
realidade, mesmo que muitos discordem do referido comportamento, adotado por 
parcela mínima da sociedade, há de se desprender de velhas tradições, mas sem 
ficar de olhos fechados para essa nova realidade. 
Ainda, não podemos esquecer que o preâmbulo da Constituição Federal 
defende uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na 
harmonia social. 
6 
 
Por fim, oportuno trazer à baila a contradição estabelecida em um Estado 
que defende uma união estável em concomitância com o casamento civil, com a 
efetivação dos direitos adquiridos com a concepção da nova família diversa daquela 
estabelecida com a reverência dos ditames legais, e ao mesmo tempo sustentar a 
bigamia como ilícito penal. Ao debruçarmos sobre o referido tema, analisaremos o 
seu objetivo, bem como o seu reflexo na sociedade brasileira, o posicionamento 
doutrinário a respeito e como a jurisprudência vem aplicando aos casos concretos. 
 
1. A FAMÍLIA NO DIREITO BRASILEIRO 
“Família! Família! Papai, mamãe, titia. Família! Família! Almoça junto todo 
dia. Nunca perde essa mania”. Estes são os versos da canção “Família”, de autoria 
dos compositores brasileiros Arnaldo Antunes e Tony Bellotto,trazendo a ideia 
tradicional do que vem a ser família, ou seja, aquela constituída por pai, mãe, filhos 
e outros indivíduos que se agregam a ela. 
Entre os gregos, família era fundamentalmente (1) um grupo de pessoas que 
se reunia pela manhã e ao cair da tarde em um lar para a realização do culto aos 
sues deuses e (2) os cônjuges e seus descendentes. 
Arnoldo Wald3, no livro “O novo direito de família” observa que, em Roma, o 
conceito de família, independia da consanguinidade, pois se tratava a família de uma 
unidade econômica, política, religiosa e jurisdicional. Posteriormente, a expressão 
“família” também passou a designar: a) o grupo de pessoas ligadas entre si por 
consanguinidade; e b) o núcleo constituído pelo casamento, do qual não resultou 
prole. 
Como se observa nos parágrafos anteriores, o conceito de família não pode 
ser definido unicamente pela ideia do núcleo constituído pelo casamento. Em 
verdade, a referida ideia foi constituída pelo direito canônico ao buscar vincular o 
conceito de família ao de casamento, este entendido como um indissolúvel 
sacramento. 
No direito brasileiro atual, a expressão “família”, na acepção jurídica da 
palavra, não se limita à noção religiosa, isto porque, a referida instituição, segundo a 
lei, é aquela entidade constituída: a) pelo casamento civil entre o homem e a mulher; 
 
3 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. São Paulo: Saraiva, 2000. 
7 
 
b) pela união estável entre o homem e a mulher; e c) pela relação monoparental 
entre o ascendente e qualquer de seus descendentes. 
A família do século 20, advinda do conceito estabelecido no Código Civil de 
1916 era uma família onde a regra de “até que a morte nos separe” dominava, 
admitindo-se, inclusive, o sacrifício até mesmo da felicidade em prol dos seus 
membros, objetivando assim a manutenção do vínculo matrimonial. Aqui vislumbra-
se claramente uma família patriarcal, heteroparental, hierarquizada, biológica, mas 
ainda com as raízes estabelecida em tempos anteriores de ser a família uma 
unidade de produção, com fortes laços patrimoniais, ou seja, os indivíduos 
formavam sua própria família com forte objetivo de constituir patrimônio e o posterior 
repasse aos herdeiros, não sendo de grande relevância os laços afetivos, razão pela 
qual a dificuldade em dissolver tal sociedade, uma vez que esta representaria a 
divisão do próprio patrimônio. 
Após a vigência da Constituição de 1988, fundamentada em valores sociais 
e humanizados, em especial a dignidade da pessoa humana, bem como as 
mudanças introduzidas com o advento do Código Civil de 2002, a família ganhou 
nova estrutura, passando a ser plural, igualitária substancialmente, democrática, 
hetero ou homoparental, sócio-afetiva ou biológica. 
Importante evolução desse conceito de família está na decisão emanada do 
Supremo Tribunal Federal pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo 
Lewandowski, acompanhando o voto do relator ministro Ayres Britto, julgando 
procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4477 e a Arguição de 
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, também convertida em ADI, 
estendendo o conceito de “família” às relações homoafetivas estáveis. 
Pelas ideias até agora expostas, denota-se que a partir da Constituição 
Federal de 1988, a instituição família passou a ser analisada sob um nova ótica, 
admitindo-se a pluralização da entidade familiar e não mais somente um ambiente 
formado pelos preceitos estabelecidos na legislação. O meio utilizado para a 
constituição da família, agora, é assunto de natureza pessoal, resguardando o direito 
do indivíduo dispor de si mesmo, todavia, o casamento, por sua vez, é algo 
umbilicalmente ligado às formalidades da legislação civil. 
 
2. DOS CRIMES CONTRA A FAMÍLIA 
8 
 
Em seu art. 226, a Constituição Federal de 1988 garantiu à família especial 
proteção do Estado, em virtude de ser considerada como base da sociedade, 
independentemente de sua origem. Segundo, Jaques de Camargo Penteado, 
tratam-na como bem jurídico com perfil nitidamente comunitário e imprescindível ao 
desenvolvimento humano4. Ainda, o mesmo autor continua: 
A elevada valoração da família justifica que os principais 
elementos de sua composição e dinâmica mereçam proteção jurídico-penal 
e, assim, os bens e interesses tratados pelos direitos dos povos e 
agasalhados nas suas constituições recebem tratamento criminal com o fito 
de, empregada a sanção punitiva, estimular-se o comportamento humano 
compatível com o respeito daqueles valores5. 
O alcance do texto constitucional supracitado faz com que os demais ramos 
do Direito não fiquem alheios a tal determinados, dentre o qual inclui-se o Direito 
Penal, fazendo com que o referido ramo jurídico, com normas incriminadoras e não 
incriminadoras, auxilie na preservação das famílias, matrimonial e extramatrimonial. 
A partir deste momento do estudo, será realizada uma explanação sobre os 
crimes contra a família, especificamente quanto ao crime de bigamia, diante deste 
ser o principal foco de discussão do presente artigo. 
 
2.1. Do Crime de Bigamia 
De Plácido e Silva6 apresenta a bigamia como sendo a derivação “do latim 
bigamus, por sua vez originado do grego gamos, anteposto de bi (repetição), que 
significa o estado da pessoa que se casou duas vezes”. 
Na história brasileira, o reconhecimento da bigamia como crime vem desde 
as ordenações Filipinas, especificamente em seu Livro V, Título XIX, ao determinar 
que: "Todo homem que sendo casado e recebido uma mulher, e não sendo o 
matrimônio julgado por inválido per juízo da Igreja, se com outra casar, morra por 
isso, dando em seguida, igual tratamento ao ato praticado por mulher". 
O Código Penal do Império em 1830, o Código Penal Republicano de 1890 
também normatizaram o crime de bigamia, todavia denominando-o de polygmia, 
sendo o crime configurado se o indivíduo contrair casamento mais de uma vez sem 
 
4 PENTEADO, Jaques de Camargo. A família e a justiça penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, pag. 31. 
5 PENTEADO, Jaques de Camargo. A família e a justiça penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, pag. 32. 
6 Silva, De Plácido e (1892-1964), Vocabulário Jurídico Conciso. Atualizadores Nagib Slaibi Filho e Priscila 
Pereira Vasques Gomes. 3. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 106. 
9 
 
que haja a dissolução do anterior por quaisquer das hipóteses estabelecidas pela 
legislação civil à época ou mesmo a morte de um dos cônjuges. 
Por último, o atual Código Penal, resolveu estabelecer o crime de bigamia 
em seu art. 235. Vejamos: 
Art. 235 - Contrair alguém, sendo casado, novo casamento: 
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. 
§ 1º - Aquele que, não sendo casado, contrai casamento com 
pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é punido com reclusão ou 
detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. 
§ 2º - Anulado por qualquer motivo o primeiro casamento, ou o 
outro por motivo que não a bigamia, considera-se inexistente o crime. 
 
Conforme já exposto em linhas pretéritas do referido artigo, o crime de 
bigamia só restará caracterizado na hipótese de o indivíduo casado segundo os 
ditames da legislação civil, com as devidas habilitações prévias, contrai um novo 
matrimônio nos mesmos moldes do anterior, mesmo ciente do impedimento que lhe 
acomete, diante da validade do casamento anterior sem que houvesse qualquer 
dissolução deste. 
O entendimento supramencionado torna-se importando na medida em que 
procura demonstrar que para a consumação do crime de bigamia faz-se necessário 
um efetivo dano ao matrimônio, não sendo considerado que o indivíduocom 
relacionamento poligâmico também pratica o mesmo crime, tese inadmissível no 
atual ordenamento jurídico. 
Oportuno assentir que, conforme já exposto alhures, o casamento religioso e 
a união estável não são suficientes para a caracterização do crime de bigamia, isto 
porque, não obstante a existência de diversas relações nessas condições, inclusive 
com efeitos na órbita civil, o mesmo não se pode falar para a configuração do crime 
em comento, isto porque aquelas não têm valor legal para incriminar um agente que 
mantém várias relações de forma concomitante. 
 
2.2. Classificação Doutrinária do Crime de Bigamia 
Segundo Cezar Roberto Bitencourt (2010:205), “o bem jurídico protegido é o 
interesse do Estado em proteger a organização jurídica matrimonial, consistente no 
princípio monogâmico, que é adotado, como regra, nos países ocidentais”. Logo, 
10 
 
segundo o ilustre doutrinador, o principal ofendido do crime em epígrafe é a própria 
família e a ordem jurídica matrimonial. 
Inclusive, em seu art. 1.521, VI, o Código Civil de 2002 previu a 
impossibilidade de contrair casamento civil as pessoas que já forem casadas, razão 
pela qual, o Código Penal tipificou como crime a conduta do indivíduo que, mesmo 
na condição de casado, contrai novo casamento, objetivando em primazia a 
proteção à instituição do casamento e a família dele decorrente. 
Não há o que se falar em proteção à fidelidade conjugal, mas a própria 
instituição familiar, até mesmo porque, após a revogação do art. 240 do Código 
Penal, por meio da Lei 11.106/2004, ao abolir do nosso ordenamento jurídico o 
crime de adultério, o Estado deixou de conceder tal proteção à fidelidade. Vejamos: 
CÓDIGO PENAL 
Adultério (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005) 
Art. 240 - Cometer adultério: (Revogado pela Lei nº 11.106, de 
2005) 
Pena - detenção, de quinze dias a seis meses. (Revogado pela 
Lei nº 11.106, de 2005) 
§ 1º - Incorre na mesma pena o co-réu. (Revogado pela Lei nº 
11.106, de 2005) 
§ 2º - A ação penal somente pode ser intentada pelo cônjuge 
ofendido, e dentro de 1 (um) mês após o conhecimento do fato. 
(Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005) 
§ 3º - A ação penal não pode ser intentada: (Revogado pela 
Lei nº 11.106, de 2005) 
I - pelo cônjuge desquitado; (Revogado pela Lei nº 11.106, de 
2005) 
II - pelo cônjuge que consentiu no adultério ou o perdoou, 
expressa ou tacitamente.(Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005) 
§ 4º - O juiz pode deixar de aplicar a pena: (Revogado pela Lei 
nº 11.106, de 2005) 
I - se havia cessado a vida em comum dos cônjuges;(Revogado 
pela Lei nº 11.106, de 2005) 
II - se o querelante havia praticado qualquer dos atos previstos no 
art. 317 do Código Civil. (Vide Lei nº 3.071, de 1916) (Revogado 
pela Lei nº 11.106, de 2005) 
 
LEI Nº 11.106, DE 28 DE MARÇO DE 2005. 
Art. 5º. Ficam revogados os incisos VII e VIII do art. 107, os arts. 
217, 219, 220, 221, 222, o inciso III do caput do art. 226, o § 3o do art. 231 
e o art. 240 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código 
Penal. 
Como se observa dos textos legais supracitados, a própria legislação, 
adaptando-se ao atual contexto social já vem buscando abolir aqueles delitos que 
11 
 
podem ser resolvidos por outras esferas do direito e o mesmo caminho há o de ser 
percorrido quanto ao crime de bigamia. 
A previsão do art. 235 do Código Penal expõe que a conduta típica do crime 
abordado é o “contrair matrimônio” já sendo o indivíduo casado, mesmo ciente da 
total vigência do casamento anterior. Ressalte-se que para a comprovação da 
ausência de impedimento para o matrimônio não basta a presunção da morte ou de 
possível anulação do casamento anterior, faz-se necessário que tais declarações 
estejam munidas das respectivas provas, principalmente diante do declarado estado 
de solteiro por ocasião do segundo casamento. Comportamento contrário a esse 
estaria configurada a inequívoca conduta dolosa do agente. 
Assim, bata a vigência de um casamento civil, não sendo discutido a sua 
validade, para possibilitar a imputação do crime de bigamia ao indivíduo, não 
havendo o que se falar na sua aplicação quando o casamento anterior não existe no 
mundo jurídico o até mesmo quando a declaração de sua existência foi realizada por 
autoridade incompetente. Ainda, não há crime quando declarado anulado ou nulo o 
casamento anterior ou posterior, por razões diversas da bigamia, conforme 
inteligência do art. 235, §2º do Código Penal. 
O sujeito ativo do crime de bigamia é a pessoa que mesmo casada, contrai 
novo matrimônio, ou, ainda que solteira, divorciada ou viúva, contrai casamento com 
o pessoa que sabe ser casada. 
Segundo o entendimento de Luiz Régis Prado7, as testemunhas que 
afirmam a existência de impedimento, sabendo que um dos nubentes é pessoa já 
casada, respondem como partícipes. 
Em sentido contrário, Mirabete lembra a seguinte jurisprudência: 
“Não havendo colaboração das testemunhas para a realização do 
tipo penal, em uma execução tal como a contida na descrição legal, não há 
falar em responsabilidade criminal pelo delito de bigamia. Nessa hipótese 
haveria colaboração nos atos preparatórios, sendo possível reconhecer 
apenas um crime de falsidade ideológica (RT 352/61, 526/334). Esse 
fundamento, todavia, é improcedente; quem participa conscientemente do 
ato preparatório responde pelo crime afinal tentado ou consumado (arts. 13, 
29 e 30).” 
O sujeito passivo primeiro é o Estado e de forma secundária, o nubente do 
casamento válido, bem como o contraente do segundo, desde este o contraia de 
boa-fé. Há de se assentir que a teor do art. 235, §1º do Código Penal, a pessoa 
 
7 Curso de direito penal brasileiro: parte especial, p. 437. 
12 
 
solteira, viúva, divorciada que mesmo ciente da condição de casada de determinada 
pessoa com este contrai matrimônio, tem a pena mais leve, diante da figura especial 
prevista pelo legislador. Vejamos: 
Art. 235 - Contrair alguém, sendo casado, novo casamento: 
Pena - reclusão, de dois a seis anos. 
§ 1º - Aquele que, não sendo casado, contrai casamento com 
pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é punido com reclusão ou 
detenção, de um a três anos. (g.n.) 
§ 2º - Anulado por qualquer motivo o primeiro casamento, ou o 
outro por motivo que não a bigamia, considera-se inexistente o crime. 
No que diz respeito ao tipo subjetivo do crime em apreço, tem-se 
inequivocadamente a existência do dolo, direito ou eventual, configurado na vontade 
livre e consciente de contrair novo matrimônio, mesmo ciente da existência do 
impedimento ocasionado em virtude de casamento anterior válido, o que o 
impossibilitaria a realizar tal feito. Registre-se a necessidade da ciência do indivíduo 
do referido impedimento, isto porque, do contrário, haveria erro de tipo, excluindo o 
dolo e via de consequência o próprio crime. 
A consumação do crime ocorre no momento da celebração do novo 
matrimônio, conforme regra estabelecida no art. 1.514 do Código Civil. 
Art. 1.514. O casamento se realiza no momento em que o homem 
e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo 
conjugal, e o juiz os declara casados. 
 
A mera tentativa de celebração do casamento também é punível, todavia, há 
de se assentir que em relação a esta (tentativa), a doutrina diverge, isto porque, de 
um lado, parcela dos estudiosos entendem que os atos praticados para o advento da 
ocasião da declaração de vontade são preparatórios, ou seja, não podendo ser 
considerados atos de execução, pois começa e acaba com a declaração da vontade 
e não se inicia sem esta. De outro lado da doutrina,até a consumação do delito, 
todos os atos praticados são executivos ou preparatórios, iniciando-se com o ato da 
celebração, não se admitindo a mera prática dos atos de celebração. 
Romão Côrtes Lacerda, mencionado por Fernando Capez, sustenta: 
“Os atos praticados para o advento da ocasião dessa declaração 
de vontade são preparatórios, não podem ser tomados como atos de 
execução, pois esta começa e acaba com a declaração de vontade, e não 
começa sem a declaração. Se, no momento em que o agente vai responder 
sim ou não a pergunta do celebrante, surge alguém e o denuncia, não se 
pode dizer que a execução se haja interrompido independentemente da 
vontade do agente, que tanto poderia ter respondido sim ou não, e posto 
que no sim estaria a execução”. 
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Outro ponto importante a ser registrado é na hipótese de um brasileiro casar-
se pela segunda vez em um país o qual a poligamia é admitida, a exemplo dos 
países árabes, não há o que se falar em prática do crime de bigamia, todavia, o 
segundo casamento não terá validade no Brasil. 
O mesmo pensamento não pode ser aplicado há hipótese do agente que se 
casa pela segunda vez em um país onde a bigamia é proibida, sendo plenamente 
cabível a punição no Brasil. 
É a jurisprudência. 
“Configura o crime de bigamia o fato de brasileiro, já casado no 
Brasil, contrai novo matrimônio no Paraguai, pois ambos os países punem a 
bigamia, o que preenche o requisito da extraterritorialidade do Código 
Penal” (TJSP, RT 516/287, 523/374) 
 
Pelo até aqui exposto, denota-se que a criminalização da bigamia foi uma 
das formas de proteger o casamento, bem como toda a instituição denominada 
família. Todavia, diante do reconhecimento da união estável nos últimos anos, 
acabou por empurrar a figura do casamento para uma verdadeira contradição, isto 
porque, na prática, não há distinção entre o casamento e a união estável. 
A afirmação acima é visível quando a Constituição Federal, em seu art. 226, 
§3º narra que: 
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união 
estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei 
facilitar sua conversão em casamento. 
 
Objetivando a mesma proteção, são os arts. 1723 a 1727 do Código Civil. 
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável 
entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e 
duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. 
§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os 
impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no 
caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente. 
§ 2º As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a 
caracterização da união estável. 
Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros 
obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, 
sustento e educação dos filhos. 
Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os 
companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime 
da comunhão parcial de bens. 
Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, 
mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil. 
14 
 
Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, 
impedidos de casar, constituem concubinato. 
 
A união estável pode ser compreendida como um fato jurídico, constituído 
por pessoas (homem e mulher solteiros, viúvos, divorciados, separados 
judicialmente ou de fato, ou mesmo pessoas do mesmo sexo) que vivem juntas, 
como se casadas fossem, ocasionando como consequência efeitos patrimoniais. 
O art. 5º da Lei n. 9.278/1996 que regulamenta o § 3° do art. 226 da 
Constituição Federal, estabelece que os bens móveis e imóveis adquiridos por um 
ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são 
considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a 
ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato 
escrito. 
Pelo texto supracitado, conclui-se que ao compararmos o art. 1.566 (deveres 
dos cônjuges) e o art. 1.724 (deveres dos companheiros) os deveres e obrigações 
postos a um também o foi ao outro, razão pela qual torna-se incoerente a aplicação 
do crime de bigamia unicamente aqueles que contraiu casamento, sem estender o 
mesmo delito à união estável. 
Considerando que o objeto tutelado é a família, com interesse direto do 
Estado em sua proteção, tem-se que a ação é pública incondicionada, ou seja, 
independe de representação da vítima ou de representante com poderes para tanto. 
Ainda, mesmo que os envolvidos nos fatos concordem com a bigamia, a ação penal 
poderá ser instaurada, diante do inequívoco e já alegado interesse do Estado. 
 
2.3. O Crime de Bigamia segundo a Jurisprudência 
Sem o receio de parecer repetitiva, conforme já exposto alhures, o elemento 
subjetivo do tipo penal do crime de bigamia é o dolo, a vontade de contrair 
casamento, mesmo ciente do impedimento ocasionado pela vigência de casamento 
válido anteriormente contraído. Para a consumação do crime de bigamia previsto no 
art. 235 do Código Penal faz-se necessário que o indivíduo declare, em documento 
público, ser solteiro, divorciado ou viúvo, ou seja, registra a ausência de 
impedimento ao matrimônio. 
15 
 
Caso o agente casado, contraia três ou mais matrimônios há concurso 
material de delitos, e a testemunha que o declarou apto ao casamento mesmo 
sabendo do impedimento que o acometia é partícipe do delito de bigamia. 
Há de se assentir que para a configuração do crime de bigamia faz-se 
necessária a precedente de falsidade ideológica. Em outras palavras, para dar início 
ao processo de habilitação para o casamento faz-se necessário que o agente 
declare ao cartório responsável pela realização do matrimônio civil a ausência de 
impedimentos. Assim, denota-se que a bigamia (crime fim) absorve a falsidade 
ideológica (crime meio), que constitui tão somente etapa de sua realização, razão 
pela qual não há o que se falar em concurso de crime de bigamia com o delito de 
falsidade, uma vez que este é um simples meio para a prática daquele. 
Sobre o tema é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça exposta em 
seu Informativo de n. 235: 
FALSIDADE IDEOLÓGICA. ABSORÇÃO. CRIME DE BIGAMIA. O delito de 
bigamia exige a falsidade precedente - que se declare em documento 
público ser solteiro, viúvo ou divorciado. Assim declarada a atipicidade da 
conduta do crime de bigamia pelo Tribunal a quo, não pode subsistir a figura 
delitiva da falsidade ideológica em razão do princípio da consunção. A 
bigamia (crime-fim) absorve o crime de falsidade ideológica (crime-meio). 
Com esses esclarecimentos, a Turma concedeu a ordem para determinar a 
extensão dos efeitos do trancamento da ação penal do crime de bigamia ao 
crime de falsidade ideológica. HC 39.583-MS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado 
em 8/3/2005. 
 
HABEAS CORPUS – DIREITO PENAL – CRIME DE BIGAMIA E 
FALSIDADE IDEOLÓGICA – TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL QUANTO 
AO DELITO DE BIGAMIA DETERMINADO PELO TRIBUNAL A QUO POR 
AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA – IMPOSSIBILIDADE DE SEGUIMENTO 
DO PROCESSO – CRIME QUANTO À FIGURA DO CRIME DE 
FALSIDADE – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. 1. O delito 
de bigamia exige para se consumar a precedente falsidade, isto é: a 
declaração falsa, no processo preliminar de habilitação do segundo 
casamento, de que inexiste impedimento legal. 2. Constituindo-se a 
falsidade ideológica (crime–meio) etapa da realização da prática do crime 
de bigamia (crime-fim), não há concurso do crime entre estes delitos. 3. 
Assim, declarada anteriormente a atipicidade da conduta do crime de 
bigamia pela Corte de origem, não há como,na espécie, subsistir a figura 
delitiva da falsidade ideológica, em razão do principio da consumação. 4. 
Ordem concedida para determinar a extensão dos efeitos quanto ao 
trancamento da ação penal do crime de bigamia, anteriormente deferido 
pelo Tribunal a quo, a figura delitiva precedente da falsidade ideológica. 
(STJ–HC 2004/0161507-1 5ª T. – Rel. Min. Laurita Vaz – DJ 11.04.2005). 
 
Nessa linha de raciocínio esclarece Luiz Regis Prado: 
“Frise-se que a prática do delito previsto no art. 235 do Código 
Penal supõe que o agente declare, em documento público, ser solteiro, 
viúvo ou divorciado, incorrendo no delito insculpido no art. 299 do mesmo 
16 
 
diploma. Haveria, portanto, concurso material de delitos? Embora parte da 
doutrina se manifeste nesse sentido, urge reconhecer que o delito de 
bigamia exige a precedente falsidade, isto é, o processo preliminar de 
habilitação para o segundo casamento importa necessariamente declaração 
falsa por parte do agente. Destarte, em se admitindo o concurso material de 
crimes, o sujeito ativo responderia sempre pelo delito de falsidade. Nesse 
contexto, é indicada a solução do conflito pelo critério da consunção. Com 
efeito, o delito de falsidade ideológica (norma consumida) é fase de 
realização do crime de bigamia (norma consuntiva) ou é uma regular forma 
de transição para este último (delito progressivo). O crime-fim (bigamia) 
absorve, portanto, o crime-meio (falsidade ideológica), que constitui etapa 
de sua realização (major absorbet minerem). Advirta-se, porém, que a 
aplicação desse critério pode trazer incoerência: a bigamia tentada, que 
absorveria a falsidade, seria sancionada menos severamente do que esta: 
todavia, se não caracterizado o início da execução, a falsidade ideológica 
consumada (ato preparatório) seria punível como delito autônomo”. 
 
No que diz respeito à prescrição do crime de bigamia, o seu prazo inicia a 
partir da noticia criminis do delito. 
Por fim, como se observa dos julgados supramencionados, o casamento que 
é apenas uma das formas de constituir a família, acaba sendo o principal elemento 
na formação do crime de bigamia, levando à conclusão de uma diferenciação no 
tratamento com as diversas formas de se constituir a família, isto porque, o 
casamento, embora seja a forma historicamente mais tradicional de constituí-la, não 
é a única, e como no direito penal não se admite a analogia in malan partem, pode-
se afirmar que este tratamento diferenciado ao casamento em relação às demais 
formas de constituição da família fere diretamente o princípio da isonomia. 
O princípio da isonomia é ferido quando trata de forma desigual as demais 
uniões utilizadas para a constituição das famílias ao punir apenas aquele que 
constitui mais de um casamento civil, não realizando igual tratamento a quem 
realizada outras formas de união concomitantemente. 
Oportuno trazer à baila que o próprio Poder Judiciário deste Estado 
reconheceu a união estável de duas mulheres com um homem. 
No caso levado à juízo, buscou a parte Autora o reconhecimento da união 
estável post mortem com seu companheiro, ficando constatado durante a marcha 
processual que o de cujus mantinha duas famílias e assim permaneceu por mais de 
29 anos, com o conhecimento de todos, tolerando-se mutuamente e consentindo a 
respeito da relação dúplice sem qualquer oposição, razão pela qual foi a união 
reconhecida. Ademais, restou demonstrado que a familiar que o falecido mantinha 
com a autora era absolutamente igual à relação mantida com a esposa. 
17 
 
Ao final, foi a ação julgada procedente, garantindo à parte Autora a 
participação no inventário do falecido. Vejamos: 
M.L.P., devidamente qualificada nos autos, propôs ação 
declaratória de união estável em face de F.D.A.S., A. A. S.,E.;A.S., E.A.S.F. 
e E.P.A., todos também devidamente qualificados. Alega a autora que 
conviveu com E. A. S. desde o ano de 1979, até a data de seu falecimento. 
Que com E.A.S. teve três filhos, E. , E.Jr. e E. Alega que E. faleceu 
deixando bens, e que desde que passou a viver com o falecido foi sua 
dependente econômica. Pede o reconhecimento da união estável que 
manteve com o falecido e a divisão dos bens deixados por E. A. S.. 
Regularmente citados somente os réus F. D. A. S. e A.A.S. contestaram o 
pedido. Alegam a inépcia da inicial em preliminar e no mérito alegam que a 
autora agiu de má-fé, pois E.A. S., pais dos réus, foi casado com S.A.S., 
mãe dos réus, até o dia 27 de setembro de 2006, data do falecimento da 
mesma. Alegam que não pode ser reconhecida a pretensão da autora pois 
o réu sempre foi casado, que nosso sistema positivo é monogâmico, que 
não permite concurso de entidades familiares, traz julgados a respeito de 
sua tese e ao final pede a improcedência do pedido com a condenação da 
autora por litigância de má-fé. A preliminar foi rejeitada quando do saneador 
de fls. 70. Na instrução do processo foram ouvidas três testemunhas e os 
debates orais foram substituídos por memoriais. A autora em seus 
memoriais reitera que viveu com E.A. S. de 1979 até a data de seu 
falecimento, que S.A.S., esposa do falecido, sabia de sua relação com E., 
que inclusive a autora acompanhou E. em viagens para tratamento de 
saúde fora do Estado, teve três filhos com E., que compartilhou um esforço 
comum com E. na formação do patrimônio do casal e que a autora e seus 
filhos sempre foram dependentes economicamente de E.S.A.. Ao final pede 
a procedência do pedido. Os réus D.A.S. e A. A.S. em seus memoriais finais 
alegam que falta a autora dois requisitos para o reconhecimento de seu 
pleito, um que nunca foi vontade de E. que a autora fosse reconhecida 
como sua esposa e que existe proibição legal a tal pretensão. Alegam que 
em se tratando de concubinato impuro não existe direito à herança. Pedem 
ao final a improcedência do pedido. É o relatório. Tratam os autos de ação 
declaratória de união estável, post mortem, que M.L.P. move em face de 
F.D. A.S., A.A. S., E. A. S., E.A.S.Fº. e E.P.A., filhos e herdeiros de E.A. S.. 
Somente os dois primeiros réus, filhos do casamento do falecido com S. 
A.S. apresentaram resistência ao pedido. Os outros três filhos do extinto 
com a autora não contestaram o pedido. Para entender os fatos. A autora 
alega que vivia em união estável com o extinto desde 1979 até a data do 
falecimento do mesmo, não obstante o falecido ter sido casado com S.A.S. 
no mesmo período em que manteve a união com a autora. Às fls. 17 veio 
aos autos certidão de óbito de E.A.S.. Veio também a certidão de óbito de 
S.A.S. às fls. 46. Às fls. 45 veio a certidão de casamento de E.A.S. e de 
S.A.S., ocorrido em agosto de 1963, no Município de Gurupí, antigo Estado 
de Goias, hoje Estado do Tocantins. Ainda veio aos autos às fls. 14/16 
certidões comprovando que E.A.S. Fº., E.P.A. e E. A.S. são filhos do extinto 
com a autora. DJE. N. 216/2008 - Terça-feira, 18 de novembro de 2008 
Tribunal de Justiça - RO 38 Este diário foi assinado digitalmente consoante 
a Lei 11.419/06. O documento eletrônico pode ser encontrado no sítio do 
Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, endereço: 
http://www.tj.ro.gov.br/autenticacao/valida Diario.html sob o número 216 Ano 
2008 Durante a instrução do processo, fiquei absolutamente convencido 
que o falecido manteve um relacionamento dúplice com a esposa com 
quem era legalmente casado e a autora. Mais ainda, fiquei também 
convencido que este relacionamento dúplice não só era de conhecimento 
das duas mulheres como também era consentido por ambas as mulheres, 
que se conheciam, se toleravam e permitiam que o extinto mantivesse duas 
famílias de forma simultânea, dividindo a sua atenção entre as duas 
18 
 
entidades familiares. A testemunha Antônio Patrioça de Sá Chaves, ouvido 
às fls. 85, declarou que, in verbis: “Eu conheço a M.desde1969, a família 
dela é de Humaitá- AM,o E. eu conheci a uns 20 anos atrás aqui na cidade 
de Porto VelhoRO, também conheci a Dona S., nunca tive conhecimento 
que o E. fosse casado legalmente com a dona S., ele nunca me falou a 
respeito disso, eu conheço o D. e sei dizer que ele é filho do E. com a dona 
S., o A. eu não conhecia muito bem, eu vim a saber que ele é filho do E. na 
data do falecimento dele, no Hospital 09 de Julho, o Sr. E. e Dona M. 
compartilhavam a vida em uma casa aqui em Porto Velho, na Rua Caúla, eu 
esporadicamente freqüentava a residência do Sr. E. lá na fazenda, não 
tenho conhecimento que a Dona M. convivesse com o E. lá na fazenda, a 
Dona S. vivia com o E. e morava com ele na casa da Fazenda Araguaia, 
não sei dizer se a Dona S. viveu na casa da fazenda até a data de seu 
falecimento no ano de 2006, eu tomei conhecimento do falecimento da 
Dona S. por um conhecido, eu tenho conhecimento de que o E. Fº e o E. 
freqüentava a casa da fazenda................... ............................com certeza 
pode se afirmar que a dona S. sabia da existência do E., do E..Fº. e da E”. 
De igual modo relatou a testemunha Célio Nogueira, às fls. 87, que, verbis: 
“eu conheço a dona S. há mais de 35 anos, eu também conheci o E. há 35 
anos, Há muitos anos atrás eu conheci a M., tenho conhecimento que a 
Dona M. e o E. teve um relacionamento e tiveram filhos, também conheço o 
E., o E. F. e a E., tenho conhecimento que nesse período que o E. tinha um 
relacionamento com a Dona M. ele tinha uma residência na cidade em que 
vivia com a Dona M., nesse período a S.vivia com ele na fazenda e eles 
também tinham uma residência aqui na cidade na Rua Pinheiro Machado, 
eu freqüentava a casa lá na fazenda, várias vezes eu vi a E., o E.e o E. Fº. 
na fazenda”. Não há qualquer resquício de dúvida de que a autora e a 
falecida esposa do extinto sabiam de suas existência e da duplicidade da 
relação que E.A. mantinha com ambas. O falecido E. teve três filhos com a 
autora, seus filhos freqüentavam a fazenda em que o extinto vivia com a 
falecida esposa S.E.A. mantinha dois imóveis residenciais na cidade, um 
para moradia da autora e outro para morada de S. , quando esta não estava 
na fazenda. A autora e S. tinham mútuo conhecimento de suas existências, 
se toleravam e permitiam que E. A.S. dividisse seu tempo e sua atenção 
com as duas mulheres, mantendo com as mesmas um relacionamento 
duradouro e estável. O que fazer o julgador diante de tal realidade? Como 
se colocar diante do que se confunde como justo e injusto, como certo e 
errado, como o direito e o avesso? Diante de uma situação fática em que 
devidamente comprovado que com a concordância de ambas as mulheres, 
o extinto manteve por vinte e nove anos uma relação dúplice, deve o 
julgador ater-se tão somente ao hermetismo dos textos legais e das 
disposições positivadas em nossos códigos de lei? Aquela mulher que viveu 
com um homem, que não obstante fosse casado, por vinte e nove anos, não 
tem direito a nada? É sabido que nossa legislação baseia-se no 
relacionamento monogâmico caracterizado pela comunhão de vidas, tanto 
no sentido material como imaterial. Da mesma forma é sabido que a relação 
paralela de uma mulher com homem legalmente casado e impedido de 
contrair novo casamento é classificado de concubinato impuro ou adulterino, 
sem gerar qualquer direito para efeito de proteção familiar fornecida pelo 
Estado. É o que dispõe o inciso VI, do artigo 1521 combinado com o § 1º do 
artigo 1723 ambos do Código Civil brasileiro. Todavia, a relação que a 
autora teve com o extinto não pode ser classificada simplesmente como 
dispõe o artigo 1727 do Código Civil brasileiro. A relação da autora com o 
falecido, não obstante fosse o mesmo legalmente casado e não separado 
de fato, não foi eventual a ponto de nos satisfazermos com a singela 
afirmação de que esta relação de vinte e nove anos somente foi um 
concubinato impuro ou adulterino, incapaz de gerar qualquer efeito jurídico 
no mundo dos fatos. Segundo Maria Berenice Dias, “a doutrina ainda 
distingue modalidades de ligações livres, eventuais, transitórias e 
adulterinas, com o fim de afastar a identificação da união como estável e, 
19 
 
assim, negar quaisquer direitos a seus protagonistas. São consideradas 
relações desprovidas de efeitos positivos na esfera jurídica. Os concubinos 
chamados de adulterino, impuro, impróprio, espúrio, de má-fé, 
concubinagem e etc, são alvo do repúdio social. Nem por isso deixam de 
existir em larga escala. A repulsa aos vínculos afetivos concomitantes não 
os faz desaparecer, e a invisibilidade a que são considerados pela Justiça 
só privilegia o bígamo. Situações de fato existem que justifica considerar 
que alguém possua duas famílias constituídas . São relações de afeto, 
apesar de consideradas adulterinas, e podem gerar conseqüências 
jurídicas”.( in Manual de Direito das Famílias, Livraria do Advogado, 2005, 
p.179) Não se pode desconhecer a realidade do comportamento social no 
que diz respeito aos relacionamentos afetivos paralelos, que acabam por 
mitigar aquele deve legal de fidelidade previsto no inciso I , do artigo 1556 
do Código Civil brasileiro. Ainda segundo o ensinamento de Maria Berenice 
Dias, “negar a existência de uniões paralelas, quer um casamento e uma 
união estável, quer duas ou mais uniões estáveis, é simplesmente não ver a 
realidade. A justiça não pode chancelar essas injustiças. Mas, é como vem 
se inclinando a doutrina. O concubinato adulterino importa, sim, para o 
Direito. São relações que repercutem no mundo jurídico, pois os 
companheiros, convivem, às vezes tem filhos, e há construção patrimonial 
em comum. Destratar mencionada relação, não lhe outorgando qualquer 
efeito, atenta contra a dignidade dos partícipes e filhos porventura 
existentes”. ( in obra citada, p. 181) É o que a psicologia atualmente 
denomina de poliamorismo. Em excelente artigo publicado no site jurídico 
jus navigandi , o magistrado e professor Pablo Stolze Gagliano trata do 
direito da amante na teoria e na prática dos tribunais Conforme o eminente 
articulista, “o poliamorismo ou poliamor, teoria psicológica que começa a 
descortinarse para o Direito, admite a possibilidade de co-existirem duas ou 
mais relações afetivas paralelas, em que seus partícipes conhecem e 
aceitam uns aos outros, em uma relação múltipla e aberta. Segundo a 
psicóloga NOELY MONTES MORAES, professora da PUC-SP, a 
etologia(estudo do comportamento animal), a biologia e a genética não 
confirmam a monogamia como padrão dominante das espécies, incluindo a 
humana. E, apesar de não ser uma realidade bem recebida por grande 
parte da sociedade ocidental, as pessoas podem amar mais de uma pessoa 
ao mesmo tempo”. ( in htpp: //jus2.uol.com.br/doutrina ) Alguns tribunais 
brasileiros, inclusive o Superior Tribunal de Justiça, já tem reconhecido o 
direito da concubina na relação dúplice, a partilhar o recebimento de pensão 
em caso de falecimento do companheiro ou homem casado que mantinha 
duas relações familiares. Nesse sentido a jurisprudência, verbis: “PENSÃO 
PREVIDENCIÁRIA – PARTILHA DE PENSÃO ENTRE A VIÚVA E A 
CONCUBINA – COEXISTÊNCIA DE VINCULO CONJUGAL E A NÃO 
SEPARAÇÃO DE FATO DA ESPOSA – CONCUBINATO IMPURO DE 
LONGA DURAÇÃO. Circunstâncias especiais reconhecidas em Juízo. 
Possibilidade de geração de direitos e obrigações, máxime no plano da 
assistência social. Acórdão recorrido não deliberou à luz dos preceitos 
legais invocados . Recurso especial não conhecido” ( STJ – REsp 742.685-
RJ – 5ª Turma – Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca – Publ. em 
05.09.2005) “PENSÃO – ESPOSA E CONCUBINA – DIVISÃO EQUANIME. 
Agiu bem a autoridade administrativa ao dividir a pensão vitalícia por morte 
de servidor que em vida manteve concomitantemente duas famílias, entre a 
esposa legítima e a concubina. Inexiste direito líquido e certo da esposa àexclusividade do recebimento da pensão, se provado está que a concubina 
vivia sob a dependência econômica do de cujus. Ato administrativo que se 
manifesta sem qualquer vício ou ilegalidade. Ordem denegada.”( TJ-DF – 
MS 6648/96 – Acórdão COAD 84999 – Rel. Dês. Pedro de Farias – Publ. 
em 19.08.1998) “SERVIDOR PÚBLICO – FALECIMENTO – ESPOSA – 
CONCUBINA –PENSÃO – DIREITO. Comprovada a existência de 
concubinato, inclusive com reconhecimento de paternidade por escritura 
pública, devida é a pensão por morte à concubina, que passa a concorrer 
20 
 
com a esposa legítima.” ( TRF – 1ª Região – AP.Civ. 1997.01.00.057552-
8/AM – Rel Juiz Lindoval Marques de Brito – publ. em 31.05.1999) Também 
deve caber tal reconhecimento para fins de divisão do patrimônio 
amealhado pelos três durante a relação dúplice. Ainda mais quando 
sobejamente comprovado que a autora, que Serafina e que Electo 
mantinham uma relação de poliamor, em que todos sabiam, se toleravam e 
consentiam a respeito da relação dúplice mantida sem qualquer oposição. 
Não se pode deixar de reconhecer os efeitos jurídicos desta relação. 
Contrário senso, seria admitir a absoluta falta de qualquer conseqüência 
pela irresponsabilidade do extinto em manter duas famílias, de quem foi 
duplamente infiel e de quem na última das ponderações, ao final das 
contas, não respeitou nem a esposa nem a companheira. Sem falar no 
locupletamento ilegal e ilícito daqueles que formaram patrimônio, que 
também teve a colaboração da autora em sua aquisição. DJE. N. 216/2008 - 
Terça-feira, 18 de novembro de 2008 Tribunal de Justiça - RO 39 Este diário 
foi assinado digitalmente consoante a Lei 11.419/06. O documento 
eletrônico pode ser encontrado no sítio do Tribunal de Justiça do Estado de 
Rondônia, endereço: http://www.tj.ro.gov.br/autenticacao/valida Diario.html 
sob o número 216 Ano 2008 Como diz Maria Berenice Dias, a Justiça não 
pode favorecer e incentivar a infidelidade e o adultério. Não obstante o § 3º 
do artigo 226 da CF/88, reconhecer a união estável como entidade familiar e 
dispor que a lei deve facilitar a sua conversão em casamento, sendo 
consectário lógico que para contrair matrimônio os contraentes não podem 
apresentar impedimentos e devem observar os seus deveres, de outro norte 
negar direito a autora no caso em julgamento constitui atentado ao princípio 
da dignidade da pessoa humana, tanto da autora como de seus filhos. O 
inciso III do artigo 1º da Constituição Federal de 1988, erigiu a dignidade da 
pessoa humana em valor supremo da República Federativa do Brasil. 
Consoante a lição de José Afonso da Silva, “não é apenas um princípio de 
ordem jurídica, mas o é também da ordem política, social, econômica e 
cultural. Dai sua natureza de valor supremo, porque está na base de toda a 
vida nacional”.( in Comentário Contextual à Constituição, Malheiros, 2005, 
p. 38) Também ao se negar a autora qualquer direito no caso em 
julgamento, importaria em afronta ao princípio constitucional da igualdade, 
expresso no caput do artigo 5º da Constituição Federal que dispõe serem 
todos iguais perante a lei, sem distinções de qualquer natureza. A relação 
familiar que o falecido mantinha com a autora era absolutamente igual à 
relação mantida com a esposa Serafina. Foram duas situações de fato 
absolutamente idênticas, duas entidades familiares mantidas ao mesmo 
tempo, que obrigatoriamente devem ser tratadas da mesma maneira. 
Doutrina e jurisprudência já vem admitindo a possibilidade da divisão em 
três partes do patrimônio formado em relações dúplices, é o que se chama 
de “triação”, ou seja, a meação transmudada em divisão de três partes 
iguais do patrimônio, um terço para o de cujus, um terço para a esposa e 
um terço para a companheira. De acordo com o magistério de Maria 
Berenice Dias, “somente na hipótese de não se conseguir definir a 
prevalência de uma relação sobre a outra é que cabe a divisão do acervo 
patrimonial amealhado durante o período de convívio em três partes iguais, 
restando um terço para o varão e um terço para cada uma das mulheres”.( 
in obra citada, p. 181) Portanto, após o ano de 1979, todo o patrimônio 
adquirido deve ser dividido em três partes, pois as relações foram 
concomitantes. Nesse sentido a jurisprudência do Tribunal de Justiça do 
Estado do Rio Grande do Sul, verbis: “APELAÇÃO CÍVEL – 
RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL PARALELA AO CASAMENTO 
E OUTRA UNIÃO ESTÁVEL – UNIÃO DÚPLICE – POSSIBILIDADE – 
PARTILHA DE BENS – MEAÇÃO – TRIAÇÃO – ALIMENTOS. A prova dos 
autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união estável entre a 
autora e o réu em período concomitante ao seu casamento e, 
posteriormente, concomitante a uma segunda união estável que se iniciou 
após o término do casamento. Caso em que se reconhece a união dúplice. 
21 
 
Os bens adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre a 
esposa, a companheira e o réu. Meação que se transmuda em triação, pela 
duplicidade de uniões. O mesmo se verifica em relação aos bens adquiridos 
na constância da segunda união estável.” ( TJRS – ApCível n.º 
70022775605/08 – Rel Dês. Rui Portanova, julgado em 07.08.2008) 
“APELAÇÃO – UNIÃO DÚPLICE – UNIÃO ESTÁVEL – POSSIBILIDADE. A 
prova dos autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união entre 
a autora e o de cujus em período concomitante ao casamento de “papel”. 
Reconhecimento de união dúplice. Precedentes jurisprudenciais. Os bens 
adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre esposa, a 
companheira e o de cujus. Meação que se transmuda em triação, pela 
duplicidade de uniões” ( TJRS – ApCível 70019387455-07 – Rev. e Red. 
Dês. Rui Portanova , vencido o relator Dês. Luiz Ari Azambuja Ramos, 
julgado em 24.05.2007) Portanto, de tudo que foi exposto, é possível o 
reconhecimento da união dúplice, quando a autora, o extinto e sua falecida 
esposa mantiveram uma relação de poliamor, consentida e tolerada, 
advindo daí efeitos legais como a divisão dos bens adquiridos neste 
período. Procedente o pedido da autora, não há que se falar em litigância 
de má-fé. Isto posto, julgo procedente o pedido para declarar que M.L.P. 
manteve união estável com o extinto E.A.S., concomitantemente ao 
casamento do falecido, do ano de 1979 até a morte deste em 17 de 
dezembro de 2007, devendo o patrimônio adquirido pelo de cujus, por sua 
falecida esposa e pela autora neste período ser dividido em três partes 
iguais, mediante comprovação nos autos do inventário em tramite neste 
Juízo sob o n.º .......... Custas e honorários, estes em 20% do valor dado á 
causa, pelos réus. P.R.I.C. Porto Velho, 13 de novembro de 2008.Adolfo 
Theodoro Naujorks Neto Juiz de Direito. 
 
Como se observa, em que pese o reconhecimento da bigamia como crime, a 
jurisprudência vem reconhecendo a possibilidade de união concomitante, quando 
haja a aceitação de todos os envolvidos na relação conjugal, garantindo aos 
envolvidos o direito decorrentes da referida união. 
 
2.3. O Crime de Bigamia e a Constituição Federal 
A Constituição Federal, em seu art. 226 garantiu à família, como base da 
sociedade, especial proteção do Estado. 
Apesar de sermos um país que adotou a monogamia, constata-se nos 
últimos tempos uma inconsciente lesão à Carta Magna, por boa parte dos cidadãos, 
visto que diante do casos que se tornou a compreensão do que vem a ser um 
casamento, o crime de bigamia acabou por entrar em desuso, assim como o foi o de 
adultério. Ademais, diante da facilidade de obtenção das informações, dificilmente 
um cidadão conseguira casar-se mais de uma vez com outra pessoa sem que o 
outro soubesse de eventual relacionamento anterior, o que ao contrario ocorre às 
vastas vistas nos dias de hoje nos casos das demais modalidades de casamento. 
22 
 
A ocorrência desenfreada de casos de pessoas que contraem um novo 
casamentoem outras formas ou modalidades de casamento nos dias atuais se 
continuar sem a tutela estatal, sem a devida proteção da lei, acabará por tornar-se 
rotineira, como se fosse um costume do povo, como se a monogamia já não fosse 
mais adotada pelo Brasil e sim a poligamia. O que em um futuro não tão distante 
passara a não ser mais crime também no casamento cível, visto que virara costume 
da sociedade. 
 
3. O CRIME DE BIGAMIA E O PRINCÍPIO DA ÚLTIMA RATIO 
Ao Estado é tutelado, por meio do Direito Penal, a capacidade de 
demonstrar a sua força coercitiva, objetivando sempre a proteção do interesse social 
e a coletividade. Todavia, tal poder coercitivo não pode ser exercido pelo Estado a 
seu bel prazer, sem nenhuma limitação. 
O Estado de Direito está limitado, no exercício dos seus poderes, aos limites 
estabelecidos pela própria lei, partindo da gênese de que esse controle deve ser 
pautado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da necessidade. 
Pois bem. A função primordial do Direito Penal é proteger subsidiariamente 
os bens jurídicos essenciais à sociedade, todavia, na qualidade de “ultima ratio”, ou 
seja, não havendo nenhum outro meio jurídico a solucionar a problemática, ou 
mesmo diante do fracasso dos utilizados é que o Direito Penal passará a atuar, 
tutelando a proteção dos bens jurídicos mais relevantes. 
Isso significa dizer que, havendo a possibilidade de obstar determinadas 
condutas e proteger, consequentemente, bens substanciais ao ser humano, por 
outros ramos do direito, a exemplo do direito civil, administrativo, trabalhista etc, ao 
Estado caberá lançar mão do Direito Penal para o exercício do referido mister. 
Diante do atual contexto social, o que se observa é que diante do desuso do 
crime de bigamia, o provável caminho a ser utilizado será o da exclusão do referido 
crime, punindo o indivíduo de outras formas, utilizando outras medidas existentes 
em ramos do direito diversos do penal. 
 
 
4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 
23 
 
A pesquisa fora realizada por meio de análise em posicionamentos 
jurisprudenciais nos diversos Tribunais Brasileiros, principalmente àqueles julgados 
do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justuça, bem como o que diz a 
doutrina e pesquisas sobre o tema. O método de pesquisa utilizado fora o 
qualitativo, procurando entender o comportamento dos indivíduos, a partir de 
características pessoais. 
Constituiu-se pela busca de casos concretos para o entendimento prático 
daquilo que ocorre de fato em relação ao tema. 
Foram realizadas pesquisas em sites jurídicos, jurisprudências, leis, 
doutrinas. 
 
5. CONCLUSÃO 
De todo o exposto, conclui-se que não obstante a sua existência no Código 
Penal Brasileiro, em razão da atual realidade social o crime de bigamia encontra-se 
ultrapassado, da mesma forma ocorrida com o crime de adultério, não cabendo a 
sua tutela pelo direito penal, o qual caberia aos outros ramos do direito. Todavia, 
isso não significa a ausência de proteção e punição ao indivíduo que pratica tal 
conduta, até mesmo porque, como exposto, a prática do delito precede de uma 
declaração falsa, denominado crime de falsidade ideológica, absorvido pelo crime de 
bigamia. 
Ainda, conforme mencionado alhures, o princípio da “ultima ratio” deve ser 
devidamente efetivado, aplicando o Direito Penal unicamente na hipótese de outros 
ramos do Direito não serem capazes de solucionar o ilícito. Assim, podendo o crime 
de bigamia ser resolvido por outros ramos do direito, desnecessária a atuação do 
Direito Penal. 
Diante de uma sociedade atual que faz questão de se aparecer, com a 
necessidade de ser vista por todos, permitindo a exposição, muitas vezes 
exagerada, de sua intimidade, recusando a interferência do Estado em tais 
comportamentos, denota-se a perda de espaço para aplicação do crime de Bigamia, 
especialmente quando o mesmo fere diretamente o princípio da isonomia, ao aplica-
lo unicamente ao casamento e não às demais formas de constituição da família, a 
exemplo da união estável. 
Pelo exposto, conclui-se que com o advento da Constituição Federal de 
1988, responsável pela modificação, pluralização, democratização e humanização 
24 
 
da família, o crime de bigamia começou a passar por um processo de esvazimento e 
contradição ao conflitar com outros princípios existente da Carta Magna, a exemplo 
da Dignidade da Isonomia e da Pessoa Humana. 
 
REFERÊNCIAS 
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4. ed. rev. atual. e ampl., São Paulo: Saraiva, 2010. 
 
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Janeiro: Lumen Juris, 2008, P. 23. 
 
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dos Tribunais, 1998. 
 
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Nagib Slaibi Filho e Priscila Pereira Vasques Gomes. 3. ed. – Rio de Janeiro: 
Forense, 2012. 
 
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GONÇALVES,Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 
2015, v. 6. 
 
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25 
 
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em 15/10/2016. 
 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406compilada.htm. Acessado em 
15/10/2016. 
 
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Acessado em 15/10/2016. 
 
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